RIO DE JANEIRO
11 a 19 de outubro de 2017
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Ano 5 | edição 239
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FUTEBOL Instalação do árbitro de vídeo divide opiniões
»»Para saber um pouco mais sobre a polêmica, o Brasil de Fato conversou alguns torcedores de times cariocas. PAG 9
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Fernando Frazão / Agência Brasil
SERVIDORES DO ESTADO DO RIO AINDA SOFREM COM ATRASOS Mesmo com o pagamento dos salários voltando à normalidade, a situação dos servidores públicos do estado do Rio de Janeiro ainda não está resolvida. Além do governo estadual não ter quitado o 13º salário de 2016, os seguidos atrasos e parcelamentos bagunçaram a vida financeira dos servidores. Muitos deles tiveram que pagar grandes multas por conta dos atrasos no pagamento das contas, outros recorreram a empréstimos ou mesmo ficaram com o nome “sujo”. PAG. 5
VIVA A ARTE Para João Ripper, o papel da fotografia é mostrar as belezas que são ocultadas »»Fotógrafo fala ao Brasil de Fato sobre
importância da fotografia para as populações marginalizadas. PAG 12
João Ripper
ACESSIBILIDADE Belford Roxo tem primeira rampa de acesso da estação de trem »»Pessoas com deficiência conquistam a construção da rampa após dois anos de mobilização e denúncias. PAG. 3
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GERAL
FALAÍ
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A atuação das Forças Armadas na Rocinha resolve o problema? Márcia, 45 anos
Fernando Frazão / Agência Brasil
No momento o Rio de Janeiro atravessa uma grave crise. Em decorrência da crise de credibilidade do governo estadual, nós estamos agora observando, o retorno de grupos fortemente armados para favelas. A participação das Forças Armadas para tentar resolver esse problema pontual se coloca como alternativa para aqueles segmentos que acreditam que resolver o problema da criminalidade violenta acontece com forte repressão, repressão armada, e de forma militarizada. Porém, nós acreditamos que o problema da segurança pública se resolve de uma outra maneira. Com políticas públicas de inclusão, com um forte investimento em educação, de saúde, de emprego e dessa maneira, as atividades policiais deverão ser de cunho preventivo e ostensivo apenas para que complemente o trabalho que a sociedade faz no sentido que é administrar seus conflitos. Lênin Pires, da Universidade Federal Fluminense (UFF)
Fernando Frazão/ Agencia Brasil
Horário de verão começa no próximo domingo
Forças Armadas retornaram à Rocinha nesta terça-feira (10)
Mais de 300 pessoas vão fazer o Enem usando nome social neste ano »»Nos dias 5 e 12 de novembro, 303 pessoas vão usar o nome
social para realizar as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). O atendimento é destinado a participantes transexuais e travestis – pessoas que se identificam e querem ser reconhecidas socialmente em consonância com sua identidade de gênero. O número de participantes que vão usar o nome social no Enem é menor que o do ano passado (407). O número geral de participantes do exame também caiu: de 8,6 milhões em 2016 para 6,7 milhões em 2017.
Recebimento de boletos vencidos em qualquer banco é adiado para 2018 »» A possibilidade de pagar boletos vencidos com valores A partir do próximo domingo (15), os moradores das regiões Sul, Sudoeste e Centro-Oeste deverão adiantar os relógios em uma hora. O horário de verão acaba em 18 de fevereiro de 2018.
abaixo de R$ 2 mil em qualquer banco foi adiada para o próximo ano. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) estendeu o prazo de implementação do novo sistema por causa da grande quantidade de documentos bancários no país.
