Festival Multiplicidade Vol. 4 - 2009

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A Luca, meu filho, pertence este livro. This book is dedicated to my son, Luca.


www.multiplicidade.com / info@multiplicidade.com

PatrocĂ­nio / Sponsorship :


Curadoria: Batman Zavareze


Não é exagero dizer que o Multiplicidade é hoje um dos festivais mais instigantes em cartaz no Rio de Janeiro. Daqueles que fazem diferença na cena artística da cidade e — por que não? — do Brasil. Afinal, quantos festivais podem ostentar em seu título o adjetivo “inusitados” quando falam dos encontros que promovem entre som e imagem? Que projeto consegue se reinventar a cada apresentação? Que série de shows-audições consegue, ainda hoje, surpreender as plateias mais antenadas? Com um calendário regular, o festival entra em 2010 em sua sexta edição com fôlego juvenil. Criado especialmente para a abertura do Oi Futuro Flamengo, o projeto cresceu, ganhou novos palcos do próprio Oi Futuro, mantendo o mesmo frescor do início. De fato, a cada show, um conceito é criado, e uma produção, erguida para concretizar uma ideia nova — ou um sonho antigo — de um grupo de criadores que nem sempre se conhecem. Aqui, neste livro-catálogo, estão reunidos registros completos sobre o Multiplicidade em 2009. Está listada toda a programação do projeto no Oi Futuro Flamengo e também os Multi Grandes Espetáculos, que lotaram o Oi Casa Grande, com atrações especiais, como Naná Vasconcelos e os internacionais AntiVJ + Principles of Geometry e The Cinematic Orchestra. Em 2009, o Multiplicidade marcou presença ainda na festa de abertura do Oi Futuro em Ipanema, reunindo Vik Muniz e Arnaldo Antunes, dois grandes artistas que nunca tinham trabalhado juntos. Emoções e sensações exclusivas, que não se repetem. A cada Multiplicidade, uma nova estreia.

It would be no exaggeration to say that Multiplicidade is, currently, one of the most exhilarating festivals in Rio de Janeiro. It is one of those rare events that can make a difference in a city’s cultural and artistic landscape, and, why not say in an entire country? What other festival can one think of that flaunts the title of hosting the most “unusual” encounters? What other project has been able to reinvent itself over each edition? What other series of concert-presentations has the freshness and creative power to surprise even the most tuned-in of crowds? In 2010, Multiplicidade will celebrate its sixth edition, with another series of breathtaking events. Especially created to mark the inauguration of the Oi Futuro branch in Flamengo, the project has grown along the years, while keeping the same youthful energy as form the beginning. As a matter of fact, each concert has the mission of proposing a new concept, around a set of fresh ideas — or even out old dreams — with artists joining the stage, most of them for first time together. The catalog you are now holding is the compilation of the venues hosted by Multiplicidade in 2009. We have compiled the list of programs which took place at the Oi Futuro branch in Flamengo, as well as the Multi-Spectacles, which packed the Oi Futuro Concert Hall (Casa Grande), with special attractions, such as singer Naná Vasconcelos and international musicians AntiVJ + Principles of Geometry and The Cinematic Orchestra. In 2009, Multiplicidade also organized a special venue in Ipanema to mark the inauguration of our newest branch in the respective neighborhood. The occasion brought together painter, Vik Muniz, and musician, Arnaldo Antunes, two of the most creative artists in the country today, in a terrific and unpre-cedented encounter, overflowing with beautiful sounds and sensations.

Que venham mais estreias em 2010! Maria Arlete Gonçalves Diretora de Cultura do Oi Futuro/ Cultural Director at Oi Futuro

Each edition of Multiplicidade brings a new debut. May there be many debuts in 2010!



Foto Dupla

Blind Date Nanรก Vasconcelos & DJ Dolores Raul Mourรฃo & Leo Domingues


O Festival Multiplicidade_Imagem_Som_inusitados surgiu em 2005, amadureceu e cresceu. Seu principal conceito é unir arte visual e sonoridade experimental em apresentações multimídia. É um evento livre, aberto ao inesperado ou, simplesmente, um convite a transpor portas intangíveis.

Multiplicidade_Imagem_Som_inusitados emerged in 2005, having matured and grown since then. The main objective behind it is to unite visual arts and experimental music in a single, multimedia presentation. It promotes free experimentation, open to the unusual, or, put simply, it is an invitation to trespass the doors of the unattainable.

Em 2009 promoveu no Rio de Janeiro dez espetáculos de diferentes proporções e complexidades, distribuídos nos teatros Oi Futuro Flamengo, Oi Futuro Ipanema e Oi Casa Grande, este último para um público de até mil pessoas na plateia, repetindo a iniciativa de sucesso do ano anterior.

In 2009, having as its natural setting, the beautiful city of Rio de Janeiro, it promoted 10 multimedia-concerts distributed in the theatres of Oi Futuro Flamengo, Oi Futuro Ipanema and Oi Casa Grande, the largest of these venues, hosting up to one thousand spectators, and repeating the acclaim achieved the previous year.

O Multiplicidade fomenta uma importante e estratégica cena, nacional e internacional, na cidade do Rio de Janeiro, construindo um intercâmbio sólido e duradouro de potencial cultural, artístico e tecnológico.

Multiplicidade foments an important and strategic cultural-artistic scene, bringing both national and international artists to Rio de Janeiro, in the construction of what is a promising bridge in terms of cultural, artistic and technological exchanges.

Já são cinco anos consecutivos com o patrocínio da Oi e da Secretaria de Cultura – RJ, através do benefício da Lei de ICMS local, de incentivo à cultura, com apoio cultural do Oi Futuro, que aposta no conceito do festival.

It has been five consecutive years of a joyous and fruitful event, thanks to the sponsorship of Oi telecommunications and the Department for Culture in Rio de Janeiro, to whom we owe the benefit of the ICMS tax incentive, as well as the cultural and logistical support of Oi Futuro, which faithfully believes in the concept of the project.

O Multiplicidade dialoga com as artes digitais, arte que muitas vezes parece ter um potencial ilimitado.

Multiplicidade openly dialogues with the digital arts, showing the virtually unlimited potential of such a field.

No interior de cada apresentação criada existem embate de ideias, movimentos antagônicos — antigos ou modernos/ sofisticados ou elementares/ tecnológicos ou artesanais —, um repertório híbrido e o surgimento de novas linguagens. Incentivo ao pensamento e à prática.

Behind each of the productions we have hosted, one must not take for granted the richness of the ideas which come into debate. Many of these are contradictory or even antithetical, as we seek to breech the boundaries between the traditional and the ultra-modern; the elementary and the sophisticated; the technological and the handmade artifacts. In sum, what we offer is a hybrid repertoire which will foment the emergence of new, rich modes of expression. An incentive for creative thought and audacious practice.

Por isso, como critério sine qua non 1 de nossa inquietude latente, o Multiplicidade é inexato por promover a invenção experimental artística e não a repetição de formas (e fórmulas). “Toda arte é experimental”, escreveu o crítico americano de vídeo e filme Gene Youngblood 2, “ou não é arte.” O Multiplicidade promove Percursos. O Multiplicidade é intencionalmente, desde sua concepção, Plural e Singular 3. Batman Zavareze Curador artístico do Festival/ Artistic curator of the Multiplicidade_Imagem_Som_inusitados

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O termo sine qua non originou-se do termo legal em latim para “sem o qual não pode ser”. 2 Gene Youngblood é, possivelmente, o primeiro a pensar a convergência das mídias, num livro histórico de 1970 sobre o tema intitulado “Expanded cinema”. Ele percebe, a partir do exemplo do cinema experimental norteamericano e do surgimento da televisão, do vídeo e do computador, que o conceito tradicional de cinema havia explodido. Referência Bibliográfica: Título: “Novas mídias na arte contemporânea” Título original: “New media in late 20th-century art” Autor: Michael Rush Livraria Martins Fontes Editora Ltda ISBN 85-336-2313-5 3 Conceito do festival: Plural, múltiplo, com riqueza na diversidade de nossa programação de forma que o diálogo seja amplo. Singular, especial e único a cada espetáculo, a cada encontro inusitado entre imagem e som.

Thus, the criteria sine qua non1 of our disquieting experimentation, is inexact: Multiplicidade promotes artistic invention and experimentation and not the repetition of bygone forms and formulas. “Art must be experimental”, according to the North American film critic, Gene Youngblood2, “or else it is not art.” Multiplicidade promotes Pathways. Multiplicidade is, intentionally, and ever since it was conceived a Plural and Singular event3.

1 The expression sine qua non originates from the latin legal vernacular as “that quality without which something cannot be 2 Gene Youngblood was, possibly, the first critic to write about the concept of converging media, in a historic book entitled “Expanded Cinema”, published in 1970. Based on research in North-American experimental cinema and the emergence of television, videos and the computer, he noticed that the traditional concept of cinema had “exploded”, that is, expanded. Bibliography: English title: “New media in late 20th-century art” Author: Michael Rush Martins Fontes, Ltda. ISBN 85-336-2313-5 3 The festivals’ concept: Plural, multiple, rich in diversity, as means of enriching the dialogue between different media. Singular, especial, unique in each venue and unusual encounter between images and sounds.


MULTIPLICIDADE OI FUTURO FLAMENGO-RJ Multi 01 Cao Guimarães + O Grivo 28 de maio de 2009 Multi 02 Muti Randolph + Clara Sverner 25 de junho de 2009 Multi 03 Cine Macalé (Jards Macalé + Samir Abujamra) 23 de julho de 2009 Multi 04 Moo 3 de setembro de 2009 Multi 05 Retrotech 24 de setembro de 2009 Multi 06 Jam da Silva + OEstúdio (participação especial Chico Neves) 29 de outubro de 2009 Multi 07 Arto Lindsay 26 de novembro de 2009

MULTIPLICIDADE OI FUTURO IPANEMA-RJ Multi 01 Arnaldo Antunes + Marcia Xavier (participação especial Edgar Scandurra) 15 de setembro de 2009 Projeções na fachada do centro cultural por Vik Muniz Multi 02 Siri + Deborah Engel + Jr.Tostoi + Lenine 25 de fevereiro de 2010 Multi 03 Siri + Deborah Engel + Jr.Tostoi + Fausto Fawcett + Chacal 26 de fevereiro de 2010 MULTIPLICIDADE OI CASA GRANDE-RJ Multi 01 Blind Date (Naná Vasconcelos + DJ Dolores) + Raul Mourão & Leo Domingues 10 de novembro de 2009 Multi 02 AntiVJ + Principles of Geometry (França) - “A Stereoscopic Show” 17 de novembro de 2009 Multi 03 The Cinematic Orchestra (Inglaterra) “Man with a movie camera” 15 de dezembro de 2009


Arnaldo Antunes + Marcia Xavier



Multi 01_2009 Cao Guimarães + O Grivo 28 de Maio/ May 28th Nelson Soares música/ music Marcos Moreira música/ music Cao Guimarães projeções/ video projections

O mineiro Cao Guimarães apresenta em seus trabalhos uma estética documental/experimental bastante rebuscada e poética. Sua obra costuma transitar entre a tênue linha do cinema, da fotografia e das artes plásticas, participando tanto de festivais de cinema quanto de exposições em galerias e museus, tais como: Tate Modern, Guggenheim Museum, Museum of Modern Art-NY (MoMA-NY), Instituto Cultural Inhotim, Festival de Locarno (2004, 2006 e 2008), Sundance Film Festival (2007), Festival de Cannes (2005), Festival do Rio (2001, 2004, 2005, 2006), entre outros. Além de produzir trilhas para cinema, vídeo e dança, O Grivo, formado por Nelson Soares e Marcos Moreira, também de Minas Gerais, abrange concertos, instalações e performances com variadas perspectivas de improvisação e utilização de equipamentos eletrônicos em áudio e vídeo. O Grivo, que constrói todos os seus instrumentos-esculturas, foi o responsável pela sonorização da Bienal de São Paulo 2008. Para o Multiplicidade, Cao e O Grivo prepararam um roteiro com 12 cenas. Num certo momento a sutileza do silêncio explorou o som do ar que vinha de microventiladores, ilustrando o curta “Sopro”, feito em parceria com Rivane Neuenschwander. Chama a atenção o improviso com ruídos de galhos e folhas secas realizado ao vivo, simulando o som que as formigas fazem ao caminhar. E o momento em que uma chapa de aço pendurada é arranhada de forma pontual e estridente com imagens projetadas de um porco sendo destroçado – “Aula de anatomia”, deslocando o espectador para uma zona de inquietação. Foram usados dois telões e um grande dispositivo de instrumentos não convencionais.

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The multimedia artist from Minas Gerais, Cao Guimarães, showcases a unique style which blends documentation and experimentation, in a far-fetched and poetic manner. His works navigate through the tenuous line which connects cinema, photography and plastic arts. He has exhibited his work in both film festivals, art galleries and museums, such as: the Tate Modern, the Guggenheim, the MoMa-NY, the Cultural Institute of Inhotim, the Locarno Festival (2004, 2006 and 2008), Sundance Film Festival (2007), Cannes Film Festival (2005) and the Rio Film Festival (2001, 2004, 2005, 2006), among others. Not to mention his production of musical scores in films, videos and dance presentations. O Grivo, formed by Nelson Soares and Marcos Moreira, both also from Minas Gerais, is a group which performs concerts, installations and variety of other performances which combine a diversity of improvisational facets, as well as the use of electronic equipment, such as audio and video. O Grivo group make their own instruments. They were responsible for the musical production of the 2008 São Paulo Biennale. On occasion of their concert at the Multiplicidade Festival, Cao and O Grivo group prepared a script consisting of 12 scenes. In one scene, the subtle and overwhelming silence produced by micro-aerators, illustrate “Breath”, one of the short films showcased in partnership with Rivane Neuenschwander. On-stage the group is seen crackling figs and dry leaves, to improvise the sound of ants walking. In another skit entitled “A lesson in anatomy”, an iron slab is suddenly scratched by an unidentified pointy object producing an eerie and screechy sound, followed by projections of a pig being ravished to pieces. The atmosphere transports the audience into a zone of uneasiness. Two film-screens and a variety of unconventional instruments were used in the production.





Multi 02_2009 Clara Sverner + Muti Randolph 25 de Junho/ June 25th Clara Sverner piano meia cauda acústico/acoustic piano Muti Randolph cenário e projeções/ stage design and projections Cenografia.net construção do anteparo de projeção/ construction of the bulkhead showing the projections

Um dos pioneiros na utilização de computadores como ferramenta e suporte para artes visuais, Muti Randolph divide seu tempo com projetos de design e tecnologia de ponta. Clara Sverner, pianista da área erudita, mas com incursões pela música popular, e mãe de Muti, já se apresentou em recitais e concertos por todo o Brasil, além da Europa, Estados Unidos, Japão e Israel. Especialista em Mozart e Villa-Lobos, Clara recentemente participou de duas faixas do primeiro disco solo de Marcelo Camelo (Los Hermanos). Para projetar suas imagens ora minimalistas, ora geométricas, ou mesmo detalhes da mão da pianista, Muti desenhou um anteparo de madeira volumétrico bastante original e disparou ao vivo de seu laptop precisas sincronizações das batidas musicais junto às suas imagens. www.muti.cx

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One of the pioneers in using the computer as a support for the visual arts, Muti Randolph divides his time between design projects and technological experimentation. Clara Sverner, a classical pianist with excursion into popular music, is Muti’s mother, and has already presented recitals and concerts all over Brazil, besides Europe, the U.S.A., Japan and Israel. A specialist in Mozart and Villa-Lobos, Clara recently participated in two of the tracks in Marcelo Camelo’s (Los Hermanos) first solo-album. In order to project his minimalist images, geometric images or even details of the pianist, Muti designed a bulkhead made out of wood, in a polyhedral form, giving the stage an original look, from which he delivers images from his laptop, precisely synchronized to the musical beats which shoot the images on screen.

Roteiro da apresentação 01 Heitor Villa-Lobos O polichinelo 02 Claude Debussy Feux d’artifice 03 Erick Satie Gymnopédie nº 1 04 Marcelo Camelo Saudade 05 Claude Debussy Clair de lune 06 Igor Stravinsky Tango 07 Anton Webern Variações para o piano Opus nº 27 08 Maurice Ravel Jeuxd’e au 09 Frederic Chopin Mazurca nº 13 10 Frederic Chopin Prelúdio nº 17 (em lá bemol maior) 11 Frederic Chopin Prelúdio nº 18 (em fá menor) 12 Frederic Chopin Estudo revolucionário

“Fora o caso da ópera, em apresentações de música erudita não há cenário nem luz cênica. Neste projeto, explora-se a possibilidade de tornar a experiência de um recital de piano visualmente mais estimulante. O programa percorre obras compostas entre a segunda metade do século 19 e a primeira do século 20, que vão do romântico ao atonal, mas sempre com alguma sugestão visual no tema ou na estrutura. Em termos de áudio, é um recital convencional, puramente acústico, sem qualquer sonorização ou intervenção elétrica. O microfone presente serve apenas para alimentar o sistema de sincronização dos vídeos.” “With the exception of the opera, in presentations of classical musical there is no scenario or scenic lights. In this project, we attempted to make the experience of a piano recital more visually stimulating. The program showcases works composed between mid-19th century and the first half of the 20th century, ranging from the romantic period to the atonal style, but always experimenting with some kind of visual suggestion in the theme or structure of the presentation. In musical terms, the recital is conventional, purely acoustic, without any kind of electronic sounds. The microphone installed on-stage serves only to feed the video projections which are synchronized to the music.”

Muti Randolph




Multi 03_2009 Cine Macalé 23 de Julho/ July 23th Jards Macalé voz, violão/ voice, acoustic guitar Samir Abujamra projeções/ projection Moana Mayall projeções/ projections Fernanda Felix produção/ production

“O conceito do Cine Macalé é usar a própria precariedade do arquivo do cinema 8mm (e a beleza que advém dessa precariedade), em uma improvável instalação multimídia onde dois projetores, um com seu inconfundível barulhinho, dialogam com a moderna tecnologia digital num mosaico repleto de simbolismos e emoções que são potencializadas pelo próprio meio em si – o Super-8 tremido, muitas vezes fora de foco e subexposto, em uma releitura contemporânea capitaneada de cima do palco por Macalé e seu inseparável violão.” Samir Abujamra Egocêntrico, bipolar e hipocondríaco (segundo ele mesmo no Twitter), Samir Abujamra trabalha com criações audiovisuais desde 1990, atuando nas áreas de cinema, vídeo, televisão e artes plásticas. Seu último trabalho é “O paraíba”, documentário em primeira pessoa que mostra a viagem solitária do diretor rumo à sua cidade natal. Autor de “Vapor barato” e “Movimento dos barcos”, parceiro principal de Waly Salomão, violonista e arranjador de Gal Costa e Caetano Veloso, ator e autor de trilhas de Nelson Pereira dos Santos, amigo pessoal de Lygia Clark e Hélio Oiticica, Jards Macalé é um dos personagens mais irreverentes e originais da música popular brasileira.

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“The purpose of Cine Macalé is to use the 8mm archive in an improbable multimedia installation where two projectors, with their unmistakable buzzing noise, converse with modern digital technology in a mosaic of symbols potentiated by the peculiar quality of the Super-8 films. Sometimes the camera is shaky, out of focus, or underexposed. All in all, it is a modern rendering of a cultural epoch gone by, and the scenario for Jards Macalé’s original voice and inseparable acoustic guitar.” Samir Abujamra An egocentric, bipolar and a hypochondriac (just as described himself on Twitter), Samir Abujamra works with the audiovisual arts since 1990. He has worked with film, videos, television and visual arts. His latest production, “The paraíba”, is documentary in which Samir narrates his solitary journey back to his home-state of Paraíba. Jards is the author of such compositions as “Vapor barato” and “Movimento dos barcos”. He was the poet, Waly Salomão’s most creative partner. He has played the guitar and been the musical arranger in projects with Gal Costa and Caetano Veloso, as well as actor and producer of the musical score of Nelson Pereira dos Santos’ films. A personal friend of artists such as Lygia Clark and Hélio Oiticica, Jards Macalé is one of the most irreverent and original voices in Brazilian popular music.




Multi 04_2009 Moo 03 de Setembro/ September 3rd Bruno Guinle criação e direção/ conception and direction Diogo Reis & Eduardo Christoph música e criação/ music and conception Marcos Kotlhar projeções/ projections Ivan LP edição & efeitos de áudio/ edition and sound effects Rodrigo Miravalles narração e vocoder/ narration and vocoder Camila Abud produção/ production PC & Tomás Ribas iluminação/ lightning PC Operador de Luz/ light operator Daniel Tenório, Loulou Chavarry e Lucieda Moreda assistentes de produção/ production assistant Alexandre Rabaço engenheiro de som/ sound engineer Party Busters registro fotográfico/ photos Breno Cunha registro em vídeo/ video

A música eletrônica atual no Rio de Janeiro tem nas festas da Moo uma importante referência. No início, em 2004, era semanal, hoje a Moo é um núcleo com 3 festas diferentes (Moo, Discoland e MooNãoMoo) que só em 2009 contabilizou oito eventos com cerca de dez mil pessoas e 12 atrações internacionais. Todo o cuidado estético as diferencia das demais festas e chama a atenção ao que vem sendo feito pelos produtores Bruno Guinle, Diogo Reis e Eduardo Christoph, os dois últimos também DJs. Convidada pelo Multiplicidade a descaracterizar a pista de dança, a Moo levou DJs e parte de sua equipe criativa para detrás de uma tela, deixando olhos e ouvidos unicamente atentos ao som e à visão de um robô de placas de LED, que, tal qual um mestre de cerimônias, se dirigia ao público em momentos-chave da performance com uma voz eletronicamente deformada. www.moo.com.br

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Current electronic music in Rio de Janeiro, such as the one’s presented at Moo are an important musical reference. In the beginning of 2004, the party at Moo was a once-a-week event. Today it forms a nucleus of three different events (Moo, Discoland and MooNãoMoo), which in 2009 organized a total of eight events with nearly ten thousand people and twelve international attractions. The aesthetic quality and preparation of the event distinguishes it from any other party in town, thanks to the interesting work being developed by producers Bruno Guinle, Diogo Reis and Eduardo Christoph, these last two, also DJ’s. Invited by Multiplicidade to reinvent the dance floor, Moo brought DJ’s and part of its creative staff to work behind a screen, leaving eyes and ears attentive to the sounds and visuals coming from a robot’s movements, installed by Led screens. Just a master of ceremony, the robot would move towards the public in key moments of the performance and speak with electronically deformed voice.



Multi 05_2009 Retrotech 24 de Setembro/ September 24th Carlos Trilha programações e sintetizadores / programming and synthesizers André Dessandes programações e sintetizadores / programming and synthesizers Alessandra Marfisa projeções /projections Binho Schaefer iluminação /lightning William Oliveira roadie Daniel Cheese técnico de som /sound technician

Retrotech é um concerto de música eletrônica criado e produzido pelo tecladista, produtor musical e engenheiro de som Carlos Trilha e que conta com o apoio do músico André Dessandes e da designer Alessandra Marfisa. Baseada em sintetizadores e baterias eletrônicas analógicas da década de 70 e início dos anos 80, a proposta do projeto é apresentar composições inéditas inspiradas nos precursores do estilo (Kraftwerk, Vangelis, Cabaret Voltaire, Depeche Mode). Assistir ao Retrotech é, ao mesmo tempo, visitar um museu da música eletrônica. Aqui não há nada pré-gravado, laptops ou softwares de áudio de última geração. A maioria dos equipamentos utilizados (e eles são muitos) não é fabricada há anos. Vários, inclusive, alcançam pequenas fortunas em leilões realizados na internet. O interesse arqueológico desses objetos eletrônicos é tão grande que a dupla Trilha e Dessandes está construindo um estúdio dedicado exclusivamente à produção de música eletrônica, o SYNTHCAMP. O Retrotech também conta com um set especial de projeção com imagens generativas sincronizadas através de softwares criados especialmente pela designer Alessandra Marfisa. www.retrote.ch

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Retrotech is an electronic music concert, created and produced by keyboardist, producer and sound engineer, Carlos Trilha, accompanied by André Dessandes and designer Alessandra Marfisa. Based on synthesizers and analogical electronic drums from the 1970’s and early 1980’s, their idea is to create music inspired by such precursors as Kraftwerk, Vangelis, Cabaret Voltaire and Depeche Mode. Watching Retrotech is like visiting a museum of electronic music. Nothing is pre-recorded: there are no laptops or hi-tech software used. Most of the equipment used (and they are many) are no longer fabricated. Many of these objects would be sold for a small fortune in auctions. The archeological interest of behind these instruments is so expressive that Trilha and Dessandes have decided to construct a studio specially dedicated to the production of electronic music, the SYNTHCAMP. The Retrotech concert includes a special set of projections using images which are synchronized to the music using software created by Alessandra Marfisa.

Sintetizadores utilizados 01 ARP 2600 02 ARP SEQUENCER 03 MINIMOOG 04 MEMORYMOOG 05 MOOG CONCERT MATE 06 MOOG OPUS 07 ROLAND SH-101 08 ROLAND SH-201 09 ROLAND D-50 10 ROLAND SYSTEM 100M 11 ROLAND ALPHA JUNO 1 12 ROLAND ALPHA JUNO 2 13 ROLAND JUNO 106 14 ROLAND JUNO 60 15 ROLAND RS 202 16 ROLAND JX-3P 17 ROLAND JUPITER 8 18 ROLAND TR 808 19 ROLAND TR 909 20 ROLAND TR 505 21 ROLAND VOCODER SVC-350 22 FENDER RHODES 23 KORG POLISIX 24 KORG MS-10 25 CLAVIA NORDLEAD






Multi 06_2009 Jam da Silva + OESTUDIO (participação especial/ special guest: Chico Neves) 29 de Outubro/ October 29th Jam da Silva voz, percussão e bateria /voice, percussion and drums Chico Neves baixo e programações /base and programming Marion piano Rhodes, escaleta, programações e voz /Rhodes piano, melodica, programming and voice Gustavo Corsi guitarra e voz /guitar and voice Garnizé percussão /percussion Nina Gaul concepção visual /visual effects Nobuyuki Ogata projeções /projections Peter Gaul projeções /projections

O trabalho do percussionista e compositor pernambucano Jam da Silva é uma mistura de artesanato com invenção, sensibilidade com ritmo. Parte de suas criações vem da rua. Sempre com um HD e um laptop, grava sons dos lugares por onde anda e incorpora essa biblioteca sonora em sua música, sejam ruídos, ambientações urbanas, falatórios ou o simples barulho dos carros. Jam é um estudante das texturas, sempre buscando novos timbres para pandeiros, cuícas, berimbaus e até mesmo para sua bateria, que funciona em harmonia com os espaços percussivos.

