tfg | bosque da conquista

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bosque da conquista tfg vila bela 2018


Pontifícia Universidade Católica de Campinas Centro de Ciências Exatas e de Tecnologias Faculdade de Arquitetura e Urbanismo Trabalho Final de Graduação Campinas | 2018 Breno Pires Pilot Orientador: Antonio Fabiano Jr. Banca Examinadora: Maria Eliza de Castro Pita (interna) Guilherme Moreira Petrella (externa)



_agradecimentos se aqui exibe-se o produto que é fruto de um longo período de academia e experiências relativas à profissão que honrarei daqui pra frente, só tenho a agradecer àqueles que fizeram parte de mim, que repararam em mim e a mim. espero ser capaz de olhar sempre para o que há além da minha vã filosofia, e assim participar da reparação coletiva do meio em que vivemos. obrigado, primeiramente, à minha avó Helena, minha companheira de vida e de sonhos. se algo é pra sempre, é meu amor e minha gratidão por você. obrigado por colocar um lápis em minha mão e me fazer acreditar que o mundo estava em sua ponta. obrigado por ser parte de mim e estar, até o fim, na minha mente e na minha pele, assim como em todo passo meu. obrigado aos meus pais, Angelica e Roberto, por serem base, e ao mesmo tempo me deixarem voar. serei eternamente grato por me permitirem me descobrir e viver intensamente cada momento e reflexão. obrigado por me respeitarem, sobretudo, com amor. obrigado Gabriela Avelino, minha eterna saudade adolescente, por ser inspiração e por

compartilhar momentos onde descobrimos que queríamos mudar o mundo. obrigado, acima de tudo, por me ensinar o que é caridade, e por ainda estar ao meu lado em cada pensamento. obrigado Milena Kammer, por me ensinar que o amor, assim como todas as lutas daqueles que pensam e sentem, é sobre se doar. te ter ao meu lado me ajuda a encarar o mundo com um sorriso no rosto. obrigado aos companheiros de vida, fundamentais nos momentos certos. obrigado Pedro Vertamatti, por ser vibração, Luna Viana, pela autenticidade, e Pedro Boccato, por ser turbulência. obrigado aos companheiros de academia, esperando que se tornem, assim como os últimos, presentes no depois. obrigado Letícia Papa, pela consistência, Felipe Santos, pelos desafios, e Carol Dantas, pelas inconformidades. obrigado Bruna Tonso, pela sintonia, e José Camilo, por me reinventar. obrigado João Pedro Tófano, pela transparência, e Murilo Tedesco, pelas provocações. obrigado, especialmente, ao grupo que tive o privilégio de compor durante este trabalho, por toda a dedicação.


obrigado àqueles que, pelo cotidiano ou por acasos, se tornaram companheiros de reflexões. obrigado Cláudio Tibiriçá, por me ajudar a dar sentido às coisas, Isaias Couto, por me ensinar a ouvir, e Felipe Neres, por me ensinar mais sobre o olhar. obrigado Viviane Bartolo e Daniel Ribeiro, por serem modelos, Guilherme Oliveira, Sandra Morikawa, Henrique Borçato e Cinthia Cruz, por acreditarem que eu era capaz de estar ao lado de vocês. obrigado aos mestres da vida, reparadores máximos. obrigado Marcelo Adolfi, Débora Frazzatto, Renata Baesso, Nádia Cazarim, Maria Eliza Castro, Beatriz Aranha, Vanessa Bello, Claudio Manetti e Wilson Mariana, por toda a clareza. obrigado, especialmente, Cláudia Ribeiro, pela sinceridade, e Fábio Boretti, por me cativar a cada palavra.

obrigado Vera Luz, por ser, de fato, mulher iluminada, que abre os caminhos e nos empurra pra dentro. obrigado por ser, ao mesmo tempo, força viril e toque suave, e por me ensinar o momento certo das coisas. e dos coisos também. obrigado, finalmente, ao meu orientador, Antonio Fabiano Jr., por ser luta e me fazer lutar, sempre com carinho e atenção. aliás, obrigado por me deixar lutar ao seu lado, por sempre saber o que falar, e por não ter medo de ser quem é. obrigado, principalmente, por me ajudar a saber quem eu sou, e quem eu quero ser. obrigado por estar comigo em cada traço, longe da borracha. se eu acredito no poder do nosso esforço, é por você. obrigado por ter sido sempre mais do que professor, orientador e guia, obrigado por ser meu amigo.

sou grato pelo privilégio de cada ponto final. honrarei tudo e todos em cada continuação que está por vir.



na profundidade imensurável da mata, busca-se a inversão de paradigmas através da procura da conexão do eu com o mundo - relação que transcende o atributo e a atribuição, na luta pela defesa da vida - por meio de programa de acerto de contas com o infinito, desenhado com a finitude da madeira e do barro, matérias orgânicas da natureza. o que nos distingue como humanos é a consciência da morte. disto advém a compaixão e também a crueldade. nisto o amor re-vela-se em linhas abstratas - arte-ofício de construção humana, demasiadamente humana - como água em luz. Antonio Fabiano Jr.



_índice começo e fim | processo o espaço coletivo na periferia o parque a vida e a morte contextualização | vila bela leitura e abordagem | território pavilhão comum reparatório arena d’água casulos pavilhão da existência caminhos e significados sistemas estruturais considerações finais anexos referências bibliografia nós

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la cittĂ offshore | fabio alessadro fusco


_começo e fim | processo como a arquitetura pode agir em territórios onde o Estado planeja e executa sua ausência, como projeto de existência e presença, a todo momento? qual a função do desenho na proposição de novos espaços e, principalmente, na redefinição de espaços já existentes? indagações como estas nos provocam a reinventar a todo momento o sentido das coisas, conformar as visões de mundo às vivências, na busca pelo traço submetido - ou em confronto - ao significado. se o território é protagonista em toda ação proposta, o projeto de arquitetura se apresenta como ferramenta possível para que pessoas alcancem seus sonhos, a começar pelo maior deles: a constituição de cidadania, construída a cada passo do caminhar e reconhecida, no urbano, não somente em cada calçada, rua e parque, mas também presente em cada encontro e despedida. encontro como maneira de circunscrever uma realidade factível para o projeto de um mundo melhor para todos, e despedida por também reconhecer seus limites socioespaciais.