www.brasildefato.com.br redacaorj@brasildefato.com.br /brasildefatorj @Brasil_de_Fato (21) 99373 4327 (21) 4062 7105 CONSELHO EDITORIAL Alexania Rossato, Antonio Neiva (in memoriam), Carolina Dias, Flora Castro, Joaquín Piñero, Mario Augusto Jakobskind, Rodrigo Marcelino, Vito Giannotti (in memoriam) EDIÇÃO Vivian Virissimo | SUBEDIÇÃO Mariana Pitasse | ADMINISTRAÇÃO Angela Bernardino e Marcos Araújo | DISTRIBUIÇÃO Carolina Dias | COLABORAÇÃO Ana Lúcia Vaz, Carolina Goetten, Gerson de Souza, Jaqueline Deister, Luiz Ferreira, Mariana Pitasse, Rute Pina e Vinícius Sobreira (texto), Pablo Vergara (foto), Juliana Braga (diagramação)
GERAL
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Belford Roxo: pessoas com deficiência conquistam acessibilidade em trens
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pós dois anos de mobilização e denúncias por mais acessibilidade nos transportes públicos, as pessoas com deficiência do município de Belford Roxo, na Baixada Fluminense, conquistaram a primeira vitória: a construção da rampa de acesso da Estação de trem. Em janeiro deste ano, o Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência da cidade realizou uma ação para mostrar a falta de infraestrutura das estações para receber pessoas com mobilidade reduzida. Mesmo com inúmeras reclamações, a Supervia, empresa responsável por operar os trens no estado do Rio, informou que apenas em 2020, a estação teria a acessibilidade reivindicada pela população. “A construção da rampa representa um ganho jurídico, pois desde janeiro, após a criação do Conselho em 2016, nós montamos uma
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FRASE DA SEMANA
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A falta de informação te faz uma pessoa manipulável Ato em frente à estação em Belford Roxo comemorou conquista
agenda de atividades e uma delas era iniciar a briga com a Supervia”, afirma José Antônio, presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Cidade de Belford Roxo. “Começamos a mapear as pessoas com deficiência na cidade e a entrar com ações judiciais contra a Supervia devido a falta de acessibilidade. A estação de Belford Roxo não tinha acessibilidade nenhuma, eu cansei de tomar tom-
bos na escada” destacou. De acordo com o presidente do Conselho, atualmente existem 42 ações na justiça contra a Supervia pela falta de acessibilidade da estação e se não houvesse mobilização e intervenção da justiça a obra não teria sido realizada este ano. Em nota, a Supervia informou que além da rampa, a estação de Belford Roxo conta com piso tátil para auxiliar deficientes visuais. (JAQUELINE DEISTER)
RACISMO NOS ESTÁDIOS
Clubes serão punidos após atos racistas de torcedores
MARCO PIGOSSI, o Zeca de “A Força do Querer”.
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INTOLERÂNCIA RELIGIOSA
Fernando Frazão / Agência Brasil
»»O governador do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão, sancionou lei
que prevê punições a clubes de futebol por atos de racismo cometidos em estádios por torcedores ou membros. A lei estipula que as penalidades sejam aplicadas caso os clubes não adotem providências para esclarecer os fatos, como ajudar na identificação dos agressores. Segundo o texto, os clubes poderão receber uma advertência ou multas, que variam de 50 a 50 mil Ufirs, o que equivale a um mínimo de R$ 155 e máximo de R$ 155 mil. Os recursos arrecadados com a punição serão destinados ao Fundo Estadual de Combate ao Racismo. O dinheiro deverá ser usado para campanhas de conscientização e de enfrentamento ao racismo. A lei já entrou em vigor com a publicação, mas está previsto no texto um prazo de 60 dias para que os clubes se adaptem e esclareçam seus torcedores sobre as mudanças.
DENÚNCIAS Apenas nos últimos dois meses, o estado do Rio de Janeiro teve quase 40 denúncias de intolerância religiosa. A secretaria Estadual de Direitos Humanos que compôs uma comissão para acompanhar os casos acredita que o número não reflete a realidade, já que muitas vítimas têm medo de denunciar.
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Niterói: privatização do setor de saneamento causou perdas para os cofres públicos
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cidade de Niterói, na região metropolitana do Rio, tem os serviços de distribuição de água, coleta e tratamento de esgoto concedidos à iniciativa privada desde 1999. Mesmo com a privatização para a Concessionária Águas de Niterói, a Companhia Estadual de Águas e Esgoto (Cedae), empresa pública que até então era responsável pelos serviços, foi obrigada a fornecer água para o município pelo fato da cidade não ter manancial próprio. O presidente da Federação Interestadual dos Engenheiros (Fisenge), Clovis Francisco do Nascimento, explica que na verdade a companhia Águas de Niterói durante 10 anos foi diretamente beneficiada pelo subsídio do estado. “Naquela ocasião o governo do estado passou a vender mil litros de água à R$0,01 para a Águas de Niterói, enquanto o custo para transformar água bruta em água potável para a Cedae era de R$1,50, no preço de hoje. Não dá para compreender porque isso foi feito”, destaca Nascimento. Apenas há dois anos, a partir de uma ação judicial, a companhia Águas de Niterói passou a pagar R$1,20 por mil litros de água tratada. O caso de Niterói demostra o quanto a privatização, apontada como saída para a crise do estado do Rio, pode ser danosa para a população. O Brasil de Fato entrou em contato com a Águas de Niterói, porém, até o fechamento desta reportagem a companhia não retornou. “Ao privatizar o sistema, uma concessionária é detentora da concessão, que passa a ter o direito de fornecer aquela água. Isso traz risco principalmente para as comunidades de baixa renda”, explica Alexandre Pessoa, engenheiro sanitarista e professor da Escola Politécnica Joaquim Venâncio da Fiocruz. “As empresas querem ter lucro e na área de saneamento, os investimentos podem ser aplicados na bolsa de valores, em vez de destinados à ampliação do sistema. Esse é o grande problema”, afirma Pessoa. (JAQUELINE DEISTER) Divulgação
Grupo Águas de Niterói controla sistema de água, saneamento e esgoto de Niterói desde 1999
BRASIL NA CONTRAMÃO MUNDIAL
VOCÊ SABIA
?
