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Brasil | p. 6 Editorial

ARTIGO A nostalgia da branquitude

Carol Dartora,

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primeira mulher negra eleita vereadora em Curitiba. Mestre em Educação, militante da Marcha Mundial das Mulheres e do Movimento Negro, secretária da Mulher Trabalhadora e dos Direitos LGBTI+ da APP-Sindicato

No trágico tempo da escravização, a violência física era uma das principais formas de negar e apagar os direitos das pessoas negras. Apesar da abolição, o que notamos ainda nos dias atuais é que o método apenas mudou. Atualmente, no lugar do chicote, o instrumento é a mordaça.

No romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, Machado de Assis exemplifica esse pacto da supremacia branca. Brás Cuba narra: “Prudêncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha as mãos no chão, recebia um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia, — algumas vezes gemendo, — mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um — “ai, nhonhô!” — ao que eu retorquia: — “Cala a boca, besta!”

Esta citação pode chocar de início, ao ver o relato de Brás Cubas, uma criança de seis anos já tão sabida das estruturas que sustentam seu lugar de superioridade, que permitem que ele faça o que bem entende com quem está abaixo. Mas, para além dos domínios ficcionais, não é tão diferente como a branquitude nacional se comporta: cínica, alheia ao sofrimento que lhe cerca, e certa de que os que gritam pela superação da desigualdade devem ser calados a todo custo.

Não é de hoje que a dissimulação da branquitude dificulta (e muito) o avanço do país nas políticas sociais e de amparo aos que, por mais de três séculos, contribuíram com a vida pública sem receber um centavo, mas que foram vampirizados de toda a sua dignidade e direitos básicos de vida.

As expressões físicas e materiais do racismo não são mais graves que a tentativa de jogar panos quentes em suas manifestações ou apagar a histórica opressão que assola o povo negro e direcionar para problemas manipulados. A supremacia branca brasileira ainda tem, e muito, de Brás Cubas.

EDITORIAL Um balão de ensaio golpista

O7 de setembro se aproxima. A um ano do bicentenário da independência do Brasil, que coincidirá com as eleições presidenciais, o país assiste aos acenos golpistas de Bolsonaro. O método do presidente oscila entre o cômico e o amedrontador. Põe tanques sucateados na rua, ao mesmo tempo que parece ter apoio – no mínimo tácito – das Forças Armadas.

Como diria o filósofo, as coisas importantes na História ocorrem duas vezes, primeiro como tragédia, depois como farsa. O golpe de 1964 instaurou a barbárie entre nós: retirada de direitos, perseguições, prisões, torturas.

Agora, Bolsonaro e seus seguidores balançam a bandeira do golpismo para seguirem úteis ao neoliberalismo mais prejudicial contra os trabalhadores. Caso contrário, já teriam sido descartados pela burguesia brasileira.

De todo modo, o que se vê são as forças mais retrógradas apoiando o presidente farsesco. Militares da reserva, alguns agrupamentos de policiais militares, religiosos carismáticos e neopentecostais e até artistas ultraconservadores unem-se a políticos fisiológicos do Congresso para barrar o impeachment e acelerar nossas crises social, econômica e política.

Apenas a superação do bolsonarismo trará ao Brasil motivos para comemorar o 7 de setembro, para além de seu balão de ensaio golpista.

SEMANA

O jornal Brasil de Fato circula em todo o país com edições regionais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Paraná. Esta é a edição 226 do Brasil de Fato Paraná, que circula sempre às quintas-feiras. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais.

EXPEDIENTE

Brasil de Fato PR | Desde fevereiro de 2016

EDIÇÃO Frédi Vasconcelos e Pedro Carrano REPORTAGEM Ana Carolina Caldas, Gabriel Carriconde e Lia Bianchini COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Carol Dartora e Eloisa Dias ARTICULISTAS Fernanda Haag, Cesar Caldas, Marcio Mittelbach e Douglas Gasparin Arruda REVISÃO Lea Okseanberg, Maurini Souza e Priscila Murr ADMINISTRAÇÃO Bernadete Ferreira e Denilson Pasin DISTRIBUIÇÃO Clara Lume FOTOGRAFIA Giorgia Prates e Gibran Mendes DIAGRAMAÇÃO Vanda Moraes CONSELHO OPERATIVO Daniel Mittelbach, Fernando Marcelino, Gustavo Erwin Kuss, Luiz Fernando Rodrigues, Naiara Bittencourt, Roberto Baggio e Robson Sebastian REDES SOCIAIS www.facebook.com/bdfpr CONTATO pautabdfpr@gmail.com

Com Bolsonaro, dinheiro deixa o Brasil

As constantes ameaças ao processo eleitoral brasileiro, a pandemia, o desemprego e a alta da inflação têm feito muito mais do que afastar investimentos do Brasil.