A composer and percussionist from the state of Pernambuco, Jam da Silva combines traditional sounds with inventiveness, sensibility and rhythm. Part of his compositions come from the street. Holding a HD camera and a Laptop, Jam records sounds from places he goes and incorporates them in his music. Be it just random street noise, conversations or cars driving by. Jam is a student of musical textures, always in search of new tones for his pandeiros, cuícas, berimbaus and even for his drum-set, which he harmonizes with other percussion instruments.

Desde 2001, a casa de criação OESTUDIO constrói soluções baseadas em arte, design, moda e web para seus clientes. Multidisciplinar, OESTUDIO é formado por sócios de diferentes áreas – designers, estilistas, diretores de filme e marketing.

The performance delivered by Jam and his troop for the Multiplicidade Festival included special guest, Chico Neves, the musical productor of Jam’s last solo album, the acclaimed “Dia santo” – considered one of the best albums in 2009 according to Gilles Peterson, a DJ who works for BBC. Jam has also participated in albums by such renowned artists like: O Rappa, Lenine, Skank, Paralamas do Sucesso, Los Hermanos, Arnaldo Antunes, among others. Chico recreated his studio onstage, down to the tiniest detail. Using large robust computers with Pro Tools, as well as small acoustic machines triggered by handles. The images projected in strong green tones, also used in the costumes worn onstage, reinforced the “nature-mankind” theme.

A performance produzida para o Multiplicidade contou com a participação especial de Chico Neves, produtor do último trabalho solo de Jam, o elogiado “Dia santo” – considerado um dos melhores de 2009 segundo o DJ da BBC Gilles Peterson –, além de discos para o Rappa, Lenine, Skank, Paralamas do Sucesso, Los Hermanos, Arnaldo Antunes, entre outros. Chico recriou seu estúdio no palco do Multiplicidade, nos mínimos detalhes, de computadores robustos com Pro Tools a maquininhas acústicas acionadas por manivelas. As imagens projetadas com uma forte gama cromática verde, também presente nos figurinos, reforçavam a temática homem-natureza. http://www.myspace.com/jamdasilva http://www.oestudio.com.br

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Since 2001, OESTUDIO constructs musical solutions using art, design, fashion and web, for its clients. Multidisciplinary by definition, OESTUDIO is formed by associates coming from different areas, such as: designers, stylists, film-directors and marketing experts.




Multi 07_2009 Arto Lindsay 26 de Novembro/ November 26th Arto Lindsay voz, guitarra/ voice, acoustic guitar Hubert Machnik efeitos/ effects Hiromi Konishi produção artística/ artistic production Alex Werner assistência de produção/ production assistant

Nascido nos Estados Unidos e criado no Brasil durante os anos da Tropicália, o multifacetado cantor, compositor, produtor e guitarrista Arto Lindsay é conhecido pelo seu pioneirismo junto às cenas noise de Nova York e suas referências vanguardistas em relação à música brasileira. Desde as primeiras gravações nos anos 70 até aos aclamados álbuns solo das recentes décadas, Arto Lindsay constrói passagens sonoras complexas, entre o pop e a desconstrução rítmica, a melodia envolvente e o ataque sônico. Considerado pela “TIME OUT” um dos 50 melhores músicos da História de Nova York, Arto Lindsay já colaborou com artistas do porte de David Byrne, Ryuichi Sakamoto, Laurie Anderson e Animal Collective. Como produtor, realizou importantes trabalhos para Marisa Monte, Caetano Veloso, Tom Zé, Vinicius Cantuária, Gal Costa e Carlinhos Brown. Arto com seu “I’ll bring the thunder” inaugurou o primeiro Multiplicidade sem imagens geradas eletronicamente, tudo isso para valorizar a escultura formada pelas caixas de som e a intensidade de sua sonoridade.

Arto Lindsay was born in the United States and raised in Brazil during the years of the Tropicalia movement. A multifaceted singer and songwriter, producer and guitarist, he is recognized for his originality and experimentation in the music scene of New York City. From his first recordings in the 1970’s, until the acclaimed solo albums of the recent decades, Arto Lindsay constructs complex sound organisms, between pop and rhythmic deconstruction; involving melodies and sonic attacks. Considered by “TIME OUT” as on the 50 greatest musicians in the history of New York, Arto has collaborated with David Byrne, Ryuichi Sakamoto, Laurie Anderson and Animal Collective. As a producer, he did albums by Marisa Monte, Caetano Veloso, Tom Zé, Vinicius Cantuária, Gal Costa and Carlinhos Brown. Arto with his “I’ll bring the thunder” inaugurated the first Multiplicidade concert with no electronically generated images. The idea was to privilege the sculptural quality of the sound speakers and the intensity of the music.

“TRAREI OS TROVÕES” “Os monitores de palco são caixas de som voltadas para o músico a fim de que ele se ouça em meio ao barulho geral do show. Jogam a voz na cara do cantor e a batida no ouvido do baterista. Hoje em dia, estão sendo substituídos por leves fones de ouvido, mas, enquanto resistirem, cumprem seu papel de espelho sonoro com eficiência. Adotei estes monitores porque, além de sua beleza física, nos trazem múltiplas metáforas e o puro prazer do avesso. Coloco os monitores em fila, e eles andam por entre o público. Uso eles para falar para fora e não para dentro do palco. Penetram no público e reconhecem no auditório um palco-irmão. IBTT ou TOT foi apresentado pela primeira vez, em 2005, na Salle Duffy no Musée d’Art Moderne de la Ville de Paris. Esta bela sala oval tem as paredes inteiramente cobertas com ‘La Fée Électricité’, uma pintura de Raoul Dufy, de 1937, que homenageia a eletricidade retratando seus principais pioneiros de uso. Foi financiada pela Companhia Nacional de Eletricidade, a Électricité de France. Com Peter Zuspan, desenvolvi um software simples que me permite controlar o som dos monitores. Neste show no Rio de Janeiro dentro do Festival Multiplicidade, contarei com a ajuda técnica de Hubert Machnik. A música oferecida por este sistema será uma mistura de canções minhas com as de outros autores escolhidos para a ocasião.” “I’LL BRING THE THUNDER” “The monitors resemble large speakers faced to the stage, installed there so that the musician can hear himself in the midst general noise of the concert. The voice is hammered into the singers ears, just as the sound of the drums flood into the drummers’ ears. Nowadays, these are being substituted by comfortable earphones, but while they are still around, will work just fine as an efficient musical mirror. I began using these monitors because besides the beauty they are, they also present a number of interesting metaphors and just the pure pleasure of being awkward. I place in the monitors in line and they walk between the public. I use them to communicate to what is beyond the stage – not the contrary. They penetrate the public and recognize in them a fraternal setting. IBTT or TOT was first exhibited in 2005, at Salle Duffy, in the Musée d’Art Moderne de la Ville de Paris. The beautiful oval room has walls entirely covered with ‘La Fée Électricité’, a painting by Raoul Dufy, from 1937, which pays homage to electricity portraying the pioneers who first used it. It was finance by the National Electricity Company, the Électricité de France. Along with Peter Zuspan, I developed a simple software that allows me to control the sound of the monitors. In this show for the Multiplicidade festival, in Rio de Janeiro, I was received technical assistance from Hubert Machnik. The music offered by this system is a unique mix of my own songs and that of other artists especially chosen for the occasion” Arto Lindsay

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FRAGMENTO/ PIECE #01 Arnaldo Antunes, poeta, músico, artista multimídia www.arnaldoantunes.com.br Poet, musician, multimedia artist



FRAGMENTO/ PIECE #02 SELEÇÃO DE TRECHOS RETIRADOS DO LIVRO ARTE E MÍDIA, COLEÇÃO ARTE + JORGE ZAHAR EDITOR 2007 MACHADO, Arlindo. “Arte e mídia”. RJ: Jorge Zahar Editor, 2007 — …. O computador carrega, portanto, essa contradição de aparecer como uma mídia única, sintetizadora de todas as demais, e, ao mesmo tempo, um híbrido, onde cada um dos meios (texto, foto, vídeo, gráfico, música) pode ser tratado e experimentado separadamente. …. Vale recordar que Ítalo Calvino, em suas “Seis propostas para o próximo milênio”, reconhecia, dentre as principais características da arte que deveria marcar a virada do milênio, a multiplicidade. Ela é definida por Calvino como um conjunto de “redes de conexões entre os fatos, entre as pessoas, entre as coisas do mundo”. Se for possível reduzir a uma palavra o projeto estético e semiótico que está pressuposto em grande parte da produção audiovisual mais recente, podemos dizer que se trata de uma procura sem tréguas dessa multiplicidade que exprime o modo de conhecimento do homem contemporâneo. O mundo é visto e representado como uma trama de relações de uma complexidade inextricável, em que cada instante está marcado pela presença simultânea de elementos os mais heterogêneos, e tudo isso ocorre num movimento vertiginoso, que torna mutantes e escorregadios todos os eventos, todos os contextos, todas as operações. …. A técnica mais utilizada consiste em abrir “janelas” dentro do quadro para nelas invocar novas imagens, de modo a tornar a tela um espaço híbrido de múltiplas imagens, múltiplas vozes e múltiplos textos. Essa espécie de escritura múltipla, em que texto, vozes, ruídos e imagens simultâneas se combinam e se entrechocam para compor um tecido de rara complexidade, constitui a própria evidência estrutural daquilo que modernamente nós convencionamos chamar de uma estética da saturação, do excesso (a máxima concentração de informação num mínimo de espaço-tempo) e também da instabilidade (ausência quase absoluta de qualquer integridade estrutural ou de qualquer sistematização temática ou estilística). Trata-se, numa palavra, de superpor tudo (texto, imagens, sons)…

A multiplicidade nos coloca cara a cara com o que se convencionou chamar de segundo barroco ou neobarroco, tendência geral da arte e dos meios contemporâneos caracterizada pela recusa das formas unitárias ou sistemáticas e pela aceitação deliberada da pluridimensionalidade, da instabilidade e da mutabilidade como categorias produtivas no universo da cultura. … E uma vez que agora os novos processos imagéticos despejam seu fluxo de imagens e sons de forma simultânea, isso exige, da parte do receptor, reflexos rápidos para captar todas (ou parte delas) as conexões formuladas, numa velocidade que pode mesmo parecer estonteante a um “leitor” mais conservador, não familiarizado com as formas expressivas da contemporaneidade. —

Selection of excerpts from, Art and Media, by Arlindo Machado. .... The computer carries the inevitable contradiction of being a single media device, while managing to synthesize all of the rest. It is a hybrid platform in which every form of media (text, photo, video, design, music) can be experimented and treated separately. …. It is worth remembering what Italo Calvino remarked in his Six Proposal for the next Millennium about the prospects of artistic production at the turn of the century. He thought it would be defined by a combination of “networks connecting people and facts and everything else in the world”. If one could summarize in a single word what aesthetic and semiotic premises stand out in the most recent audiovisual production it would be the multiple and creative use of different media. That is what stands out the most in the mind of contemporary artists. The world is seen and represented as a network of relations which are inextricably connected. Each instant is marked by the simultaneous presence of an enormity of heterogeneous elements. All of this takes place in a vertiginous and destabilizing velocity. The technique used to integrate these media consists in opening windows or pathways in which these different tools interact. These pathways create a hybrid space where images and texts interplay. This kind of multiple authorship in which these objects interconnect – text, voices, noise and a plethora of images – creates a thread of rare complexity. It is the proof of the structure that we have come to know as the aesthetic of saturation. It is the aesthetic of excess (the maximum concentration of information in the minimum amount of time, travelling across the globe). It also generates instability (the almost absolute absence of structural coherence or of a thematic and stylistic system). In short, it is the tendency of superposing everything (texts, images, sounds)… The plethora of information and media platforms has made come to grip with what academics have called a second baroque, or neo-baroque, which is the general tendency how art is being produced today. The method now used seems to reject all formal concerns, deliberately accepting the plural dimensions, unstable boundaries and mutable categories of trans-cultural reality. … These new processes of exchanging information through images and sounds instantaneously have nearly overtaken traditional channels of expression and learning. The receptor is urged to hone his/her reflexes in order to capture all (or part of) the plethora of information. The speed in which all of this is processed may leave the more conventional “reader” dumbfounded.


FRAGMENTO/ PIECE #03 DOCUMENTÁRIO E SUBJETIVIDADE UMA RUA DE MÃO DUPLA Por Cao Guimarães, cineasta e artista plástico www.caoguimaraes.com — I “Não é o escultor que esculpe a escultura, é a escultura que esculpe o escultor!” Existe nesta frase de Merleau Ponty algo que fica no meio, como um canteiro entre duas avenidas. Chacoalha-se uma frase como chacoalha-se uma vida. Uma inversão entre sujeito e predicado, entre sujeito e objeto que pode nos ajudar a entender um pouco a relação entre arte e vida, realidade e percepção, olhar e deixar-se olhar, entregar e receber. Poderíamos da mesma forma dizer: não é o cineasta que faz o filme, mas o filme que faz o cineasta. Ao fazer um filme algo está nos fazendo, e algo está se fazendo para além de nosso fazer. O filme se faz e com ele me faço. Se o meu assunto é a realidade, não estou isento dela, e nem ela está isenta de mim. Neste exercício da reciprocidade, da generosidade da entrega, vários graus de subjetividade estão interagindo entre si. A questão não é objetivar o olhar diante da realidade, mas mesclar sua subjetividade com a subjetividade do outro. Às vezes esvaziando– se no sentido zen-budista do termo, às vezes potencializando o seu ‘eu’ até o total transbordamento. Não existem regras definitivas, tudo funciona como uma espécie de pacto fundamentado na cumplicidade recíproca. A percepção dos acontecimentos reais sempre estará intimamente relacionada ao imaginário. Nenhum olhar é isento de si ao olhar para fora. Vejo e, ao ver, também me vejo. Vendo-me inserido nisso ou naquilo, aquilo inserido em mim, a coisa se forma, um algo mais, o inesperado. Imagino, ajo na direção do que imagino, depois salto para o lado de lá, para o lugar do desconhecido, que é muitas vezes mais forte e intenso do que o que antes eu imaginava. O cinema do real é a arte deste encontro, um encontro com o que você imagina e no entanto revela-se de outra forma. Nessa revelação, nesse susto, somos convocados diante de um espelho que lhe mostra um outro rosto. Qualquer realidade é a extensão de você mesmo, e você, a extensão da realidade. Olhar o mundo através de um aparelho ótico, enquadrar a realidade,

já possui em si uma dimensão subjetiva muito forte. É impossível destituir o documentário da subjetividade. É ontologicamente impossível. Ao planejar um filme, ao escolher um assunto, você de uma certa forma começa um processo de múltiplos recortes, do macro ao micro, do todo às partes. Você objetiviza um espaço real, prepara a cama onde seu olhar vai poder se deitar. Encontrar um lugar para se permitir estar perdido. Potencializar um descontrole necessário. Este movimento dialético entre o que vem de dentro e o que vem de fora gera um espaço entre, onde o filme habita. O importante é não perder este lugar de vista; lugar que é na verdade um fluxo onde as coisas se embaralham, esvaziam-se de si e revelam-se outras por algum momento. Este lugar é o lugar da câmera ligada diante de alguém ou alguma coisa. Este lugar é um momento, um dos muitos momentos mágicos do processo cinematográfico. “Antes de estudar Zen, um homem é um homem, uma montanha é uma montanha. Ao estudar Zen, um homem é uma montanha, e uma montanha é um homem. Depois de estudar Zen, um homem é um homem, uma montanha é uma montanha. Só que voce está com os pés um pouco fora do chão.” Este pensamento de Dr. Suzuki, via John Cage, retrata bem o processo da feitura de um filme que lida com o real. Ao pensar num objeto de um filme, ao imaginar o universo de um determinado assunto, falsas certezas pululam em seu imaginário, você se sente um Deus criando um determinado mundo. Ao ir de encontro ao objeto de seu filme, ao acionar o botão do descontrole, todas as coisas se transformam, suas certezas evanescem, você troca o lugar deificado de um mundo imaginário pela crueza da realidade diante de seus olhos. Você volta a brincar de Deus associando imagens e sons uns com os outros e esculpindo o tempo e o ritmo de seu filme na edição. Fundamental lugar

do reencontro, onde o homem volta a ser homem, e a montanha, montanha. Olhar as coisas por uma segunda vez, realinhar o caos, reinventar o mundo através da imagem e não apenas do imaginário. Finalmente, na sala de cinema, todos flutuam com os pés um pouco acima do chão. A realidade é uma coisa híbrida, multifacetada pela incidência de olhares diversos, espelho sem fundo de um homem, uma cultura, um país. Se a pensarmos como esta lâmina reflexiva, que nos reflete e nos faz pensar, se a compararmos à superfície de um lago, podemos nos relacionar com ela de pelo menos 3 maneiras: podemos ficar sentados no barranco contemplando sua superfície (e acho que a pele das coisas é um universo imenso que revela muito do que no fundo se esconde). Existe aí a possibilidade de um distanciamento, uma relação filtrada por um olhar distante, um olhar passante, algo que incide e elege, no momento mesmo do encontro entre a imagem que é dada e os olhos que a percebem. Uma atitude, uma opção de posicionamento, como num campo de batalha, como a posição dos rifles em uma emboscada num faroeste americano, como as cenas iniciais de “F for Fake” de Orson Welles – a câmera distante acompanha uma bela mulher que caminha pela rua sendo devorada pelos olhares desavergonhados dos homens pelos quais ela passa. - Podemos, ainda sentados no barranco ou em pé na margem do lago, lançar uma pedra na água para vê-la reverberar, gerar um movimento tectônico em sua superfície, embaralhar seus elementos, desorganizar o aparentemente organizado. Esta pedra enquanto um conceito, um dispositivo, uma proposição. Os trabalhos oriundos deste método são fundamentados no princípio de ação e reação. Uma proposição qualquer aciona um movimento que produz uma reação. São trabalhos que jogam com a noção do esvaziamento da autoria, ou, pelo menos, nutrem o desejo do compartilhamento desta. Um jogo não se joga sozinho, jogos são também fundamentados em uma ação que espera uma reação. - E finalmente

podemos lançar nós mesmos neste lago. Afundarmos inteiro nestas misteriosas águas e, de dentro, abrir os olhos e ver o que acontece. Esta atitude imersiva reflete um desejo de entrega e investigação, uma propensão ao embate, à mescla, a vivenciar um pouco mais de perto o que se esconde dentro do espelho, no fundo das águas, encarar o peixe nos olhos, deixar-se levar pela correnteza ou hipnotizar-se com a calmaria do lago. Portanto, existe o lago e existe você. E no meio disso, na margem disso, ronronares de sapos dissonantes, ballet da vegetação ao vento, metamorfoses de peixes em luz, bolhas de ar atravessando a água. Tudo participa e autoriza esta experiência. Tudo estimula, seduz, desorganiza, afeta sua percepção. Pois no espaço real uma folha que cai é tão expressiva quanto o vestido de Marilyn Monroe que voa, e a sonoridade de um deserto, tão intensa quanto uma cantora lírica no palco. II Um helicóptero sobrevoa uma favela lançando um facho de luz sobre seus casebres. Da pracinha um homem observa o belo movimento circular do helicóptero e o facho de luz cortando a noite escura. Eu observo o homem da pracinha observando o helicóptero. Alguém com um binóculo pode estar me observando observar o homem da pracinha observando o helicóptero. Enquanto observo o homem da pracinha observando o helicóptero, imagino o que ele está vendo e imagino também o que o piloto ou o foquista da luz estão vendo lá de cima. De repente alguém grita no meio da favela. Movo meus olhos na direção do grito, por instinto, por curiosidade. Vejo apenas o facho de luz percorrendo os casebres apagados. O grito se cala, o helicóptero se vai, o homem da pracinha deita na grama e fecha os olhos. Uma rede de imagens se construiu em minha memória. O que realmente vi e o que imaginei ter visto? O que realmente aconteceu e o que eu imaginei ter acontecido? Nesta dúvida alguma coisa existe. O homem da pracinha faz seu filme em sua memória, eu faço o meu, da mesma forma o piloto, o foquista e a pessoa do binóculo. Existem diferentes filmes em cada um de nós para uma mesma realidade. Nisso consiste a beleza e a magia de lidar com a realidade. Ela nos faz pairar para além de nossas certezas e nos reinventarmos sempre diante das inúmeras possibilidades que se apresentam.

Somos todos espectadores privilegiados de inúmeros filmes que a realidade nos oferece. E felizmente nunca vemos a mesma coisa do mesmo jeito. Da mesma forma nunca saímos de uma sala de cinema com a mesma impressão de um filme que a pessoa ao lado. Pois arte não é ciência, e os DNAs e os vetores de uma obra de arte são fundamentados na imprevisibilidade. A centopeia que habita sua cabeça ao sair de uma sala de cinema não tem necessariamente cem patinhas. Tão pouco será a mesma centopeia que existiu um dia na cabeça do diretor quando imaginou o filme. Ter a coragem de se entregar, saltar do plano deificado da imaginação para o plano real da imagem em ação, recodificar o transe e perceber o milagre da multiplicação dos sentidos no que se encontra para além de sua pessoa. É necessário, de quando em vez, assassinar o sujeito para que a subjetividade exista. Pois é no lodo abissal de nossa existência que o sujeito real se move. Este ser inominável que está dentro de nós, do qual sabemos tão pouco – é este o outro rosto que se revela do outro lado do espelho quando nos propomos a encarar de frente a realidade. Publicado no livro “Doc: expressão e transformação”. Itaú Cultural, 2007. —

THE DOCUMENTARY AND SUBJECTIVITY A TWO-WAY ROAD By Cao Guimarães, filmmaker and artist “It is not the sculptor who sculpts the sculpture, but the sculpture that sculpts the sculptor!” There is something about this phrase of Merleau Ponty’s that does not budge – that seems to stand like a gantry in between two avenues. One can squeeze or shake a phrase as one does life itself. A simple inversion of subject and predicate, between the subject and the object can shed light on the relationship between art and life, reality and perception, sight and being seen, giving and taking. We could just as well say that the filmmaker is not the one who makes the films but the film makes the filmmaker. As one makes a film there is something being produced beyond the act of filming. The movie is being made as I am made with it. If the topic at hand is reality, then I cannot exempt myself from it. In this exercise of reciprocity and giving, many levels of subjectivity are involved. The question is not about objectifying one’s look upon reality, but combining one’s personal subjectivity with that of the “other”. Sometimes it means emptying oneself, in the Buddhist sense of the word; at others it means potentiating oneself until the inner-self overflows. There are no definite rules: everything works as a kind fundamental pact of mutual reciprocity. The perception of reality is always intimately tied to the imaginary. It is impossible to perceive an object from a neutral standpoint. I am part of what I see. As try to notice myself inserted somewhere, I might as well realize that that which I am perceiving is equally inserted in me. In other words: as I perceive I am transforming reality according to my needs – this sequence of events creates the unexpected. I imagine something – hence I act according to what I imagine. The leap to the other side is what leads to the unknown, which is more times than not, much more powerful than what I expected. Movies reveal precisely what I am trying to say: reveling in a film is always a surprise and many times, a revelation. In this revelation, in this surprise, we are called to stare upon a mirror with someone else’s face stamped on it. Any reality is the extension of one’s own being, and vice versa. To look at the world through an optical device is to try to enframe it. The subjective pull involved in this is tremendous. Therefore, it is impossible to destroy the gravitational pull of the subjective as it documents every step of the artists’ creation. One might even say that it is ontologically impossible. As one plans a film and chooses a topic, one initiates a process of multiple stages. The decisions involved range from the tiniest detail all the way to the big picture. One must objectify the spatial reality that will be used, in order to prepare the terrain for the act of filming itself. One must find just the right place; a place where one can lose sight of oneself. Potentiating the lack of control over what is being made is at times necessary. This dialectical moment that combines what is controlled and preconceived with what is generated from the outside, from the loss of control, is the territory which the movie inhabits. The important thing is to not lose sight of the place one wants to reach. A place which is, in truth, a point of flux, where elements intertwine, empty themselves into each other and reveal themselves to be other than what was supposed. This is the place where the camera makes the rounds. It is one of the many wondrous moments involved in making a film.


