Charla policial

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CARLOS JONATAS S PAL DING

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150anos BRIGADA MIUTAR u


Capa:

concepção arte-final

- Vanderlei

Martins Pinheiro

Soelma

FICHA CATALOGRAFICA Spalding, C

Jonetes

Charla policial.

83

Porra Alegre, Presença, 1987.

p.

1. Literatura Brasileira - Crônicas

CDU

I.

Tttuto.

869.0(81)

o Elaborada pela Bibliotecária Maria Goretti de Souza Silveira - CRBI10-487)

Revisão: Aldira

Correa Hetamozo


PREFÃCIO "MEU PREZADO COLEGA Saúde e pronto restabelecimento junto à Exma. Fam (lia para alegria de todos nós, te desejo. Li, com muito contentamento, os mandamentos do Brigadiano, publicados no jornal "a CI DADE", de Santa Maria. E. realmente, uma orientação para a nossa gente que muito me agradou, e que pode servir para todo homem em qualquer adversidade. Meus parabéns e continua, que a cruza Spalding-Borges Forte deu para o Rio Grande a confirmação da raça forte de que estás servindo de sinuelo. Um forte abraço do amigo Vasco Mello Leíría". Com esse bilhete o veterano advogado e criminalísta "Capitão Caraquatá", como foi diplomado pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho o poeta Vasco Mello Leiria, saudava o surgimento, na irnprensa de Santa Maria, no jornal "a CI DADE", da obra fIOS Dez Mandamentos para o Brigadiano" do jovem Tenente Carlos Jonatas Spalding, falecido em outubro de 1961. Aquele trabalho foi, posteriormente, publicado em pequeno formato, por mais de uma vez, e circulou pelos quartéis brigadianos, largamente. "Cal oca" manteve colaboração assídua em jornais do interior do Rio Grande do Sul e viu publicações suas em revis-


tas e jornais especializados em assuntos de natureza policial de várias regiões do mundo. Com seus familiares ficaram alguns recortes que, reunidos com saudade e carinho, me foram, certo dia, confiados pelo seu irmão Luiz Fernando Borges Fortes Spalding para que os divulgasse. Isso ocorreu em 1982 ... A sorte, os bons ventos da sorte madrinha que me abençoa a vida colocou-me, de repente, quase ao término de meu tempo de serviço, na condição de Coordenador da Comissão Literária encarregada das publicações comemorativas dos 150 anos da Brigada Militar. Não poderia ter ocorrido melhor circunstância para dar plena divulgação aos trabalhos do saudoso brigadiano Carlos Jonatas Spalding, precocemente ceifado de nosso convrvlo, Oficial de elite que honrou sobremodo as fileiras da Sesquicentenária Brigada Militar deixou como registro de seu encantamento pela Coroporação e seu entranhado amor à sociedade sul-riograndense a obra "SERViÇOS DE POLICIA MILITAR (Edição Sulina), o já referido "MANDAMENTOS PARA O BRIGADIANO" (Edição da Imprensa Oficial (1967) e uma infinidade de outros trabalhos publicados, esparsamente, pela imprensa do interior ... Esta CHAR LA POLICIAL que ora entregamos ao público reúne uma parte dessestrabalhos e traz à baila muitos assuntos aue hoje ainda são preocupação dos Policiais Militares, numa prova irrefutável de sua atualidade. E uma coleção de temas de leitura agradável que se insere entre aqueles que, sendo publicados, estarão servindo de gaudio pelas comemorações do século e meio de existência da Brigada Militar. JOSE HILARIO RETAMOZO Maj PM - Coordenador da Comissão Literária BG n9 82/1987