“Quando vier a primavera” - Alberto Caeiro (heterônimo de Fernando Pessoa) “Quando vier a Primavera, Se eu já estiver morto, As flores florirão da mesma maneira E as árvores não serão menos verdes que na Primavera passada. A realidade não precisa de mim. Sinto uma alegria enorme Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma. Se soubesse que amanhã morria E a Primavera era depois de amanhã, Morreria contente, porque ela era depois de amanhã. Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo? Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo. E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse. Por isso, se morrer agora, morro contente, Porque tudo é real e tudo está certo. Podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem. Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele. Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências. O que for, quando for, é que será o que é.” _11


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la cittĂ orribile | fabio alessadro fusco


_o espaço coletivo na periferia nas periferias (no plural por compreender que, mesmo tendo linha condutora comum, cada periferia se configura em e com características particulares) da maior cidade do Brasil, constituídas inicialmente pela classe trabalhadora resultante da industrialização de décadas passadas, a urgência pelo morar é violenta e supera qualquer outra força. o poder público, que poderia se apresentar como possível agente regulador de interesses para que uma maior equalização de direitos pudesse se efetivar no mundo urbano, trata as pessoas como números. seu único interesse é fazer com que essas pessoas possam chegar rapidamente no centro para trabalhar, parte de um processo que, ao investir apenas em infraestruturas e transportes, deixa de lado a qualidade de vida e a felicidade daqueles que movem a cidade.

entende-se, então, o projeto de arquitetura e urbanismo como a proposição da Casa Pública, onde ações e vivências do cotidiano se tornam coletivas, em espaços comuns. banheiros, cozinhas, lavanderias para todos. conversas, encontros, afetos. a partir delas - as casas e deles - os afetos -, os lugares são reconquistados e, possivelmente, ressignificados.

em traçados urbanos desorganizados, pessoas se juntam e praticamente não sobra nem tempo, nem lugares. tempo para celebrar a vida, e lugares que sejam palco para isso. a água fica suja, os verdes são ocupados e morrem. forças surgem nas brechas que a ausência do Estado deixa.

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la cittรก dopo jefferson | fabio alessadro fusco


_o parque a urbanização violenta e desmedida nas periferias da cidade corta ao meio lugares importantes, para as pessoas e animais, para a manutenção do meio ambiente e para a renovação da vida. o Parque Jardim da Conquista é um remanescente de mata atlântica localizado na porção noroeste da área de estudo e, no início dos anos 2000, foi rasgada pela av. jacu-pêssego, que surgiu como um braço do rodoanel leste.

e a morte, do meio natural, do construído e dos seres humanos. é preciso entregar-se aos espaços para habitá-los. o corpo humano, em sua grande variedade de formas, é o que deve guiar a construção desta morada comum. nossos corpos querem uma cidade que preze pela construção coletiva e pela liberdade de pensá-la, repensá-la e reinaugurá-la sempre.

no lado oeste da avenida, o que resta hoje é um maciço arbóreo delimitado por três vias locais e dominado pelas forças alternativas à ausência do Estado, que estipulam dois usos para este território que, em grande medida, trazem significados negativos para o mesmo. estes são: a desova de corpos e o desmanche de carros. resto de espaço para objetos sociais. em uma área que contempla tais questões, além de especificidades como a topografia acentuada, a nascente de um dos córregos do bairro e uma mata alta e densa, o projeto de arquitetura surge para a ressignificação. ressignificar espaços e conceitos da vida humana. o meio ambiente em que vivemos e a relação do homem com a natureza. a vida _15


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extremities dirt and various repressed emotions | fabio alessadro fusco


_a vida e a morte a morte tem importância fundamental para a existência. ela é apenas mais um instante da vida, como todos os outros. como todos os outros instantes, que morrem e não voltam mais. porém, a consciência da morte é o que nos faz viver, é o que nos traz a noção de tempo, e o que dá sentido à vida. na antiguidade, o paganismo (pagus = terra onde se planta/habita) tratava a morte como algo sagrado. o homem (humus = feito de terra) ancestral da família era enterrado, sacralizando aquele lugar, tornando-o fértil e próspero. “tu és pó, e ao pó retornarás”. a idade moderna, entretanto, inaugura o dualismo vida x morte e, junto ao racionalismo, nos afasta do pensamento crítico sobre quais são suas razões e como enfrentá-las. “não se pode olhar de frente, nem o Sol, nem a morte.” - La Rochefoucauld. a vida e a morte se tornam inconciliáveis. a contemporaneidade, por sua vez, nos levou à banalização da morte, traduzindo-a em fenômenos biológicos (puberdade, envelhecimento), sociais (taxas de mortalidade), demográficos (envelhecimento da população), naturais (previsível, investigável), e até públicos (dever do Estado, certidão de óbito). tais interpretações nos afastam dos reais significados das coisas,

e até nos impedem de parar para pensar e, de fato, superar significados impostos pela sociedade. “Não se trata absolutamente de fuga para o sonho ou o irracional. Quero dizer que preciso mudar de ponto de observação, que preciso considerar o mundo sob uma outra ótica, outra lógica, outros meios de conhecimento e controle.” – Ítalo Calvino em “Seis propostas para o novo milênio”.

por que não, então, indagar sobre a relação que temos com a morte? a perda de alguém tem que significar apenas dor e sofrimento? qual o aprendizado que podemos tirar disso? como fazer com que, de fato, a morte tenha algo a nos ensinar sobre a vida? como traduzir isso através da proposição de espaços e a ressignificação de lugares? se, como Nietzsche afirmou, “nossa vida, como toda vida, é ao mesmo tempo uma morte perpétua”, aqui entende-se que é preciso encarar a realidade de cada momento, que não volta, fortalecendo as conexões com aquilo que nos mantém vivos - sejam pessoas, lugares, hábitos ou ideias -, a fim de ressignificar nossa existência ou, pelo menos, cada dia vivido e sobrevivido por nós. _17