O país viu muitos recursos gerados aqui deixando as nossas fronteiras. De acordo com o Dieese, a partir de dados do Banco Central, no primeiro semestre de 2021, as remessas enviadas ao exterior de lucros e dividendos das indústrias situadas no país atingiram a marca de US$ 4,5 bilhões.

O valor, que se aproxima dos R$ 24 bilhões, é quase 5 vezes maior em relação ao primeiro semestre de 2020.

No acumulado, essas empresas que obtiveram lucros no Brasil enviaram US$ 9,3 bilhões para o exterior. Aumento de 69% em relação ao mesmo período de 2020. Só a indústria metalúrgica fez a maior remessa: US$ 2,3 bilhões.

Na indústria química também houve remessas expressivas: mais de US$ 1,1 bilhão. O setor de produtos químicos foi responsável pelo maior envio, com o volume de US$ 807 milhões (crescimento de cerca de 233% em relação a 2020). Chama atenção que outros setores não considerados industriais também enviaram para fora do país 4,7 bilhões de dólares.

FRASE DA SEMANA

“Cada artista é um soldado contra o fascismo”

Diz o diretor de cinema premiado neste ano no Festival de Gramado, Aly Muritiba, em entrevista ao Brasil de Fato Paraná. Para ele, que está lançando dois lmes neste ano, esses trabalhos são “a forma de passar um recado para este governo fascista. Eles não nos calarão, não nos pararão, muito embora eles tentem nos destruir, vamos resistir”

Divulgação

A COOPERATIVA DE AGROINDÚSTRIA E COMÉRCIO TERRA LIVRE – COOPERATIVA TERRA LIVRE, vem através de seu Diretor Presidente, Sr. Paulo Cesar Rodrigues Brizola, no uso das suas atribuições que lhe são conferidas pelo Estatuto Social desta entidade e as leis vigentes, CONVOCAR as suas cooperadas e cooperados para participar da Assembleia Geral Ordinária a ser realizada no dia 10 de Setembro de 2021 (Sexta-feira), na sede da Cooperativa, localizada no Assentamento Contestado, município de Lapa – PR, às 08:00hrs em primeira convocação, às 09:00hrs em segunda convocação e as 10:00hrs em terceira e última convocação, para deliberarem sobre a seguinte ordem do dia: 1 – Prestação de contas contendo: a) Relatório de Gestão; b) Balanço; c) Demonstrativo de sobras ou perdas apuradas; d) Plano de atividades da Cooperativa para o exercício seguinte. 2 – Destinação das sobras apuradas ou rateio das perdas. 3 – Eleição dos componentes do conselho fiscal. 4 – Outros assuntos de interesse social.

LAPA/PR, 23 de Agosto de 2021

Paulo Cesar Rodrigues Brizola, Diretor Presidente, CPF: 839.667.069-20

deliberarem sobre a seguinte ordem do dia: Reforma do Estatuto Social, mediante alteração dos objetivos sociais e atividades econômicas principais, com inclusão de novas atividades econômica secundária.

LAPA/PR, 23 de Agosto de 2021

Paulo Cesar Rodrigues Brizola, Diretor Presidente, CPF: 839.667.069-20

EDITAL DE CONVOCAÇÃO

A COOPERATIVA DE AGROINDÚSTRIA E COMÉRCIO TERRA LIVRE – COOPERATIVA TERRA LIVRE, vem através de seu Diretor Presidente, Sr. Paulo Cesar Rodrigues Brizola, no uso das suas atribuições que lhe são conferidas pelo Estatuto Social desta entidade e as leis vigentes, CONVOCAR as suas cooperadas e cooperados, para participar da Assembleia Geral Extraordinária, a ser realizada no dia 10 de Setembro de 2021 (sexta-feira), na Sede da Cooperativa, localizada no área comunitária do Assentamento Contestado, município de Lapa – PR, às 14:00h, em primeira convocação, com a presença de 2/3 dos cooperados(as); às 15:00h, em segunda convocação, com a presença de 50% mais um dos cooperados(as) e às 16:00h, em terceira e última convocação, com a presença de no mínimo 10 cooperados(as) para

EDITAL DE CONVOCAÇÃO

QUE DIREITO É ESSE?

Eloisa Dias A nal, qual o papel do STF?

O Supremo Tribunal Federal é a mais alta corte do Poder Judiciário brasileiro e guardião da Constituição. Composto por 11 ministros, sua principal função é garantir o respeito às normas constitucionais. Em geral, é a última instância a que se pode recorrer em um processo, para analisar se houve ou não violação à Constituição Federal. Excepcionalmente, alguns processos, em razão das pessoas envolvidas, são analisados diretamente pelo STF: é o caso das infrações penais comuns que envolvam o presidente da República, o vice-presidente, os membros do Congresso, ministros e o procurador-geral da República.