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SEU MELHOR AMIGO

o Policial-Militar é o melhor amigo que um cidadão correto pode ter. Em alguns casos 9u em alguns lugares, pode ele mostrarse pouco .amãvel, mas em geral é justo dizer que ele representa um dos sustentáculos da vida civilizada. A sua dedicação é todos os dias posta à prova, com resultados lisongeiros para a sua nobre Corporação. Muitos indesejáveis têm sido presos, com risco de vida do policial-militar, para que o bem estar dos cidadãos não seja jamais molestado. Muitas vidas e propriedades têm sido salvas graças à intervenção pronta e eficaz do policial-militar. Todos os tipos de ocorrências anormais, que se verificam nas ruas, encontram sempre o policial-militar vigilante no sentido de manter ou restabelecer a ordem; proteger os que estão em perigo; socorrer os acidentados. Alguns excessos de autoridade de policiais-militares que ainda não se identificaram com a nobre missão que o povo Ihes confiou, não deve servir de pretexto para cobrir de críticas uma classe que dá todo o seu esforço, e emprega todo seu carinho, para proteger a população das cidades em todas as horas do dia e da noite, com uma dedicação que deveria ser suficiente para fazer esquecer todas as críticas por mais justas que fossem. E, como se isso não bastasse, lembremo-nos que a sua existência é a garantia da nossa.

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BRIGADIANOS

EXCEPCIONAIS

Cito Thomas Walsh: "Roubo à mão armada, violação de trânsito, incêndio criminoso, homicídio, até cachorros loucos - tudo isso faz parte da rotina de um policial". Policial de giro, ou de serviço no Destacamento, acrescento eu. E tudo tem que ser resolvido com eficiência e presteza. E o é, quando estão de serviço, policiais como os brigadianos José Silveira e Hélio Nogueira. Tudo então é resolvido com a maior facilidade. Até mesmo bebê adiantado. (Afinal não há nada de extraordinário a este RESPE ITO. Talvez gêmeos dessem mais trabalho. Mas s6 um ... ) Foi o caso do primogênito do casal Roque Domingos. Zero hora e trinta minutos do dia 30 de abril. Sentindo a precipitação do parto, o casal dirigiu-se ao Posto Policial N92, da Brigada Militar, em Vila do Sarandi. Ali, os soldados de serviço solicitaram por telefone uma ambulância para que a Sra. Roque Domingos fosse assistida. O médico socorrista prometeu vir logo com a ambulância. E o logo foi se alongando. E o nenê foi se adiantando. E os brigadianos foram preparando um cantinho no Posto Policial. Era iminente o parto. Não havia parteira, não havia mulher alguma que aquela hora da madrugada pudesse auxiliar. Havia os briqadianos ... Assistiram-na com eficiência e presteza. O nenê adiantado nasceu no Posto Policial sem complicações, graças ao espírito de iniciativa e princípios de polícia social de que estão embuídos os - BRIGADIANOS Quando o médico chegou na ambulância, a parturiente já se encontrava em seu lar, com seu nascituro, e com seu marido. Exultavam alegria. . . Pol feia não é s6 pega ladrão! 4


"PEDRa

E PAULO"

Quando em 1956, a Brigada Militar lançou em Porto Alegre, as duplas "Pedro e Paulo", ela sabia que a introdução daquele novo sistema de policiamento ostensivo-preventivo, estava fadado ao mais pleno êxito. Sabia que dentro em pouco, não apenas o portoalegrense, mas todo o riograndense, exultaria de contentamento. Sentir-se-ia protegido de maneira sábia e carinhosa pelos encarregados da sua segurança, que agora apresentavam um alto índice de aprimoramento. Sabia, igualmente, a Brigada Militar, que com o invitável sucesso dos "PP", ela passaria a ser solicitada por todas as entidades promotoras de festejos e reuniões, e por todos os rnunicfpios progressistas, para proporcionar-lhes uma assistência policial-militar igual a que vinha dando a certos locais da Capital - a eficiente assistência dos "PP". Após anos de lutas constantes em prol da população, o sucesso dos "PP" é inconteste. E como a Brigada Militar prévia, ela passou a ser solicitada. Muito solicitada. Os estudantes queriam "PP" em seus bailes e festas. O povo solicitava-os para o trânsito. A sociedade, deles necessitava em todas as suas atividades grandiosas. E assim foi que Montenegro, Vacaria, Caxias e agora Santa Maria, pleitearam junto aos poderes públicos um serviço de policiamento eficiente e disciplinado, carinhoso e moderno - um serviço de policiamento "PP". Os dois primeiros munidpios já foram contemplados. Há necessidade de o serem os demais, pois também querem que seus habitantes sintam-se sob o manto protetor dos "PP" e também para