_contextualização | vila bela “os mecanismos históricos, sociais, econômicos e espaciais de urbanização de grandes metrópoles, imersos em um sistema de desenvolvimento desigual, geram territórios com diagnósticos em grande medida semelhantes. a violência urbana tem sido elemento, pelo avesso, de articulação da própria configuração da cidade. é a norma, enquanto regra que delimita e norteia a lógica do desenho urbano regido pelo capital.” - (PILOT, SANTOS, CARLOS JR., AZEVEDO, 2018)

a vila bela é um bairro localizado na subprefeitura de são mateus, mais especificamente na divisa entre os distritos de são rafael e iguatemi. nas delimitações administrativas, faz parte da zona leste 2 do município de são paulo, uma região caracterizada pela histórica presença de indústrias e vilas operárias.o desenvolvimento da cidade, com o passar do tempo, se baseou em um projeto onde o Estado concentrava investimentos em regiões de interesses econômicos, o que gerou marcantes desigualdades socioespaciais, assim como a clara diferença de oportunidades, levando à ocupação desenfreada e o adensamento populacional das periferias. o plano urbano no qual o presente trabalho se sustenta foi construído sob duas principais _18

premissas: conexões - da zona leste com são paulo (centro) no entendimento do espaço da metrópole, e da vila bela com seu entorno e as principais infraestruturas da região, através de modais de mobilidade em escalas micro, médio e macro -, e fortalecimento da comunidade espalhado pelo sistema de espaços livres através da promoção de espaços que abraçam atividades do cotidiano privado no ambiente coletivo, a casa pública, sejam ruas, calçadas, corpos d’água, vazios urbanos e até lajes e garagens. o espaço público é o lugar materializado do coletivo. ele pode ter infinitas formas, jeitos e vocações, mas é sempre isso: o território da experiência do lugar que dá forma à ela. “O teor não programático do trabalho é desejado e importante, por procurar se inserir em um processo participativo, mesmo que incipiente, partindo da aproximação com lideranças políticas atuantes na Vila Bela desde seu início. A evidência da contraposição entre público vs. privado parte da premissa da Casa Pública, entendendo alguns programas domésticos como infraestruturas públicas: banheiros, chuveiros, cozinhas, lavanderias e varais coletivos.” - (PILOT, SANTOS, CARLOS JR., AZEVEDO, 2018)


o projeto em questão, traduzido em um caso de releitura de espaços coletivos como produção de conhecimento para a sociedade, nasce de um pensamento oriundo de tais proposições, alimentando a discussão acerca do desenho enquanto ferramenta de discussão, produção e atuação do cidadão, assim como da constituição de cidadania. o território investigado é, então, um recorte para propostas de ressignificação de um lugar e de valores. “[...] na busca de novos paradigmas não só de práticas sociais, mas de memórias coletivas, no apontamento para posicionamentos de resistência capazes de costurar, também, novas relações com o espaço construído e natural.” - (PILOT, SANTOS, CARLOS JR., AZEVEDO, 2018)

rmsp | são paulo

são paulo | são mateus

são mateus | vila bela

vila bela | bosque da conquista _19


_leitura e abordagem | território este fragmento do parque jardim nova conquista é um remanescente de maciço arbóreo denso, exemplar do que era a mata atlântica antes da ação antrópica (muitas vezes) violenta neste território. caracterizado por declividade acentuada, cerca de 30m de desnível entre o ponto mais alto e o mais baixo, as dobras do terreno geram marcantes linhas de drenagem e de festo, sinalizando, também, a nascente do córrego que dali sai e determina o traçado urbano da ocupação a oeste do recorte. delimitado pelas ruas oscarito e abelardo barbosa e pela travessa ayrton senna, este remanescente, hoje em dia, se apresenta como um vazio urbano, não ocupado por atividades formais ou qualificadas para uso público. o que significa, então, um território que apresenta enorme potencial - seja em aspectos ambientais, como naqueles relacionados a equipamentos públicos de lazer ou mesmo lugares de afeto -, permanecer vazio? segundo informações concedidas por uma das líderes comunitárias do bairro, Edilene Silva, são duas as práticas atribuídas àquele local: o desmanche informal de carros e a desova de corpos. em um _20


jardim da conquista

bosque da conquista

parque jardim da nova conquista

vila bela

jardim nova conquista

av. jacu-pĂŞssego _21


território marcado pela política de ausência do Estado, forças alternativas regem as dinâmicas socioespaciais, impedindo aquele lugar de ter qualquer uso dedicado às pessoas e seu cotidiano. pelo simples fato de levarem significados negativos ao território, estas questões simbolizam a morte de um espaço que poderia e deveria participar do fortalecimento coletivo, assim como o afastam de se tornar palco para transformações socioespaciais alavancadas pelas pessoas, pela própria comunidade. o lugar é um vazio, um buraco no meio do mesmo buraco que é a vila bela, esquecida pela cidade e desconectada da mesma. o projeto de arquitetura surge, então, como o Bosque da Conquista. aqui, a intenção não é só a busca pela provocação e questionamento da visão que as pessoas construíram daquele lugar, mas também de pensar em formas ou contraformas de intenção e resistência, como essência e origem, que possam aflorar o potencial ambiental, social e coletivo que o território apresenta. dois pavilhões, três casulos, uma arena, um mirante e um bebedouro compõem a proposta, além de inúmeras possibilidades de _22


topos

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caminhos desenhados pelo próprio uso feito pelo caminhar. implantados nas clareiras da densa massa arbórea, os espaços construídos pretendem tocar o chão, grampeando as dobras do terreno, agredindo-o o mínimo possível e abrandando a contraposição entre paisagem natural e construída, criando pontos de luz no buraco deixado e ignorado pelo ser humano. pequenas sombras fluídas, capazes de se abrir completamente, redefinem a ideia de permanência e passagem, portal e porta, ao mesmo tempo que questionam o uso privado-públicoindivíduo-coletivo. são pequenas grapas no chão criando uma linha tênue que separa e define o conceito e o espaço. a horta comunitária proposta pode ser acessada pela franja sul do bosque, indicada pela presença de uma plataforma elevatória. em apoio é criado o Pavilhão Comum, que abriga a cozinha coletiva e o vestiário para os trabalhadores da horta, assim como um espaço para alimentação e o berçário de mudas, amarrando as dobras do terreno assim como uma de suas principais linhas de drenagem. adentrando o bosque, encontramos o Reparatório, um mirante que alcança o _24