“ Before studying Zen Buddhism, a man is merely a man; a mountain is no more than a mountain. As one studies the Zen, a man is like the mountain, and a mountain is like man. After studying the Zen, a man is a man, a mountain is a mountain, but your feet are slightly off the ground.” The quotation above is from Dr. Suzuki, as cited by John Cage. It can be interpreted as a metaphor of what making film is about. As one imagines the project of a film, imagines the universe of a given subject, many false hopes leap forth in the artists’ mind, attributing the filmmaker with a sense of Godliness. As one begins making a film and turns the camera on, everything is transformed, certainties vanish, and the deified world of the imagination is unmasked by the cruelty of reality as it is. The filmmaker plays God as he/she pastes images to sounds, sculpts time and rhythm to a single edited body. A profound moment that can be compared to the Zen quotation as representing man returning to himself, changed by the teachings of the Buddha. A moment of contemplation, a second look at things, in an attempt to organize the chaos and reinvent existence through images and no longer only in the imagination. Finally, when all are summoned to the first film screening, there is a common sensation of floating a few millimeters above the ground. Reality beckons as a hybrid, multifaceted creature, object of such diverse perspectives, a kind of mirror into the bottomless pit of existence or of an entire culture or country. One might compare the feeling to a kind of fine, reflexive blade, which reflects our own image and makes us think. In comparing it to the surface of a lake, one can relate to it in at least three different ways: -we can remain seated on a bank, contemplating the surface (the surface of things can be a universe in itself and reveal a great deal about what is hidden beneath). Then we can attempt to distance ourselves to filter the image as we absorb almost with a distracted look, or passing gaze, which randomly elects a specific detail to focus as one perceives the object. The act of observing is an attitude, a strategic option. It is like positioning one’s army in an ambush, as in those old Western flicks, or as in opening scenes of Orson Welles’, F for Fake – with a distant camera following a beautiful woman as she walks down a street, while she is devoured by the libidinous eyes of the spectators. -we can choose another path, whether we are seated or standing up on that same bank, as we contemplate the surface of the lake, watching ripples form and reverberate across the liquid space, while we toss another stone into the water. The object we throw represents the dynamo of intervention. It can be a concept, a device or proposition. Whatever idea or proposition which has the power of moving an otherwise motionless surface. The stone metaphor is useful to understand the notion of how truly pointless the concept of authorship can be. One movement will generate another in a chain reaction. The object which first intervened (the stone) disappears, as it gives life to new propositions. A game cannot be played by oneself: it presupposes the next, a reaction, or chain of events. - And finally we can throw ourselves into the same silent lake. Sink deep in the mysterious waters, until we emerge, with eyes-wide open, to see what has happened. The immersion into the object reflects a desire to give oneself entirely to the task. It reveals an anxiety to revel

in the object, to find out what is hidden beneath the deep waters, to stare the fish in the eyes, and let oneself be carried away by the drifting waters, or just be still to contemplate the silence of the lake. In other words, there is the lake and then there is you. In between these two, at margins, we can hear the dissonant murmurs frogs, or the familiar ballet of the wind rustling in the trees, the fish alight in the water, as bubbles slowly ascend to the surface. Everything participates in the experience – stimulating, seducing, disorganizing – your perception. A leaf floating in the air can be equally poetic as Marilyn Monroe’s dress blowing in the wind, or as intense and expressive as a tenor singing on a stage. II A helicopter flies over a shanty-town, casting light on the houses. From a bench in a square, a man observes the circular movement of the helicopter lighting up the rooftops in the town. I observe the man watching the helicopter. Someone else with a binocular might as well be observing me as I observe this other man observing the helicopter in the square. As I observe this man I imagine that what he is seeing and imagine what the man in the helicopter is seeing. Suddenly, someone screams from a room somewhere in the shantytown. I move my eyes in the same direction, trying to figure out where it came from. But all I can see is the light drifting along the houses. The scream gives way to a shrill silence, as the helicopter disappears and the man sitting in the square lays down on the grass and closes his eyes. A network of images cross my mind; images I have been tying together all along. What did I really see or was I just imagining things? The doubt I feel is revealing. The man in the square has served himself of what he saw and made his own memory of it. I do the same, just as the pilot has done, and the other unknown observe with his binoculars has done. Each one of us can offer a unique version, or film, of what we have seen. That is precisely the beauty and magic of dealing with reality. The possibility of transforming it according to our own inventions, beyond any preconceived notions, is what renders these possibilities innumerable. We are all privileged spectators in the infinite library of films that reality so generously offers to each and every one of us. Fortunately, each one of us perceives objects in a personal, authentic way. The same can be said about leaving the cinema after watching a movie: one will never leave the theatre with the exact same understanding of the movie is one’s neighbor did. This is so because art in not a science. The DNA of a work of art made up of unpredictable matter. The centipede that inhabits your head as you exit a movie theatre does not necessarily have 100 legs. Neither will it be the same insect the filmmaker had in mind when he first imagined the film. Having the courage to give entirely to the task, to leap from the deified plain of the imagination to the real, sometime crude plain of reality and actions, is like recoding a vision into intelligible reality and perceiving the miracle of meaning which resides beyond one’s petty intentions. For it is only faced with abyss of existence that an individual comes closer to meaning. This unnamable being inside us, of whom we only know so well, is the other face that is revealed to us in the mirror when we force ourselves to face reality.

Andarilho (2006) Filme de/ Film by Cao Guimarães


FRAGMENTO/ PIECE #04 ENTREVISTA COM ARTO LINDSAY Hermano Vianna, antropólogo Texto integral da entrevista publicada na revista Qualis, número 12, 1993 — H - Em 1985, na época do lançamento do primeiro disco dos Ambitious Lovers, “Envy”, você disse para o jornal inglês “New Musical Express” que “existe algo errado quando o QI de sua plateia excede em muito o QI médio da cidade onde você está tocando”. Hoje, oito anos depois, como você avalia o QI de seu público? A - Eu acho que - infelizmente - o QI do meu público é mais alto ainda. (Risos) Mas, como ando produzindo discos de gente famosa, eu fico famoso por ser amigo das pessoas famosas. Isso de um lado é ridículo, mas de outro é bacana, porque eu reconheço que um dos meus fortes é a colaboração. A criação individual é uma ideia muito poderosa, e todo o sistema do mercado é voltado para o indivíduo. Mas a criação em grupo traz muitas novidades, é necessária, o mundo precisa dela. H - Os Ambitious Lovers sinalizavam para uma mudança em sua carreira, da arte “de confronto” da época da banda DNA, cuja música foi rotulada como “noise” ou barulho, para uma atitude mais pop. Por que você quis fazer isso? E por que você ainda não é um ídolo de massas? A - Eu quis mexer com a massa. Sempre gostei de música pop. Mas não sei se tive bastante vontade de ser um ídolo de massa. Queria trazer o confronto pra dentro desse meio. Você pode ver que eu acabei fazendo uma coisa bem pop. Uma geração nova acabou fazendo algo parecido com a minha música antiga, do DNA, transformada em pop. Mas a semelhança só vai até certo ponto. O Nirvana, por exemplo, é um Beatles vestido de zoeira. O que a gente fazia era bem mais sofisticado do que isso. A técnica era mais primitiva, mas a ambição artística era muito maior. H - Mas existia a possibilidade de você fazer o que o Sonic Youth fez, de domesticar o noise, transformando-o em algo mais pop. Por que você optou por outro caminho? A - Eu fiz aquilo e passei para outra coisa. Eu preferi, em vez de domesticar aquela coisa crua, deixar tudo como estava. Fica em disco, fica como influência.

H - Mas a sua escolha tinha a ver com o Brasil. Com uma tradição da música brasileira que privilegia harmonias sofisticadas... A - É verdade. Quando acabei o DNA, peguei os discos do Noel Rosa, Cartola, e fiquei cantando aquilo sozinho em casa. Foi assim que comecei a cantar melodias. É uma coisa engraçada. A ambição das pessoas que amam sua arte não é ser O Artista, como parece de fora. Na verdade você quer ser um dos artistas, você quer participar de alguma coisa. No caso da música noise, tão importante quanto o punk foi a “performance art” primitiva, Vito Accunci, Chris Burden, coisas bem extremas. Também estávamos descobrindo, cada um por si, Dada, Artaud, William Burroughs, que eram coisas que você tinha que ir atrás, não se aprendia no colégio. Eu nunca tinha ouvido nada parecido com o que eu faço, mas sabia que aquilo tinha que existir, alguma coisa como uma guitarra free jazz. H - Mas como é que um garoto como você, criado em Garanhuns, no interior de Pernambuco, conseguiu se enturmar com que existia de mais extremo ou “de confronto” na arte de Nova York? A - A formação brasileira me deu várias coisas. Eu sabia que a cultura era uma coisa mutável. Aprendi que os hábitos e as maneiras das pessoas são coisas arbitrárias. Desde menino eu sempre vivi em mundos diferentes, isso me deu muita liberdade mental. Eu me sentia tão em casa aqui como lá. Eu não me sinto estrangeiro em lugar nenhum e me sinto estrangeiro em todos os lugares. Mas não é uma coisa romântica. Sempre foi assim. H - Eu li recentemente algumas declarações de escritores com Carlos Fuentes e Mário Vargas Llosa falando que essa situação da América Latina, de estar entre várias culturas e de ser mestiça, é o futuro do mundo. Você acha que o seu modo de vida é também o futuro? A - Claro que eu acho (risos). Sei que alguns amigos vão ficar horrorizados ao ler isso.

H - O mundo vai ser melhor assim? A - Bem melhor. Não sei, a questão é interessante, mas agora a gente só pode ser superficial ao tratar dela. Eu acho que o mundo caminha para essa mestiçagem, com certeza. A gente não entende ainda que formas isso vai tomar. E tem o outro lado: se você olha para a História, aquilo que você vê como original também é produto da mestiçagem. Por exemplo, olhando para a cultura japonesa, parece que aquilo é uma coisa sólida, um objeto. Mas o Japão misturou influências coreanas, chinesas. Nada é original. Quando ficar todo mundo se comunicando, esse processo só vai se acelerar. H - Nessa situação existe a possibilidade de escolher entre dois caminhos. Você já falou que esses são dois métodos usados em suas composições: um seria a fusão, o mestiço, o outro seria a colagem, colocar coisas diferentes uma do lado da outra. Qual é o método mais interessante? A - Hoje em dia eu acho a colagem mais interessante. Uma palavra melhor é justaposição. A justaposição é mais interessante que a superposição. Talvez por ser o caminho menos explorado. É mais difícil. O John Zorn tenta fazer essa coisa, mas fica ainda sem sentido. Ele se justifica, como eu me justifico, falando do espaço entre um elemento e outro como sendo o que é interessante. O não expresso, o não explicitado é o que vale. Quando eu coloco dois termos juntos, eu não vejo um terceiro termo que seja a síntese, mas eu vejo uma multiplicidade de possíveis relações. Amigos, inimigos, masculino, feminino, um é resultado do outro, todas as possíveis relações entre os elementos. Conseguir direcionar um pouquinho isso é o que realmente me excita. H - O que é que você acha que artistas como Caetano e Gal esperam de você ao chama-lo para produzir um disco? A - Eu não sei. Eu já achei várias coisas. Acho que eu sou um bom produtor. Eu sei dar ao artista aquilo que ele precisa para fazer melhor aquilo que pode fazer. Eu sei estruturar a situação


para ele. Eu sei lhe dar as ferramentas. Eu tenho também uma visão de fora do seu trabalho. Talvez seja isso, não tenho ideia. H - Mas a personalidade do produtor não deve interferir no trabalho? A - Tem que interferir. Por exemplo: a pessoa quer fazer alguma coisa; se você se opor a ela, ela tem que ter certeza que quer aquilo, tem que procurar as razões. Mas é claro que também quero algumas coisas e não posso deixar de querer. Isso faz parte. No dia a dia do trabalho, eu não posso deixar de ser uma pessoa com desejos e opiniões. Tenho muitos. Mas também eu quero que a pessoa me surpreenda, eu quero que ela me faça gostar ainda mais da sua música. H - Ao lado do trabalho de produtor, você tem desenvolvido uma relação cada vez mais intensa com o teatro, participando de peças de Heiner Muller na Alemanha ou fazendo a trilha do novo espetáculo de Gerald Thomas no Brasil. Como isso começou? A - Eu vi pouquíssimo teatro na minha vida. Mas, antes de montar o DNA, eu me interessei muito pelo teatro do Richard Foreman em Nova York. Na faculdade, onde eu aprendi mais foi participando de um grupo de teatro, que fazia coisas bem abstratas, como uma peça sem nenhum gesto humano. Minha música acabou ficando bem teatral. H - Você também compõe trilhas sonoras para grupos de dança. O último trabalho foi para Amanda Miller, coreógrafa do Balé de Frankfurt. Como surgiu a ideia dessa colaboração? A - O trabalho foi encomendado pelo Balé Gulbenkian, que é português, e a Amanda me sugeriu fazer uma trilha com muito texto baseada em Fernando Pessoa. Eu gravei a música usando basicamente três baterias. Foi muito legal. Os bateristas nunca tocam juntos. Os caras deliraram no estúdio tocando uns com os outros. Eu dei ideias e regi. Deixei eles tocarem e depois editei o que foi gravado. H - Você sempre teve muitos amigos artistas plásticos, como Jean Michel Basquiat e Julian Schnabel. Você vê alguma possibilidade de uma colaboração entre música e artes plásticas? A - Claro. Eu vou fazer agora um trabalho com Richard Prince, que, depois daquelas apropriações de fotografias de

publicidade, tem feito quadros com piadas escritas. Ele quer fazer um disco de piadas, e eu vou fazer a parte musical. H - Todos esses seus interesses ecléticos estavam representados na seleção que você fez para o Festival de Munique do ano passado. Qual era mesmo a sua escalação? A - O pessoal de Munique convidou alguns compositores para fazer a programação de cada dia: Philip Glass, John Zorn, Ornette Coleman, John Cale and myself. Eu levei Roland Topor, que é um cineasta e cartunista francês. Chamei um grupo da Sérvia, só de sopros. O Vito Accunci mandou uma fita e slides. Convidei Babes in Toyland, que é uma banda neopunk, três meninas, genial, tudo do que eu gosto. Convidei Amanda Miller, que dançou entre Babes in Toyland e minha banda, com Marisa Monte como convidada especial. E no final da noite ainda tinha os DJs e os travestis do Jackie Sixty, meu clube noturno preferido de Nova York. H - Pra terminar: qual é a principal diferença entre os Estados Unidos e o Brasil? A - Lá, água de coco é enlatada. H - E a semelhança? A - A cultura dos dois países é a mistura do africano com o europeu. Todo mundo está começando a valorizar isso agora. Eu detesto quando as pessoas dizem que aqui no Brasil nada funciona. Sempre achando que lá é melhor. A gente precisa ver as possibilidades únicas daqui. Sempre dei a maior força para fazer com que os americanos vejam que o Brasil é um país moderno, que faz parte do mundo atual. Eu luto lá fora contra a visão exótica do Brasil. Sempre falo de Hélio Oiticica, Nelson Rodrigues e Caetano Veloso como sendo grandes artistas, comparáveis a qualquer um no mundo inteiro, que deveriam fazer parte do diálogo internacional, que têm coisas inovadoras, importantes para oferecer para todo mundo. —

INTERVIEW WITH ARTO LINDSAY Hermano Vianna, Antrophologist H - In 1985, when your former band, Ambitious Lovers, released their first album, “Envy”, you said in an interview to the New Musical Express, that “there was something wrong when the IQ of your audience exceeded the average IQ of the town where you’re playing at”. Today, eight years down the road, how do you evaluate the IQ of your public? A - Unfortunately, I think the IQ of my audience is superior today (laughs). But nowadays, ever since I started producing albums for famous artists, I’ve become well-known, but that’s only because I’m in contact with these kinds of people. Perhaps it’s a little ridiculous, but on the other hand, I think it works out well. I’m aware that one of my strengths is working in collaboration. Individual creation is usually the norm, and the market privileges individual artists. But making music with people you identify with is full of interesting surprises and I think it’s necessary. H - Ambitious Lovers signaled a change of gears in your career. From the combative style of your earlier band, DNA - labeled as “noise” music - to a more mainstream grain of style. Why did you want to change? And why aren’t you pop icon yet? A - I guess I tried connecting with the larger public. I’ve always liked pop music. But I’m not sure I ever wanted to become a pop idol. I wanted to defy, in a certain way, the mainstream convention. But one can ended up making something like pop music in the process. A new generation started producing music which I think resembles, to a certain point, what I was doing with DNA. But the similarities only go so far. Nirvana, for example, is like the Beatles, except that it’s a garage band and is noisier. What we were doing was more sophisticated than that. The technique was primitive, but the artistic ambitions were much higher. H - But do you think you could have tried doing something more like Sonic Youth, instead of domesticating the ‘noise” and transforming it into pop? Why did you choose to change gears? A - I had done it for a while until I thought I should move on to the next thing. I preferred leaving the past as it was, to start anew, instead of domesticating our sound. There it is, recorded for all to hear. Let it be heard. H - But your choice seems to have something to do with your Brazilian upbringing and the local musical tradition which seems to privilege sophisticated harmonies… A - True. When I left DNA, I started listening to Noel Rosa and Cartola again, and began singing and absorbing it when I home. That’s how I began experimenting with a mellower style of music. It’s funny how the people who love your music do not expect you to be the Artist, as one sees it from the outside. In truth, it seems to me that the public wants to be the artist, wants participate somehow. As for “noise”, just as important an influence on us as the punk movement has, there was the primitive “performance art”. Vito Accunci, Chris Burden, and a few other very experimental artists. While on the side, each one of us was discovering things like the Dada artists, Antonin Artaud, William Burroughs, etc. None of these were taught in schools, one had to go after them. I’d never heard anything like what I was trying to do, but I knew it had to exist, something like a free jazz guitar.

H - How does a kid growing up in the backlands Pernambuco, make it in New York City with such an experimental group of musicians? A - Growing up in Brazil was a gift for me. I came to grasp the fact that culture is a mutable thing. I learned that habits are arbitrary. Ever since I was a child I lived in separate worlds, which gave me plenty of mental freedom. I felt just as much at home in Garanhuns as I did in New York City. I don’t feel like a foreigner in any specific place, yet I feel foreign everywhere. It’s not a romantic thing. It’s always been this way. H - I recently read a commentary by authors like Carlos Fuentes and Mário Vargas Llosa, discussing the situation in Latin America, how it is composed of so many cultures and on the nature of the mestizo. Do you think your transcultural experience is the way of the future? A - Of course I do (laughs). But I know a few friends will be horrified when they read this. H - Do you think the world will be better off like this? A - Much better off. It’s an interesting question; today we can’t know yet, for sure, so it’s hard not being superficial about it. Nonetheless, I think the world is moving towards a generalized form of the mestizo. For example, looking back at Japanese culture, it seems very solid and temporal. Yet Japan has absorbed much influence from Korea and China. It isn’t as original as one might expect. When the entire world communicates and exchanges information then this process will accelerate. H - Using cultural differences as a metaphor, one can adapt it to the individual level, in terms of one’s own creative process. You’ve already mentioned something about using two methods of composition: a first, a tendency to fuse things together, in the spirit of the mestizo, and secondly, the collage technique, as in pasting disparate things together. Which method is more interesting? A - Nowadays I think the collage method is more interesting. I would use the word juxtaposition to describe it better. That’s because it’s the least explored method. It’s harder. John Zorn tries doing it, but it turns out not making much sense. I reinforce the richness of this kind of method, just as he does: the most exciting thing about it is the room that one finds to maneuver in between and the apparent friction that is released when these different elements interact. It is the unexpressed, the non-explicit what you’re really after. When I use two different elements together, I do not search for a third element that will synthesize the first two. What I do see is a multitude of possible relations connecting them. Friends and enemies, masculine and feminine, each one of these opposites are inextricably linked together – each one is a possible result of the other. Trying to arrange these elements is what excites me. H - What do you think artists like Caetano Veloso and Gal Costa expect of you when they invite you to produce their albums? A - I’m not sure. But I’ve thought about it. In the end, I think I’m a good producer. I know how to give the artist what he/she needs in order to do what they know best. I prepare the situation; I show them the right tools. I think I’m a good interpreter of other peoples’ ambitions. Maybe that’s it. I don’t know.

H - But should the producers’ personality interfere in the work? A - One has to interfere. For example: if the artist wants to do something which you oppose, than he/she must look at the reasons for doing it. But, of course, there are some things I wish to include and that’s precisely my job. I can’t repress my opinions and I usually have many. On the same token, it’s a pleasure to be surprised by what people can do; it makes me like their music even more. H - Besides producing albums, you’ve developed a relationship with theatre participating in plays by Heiner Muller in Germany or making the soundtrack for Gerald Thomas’ new spectacle in Brazil. How did this begin? A - I saw very little of theatre in my life. But before starting DNA, I became very interested in Richard Foreman’s plays in New York. In college I learned a bit more about it when I worked in a theatre group that tried doing some abstract things, such as a play without any human gestures. My music turned out quite theatrical. H - You also compose music for dance groups. Your last work was for Amanda Miller, a choreographer at the Frankfurt Ballet. How did this collaboration begin? A - The musical score was commissioned by the Gulbenkian ballet company, which is from Portugal. Afterwards, Amanda suggested that I try making a score for a text based on Fernando Pessoa. I recorded it using three drummers. It worked out well. Drummers never play together, so when they have a chance they go wild. I offered them ideas and tried to guide their work. I let them play and then recorded it. H - You’ve always had many painter friends, such Jean Michel Basquiat and Julian Schnabel. Do you see any possibility in bringing together music and painting? A - Of course. I’m starting to work on a project with Richard Prince, who’s become well-known for his appropriations of publicity photographs and is now working on paintings with jokes on them. He wants to record an album composed of jokes, and I’m going to participate. H – With such a range of interests… how did you choose what to perform at the Munich Festival last year? What was the show like? A - The festival organizers invited a few composers to prepare a program for the Day: Philip Glass, John Zorn, Ornette Coleman, John Cale and myself. I then invited Roland Topor, a French filmmaker/cartoonist. I brought in a group from Serbia that played wind instruments. Vito Accunci sent in videos and slides. I invited Babes In Toyland, which is a neo-punk band made up of three phenomenal women. Finally, I had Marisa Monte as my special guest. To close the night we had the DJ’s and drag queens from my favorite night club in New York, the Jackie Sixty come on stage to perform a dance. H - To conclude: what do you think is the main difference between the U.S. and Brazil? A – In the U.S., the coconut juice is canned. H -How about similarities? A – Culture in both countries has been heavily influenced by an admixture of African and European influence. Everyone is starting to appreciate this now. I it hate when people say that here in Brazil, nothing really works, as if

everything worked much better in the U.S. We have to appreciate our uniqueness. I’ve always tried making people in the U.S. realize that Brazil is a modern country with loads to offer. I try to fight against the cliché about the exotic aspects of the country. I always talk about Hélio Oiticica, Nelson Rodrigues and Caetano Veloso as representing some of the most formidable artists of their day, comparable to any other great artists in the world. They should be a part of the cultural interchange worldwide because they have important things to offer to the world.


FRAGMENTO/ PIECE #05 TOTEM E TABU: O MITO FUNDADOR DO PAI Numa Ciro, psicanalista, doutora em ciência da literatura e artista. — A genialidade com que Sigmund Freud reuniu, ao longo de sua obra, a investigação científica e a arte da escrita obteve o justo reconhecimento quando, em 1930, lhe foi concedido o Prêmio Goethe de Literatura. Freud não pôde sair de Viena para ir à celebração do prêmio em Frankfurt e, para representá-lo, enviou sua filha Anna, também psicanalista, que leu o discurso do pai. Naquele texto de agradecimento pelo prêmio, o homenageado tratou das relações de Goethe com a psicanálise e respondeu aos que o acusaram de “haver ferido a veneração devida ao grande poeta pelas tentativas de analisá-lo”. Tal lesão num dos totens mais importantes da cultura alemã não era uma acusação restrita apenas ao poeta Goethe e à cultura alemã. Pois não foram poucos os tabus violados pela pena de Freud, referentes aos totens mais caros à cultura ocidental. Durante os anos de 1911 e 1912, Freud se dedicou ao que ele próprio descreveu como “uma tarefa bestial”, a escrever os quatro ensaios, reunidos sob o título de “Totem e Tabu”. Este livro teve o mesmo destino das obras que ficaram famosas apenas pelo título. Há pessoas que jamais o tomaram nas mãos, e, no entanto, imaginam e até falam dele como se falassem de um velho conhecido. Dessa forma, tratam-no como ele deve ser tratado, como um mito. Talvez por essa virtude, os artistas de todas as artes ainda hoje o elegem como tema de suas representações utilizando formas as mais variadas e distintas entre si, para nos alimentarem da riqueza dessa narrativa. “Totem e Tabu” é o tratado de um mito, através do qual Freud narra o próprio mito por ele criado. À pergunta que salta das molas do divã, “O que é um pai?”, Freud responde do lugar de quem é interpelado pela curiosidade infantil. As crianças não perguntam “quem eu sou?” mas, “de onde eu vim?”. Elas querem saber “de onde vêm os bebês”. Parafraseando Fernando Pessoa, a criança vive o pasmo essencial, como se “reparasse que nascera deveras...”. No Gênesis, o princípio era o verbo. Em Goethe, no começo era o ato. Lacan, no seminário sobre a transferência, devorava o deus Eros do banquete

platônico e concluía que no início era o amor. Freud debandou no tempo e foi comer com as mãos no banquete totêmico. É que Freud não quis transformar a pergunta sobre o pai, ou sobre a origem num enigma. A origem, por ser mítica, da ordem do real, não pode ser interpelada pelas regras do deciframento, e o lugar do psicanalista não é o pedestal de uma esfinge. Por isso, Freud inventou uma história. Terrível, como toda história infantil. Ele conta que havia, nos tempos imemoriais, uma horda primeva, onde um chefe violento e ciumento guardava todas as fêmeas para si próprio e expulsava os machos que lá nasciam à medida que cresciam. Um dia, os banidos se reuniram tipo manos e retornaram. Imbuídos de uma revolta cozida no ódio, mataram o chefe. Logo depois, ao descobrirem que também o amavam e o admiravam, devoraramno, em meio a uma celebração chamada de totêmica. Morto o chefe, a sua presença se tornara ainda mais forte e poderosa, e, ao se identificarem com ele, pela apropriação de cada uma das partes do seu corpo – leia-se: sua força –, deram início a uma desavença, pois cada um queria ocupar o lugar deixado pelo morto e gozar de tudo que antes estivera ao seu inteiro dispor. Para não se exterminarem uns aos outros, eles se viram obrigados a fazer um acordo que visava à sobrevivência de todos e à anulação do crime, pois a essa altura eles estavam tomados pelo sentimento de culpa. Sendo a morte um ato irrevogável, o sentimento de culpa serviu de móbil para que eles realizassem o trabalho de luto, por intermédio da criação do totem, substituto do morto. O totem, escolhido entre os animais, cumpriu a função que fez operar o lugar vazio deixado pelo morto, através da lei criada em seu nome: Pai. A anulação daquele ato se deu, portanto, de forma simbólica, ao estabelecerem o primeiro tabu, resultante do acordo entre eles: a proibição de matar o pai, agora na pele do totem. Aquele que violasse essa condição sofreria os piores castigos, inclusive a morte, ou então o próprio violador seria transformado, ele mesmo, em tabu.