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que se imponham aos olhos dos visitantes, como padrões em matéria de policiamento, por possuírem os soldados padrões "PP", Urge, pois, um aprimoramento em toda a Brigada Militar, uma reestruturação em sua organização, para que ela possa atender aos que lhe solicitam o referido policiamento. ~ necessário, ao nosso entender, que as unidades não especializadas, que não é o caso do RPR Mont. CB, CIM, RBG e outras, sejam transformadas em batalhões de pol (cia "Pedro e Paulo". Mais ou menos como no Estado de Guanabara, onde a então Polfcia Militar do Distrito Federal, é toda "Cosme e Damião". A Brigada Militar vem vindo por este caminho. A criação dos Núcleos de Preparação Policial, em Porto Alegre e no interior, além de outras, dão-nos prova disso, no que diz respeito à Brigada Militar. Uma recente visita do governador do Estado, eng. Leonel Brizola, ao quartel dos "PP", proporcionou a abertura de um crédito especial de 4 milhões de cruzeiros para compra de viaturas a eles destinadas, afora outros créditos à disposição da Brigada Militar, que indiretamente beneficiará também o Batalhão de Polícia, é a prova no que diz respeito ao Poder Público. Santa Maria, tenho certeza, será contemplada com "PP". Ela merece por "n" razões, e porque é Santa Maria.

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COLEGIAIS E TRANSITO

(Panamá) - Coisas verdadeiramente notáveis presencia-se na avenida principal de Panamá City. As vezes fica-se surpreso. As vezes fica-se encantado. Desta feita fiquei encantado. Transcorria a "Semana de Prevenção de Acidentes de Trânsito", Diversas ruas estavam engalanadas com faixas e cartazes. Alertavam motoristas e transeuntes com os resultados da imprudência. Quase os mesmos dfsticos usados no Brasil: "Perca um minuto na vida ... " Meu encantamento todavia não foi com as faixas e seus conselhos. Foi com um negrinho de seus 16 anos. Com um apito na boca e luvas brancas nas mãos dirigia o trânsito num importante cruzamento. Desembaraçava-se bem o safado. Mas vá lá! uma falta de responsabilidade ... se bem que o garoto entendia do assunto Não era um membro da Guarda Nacional ... Não estava fardado Estava à paisana ... Ainda atônito, continuei minha caminhada. Olhava as vitrinas com um olho. Pelo rabo do outro, controlava o pretenso guarda de trânsito. Noutro cruzamento a mesma coisa. Um caso original. Chamei um integrante da Guarda Nacional que perambulava pela artéria: Desejava uma informação sobre a presença dos "chicos" no trânsito. E aqui vai o "porquê", como gentilmente me foi explicado. (Qual falta de responsabilidade! Qual nada. Algo muito bem planejado! )

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Dada a impossibilidade da Guarda Nacional cumprir sozinha o programa pré-estabelecido de intensificação do policiamento educativo de trânsito nas artérias de maior movimento, a GN conta com o aux (lio espontâneo dos colegiais. As diversas entidades congregadoras dos estudantes, assim como os clubes juvenis e escoteiros, são instruidos durante certo período, pelos oficiais e sargentos da GN, sobre como policiar preventivamente o trânsito. Aptos para tal fim, e no decorrer da Semana de Prevenção, os estudantes correm às ruas a fim de dirigir e orientar o tráfego. Fazem com que pedestres e motoristas obedeçam os sinais regulatórios, criando, dessa maneira, o hábito salutar de não desrespeitá-Ios para segurança geral da população. Lembrei-me, então, de notfcias que acabara de receber de Porto Alegre. Na "terrinha" fora iniciada uma campanha de educação juvenil no trânsito. Constituia-se de palestras efetuadas pelos Delegados de Pol (cia-Militar da Brigada gaúcha à diversas tu rmas do Colégio Santo Antônio. Interessantíssimo seria a continuação dessa campanha em outras escolas e a posterior utilização em auxílio da Polícia durante a nossa Semana de Prevenção. Supervisionados, é claro, como aqui no Panamá, pelos próprios policiais. (Aliás, era isso que fazia o GN que perambulava pela avenida e que foi por mim interpelado).