Um dos argumentos principais para a privatização do setor de energia e saneamento básico é a ineficiência do serviço. No entanto, quando se trata de gestão de recursos naturais, o Brasil está indo na contramão de todos os países que têm buscado um maior controle do setor. Dados de organizações europeias apontam que dos anos 2000 para cá foram registrados 267 casos de reestatização do sistema de água e esgoto na Europa.
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Situação dos servidores públicos do Rio não está resolvida Mesmo com o pagamento de parte dos salários, os seguidos atrasos e parcelamentos bagunçaram a vida dos servidores MARIANA PITASSE
RIO DE JANEIRO (RJ)
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esmo com o pagamento dos salários voltando à normalidade, a situação dos servidores públicos do estado do Rio de Janeiro ainda não está resolvida. Além do governo estadual não ter quitado o 13º salário de 2016, os seguidos atrasos e parcelamentos bagunçaram a vida financeira dos servidores. Muitos deles tiveram que pagar grandes multas por conta dos atrasos no pagamento das contas, outros recorreram a empréstimos ou mesmo ficaram com o nome
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Aprovam a gestão de Pezão no governo estadual. Dado consta no último levantamento do Datafolha divulgado no sábado (7).
“sujo”. A professora aposentada Márcia Deister, 58 anos, enfrentou uma situação ainda mais complicada. Ela pe-
PRIVATIZAÇÃO CEDAE Tomaz Silva /Agência Brasil
Fernando Frazão / Agência Brasil
gou três empréstimos consignados, aqueles que são descontados na folha de pagamento, e teve também o
valor abatido direto da sua conta corrente. “Além de não receber ainda estava sendo lesada dessa maneira. Isso aconteceu muitas vezes. Fui no banco e reclamei. Restituíram meu dinheiro em conta mas colocaram meu nome no SPC e Serasa como se eu não estivesse pagando. Depois que reclamei, pararam de descontar esse dinheiro no contracheque, mas aí passaram a me considerar inadimplente. Então quer dizer, enrolaram minha vida toda, fiquei com meu nome sujo por uma coisa que não fiz nada de errado”, explica. Márcia contratou um advogado e entrou com um processo na Justiça contra o banco, mas ainda não sabe como vai terminar. O banco está exigindo que ela pague de uma só vez todo o dinheiro que pegou como empréstimo.
600 MILHÕES A MENOS O governo do Rio publicou na segunda-feira (9) edital para tomar empréstimo para pagar salários atrasados. O valor da operação será de R$ 2,9 bilhões, R$ 600 milhões a menos do que o estimado inicialmente. De acordo com a Secretaria de Fazenda do Rio, a redução do valor foi provocada por avaliação mais conservadora do valor da Companhia Estadual de Água e Esgoto (Cedae) pelo Tesouro Nacional. O empréstimo terá ações da companhia, avaliada em R$ 7 bilhões, como garantia.
VOCÊ SABIA
?
O Rio ainda deve o 13º salário de 2016 a cerca de 127.000 servidores e aposentados, uma dívida de R$ 1,2 bilhão.
Servidores lesados devem procurar a defensoria pública »»A
história de Márcia não é particular. Assim como ela, muitos servidores se sentiram lesados nos últimos meses por conta dos atrasos e parcelamentos dos salários. De acordo com Patrícia Cardoso, coordenadora do Núcleo de Defesa do Consumidor (Nudecon) da Defensoria Pública do Rio, o atendimento do núcleo dobrou nos últimos meses. Segundo a defensora, a maioria dos processos têm como objetivo impedir o corte de serviços essenciais, como água e luz, dos funcionários públicos, além dos descontos indevidos de empréstimos consignados. “Quem precisar de atendimento é só ligar para 129 e receber as instruções”, informa.