รกgua _25


topo das árvores, remetendo a dicotomia de sentidos aos quais o usuário se submete: a observação e reconexão com a cidade, e a autorreparação, relativa ao posicionamento que tomamos aos valores da sociedade como um todo, não só aqueles provocados aqui. no centro do recorte, acompanhando a nascente do córrego ali presente, propõese a Arena d’Água, um espaço de micro intervenções de mobiliário urbano conformadas ao território, que naturalmente tem forma de anfiteatro, podendo abrigar encontros coletivos, sejam assembleias ou simples permanências. em um arco mais distante da nascente, são propostos os elementos que amarram a provocação à questão da desova de corpos. os Casulos são abrigos para espaços de despedida, assim como para as composteiras humanas, em uma proposta alternativa para a destinação daquilo que fica quando nós, os seres humanos, partimos. por final, o Pavilhão da Existência conforma outro acesso ao bosque, em um espaço de permanência que se conforma ao redor do córrego e se configura como praça da rua, como se o bosque englobasse parte dela, _26


cheios e vazios _27


em forma de passarelas, arquibancadas e cobertura. “a arquitetura tem o seu espaço de existência. encontra-se numa ligação física especial com a vida. no meu ponto de vista, inicialmente não é mensagem nem sinal, mas invólucro e cenário da vida, um recipiente sensível para o ritmo dos passos no chão, para a concentração do trabalho, para o silêncio do sono.” - (ZUMTHOR, 2005)

o bosque se consolida pela presença dessas proposições pontuais de espaços construídos, e não por uma intervenção que ocupa a área como um todo, formando microcosmos a partir da criação de espaços. aqui, é preferível que o usuário explore o território se guiando pelos pontos de luz e por onde a topografia natural permite, assim como por sua própria intuição e natureza. o conceito proposto se fundamenta ao entender que o projeto de arquitetura deve respeitar o ambiente natural, desaparecendo e dando lugar aos sentidos criados pelas próprias pessoas que, junto ao território, são protagonistas em qualquer ato de apropriação.

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f b

g f

g

arena d’água

h c

c

h

casulos b

pavilhão da existência

d a

bebedouro

reparatório

e

jardim dos carros

pavilhão comum d

e

horta comunitária

a

implantação | 1:1250 _29



corte a | 1:200

corte b | 1:125



corte c | 1:125

corte d | 1:200


_pavilhão comum ocupando o local de acesso para o desmanche de carros que ocorria no parque, a proposição para suas franjas é a horta comunitária, uma iniciativa que pretende fortalecer o senso de comunidade e de pertencimento da população. além de barrar usos indesejados nesta área, sua presença atrai as pessoas, tanto pelo trabalho coletivo, quanto pelo que é produzido. esta produção se dá em uma porção de terreno escalonado, vencendo um desnível de 5m com o auxílio da única plataforma elevatória que entra no bosque. no final da plataforma, que se alinha em direção à nascente presente no bosque, o pavilhão comum surge com a função de apoio à horta e às pessoas que trabalham ali, mas também amarra-se ao conceito de casa pública, dado que seu principal equipamento é a pequena cozinha coletiva que, por sua vez, configura espaços de convívio. a estrutura principal toca o chão na dobra do terreno, perpendicularmente à linha de drenagem marcada pelo mesmo. a arquitetura anuncia a importante presença da água que, em caso de chuvas, é captada do solo, passa pelo meio do espaço em uma linha marcada no piso e na cobertura, e é despejada novamente em seu caminho _34


planta | 1:125 _35


natural pelo terreno. no final dele, a proposta de um bebedouro coletivo dá sentido final à presença da água, tensionando sua presença natural ali, em contraposição à infraestrutura relacionada à cidade. o espaço também conta com uma área para refeições e um berçário de mudas, desenvolvido embaixo da árvore que rasga o piso. além disso, uma passarela sai em direção ao local onde se depositava as carcaças de carros, que serão manipulados para receber plantas floridas que atraem borboletas, a fim de criar um espaço agradável de permanência e memória. algumas flores possíveis são os girassóis (Helianthus annus), o funcho (Foeniculum vulgare) e as margaridas (Leucanthemum vulgare). o nível em que o pavilhão toca o solo encontra uma curva de nível que percorre todo o parque, atravessando-o por completo, o que configura este espaço construído, assim como a plataforma elevatória que dá acesso a ele, como partes de um caminho urbano, pelo qual o usuário anda naturalmente e encontra outros pontos de luz dentro do bosque.

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isomĂŠtrica - carros

isomĂŠtrica - bebedouro

corte e | 1:125 _37


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perspectiva isomĂŠtrica


_reparatório também ancorado ao terreno, o reparatório é um mirante que se espacializa em três superfícies paralelas de cheios e vazios, e duas superfícies maciças, perpendiculares às anteriores, e também paralelas entre elas. os cheios e vazios, maciços e ocos, remetem aos diferentes planos de preenchimento da paisagem natural e irregular na qual o projeto se insere, ou seja, as árvores. ao mesmo tempo, contrapõe-se a este cenário por se desenvolver em uma estrutura estritamente regular e modular. uma rampa e duas escadarias em diferentes direções encontram três pontos de observação em três diferentes alturas, chegando a alcançar o topo das árvores. neles, o caminhador para e repara nas indefinidas linhas entre paisagem natural e artificial, se reconectando com a cidade, na esperança de que o próximo a ser reparado seja ele mesmo, passando por experiências e saindo de lá com visões fortalecidas e renovadas.