Assim, diz Freud, a união entre os irmãos “lhes permitiu realizar aquilo que cada um deles, individualmente, teria sido incapaz de fazer”. Mas nesse instante Freud também observou que o desejo sexual não unia aqueles homens, ao contrário, causava uma separação mortal entre eles. A fraternidade conquistada para combater o chefe e colocar o pai no seu lugar não resistia à rivalidade que se estava criando em meio à disputa pelas mulheres. Por essa causa, foi estabelecido o segundo tabu: a interdição ao incesto. Daquele lugar onde havia apenas fêmeas, adveio a mãe. A mulher, a esposa, a irmã, a cunhada e assim por diante... o mito não cessa... E QUEM QUISER QUE CONTE OUTRO, POIS A VISÃO ALÉM DO ALCANCE SOMENTE AO CEGO Há DE VIR. A LUZ DOS OLHOS ACENDE O PRAZER DE SE ILUDIR. A MENTIRA E A VERDADE SE CASARAM PRA FINGIR E SEUS FILHINHOS HERDARAM AS FEIÇÕES DO CONFUNDIR. —

Fotos da perfomance de Arnaldo Antunes no Festival Multiplicidade de 2008 Photos from Arnaldo Antunes performance at Multiplicidade Festival 2008


TOTEM AND TABOO: THE FOUNDING MYTH OF THE FATHER Numa Ciro, psychoanalyst, PhD in literature and artist.

Foto da perfomance de Arnaldo Antunes no Festival Multiplicidade de 2009 Photo from Arnaldo Antunes performance at Multiplicidade Festival 2009

The genius which Sigmund Freud gathered, throughout his works, the scientific investigation and the masterful writing achieved the appropriate recognition when he received the Goethe Prize of Literature in 1930. Since Freud couldn’t leave Vienna for the celebration of his prize in Frankfurt, he sent his daughter Anna to represent him, also a psychoanalyst, who read her father’s speech. The speech mentioned the relations between Goethe and psychoanalysis and refuted those who accused him of “having harmed the deserved prestige of the great poet with the attempts to analyze him”. The harm on one of the most important totems of German culture wasn’t an accusation restricted only towards Goethe and the German culture. The taboos broken because of Freud which referred to Western culture’s most important totems were not scarce. During 1911 and 1912, Freud dedicated himself to what he called “a beastly task” writing four essays gathered in Totem and Taboo. This book had a similar destiny to other works which became famous simply because of the title. There are people who never held the book in their hands but still speak of it like an old friend. They treat it like it should be treated, like a myth. Because of this virtue, artists of all the arts even today elect it as the topic of their representations using the most diverse of forms to feed us the richness of the narrative. Totem and Taboo is a treaty of a myth in which Freud narrates a myth he created. The question which jumps out of the shrink’s chair, “What is a father?”, Freud responds from the position of one who questions childhood curiosity. Children don’t ask “who am I?” but rather “where did I come from?”. They want to know “where do babies come from”. Citing Fernando Pessoa, a child lives the essential wonder like “realizing they were born…”. In the Genesis, the beginning was the Verb. In Goethe, the beginning was the act. In a conference about transfer, Lacan devoured the god Eros of the platonic banquet and concluded that the beginning was Love. Freud disbanded over time and went to eat with his hands in the totemic banquet. Freud didn’t want to transform the question about the father or about the origin into an enigma. Because it’s mythical, from the order of the real, the origin can’t be questioned because of deciphering rules and the psychoanalyst’s position is not the sphinx’s pedestal. That’s why Freud invented a story. Terrible, like all children’s literature. He explained how, a long time ago, there was a primal horde in which a violent and jealous leader kept all the females to himself and banished all the males as they were born and grew up. One day, the banished united and returned. Involved in an uprising filled with hate, they killed the leader. Afterwards, when they discovered that they also loved and admired him, they devoured him in the middle of a totemic celebration. With the leader’s death, his presence became even more powerful. The murderers tried immortalizing him by taking ownership of each part of his body – that is, his strength – which led to a quarrel because each one wanted to occupy the place left by the leader and enjoy everything he had. In order not to kill each other, they felt obliged to make an agreement which

could seal peace and guarantee survival and a pardon of the crime because at this point they were overtaken by guilt. Death is an irreversible act and the feeling of guilt served as a conduit to make them mourn by creating the totem, the substitute for the dead leader. The totem is chosen amongst animals and served its role of substitution with a law created in its name: Father. The annulment of the crime happened symbolically by establishing the first taboo, a result of their agreement: the prohibition of killing the father, now present on the skin of the totem. Whoever violates this condition suffers the worst of punishments, including death, or the violator is transformed himself in a taboo. Thus, said Freud, the union between brothers “made possible that which each one individually would not have been able to do”. But this is when Freud also observed that sexual desire didn’t unite those men but rather caused a mortal separation between them. The fraternity achieved fighting the former leader, which resulted in replacing him the father figure of their idolatry, didn’t suffice to put an end to the rivalry created in the dispute of the women. Thus, the second taboo was established: the banning of incest. While before all females were merely females, with not differentiation between the, emerge the mother figure. The woman, the wife, the sister, the sister-in-law, and so on… the myth doesn’t stop… AND LET THE NEXT MYTH BE TOLD, FOR THE VISIONS BEYOND REACH ONLY TO THE BLIND ARE TO COME. THE LIGHT OF THE EYES ALIGHT THE PLEASURE OF ELUDING ONESELF. TRUTH AND LIES MARRY TO PRETEND BEARING CHILDREN HEIRS TO THE FEATURES OF CONFUSION.


FRAGMENTO/ PIECE #06 1997. IMAGENS DE CHOCOLATE Por Vik Muniz, artista plástico www.vikmuniz.net — Esta série é um desdobramento natural das “Crianças de Açúcar”, num momento em que eu buscava meios de retardar ao máximo a experiência – a permanência – da imagem. Somos violentamente bombardeados por estímulos visuais, nossa habilidade de assimilar essas informações se vai aos poucos puindo – e só nos resta a capacidade de absorver a essência daquelas mensagens efêmeras. Minha intenção, portanto, era construir imagens lentas – que se oferecessem na contramão. Imagens que infundissem tal volume de ambiguidade – tantas camadas de obstáculos – que obrigassem o espectador a diminuir o ritmo, desacelerar, a reincorporar sensações esquecidas, planos de percepção atrofiados. Estava num restaurante chinês, um daqueles cujo cardápio traz a foto dos pratos, e de repente pensei em como o gosto – o paladar – era-nos importante; o quanto representa uma outra dimensão. Mais que o gosto, ocorreu-me, a imaginação do gosto. Lembrei-me de que, por ocasião das “Crianças de Açúcar”, experimentei contar às pessoas que se tratava de obras feitas de sal, de cal, de cocaína – e a cada uma daquelas falsas constituições correspondia uma reação diversa. O espectador – como eu diante do cardápio chinês ilustrado – sentia o gosto das fotos. Em seguida, decidido a trabalhar com o paladar, pus-me a procurar pelo melhor gosto, e experimentei fotografar vários tipos de comida. O chocolate sobressaiu. Claro. O chocolate é interessantíssimo. É quase como a tinta, aliás. Um amálgama: produto industrializado, extremamente processado, cheio de elementos artificiais, profundamente explorado pela publicidade, também por isso, rico – muito carregado – de significados culturais. O chocolate, um negócio marrom, é associado a noções absurdas, ao romance e à escatologia, ao mesmo tempo. Quase tudo pode se relacionar à ideia de chocolate, e nada me poderia servir melhor de base empírica para testar o material contra o tema. É uma série enorme, que prossegue até hoje, com grande diversidade de assuntos, mas em que alguns se destacam. As multidões, por exemplo.

1997. CHOCOLATE IMAGES By Vik Muniz, artist

Gosto de esporte, menos pela atividade em si do que pela plateia – pelo público. Experiência incrível é observar uma torcida. De início, identificam-se os rostos – e o rosto é a representação mais básica, mais primitiva, a primeira coisa que se olha. Depois, porém, já não se distinguem as faces, as feições. Consolida-se uma massa – uma textura. E eu me interesso por essa rota de fundição, por essa trilha de perda, por essa vereda que vai da representação máxima à abstração despercebida. “Imagens de Chocolate”, série que compreendo sobretudo como experimental, resultou numerosa porque me permitiu pensar na arte – pensar na arte enquanto a criava. A partir de então, ficou-me bem mais claro o que desejava fazer. Retirado do Catálogo Raisonné “VIK MUNIZ - OBRA COMPLETA I 1987 2009” – Editora Capivara (Organização de Pedro Correa do Lago), página 228. —

Projeção de Sigmund na fachada do Oi Futuro Ipanema, Multiplicidade Especial 2009, por Vik Muniz Sigmund projection at Oi Futuro’s façade during Multiplicidade Special Edition 2009, from Vik Muniz

This series is a natural sequel to the Children of Sugar project. It arose in a moment of my career in which I sought for way to delay in the utmost the experience of perceiving an image – in other words, of the permanence of the image. We are continuously bombarded by visual stimulation. Our ability to assimilate the variety of information seems to be slowly decreasing – the most we can do is to try to absorb the essence of these ephemeral messages. My intention, therefore, was to construct slow images – images which did not open themselves to the spectator so easily. In other words, images that could create such volume of ambiguity – enough layers of obstacles – that it would oblige the spectator to slow down his/ her rhythm of absorption; to decelerate and reincorporate forgotten sensations or layers of perception which are losing their natural vigor. I was once at a Chinese restaurant skimming through a menu – one of those menus containing photos of the dishes served – when suddenly thought about how our palate – how the taste of things, generally speaking – is important to us and how it represents a kind of dimension in itself. More than tasting the dishes themselves, I came to marvel about how one imagines tasting them. I then remembered about how when I was working on the Children of Sugar project, I experimented telling people that the objects in exhibition were created using salt, lime or even cocaine – which is a lie. I was interested in seeing how each of these false components engendered a different kind of reaction in my interlocutor. The spectator could imagine the sensation of tasting the object – just as I could in relation to the Chinese menu. These ideas brought me to begin working with images that stimulate the palate. I began looking for things which elicited the strongest sensations of taste by photographing different kinds of food. Chocolate emerged as the most stimulating, of course. Chocolate makes for a very interesting case. It reminds me of paint. An amalgamation of different ingredients and references: for one, an industrialized product, extremely processed, full of artificial ingredients and very rich in cultural signification. Chocolate, this brownish paste, is associated to many absurd notions of romance and scatology at the same time. Almost everything can relate to the idea of chocolate – no other object could have served me better as reference by which to test my theme. The series I have created thus far is already enormous and continues expanding, including another diversity of themes – but some of these truly stand out. The work with the crowds, for example. I enjoy sports; not so much for the activity in itself but for the huge crowds that it congregates – the general public. The experience of observing a crowd at a sports completion is incredible. At first, one can identify peoples’ faces – the face is the most basic and most primitive representation of a person – the first thing we look at. Afterwards, however, one no longer distinguishes individuals. The mass overtakes everything else – it consolidates itself as a kind of texture. I am very interest in this fusion which takes place in the course of observation: from the maximum detail of representation to the most amorphous abstraction, which usually takes place unannounced. Chocolate Images is, most of all, and experimental project. It resulted in such an enor-

mous collection because it allowed me to reflect upon the artistic métier in a variety of ways. I had a chance to think it over in the very moment I was creating. From then on, it was much easier to realize what exactly I wanted to accomplish. Retrieved from the Raisonné Catalogo “VIK MUNIZ – COMPLETE WORKS I 1987 – 2009” – Capivara Editors (Organized by Pedro Correa do Lago), Page 228.

Projeção de Walt na fachada do Oi Futuro Ipanema, Multiplicidade Especial 2009, por Vik Muniz Walt projection at Oi Futuro’s façade during Multiplicidade Special Edition 2009, from Vik Muniz


Jackson Pollock por Hans Namuth, 1949 Jackson Pollock by Hans Namuth, 1949

Série de Chocolate, Action photo, a partir de Hans Namuth. Vik Muniz, 1997, Cópia fotográfica por oxidação de corantes Action Photo, after Hans Namuth from Pictures of Chocolate. Vik Muniz, 1997. Chromogenic color print.

Projeção de Action photo na fachada do Oi Futuro Ipanema, Multiplicidade Especial 2009, por Vik Muniz Action photo projection at Oi Futuro’s façade during Multiplicidade Special Edition 2009, from Vik Muniz


FRAGMENTO/ PIECE #07 MULTIPLICIDADE: POESIA E TECNOLOGIA EM AUGUSTO DE CAMPOS Alberto Saraiva, curador de artes visuais —

1  BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Obras escolhidas. Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 166-7.

O binômio arte/tecnologia pode parecer a priori como uma disjunção, mas não o é. Esta relação ganha clareza na medida em que entendermos o caminho que a arte tomou efetuando a passagem da técnica para a tecnologia. De acordo com Walter Benjamin, é possível entender “técnica” como manufatura, ou trabalho manufatural, isto é, ação do artista em produzir a obra de arte utilizando a mão sem um mecanismo que substitua esta necessidade1. Por outro lado, “tecnologia” seria para Benjamin um processo de evolução e acréscimos de novos mecanismos cada vez mais elaborados com base em princípios científicos criados para substituir o esforço humano em determinadas áreas do fazer. Esta evolução promoverá o distanciamento paulatino da mão do artista em relação ao objeto artístico. O processo de construção da obra vai depender de um projeto imaginado e submetido a princípios científicos aplicados a máquinas. Na prática a tecnologia implica na subtração do esforço físico, na medida em que o artista abre mão da manufatura. O resultado é uma obra sem o registro do gesto e das tensões do corpo. A obra passa a ser mais estritamente uma operação mental. Mas é importante notar que tanto técnica quanto tecnologia são meios e não fim. O objeto artístico depende antes de uma elaboração que passa pela conjugação razão/ emoção e pelo desenvolvimento de sua própria poética. O advento das novas tecnologias proporcionou aos artistas a investigação de novos processos de invenção. O artista irá enfrentar o problema apropriando-se dos meios tecnológicos para questionar, expor e inventar, efetuando correlações que estão para além das perspectivas interdisciplinares. As atividades artísticas justapostas às mais diversas áreas do conhecimento, como a biologia, a química, a física e as ciências sociais antropologia, sociologia, economia e política, irão de fato modificar os rumos da arte atual, aproximando-a cada vez mais da problemática da vida contemporânea. Alguns poetas brasileiros irão se apropriar de maneira direta dos meios tecnológicos para efetuar seus respectivos projetos. A poesia concreta é um exemplo claro que define a utilização de um meio em função de um objetivo artístico. No caso específico do poema concreto, vários meios serão imediatamente absorvidos, mas não só isso, a própria constituição do poema solicitará novos meios que na época não estavam disponíveis. Augusto de Campos é poeta cuja trajetória demonstra um exercício permanente de apropriação da tecnologia e foi também o poeta da poesia concreta que mais se interessou pelos meios eletrônicos. E foi ele, mais do que os outros poetas do grupo Noigandres, quem de fato utilizou os meios tecnológicos contemporâneos. Em 21 de novembro e 5 de Dezembro de 1955 Augusto de Campos apresentou no Teatro de Arena de São Paulo os poemas “lygia fingers”, “eis os amantes” e “nossos dias com cimento”. Esses poemas foram apresentados de forma não convencional, com oralizações do conjunto Ars Nova e projeção simultânea de slides. Os poemas foram antecedidos por um texto com tom de manifesto no qual Augusto explicava com clareza a poesia concreta. A utilização do projetor de slides como meio de veiculação do poema corroborava no estreitamento da poesia concreta com os meios tecnológicos, mas este meio naquele momento já se anunciava insuficiente

2  CAMPOS, Augusto. Revista Código, nº 11, Salvador, 1985, s.p

3  CAMPOS, A. & CAMPOS, H. Revista Código 11. Salvador, 1986.

4  ARAÚJO, Ricardo. Poesia visual vídeo poesia. São Paulo: Editora Perspectiva, 1999, p. 15.

ao poema, pois aquela nova poesia exigia o dinamismo não apenas da imagem como luz estática, caso do slide, mas da imagem como movimento, o que pareceu desde o começo ser da natureza do poema concreto. Neste mesmo texto de apresentação Augusto de Campos declarava: “No plano visual, não podendo valer-me de luminosos ou de recursos cinematográficos, mais aptos à apresentação dos poemas, optei pela grafia em cores, fazendo corresponder a cada timbre ou tema definido uma cor determinada”2. Esse instante anterior à exposição oficial de inauguração da poesia concreta deixava claro os possíveis desdobramentos e caminhos que aquela poesia deveria tomar. Depois daí, a migração do poema para outros meios seria uma consequência natural, e foi de fato o que se pôde observar e constatar nas décadas seguintes ao lançamento da poesia concreta na “Exposição Nacional de Arte Concreta” em São Paulo e depois no Rio de Janeiro. A passagem do slide para a holografia, da holografia para o vídeo texto e depois para a computação gráfica promoveria a realização de um projeto que em seu cerne não apenas sugeria, mas exigia meios tecnológicos com capacidade de fazer o poema aparecer em sua inteireza original. O vídeo, mídia que chega ao Brasil nos anos 70, não parecia apropriado para a poesia concreta. Era um meio muito instantâneo, com características muito peculiares e naquele momento sem recursos de edição, construção e modelagem de que a poesia concreta precisava. É através da computação gráfica que o poema concreto migra do espaço físico para o espaço virtual, considerando a virtualidade em todas as suas possibilidades. Durante a abertura da “Exposição Nacional de Arte Concreta”, em dezembro de 1956, foi publicado no “Diário Popular” de São Paulo, em 22 de dezembro de 1956, uma significativa entrevista com os poetas concretos em que vários meios de comunicação de base tecnológica são mencionados como veículos para a poesia concreta assim como suas conexões com a música eletrônica de Pierre Boulez: “A poesia concreta propõe o útil: o poema, como um objeto de consumação integrado na vida cotidiana, na arquitetura, como ‘formas mentis’, fecundo de sugestões à propaganda, às manchetes, ao rádio, cinema, TV etc...”3 O conceito verbivocovisual aplicado à poesia concreta, termo inventado por Joyce, já armazenava potencialmente a noção de movimento, como que a aguardar soluções tecnológicas para dar cabo aos seus possíveis desdobramentos. A experiência realizada de janeiro de 1992 a maio de 1994 no projeto Poesia-Visual-Vídeo-Poesia no LSI – Laboratório de Sistemas Integráveis da Escola Politécnica da USP comprova isso. O projeto propunha a animação de sete poemas: “Bomba” e “SOS”, de Augusto de Campos, “Femme”, de Décio Pignatari, “Dentro”, de Arnaldo Antunes, e “O Arco-Íris no Ar Curvo”, de Júlio Plaza4. Essa experiência pareceu uma complementaridade daquilo a que se propunha a poesia concreta. Em outros termos, cada desdobramento parece ter acontecido dentro de um ciclo tecnológico brasileiro, no qual os preceitos conceituais dos poetas concretos se adequavam imediatamente aos meios, justamente porque esses meios eram indispensáveis para que o projeto da poesia concreta pudesse acontecer em toda a sua complexidade. Há aí uma ideia de extensão na qual os poetas novos das gerações seguintes, como Júlio Plaza, Arnaldo Antunes, Walter Silveira, Cid Campos e João Bandeira, de certo modo deram continuidade. Essa extensão efetiva e real da poesia concreta se apresenta como um projeto aberto e em sintonia com as atividades atuais da cultura pop. Trata-se da mesma poesia que


levou Caetano Veloso a musicar o “Quasar”, de Augusto de Campos. Talvez essa “extensão poética”, capaz de mobilizar gerações diferentes da música popular e da poesia, seja um indício do olhar aguçado que devemos lançar sobre esse projeto e sobre os novos meios capazes em sua estrutura de ampliar conceitos artísticos. Todos os poemas animados nos laboratórios de Sistemas Integráveis da Escola Politécnica da USP segundo Ricardo Araújo:

5  ARAÚJO, Ricardo, op cit., p. 21.

6  Ibidem, p. 16.

7  CAMPOS, Augusto de. O Globo, Entrevista Augusto de Campos. Rio de Janeiro, 21.08.2004.

8 CAMPOS, Augusto de. O Globo, Rio de Janeiro, 21.08.2004.

f oram originalmente pensados na bidimensionalidade do papel e em preto e branco. Portanto, o processo da passagem para a tridimensionalidade, com sonorização e animação em cores, foi resultado de um esforço que passou por diversas etapas, cujo escopo foi a finalização das animações dos poemas, acompanhada pelos poetas, em todas as fases5. É fundamental notar que este trabalho era uma experiência de ação complementar ao que já havia sido realizado, e, muito embora o projeto seja chamado Poesia-Visual-VídeoPoesia, apenas o resultado foi editado em formato Betacam, Super-VHS e U-Matic (denominações de formatos para videocassetes da época) para apresentação e veiculação, porque a construção foi realizada com a tecnologia atualíssima da computação gráfica que naquele momento ainda não estava disponível para uso caseiro. O meio videográfico remonta à década de 70, quando aconteceram no Brasil as primeiras experiências com videoarte, mais precisamente no Rio de Janeiro em 1974. Mas este meio não dispunha de recursos técnicos para realizar animações. Desta forma a videoarte não era o canal ideal para dar continuidade aos conceitos da poesia concreta, que por sua vez teve que aguardar o surgimento de uma tecnologia avançada como a computação gráfica para efetivar seu projeto potencial. Assim, o processo de animação dos poemas foi de fato realizado em computação gráfica: O LSI é um centro de estudos que possibilita a pesquisa nos campos de processamento de imagens e computação gráfica. Para esses tipos de pesquisas, o LSI possui uma série de recursos de hardware e software especializados em computação gráfica. Estes recursos estão dispostos em um espaço que a engenharia eletrônica, utilizando uma metáfora extraída da organização humana, denomina “ambiente”. Esse “ambiente” de máquinas e programas está interligado através da rede “Ethernet” e se ajusta em sistemas operacionais “Unix” e “DOS”, combinados com interfaces gráficas “X-Windows”, “Motif” e “Windows6. Embora a descrição do laboratório hoje nos pareça antiga, podemos averiguar que a capacidade de geração de dados e imagens era de ponta para o início da década de 90, e esses recursos de animação só estavam disponíveis de fato em laboratórios de pouquíssimas universidades. Ao ser perguntado se o concretismo antecipou a era da informação, Augusto de Campos respondeu que “a poesia concreta, reativando nos anos 50 as propostas do Lance de Dados mallarmiano e das vanguardas do início do século passado, antecipou, de fato, as novas mídias eletrônicas, com a criação de uma poesia de sintaxe espacial, de multileituras e de impressões em cores, sem falar nas estruturas cinéticas. Os dois precursores da arte digital no Brasil, o pintor Waldemar Cordeiro e o poeta Erthos Albino de Souza, provêm do

9  CAMPOS, Augusto de. Não Poemas. São Paulo: ed. Perspectiva, 2003, p.11.

10  Ibidem, p. 11.

11  BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Obras escolhidas. Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 166-7.

concretismo. (...) e conclui que gostaria ainda de prosseguir na caminhada exploratória pelo universo digital.”7 E, dentre os poetas concretos, Augusto de Campos foi o que mais se dedicou a acompanhar os avanços tecnológicos: “Eu caminhei em direção às animações computadorizadas”8 . No prefácio (nãofácio) de seu livro “Não Poemas”, de 2003, livro que acompanha um CD-ROM interativo dos clip-poemas de 1997, Augusto de Campos declara que: rande parte do que tenho feito em poesia migrou G para o universo digital animado – a poesia em cor e movimento, que sempre me fascinou e que agora está ao alcance dos meus dedos. É esse o território que mais me incita e desafia agora-pós-tudo. Mas as ferramentas computadorizadas que filtram toda minha produção, há mais de 10 anos, também fabricam o poema palatável ao papel e ao livro. E alguém que é tão breve e produz tão pouco – qualidades para alguns, defeitos para muitos – NÃO pode recusá-las ao inevitável registro do percurso. Alguns desses poemas são mesmo versões estáticas de clip-poemas digitais, “poemovies” a que a animação dá mais pulso. É o caso de “sem saída”, estampado na quarta capa, quase fora do livro, saindo dele. E que acena tanto para cibernautas como para libernautas9. Ainda no prefácio de “Não”, Augusto de Campos faz uma preciosa declaração que diz respeito à passagem da técnica mecânica da máquina de datilografia aos meios computacionais: “e esse ‘não’ que já era título de um poema de 1990, o meu ultimo datiloscrito”10. O processo de criação do poema fez basicamente um percurso migratório que vai da escrita manual à escrita mecânica (máquina de escrever) e, no caso do poema concreto, passa por outros meios como o recorte, o desenho e a impressão, até chegar de fato às mídias eletrônicas. Mesmo que o fim do poema fosse sempre a imprensa e o livro, a fase de criação ainda passou por longo período de fatura manual aguardando a chegada dos meios tecnológicos. Para Walter Benjamin, a passagem da técnica para a tecnologia se dá quando o artista delega à máquina a motricidade de seu fazer, abandonando a manufatura, o que acontece prioritariamente a partir da invenção da fotografia: reprodução técnica da obra de arte representa um A processo novo, que se vem desenvolvendo na História intermitentemente, através de saltos separados por longos intervalos, mas com intensidade crescente. Com a xilogravura, o desenho tornou-se pela primeira vez tecnicamente reprodutível, muito antes que a imprensa prestasse serviço para a palavra escrita. Conhecemos as gigantescas transformações provocadas pela imprensa – a reprodução técnica da escrita. Mas a imprensa representa apenas um caso especial, embora de importância decisiva para um processo histórico mais amplo. À xilogravura, na Idade Média, seguem-se a estampa em chapa de cobre e a água-forte, assim como a litografia no século XIX.(...). Graças à litografia, as artes gráficas começaram a situar-se no mesmo nível que a imprensa. Mas a litografia ainda estava em seus primórdios quando foi ultrapassada pela fotografia. Pela primeira vez no processo de reprodução da imagem, a mão foi liberada das responsabilidades artísticas mais importantes11. Este salto dado pela tecnologia irá de fato mudar os


procedimentos de criação da obra de arte. Por esta razão, Augusto de Campos se refere ao seu último poema datilografado, no qual utilizava um meio mecânico, já sem os recursos adequados para a construção dos seus poemas. Os computadores, com sua formatação de hardware e software, serão ferramentas mais preciosas e adequadas à modelação do poema visual. Para ele, as mídias computacionais e seu permanente desenvolvimento serão sempre fonte inesgotável de possibilidades para a criação do poema. Entretanto, é preciso observar que essas mesmas tecnologias são meios e não fins em si, mas sem as quais boa parte da produção do poema contemporâneo não seria possível. Logo, podemos pensar também que o meio é um fator integral do qual o poema não poderia abrir mão, e, sendo assim, o meio seria uma parte do ser do poema, do ser da coisa e participaria do “em si” imanente da obra de arte. Essas interseções e complementaridades acionadas entre arte e tecnologia são sem dúvida uma questão da qual hoje não podemos escapar, e certamente deverá haver ainda um empenho em averiguar com cautela o impacto da tecnologia na obra de arte. —

