Brasil de Fato RJ - Especial Maio 2016

Page 1

RIO DE JANEIRO

Maio de 2016

distribuição gratuita

EDIÇÃO ESPECIAL

Novo Brasil não sairá de um golpe Antonio Cruz/Agência Brasil

M

ais uma vez a elite brasileira deu um golpe no povo. Desta vez o golpe foi sofisticado, usou toga, colete à prova de balas e potentes câmeras de TV. Seus soldados usavam terno e gravata. A corrupção foi novamente a melhor desculpa encontrada pelos golpistas para ganhar o apoio da sociedade. No entanto, a presidente Dilma Rousseff não respondia por nenhum crime de corrupção, mas sim pelas “pedaladas fiscais”, que ocorrem quando o Executivo Federal pede empréstimo a algum

banco público para garantir recursos para alguns programas sociais e, posteriormente, os paga. Enquanto Dilma foi deposta injustamente, Eduardo Cunha e sua gangue ficaram impunes, mesmo sendo os maiores criminosos do país. GARANTIAS DEMOCRÁTICAS Diante desse golpe está claro que não se trata mais apenas do governo Dilma, mas sim de defender as mínimas garantias democráticas conquistadas desde o fim da di-

tadura, como vem fazendo a Frente Brasil Popular. Qualquer que seja o desfecho da

Esse novo Brasil não sairá de um golpe. Sairá do povo nas ruas, da união, da luta organizada luta que estamos travando estará na ordem do dia a necessidade de mudanças pro-

fundas, pois a crise será de longo prazo e será impossível conquistarmos qualquer avanço com o esgotado sistema político que temos hoje. OCUPAR AS RUAS Por isso, de início é necessária uma reforma profunda do sistema político, e uma Constituinte Exclusiva que altere as regras do jogo político no Brasil. Uma ampla luta pela democratização dos meios de comunicação será também inadiável. Assim como o controle do petróleo, a luta por uma Petrobrás 100% es-

tatal, o amplo investimento na geração de empregos e a retomada da indústria nacional. A ampliação nos programas de acesso à saúde e educação também deve estar na agenda. É visível em todas as manifestações que estão ocorrendo que o sonho de um novo Brasil pulsa e já não cabe nas velhas roupas que usa. Esse novo Brasil não sairá de um golpe. Sairá do povo nas ruas, da união, da luta organizada. A história nos trouxe até aqui e é hora de assumir nosso papel.


2 | ESPECIAL

Rio de Janeiro, maio de 2016

Temer apresenta plano de governo carregado de retrocessos Vice-presidente planeja dificultar reajustes anuais do salário mínimo e aumentar tempo de trabalho para aposentadoria Valter Campanato/Agência Brasil

Mariana Pitasse do Rio de Janeiro (RJ) o final de 2015, o PMDB tornou público o plano de governo “Ponte para o Futuro”, elaborado pela cúpula do partido com objetivo de apresentar propostas para “retomar o crescimento econômico do país”. Em março deste ano, o documento foi atualizado com novas propostas, deixando claro quais seriam as medidas tomadas por Michel Temer, caso consiga assumir a presidência após o golpe contra a presidente Dilma Rousseff.

Documento chama atenção não só por apresentar o plano de governo de um vicepresidente, como também pelo retrocesso das propostas O documento chama atenção não só por apresentar o plano de governo de um vice-presidente, como também pelo retrocesso das propostas. Entre elas, revisão na abrangência de programas sociais, mudanças na concessão de bolsas de estudos, aumento do tempo de trabalho para aposentadoria e até entraves para os reajustes anuais do salário mínimo. O Brasil de Fato destacou as principais mudanças que o plano de governo do PMDB pode trazer ao trabalhador brasileiro.