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GERAL
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Horário de funcionamento do Bicicletário público de Niterói gera questionamentos JAQUELINE DEISTER
RIO DE JANEIRO (RJ)
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s cidades estão tendo que rever o seu planejamento urbano. O município de Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, possui um programa destinado ao incentivo do uso da bike como meio de transporte. Em março deste ano, após três anos de pressão dos cicloativistas da cidade, a Prefeitura inaugurou o Bicicletário Arariboia. Localizado ao lado da estação das barcas, o espaço,
de uso gratuito, possui 416 vagas para bicicletas, bombas para calibrar pneus, tomadas para carregar bicicletas elétricas e banheiros. A iniciativa foi bem recebida pelos ciclistas de Niterói. No entanto, os adeptos das magrelas têm questionado o horário de funcionamento do Bicicletário. Marcelo Santos é operador de áudio e todos os dias pega a barca e pedala cerca de 10 quilômetros para chegar ao trabalho no Rio. Ele conta que ainda não utilizou o estacionamento gratuito de bikes da Praça Ara-
Tomaz Silva /Agência Brasil
CARNAVAL DE RUA
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Bicicletário Arariboia oferece 416 vagas gratuitas é alternativa para ciclistas da cidade riboia devido ao horário limitado de funcionamento. “Eles fecham às 23h e a maioria das vezes eu estou no Rio à noite e retorno na última barca, de meia noite. E quando eu chego em Niterói o Bicicletário está fechado. Eu acho que o horário de fechamento deveria ser meia hora depois da
última barca sair do Rio”, afirmou o ciclista. O Brasil de Fato entrou em contato com a Prefeitura de Niterói para saber o que está sendo feito para resolver o problema. De acordo com o assessor do Programa Niterói de Bicicleta, Felipe Simões, a Prefeitura está realizando um
estudo para saber a demanda de usuários após às onze da noite. Atualmente, o Bicicletário Arariboia conta com 3.5 mil ciclistas cadastrados e funciona de segunda à sexta-feira, das 6h às 23h, e aos sábados, das 7h às 18h. Domingos e feriados o estacionamento fica fechado.
HOSPITAIS FEDERAIS
Juiz determina prazo para manifestação da União sobre hospitais federais do RJ
Fernando Frazão/ Agência Brasil
»»
FOLIA A Riotur recebeu 486 inscrições de blocos de rua para o carnaval 2018. Em relação a 2017, foram 16 solicitações a mais.
O juiz federal Firly Nascimento Filho concedeu 72 horas para a União se posicionar em relação à ação civil pública que pede a renovação imediata de contratos em hospitais federais no Rio de Janeiro. O prazo foi estipulado a partir de uma reunião nesta segunda-feira (9) com a bancada de deputados federais do estado que acompanha a situação das seis unidades de saúde do Rio. O presidente do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj), Nelson Nahon, disse que mais de 600 contratos
Fim de contratos em hospitais federais ameaça serviços
terminam em 2017 e ameaçam o fechamento de serviços nos hospitais da rede federal na capital. No dia 18 de agosto, o Cremerj e o Conselho Regional de
Enfermagem entraram com ação civil pública contra o Ministério da Saúde para garantir a continuidade dos contratos da União de forma emergencial.
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ENTREVISTA
RUTE PINA, MARIANA PITASSE E GERSON DE SOUZA
SÃO PAULO (SP)
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m sua passagem pelo Brasil, o economista Cosmas Musumali, secretário geral do Partido Socialista da Zâmbia, na África, conversou com o Brasil de Fato. Na entrevista, Musumali fala sobre a importância do pan-africanismo, um pensamento que trata sobre os direitos dos povos negros e a libertação dos territórios colonizados no continente africano. Segundo o economista, as ideias pan-africanistas podem contribuir na luta contra os retrocessos que estão acontecendo hoje no Brasil. Brasil de Fato: Como podemos definir o pan-africanismo? Cosmas Musumali: O pan-africanismo pensa a emancipação dos povos africanos e de seus descendentes. O pensamento pan-africanismo é necessário ainda hoje para a luta desses povos porque, onde quer que estejam, eles têm que enfrentar situações específicas que outras pessoas não têm. Vale lembrar que a exploração e a desigualdade não são exclusivas aos africanos e descendentes, então, trabalhar junto com outros povos é importante. Como o Pan-africanismo pode ajudar a pensar uma unidade no Brasil, após o gol de estado? Trabalhar juntos contra
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COSMAS MUSUMALI
“Em 100 anos vamos ver mais peles e rostos africanos” Lilian Campelo