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planta | 1:125


perspectivas isomĂŠtricas _41


_arena d’água marcando o centro físico do bosque está a nascente do córrego que rasga o território a seu redor. o terreno naturalmente cria o perfil de anfiteatro em volta do local de nascimento da água, e assim recebe microequipamentos de mobiliário urbano, assentados no solo praticamente sem alterá-lo. além disso, instalações com cordas amarradas às arvores indicam as visuais importantes para o espaço construído. alimentando o potencial natural do lugar, espera-se que a arena d’água possa receber atividades coletivas, seja de permanências ou mesmo de discussões, a partir de um espaço configurado para a confluência de pontos de vista em direção à importância da água, tanto naquele local, como em relação à sua presença na cidade, e qual nosso posicionamento perante tal.

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_casulos a implantação de três casulos na continuidade do caminho urbano previamente apresentado coloca em atrito os inúmeros acontecimentos do bosque. Permanências e passagens. Passado e futuro. vida e morte. a intenção é questionar os significados desta última, e como nossas sociedade lida com essa questão. será que só podem estar relacionados a ela sentimentos tristes e ruins? será que temos que encará-la como fim?

o pavimento térreo abriga o funcionamento técnico deste programa, através do qual se retira os materiais resultantes do processo, sendo possível transportá-los até a horta comunitária e o berçário de mudas, a fim de dar uma nova destinação àquilo que um dia foi o corpo de alguém, e ao mesmo tempo reforçar o inevitável teor cíclico da vida. A vida continua. *Anexo 1 - Urban Death Project

cada um dos três é, primariamente, um espaço de despedida, que pode abrigar diversos rituais que tenham essa função, propondo uma alternativa aos enterros e cremações, que é a compostagem humana*. nos abrigos, conformados através de duas superfícies que se amarram, o pavimento superior - acessado através da linha de fluxo principal do bosque - é por si o espaço do ritual de despedida. este, envolve um núcleo vertical de concreto que, repleto de materiais orgânicos e biomassa, como terra e chips de madeira, receberá os corpos daqueles que faleceram, dando início ao processo de transformação do corpo no qual seus componentes são incorporados à matéria orgânica e que, em um período de nove meses, resulta em terra fértil. _43


planta - tĂŠrreo | 1:100 _44


planta - 1o pavimento | 1:100 _45


corte f | 1:50

corte g | 1:50 _46


perspectiva isomĂŠtrica _47


_pavilhão da existência configurado como outro acesso ao território, o pavilhão da existência é, antes de tudo, uma parte da rua abelardo barbosa englobada pelo bosque. passarelas, pisos e arquibancadas que novamente grampeiam o perfil natural do terreno, tocam o chão e fazem o caminhador interagir de diversas formas com o córrego, criando um portal para a água ali presente. ao caminhar e permanecer nas diversas espacialidades geradas, a contemplação do rio associada ao convívio coletivo estabelece, na transição entre cidade e bosque, a reafirmação do senso de pertencimento das pessoas com aquele lugar, que independe de qualquer acontecimento interno àquela área. a cobertura, por sua vez, indica a direção de alguns dos pontos de luz de dentro do bosque. além disso, acolhe mais um elemento de mobiliário urbano, anunciado como prateleiras e fechamentos que abrigam materiais e equipamentos de intervenção no bosque, para uso público e coletivo, a fim de proporcionar ferramentas para apropriação dos espaços, assim como fomentar processos que colaboram para isso. _48


planta | 1:125 _49


corte h | 1:75

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perspectivas isomĂŠtricas _51


_caminhos e significados a arquitetura tem, como pressuposto, o respeito ao território - social, político, histórico, econômico, espacial – para que este, juntamente às pessoas, protagonize toda e qualquer ação humana. deve ser palco, enraizado em cheios e vazios, fixos e fluxos, encontros e despedidas, celebração e calmaria. acredita-se, também, que o uso é proveniente e produtor do espaço. por isso, qualquer atitude em desenhar caminhos e impor movimentos dentro do bosque apresenta-se opressora, além de não se adequar à proposta de ressignificar os valores pré-existentes ali. a intenção não é criar um novo lugar a partir de uma ideia definida pela materialidade do desenho imposto, mas propor espaços comuns a partir da experiência e vivência cotidiana, constituída pelo poder do tempo a partir do reconhecimento, reflexão e sonhos ali realizados. a sugestão do projeto é que, nas prateleiras do pavilhão da existência, sejam armazenadas tintas naturais e materiais de pintura, feitas a partir de água, terra e pigmentos naturais, como urucum, açafrão, areia, entre outros. as árvores que acompanham os caminhos principais do bosque são marcadas com essas tintas e, como convite, o projeto incentiva as famílias que participaram do processo de compostagem humana (ou seja, deixaram o corpo de alguém querido nos casulos), marquem uma árvore do bosque como símbolo daquele que se foi. com o passar do tempo, espera-se que as árvores marcadas pelas famílias, assim como outras marcadas por quaisquer pessoas em diferentes processos de apropriação do espaço, dêem nova unidade ao bosque pela ação contínua e conjunta entre artefato artístico humano e paisagem natural.