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PISTOLAS CRUZADAS (Canal Zone) - Relativamente há bem pouco tempo alguns policiais-militares brasileiros começaram a usar um distintivo formado por duas pistolas cruzadas. Os primeiros que me recordo ter visto usando, foram os integrantes da hoje chamada 6ª Cia. de Pol ícia do Exército. As pistolinhas eram, e até hoje são, parte integrante do distintivo regional daquela Companhia. Lembro-me que muitas interrogações surgiram com a divulgação do suposto novo distintivo nos meios policiais-militares. Fiz, como tantos, dive'rsas suposições. Não passaram de suposicões ... . Aqui, quando passamos a usar nos uniformes, como os. policiais-militares de tio Sam, as pistolinhas, minha curiosidade fez-me procurar respostas às interrogações outrora surgidas, e não respondidas. Informações pessoais, livros e folhetos fizeram-me retroceder ao ano 1920. Naquele ano houve uma reorganização no Corpo de Polícia iviilitar do Exército Norte-americano. Para integrar este Corpo foram selecionados 5.ooU infantes. O então Comandante Geral da Unidade de Intenteria de onde estes homens saíram, sugeriu que, como eles não serviam mais como infantes, se Ihes ceveria distinguir o distintitivo. Foi então que criaram, em caráter definitivo e permanente, a Polícia Militar, e lhe deram um novo distintivo, completamente diferente do usado pelos infantes (fuzis cruzados), e das demais armas e serviços. Entre as muitas sugestões para o novo emblema dos policiais9


militares, decidiu-se a aprovação do das pistolas cruzadas, uma idéia do Capitão George M. Chandler, do Estado Maior. Serviu de modelo, uma pistola de coleção de armas do Comandante Jerorne Clarck, reformado do Exército Americano, e hoje residente em Purcellville, na Virqrnla. Pistola esta, muito ligada à história da Potrela Militar. Segundo nos consta foi uma das primeiras armas portadas pelos primeiros integrantes dos Corpos de Pol (cia Militar. distintivo foi tornado público em 1922. (Ele era muito mais velho do que eu podia imaginar). Hoje na quase totalidade dos países do Continente Americano, os policiais-militares usam as pistolas cruzadas como seu srrnbolo. E entre eles figuram os do Brasil. Não só os da 6~ Companhia. Também os de algumas PPMM estaduais, sendo que uma delas é a nossa Brigada Militar.

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SERVICO DE POLICIA MILITAR Acabamos de escrever um pequeno livro intitulado "Serviços de Pol fcia Militar". Abordamos neste trabalho os serviços mais comumentes prestados pela Brigada Militar no policiamento preventivo e repressivo do nosso Estado. Estes serviços são do conhecimento geral, e normalmente são executados com eficiência. O ideal, porém, seria que sempre fossem executados com eficiência. Este livro vem a ser nossa contribuição para a conquista do ideal. Para tal, procuramos apresentar aos leitores as mais modernas técnicas e planejamento sobre como executá-Ios. E assim fizemos, por estarmos imbuídos do pensamento de que o planejamento das ações policiais tem como resultante a eficiência. As técnicas e o planejamento apresentados. em "Serviços de Polícia Militar", são frutos, em parte, de nossa participação e observação de ações policiais no Brasil e no estrangeiro e, principalmente, da experiência policial de outros países que os registraram como normas de ações a serem sempre seguidas. Não temos dúvidas, por esta última razão, de que a leitura e o seguimento daquilo que apresentamos neste trabalho trará conseqüências benéficas às Polfeias Militares e proporcionará maior segurança a seus homens fardados de cáqui quando em serviços policiais. "Serviços de Polícia Militar" foi editado pela Livraria Sulina Editora, de Porto Alegre, que o incluiu dentro da série "Coletânia Policial Militar", e já o colocou à disposição dos interessados através de sua rede de representantes. 11