Musumali, os descendentes de africanos no Brasil são os que mais estão perdendo com as reformas de Temer o atual governo no Brasil é urgente. A gente não pode ter o luxo de ficar fragmentado. Os pan-africanistas no Brasil devem ter uma posição formulada em conjunto a respeito do que está acontecendo. Os descendentes de africanos no Brasil são as pessoas que mais estão perdendo com as reformas que estão sendo aplicadas, então, é preciso lutar ainda mais e trabalhar ao lado de outras forças da esquerda. De que forma? O pan-africanismo não somente é importante no Brasil, mas também no mundo inteiro. Então, os que estão fora do país têm
Trabalhar juntos contra o governo atual no Brasil é urgente
o dever de ficar juntos com os daqui. Do mesmo jeito que a gente falou que a vida dos negros importam nos EUA [referência ao movimento Black Lives Matter] há alguns anos, teríamos que estar falando hoje: ‘não destruam as vidas no Bra-
sil e também o Estado de bem-estar que existia aqui’. Essa teria que ser a demanda de todos os africanos, independente de onde estiverem. Qual o futuro da população africana? A população africana vai ter um maior crescimento e isso cria uma cara diferente para o mundo. Em 100 anos vamos ver mais peles e rostos africanos. Serão a maioria, mas ainda sem poder econômico e político. Temos que ter em conta que o crescimento da população vai ser liderado pela África — o continente mais pobre do mundo.
Brasil de Fato: Qual o impacto disso para o mundo? Os impactos têm que ser planejados para que a maior parte da população do mundo não continue marginalizada como é hoje. A boa notícia é que essa população jovem negra terá mais acesso à educação e vai viajar muito. A maior questão é: quais valores essa população vai carregar? A ideia é que carreguem valores de igualdade, honestidade e solidariedade. Valores que vão ajudar a mudar a sociedade do futuro. Coincidentemente, esses são os mesmos valores socialistas.
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ESPORTES
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PAPO ESPORTIVO
Beto Barata/PR
LUIZ FERREIRA
E continuaremos celebrando...
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elebramos quando o Brasil foi escolhido para sediar a Copa do Mundo. Fechamos os olhos para todo o dinheiro desviado na construção das “arenas”. Assistimos passivamente à remoção de casas e escolas para a construção das estruturas pedidas pela FIFA. Aturamos grandes ídolos do esporte afirmando em alto e bom som que “não se faz Copa do Mundo com hospitais e escolas”. E acordamos com a porrada dos 7 a 1 e o surgimento de uma névoa de pessimismo com o chamado “futebol nutella”. Gol da Alemanha. Celebramos quando o
Rio foi escolhido como sede dos Jogos Olímpicos. Fingimos que não era conosco quando o custo das obras chegou na estratosfera. Cobramos resultados dos nossos atletas como um dono de uma megacorporação cobra produtividade de seus empregados sem se preocupar com um mínimo de condições de trabalho. Assistimos Carlos Arthur Nuzman, nome até então intocável do Comitê Olímpico Brasileiro, indo para a cadeia depois de denúncias de irregularidades na escolha da sede para as Olimpíadas. Seguimos celebrando, ébrios pelas medalhas, pelas vitórias e pela inércia que nos caracteriza há séculos.
Futebol carioca tem 31 clubes fora de atividade
»»Uma olhada no site da Federação de Futebol do Rio apon-
ta uma realidade pouco conhecida. Entre os clubes que estão na relação da Série C do estado, 31 estão fora de atividade e não disputaram nada em 2017. Esse esvaziamento atinge cerca de mil profissionais, entre jogadores e comissão técnica, retratando a grande distância dos quatro grandes clubes do estado para os demais. Vários desses 31 ausentes não têm documentação em dia e estão mergulhados em dívidas.
Comitê Organizador do Rio-2016 deve R$ 100 milhões a fornecedores »»Um ano e dois meses depois das Olimpíadas, o Co-Rio (co-
mitê organizador) ainda acumula cerca de R$ 100 milhões em dívidas com fornecedores. São nove credores, a maioria empresas contratadas para entregar material usado em estruturas temporárias dos Jogos.
Assistimos Carlos Arthur Nuzman, nome até então intocável, indo para a cadeia
Cobramos resultados dos nossos atletas como um dono de uma megacorporação cobra produtividade de seus empregados Hoje eu me coloco como um fã do esporte completamente decepcionado com tudo o que foi relatado. Admirador confesso de lendas do esporte e do jornalismo
esportivo lamento profundamente que a situação tenha chegado nesse ponto. Difícil saber onde erramos. Onde falhamos. Ou onde deveríamos parar de celebrar.