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“Nessa estrada não nos cabe conhecer ou ver o que virá. O fim dela ninguém sabe bem ao certo onde vai dar. Vamos todos numa linda passarela De uma aquarela que um dia, enfim, descolorirá” - Toquinho em “Aquarela” o tempo entra como elemento em movimento e age de forma material, na consciência da transformação do espaço e como dado projetual desta alteração da própria variação. aproxima-se, então, da ressignificação: do lugar, e da vida. a história fica e o uso reconstitui constantemente os significados, que a tinta nas árvores não deixa apagar. representação material daquilo que transcende, e fica - de forma muito mais coerente e concisa - na memória do lugar e das pessoas que usufruem dele. se todas as árvores estão pintadas, todos os caminhos do bosque foram percorridos, mesmo sem serem desenhados impositivamente pelo projeto de arquitetura. caminhos do desejo da construção de um espaço de resistência, dado pelo entendimento do lugar como experiência individual que constrói e redimensiona o coletivo, tendo na mão de todos o saber fazer de uma nova paisagem. um novo lugar. “porque arquitetura é fato. ato no mundo para outrem. o desenho some e ficam as coisas para as outras pessoas que, estas sim, desenham no seu ir e vir da existência os verdadeiros significados.” - Vera Luz

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_sistemas estruturais os pontos de luz no território se configuram a partir de dois elementos estruturais, conjugados ou não, que aparecem a todo momento na paisagem natural e a intervenção humana no bosque: a madeira e o tijolo ecológico. o primeiro, reforça a linha tênue entre as formas irregulares naturais do território e as regularidades e racionalidades do espaço construído proposto. o segundo, por sua vez, representa a transformação, da terra em estrutura, assim como da morte em vida. linha e massa na busca da criação de uma zona instável e não definida entre parada e chegada, interior e exterior, pertencimento e fluxo. estes elementos neste contexto são, principalmente, a relação entre matéria e território, cultura e cultivo, história e instante de vida. nos pavilhões comum e da existência, assim como no reparatório, por exemplo, a madeira configura a estrutura principal, em um sistema de apoios e fixações de peças simples e regulares. madeira sobre madeira. nestes mesmos ambientes, planos maciços de tijolo são usados como vedação e preenchimento, ativando os cheios e vazios e as profundidades implícitas nas espacialidades. _58


banco | 1:20

passarela | 1:20

fundação | 1:10

banco | 1:10 _59


nos casulos, o pensamento é inverso. a contraposição de elementos talvez faça parte da compreensão de que, como qualquer acontecimento do bosque, como na cidade e na vida, o que acontece ali é natural e significativo. duas superfícies autoportantes de tijolo configuram o espaço, assim como sustentam, internamente, as estruturas de madeira que dão suporte ao programa. na madeira, os pilares são feitos por peças duplas de perfil 5x15cm e alturas variáveis, e as vigas se diferencias por peças duplas de perfil 50x150mm, fixadas por fora do pilar, e peças simples, de 50x200mm, fixadas no espaço entre as peças do pilar. (detalhe 1). na fundação, de concreto moldado in loco, as peças duplas dos pilares trasferem a carga para uma peça simples, fixada no bloco de concreto através de chapas metálicias. (detalhe 2). as coberturas nos pavilhões é estruturada por peças de madeira e compostas por placas de osb de 2440x1220x18mm, revestidas externamente por manta impermeável. nos casulos, entretanto, a cobertura semi translúcida, feita com chapas de policarbonato de 2050x1000x5mm.

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cobertura | 1:20

tijolos | 1:20

estrutura | 1:10

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_considerações finais todo pensamento crítico surge a partir de urgências. urgências que nos provocam e nos inquietam a alma. e que bom seria se toda provocação resultasse em posicionamentos. e que bom foi ser provocado por um território tão delicado e feroz, e por pessoas tão humanas. e que bom foi estar ao lado de companheiros tão dedicados à busca por soluções teóricas, técnicas e espaciais, sempre transbordantes de significados. significados, estes, que encontramos no próprio território, a partir de uma sensibilidade única da Edilene. unindo tais práticas às experiências que tive o privilégio de viver até aqui, pude alcançar novas e revigorantes reflexões, sobre o que é a morte - de pessoas e de lugares - e sobre os buracos da cidade. até perceber que este trabalho pretendia, na verdade, falar sobre os buracos da vida e sobre como ocupá-los. “tem alguns sentimentos que são lugares comuns. o amor, a dor, a morte. a gente acha que é tão único mas todo mundo sente igual. não de forma idêntica, mas igual.” - Antonio Fabiano Jr. se fazer um projeto de arquitetura é se posicionar no mundo*, os riscos - palavras, desenhos e pensamentos - presentes neste caderno são a forma que encontrei para me expressar. o que fica, então, é a memória de lugares, pessoas, e grandes provocações, a partir das quais nunca me esquecerei de que a normalidade é uma ilusão imbecil e estéril**. *Paulo Mendes da Rocha em Tudo é projeto **Oscar Wilde em Loucos e santos

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_anexos “dentro da máquina que transformará seu corpo em compostagem” - tradução livre da matéria “inside de machine that will turn your corpse into compost”,de 25/10/2016 pelo site wired. quando você morrer, quer ser enterrado ou cremado? se a arquiteta Katrina Spade fizer o urban death project funcionar você pode ter uma terceira opção: a compostagem. se o primeiro centro de recomposição de Spade for inaugurado em seattle no ano de 2023, como é o planejado, será um local repleto de espiritualidade, onde as famílias e amigos podem levar o corpo de pessoas queridas para o descanso final, fazendo com que a decomposição do mesmo tenha uma utilização amigável ao meio ambiente. Katrina descreve o espaço como uma junção de atividades funerárias, como o velório, mas também um parque público. “penso seja importante criar espaços onde pensamos sobre a morte e seu papel nas nossas vidas, assim como o fato de que ela está vindo todos nós”, diz ela. o segredo é acertar o como acontece a decomposição. Spade está trabalhando junto a especialistas do solo para aperfeiçoar o processo, assim como desenhando o projeto em torno do núcleo de concreto que o abriga. imagine um edifício retangular de três andares, cheio de chips de madeira, com uma sala em seu topo. durante os serviços funerários, as pessoas carregam o corpo por uma rampa que circula em volta do núcleo até a sala. lá, deixam o corpo numa cama de matéria orgânica dentro de uma porta aberta no piso. esta abertura é o topo do núcleo de concreto de aproximadamente 1,80x3,00m que abriga compartimentos empilhados que receberão os corpos. as pessoas que se despedem acobertam o corpo com mais chips de madeira e fecham a porta. durante as próximas quatro a seis semanas, o corpo se moverá lentamente para baixo enquanto se decompõe, e o material da parte de baixo se condensa e é removido. essa linha do tempo é baseada na técnica de livestock mortality composting, de Lynne Carpenter-Boggs, uma cientista do solo da washington state university. quando animais usados nos programas de agricultura da universidade morrem, a escola os juntam em montes para compostagem, onde cadáveres de larga escala possam se decompor - até os ossos começam a se desfazer - em um a dois meses. porém ninguém tentou a compostagem, de animais ou corpos humanos, em um sistema vertical como o de Spade. no próximo ano, Spade e Carpenter-Boggs trabalharão nisso no campus da wsu. utilizando carcaças de porcos e, posteriormente, corpos humanos doados, eles descobrirão quanto tempo demora para o corpo descer do topo até o fundo da estrutura. no projeto de Spade, o núcleo de concreto tem aproximadamente 7,30m de _64