"879 DISTHITu

A Técnoprint

POLICIAL"

Gráfica S.A., do Rio de Janeiro,

editora

indis-

cutivelmente já vitoriosa na produção de livros de bolso, vem de lançar mais uma brilhante série dentro de suas famosas "Edições de Ouro:" "879 UIS I RITO POLICIAL", com livros escritos pelo norte-americano Ed Mc Bain. Como todos os livros da Técnoprint, os desta série também se destacam aos nossos olhos pela sua rnaqnffica apresentação artfsti ca e gráfica. Suas capas envernizadas são bem desenhadas e impressas com esmero. A paginação é agradável e a revisão boa. Já saíram do prelo três exemplares: "O coração tatuado", "O salário do crime" e "60 minutos para viver". Ed Mc Bain teve o cuidado de não criar um único detetive para suas histórias. Seus personagens são vários. São os policiais lotados no "879 Distrito Policial de New York". Policiais fardados e à paisana, como os investigadores Kling, Arthur Brown, Meyer, Steve Carella e Cotton Hawes, e que trabalham sempre em comum acordo com o pessoal do departamento de polfcia técnica, como Sam Grossrnarln, o laboratorista, nas lutas contra os crimes e os criminosos. O grande mérito de Ed Mc Bain é não atacar, como cornumente o fazem grandes escritores policiais, - "o espírito rotineiro da pai reta, a aplicação da mesma técnica a todos os casos com o defeito de não se cuidar da especialidade da hipótese e do homemcriminoso de que trata". Os livros da série "879 Distrito Policial" não apresentam um detetive particular dotado de grande inteligência, pernóstico. fanfarrão e conquistador. que parece ter por ideal lL


desmoralizar as organizações policiais, tornando-as mesmo rídfcuIas ante os olhos do leitor. . Neles, muito ao contrário, são narrados por Ed Mc Bain o verdadeiro e árduo trabalho da polfcia desde o interior de um distrito policial, assim como os mais modernos processos de investigação criminal usados nos Estados Unidos, o que Ihes dá um sabor todo especial de originalidade e veracidade. Por estas razões é que julgamos que estes livros devem ser lidos por todos, e principalmente pelos policiais, porque além do já dito, no nosso entender de especializado em pai feia, cada livro de Ed Mc Bain é uma verdadeira aula de polfcia onde, inclusive, são apresentados cópias de formulários e fichas utilizados pela polrcia para fins de arquivamento e elucidação de crimes. Leia, pois, Ed Mc Bain e sinta-se como um dos integrantes do "879 Distrito Policial".

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F.I.F.S.P. JONATASC. SPALDING (Membro da F.I.F.S.P.) A "Fédération International des Fonctionaires Supérieurs de Pol (ce" foi criado no dia 22 de abril de 1950, com as grandes finalidades de congregar e promover a confraternização entre os funcionários de Polrcia dos quadros superiores, de todo o mundo, facilitando-lhes o intercâmbio cultural, o estudo e ligação com os grandes órgãos intemacionais de polícia, no que tange ao aprimoramento da ação social dos serviços policiais e a defesa sobre o plano internacional dos interesses morais dos funcionários de pol (da. Com apenas dois anos de existência a Organização das Nações Unidas (ONU) a considerou como entidade honorária dos Estatutos Consultivos do seu Conselho Econômico e Social, o mesmo acontecendo, dois anos mais tarde com a UNESCO, por deliberação de sua Assembléia Geral de 1954. Os princípios que norteiam a F.1. F.S.P. são os de fazer prevalecer a prevenção sobre a repressão, e de mostrar aos cidadãos que a polfcia é, antes de tudo, um órgão social de proteção. Por esta razão a Federação organiza, anualmente, Congressos Internacionais de Pol feia, e participa, freqüentemente, em diferentes conferências internacionais relativas a criminologia: prevenção da criminal idade, direito penal, defesa social, etc. Após pormenorizados estudos, a F.I.F.S.P. chegou ao parecer de que seria muito mais eficaz a aplicação dos meios e a difusão dos princípios citados junto a infância, de forma tal que ela não se sinta por isso, como um conjunto de menores delinqüentes ou socialmente inadaptados. Assim, a realização de Congressos Inter-