ESCOLINHA DE FUTEBOL Lucas Uebel/ Grêmio FBPA
Preferimos a vitória a qualquer custo ao trabalho duro e honesto dentro da gestão esportiva, descobrindo talentos melhorando a qualidade de vida de todos. Mas seguiremos celebrando. Afinal, a rodada vai começar novamente. E se meu time não vencer, não é meu time. Mas se vencer, vocês vão ter que me engolir. Grande abraço e até a próxima.
O niteroiense Léo Moura, que atualmente joga no Grêmio, esteve no Rio no último domingo (8) para inaugurar o Núcleo Realengo da Escolinha de Futebol e Cidadania Léo Moura, em Realengo. A expectativa é de que 700 crianças sejam atendidas pela iniciativa.
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Instalação do árbitro de vídeo divide opiniões no futebol brasileiro Para saber um pouco mais sobre a polêmica, o Brasil de Fato conversou com alguns torcedores de times cariocas Daniel Augusto Jr / Ag. Corinthians
MARIANA PITASSE
RIO DE JANEIRO (RJ)
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Rafael Ribeiro/CBF
instalação do árbitro de vídeo está dividindo opiniões no futebol brasileiro. Alguns técnicos, jogadores e torcedores consideram que esse tipo de tecnologia pode mudar a relação com o esporte, outros acreditam que pode acabar com as injustiças cometidas pela arbitragem. Em meio aos diferentes palpites sobre o assunto, o Brasil de Fato conversou com alguns torcedores de times cariocas para saber o que eles acham dessa polêmica. Para a torcedora do Botafogo Mayra Faria, a tecnologia só traz pontos positivos ao futebol. “Os árbitros estão cometendo muitos erros de marcação. No último domingo, estava em um jogo e o árbitro não quis dar o pênalti, quem teve que dar foi o bandeirinha. E se ele não tivesse visto? Não acho que vamos ficar dependentes da tecnologia, pelo contrário, vai nos ajudar bastante”, afirma.
O gol de mão de Jô, atacante corintiano, foi decisivo para a instalação da tecnologia
Em meados de setembro, após inúmeras polêmicas de erros de arbitragem cometidos durante o Campeonato Brasileiro, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) decidiu instalar o árbitro de vídeo para tirar teima de lances difíceis de serem identificados. Até então, a CBF estava postergando a im-
plantação do sistema por economia, mas o gol de mão de Jô, atacante corintiano, durante partida contra o Vasco, foi decisivo para a mudança. A tecnologia está já em fase de teste e instalação. “Se funcionar no mesmo esquema como vemos no vôlei, por exemplo, pode ser que dê muito certo. As-
FRASE DA SEMANA Já torci para o Palmeiras, aí depois passei a torcer para o Santos quando comecei a jogar lá. Quando vira atleta, você acaba gostando do time em que está trabalhando” Neymar, em programa de TV, admitindo que foi torcedor do Palmeiras quando era criança
sim poderemos evitar erros de arbitragem que têm prejudicado o placar em um monte de jogos”, afirma Vitor Tufani, torcedor do Vasco. Ao contrário do que é esperado por Vitor, as imagens de lances duvidosos não poderão ser solicitadas por jogadores e treinadores durante os jo-
gos do Campeonato Brasileiro. Segundo informações da Comissão Nacional de Arbitragem, quem pedir árbitro de vídeo ao longo das partidas será penalizado, podendo até ser expulso. No Brasileirão, a tecnologia será conduzida pelo juiz responsável por acompanhar a partida da cabine. Somente ele poderá corrigir erros de arbitragem. “Mesmo assim, quando se coloca na balança, é muito importante ter o árbitro. Eu prefiro que o justo prevaleça do que o sentimento de frustração”, opina Breno Batista, torcedor do Vasco. Além do Brasil, outros 12 países têm feito experimentos com o árbitro de vídeo. Entre eles, Alemanha, Austrália, Estados Unidos, França e Holanda. A tecnologia, que já havia sido utilizado pela Fifa na última edição do Mundial de Clubes, também voltará a ser usada na Copa das Confederações, evento-teste para o Copa de 2018.
Quatro camisas brasileiras estão entre 50 maiores da história do futebol »»A conceituada revista inglesa FourFourTwo publicou recentemente um
ranking com as 50 maiores camisas de futebol de todos os tempos e incluiu quatro representantes brasileiros. Entre as quatro camisas do Brasil, três são de clubes e uma é da seleção brasileira. Quem primeiro apareceu na lista foi o Madureira, do Rio, com uma camisa de 2013 que homenageou o revolucionário Che Guevara. Em seguida, está o uniforme usado pelo Brasil em 1986, depois a camisa do Grêmio de 1989 e 1990, e por último, o uniforme do Corinthians, de 1982 e 1983. Os critérios usados pela revista foram a beleza, a importância do time e a relação com o que acontecia no mundo.