MULTIPLICITY: POETRY AND TECHNOLOGY IN AUGUSTO DE CAMPOS Alberto Saraiva, visual arts curator At first glance, there may seem to be a disjunction between art/technology, but there is none. This relationship gains clarity as we understand the path art has taken from technique to technology. According to Walter Benjamin, it is possible to understand “technique” as the manufacture of crafts, that is, the act of producing a work of art using his bare hands without the need of a mechanism that substitutes that necessity. On the other hand, “technology” would be, to Benjamin, a process of evolution and addition of ever more elaborate new mechanisms based on scientific principles created to substitute human effort in certain areas. This evolution will promote a gradual distancing from the hands of the artist in relation to the artistic craft. The process of the construction of the craft will depend upon a project imagined and submitted to scientific principles applied to machines. In practice, technology implies the subtraction of physical effort since the artist forgoes the process of manufacture. The result is a work without any record of gestures and tensions of the body. The work becomes strictly a mental operation. However, it is important to note that both technique and technology are a means and not an end in themselves. The artistic craft depends on an elaboration that goes through reason/ emotion and the development of its own poetic. The advent of new technologies has provided artists with an investigation of new processes of invention. The artist will face his problem utilizing technological means to question, expose and invent, creating correlations that go beyond interdisciplinary perspectives. The artistic activities juxtaposed with the most diverse areas of knowledge such as biology, chemistry, physics, the social sciences, anthropology, sociology, economics and politics will, in fact, change where current art is headed and approximating it more and more to the problems of contemporary life. Some Brazilian poets will directly utilize technological means to accomplish their respective projects. Concrete poetry is a clear example that defines the use of a means as an artistic goal. In the specific case of a concrete poem,

various means are immediately absorbed, but not only that; it’s very constitution will require new means that are not available at the time. Augusto de Campos is a poet whose trajectory demonstrates a constant use of technology. He was also the concrete poet who became most interested by technological means. It was he, more than the other poets of the group Noigandres, who, in fact, utilized technological contemporary means. In November 21st and December 5th 1955, Augusto de Campos performed at the Teatro de Arena in São Paulo the poems “Lygia fingers”, “eis os amantes” and “nossos dias com cimento”. These poems were read in a conventional manner, with performances from the group Ars Nova and simultaneous projection of slides. The poems were preceded by a text resembling a manifest in which Augusto explained with clarity the concrete poetry. The use of a slides projector as a means of technological circulation backed the joining of concrete poetry with technological means, but this means, at the time already announced itself as insufficient for the poem since that new poetry demanded a dynamism not seen in static images such as the slides. It required images with movement, which seemed to be, from the start, the nature of the concrete poem. This same text from Augusto de Campos’s performance proclaimed: “In the visual field, not being able to use luminous or cinematographic resources, which are apt for the presentation of poems, I opted for the use of colors making each timbre or defined theme as a specific color”. This instant prior to the official exposition of the debut of concrete poetry made clear the possible routes that poetry should take. Afterwards, the migration of poems to other means would be a natural consequence, and this was in fact what could be observed in the coming decades following the debut of concrete poetry in the “National Exposition of Concrete Art” in São Paulo and afterwards in Rio de Janeiro. The migration from slide to holography, from holography to videotext and afterwards to graphic computation would promote a project that itself not only suggested, but required the appropriate technological means that would enable the poem to appear in its original entirety. Video, which arrived in Brazil in the 70s, did not seem appropriate for concrete poetry. It was too

instantaneous, with very peculiar characteristics in a time without editing resources, construction and modeling that concrete poetry required. It is through graphic computing that the concrete poem migrates from the physical space to the virtual space, contemplating reality in all its possibilities. During the opening of the “National Exposition of Concrete Art”, December of 1956, was published in the “Popular Daily” of São Paulo in December 22nd 1956 a significant interview with the concrete poets in which various means of communication with a technological base are mentioned as instruments for concrete poetry along with their connections to the electronic music of Pierre Boulez: “Concrete poetry proposes the useful: the poem, like an object of use integrated in daily life, in architecture, as forms of the mind generates plentiful suggestions to propaganda, news, radio, cinema, TV etc…” The “verbivocovisual” concept, term invented by Joyce, applied to poetry already potentially had the notion of movement as if it were awaiting technological solutions to bring about its possible unfolding. The experience that took place in January 1992 to May 1994 in the project Poetry-Visual-Video-Poetry in the LSI – Laboratory of Integrated Systems of the Polytechnic School of University of São Paulo proves this. The project proposed the animation of seven poems: “Bomba” and “SOS”, from Augusto de Campos, “Femme” from Décio Pignatarai, “Dentro” from Arnaldo Antunes and “O Arco-Íris no Ar Curvo” from Júlio Plaza. This experience seemed complementary to what was proposed by concrete poetry. In other words, each unfolding seems to have happened inside a Brazilian technological circle in which the conceptual precepts of concrete poets were tied to the means, since these means were indispensable for that the poetry could exist in all its complexity. Therein lays an idea, which the poets of following generations such as Júlio Plaza, Arnaldo Antunes, Walter Silveira, Cid Campos and Jõao Bandeira, in a certain way, gave continuity to. This effective and real extension of concrete poetry presents itself as an open project in synch with current pop culture activities. It is the same poetry that led Caetano Veloso to sing “Quasar” from Augusto de Campos. Perhaps this “poetic extension”, able to mobilize different generations of popular music and poetry, is an indication of how

closely we should look at this project and on the means in its structure capable of extending artistic concepts. All of the animated poems in the Laboratories of Integrated Systems of the Polytechnic School of the University of São Paulo according to Ricardo Araújo: Were originally thought in two dimensions on paper in black and white. Therefore, the process of the passage to three dimensions, with sounds and color animations was a result of an effort that went through many stages and whose scope was the finalization of the animation of the poems. This was closely observed by the poets in all stages. It is fundamental to note that this work was an experience complementary to what had already been made and although the project was named Poetry-Visual-Video-Poetry, only the result was edited in Betacam, Super-VHS and U-Matic (formats for videocassettes at the time) for presentation and distribution, since the construction took place with very modern computer graphics that at the time was not available for domestic use. The videographic means goes back to the 1970s when the first experiences with videoart happened in Brazil, more precisely in Rio de Janeiro in 1974. However, this means did not dispose of technical resources to make animations. This form of videoart was not the ideal medium to give continuity to the concepts of concrete poetry, which would have to wait until the start of a new advanced for of technology such as computer graphics to realize its potential project. Thus, the process of animating the poems was in fact made with computer graphics: T he LSI is a center for studies that permits the research in the field of image processing and computer graphics. For these kinds of researches, the LSI has a series of resources in hardware and software that are specialized for computer graphics. These resources are available in a space where electronic engineering, utilizing a metaphor extracted from human organization, denominates “ambient”. This “ambient” of machines and programs is linked through “Ethernet” and adjusts itself in “Unix” and “DOS” operational systems combined with graphical interfaces “X-Windows”, “Motif” and “Windows”. Although the description of the laboratory today seems ancient, we can ascertain the capability of data generation and image processing was first-rate for the beginning of the 90s and these animation resources were only available in very few universities. When asked if the Concretism anticipated the era of information, Augusto de Campos responded that “the concrete poetry, reactivating in the 50s the proposals of the Mallarmian Throw of the Dice and vanguards from the beginning of last century, did in fact anticipate new electronic media with the creation of a poetry with spatial syntax of multiple readings and color impressions, not to mention kinetic structures. The two precursors to digital art in Brazil, the painter Waldemar Cordeiro and poet Erthos Albino de Souza come from Concretism. (…) and concludes that would still like to engage in the exploratory walk through the digital universe.” And, among concrete poets, Augusto de Campos was the one who dedicated himself most to accompany the technological advances: “I have gone towards computerized animations” . In his book’s, “Non Poems” from 2003, preface (nonpreface), comes a CD-ROM with interactive clip-poemas from 1997 and Augusto de Campos states that:

great part of what I have done in poetry A has migrated to the digital animation universe – the poetry in color and movement that has always fascinated me and is at reach with my fingertips. This is now the territory that most excites and challenges me. However, the computerized tools that filter all of my production for more than 10 years also create the poem palatable to paper and books. And someone who is so brief and produces so little – a quality to some, defect to many – CANNOT refuse them to the inevitable course of registration. Some of these poems are really static versions of digital clip-poems, “poemovies” in which the animation gives more pulse. It is the case in “no exit”, printed on the fourth page, almost outside of the book, exiting it. It reaches both cybernauts and libernauts. Still in the preface of “No”, Augusto de Campos makes a precious statement with respect to a passage of the mechanical technique of the typewriter to the computational means: “and this ‘no’ that was already the title of the poem basically made a migratory route that goes from manual writing to mechanical writing (typewriter) and, in the case of the concrete poem, goes through other means such as the cutting, drawing and printing until it reaches the electronic medium. Even though the end of the poem was always the print and the book, the creation stage still went through, for a long time, a long period of manual manufacture awaiting the arrival of the technological means. To Walter Benjamin, the passage from technique to technology happens when the artist delegates to the machine the motion of his labor, abandoning the manufacture, which happens with the invention of photography: T he technical reproduction of art represents a new process that has been developing in the intermittent History through long jumps separated by long intervals but with increasing intensity. With woodcutting, drawing became for the first time reproducible way before the printing press bore service to the written word. We know about the gigantic transformations that came about from the printing press – the technical reproduction of writing. But the press represents only a special case, although of decisive importance to a much broader historical process. From woodcutting comes the engraving in copper as well as lithography in the XIX century (…). Thanks to lithography, graphic arts begin to locate itself in the same level as the press. However, lithography was still in its infancy when it was surpassed by photography. For the first time in the process of reproducing an image, the hands of the artist were freed from the most important artistic responsibilities. This leap given by technology will in fact change the procedures of the creation of the work of art. For this reason, Augusto de Campos refers to his last written poem, which utilized a mechanical means of writing, without the adequate resources for the construction of his poems. Computers, with their hardware and software formatting will be more precious and adequate modeling tools for the visual poem. To him, the computational media and its permanent development will always be an endless source of possibilities to the creation of the poem. Meanwhile, it is important to observe that these same technologies are only means and not the ends, but without which the production of the contemporary poem would not have been

possible. We can therefore see that the means is an integral factor of which the poem could not go without and thus the means would be a part of the poem, and would itself be an imminent part of the work of art. These intersections and complementarities between art and technology are without a doubt an inescapable reality from which we cannot escape and will certainly still have a role in cautiously understanding the impact technology has on the work of art.

1  BENJAMIN, Walter. The Work of Art in the Age of Mechanical Reproduction. In: Selected works. Magic and Technique, Art and Politics: essays on literature and cultural history. São Paulo: Brasiliense, 1985, p. 166-7. 2  CAMPOS, Augusto. Revista Código, nº 11, Salvador, 1985, s.p 3  CAMPOS, A. & CAMPOS, H. Magazine Código 11. Salvador, 1986. 4  ARAÚJO, Ricardo. Visual Poetry. São Paulo: Editora Perspectiva, 1999, p. 15. 5  ARAÚJO, Ricardo, op cit., p. 21. 6  Ibidem, p. 16. 7  CAMPOS, Augusto de. O Globo, Interview with Augusto de Campos. Rio de Janeiro, 21.08.2004. 8 CAMPOS, Augusto de. O Globo, Rio de Janeiro, 21.08.2004. 9  CAMPOS, Augusto de. Não Poemas. São Paulo: ed. Perspectiva, 2003, p.11. 10  Ibidem, p. 11. 11  BENJAMIN, Walter. op cit., p. 166-7.


FRAGMENTO/ PIECE #08 INTENSIDADE E TEMPO Belisario Franca, fundador e diretor da produtora Giros/ documentarista www.giros.com.br — A escala de frequências na vertical e o tempo na horizontal. O impulso sonoro. O som é imagem. O som visível. Na contemporaneidade, imagens e sons construíram uma nova oralidade que atravessa nossa vida cultural. A arte contemporânea, plena de experiências multissensoriais, gera uma multiplicidade que quer dar conta do mundo a cada dia mais fragmentado. Nada garante a obra. A música se faz visível, e as imagens são polifônicas. Uma obra em construção flui, se quer singular, e procura. Errática por vezes, não foge da vertigem e encontra um outro imaginário. Artistas em diálogos inusitados se unem em obras para construir um tempo para um lugar fora dele. Os sentidos conversam: percebemse imagens e se é envolvido pelo som. Novas narrativas elaboradas em imagem e som estabelecem um lugar na arte. Vive-se dentro do tempo da obra. Fusões, entrelaçamentos, choques, elipses, rupturas, silêncios. Imersão. A cada novo dispositivo é produzido um tempo inaugural, sempre no presente. Arte e tecnologia reinventadas geram um novo conhecimento. Experimenta-se a produção de outra narrativa na lógica plural da contemporaneidade. O som corporificado em imagens explode em abordagens inesperadas e sugestivas. Nem antes nem depois. No aqui e agora da experiência da arte, produzem-se modos novos de subjetividade. Não se observa somente com o olhar e nem se percebe o som apenas pela audição. O espectador é convocado sensorialmente a fazer parte da experiência cinestésica. Habita-se a obra no momento exato da criação. Com intensidade. No tempo. O encontro é múltiplo: do artista que produz o som e a música, do artista que produz imagens e do espectador que articula os elementos da cena em jogo. Dissolvem-se as fronteiras. Não se representa. O mundo se expande na pluralidade e simultaneidade de um novo saber que se impõe gerando um sentido e uma sensação. Gerando um lugar para a arte. Gerando Multiplicidade. —

Time and Intensity Belisario Franca, creator and director of Giros production company/ documentarist A frequency scale on the vertical line and time marked on the horizontal. The impulse of sound – sound transformed into imagery. As something made visible. Today, images and sounds are constructing a new oral code which can be noticed throughout our cultural existence. Contemporary art is filled with multisensory experiences, offering a means of multiplying oneself in order to grasp a world which is ever more fragmented. There are no more narrative assurances. When the music is made visible, images turn polyphonic. A work in progress, it floats and searches for a singularity. Erratic at times, it does not shun away from the vertigo as it searches for other imaginaries. Artists can partake in unusual encounters: they work together in building narratives which defy temporal boundaries. The senses converse: one notices the images as they are simultaneously involved by the sound. New narratives are elaborated coupling images and sound, establishing an unidentifiable body of work. The spectator inhabits the work of art. Fusions intertwining, shocks, ellipses, ruptures, silences. Immersion. Within each device, a new time-frame is inaugurated, without ever leaving your place. Art and technology reinvented generate a novel kind learning. We are experimenting with the production of plural, logically concatenated narratives. Sounds embodied in images explode in suggestive and unexpected images. Not before or after, but here and now, contemporary art is producing new modes of subjectivity. One no longer observes the image merely with eyesight. Sound is no longer captured exclusively by audition. The spectator is invited to partake in a sensorial journey, a kinesthetic experience. One will co-inhabit the work of art just as it is being created. With Intensity and within its time-frame. The interaction which occurs between artists and spectators are multiple and unlimited: first, between the artists who produce the music and the ones who create the images. Then, between the artists and the spectators who absorb the interaction. The boundaries are thusly dissolved. Art is no longer merely a representation. The world seems to expand in the plurality and simultaneity of the experience generating meaning and sensations. Creating a new space in which art can flourish. Generating Multiplicity.


FRAGMENTO/ PIECE #09 O AUDIOVISUAL NAS ARTES PLÁSTICAS Veronica Cordeiro Publicado originalmente na Revista Trópico - Ideias de Norte a Sul em julho de 2005. http://p.php.uol.com.br/tropico/html/ index.shl Veronica Cordeiro é artista etnográfica, curadora e escritora recentemente radicada em Montevidéu, Uruguai. Formou-se em História da Arte pela Universidade de Edimburgo, Escócia, e é Mestre em Antropologia Visual pela Goldsmiths College, Londres. — “Para o Olho, a mudança muda tudo”. William Blake, “O Viajante Mental” Na arte contemporânea, tanto no Brasil como no resto do mundo, a linguagem fílmica do vídeo e do filme tornou-se um universo muito amplo de pesquisa artística. Em grandes exposições, como as dezenas de bienais internacionais, a Documenta de Kassel, a Manifesta, entre tantas outras mostras periódicas de arte, é comum deparar-se com corredores de salas escuras que abrigam diversos tipos e formatos de projeções de filme ou vídeo e outras mídias audiovisuais e digitais. A última Bienal de Veneza (2001), por exemplo, adquiriu o apelido de “Bienal do vídeo”, e a diversidade de projeções fílmicas e de videoinstalações reflete a magnitude desse meio de expressão. Havia desde cenas dilatadas até o ponto de se tornarem imagens quase estáticas, como o “The Quintet of the Unseen”, 2000, do renomado videoartista americano Bill Viola, até propostas experimentais alternativas à própria linguagem fílmica de cineastas e produtores multimídia. Abbas Kiarostami, por exemplo, projetou a imagem dele e de sua companheira enquanto dormiam, no chão do prédio do Arsenale. Chris Cunninhgam, artista inglês conhecido principalmente pela realização de vídeos de música (“All is Full of Love”, de Björk, é um dos mais célebres), apresentou, além de alguns videoclipes, o filme “Flex” (2000), de corpos nus entrelaçados numa grande tela. Talvez a proposta mais surpreendente tenha sido a da parceria de um cineasta canadense com um pintor

português: Atom Egoyan e Julião Sarmento, em “Close” (2000), projeção em tela dupla que transfere o voyeurismo cinemático do espectador numa espécie de sadismo perverso do diretor. EXPERIÊNCIAS EM TEMPO REAL As imagens em movimento nos fazem retornar à experiência do real, e é por essa capacidade mimetizante do filme ou do vídeo que tantos artistas hoje concentram grande parte de suas pesquisas nessa linguagem. No entanto, os focos são muito distintos. A questão a ser refletida aqui não é tanto o porquê do surgimento da linguagem fílmica no circuito das “artes plásticas”, pois seria reduzir o problema a uma questão de evolução tecnológica – como foi o caso da fotografia e de suas decorrências digitais. Cabe analisar os tipos de uso dessa linguagem, as diferenças de conteúdo, expansão formal e conceitual, para nos situarmos melhor dentro de sua própria lógica espaçotemporal, tanto como “espectadores”, críticos e criadores. O elemento inerente ao filme, à “imagem em movimento”, que o distingue da pintura, escultura, fotografia, entre outras técnicas “plásticas” ou “visuais”, pode ser encontrado no tempo. Jean-Luc Godard aponta muito bem que, para os americanos, uma imagem é “picture” (palavra que também serve à fotografia), enquanto “movie” é o termo que consegue designar a noção de movimento. Esse é também o primeiro fator que separa o cinema ao qual conhecemos e assistimos na sala escura de um auditório – do longa-metragem – dos filmes de artistas, documentaristas, videoartistas, videomakers e até de produtores de cinema e VJ’s.

Filmes e vídeos apresentados nos festivais de cinema underground, de vídeo, e em galerias e outras instituições culturais, são geralmente de “curta” duração. Nas exposições “de arte”, as projeções encontram-se em “looping” contínuo, e o espectador escolhe se quer assistir a toda a projeção ou somente dedicar sua visita a um fragmento aleatório – como se não houvesse perda de narrativa nesta escolha. O que não impede a realização de alguns filmes intermináveis de Douglas Gordon ou Stan Douglas, onde o tempo ainda é o ponto referencial dessa linguagem, embora a lógica da duração seja um processo diametralmente inverso. Nesse sentido, a angústia que o espectador teria de passar ao assistir a “24 Hour Psycho”, de Gordon (a duração do filme original do Hitchcock, “Psicose”, é diferida para 24 horas), ou “Journey into Fear” (2002), de Stan Douglas (são 30 faixas da mesma cena com duração total de 7 horas e 40 minutos), aparece como contraponto paradoxal às repetitivas pancadas contra a parede do protagonista de “Wall Piece” (2000), do americano Gary Hill. Um dos artistas hoje mais renomados no circuito internacional, que trabalha com o filme, é o americano Matthew Barney. Conhecido pela série “Cremaster”, o artista, altamente influenciado pelas filmagens do futebol americano, criou um vocabulário fílmico único em forma e conteúdo. Cada série dos filmes “Cremaster” torce o fluxo da narrativa tradicional, desafia e questiona os gêneros do cinema, misturando experiências autobiográficas com o fascínio pelo esporte e sua exploração como violência (partindo sempre do

impulso sexual masculino... incluindo também às vezes o feminino...). Barney desenvolveu uma estética fílmica original, mas, como Douglas Gordon e Stan Douglas, entre outros, não abdica do ponto de partida formal da tradição do cinema, isto é: criar fábulas ou certos tipos de narrativa a partir da literatura, da História, da psicanálise, do pensamento sociológico, sempre tirando partido da infraestrutura do cinema, de suas equipes de filmagem, atuação e produção. A relação desses artistas com o filme se aproxima do cinema, do mesmo modo que, inversamente, os cineastas Karin Aïnouz e Beto Brant no Brasil têm transitado nos universos das artes visuais e de festivais independentes, até finalmente realizarem seus (excelentes) longas-metragens. FILME OU VídEO? Muitos artistas escolhem utilizar o vídeo como registro-obra de experimentos performáticos (em que utilizam o próprio corpo simultaneamente como sujeito e objeto). Em geral, fazem-no a partir de uma ordem subjetiva; outras vezes o propósito é político e procura relacionar espaços privado e público. O artista norte-americano Bruce Nauman é a grande referência nessa vertente mais experimental. A suíça Pipilotti Rist encanta outras plateias. No Brasil, destacamos os jovens Amílcar Packer (que discute a imagem em movimento e seu posterior congelamento em fotografia em “still”); Fernando Lindote (que recontextualiza o ambiente para acolher os resíduos de plástico mastigado em “Edax”, videoinstalação de 1999); Brígida Baltar (com registros matéricos, fotográficos e em vídeo de suas caminhadas ao ar livre em “Coleta da Neblina”). São artistas que documentam processos corporais ou viagens geopoéticas, utilizando o vídeo como registro, como suporte final da obra e ainda como elemento constitutivo de uma instalação “multimídia”. Há de ser pontuada uma diferença entre essa abordagem e a pesquisa, até mesmo mais apurada, de artistascineastas (ou cineastas-artistas?) que trabalham voltados para a imagem tecnológica. Para explicar isso, basta comparar o trabalho digital de Cao Guimarães, bem diferente dos vídeos que realizou em colaboração com Rivane Neuenschwander. Cao tem diversos documentários e filmes, como “Hypnosis”,

“Between”, mas também um enfoque sociológico que se encontra entre o universo do cineasta e do (video) artista. Nessa mesma linha, Lucas Bambozzi mistura videoinstalações com investigações que têm um olhar mais “antropológico”. Por outro lado, os filmes do grande desenhista sul-africano William Kentridge, produzidos em formato de 16 e 35mm, mas geralmente transferidos ao vídeo e DVD para eficácia expositiva, de certo modo subvertem essa distinção técnica. O ponto de partida do artista é sempre o desenho a carvão, a história política de uma nação sofrida, a literatura, e um certo enfoque romântico da “pequenez” do homem em relação à natureza. A prolífica produção de desenhos de Kentridge passa ao filme por meio da animação digital, em que os personagens ganham “vida” a partir do movimento da imagem – são desenhos animados em preto e branco, que transitam entre um mundo estético quase artesanal e a proximidade com o mundo “real” a partir de um movimento paradoxal: a sua virtualização digital. A questão que emerge poderia ser assim formulada: qual a diferença entre um (video)artista e um cineasta? E onde se insere o artista “visual” que também utiliza o vídeo e/ou filme em algumas obras? Será uma mera questão de inserção em um determinado circuito? TRABALHOS EM PARCERIA Junto com essa abertura tecnológica, surgem parcerias com outros artistas, ou não, especialistas e leigos. É o caso de Rivane Neuenschwander com Cao Guimarães em “Inventário de Pequenas Mortes”, filme que acompanha a força e fragilidade de uma bolha de sabão na paisagem em movimento, e em “Love Lettering”, produzido por Rivane com Sergio Neuenschwander (Museu de Arte da Pampulha de Belo Horizonte, 2002). Nesse vídeo, pequenas palavras foram afixadas ao rabo de peixinhos dentro de um aquário e, através de seus movimentos aquáticos, viajam de um canto ao outro produzindo poemas visuais de grande beleza e sutileza. Outra jovem artista mineira, Marilá Dardot, produziu um vídeo intitulado “Hic et Nunc” (Aqui e Agora), baseado no conceito de aura de Walter Benjamin, em que uma mão é vista escrevendo verbos em uma pequena lousa branca, enquanto a outra os apaga, um verbo após o outro consecutivamente.