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nacionais pela Proteção da Infância, conferências sobre problemas educacionais, e o manual da "Ação da Polícia na Proteção de Saúde Mental das Crianças" já são realidades. No campo da chamada "Defesa Social", no deconer das reuniões internacionais, tem sido apresentados numerosos trabalhos, destacando-se um, apresentado no 11I Congresso Internacional de Criminologia, elaborado pelo Comissário Principal da "Surété" Francêsa, Paul Villetorte, que é o Secretário Geral da F.I.F.S.P .• versando sobre "A Polícia diante da Reincidência". e que teve repercusão em todo o mundo. Evoluindo normalmente em seus fins iniciais. a F.I.F.S.P: que tem por presidente o Secretário de ~rança Pública do Principado de Mônaco, M. Delavenne, procura os meios de contato da pol ícia com a infância para, nestas ocasiões, PÔ" em prática a ação protetora da pol ícia em favor da infância visando sempre um mundo melhor.

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PROFILAXIA

CRIMINAL

o artigo 39do Estatuto da F.IF.S.P. ("Fédération Internationale des Fonctionnaires Supérieurs de Police", com sede em Paris, (França) expressa os fins desta Associação. Entre outras finalidades, ali se encontram estabelecidas as de proceder a todos os estudos que facilitem a ação preventiva e educativa da pol (ela, provocar o aprimoramamento da organização e a eficácia dos serviços de polícia. Para dar cumprimento a tais dispositivos a F.I. F.S.P. cria grupos internacionais de especialistas, que após estudarem e debaterem os assuntos que Ihes são atribuídos, encaminham suas conclusões aos congressos internacionais fie polfcia. Assim vão surgindo regulamentos, normas e sugestões às organizações de pol (cia e aos poderes 'executivos e legislativos de todo o mundo. Desta maneira vem, pois, a F.I. F.S. P. de constatar a transformação profunda dos contatos sociais, e dos novos rumos da profilaxia criminal. Transformações estas que impõe à polícia uma adaptação e extensão de seus fins e métodos. Por estas raZões é que ela acaba de sugerir a adaptação da missão preventiva da polfcia fi nova concepção da criminologia, concepção "existencial" (isto é, procurando apanhar o homem em sua realidade complexa) e dinâmica. Opina também a Federação pela chamada dos quadros da pol ícia para prevenir conflitos entre o delinqüente e a sociedade, e o seu emprego para participar da educação dos cidadãos e assessorar os poderes executivo e legislativo em matéria de profilaxia criminal. 16


A Federação considera ser necessário que, no cumprimento de sua missão, o policial se dedique mais particularmente aos jovens, usando em especial seu poder de persuassão em vez do de coação, estendendo sua ação aos pais, após uma avaliação prudente das normas sócio-culturais do meio. Reafirma ela a necessidade de uma colaboração estreita entre a pol ícia e todos os serviços médicos, sociais, educativos ou culturais encarregados de assistir a juventude.