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Artistas encarnam Orixás em mostra inédita no Rio
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Daryan-Dornelles
m um momento em que a cidade precisa de mais tolerância religiosa, entra em cartaz a exposição “Orixás: quando o mito veste o corpo”. As fotografias de Daryan Dornelles e Stefano Martini ficam expostas até 5 de novembro, no Centro Cultural Justiça Federal. Com entrada livre, a mostra idealizada por Margo Margot, pode ser visitada de terça a domingo, das 12h às 19h. A partir de pesquisa bibliográfica, Margot organizou vinte “Orixás” para nos convidar conhecer profundamente um pouco mais de uma das culturas de base do povo brasileiro. A exposição, mais do que uma mostra visual, busca trazer reflexões sobre a essência dos mitos africanos cultuados no candomblé. Nas imagens expostas, artistas como Zezé Motta, Gilberto Gil, Vidal Assis e João Donato aparecem em meio à trajes e elementos da natureza que compõe o ambiente de cada orixá.
ONDE VER
Zezé Motta e Gilberto Gil representam os orixás
OUVIR AS ESTRELAS
HORÓSCOPO
Stefano Martini
Vamos começar nosso papo falando sobre aquele signo que quase todo mundo conhece, que a gente identifica como o nosso. O signo que é definido pelo dia e mês do nosso nascimento. Na verdade, astrologicamente, este é o signo solar. Ou seja, quando digo o meu signo, estou dizendo que no dia em que nasci, o Sol transitava por aquele signo. Os signos são os equivalentes astrológicos das constelações que a gente vê no céu. Então, esse signo diz apenas a posição do Sol quando nasci. As pessoas me perguntam sempre: como podem existir piscianos ou virginianos tão diferentes? É porque quando a gente traça o mapa, não olha só a posição do Sol, mas também a posição da Lua, de Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter, Saturno, Urano, Netuno e Plutão. Alguns astrólogos ainda olham a posição de alguns asteróides. O que o mapa astral mostra é o desenho do céu, visto a partir da terra, no momento em que a pessoa nasceu. Por isso, nós temos vários signos no nosso mapa. No entanto, temos o foco no signo solar porque o Sol é o centro do sistema. E como centro do sistema solar, simboliza o nosso centro. O centro ao redor do qual todo o resto gira, mas para saber como gira, vamos ter que analisar os outros aspectos do mapa. Ana Lúcia Vaz
Centro Cultural Justiça Federal Avenida Rio Branco, 241, no Centro do Rio de Janeiro. Em cartaz até 05/11. De terça a domingo, das 12h às 19h
MAFALDA COMPLETA 53 ANOS
Tania Rego/AgenciaBrasil
Há exatos 53 anos, a personagem Mafalda, do cartunista argentino Quino, era publicada pela primeira vez. A menina que questiona as desigualdades do mundo, se preocupa com a humanidade, e não entende os padrões impostos pelos adultos, ganhou reconhecimento internacional, especialmente nos países da América Latina.
CULTURA & LAZER
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Na história, a personagem Glória tenta confrontar uma relação abusiva
EXPOSIÇÃO
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Filme sobre violência contra mulher é premiado no Festival de Brasília
Os corredores do Centro de Referência do Artesanato Brasileiro estão recebendo a exposição “Festa Brasileira: Fantasia Feita à Mão”, que reúne centenas de objetos tradicionais das culturas de Norte a Sul do país. O quê: Festa Brasileira: Fantasia Feita à Mão. Quando: Até 28/10, das 18h30 às 21h. Onde: Rua Pedro I, 71, no Centro. Quanto: 0800.
Curta-metragem de Laís Melo denuncia relações abusivas e violência doméstica
Cinema ao ar livre em Campo Grande
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A diretora Laís viu o despertar de seu interesse por contar histórias de mulheres da classe trabalhadora quando trabalhou como repórter policial, em um jornal da região metropolitana de Curitiba. “Via histórias que se repetiam, que aconteceram comigo, com minha mãe, com amigas e com outras que nunca conheci pessoalmente”, explica. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Avon, três em cada cinco mulheres jovens já sofreram violência em relacionamentos. “No cinema, minha intenção é criar espaços de escuta e voz às mulheres da classe trabalhadora, periféricas, negras, lésbicas, bissexuais, transexuais, do campo, indígena. Também, criar estratégias de ‘fazer com’, repensando os modos de produção”, conclui.