Conheça o plano de governo de Temer

N

Tema

Salário mínimo e Previdência

Aposentados e Pensionistas

Governo Dilma

Plano Temer

Reajustes anuais automáticos previstos no orçamento público

Reajustes passam a depender da aprovação do Congresso

Garantia de aumento real, baseado na inflação do ano anterior

Possibilidade de reajustes abaixo da inflação

Hoje são considerados a soma da idade e o tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 anos para mulheres)

Introdução de idade mínima para aposentadoria (homens 65 anos e mulheres 60 anos) com previsão de aumento progressivo

Leis Trabalhistas Direitos preservados pela Consolidação (CLT) das Leis do Trabalho (CLT)

Convenções coletivas passam a prevalecer sobre as normas da CLT

Custos reservados nos orçamentos anuais da União

Programas reavaliados a cada ano por um comitê no Congresso

Podem participar famílias com renda mensal de até R$154 por pessoa

Limitado aos 10% mais pobres, que vivem com menos de 1 dólar por dia (R$105 por mês)

Minha Casa, Minha Vida

Rendimentos do FGTS utilizados para a construção das habitações

Fim do uso do FGTS como fonte de recursos para as obras

Pronatec

Estudantes ou formados nas redes públicas de educação podem se candidatar às bolsas

Oferta de bolsas restrita aos estudantes de menores faixas de renda

Programas e Projetos Sociais


Rio de Janeiro, maio de 2016

ESPECIAL l 3

Investigados por corrupção podem assumir o governo O pedido de impeachment da presidente não tem nenhuma ligação com a Operação Lava Jato Fania Rodrigues do Rio de Janeiro (RJ)

P

ara compreender o momento político que o país vive, primeiro é preciso entender que a presidente Dilma Rousseff não é acusada de corrupção. Os partidos da oposição tentam derrotar o governo devido às chamadas “pedaladas fiscais”, que são manobras feitas com o objetivo de “aliviar”, momentaneamente, as contas públicas. No final do ano de 2014, o governo autorizou o uso de dinheiro de bancos públicos para pagar programas sociais, como Bolsa Família, o abono e seguro-desemprego, e os subsídios agrícolas. Os beneficiários receberam tudo em dia, porque os bancos usaram recursos próprios no pagamento. Essa estratégia foi adotada nos mandatos dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva sem qualquer problema. Governadores de 16 estados usaram a mesma tática para conter as dívidas no ano de 2014. Se a presidente Dilma não está envolvida em casos de corrupção, o mesmo não acontece com seus possíveis sucessores. Entre os quatro primeiros nomes de pessoas que podem vir a assumir a Presidências, três são citados na Operação Lava Jato.

1

Linha de sucessAo da PresidÊncia da RepÚblica em caso de impeachment Ponte para o Futuro quer desmontar o país Alinhado com setores empresariais, o PMDB apresentou uma série de propostas reunidas na chamada “Agenda Brasil”. Essas medidas visam beneficiar diretamente os empresários, a classe média alta, grandes fazendeiros, estrangeiros, entre outros. A Agenda Brasil defende a ampliação da terceirização em empresas públicas e privadas, o que poderia prejudicar os direitos trabalhistas. Também quer mudanças na lei de demarcação de terras indígenas, com o objetivo de facilitar a expansão do agronegócio. O conjunto dessas medidas pode provocar retrocessos nos direitos conquistados nos últimos anos. Esse é o plano que partidos como o PMDB e PSDB pretendem implantar caso a presidente Dilma sofra o impeachment.

Michel Temer (PMDB), vice-presidente Temer é acusado de participar do esquema de corrupção na Petrobrás. Ele foi citado por delatores da Lava Jato e é acusado de receber dinheiro de propina. Além disso, foi Temer, e não Dilma, quem assinou a autorização das medidas que resultaram nas pedaladas fiscais.

2

Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara Contra Cunha pesam denúncias de receber dinheiro desviado da Petrobrás e manter milhões de dólares em contas secretas na Suíça e em outros paraísos fiscais. O deputado, que conduz o processo de impeachment, é réu no Supremo Tribunal Federal (STF).

3

Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado Renan também foi citado por delatores, investigados na Lava Jato, acusado de ser beneficiário do esquema de corrupção na Petrobrás. Ele é citado em nove inquéritos no STF.

Como funciona o processo de impeachment? O plenário Câmara dos Deputados aprovou a abertura do processo de impeachment. A denúncia já está sendo apreciada no Senado, que é quem conduz o julgamento e vai definir se a presidente é

culpada ou inocente. No Senado, o relator do processo é o senador Antonio Anastasia (PSDB). Ele é ex-governador de Minas Gerais. Segundo o Ministério Público Federal, Anastasia

também praticou “pedaladas fiscais” no orçamento do estado mineiro. Ele responde a processo na Justiça por descumprimento da obrigatoriedade de gasto mínimo na Saúde.