No mesmo ano, Nuno Ramos realizou, em colaboração com Eduardo Climachauska, um filme intitulado “Luz Negra” (tal como a exposição). O filme foi situado nos arredores de Sorocaba, onde foram cavados grandes buracos dentro dos quais foram inseridas cinco caixas de som com cerca de dois metros de altura. Em determinado momento, elas são acionadas e ouvem-se trechos do samba “Juízo Final”, de Nelson Cavaquinho. A prática colaborativa parece adequar-se ao uso do vídeo ou filme, para além da comodidade prática. É um meio que se distingue por mobilizar o sentido de “equipe” em todas as tarefas envolvidas (atuação, filmagem, produção e edição) e pela possibilidade de construir estudos de comportamentos psicossociais e relações interpessoais. A artista inglesa Gillian Wearing, por exemplo, apresentou na 25ª Bienal de São Paulo um vídeo que é resultado de um exercício realizado ao longo de alguns anos. “Drunks” retrata o estado quase inconsciente de três bêbados numa rua de Londres, local que a artista vem estudando há algum tempo e trabalhando com as vítimas do excesso alcoólico e da depressão. O jovem artista brasileiro Laércio Redondo1, radicado em Estocolmo, Suécia, estuda a comunicação entre as pessoas em contextos diferentes. Em “Kidnapping Images”, um grupo de pessoas de diversas idades, que representa o estereótipo de uma boa família, está reunidas numa sala observando as imagens feitas por uma irmã morta há duas décadas. Se a condição temporal da linguagem fílmica estabelece a principal diferença entre o cinema e o filme artístico ou “independente”, há outro fator que merece ser mencionado, a saber: a integração do espaço-ambiente à projeção. Em “Art and Cinema” (catálogo da Documenta 11), Mark Nash diz que nos últimos 30 anos as práticas da imagem em movimento transformaram o espaço da arte contemporânea. Estava se referindo ao espaço de exibição de arte. Contrastando o espaço do cinema ao espaço do “cubo branco”, pode-se observar que o “cinema” de galeria tornou-se “um cinema de fragmentos”. Além do conteúdo e do vocabulário específicos a cada (video) artista, há uma distinção primária estilística que se dá na escolha de como expor o resultado final.


1 Laercio Redondo Kidnapping Images Videoinstalação/ video installation (2001) 60 min, loop, DVD

www.laercioredondo.com


A utilização de telas múltiplas, sua dimensão, os canais de projeção, locais e ângulos de projeção, contextualização espacial etc. são algumas das considerações que se integram a qualquer filme ou vídeo de artista hoje. No entanto, para além dos fatores temporais e espaciais da exibição de filmes e vídeos, percebe-se hoje a capacidade de reconstrução sucessiva, a abertura conceitual e formal que a linguagem fílmica possui. Independentemente do circuito de atuação do artista/videomaker/ cineasta, a qualidade investigativa e experimental proferida por esse meio, diferentemente do cinema “tradicional”, abriu um novo capítulo na História da Arte. Talvez seja o “movimento” estilístico mais paradigmático do momento histórico que vivemos – em relação à difusão incondicional da imagem que permeia a vida de cada um de nós. 1  Ver Gilles Deleuze, “Cinema: A Imagem-Movimento” e “A ImagemTempo” (1983), em que o filósofo francês oferece uma interpretação alternativa à teoria dominante psicanalítica e semiológica em torno da linguagem fílmica. Para Deleuze, o cinema não é uma linguagem sobre significados obscuros e metadiscursos inacessíveis. Pode ser compreendida de forma mais direta, na composição de imagens e signos, que são pré-verbais em natureza. Nos dois volumes, Deleuze reflete sobre a “imagem-percepção” (a forma básica da imagem-movimento) até o “cinema, corpo, cérebro e pensamento”, que é uma das culminações da imagem-tempo. 2  Recentemente traduzido ao português e publicado no Brasil, o ensaio do artista, escritor e diretor de filmes Brian O´Doherty “No Interior do Cubo branco – A Ideologia do Espaço da Arte”, Martins Fontes: 2002 (versão original em inglês publicada numa série de três artigos na revista “Artforum” em 1976), deu origem à expressão “cubo branco”, jargão referencial das artes visuais. O livro analisa (e ironiza) a relação do espectador e do artista com a obra de arte exposta no espaço da galeria modernista, descrito como sendo quase sempre um cubo de janelas lacradas, pintado de branco com luz vinda do teto. —

CINEMA AND THE VISUAL ARTS By Veronica Cordeiro Published in the Trópico Magazine – Idea from North to South – July of 2005 http://p.php.uol.com.br/tropico/html/index.shl Veronica Cordeiro is an ethnographic artist, curator and writer, presently living in Montevideo, Uruguay. She graduated in Art History at the University of Edinburgh and received a Masters degree in Visual Anthropology from Goldsmiths College, London. “ For the Eye altering alters all”. William Blake, “The Mental Traveler” Contemporary art in Brazil and the rest of the world has come to grips with the inexhaustible possibilities of exploring in film and video platforms. In large exhibitions, as in the dozen international Biennales around the world, or the Documenta, organized by Kassel, and the Manisfesta, among so many other seasonal exhibitions, it has become more and more common to encounter these dark, surrounded rooms where all kinds of film or video projections, as well as digital and audiovisual media, are being screened and experimented. The Vienna Biennale of 2001, for example, acquired the reputation of being the “video Biennale”, because of the diversity of films and video-installations shown in the exhibition. The range of projects was another telling aspect of the event. For example, beside the dilated and almost static images of “The Quintet of the Unseen” (2000), by the renown North-American video-artist, Bill Viola, one could find experiments conducted by filmmakers and multimedia artists. Abbas Kiarostami, as a matter of fact, projected an image of himself and his wife as they slept, on the floor of the Arsenale building. Chris Cunningham, the British artist known for his work with music videos (Bjork’s, “All is Full of Love”) showcased a film entitled “Flex” (2000) in which naked bodies appeared intertwined on a large screen. Perhaps the most innovative and surprising exhibition was entitled “Close” (2000), a partnership between the Canadian filmmaker, Atom Egoyan and the Portuguese painter, Julião Sarmento. The project consisted in a double screen which revealed spectators at a movie theatre at the screening of a film, entertaining the directors in a king of sadist perversion or revenge of his. REAL TIME EXPERIENCES Images in movement create a simulacrum of reality – the mimetic quality of film and video experimentation is what has concentrated the efforts of so many artists nowadays to this milieu. Their focus, however, is as diverse as reality itself. The reflection worth making here is not so much as to why the emergence of filmic language has overshadowed, to a certain degree, the conventional arts, because that would reduce the phenomenon to a mere question technological evolution – as was the case with photography and the rippling effect produced in all kinds of expression. It is worth considering how the use of the film, in all the rich variety of contents it comports, has developed both in form and concept, along the years, so as to situate our discussion in the context it requires. The distinctive element inherent to filmmaking is the quality it has of capturing “images in movement” – this is precisely the

element which distinguishes it from painting, sculpture, photography and other artistic techniques. Jean-Luc Godard point out that to the North-Americans, an image is a picture (a word that also serves to describe photography), while the term movie has the quality of designating movement. This is the foremost facet which separates film as we know it and observe it in the movie theatres, from the other kinds of uses of film by documentary filmmakers, video-artists, video makers film producers and even VJ’s. The films and videos exhibited in underground film festivals, or videos showcased in art galleries or other cultural institutions, are generally of shorter duration. In the art expo’s, the projection are continuously repeated and the spectator is given the choice of watching the entire skit or only a random fragment – as if there was no narrative cohesion to observe. But that isn’t enough to stop certain filmmakers, such as Douglas Gordon or Stan Douglas, from making interminable films, in which time is still the logical reference point, besides the question of duration being the reverse of the logic. The anguish the spectator feels watching “24 Hour Psycho”, by Gordon, in which the duration of Hitchcock’s’ “Psycho” is prolonged to 24 hours, or “Journey into Fear” (2002), by Stan Douglas, in which a single scene is reproduced 30 times for total duration of seven hours and forty minutes, seems to be the counterpoint to Gary Hill’s, “Wall Piece”, consisting in the main character repetitiously slamming a wall. Mathew Barney, one of the most reputed artists in the international film circuit today, is known for the series “Cremaster”, in which the artists, highly influenced by the filming of American football, creates a unique filmic style, both in form and content. The “Cremaster” films manage to distort the narrative flux of traditional films, challenging and questioning the conventional labels attached to a given style of film. Mixing autobiographical experiences with his fascination for sports and the exploration of violence therein – most usually from a masculine point of view… exploring man’s sexual impulses). Albeit Barney’s very original filmic aesthetic, he does not completely separate himself from the formalist traditions. In other words, he manages to create fables or similar kinds of narratives using literature, history, psychoanalysis and sociological thought, adapting it to the filmic palette. The relationships these artists have with film bring them very close to traditional cinema. Inversely, Brazilian filmmakers like Karin Ainouz and Beto Brant have managed to transit in between films and video art exhibiting their work in independent art festivals. Film or video? Many artists choose either using the video platform in theatrical experiments, using their bodies simultaneously as the subject and object of their work. Generally, they do so from a subjective vantage point; at other times their purpose is political trying to relate the public and private spheres of life. The North-American artist, Bruce Nauman, is a great reference in terms of this kind of experimentation. The Swiss artist Pipilotti Rist has also charmed spectators around the world. In Brazil, young artists such as Amílcar Packer (who uses video and photography to explore the divide the two); Fernando Lindote (using plastic residue to re-contextualize the environment, such as in the “Edax” video-installation); Brígida Baltar (with photographic and filmic register of her walks in the open-air, entitled “Collecting the Fog”). These are artists who document corporal and poetical

experimentation using the video as their instrument of preference and as the main vehicle of their multimedia installation. One must point out the difference between video-art and the research done by filmmakers and artists who privilege technology as their vehicle. Comparing the digital work done by Cao Guimarães with the different video experiments conducted in collaboration with Rivane Neuenschwander, this becomes very clear. Cao has made a number of documentaries and film, such as “Hypnosis”, “Between”. In a similar vein, Lucas Bambozzi has created video-installation which explores anthropological questions. On the other hand, the films made by the great South-African illustrator, William Kentridge, produced in the 16 and 35 mm – but usually transferred to video and DVD so to enhance the quality of the exhibition – manages to subvert this technical distinction. The starting point for the illustrator is in drawing the problematic political history of his country, literature, with a certain romantic tendency to explore the insignificance of man before the natures’ monumental proportions. Kentridge’s prolific production of illustrations is transferred to film through digital animation, in which the characters actually come to life through the movement of the images. The drawings are in black and white, usually ranging between an almost traditional and realistic aesthetic. The question that emerges could be summarized as follows: what is the difference between a video-artist and a filmmaker? And to which category does the visual artist belong, considering he/she uses video and film in his/ her works? Is all just a matter of where the work is exhibited, if either in a movie theatre or in a gallery or museum? Working in Partnership Along with the technological break which has transformed the artistic world, there is the phenomenon of producing in collaboration with other artists. Such is the case of Rivane Neuenschwander and Cao Guimarães in “An Inventory of Small Deaths”, a film which captures the fragility of a soap moving through space. Or in “Love Lettering”, a film produced by Rivane, along with Sergio Neuenschwander, now at the Pampulha Museum, in Belo Horizonte (2002). In this video, words are attached to the fishes in an aquarium producing beautiful visual poems as they move from side to side. Another Young artist from Minas Gerais, Marilá Dardot, produced a video entitled “Hic et Nunc” (Here and Now), based on an idea of Walter Benjamin’s’, regarding the loss of the aural quality in art. In the video a hand is seen writing verbs in a small white vase, while the hand erases the verbs, one after another. In the same year, Nuno Ramos and Eduardo Climachauska worked in collaboration to produce the film “Dark Light” (named after the exhibition). The movie was shot in the vicinity of Sorocaba (São Paulo), where two deep holes were dug into the ground and then filled with five boom-boxes measuring two meters in height. In a certain moment, all five are turned on and start playing “Juízo Final” (Final Judgment), by Nelson Cavaquinho. Collaborative work seems very appropriate in the making of films or videos. The team work involved in all stages of productions is proof of that. Consider the components involved: acting, filming, production and editing. It is a laboratory social behavior and interpersonal relations. The British artist, Gillian Wearing, for example, presented a video which is the product of

several years of footage. “Drunks” was exhibited at the 25th Biennale of São Paulo, portraying the almost unconscious state of three drunks roaming a street in London, the city this artist has chosen to study in depth, following the lives of workers victimized by alcoholism and depression. Another young Brazilian artist, Laércio Redondo, rooted in Stockholm, Sweden, has been exploring forms of communication between people in a variety of contexts. In “Kidnapping Images”, a group of various ages, representing the stereotype of a functional family, gathers in a room to observe images filmed by a sister of theirs, dead two decades prior. If the main difference between cinema and artistic/independent film is the conditions of time which it establishes, there is another factor which deserves being mentioned: the integration between the actual film and environment in which it is screened. In “Art and Cinema” (see catalogue of the Documenta 11), Mark Nash says that in the last 30 years the experiments using moving images has transformed the world of contemporary art. He was referring to the space where art is exhibited. Comparing movie theatres to the art galleries where these artistic films are shown, one will come to grasp with the fact that galleries exhibit a “cinema of fragments”. Besides the content and vocabulary which individualizes each kind of film, there is a primary stylistic in terms of the setting where the movie is exposed. The use of multiple screens varying in dimension, multiple channels of projection, in different angles and spatial contexts etc., are a few of the considerations that take part in brainstorming the production of film or artistic video. However, besides these logistical concerns, what we see emerge is a renewed capacity for reconstructing the language of film, the exploration of formal and conceptual possibilities. Regardless of the context where these independent films and artistic videos are exhibited, the experimental quality of the works being produced, unlike what is happening with traditional film, has certainly inaugurated a new chapter in the history of artistic production. Perhaps it is the most paradigmatic stylistic “movement” of our age, namely, the pervasiveness of the image as a symbol which floods our lives today. 1  For further consultation read Gilles Deleuze in “Cinema: Image in Movement” and “The Time-Image” (1983), in which the French philosopher offers a theoretical alternative to the dominating ideas of psychoanalysis and semiotics in regards to the filmic language. For Deleuze, film does not make use of obscure language or inaccessible metaphysical discourse. Instead, it can be understood as a direct composition of images and symbols, which are pre-verbal in nature. In both volumes of the work, Deleuze reflects on the concept of “image and perception”, which is one of the culminations of “image and time”. 2  Brian O’Doherty’s, “Inside the white cube: notes on the gallery space”, recently translated to Portuguese and published in Brazil, coined the expression “white cube”, a jargon frequently used in the arts world. The analyses (with a hint of irony) the relationship between the spectator and the artist when a work of art is exposed in the setting of a modern gallery. He describes the galleries as pretty much all alike, consisting of a cube with sealed window and walls painted white, with lights flooding from the ceiling.


FRAGMENTO/ PIECE #10 Todos os sons do silêncio Filme russo de 1929 ganha trilha sonora do Cinematic Orchestra e vira DVD Carlos Albuquerque, jornalista de O Globo — O que são alguns meses de atraso perto de 75 anos de silêncio? Se o querido zine-leitor se perdeu em meio a zilhões de lançamentos musicais no segundo semestre de 2003, não fique triste. Só androides com Inteligência Artificial e muita memória RAM poderiam acompanhar TUDO o que chega às lojas. Portanto, junte-se a nós e seja, enfim, apresentado a um dos melhores discos (e DVDs) do ano passado: “Man with a movie camera”, no qual o precioso grupo inglês The Cinematic Orchestra “musicou” um clássico do cinema, o filme (mudo) russo “Man with a movie camera”, dirigido pelo russo Dziga Vertov em 1929. O disco e o DVD (da sagaz Ninja Tune) são importados, mas o filme, com o nome “Um homem com uma câmera”, chegou aqui em DVD da Continental (esgotado na maior parte dos sites de venda) e na caixa “O cinema revolucionário soviético”. No filme, Vertov, um dos cineastas preferidos de Lênin, dá um start no cinema-verdade e retrata um dia na outrora poderosa União Soviética. Dividido em seis temas, ele mostra os trabalhadores nas ruas, nas fábricas e em seus momentos de lazer. São imagens deslumbrantes, com cortes, telas divididas e outras técnicas de edição que estavam muito além do seu tempo. Pergunte ao seu amigo cinéfilo que ele vai te explicar isso bem melhor. Além de todas as suas qualidades, “Man with a movie camera” tem ritmo. E é justamente aí que entra o Cinematic Orchestra. Há ritmo e repetição no filme. E isso é fantástico – declarou em entrevista à BBC o DJ, produtor e fundador da banda J. Swinscoe. Ora, o Cinematic Orchestra ganhou fama e passou a ser cultuado por causa do seu som, ahn, cinematográfico, espaçoso, aberto, meio soul, meio dark. Misturando músicos “de verdade” com samplers e scratches, o CO é uma banda de jazz eletrônico. Um jazz bem free, diga-se de passagem. E foi com essa credencial que o grupo foi chamado pelos organizadores do Festival de Cinema do Porto, em

All the sounds of silence The Cinematic Orchestra records a new soundtrack for a Russian film shot in 1929 and releases it on DVD Carlos Albuquerque, journalist from the O Globo newspaper

1999, para essa ambiciosa aventura: botar som no silêncio e fazer uma apresentação ao vivo acompanhando as imagens do filme. “Ficávamos dentro do estúdio olhando o filme numa televisão bem pequena enquanto buscávamos inspiração para as músicas” - conta Swinscoe numa entrevista incluída no DVD. O resultado ficou tão bom que, além de palmas, o show ganhou disco, DVD e gerou uma turnê na qual o CO está até agora. Para quem não tem milhas ou milhares de reais acumulados e não pode ir atrás da banda, a melhor opção é mesmo ver o DVD. Ele traz o filme, na íntegra, já com o som do CO ao fundo, num casamento perfeito: o som grandioso do Cinematic Orchestra inserido nas imagens de Vertov como se tivesse nascido assim, seja no enterro “embalado” pela atmosfera sombria de “Evolution” ou nas batidas quebradas de “Work it” acompanhando o frenético ritmo de trabalho das operárias russas. “Man with a movie camera”, o DVD, traz também trechos de um show do Cinematic Orchestra em Londres e o vídeo de “All that you give” (do discoirmão “Every day”, com a participação da lendária cantora Fontella Bass). O silêncio nunca soou tão bem. Texto do jornalista Carlos Albuquerque escrito em 2004 para o Jornal O GLOBO (Rio Fanzine) —

What are a few months of delay compared to nearly 75 years of complete silence? If the honorable reader hasn’t been able to keep track of the zillion musical releases in the second semester of 2003, there is no need to be wary. Only a bunch of Androids with loads memory RAM could possibly follow everything that makes it to the music stores. Therefore, join us at last, to discover one of the best albums released last year. Namely, a “Man with a movie camera”, the Russian film which the talented British band called The Cinematic Orchestra, composed a soundtrack for, The movie is cult classic directed by the Polish filmmaker, Dziga Vertov, in 1929. Both the album and the DVD (release by Ninja Tune) are imported. On the other hand, the movie was released locally thanks to Continental, but nearly sold out. It can also be found in the “Soviet Revolutionary Film” box-set. Vertov, one of Lenin’s favorite filmmakers, inaugurates his “true-cinema” saga, by which he portrays the daily life of the Russian people a decade after the October Revolution. Divided into six themes, Vertov shows the workers on the streets, in the factories, and in moments of leisure. There are truly wonderful scenes. The narrative and editing techniques used by Vertov are extraordinarily ahead of his time. Ask your closest film-buff friend for additional information. Besides other countless qualities, a “Man with a movie camera” has a special rhythm. And that’s precisely where the Cinematic Orchestra group comes in. There is plenty of rhythm and repetition in the film. That’s what makes it fantastic – said J. Swinscoe, the founder of the band, in an interview for the BBC. Cinematic Orchestra came to fame because of the undeniable qualities of their music: the spacious, open, soul-like, rather dark feeling their music conveys. Bringing in traditional musicians and DJ’s, samplers, scratchers, the CO is an electronic jazz band. A very free-feeling jazz band, one might add. The group first came to Brazil in 1999, to play at a film festival in Porto Alegre. It was the first time the Brazilian public got see them life, with their ambitious, adventurous rhythms, playing live accompanied the movies’ video projections. We recorded in a Studio, watching the movie played on very small TV screen, while we searched for the inspiration to make the music – remembers Swinscoe, in an interview featured in the DVD. The result was so exceptionally good that besides the deserved applause, the band produced an album, a DVD and began touring the world to show their work. So those of us who don’t have enough mileage or can’t come up with enough money to go see the band live, the best option is to buy the DVD. The DVD features the original film, edited with the soundtrack produced by the CO. The collaboration turned out a success – the music created the CO seems to have been a part of the movie ever since it conceived by Vertov back in 1929. Be it in the funeral scene accompanied by the somber atmosphere of the song “Evolution” or in the fast-paced “Work it” which

accompanies the frenetic rhythm of the Russian factory workers, one cannot remain indifferent to the combination. “Man with a camera”, on DVD, also brings excerpts of CO’s concert in London, as well as a music video of their former album, “Everyday”, with the legendary singer, Fontella Bass, as special guest. Written by Carlos Albuquerque in 2004 for the O GLOBO newspaper (Rio Fanzine)


FRAGMENTO/ PIECE #11 Paul D. Miller aka DJ Spooky Artista conceitual, escritor e músico que reside em Nova York www.djspooky.com Kino-Glaz/Kino-Pravda: Remix Este ano fui convidado para apresentar, no museu Hermitage, versões remixadas de filmes clássicos como “KinoGlaz” e “Kini Pravda”, do Dziga Vertov. Depoimento do Artista: “O drama convencional nos filmes é ópio do povo... abaixo os cenários faz de conta burgueses... Longa vida à vida como ela é!” – Dziga Vertov —

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Neste século XXI de reconhecida modernidade, o filme se tornou uma coleção de momentos editados, a que são dados uma sequência e trilha sonora. Quase sempre se utilizam de software digital. A mim me parece um processo de trabalho – a feitura de um filme – que esvaeceu as linhas divisórias entre outras formas de arte (música, arquitetura, design, etc.), visto que todas se utilizam de edição digital. A edição cinematográfica remete à colagem na qual se baseia a estética das mídias digitais contemporâneas. Basta olhar para as origens do cinema, principalmente a dois filmes de que dificilmente se escapa: “Sinfonia de uma cidade” (1927), de Walter Ruttman, e “Um homem com uma câmera” (1929), de Dziga Vertov. Para a apresentação realizada no Hermitage, queria voltar os olhos para as raízes do cinema clássico russo. Foi assim que acabei me envolvendo com filmes mais antigos e menos conhecidos do Vertov, anteriores aos clássicos, quais sejam: “Kino-Glaz” (1924) e “Kino-Pravda”. Voltando à apresentação no Hermitage, foi meu intuito mostrar conexões entre o “cinema revolucionário russo” e a mudança social na perspectiva da cultura DJ. O cinema russo sempre teve a preocupação de compor a realidade do dia a dia, com assuntos mais filosóficos que permeiam a cultura moderna. Temos, por exemplo, os filmes, “Encouraçado Potenkim”1 (1925), de Sergei Eisenstein, “Soy Cuba” (1964), de Mikhail Kalatozov, ou ainda, “Solaris” (1972), de Andrei Tarkovsky, cuja influência certamente será percebida no meu projeto de remixagem “Kino-Glaz/ Kino-Pravda”.