Mas o que é a Constituição, que o STF deve defender? Em resumo, a Constituição organiza o Estado brasileiro - um estado democrático de direito - que tem por finalidade a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, com a redução das desigualdades sociais. Ela assegura uma série de direitos fundamentais aos cidadãos, com base na dignidade da pessoa humana. Além disso, é a Constituição que regulamenta o nosso sistema político e a organização dos poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – determinando qual a competência de cada um. Assim, cabe ao STF decidir se, em determinado caso, houve ou não uma “invasão de competência”.

Projeto pode garantir mais de 4 mil empregos a negros e indígenas

Proposta da vereadora Carol Dartora destina 20% das vagas na Prefeitura a cotas raciais

Gabriel Carriconde de Constituição de Justiça (CCJ), o projeto corre risco de sofrer retro-

Segundo números divulgados cesso em sua redação original. Propela própria Prefeitura de Curiti- posta da vereadora Amália Tortato ba, em requerimento de informação (Novo) altera para cotas sociais, da vereadora Carol Dartora (PT), reservando vagas por índice socioeno quadro atual de funcionários há conômico, e não racial. apenas 21 pessoas que se declaram “Nós concordamos que existe indígenas (0,09%) e 932, (3%), pre- racismo no Brasil, mas entendemos tas. Contra 19.951 (78%) que se di- que o enfrentamento está equivozem brancas, num total de 25.265 cado”, afirmou Tortato durante deservidores. bate com Dartora, no portal Plural.

Outro fator importante é a renda. Amália acredita que o critério social A média salarial de servidores de- já beneficiaria negros e indígenas. clarados brancos (6.283) é em mais “Na nossa avaliação, o critério de de mil reais superior à dos negros cotas sociais atinge pessoas que não (5.012), sendo maior a desigualdade tiveram oportunidades de boa esse comparada aos declarados ama- colaridade e renda lá atrás, dentre relos (9.486), sendo que este grupo elas as pessoas negras, e beneficiarepresenta pouco mais de 1% do to- ria pessoas que também não tivetal de funcionários em Curitiba. ram oportunidades independente-

Estes são alguns motivos que le- mente da cor da pele”, destacou. varam a vereadora a apresentar, na O PL atualmente está tramitanCâmara Municipal, proposta de política afirmativa para garantir equidade no acesso e oportunidades de empregos bem remunerados a negros e indígenas.

Pelo projeto, 20% das vagas disponibilizadas em concursos públicos municipais seriam reservados para o sistema de cotas raciais. Estudo do IBGE sobre desigualdades sociais por cor ou raça no Brasil, feito em 2018, apontou que 34% da população paranaense é negra e, em Curitiba, cerca de 21%.

Apesar da significativa parcela, a desigualdade de oportunidades e o desemprego têm afetado com muita força, sobretudo na pandemia, essa parcela da população. Ainda de acordo com o estudo, a diferença salarial entre brancos e negros é de quase mil reais. Caso o projeto de Lei de Dartora seja aprovado, seriam gerados mais de 4 mil vagas para negros e indígenas, considerando o número atual de funcionários.

Em 2014, lei federal parecida com a proposta da vereadora foi sancionada pela presidenta Dilma Roussef (PT). Na Câmara de Curitiba, apesar de parecer favorável na Comissão do na Comissão de Educação da casa, e ainda receberá parecer dos parlamentares da comissão. Em entrevista ao Brasil de Fato Paraná, Dartora destaca a importância do recorte racial da proposta, já que, de acordo com ela, as alterações não atacam as desigualdades raciais na cidade.

“Qual a lógica que rege o fato de

Vereadora Carol Dartora é autora de projeto de cotas raciais para contratação de funcionários na Prefeitura de Curitiba

que, em um país em que 54% da população se declara negra, os lugares de poder estejam ocupados em sua quase totalidade por pessoas brancas? Quais mecanismos ideológicos estão em jogo para assegurar aos brancos a ocupação de posições mais altas na hierarquia social sem que isso seja encarado como privilégio racial?”, questiona.

A proposta de Dartora é defendida por movimentos negros da cidade e por Ministério Público e Defensoria Pública da União e do estado. Em um parecer técnico divulgado em abril, os órgãos destacam que a prática “tem mostrado o sucesso da política de cotas, capaz de nos últimos anos quadruplicar o ingresso de negros no ensino superior, além de ampliar de modo significativo - apesar de ainda insuficiente - o quadro de servidores públicos negros”.

Divulgação

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