7 minute read
Especial
“A plataformização é a transformação mais radical do trabalho desde a 2ª revolução industrial”, diz pesquisador
Davi Macedo, da Clínica Direito do Trabalho da UFPR
Advertisement
Odiagnóstico é de Marcelo Manzano, professor e doutor em economia (Unicamp). Ele faz parte do Grupo de Pesquisa da Clínica Direito do Trabalho da UFPR sobre Plataformas Digitais de Trabalho e entende que o estudo é fundamental para conhecer esse modelo de negócio e seus mecanismos de mobilização do trabalho. A entrevista completa está no site do BDF Paraná.
BdF - Em 2021, a Clínica Direito do Trabalho da UFPR decidiu pesquisar sobre as plataformas digitais de trabalho. O que despertou o seu interesse nesse objeto de pesquisa?
Manzano - Sou pesquisador do mercado de trabalho e considero fundamental a análise das plataformas digitais. Elas transformam o mercado de trabalho de forma muito radical. Eu diria que é a transformação mais radical desde a segunda revolução industrial. É uma grande transformação que precisamos conhecer melhor, cujos efeitos são difíceis de captar por envolver questões difusas, justamente pela forma como está organizada a produção do capitalismo hoje em dia.
A pesquisa está em andamento, mas já é possível ter as primeiras impressões sobre essa modalida-
de de trabalho virtual? A pesquisa permite mostrar que a pandemia teve impacto forte em algumas atividades que resistiam ao trabalho por plataformas digitais, em especial o setor de saúde. As próprias categorias profissionais resistiam em assumir o teletrabalho. A pandemia acabou minando essas resistências. De fato, a nossa pesquisa vai demostrar isso. É uma primeira questão que vale a pena destacar. Vale ressaltar também que as plataformas são muito dinâmicas. A pesquisa não completou seis meses e já pudemos observar transformações ocorrendo. As empresas e os modelos de negócios são muito dinâmicos. Sofrem mutações rápidas porque estão em contexto fluído e competitivo. As plataformas têm que criar constantemente novas formas de organização. Isso dificulta a pesquisa, mas um dado que já se percebe é o dinamismo. Um ambiente de transformações contínuas dos negócios. As empresas vão evoluindo muito rapidamente ao longo do tempo, inclusive mudando de setor e de atividade. Empresa que começa como uma simples marketplace, que põe em contato o vendedor com o consumidor, percebe que a partir do momento que ela reuniu as duas pontas e tem muitos dados, pode fazer muito mais. Aí começa a incluir serviços e termina virando um banco.
Formam-se diferentes tipos de trabalhadores e de exploração do trabalho? As plataformas também surpreendem pela expansão. Estão em todas as atividades. É um verdadeiro novo mundo que surge e a pandemia contribuiu muito para isso. Ela rompeu as barreiras, forçou a aceitação dessas tecnologias. Até para as coisas mais banais, como os trabalhadores chamados de clickworkers, que têm apenas que confirmar conteúdo, ou seja, apertar o enter quando vê uma imagem, em atividades de calibragem de inteligência artificial. Tem muita gente fazendo isso e competindo em escala global. Uma pessoa do interior de Goiás disputando com alguém que está na Índia. Tem desde esse tipo de trabalhador até profissionais com atividades muito sofisticadas que fazem
Editora Brasil 247
atendimentos on-line. Está crescendo também a atividade virtual entre bancários, os chamados personal bankers. É muito diverso, é difícil hoje imaginar um setor no qual as plataformas não estão inseridas. E destaco, a pandemia ajudou muito nessa generalização, nessa disseminação.
Qual é a dimensão do trabalho por plataformas digitais no Brasil? É
possível quantificar? Essa é uma dificuldade que nós temos e que existirá ainda por muito tempo. Não é só no Brasil, mas no mundo inteiro. Tem alguns números que circulam até por órgãos internacionais, como a OIT, mas são estimativas, eu diria, muito precárias. Não há base segura para dimensionar esse mercado. Isso porque as pessoas não são registradas como trabalhadores, são simplesmente freelancers, atuam de forma precária, muitas vezes sem passar por uma empresa ou mesmo algum cadastro. Não temos como saber se a pessoa está trabalhando ou não, há quanto tempo está trabalhando, se não está, quantas horas por dia. Quanto ela recebe, como ela recebe. Tem muitas pessoas que trabalham para empresas internacionais, então recebem o pagamento por meio do paypal, em dólar.
O vírus ainda anda nos ônibus lotados
“Nunca peguei ônibus com 50% de lotação, estão sempre cheios”, diz usuária de transporte coletivo (foto)
Ana Carolina Caldas culação com, no máximo, 70% da capacidade.