Montage é o termo francês que descreve “colocar junto”. No meu projeto de remixagem, tentei aproveitar a fascínio do século XXI com o realismo, utilizando-me dos recursos de documentos históricos e arquivos, para fazer uma conexão com a montage e outras ideias pioneiras que Vertov liderou. Em meu trabalho, substituí a trilha sonora original dos filmes “Kino-Pravda” e “Kino-Glaz” por um som contemporâneo, que combina a relação dialética entre a montagem de vídeo e o meu trabalho como compositor, artista plástico e escritor. Preparei, também, uma instalação utilizando reproduções das pinturas construtivistas do artista russo Malevich2, em forma de colagem, com os pôsteres de Aleksandr Rodchenko, que foram produzidos mais ou menos no mesmo período de atividade do Vertov. O que o Vertov gostava de chamar de “Kinochestvo” – ou seja, a arte de organizar “o movimento necessário de objetos no espaço, como uma única entidade rítmica harmoniosa” – funciona para mim, como um cinema ritmado. Vejo nesta instalação, bem como nos projetos dos filmes, uma busca histórica pelas raízes que Sergei Eisenstein gostava de chamar “a montagem dialética”. A ideia principal é mostrar as conexões entre a arte contemporânea, como a praticamos hoje, e a influência do cinema no modo que pensamos e fazemos a arte digital, tanto em filmes como na composição musical. Dziga Vertov foi, sem sombra de dúvida, um dos cineastas mais importantes do início do século XX. Curiosamente, seu nome verdadeiro era Denis Arkadevich Kaufman, mas a maior parte da sua obra foi realizada

sob o pseudônimo Dziga Vertov. Durante os anos de 1920, Dziga foi pioneiro no uso da colagem cinematográfica, como um meio de documentar a realidade da União Soviética na qual vivia, sem ter de se render à camisa de força do realismo, que limitava as possibilidades narrativas. Para Dziga Vertov, o cinema se apresentava como o veículo ideal para mostrar ao povo russo as novas ideias e maneiras de perceber o mundo, orientado pela dinâmica fluida da modernidade. Em outras palavras, era uma maneira de se demonstrar às pessoas que o mundo havia se transformado. Para fazer com que o povo russo compreendesse e apreciasse as transformações trazidas pela jovem Revolução Russa, era preciso, segundo Vertov, abolir as convenções narrativas de início, meio e fim. A experiência nas ruas deveria, igualmente, substituir o apego às fórmulas da produção tradicional com atores e cenários convencionais. Vertov queria apresentar a Revolução Russa como um acontecimento sem linearidade, um projeto de renovação da Humanidade, de modo a capturar em filme a luta do povo contra a opressão. Ele queria usar o cinema para encontrar uma liberdade quase impossível: mostrar que não existia limite à capacidade humana. Para mim, a cultura DJ herdou esse impulso – o impulso realista inerente à música hoje produzida nos centros urbanos. Se há alguma coisa que se assemelha à obsessão do cineasta para com o realismo, é a vontade de não perder o tato com a realidade, de não se enganar – um mantra que muito se repete no hip-hop. Vertov gostava de chamar o seu estilo de retratar o mundo de “kinografia” absoluta. Convém lembrar quantas décadas levou o Ocidente para se atualizar quanto às técnicas utilizadas pelos russos. Por exemplo, o movimento “Cinéma Verité” da França dos anos 1950 e 1960. “Kino-Pravda” significa nada menos que o cinema da verdade, donde se pode perceber a inspiração dos franceses. Kino-Glaz, em português, traduz-se como “Cinema do olho”. Em ambos os filmes, a começar por seus títulos, Vertov buscou traduzir a dinâmica da realidade de um tempo às voltas com a industrialização e as conquistas de trabalhadores através do esforço nas fábricas, celebrando, assim, a ruptura com uma era derrotada: a Rússia czarista. “Kino-Pravada” representa o nascimento do cinema moderno: ao usar esse termo, Vertov demonstrava acre-

ditar que o cinema poderia ser o meio adequado para se revelar as verdades escondidas. Através da justaposição de imagens haveria de se chegar a uma espécie de “lógica da montagem” – ideia muito cara ao DJ e VJ hoje em dia – que parece ter desaguado na realidade do século XXI, haja vista a “Web 2.0” e a produção de filmes que se realiza hoje, armazenados nos websites do YouTube, Facebook, Vimeo e outros. O mundo da web hoje nos remete ao que o teórico da comunicação Lev Manovich gosta de chamar “banco social de dados” – um lugar onde a busca pela informação leva a uma infinidade de assuntos, arquivos pessoais, e dados de toda sorte, que reforça, sobretudo, a ideia de que o cinema abriu o caminho para as complexidades do mundo moderno, funcionando como um espelho dessas transformações que percebemos na sociedade da era digital. Basta olhar em retrospectiva para a história da trilha sonora cinematográfica para se notar como esta se tornou componente integral do filme. O filme francês “O Assassinato do Duque de Guise” (1908 – título original: “La Mort de duc de Guise”), dirigido por Charles Le Bargy e André Calmettes, com roteiro de Henri Lavedan, atores do Comédie Française, e cenografistas importante da época, marcou história: foi um dos primeiros filmes a utilizar uma trilha sonora original, composta por Camille Saint-Saëns. Observando as duas “famílias” de cinema que surgiram na França no início do século 20 – o realismo dos irmãos Lumière e o teatro mágico de Georges Méliès –, fica fácil apreciar a influência técnica da montagem de Vertov e, quem sabe, ainda traçar um paralelo com o trabalho musical e de colagem que venho realizando, a exemplo do que foi feito no projeto Kino-Glaz/Kino-Pravda. O “Kino-Glaz” e o “Kino-Pravda” fizeram história pelo alcance das técnicas cinematográficas que Vertov inventou ou desenvolveu, quais sejam: a dupla exposição, o fast/slow motion, freeze frames, os close-ups radicais, as animações, a justaposição de ângulos de filmagem, as cenas rodadas em reverso, enfim, o estilo autorreflexivo. Tentarei explorar esses tipos de técnicas de representação através da interpretação musical das imagens realistas. No início do filme “Um Homem com uma Câmera”, Vertov afirmou: O filme “Um Homem com uma Câmera” representa UMA EXPERIÊNCIA

CINEMATROGRÁFICA DE TRANSMISSÃO DE FENÔMENOS VISUAIS. UM FILME QUE NÃO SE DIVIDE EM PARTES (um filme sem capítulos)/ SEM A AJUDA DE ROTEIRO (um filme sem roteiro)/ SEM A AJUDA DO TEATRO (um filme sem atores, sem cenários, etc.) A nova experiência iniciada pelo “Cinema-Olho” dirige-se para a criação de uma linguagem autêntica e internacional do cinema – “KINOGRAFIA” ABSOLUTA – com base na sua independência em relação à linguagem do teatro e da literatura. Ele começou o filme de 1924 com uma afirmação semelhante, desta feita, ainda mais imerso na rotina diária da Cultura Soviética e seus ideais de realismo: “ Kino-Glaz: É a primeira vez no mundo em que se tenta criar um filme sem a participação de atores profissionais, de artistas ou diretores; sem a utilização de estúdio cinematográfico, cenários ou vestimentas diferentes. Todos os participantes continuam a viver suas vidas do mesmo modo que antes das filmagens. presente filme representa um O assalto à nossa realidade, devassada que restou pelas câmeras, de modo a preparar o solo para criatividade esclarecedora contra um ambiente repleto de contradições de classes...” Como será que recepcionaremos, neste século XXI, o cinema vertiginoso e rítmico de Dziga Vertov? Este projeto é apenas um primeiro passo na estrada para o reconhecimento da influência exercida pelo pioneiro do século XX sobre a estética contemporânea. —


2 Kazimir Malevich A Cruz Negra, O Quadrado Negro e O Círculo Negro. Tríptico, 1923 The Black Cross, The Black Square and The Black Circle. Triptych, 1923


Paul D. Miller aka DJ Spooky Conceptual artist, writer, and musician working in New York. Kino-Glaz/Kino-Pravda: Remix This year I was invited (2009) to present a remix of Dziga Vertov’s classic films “Kino-Glaz” and “Kino Pravda” at the Hermitage museum. The following essay is about the project, followed by the film trailer. Artist Statement: “The film drama is the Opium of the people ... down with Bourgeois fairy-tale scenarios.. Longlive life as it is!” – Dziga Vertov In modern 21st century life, a film is a kind of collection of edited moments given a sequence and soundtrack. They’re almost always made using edited digital media software. For me, it’s a work process that has slowly blurred the lines between how other artforms (music, architecture, design, etc.) that are based on software editing operate as well -- film editing is a reflection of the collage based aesthetics of digital media, and if you look at the roots of cinema, you almost are always taken directly to a couple of films: Walter Ruttman’s “Symphony of A City” (1927) and Dziga Vertov’s “Man With a Movie Camera” (1929). For this concert at the Hermitage I wanted to look at some of the “roots of the roots” of this Russian cinema classic -- I ended up looking at some of the more rare versions of films Vertov made that led up to his classic, which led me directly to his early “Kino-Glaz” (1924) and “Kino-Pravda” collections of films. For the concert at the Hermitage, I want to show some of the connections between “revolutionary cinema” and social change from the view point of Dj culture. Russian cinema has always inter-twined everyday life with some of the issues that underly modern culture -- whether it was Sergei Eisenstein’s 1925 “Battleship Potemkin,” Mikhail Kalatozov’s “Soy Cuba” (1964), or Andrei Tarkovsky’s 1972 “Solaris,” and some of the issues that drove these early film makers will be a starting point for the “Kino-Glaz/Kino-Pravda” remix project. “Montage” is the French term for “putting together.” With my remix of “Kino-Glaz/Kino Pravda” I want to engage the 21st century fascination with realism and synthesis from archival resources and make a connection with some of the historical “montage” with some of the historical concepts that Vertov pioneered -- that is the basis for the Hermitage project. I’ve re-scored/ and re-mixed the “Kino-Pravda” and “Kino-Glaz” films with a contemporary soundtrack based on a combination of contemporary art’s dialectical relationship with video-montage and my work as a composer, artist, and writer. There is also an installation based on my remixes of early prints from Malevich’s Constructivist prints, and Aleksandr Rodchenko’s film posters that were also made around the same time as Vertov’s films. What Vertov liked to call “Kinochestvo” -- the art of organizing the “necessary movements of objects in space as a rhythmical artistic whole, in harmony with the properties of the material,” for me, becomes a cinema of rhythm. I look at both the installation and film projects as reflections of a historical search for the roots of what Sergei Eisenstein liked to call “dialectical-montage” -- the main idea is to show the connections between contemporary art practice, and how film has changed the way we think of contemporary digital art and sound composition.

Dziga Vertov is without question one of the more important filmmakers of the early 20th century. Amusingly enough, his real name is Denis Arkadevich Kaufman, and most of the material he made was under his pseudonym, which is the most well known aspect of his work. During the 1920’s he pioneered a style of collage-based cinema that documented the every day world of the Soviet Union in a way that was meant to destabilize the norms of what he felt were a kind of prison of story telling. To Vertov, film was a way of showing the Russian people that they needed new ideas and new ways of perceiving the world as a dynamic and completely flux-oriented milieu: in short, that things had changed for good. To be able to appreciate the dynamic, young revolution that had just occurred, Vertov felt that the Russian people needed a new cinema that did not obey the old bourgeois rules of “beginning, middle, and end” or even had normal actors, stage setting and design -- all of that would be taken care of by conditions in the “real world:” He wanted to present the revolution as a kind of “non-linear” project for renewing how people could present humanity and to illuminate the struggle against oppression. He wanted to use cinema to find freedom in a world where anything was possible. To me, Dj culture has inherited that same impulse -- the impulse towards “realism” is part and parcel of many of the musics of the urban landscape. If there’s anything that resembles Vertov’s obession with realism it’s the art of “keeping it real” -- a mantra one hears in hip hop at every level. Vertov liked to call his style of taking portraits of the everyday world “absolute kinography.” One must remember that it took filmmakers in the West many years to catch up with his techniques -- for example, the “Cinéma Vérité” movement of the 1950’s and 1960’s. Vertov’s “Kino-Pravda” simply means -- along with the French -- “cinema of truth.” Kino-Glaz, in English, translates as “Cinema-Eye.” In both films, Vertoz attempted to come up with a term that reflected language itself as a series of documents that evolved into a dynamic portrait of a rapidly changing world where things like electrification, industrialization, and the achievements of workers through hard labor were to be celebrated as a break with the hardship of the previous era in Russia. To me, this is a starting point of early modernism in film: in coining “Kino-Pravda” Vertov wanted to use film as a means of getting at “hidden” truth through juxtapositions of images which leads us to a kind of “logic of montage” -- much like a Dj or Vj would today -- the 21st century idea of “Web 2.0” has finally caught up with the super-imposition of film, representation, and the everyday world of websites like youtube, facebook, vimeo, and others. Today’s online world resembles what theorist Lev Manovich likes to call the “social data browser” -- it’s a place where the search for new material to contextualize leads to a search for new samples and new material from the archives of everyday life, databases, and above all, a collision between the way we live now, and the way film has helped give modern life a kind of continuously transforming mirror of the complexities of our information based digital economy. If one looks at the history of film soundtracks one can see how the “soundtrack” evolved as a core component of film. The “Assassination of the Duke of Guise” (1908) (original French title: “La Mort du duc de Guise”) was a French historical film directed by Charles Le Bargy and André Calmettes, adapted by Henri Lavedan, and

featuring actors of the Comédie Française and prominent set designers. It is one of the first films to feature an original film score, composed by Camille Saint-Saëns -- it too is an influence on this project. If you look at the two strands of cinema that came out of France at the beginning of the 20th century -- the realism of the the Lumière brothers, versus the theater of magic of Georges Méliès -- you can easily trace a link to the montage techniques of Vertov, and hopefully, to the sound and image collage that I have created for the Kino-Glaz/Kino-Pravda project. The “Kino-Glaz” and “Kino-Pravda” films are famous for the range of cinematic techniques Vertov invents, deploys or develops, such as double exposure, fast motion, slow motion, freeze frames, jump cuts, split screens, radically juxtaposed camera angles, extreme close-ups, tracking shots, footage played backwards, animations and a self-reflexive style -- the split screen tracking shot. I will explore these kinds of film representations through the filter of how sound interprets cinematic “realism.” At the beginning of his 1929 film “Man with a Movie Camera” Vertov proclaimed “The film Man with a Movie Camera represents AN EXPERIMENTATION IN THE CINEMATIC TRANSMISSION Of visual phenomena/ WITHOUT THE USE OF INTERTITLES/ (a film without intertitles)/ WITHOUT THE HELP OF A SCRIPT/ (a film without script)/ WITHOUT THE HELP OF A THEATRE/ (a film without actors, without sets, etc.) This new experimentation work by Kino-Eye is directed towards the creation of an authentically international absolute language of cinema - ABSOLUTE KINOGRAPHY - on the basis of its complete separation from the language of theatre and literature.” He began his 1924 film with a similar kind of statement with an even more direct link between the everyday world of Soviet Culture, and his ideas of realism: “The World’s first attempt to create a filmobject without the participation of actors, artists, directors; without using a studio, sets, costumes. All members of the cast continue to do what they usually do in life. T he present film represents an assault on our reality by the cameras and prepares the them of creative labor against a background of class contradictions...” How do we in the 21st century respond to Vertov’s “cinema of rhythm?” This project is just a first step along the path to understanding how cinema of the 20th century set the tone for the info-aesthetics of the 21st century.

DJ Spooky no Hermitage Foundation Museum, São Petersburgo, 2009 DJ Spooky at the Hermitage Foundation Museum, Saint Petersburg, 2009


FRAGMENTO/ PIECE #12 TRECHO DA Resolução do Conselho dos Três, 10/04/1923 Manifesto publicado no número 3 da revista Lef, de 1923. Dziga Vertov, diretor de “Homem com a câmera” (1929) —

Selection of excerpts from Resolution of the Council of Three Manifest published in the third issue of LEF magazine, 1923 Dziga Vertov, director of the “Man with a movie camera” (1929)

I AM KINO EYE.

I AM KINO EYE, I CREATE A MAN MORE PERFECT THAN ADAM, I CREATE THOUSANDS OF DIFFERENT PEOPLE IN ACCORDANCE WITH PRELIMINARY BLUE-PRINTS AND DIAGRAMS OF DIFFERENT KINDS


I AM KINO EYE.

I AM KINO EYE, I AM A MECHANICAL EYE. I, A MACHINE, SHOW YOU THE WORLD AS ONLY I CAN SEE IT.


ER GA TO V D VE ZIG RT A OV D VE ZIG RT A OV D VE ZIG RT A OV



MULTI 01_2009 Arnaldo Antunes + Marcia Xavier 15 de setembro/ September 15th Projeções na fachada do centro cultural por Vik Muniz/ Projections on the façade of the cultural center by Vik Muniz Arnaldo Antunes voz, efeitos e programações/ voice, effects and programming Edgard Scandurra voz, guitarra/ voice, guitar Marcelo Jeneci sanfona, violão de aço, sintetizadores, programações/ concertina, acoustic guitar, synthesizers, programming Demétrius Ferreira técnico de som/ sound technician Marcia Xavier cenário e projeções/ scenario and projections Vik Muniz projeções externas na fachada do Oi Futuro/ external projections on Oi Futuro’s external façade

Música, poesia e imagem não são um universo dissonante para a obra de Arnaldo Antunes. Apresentando-se com o auxílio de efeitos, samples e playbacks em algumas faixas, além do acompanhamento de Marcelo Jeneci na sanfona, violão e teclados e do parceiro Edgard Scandurra com efeitos rifados de sua guitarra, Arnaldo Antunes se deleita ao subir no palco para prover experimentações. Arnaldo remonta palavras dando a elas novos sentidos. Músico, compositor, poeta e artista plástico de meios e mídias variados, Arnaldo tem total domínio ao declamar, ao cantar e ao performar. Arnaldo recusa o óbvio, busca em seus trabalhos desafios e não nega as novas máquinas eletrônicas. Estímulo sensorial livre, como os artistas concretistas que tanto o inspiram. A performance (apresentada pela primeira vez no Oi Futuro Flamengo, em 2008, na abertura da temporada) traz inovação à poesia, fragmentação das palavras, ênfase em valores sonoros e recursos expressivos incomuns de sua comunicabilidade. Desta vez com Edgard Scandurra, o espetáculo – surgido a partir da releitura de seu trabalho “Nome”, de 1993, uma das principais referências multimídia naquela década no Brasil, resultado da união entre livro, vídeo, disco e show – ganha ressonâncias ímpares com uma sonoridade inimaginável recriada a partir de sua guitarra e seus pedais de efeito.

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O visual concebido pela fotógrafa e artista plástica Marcia Xavier, que manipulou ao vivo imagens de seus vídeos, era projetado numa grande tela curva reflexiva e, como espelho, criava um infinito jogo de cena numa grande parede 180º. Marcia Xavier trabalha com Arnaldo Antunes desde 2003, quando fez as imagens do livro de poesias “ET Eu Tu”, lançado pela Cosac Naify. Desde então, Marcia – que tem obras expostas em Cuba, México, Estados Unidos, Portugal, Espanha, Bélgica e nas principais galerias de arte do Brasil – vem assinando suas capas de disco e cuidando do contexto visual dos seus shows. www.arnaldoantunes.com.br

Music, poetry and image coexist in Arnaldo Antunes’ work. In his at the Multiplicidade Festival, using sound-effects, sampling and playbacks in some of his tracks, as well as the accompaniment of Marcelo Jeneci in the concertina, acoustic guitar and keyboards and Edgar Scandurra in the guitar, Arnaldo Antunes feels right at home climbing onstage to experiment. He shuffles words and pieces them back together shedding new light on their meaning. Musician, composer, poet and multimedia artist, Arnaldo has complete domination of the stage as he recites, sings and performs. He refuses repeating himself, and using other obvious tricks. In his work, Arnaldo seeks challenges and does not refuse the novelty of using electronics. Free sensorial stimulus is what Arnaldo seeks, just the Concrete artists of São Paulo, who inspired him, tried to do. In performance at the Oi Futuro Flamengo, in 2008, for the opening venue of the season, Arnaldo prepared a medley of poetry, fragmented wordplay and other unconventional resources of expression to enrich his show. This time with guitarist, Edgar Scandurra, the performance – originated from a rereading of his work, “Name”, from 1993, one of the most revered multimedia works of the decade, in Brazil – was enlivened by unique resonances and unimaginable sound effects coming from the guitar and pedals. The scenario onstage was conceived by photographer Marcia Xavier, who manipulated the images as they were projected in a large, curved screen, reflected onto a mirror, which created an infinite display, then reproduced on a wall of 180°. Marcia Xavier works with Arnaldo Antunes since 2003, when she prepared the images for his book of poetry entitle, “Et Eu Tu”, published by Cosac Naify. Since then, Marcia – who has had works exhibited in Cuba, Mexico, the U.S., Portugal, Spain, Belgium, not to mention the most important galleries in Brazil – has designed the covers of two of Arnaldo’s latest albums, as well as preparing scenario for his shows.







Multi 02_2010 Siri + Jr.Tostoi + Lenine + Deborah Engel 25 de Fevereiro/ February 25th

Multi 03_2010 Siri + Jr.Tostoi + Fausto Fawcett + Chacal + Deborah Engel 26 de Fevereiro/ February 26th

Siri concepção musical, percussão e trompete/ musical conception, percussion and trumpet André Moreno percussão/ percussion Sacha Amback teclados/ keyboards Jr. Tostoi guitarrra, programações e efeitos/ guitar, programming and effects Lenine voz e poesia/ vocals and poetry Fausto Fawcett voz e poesia/ vocals and poetry Chacal voz e poesia/ vocals and poetry Deborah Engel vídeos e cenário/ vídeos and stage settings Sergio Marimba cenografia/ stage design Alessandro Boschini iluminação/ lighting

O formato experimentado neste Multiplicidade especial subverteu a linha de produção. Foram três diferentes atos performáticos – Lenine, Fausto Fawcett e Chacal – em dois dias sob uma mesma camada uterino-sonora criada pelo músico Siri.

de experimentação através de encontros e pensamentos.

Após levar um Fusca 69 para o palco nas apresentações de seu álbum de estreia, espetáculo realizado em 2005, ano de surgimento do Multiplicidade, o percussionista Siri virou referência em experimentações audiovisuais com seu híbrido de arranjos de instrumentos de cordas e sopros com inusitadas percussões, videoarte e performance. Seu novo CD, “Ultrasom”, dá continuidade ao caminho deste lamurioso trabalho. Inspirado pela pulsação do ventre materno, o disco é uma viagem de sons, imagens e texturas registrados nas sessões da ultrassonografia de sua filha, Clara.

Lenine, pai e avô, declama “o valor que o pai tem”, numa composição inédita criada para este encontro. Entre repetições cadenciadas e explanações filosóficas, Lenine cria um mantra para traçar um perfil paternal emocionante de quem tem laços genéticos, mas não sabe o que é parir. Genialidade pura, digna de um artista-patrimônio da música popular brasileira, quando clama em extrema simplicidade pela sua mãe e recita: “Quem não tem mãe não tem nada.”

Transformando o útero, base de nossa existência, em antessala para o despertar da vida caótica, Siri, movido pelo encantamento da concepção humana, constrói um conjunto de sons, indo muito além das fórmulas da sonoridade instrumental brasileira e transforma em música e imagens toda a emoção dessa troca entre o embrião e a mãe, criando o que pode ser chamado de orquestra uterina. Além dos arranjos inusitados, Siri assina a produção musical e a gravação da parte rítmica, tocando instrumentos como bateria, tablas, didjeridoo, surdos, berimbaus e pandeiros, harmonium e trompete. Promovendo encontros inéditos desde sua criação, o Festival Multiplicidade desafiou o status definido do Ultrasom e foi inserindo novos inputs criativos. Um recorte transversal para redesenhar o formato existente. Um exercício livre 80

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Jr. Tostoi interfere com sutil sensibilidade com novas linhas sonoras retiradas de sua guitarra e manipuladas em efeitos que ecoam sobre as bases existentes.

Chacal, pai do vanguardista evento carioca CEP 20.000, que em 2010 completa 20 anos de vida, é um militante da poesia e de performances que divagam nos limites inflamados da palavra e seus múltiplos significados. Chacal tem na pele de sua trajetória tantos filhos-artistas que passaram no palco do seu evento, o Multiplicidade é mais um filho do que ele vem construindo, por que não? Chacal vai muito além. No Multiplicidade, ele dissecou onde havia e não havia vida. No final de sua atuação, retornou para encontrar Fausto e promoverem no palco um embate sobre a obstetrícia e as deformações genéticas. Fausto se prende a um fato jornalístico que soa como uma aberração, uma mãe americana que teve oito filhos de uma só vez, e traça uma profecia mística para entender o improvável. Dos controversos avanços da medicina até a imortalidade, tudo é tratado com humor explosivo, poético, muitas vezes

catastrófico apontando o rumo traçado pela Humanidade. É lançado o conceito do “Speed Darwin”; evolução vertiginosa da mutação da espécie. Fausto trouxe aos músicos as referências de King Crimson para sobrepor sonoridades aparentemente não melódicas para um novo entendimento musical de sua declamação. O cenário orgânico representa uma placenta. As projeções num anteparo translúcido dividiram o público dos artistas no palco e traziam um misto de constelações espaciais e combinações de DNA, que muitas vezes se confundiam. Em contraponto às imagens literais do interior do corpo humano ou o ultrassom de um bebê, Deborah criou vídeos poéticos em que por exemplo pétalas eram recompostas até sua origem natural, uma a uma, até formar novamente a vida de uma flor.

Página do caderno de Fausto Fawcett com ideias para sua apresentação / Fausto Fawcett’s sketch book with ideas for his performance


The format experimented at Multiplicidade revolutionized our line of production. There were three different performances – Lenine, Fausto Fawcett and Chacal – in two days under the same wombsound layer created by the musician Siri. After taking a Volkswagen Beetle 69 to stage for his debut album performances that occurred in 2005, year Multiplicidade’s inception, the percussionist Siri became a reference in audiovisual experimentation with his hybrid arrangements of string and wind instruments with unusual percussion, video art and performance. His new CD, “Ultrasom”, gives continuity to his emotional work. Inspired by the pulsation of the maternal womb, the album is a trip composed of sounds, images and textures recorded in the sessions of ultrasonography of his daughter, Clara. Transforming the uterus, basis of our existence, into an antechamber to wake him from his chaotic life, Siri, moved by his feeling of excitement regarding the human conception, builds a series of sounds that go beyond the regular formula for Brazilian instrumental sounds and transforms into music and images all the emotion of this exchange between the embryo and its mother, creating what can be called a womb orquestra. Besides unusual musical arrangements, Siri signs the musical production and the recording of the rhythmic part, playing instruments such as drums, tabla, didgeridoo, bass drums, berimbaus and pandeiros, harmonium and trumpets. Promoting unique gatherings since its creation, the Multiplicidade Festival challenged the defined status of the ultrasound and inserted new creative inputs. A transversal cut to redesign the current format. An exercise free of experimentation through encounters and thoughts.

old, is a militant of poetry and performances that concentrate on the extreme limits of words and their multiple meanings. Chacal has so many artist-sons that have gone through his stage that I dare say that Multiplicidade is yet an other son whom he has been building, why not? Chacal goes way beyond. In Multiplicidade, he dissected where there is and is not life. In the end of his performance, returned to meet Fausto and promoted, on stage, a discussion on obstetrics and birth defects. Fausto ties himself to a journalistic fact that sounds more like an aberration: an American mother who had octuplets. He traces a mystic prophecy to understand the improbable. From the controversial advances of medicine to immortality, everything is treated with explosive humor, poetic, many times catastrophic pointing to a road paved by humanity. The concept of “Speed Darwin” is coined; vertiginous evolution of the mutation of species. Fausto brought musicians the references of King Crimson to overlap sounds that seem apparently non melodic for a new musical understanding of his declamation. The organic scenario represents a placenta. The projections separate the public from the artists on stage and bring a mix of stellar constellations and DNA combinations that many times blend together. In counterpoint to the literal images of the interior of the human body or ultrasound of a baby, Deborah created poetic videos where, for example, petals were recomposed to their natural origin, one by one, until they formed the life of a flower.