altura e acomoda seis corpos de uma vez, com 90cm de chips de madeira entre eles. ventoinhas fazem o ar circular o material em decomposição para acelerar o processo, puxando o ar das extremidades do núcleo através de aberturas, direcionando-o para o centro, e depois expelindo-o por ventiladores filtrantes. as mesmas aberturas permitem a adição de soluções de água e açúcar ao processo para estimular atividades microbianas. Spade e Carpenter-Boggs estimam que, quando o material chegar no fundo do núcleo de concreto, será um grosso lodo, não mais reconhecido como restos humanos. posteriormente, e um espaço no fundo do núcleo, funcionários (um pessoal muito, muito especial) finalizam e curam o composto. imãs removem materiais como preenchimentos dentários metálicos, e os funcionários processam o composto tornando-o um material fino, poroso, e mais parecido com solo. pelo menos, essa é a ideia. recomposição como um ritual. assim que o composto está finalizado, as famílias podem retirar uma parte do solo e levá-lo para casa - mas não há garantias de que o mesmo é resultado exclusivo da pessoa amada. fica tranquilo, diz Spade. a morte é uma oportunidade de se desprender da obsessão americana do individualismo. “o que é mágico é que nós deixamos de ser humanos no processo,” ela diz. “nossas moléculas são reorganizadas em outras moléculas, e o resultado não é, de fato, restos humanos. devolver para alguém o solo criado a partir da pessoa amada seria puramente simbólico. se o que estamos tentando fazer é se reconectar com o fato de que somos todos parte desse grande e natural mundo, vamos dizer, ok, nós realmente somos parte desses sistema que é muito maior do que nós mesmos.” isso não será fácil de vender para a maioria das pessoas. “eu acho que há um desejo enraizado nas famílias de ter controle sobre os restos humanos individualmente” diz o historiador Gary Laderman, coordenador do departamento de religião da emory university e autor de rest in peace: a cultural history of death and the funeral home in twentieth-century america. ainda assim, ele predica que este projeto conseguirá atrair uma pequena clientela simpatizante da sua filosofia ambiental. este é, de fato, o limite da capacidade do urban death core. o núcleo de concreto com 10 compartimentos consegue abrigar 60 corpos por mês, se o processo de decomposição durar quatro semanas. este limite de 60 corpos também leva em conta que o espaço acomoda um ritual de despedida por vez, permitindo duas cerimônias por dia, e garantindo que as famílias não se sentirão apressadas. os centros de recomposição serão reflexo da arquitetura vernacular local: Spade e seus parceiros estão desenvolvendo um manual que combina especificações técnicas (como as dimensões corretas para o núcleo) e recomendações de design (a melhor mandeira de iluminar um recinto fechado, por exemplo), mas maior que _65


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isso, arquitetos locais terão livre escolha. um centro de recomposição em san antonio deverá ser diferente de um em tóquio, por exemplo. talvez o seu centro local terá jardins verticais nas paredes internas. talvez terá projetado os nomes daqueles que se foram nas paredes do núcleo em neon roxo. Spade nomeia duas outras obras que evocam o sentimento de inspiração e quietude que ela imagina para os centros de recomposição: a capela de st. ignatius, no campus da seattle university, do arquiteto Steven Holl, e as termas de vals, um spa suíço construído em cima de águas termais, projeto de Peter Zumthor. ambos usam materiais naturais para criar uma série de recintos íntimos cobertos de luz por aberturas estrategicamente posicionadas. os centros de recomposição manterão um similar ambiente de mistério e veneração, também pelo fato de que o núcleo de concreto estará quente para quem tocá-lo. (o calor vem das bactérias quebrando moléculas de matéria orgânica e um ambiente rico de oxigênio - o processo de decomposição, feito corretamente, alcança temperaturas altas o suficiente para matar patógenos). “só de isso ser uma consideração a ser tomada na elaboração do projeto e deixando isso acontecer, já é bem poderoso”, diz Spade. “você perceberia imediatamente que algo enorme está acontecendo lá dentro.” enquanto isso, a rampa em volta do núcleo deverá ser como uma tela em branco para a customização do ritual de despedida: famílias e amigos podem cantar enquanto carregam os corpos de seus queridos, ou até mesmo acompanhar uma banda, como numa parada. isso é emocionante para Bill Hoy, um professor clínico do medical humanities program da baylor university e autor de do funerals matter? the purposes and practices of death rituals in global perspective. Hoy, que dirigiu processos de luto em hospícios durante muitos anos, diz que a houve um processo de simplificação dos funerais nas últimas décadas, o que levou algumas famílias a cortar partes reconhecidas da despedida em seus rituais, até algumas que ajudavam as pessoas a processar a perda. “é quase como se, quando depositamos o corpo no núcleo, deixássemos também nosso luto, e o que vejo como clínico é exatamente o oposto,” ele diz. “o que me encoraja é o espaço criado por Spade permite que hajam cerimônias do jeito que as famílias encontrem significados.” nossa visão sobre a morte e suas disposições mudam com o passar do tempo. americanos começaram a aceitar a cremação apenas nos anos 60; hoje quase a metade dos corpos no estados unidos são cremados. esta ideia de decomposição pode não ser para todos, mas é perfeita para aqueles que querem retornar à terra da forma mais gentil - e literal - possível.