4 | ESPECIAL

Rio de Janeiro, maio de 2016

ENTREVISTA | João Pedro Stedile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)

“Independente dos cenários, vai ter luta”, diz Stedile Fania Rodrigues e Vivian Virissimo do Rio de Janeiro (RJ)

U

m eventual governo Temer provocará o aumento da luta de classes, das mobilizações, das greves e dos enfrentamentos. Esse é o cenário visualizado por João Pedro Stedile, da direção do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terras (MST), caso o processo de cassação do mandato da presidente Dilma Rousseff seja aprovado no Senado. O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou a abertura do processo de impeachment neste domingo (17). Agora o Senado dará a palavra final sobre a questão. Brasil de Fato - O que podemos esperar do governo Dilma, caso o impeachment seja derrotado no Senado? João Pedro Stedile - É possível que a direita invente outros mecanismos ou invista no processo que está no Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Esse segundo caso poderia resultar na cassação da chapa Dilma/Temer e seriam convocadas novas eleições gerais. Mas avalio que a direita e o poder econômico não estão dispostos a arriscar, porque eleições gerais devolveriam ao povo o direi-

to de escolher. A direita tem o grande objetivo de afastar a presidenta para colocar em prática novamente o seu programa neoliberal. Isso significaria a eliminação das conquistas sociais, a retirada de direitos trabalhistas e, principalmente, a diminuição dos recursos que hoje são destinados à saúde e à educação.

Missão de Temer é aumentar a exploração aos trabalhadores para que os empresários tenham mais lucro Brasil de Fato - Se o governo vencer essa batalha, qual é o possível cenário? Esse governo Dilma, que acompanhamos até aqui, acabou. A partir de maio, mesmo derrotando os setores que querem o impeachment no Senado, será um novo governo. Dilma até tentou no ano passado se reconciliar com a direita, colocando o PMDB em novos ministérios e não deu certo. Em um governo Dilma pós-impeachment a reformulação ministe-

rial seria coordenada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e nessa recomposição os ministérios seriam ocupados por nomes notáveis da sociedade e não mais somente por alianças partidárias. Essa mudança forçaria o governo a resgatar o programa para o qual foi eleito. Brasil de Fato - Agora, o que acontece se o impeachment for aprovado no Senado? Se houver impeachment e assumir Michel Temer (PMDB) e Eduardo Cunha (PMDB) será um caos do ponto de vista político. Porque todo aquele discurso de que precisa trocar o governo porque o PT era corrupto não vai mais funcionar. Ora, o PMDB é o partido mais corrupto da história do Brasil. Então a corrupção aumentaria muito. No entanto, mais que isso, a missão de Temer é aumentar a exploração aos trabalhadores para que os empresários tenham mais lucro. Na cabeça deles, com o empresário tendo mais lucro a economia vai crescer. Mas isso não acontece na realidade. Brasil de Fato – Como seria o eventual governo Temer? Vários projetos que prejudicam a classe trabalhadora estão para ser votados atual-

Mídia Ninja

João Pedro Stedile explica porque um possível governo Temer é ruim para o trabalhador

mente no Congresso. Com uma vitória do impeachment esses projetos seriam aceleradamente aprovados. Outro dia, o jornal Valor Econômico publicou uma matéria em que um empresário afirma que é um absurdo o trabalhador ter 30 dias de férias. Esse empresário defen-

Setores organizados da classe trabalhadora não vão aceitar a perda dos direitos pacificamente de que o Brasil deveria fazer como a China, que só concede 13 dias de férias ao trabalhador, ou como nos Estados Unidos e Japão, em que as férias são acordadas empresa por empresa. É isso que eles

querem implantar no Brasil, acabando com os direitos previstos na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Brasil de Fato – Como a sociedade vai reagir a essas mudanças nas políticas públicas? Sem dúvida vai aumentar a luta de classes, as mobilizações, as greves e os enfrentamentos. Porque os setores organizados da classe trabalhadora não vão aceitar a perda dos direitos pacificamente. Então, é provável que o governo Temer tenha uma vida muito curta. Se ele assumir é bem provável que sejam organizadas mobilizações de todos contra ele, até dos coxinhas. A principal pauta dos coxinhas é a corrupção e o PMDB é o partido mais corrupto do país. Seja qual for o resultado do impeachment, o tema da reforma política vai voltar para a agenda prioritária e os movimentos populares defendem a convocação de uma Assembleia Constituinte. Ou seja, independente dos cenários, vai ter luta.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.