Jr. Tostoi interferes with subtle sensibility with new riffs from his guitar and manipulated in effects that echo over the existing musical base. Lenine, father and grandfather, declaims “the value that the father has”, in a never before seen composition created for this gathering. Between repetitions and philosophical explanations, Lenine creates a mantra to devise an emotional paternal profile of one who has genetic ties, but does not know what it is to give birth. Pure genius, worthy of being a heritage of Brazilian popular music when he calls, in extreme simplicity, for his mother and recites: “Who has no mother has nothing.” Chacal, father of the vanguard carioca event CEP 20.000 which in 2010 becomes 20 years

Frames do making of do processo de criação do espetáculo / The making of perfomance’s creation


A nave híbrida por entre o corpo pulsante “‘Ultrasom’, intervenção sonora realizada por Siri em seu último CD, busca investigar os meandros de nossa fase uterina, basal para a compreensão dos desígnios que regem a existência. A pesquisa do artista baseia-se na premissa de que no ventre materno, antessala do despertar para o caos, somos embalados por sons límpidos, fluidos, quase imperceptíveis. Para comprovar a sua tese, Siri, tal qual um astronauta transversal aparamentado com as vestes das linguagens multipartidas, ingressou no corpo da mulher grávida e, durante os nove meses de gestação de sua filha Clara, fez uma viagem insólita. Nesse percurso, movido pelo encantamento da concepção humana, construiu um conjunto de sons que são o cerne de seu trabalho atual. A configuração de Ultrasom, como o próprio nome induz, dá-se através de ondas sonoras que acarretam um envolvimento completo, assim como a placenta que protege, nutre, vibra. Fazendo um paralelo com a arquitetura, possui a organicidade gaudiana, conjuminada com o traço preciso de Lucio Costa. Sofisticado em sua trama conceitual, Ultrasom é um projeto de cunho experimental absolutamente sintonizado com os meandros do contemporâneo, a começar pelo posicionamento do artista em não se abrigar em qualquer campo específico: Siri navega pelas vias turbulentas das fronteiras com a mente e o corpo abertos a qualquer experiência artística, depurando os significados para a construção de sua obra. Essa postura antropofágica e faminta faz dele um artista diferenciado, na medida em que não dissocia a arte da vida.” The hybrid vessel between the pulsating bodies “‘Ultrasom’, sound intervention by Siri in his latest CD, aims to investigate the meanders of our womb phase, basis to our comprehension of the purpose that rules our existence. The artist’s research is based on the premise that in the maternal womb, antechamber of the awakening to chaos, we are surrounded by pristine sounds, fluids, which are almost imperceptible. To prove his hypothesis, Siri, like a transversal astronaut equipped with the tools of fragmented language, entered the body of a pregnant woman and, during the nine months of gestation of his daughter Clara, made an unusual journey. Along this route, fueled by his feeling of excitement around human conception, created a series of sounds that are the basis of his current work. The configuration of Ultrasound (Ultrasom), as its name implies, is through sound waves that bring about a complete enclosure, like the placenta that protects, nurtures, and vibrates. Resembling architecture, it possesses Gaudi’s organic aspect along with the precise lines of Lucio Costa. Sophisticated in its conceptual plot, Ultrasom is an experimental project absolutely synched with the meanders of the contemporary, such as the lack of a specific artistic field: Siri navigates through the turbulent routes of the frontiers of the mind and body open to any artistic expression, cleansing the meanings to the construction of his work. This cannibalistic and hungry posture makes him a differentiated artist, as he does not dissociate art from life.”

Nelson Ricardo Martins





Multi 01_2009 Blind Date 10 de Novembro/ November 10th Naná Vasconcelos voz, percussão/ vocals, percussion DJ Dolores samples e programações/ samples e programming Lucas dos Prazeres percussão/ percussion Yuri Queiroga baixo/ bass Deco trombone/ trombone Parrô saxofone/ saxophone Raul Mourão concepção visual e projeções/ visual conception and projections Leonardo Domingues projeções/ projections Yan Motta projeções/ projections Maneco Quinderé iluminação/ lighting Geraldinho Magalhães produção artística/ artistic production JR Fontes assistência de produção/ assistant producer

Certamente este foi um dos maiores desafios do Festival. O apagão elétrico de grande parte do Brasil e uma pequena região do Paraguai atingiu em cheio o roteiro previamente esperado e conduziu o espetáculo para uma nova criação interativa entre artista e público, desvelando um novo sentido tempoespaço. Foram aproximadamente 30 minutos de um primeiro ato onde percussões remixadas eletronicamente misturavam-se ao cenário de duas grandes projeções até o corte de energia.

Quem cuidou do visual deste show, inédito, foi a dupla Raul Mourão, um dos artistas plásticos de grande destaque da geração 90, e o prestigiado editor e diretor Leo Domingues. As obras de Raul desenvolvem um vocabulário transversal de elementos da cena urbana deslocados de seu contexto natural. Já Leo Domingues, que iniciou sua carreira editando documentários, videoclipes e comerciais, atualmente dedica seu tempo à direção de documentários.

Nesse encontro às escuras (Blind Date), a única regra preestabelecida nos seguintes 40 minutos foi a improvisação orgânica dos tambores e outros elementos percussivos que sucumbiam à existência da eletricidade. A escuridão foi o cenário perfeito para ilustrar um ambiente enigmático e sensorial para a audição dentro do teatro até a saída apoteótica para a rua com cerca de 500 pessoas, num grande cortejo de cantos e entoadas de coco e maracatu, remetendo ao universo do carnaval popular pernambucano.

Em paradigma ao inesperado episódio da falta de energia, tivemos como convidado especial deste espetáculo um dos mais importantes iluminadores de teatro e shows do Brasil, Maneco Quinderé, que deixou sua marca num balé de luzes e fumaça, criando ambientes cromáticos durante os 30 minutos em que reinou a eletricidade.

O projeto “Blind Date” surgiu a partir de uma trilha sonora composta para uma exposição de arte, onde DJ Dolores e Naná Vasconcelos se reuniram e decidiram experimentar novas fusões. Com os instrumentistas da nova geração pernambucana Lucas dos Prazeres (percussão) e Yuri Queiroga (multi-instrumentista, filho do maestro Spok, sobrinho de Lula Queiroga), além da dupla de metais Parrô (sax) e Deco (trombone), Naná improvisa sons enquanto Dolores dispara de seu laptop batidas hipnóticas e fortemente percussivas aliadas a samples.

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This was certainly one of the biggest challenges of the Festival. The electric blackout in large parts of Brazil and in a small region of Paraguay hit the previously expected plan and led the performance to a new interactive creation between the artist and the public, making apparent a new sense of time-space. It was approximately 30 minutes of a first act, were percussions that were remixed electronically mixed themselves with the scenes of two big projections until the energy was cut. In this unlit gathering, the next 40 minutes that were to come, the only pre-established rule was the organic improvisation of drums and other percussive elements that succumbed to the existence of electricity. The darkness was the perfect stage to illustrate an enigmatic and sensorial ambience inside the theater culminating towards the exit to the street with around 500 people, in a procession of singing and clanging of coconuts and maracatu, sending to the universe the sound of the popular carnival of Pernambuco. The project “Blind Date” appears from a sound track composed for an art exposition where DJ Dolores and Naná Vasconcelos came together and decided to experiment new fusions. With a new generation of Pernambuco musicians, Lucas dos Prazeres (percussion) and Yuri Queiroga (multi instrumentalist son of maestro Spok, nephew of Lula Queiroga), as well as the metals doubles Parrô (saxophone) and Deco (trombone), Naná improvises sounds while Dolores fires out of her laptop hypnotic heavily percussive beats and samples. Who took care of the visual of this show, in a never before seen format, were Raul Mourão, one of the plastic artists of great prominence of the 90s generation, and the esteemed editor and director Leo Domingues. The works of Raul create a transversal vocabulary of elements of the urban scene dislocated from their natural context. Leo Domingues, who began his career editing documentaries, video clips and commercials, now dedicates his time to the direction of documentaries. In paradigm to the unexpected episode of the blackout, we had, as a special guest, one of the most important theater and show lighting specialist of Brazil, Maneco Quinderé, who left his mark in a ballet of lights and smoke, creating chromatic ambiences during the 30 minutes electricity reigned.

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Multi 02_2009 Principles of Geometry + AntiVJ (França/ France) 17 de Novembro/ November 17th A Stereoscopic Show Jeremy Duval teclado, programações/ keyboard, programming Guillaume Grosso teclado, programações/ keyboard, programming Alberto Malo bateria/ drums Joanie Lemercier projeções 3D/ 3D projections Nicolas Boritch produção/ production

“A Stereoscopic show” é uma colaboração entre o projeto de música eletrônica retrô-futurista francês Principles of Geometry e o coletivo de artistas visuais europeu AntiVJ, que propõe uma nova dimensão ao universo audiovisual. Depois de um ano imerso em pesquisas e desenvolvimento, o coletivo ou, como eles preferem se definir, selo visual (Visual Label) AntiVJ desenvolveu, com o apoio da organização cultural francesa Arcardi, várias ferramentas para gerenciar conteúdo 3D ao vivo. Utilizando a técnica da estereoscopia (a mesma tecnologia utilizada nos cinemas IMAX para assistir a filmes de alta definição com óculos 3D) e assim criar ilusões de ótica através da sobreposição de duas imagens planas, combinadas num pequeno ângulo, o AntiVJ cria uma jornada espacial, em tempo real, reunindo paisagens futuristas e elementos geométricos em movimento num universo em 3 dimensões, monocromático e minimalista. O “A stereoscopic show” já aconteceu no Museu Nacional de Arte da Estônia durante o Plektrum Festival, no Enghien Art Center, na França, e no Elektra Festival em Montreal, Canadá, todas as apresentações realizadas em 2009. Dupla francesa formada por Guillaume Grosso e Jeremy Duval com a participação do baterista convidado Alberto Malo, o Principles of Geometry se vale da estética sonoro-eletrônica dos anos 70 (repleta de sintetizadores) e de trilhas de cinema para criar uma sonoridade épica e lânguida. Influenciado pelos artistas Air, Mogwai, Boards of Canada, Aphex Twin e Brian Eno, o Principles of Geometry já trabalhou e remixou os artistas da nova geração francesa Sebastien Tellier, Joakim, Mr Oizo e Vast Aire.

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Já os artistas visuais AntiVJ são especializados em instalações multimídia, projeções arquitetônicas mapeadas com abraçamento tecnológico, experimentos visuais e performances audiovisuais com truques tecnológicos. O selo AntiVJ é formado hoje por cinco artistas visuais: Joanie Lemercier (crustea), Olivier Ratsi (Emovie), Romain Tardy (Aalto), Yannick Jacquet (Lego_man) e Simon Geilfus. www.antivj.com/POG www.principlesofgeometry.com http://www.arcadi.fr/

“A Stereoscopic show” is a collaboration between the retro-futuristic French music project Principles of Geometry and the collective of European visual artists AntiVJ, that propose a new dimension to the audiovisual universe. After a year immersed in research and development, the collective or, as they prefer to define themselves, Visual Label AntiVJ developed, with the support of the cultural French organization Arcardi, various tools to manage 3D content live. Using the stereoscopic technique (the same used in IMAX theaters to watch films in high definition with 3D glasses) thus creating optical illusions from the overlapping of two plane images combined at an angle, AntiVJ creates in a spatial journey, in real time, gathering futuristic landscapes and geometric moving elements in a universe in 3 dimensions, monochromatic and minimalist. The “A stereoscopic show” has already taken place in the Museum of National Art of Estonia during Plektrum Festival, in Enghien Art Center in France, and in the Elektra Festival in Montreal, Canada, all of which occurred in 2009. A French double formed by Guillaume Grosso and Jeremy Duval with the participation of guest drummer Alberto Malo, the Principles of Geometry values itself from the electronic musical aesthetics of the 70s (filled with synthesizers) and movie tracks to create an epic sound. Influenced by the artists Air, Mogwai, Boards of Canada, Aphex Twin and Brian Eno, the Principles of Geometry has worked with and remixed artists of the new French generation Sebastien Tellier, Joakim, Mr Oizo and Vast Aire. The visual artists AntiVJ are specialized in multimedia installations, architectural projections mapped with technology, visual experiments and audiovisual performances with technological tricks. The label AntiVJ is composed of, today, by five visual artists: Joanie Lemercier (crustea), Olivier Ratsi (Emovie), Romain Tardy (Aalto), Yannick Jacquet (Lego man) and Simon Geilfus.






Multi 03_2009 The Cinematic Orchestra (Inglaterra/ England) 15 de Dezembro/ December 15th Man with a movie camera Jason Swinscoe programações/ programming Luke Flowers bateria/ drums Larry Brown voz, violão/ vocals, guitar Tom Chant saxofone, clarineta/ saxophone, clarinet Ivo Neame teclado/ keyboard Stuart MacCallum guitarra/ guitar Phil France baixo/ bass Heidi Vogel voz/ vocals Paul Hatt técnico de som/ sound technician Stephen Hodge técnico de som/ sound technician Joe Theophilus produção artística/ artistic production Samuel Betts iluminação/ lighting

The Cinematic Orchestra é um grupo inglês de jazz e eletrônica que mistura músicos virtuosos com samples e scratches, formado no final da década de 90 pelo músico, compositor e produtor Jason Swinscoe, e que inclui vários instrumentistas – no Brasil foram oito músicos no palco.

uma montagem avançadíssima para a época e ainda vanguarda para os dias atuais, Vertov utiliza técnicas até então inexistentes ou minimamente usadas, como divisão de telas, enquadramentos angulados, câmera lenta, sobreposições incomuns e cortes rápidos, algumas vezes, subliminares. Hoje o filme, considerado na época como um manifesto do cinema-verdade, pode ser visto como uma primeira e pioneira experiência da linguagem do videoclipe.

Na época, então funcionário da fundamental gravadora Ninja Tune, um dos selos mais autorais dos últimos 20 anos, Swinscoe, que também era DJ e músico (guitarra e baixo), juntou sua paixão por trilhas de cinema (Bernard Hermann, John Lurie), clássicos do jazz e grandes orquestras num projeto especializado na criação de ambientes sonoros, ou “cinematográficos”, entre a improvisação jazzística e a música eletrônica. Nascia o The Cinematic Orchestra.

É o cinema-verdade de Vertov com a trilha ao vivo do The Cinematic Orchestra que o Festival Multiplicidade exibiu pela primeira vez no Brasil. Um poema sinfônico baseado em imagens, ou melhor, um poema cinemático. No final da exibição de “O homem com uma câmera”, a banda ainda apresentou algumas músicas de seu último disco de estúdio, “Ma fleur.”

É impossível falar no The Cinematic Orchestra e não mencionar a sonoridade cinematográfica de sua música. Em 1999, por exemplo, ano de lançamento de seu primeiro álbum, “Motion”, a banda foi convidada a participar de dois dos mais importantes projetos de sua carreira, ambos ligados ao cinema. Num deles, o Cinematic tocou durante a cerimônia póstuma pelo prêmio de conjunto da obra de Stanley Kubrick, diretor de cinema que havia falecido naquele ano. Em outro, a convite do comitê organizador da cidade do Porto como a Capital Europeia da Cultura de 2001, o The Cinematic Orchestra escreveu e musicou ao vivo uma trilha sonora alternativa para o revolucionário filme russo “O homem com uma câmera” (1929), de Dziga Vertov.

Ao todo, o The Cinematic Orchestra lançou quatro álbuns: “Motion” (1999), “Remixes 98-2000” (2001), “Every day” (20021), “Man with a movie câmera” (2003), “Ma fleur” (2007) e os discos ao vivo “Live at Albert Hall”, “Live at Barbican” e “Live at Roundhouse”, todos de 2008. Já tocaram em alguns dos principais festivais de música do mundo, como Homelands, Essential e The Big Chill (Inglaterra), Sónar (Espanha), Celorico de Basto (Portugal), North Sea Jazz and Drum Rhythm (Holanda), Cannes (França), Fuji Rock (Japão) e Montreux (Suíça), sem contar os inúmeros festivais de jazz e os principais clubes do estilo mundo afora.

Considerado um experimento na época de seu lançamento, “O homem com uma câmera” acompanha o dia a dia da vida da classe trabalhadora russa nas fábricas e nos seus momentos de lazer. Com 112

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The Cinematic Orchestra is a British group of jazz and electronic music that mixes virtuous musicians with samples and scratches formed in the end of the 90s by the musician, composer and producer Jason Swinscoe, and includes various musicians – In Brazil there were eight musicians on stage.

It is the cinema verité of Vertov with the live track of The Cinema Orchestra that the Multiplicidade Festival exhibits for the first time in Brazil. A symphonic poem based in images, or rather, a cinematic poem. After the showing of “A man with a movie camera”, the band still performed some tracks for its latest album “Ma fleur.”

Back then, an employee of the important record label Ninja Tune, Swinscoe, who was also a DJ and musician (guitar and bass), joined his passion for movie soundtracks (Bernard Hermann, John Lurie), classics of jazz and great orchestras in a project that specialized in the creation of sound ambiences or “cinematic”, between the jazz improvisation and electronic music. The Cinematic Orchestra was born.

In all, The Cinematic Orchestra released four albums: “Motion” (1999), “Remixes 98-2000” (2001), “Every day” (20021), “Man with a movie camera” (2003), “Ma fleur” (2007) and the live albums “Live at Albert Hall”, “Live at Barbican” and “ Live at Roundhouse”, all from 2008. They have performed in some of the most important music festivals in the world such as Homelands, Essential and The Big Chill (England), Sónar (Spain), Celorico de Basto (Portugal), North Sea Jazz and Drum Rhythm (Holland), Cannes (France), Fuji Rock (Japan) and Montreux (Switzerland), not to mention countless jazz festivals and major clubs of the sort around the world.

It is impossible to speak of The Cinematic Orchestra without mentioning the cinematic sound of its music. In 1999, for example, year of the debut of its first album “Motion”, the band was invited to participate in two of the most important projects of its career, both linked to cinema. In one of them, The Cinematic played during the posthumous ceremony for the award of the work of Stanley Kubrick, movie director who had passed away that year. In another, by invitation from the organizing committee of the city of Porto as the European Capital of Culture of 2001, The Cinematic Orchestra wrote and performed live an alternative sound track for the revolutionary Russian film “A man with a movie camera” (1929) from Dziga Vertov. Considered an experiment at the time of its debut, “A man with a movie camera” shows the day to day life of the Russian working class in the factories and in its moments of leisure. With very advanced special effects for the time and still a vanguard for the current times, Vertov uses techniques that were then inexistent or minimally used such as splitting screens, angled scenes, slow motion, unusual overlapping and quick cuts, sometimes subliminal. Today the movie, which was considered at the time a manifest of the cinema verité, can be seen as a first and pioneer experience of the language of the video clip.







Oi Futuro

Equipe Festival Multiplicidade Teatro Oi Futuro, Oi Casa Grande

PRESIDêNCIA PRESIDENT José Augusto da Gama Figueira

IDEALIZAÇÃO, DIREÇÃO E CURADORIA CONCEPTION, DIRECTION AND CURATORSHIP Batman Zavareze (27+1)

TÉCNICO DE SOM AUDIO TECHNICIAN Eduardo Baldi Filipe Pires

ASSISTêNCIA DE DIREÇÃO E PRODUÇÃO DIRECTION ASSISTANT AND PRODUCTION Chico Linhares

ILUMINADOR LIGHTING Humberto Banha Bruno Barreto

COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO PRODUCTION COORDINATION Tathiana Lopes Ricardo Scheleder (WeDo)

ILUMINADOR ASSISTENTE LIGHTING ASSISTANT Edson de Souza

VICE-PRESIDêNCIA VICE-PRESIDENT George Moraes DIREÇÃO DE CULTURA DIRECTOR OF CULTURE Maria Arlete Gonçalves DIREÇÃO DE EDUCAÇÃO DIRECTOR OF EDUCATION Samara Werner DIREÇÃO DE MARKETING E CONTEúDO MARKETING AND CONTENT DIRECTOR Wellington Silva DIREÇÃO ADMINISTRATIVO-FINANCEIRA FINANCIAL AND ADMINISTRATIVE DIRECTOR Flavio Copello

PRODUÇÃO PRODUCTION Isabela Saboia (WeDo) Rafael Otero (WeDo) Roberto Bianchi

FOTOS PHOTOS Rodrigo Torres Lucas Werthein Gregoire Basdevant Gabi Carrera TRATAMENTO FOTOGRÁFICO PHOTOGRAPHIC TREATMENT Marcio Leitão

DIREÇÃO INSTITUCIONAL INSTITUTIONAL DIRECTOR José Zunga

ASSISTêNCIA DE PRODUÇÃO PRODUCTION ASSISTANT José Ricardo Silva (WeDo) Kika Couto

CURADORIA DE ARTES VISUAIS VISUAL ARTS CURATOR Alberto Saraiva

DIREÇÃO DE ARTE ART DIRECTION Leonardo Eyer (Boldº)

CURADORIA DE ARTES CêNICAS SCENIC ARTS CURATOR Roberto Guimarães

DESIGN, VÍDEOS E SITE GRAPHIC DESIGN, VIDEO AND WEBSITE Adriano Motta (Boldº)

PRODUÇÃO DE ARTES CêNICAS SCENIC ARTS PRODUCER Lúcia Nascimento

CENOGRAFIA SCENOGRAPHY Susana Lacevitz (Cenografia.net) Daniela Rodrigues (Cenografia.net) Philippe Midani (Cenografia.net) Mario Passos (WeDo) Jully Troitiño (WeDo) Érica Schwarz (WeDo) Evangelista

ASSESSORIA DE IMPRENSA PRESS LIAISON MNiemeyer

CENOTÉCNICO STAGE SETTING Alex Augusto Silva

PRODUÇÃO EXECUTIVA E ADMINISTRAÇÃO EXECUTIVE PRODUCTION AND MANAGEMENT Mirian Peruch (27+1)

DESENVOLVIMENTO DE COMUNICAÇÃO COMMUNICATION DEVELOPMENT Sabrina Candido ASSESSORIA DE IMPRENSA PRESS LIAISON Graciela Urquiza Mendes Roberta Salomone EQUIPE TEAM Bruna Costa Claudia Leite Leandro Porto Maria de Fátima Santana Rakel Cogliatti Sérgio Pereira Tatiana Laura Victor D’Almeida Viviane Lepsch

CAMERAMAN E EDIÇÃO CAMERAMAN AND EDITION João Oliveira CAMERAMAN CAMERAMAN Marcio Zavareze Emanuel Santos Valério Correia

CONTABILIDADE ACCOUNTING Macedo&Muzzio CONSULTORIA DE PROJETO PROJECT CONSULTANT José Carlos Barbosa

CENOTÉCNICO ASSISTENTE STAGE SETTING ASSISTANT Robson Luiz M. Nascimento COORDENAÇÃO TECNOLÓGICA TECHNOLOGICAL COORDINATION Fabio Ghivelder PROJEÇÕES E INSTALAÇÕES MULTIMÍDIA PROJECTIONS AND TECHNOLOGICAL INSTALATIONS All Business DIREÇÃO DE PALCO STAGE DIRECTION Marcio Barros

UM PROJETO DA 27 MAIS 1 COMUNICAÇÃO VISUAL A PROJECT BY 27 MAIS 1 COMUNICAÇÃO


Livro

CONCEPÇÃO E CURADORIA CONCEPTION AND CURATORSHIP Batman Zavareze (27+1) ASSISTêNCIA DE DIREÇÃO DIRECTION ASSISTANT Chico Linhares DIREÇÃO DE ARTE ART DIRECTION Leonardo Eyer (Boldº)

FOTOS PHOTOS Lucas Werthein Gregoire Basdevant Rodrigo Torres Gabi Carrera Camilla Maia TRATAMENTO FOTOGRÁFICO PHOTOGRAPHIC TREATMENT Lastudio

PROJETO GRÁFICO GRAPHIC DESIGN Adriano Motta (Boldº) Lucas Pires (Boldº)

TRADUÇÃO TRANSLATION João Fonseca

PRODUÇÃO GRÁFICA PROOFING PRODUCTION Sidnei Balbino

REVISÃO PROOFREADING José Figueiredo

TEXTO TEXT Batman Zavareze Alberto Saraiva Arlindo Machado Arnaldo Antunes Belisario Franca Cao Guimarães Carlos Albuquerque Dziga Vertov Hermano Vianna Numa Ciro Paul D. Miller aka DJ Spooky Verônica Cordeiro Vik Muniz

PRODUÇÃO EXECUTIVA EXECUTIVE PRODUCTION Mirian Peruch (27+1) EDITORA PUBLISHER Aeroplano COORDENAÇÃO EDITORIAL EDITORIAL MANAGEMENT 27 Mais 1 Comunicação Visual Ltda AGRADECIMENTOS ACKNOWLEDGMENTS Mirian Peruch, Maria Arlete Gonçalves, Roberto Guimarães, Adriana Rattes, Mariana Varzea, Tatiana Assumpção Richard, Victor D´Almeida, Lúcia Nascimento, Pedro Genescá, Sabrina Candido, Heloisa Buarque de Hollanda, Elisa Ventura, Camilla Savoia, Jorge Zahar Editor, Editora Capivara, Raul Mourão, Camilla Maia, Fabio Ghivelder, Vik Muniz Studio, Arnaldo Antunes, Hermano Vianna, Belisario Franca, Numa Ciro, Veronica Cordeiro, Calbuque, Dj Spooky, Stephen Cohen, Alberto Saraiva e Bebeto Abrantes.


CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ M926 Multiplicidade / org. Batman Zavareze ; [versão para o inglês João Fonseca]. - 1.ed. - Rio de Janeiro : Aeroplano, 2010. 176p. : il. Festival Multiplicidade 2009 Texto belíngue, português e inglês Inclui bibliografia ISSN 2177-7187 1. Multiplicidade (Projeto cultural). 2. Arte e tecnologia. 3. Multimídia (Arte). I. Zavareze, Batman. 10-2323.

CDD: 700.105 CDU: 7.021

18.05.10 019295

27.05.10

Todos os direitos reservados AEROPLANO EDITORA E CONSULTORIA LTDA. Av. Ataulfo de Paiva, 658 / sala 401 | Leblon Rio de Janeiro – RJ – cep: 22440-030 Tel: (21) 2529-6974 | Fax: (21) 2239-7399 e-mail: aeroplano@aeroplanoeditora.com.br www.aeroplanoeditora.com.br Copyright © Batman Zavareze, 2010 curadoria Batman Zavareze coordenação editorial 27 Mais 1 Comunicação Visual Ltda. produção executiva Mirian Peruch projeto gráfico Leonardo Eyer fotos Lucas Werthein, Rodrigo Torres, Grégoire Basdevant revisão José Figueiredo revisão tipográfica José Figueiredo

Apoio: MTV O GLOBO OI INTERNET OI KABUM! CENOGRAFIA.NET ALL BUSINESS OI FM LASTUDIO Design Gráfico:

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