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museu da mineração allmannajuvet | peter zumthor

memorial da vala | felipe neres

templo do bosque | marco casagrande


paisagem urbana | segovia, espanha

esta es una plaza | madri, espanha

machu picchu | peru


4 vigas | solano benitez

invenção da cor, penetrável | helio oiticica


el bosque de oma | bilbao, espanha

capela bruder klaus | peter zumthor

estudo de escada | josĂŠ paulo gouvĂŞa


_bibliografia projetos: - museu da mineração allmannajuvet | Peter Zumthor (disponível em: https://www.archdaily.com.br/ br/796507/museu-da-mineracao-allmannajuvet-peter-zumthor) - memorial da vala | Felipe Neres (disponível em: https://seuacervo.com/trabalho/107/memorial-da-vala/) - templo do bosque | Marco Casagrande (disponível em: https://www.plataformaarquitectura.cl/cl/800499/ templo-del-bosque-marco-casagrande?ad_medium=gallery) - esta es una plaza (acervo pessoal do orientador e disponível em: http://estaesunaplaza.blogspot.com/) - paisagem urbana segóvia (acervo pessoal do orientador) - machu picchu (acervo pessoal do orientador e amigos) - 4 vigas | Solano Benitez (disponível em: https://cosmopista.com/2011/08/03/quatro-vigas-solano/) - invenção da cor, penetrável | Helio Oiticica (acervo pessoal) - el bosque de oma (acervo pessoal de amigos) - capela bruder klaus | Peter Zumthor (disponível em: https://www.archdaily.com.br/br/01-55975/capelade-campo-bruder-klaus-peter-zumthor) - estudo de escada | José Paulo Gouvêa (acervo pessoal do orientador)

livros:

- conversa com estudantes | KAHN, Louis. Barcelona - Editora G.Gili, 2002 - pensar a arquitectura | ZUMTHOR, Peter. Barcelona - Editora G.Gili, 2005 - história do pensamento ocidental | RUSSELL, Bertrand. Rio de Janeiro - Nova Fronteira, 2013. - assim falava zaratustra | NIETZSCHE, Friedrich. Rio de Janeiro - Nova Fronteira, 2012.

textos: - “inside de machine that will turn your corpse into compost”, por Robyn Ross (disponível em: https:// www.wired.com/2016/10/inside-machine-will-turn-corpse-compost/) - “São Paulo: carros abandonados transformam-se em arte e jardins” (disponível em: https:// greensavers.sapo.pt/sao-paulo-carros-abandonados-transformam-se-em-arte-e-jardins-com-fotos/) - “a cidade como playground”, por Merijn Oudenampsen (disponível em: https://piseagrama.org/acidade-como-playground/) - “entrevista com Álvaro Siza: a beleza é o auge da funcionalidade!”, por Vladimir Belogolovsky (disponível em https://www.archdaily.com.br/br/803527/entrevista-com-alvaro-siza-a-beleza-e-o-auge-dafuncionalidade) - “introdução e receita de tinta ecológica à base de terra” (disponível em: https://www.jardimdomundo. com/conheca-as-tintas-de-parede-naturais/) _72


vídeos: - trecho da palestra de Solano Benitez na faculdade de arquitetura e urbanismo da universidade de são paulo (fauusp) em 30/03/2009 (disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=H4MUDHp6-4g) - “when I die, recompose me”, palestra da arquiteta Katrina Spade no ted talks (disponível em: https:// www.youtube.com/watch?v=bnvnBwP9sTo) - “sobre o tempo”, palestra de Clóvis de Barros Filho na unimed (disponível em: https://www.youtube. com/watch?v=1Gd1v3W1_CE) - “a morte como instante de vida”, palestra de Scarlett Marton no café filosófico (disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JbXHftyakm4) - “loucos e santos” de Oscar Wilde, declamado por Antônio Abujamra (disponível em: https://www. youtube.com/watch?v=tjvLONYVFcY)

músicas: - o velho e o moço | los hermanos “deixo tudo assim não me importo em ver a idade em mim ouço o que convém eu gosto é do gasto. sei do incômodo e ela tem razão quando vem dizer que eu preciso sim de todo o cuidado.

filmes:

e se eu fosse o primeiro a voltar pra mudar o que eu fiz quem então agora eu seria? ah tanto faz e o que não foi não é eu sei que ainda vou voltar mas eu quem será?

deixo tudo assim não me acanho em ver vaidade em mim eu digo o que condiz eu gosto é do estrago. sei do escândalo e eles têm razão quando vêm dizer que eu não sei medir nem tempo e nem medo.

e se eu for o primeiro a prever e poder desistir do que for dar errado? ah olha se não sou eu quem mais vai decidir o que é bom pra mim? dispenso a previsão. ah se o que eu sou é tambem o que eu escolhi ser aceito a condição. vou levando assim que o acaso é amigo do meu coração quando falo comigo quando eu sei ouvir.”

- capitão fantástico | direção: Matt Ross. electric city entertainment, 2016. 1 filme (118min.) - o universo no olhar | direção: Mike Cahill. verisimilitude, 2014. 1 filme (106min.) - interestelar | direção: Christopher Nolan. paramount pictures, 2014. 1 filme (169min.) - viva: a vida é uma festa | direção: Lee Unkrich. pixar animation studios, 2017. 1 filme (105min.) - tudo é projeto | direção: Joana Mendes da Rocha. olé produções, 2017. 1 filme (74min.) - o arquiteto e a luz | direção: Laura Artigas, Pedro Gorski. olé produções, 2015. 1 filme (93min.) _73


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obrigado, por tudo. _75



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