Desde o início da pandemia, os usuários do transporte coletivo de Curitiba e Região Metropolitana não tiveram segurança sanitária garantida, muito menos respeitados os decretos da própria Prefeitura, que estabeleciam que só poderiam andar com 50% a 70% da lotação. Quem vive a realidade diária relata que andar de ônibus em Curitiba é um “caos”.
Ainda com frota reduzida, Curitiba voltou a registrar, em julho deste ano, média diária de passageiros acima de 300 mil pessoas, de acordo com dados da Urbs, volume 10% superior à marca de junho. Mesmo com o decreto municipal em vigor que determina cirCaos Os números comprovam que a superlotação, que nunca deixou de acontecer, aumentou ainda mais segundo relatos de quem vive essa realidade. “Nos horários convencionais de trabalho, nunca peguei ônibus com metade da lotação, desde o início da pandemia. Durante o dia, principalmente, sempre muito lotado”, conta a professora e musicista Alana Dédalos.
Ela pega quatro ônibus diários para trabalhar e voltar para casa. “Por muitas vezes, na volta do trabalho, já cheguei a ficar esperando 40 minutos para tentar pegar ônibus mais vazios. Você fica com medo, mas precisa entrar. Na volta, é
Giorgia Prates um caos completo entrar no ônibus Santa CândidaCapão Raso. O tubo já está explodindo de gente. Pior ainda na hora de ir trabalhar, você não pode se dar ao luxo de aguardar”, conta.
A professora enviou vídeo ao Brasil de Fato Paraná mostrando a superlotação dentro do ônibus e, inclusive, imagens de cadeirantes tentando se equilibrar no meio do corredor lotado. “A sensação é de descaso completo. Como se quem anda de ônibus não merecesse ser cuidado. A cidade, o comércio, voltaram ao normal, mas nenhuma mudança ocorreu no transporte coletivo. Minha sensação é de que a frota continua reduzida porque nunca tivemos ônibus vazios.”
Essa também é a realidade da diarista Lucilene Raquel Domingos, 48 anos, que sai de Fazenda Rio Grande, na Região Metropolitana, e utiliza diariamente três linhas de ônibus. “Nunca vi vazio. Todos os dias estão cheios, extremamente lotados, principalmente no Terminal do Pinheirinho. É um caos”, diz. “Até vi guardas nos terminais tentando manter o distanciamento. Mas a Prefeitura ‘esquece’ que os ônibus vão para os pontos e aí vai enchendo.”
SUBSÍDIO DE MILHÕES NÃO INVESTIDOS
Lafaiete Neves, especialista em mobilidade urbana, Conselheiro Titular do Conselho da Cidade de Curitiba e integrante do Fórum Popular do Transporte Coletivo, destaca que a Prefeitura destinou milhões aos empresários do transporte coletivo e esse recurso não se re ete em investimento. “A justi cativa para o subsídio era que houve queda do número de passageiros. Porém, os ônibus nunca estiveram vazios, como bem falam os que vivem isso todo dia. É uma falácia” contesta. Lafaiete a rma que o que os usuários dizem só comprova as duas auditorias feitas pelo Tribunal de Contas do Paraná. “Concluíram sobre a superlotação durante a pandemia e nada foi alterado ainda pela Prefeitura,” diz.
PROJETO PARA REDUZIR LOTAÇÃO
Projeto de lei do vereador Renato Freitas (PT), apresentado em abril, propõe ações mais contundentes para reduzir a lotação e o risco de transmissão da Covid-19 nos ônibus da cidade. O texto muda artigo da lei que instituiu o Regime Emergencial de Transporte na capital paranaense – que deve expirar no dia 30 de junho, se não for prorrogado.
Determina que as concessionárias de transporte limitem a 50% a lotação máxima nos coletivos, com possibilidade de aplicação das sanções previstas em contrato.
A proposta incumbe à Urbs de fiscalizar o cumprimento das medidas; também estabelece que os recursos e logística para as ações propostas venham da Prefeitura.
Giorgia Prates
O que diz a Prefeitura
Em nota, a assessoria de comunicação da Prefeitura de Curitiba respondeu que “a frota opera com 100% dos veículos nos horários de pico. Fora dos horários de pico, a demanda cai mais de 50%. Vale lembrar que ao contrário do que muita gente imagina, os 50% de ocupação não signi cam apenas passageiros sentados. Em biarticulados, por exemplo, esse nível de ocupação equivale à lotação de bancos (53) e mais 73 passageiros em pé. Há scalização, concentrada nos maiores terminais durante o pico da manhã e no centro da cidade no pico do m de tarde. Com uma frota de mil veículos, é impossível colocar um scal em cada veículo.”