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Figura 11: Converso sobre qualquer assunto (2008) – Performer Eleonora Fabião

26 É quase raro ver uma performance que não questione os problemas sociopolíticos presentes na nossa sociedade. Esse incômodo pode estar presente em uma ação tão simples que pode passar despercebida dos olhares menos atentos. Como, por exemplo, quando uma mulher leva, para o centro da cidade, dois bancos e uma placa com os dizeres “converso sobre qualquer coisa”15 .

Figura 11: Converso sobre qualquer assunto (2008) – Performer Eleonora Fabião. Fonte: Disponível em: <https://www.itaucultural.org.br/rumos-2013-2014-a-arte-de-criar-o-mundo-que-se-deseja> Acesso, fevereiro de 2020.

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As questões sociopolíticas também estão presentes quando um homem é convidado a performar em uma galeria de arte nos Estados Unidos e decide que não pisa em solo estadunidense16; então, é levado de maca para a galeria e performa ao lado de um lobo.

Está claro que, hoje em dia, até a arte existe como parte de uma situação política. O que não quer dizer que a arte tem de ser vista em termos políticos ou ser explicitamente engajada, mas a maneira como os artistas tratam sua arte, onde eles a fazem, as chances que se tem de fazê-la, como ela será veiculada e para quem – é tudo parte de

15 Converso sobre qualquer assunto (2008) – Performer Eleonora Fabião: nessa proposta, Fabião leva duas cadeiras e um cartaz com os dizeres: “converso sobre qualquer assunto” para as calçadas das cidades. As pessoas se aproximam e trocam com a artista suas experiências, dúvidas, alegrias e frustrações. 16 Coyote: I Like America and America Likes Me (1974) – performer Joseph Beuys : A “performance” se inicia no Aeroporto John Kennedy. Joseph Beuys chega da Alemanha e desce do avião enrolado dos pés à cabeça em feltro (ele comenta mais tarde que esse material representava para ele um isolante tanto físico quanto metafórico). Do aeroporto, Beuys é carregado numa ambulância (ele já chega em más condições físicas por causa do feltro) para o espaço onde conviverá com um coiote selvagem por um período de sete dias. Durante esse tempo, os dois estiveram isolados de outras pessoas, sendo separados do público visitante da galeria por uma pequena cerca de arame. Os rituais diários de Beuys incluíam uma série de interações com o coiote, onde eram “apresentados” objetos para o animal — feltro, uma bengala, luvas, uma lanterna elétrica e o Wall Street Journal (entregue diariamente). O jornal era rasgado e urinado pelo animal, numa espécie de reconhecimento, à sua maneira, pela presença humana. Essa “performance” se denominou Coyote: I Like America and America Likes Me. (COHEN, 2013, pág. 51-52)

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um estilo de vida e de uma situação política (LIPPARD, 1973, p. 8-9 apud FABIÃO, 2009).

Figura 12: Coyote: I Like America and America Likes Me (1974) – Performer Joseph Beuys. Fonte: Disponível em: <https://www.wikiart.org/en/joseph-beuys/i-like-america-and-america-likes-me> Acesso, fevereiro de 2020.

A performance convida o performer ou a performer e o espectador ou a espectadora a se posicionarem, a questionarem sua forma de pertencer a um sistema que aprisiona e nega, o tempo todo, o corpo e as escolhas individuais. Afinal, se uma performer17 escolhe estar em plena praça da Estação, na cidade de Belo Horizonte/MG, com uma cadeira, e a utiliza para diversas coisas, menos para sentar, o que fazer a não ser apreciar tamanha “insanidade”? Pode ser que o espectador não se posicione – lembre-se, a Performance Arte é um convite – mas será afetado de alguma forma por aquele ato inesperado.

(...) a performance é basicamente uma linguagem de experimentação, sem compromisso com a mídia, nem com uma expectativa de público e nem como uma ideologia engajada. Ideologicamente falando, existe uma identificação com o anarquismo, que resgata a liberdade na criação (COHEN, 2013, p. 45).

Quando uma performance acontece em espaço público, fica evidente como isso afeta o artista de forma diferente do que se ela acontecesse em uma galeria de arte. Os ruídos, a estrutura, o chão, todos as características modificam a forma de o artista se colocar e realizar os movimentos ou a fala. Os transeuntes que assistem a performance no espaço público podem interferir na ação e levantar questionamentos, já o público de uma galeria provavelmente apreciará em silêncio o que acontece, a não ser que seja convidado a intervir.

17 Performance aconteceu no festival de performance de BH em 2011. Busquei pelo registro da obra, mas o site do festival estava fora do ar. Segundo uma das curadoras, a falta de apoio institucional fez com que o projeto fosse encerrado, por isso não foi possível manter o site no ar. Entrei em contato com a curadora do projeto mas não obtive retorno. Mantive a imagem porque ela apresenta características importantes para o entendimento de performance arte e de como fazer uso de um elemento presente no cotidiano dos e das discentes, cadeira.

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