Brasil de Fato PR - Edicao 226

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Brasil de Fato PR 2 Opinião

Paraná, 25 de agosto a 1 de setembro de 2021

Brasil de Fato PR

A nostalgia EDITORIAL Um balão de ensaio da branquitude golpista

ARTIGO

Carol Dartora,

primeira mulher negra eleita vereadora em Curitiba. Mestre em Educação, militante da Marcha Mundial das Mulheres e do Movimento Negro, secretária da Mulher Trabalhadora e dos Direitos LGBTI+ da APP-Sindicato

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o trágico tempo da escravização, a violência física era uma das principais formas de negar e apagar os direitos das pessoas negras. Apesar da abolição, o que notamos ainda nos dias atuais é que o método apenas mudou. Atualmente, no lugar do chicote, o instrumento é a mordaça. No romance “Memórias Póstumas de Brás Cubas”, Machado de Assis exemplifica esse pacto da supremacia branca. Brás Cuba narra: “Prudêncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha as mãos no chão, recebia um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia, — algumas vezes gemendo, — mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um — “ai, nhonhô!” — ao que eu retorquia: — “Cala a boca, besta!” Esta citação pode chocar de início, ao ver o relato de Brás Cubas, uma criança de seis anos já tão sabida das estruturas que sustentam seu lugar de superioridade, que permitem que ele faça o que bem entende com quem está abaixo. Mas, para além dos domínios ficcionais, não é tão diferente como a branquitude nacional se comporta: cínica, alheia ao sofrimento que lhe cerca, e certa de que os que gritam pela superação da desigualdade devem ser calados a todo custo. Não é de hoje que a dissimulação da branquitude dificulta (e muito) o avanço do país nas políticas sociais e de amparo aos que, por mais de três séculos, contribuíram com a vida pública sem receber um centavo, mas que foram vampirizados de toda a sua dignidade e direitos básicos de vida. As expressões físicas e materiais do racismo não são mais graves que a tentativa de jogar panos quentes em suas manifestações ou apagar a histórica opressão que assola o povo negro e direcionar para problemas manipulados. A supremacia branca brasileira ainda tem, e muito, de Brás Cubas.

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7 de setembro se aproxima. A um ano do bicentenário da independência do Brasil, que coincidirá com as eleições presidenciais, o país assiste aos acenos golpistas de Bolsonaro. O método do presidente oscila entre o cômico e o amedrontador. Põe tanques sucateados na rua, ao mesmo tempo que parece ter apoio – no mínimo tácito – das Forças Armadas. Como diria o filósofo, as coisas importantes na História ocorrem duas vezes, primeiro

como tragédia, depois como farsa. O golpe de 1964 instaurou a barbárie entre nós: retirada de direitos, perseguições, prisões, torturas. Agora, Bolsonaro e seus seguidores balançam a bandeira do golpismo para seguirem úteis ao neoliberalismo mais prejudicial contra os trabalhadores. Caso contrário, já teriam sido descartados pela burguesia brasileira. De todo modo, o que se vê são as forças mais retrógradas

apoiando o presidente farsesco. Militares da reserva, alguns agrupamentos de policiais militares, religiosos carismáticos e neopentecostais e até artistas ultraconservadores unem-se a políticos fisiológicos do Congresso para barrar o impeachment e acelerar nossas crises social, econômica e política. Apenas a superação do bolsonarismo trará ao Brasil motivos para comemorar o 7 de setembro, para além de seu balão de ensaio golpista.

SEMANA

EXPEDIENTE O jornal Brasil de Fato circula em todo o país com edições regionais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul e Paraná. Esta é a edição 226 do Brasil de Fato Paraná, que circula sempre às quintas-feiras. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais.

Brasil de Fato PR | Desde fevereiro de 2016 EDIÇÃO Frédi Vasconcelos e Pedro Carrano REPORTAGEM Ana Carolina Caldas, Gabriel Carriconde e Lia Bianchini COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Carol Dartora e Eloisa Dias ARTICULISTAS Fernanda Haag, Cesar Caldas, Marcio Mittelbach e Douglas Gasparin Arruda REVISÃO Lea Okseanberg, Maurini Souza e Priscila Murr ADMINISTRAÇÃO Bernadete Ferreira e Denilson Pasin DISTRIBUIÇÃO Clara Lume FOTOGRAFIA Giorgia Prates e Gibran Mendes DIAGRAMAÇÃO Vanda Moraes CONSELHO OPERATIVO Daniel Mittelbach, Fernando Marcelino, Gustavo Erwin Kuss, Luiz Fernando Rodrigues, Naiara Bittencourt, Roberto Baggio e Robson Sebastian REDES SOCIAIS www.facebook.com/bdfpr CONTATO pautabdfpr@gmail.com


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