CINEMA
CAROLINA GOETTEN CURITIBA (PR)
ssistir a “Tentei”, sendo mulher, é muito forte. Com marcas sensíveis de realidade, o filme é fruto da construção coletiva de uma equipe encabeçada por mulheres e que conhece muito bem a denúncia feita por elas. Dirigido por Laís Melo, “Tentei” ganhou três prêmios no Festival de Brasília do Cinema Nacional, nas categorias de melhor filme, melhor fotografia - pelo trabalho de Renata Correa -, e melhor atriz - pela atuação de Patricia Saravy. Na história, a personagem Glória tenta confrontar uma relação abusiva. Seu marido a violenta todos os dias. Mas o final é que é doloroso: como milhares de mulheres, atadas pelas limitações que a sociedade nos coloca, Glória não consegue se libertar.
Mostra expõe tradições nacionais na Praça Tiradentes
De quarta a domingo, dias 11 a 15, o Park Shopping Campo Grande apresenta festival de cinema ao ar livre. Na programação, filmes como “Minions”, “Capitão América” e “Moana”. O quê: Festival de cinema ao ar livre. Quando: Entre os dias 11 e 15, a partir das 18h15. Onde: Estrada do Monteiro, 1200, em Campo Grande. Quanto: 1 kg de alimento não perecível ou itens de higiene pessoal.
12 CULTURA & LAZER ENTREVISTA
RIO DE JANEIRO, 11 A 19 DE OUTUBRO DE 2017
JOÃO RIPPER
João Ripper: “Papel da fotografia é mostrar as belezas que são ocultadas” Fotos: João Ripper
VINÍCIUS SOBREIRA
RECIFE (PE)
O
carioca João Roberto Ripper, 64 anos, é fotojornalista autodidata. Seu trabalho é dedicado a questões sociais e aos Direitos Humanos. Em 2004, junto ao Observatório das Favelas fundou o programa Imagens do Povo, agência-escola que funciona dentro do conjunto de favelas da Maré. Por mais de 12 anos, o Imagens do Povo capacita moradores de favelas para o trabalho com fotografia aliado à percepção crítica. Brasil de Fato: O que é “história única” que você sempre se refere? João Ripper: É quando criam um estereótipo de determinadas populações, geralmente associadas à violência. Os alvos dessas “histórias únicas” são principalmente os moradores de favelas, as populações tradicionais, os índios, quilombolas, agricultores sem-terra. Essas populações sempre aparecem como se fossem responsáveis pela violência, mas na grande maioria das vezes elas são vítimas da violência. E quando se passa muito tempo veiculando apenas informações de violência relacionadas a elas, acabam atingidas pelo estigma. E de que forma isso afeta a vida dessas pessoas? Isso fere a dignidade das pessoas e faz com que as outras pessoas que recebem a informação acabem se distanciando dessa comunidade. Aquele grupo passa a não ser aceito pela sociedade, não consegue apoio e isso dificulta ainda mais o processo de luta por melhorias na
condição de vida. Portanto, a criação das histórias únicas está ligada aos poderes, sejam governamentais, políticos ou econômicos. Esses poderes têm essa visão sobre as comunidades. Eles dominam o mercado da comunicação e difundem apenas as histórias únicas, retiram a beleza de populações e ignoram tudo de bom que se faz nas comunidades. Como a fotografia pode ajudar a romper com isso? O papel da fotografia é se empenhar cada vez mais em mostrar as belezas que são ocultadas e denunciar tudo o que prejudica esses trabalhadores e as populações menos favorecidas, que são massacradas com ações do Estado brasileiro e dos poderosos. E o nosso trabalho é ver com bons olhos as pessoas que fotografamos. Temos que mostrar como aquelas pessoas são boas, mas que infelizmente estão sendo massacradas, tendo seus direitos usurpados. Precisamos dar uma resposta de resistência, mas também mostrar como são belas essas populações que são estereotipadas como violentas. O que você diria ao leitor que vive nas periferias e que sonha em ser fotógrafo? Que tenha muita vontade. Busque se formar com as experiências que já estão acontecendo, para que aprenda mais de fotografia. O importante é ter conhecimento, muita vontade e um olhar de bem para essas populações esquecidas e criminalizadas. A gente precisa de pessoas que tenham um doce olhar sobre o nosso povo. Se você tem esse olhar, mergulha no teu sonho.