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X MANDAMENTOS

DO BRIGADIANO

O desejo dos policiais de bem servir ao povo, dando-lhe o máximo de assistência e tudo fazendo para tirar de seu convrvlo as pessoas nocivas que lhe perturbam a tranqüilidade, é uma realidade. E incontestável que nos dias correntes as organizações policiais tem este desejo por ideal. E ele conseqüência dos trabalhos de relações públicas que executam, fazendo com que o povo passe a ver no policial o seu protetor leal e dedicado e não aquele que lhe vai tolher a liberdade. O povo está, pois, aprendendo que deve confiar no policial, solicitá-Io como conselheiro e tutor nos momentos de dificuldades e insegurança. . Mas apenas o povo aprender, não é suficiente. E preciso que ele proceda como tal. Torna-se, então, necessário que paralelamente com as promoções pró-polrcia, as corporações policiais codifiquem normas sobre o procedimento que devem ter seus componentes, como agentes de autoridade que são para com o público no exercfcio de suas nobres e delicadas atribuições de pol fcla preventiva. O emprego destas normas, destes mandamentos, em todos os contatos com o povo, completam as promoções. Deixa latente que o policial está, em verdade, à disposição do povo, o que vem quebrar a muralha de gelo existente entre o povo e polfcia. O temor que ele tem de se acercar do policial cai por terra. O polfcia deixa de ser o "bicho-papão", para ser o "anjo da guarda". Esta tão desejada harmonia povo-pol feia é tanto mais acentuada, quanto mais leal e objetivo for binômio promoção-mandamentos.

o

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Assim, aqui vão 10 mandamentos para o brigadiano e que serão comentados, individualmente, nas edições de A CIDADE subseqüentes a esta. I - Fazer prevalecer a prevenção sobre a repressão. II - Empregar sempre o bom senso. III - Estar permanentemente a serviço da sociedade. IV - Ser um servidor público no mais amplo sentido da palavra. V - Ser cortês e delicado até com os delinqüentes. VI - Ser exemplo para jovens e adultos. VII - Aprimorar seus conhecimentos técnicos-profissionais. VIII - Guardar zeloso o tesouro das tradições brigadianas. IX - Jamais macular a farda da Brigada Militar. X - Ser fiel a si mesmo, ao serviço, à Pátria e a Deus.

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X MANDAMENTOS

DO BRIGADIANO

DE JONATAS C. SPALDING -1FAZER PREVALECER A PREVENÇ.Õ.O SOBRE A REPRESSÃO A missão principal do brigadiano no policiamento deve ser 3 de prevenir delitos e contravenções. Muito embora a repressão também seja uma das suas atribuições, ele deve ernpreqar toda sua autoridade e todos os seus conhecimentos para educar o povo obstando, assim, práticas de crimes e contravenções. Ministrar conselhos, fornecer informações e vigiar constantemente advertindo os faltosos em potencial, é algo de muito sublime que o brigadiano pode fazer para que a sociedade viva tranqüilamente e com segurança.

11 EMPREGAR SEMPRE O BOM SENSO O êxito de uma intervenção policial dependerá quase que exclusivamente da forma com que o brigadiano abordará a ocorrência.

E sabido que ninguém gosta de ser chamado à ordem. Também o é que normalmente após a prática de um delito ou contravenção seu autor está num estado de exaltação máximo. 20


Sendo assim, as atividades do brigadiano devem ser as mais acertadas possíveis. Como cada ocorrência é diferente de outra, não é possível estabelecer normas de ação para enfrentá-Ias. Mas é certo que em todas as melhores ações são as determinadas pelo bom senso.

-111ESTAR PERMANENTEMENTE

A SERViÇO

.

DA SOCIEDADE

Dizem os regulamentos que, fardado, o brigadiano está permanentemente de serviço. Sendo assim, e considerando que a Brigada Militar é a grande responsável pela manutenção da ordem e segurança pública no Estado, o brigadiano deve estar sempre alerta para mostrar à socieda- . de que sua Corporação jamais deixará de cumprir esta nobilitante missão que lhe foi confiada. Nas ruas, bailes, cinemas, etc., mesmo que pela "escala de serviço" esteja de folga, o brigadiano deve intervir sempre que a situação assim o requerer.

-IVSER UM SERVIDOR PÚBLICO NO MAIS AMPLO SENTIDO DA PALAVRA Como um Servidor público, o brigadiano tem a seu cargo deveres e obrigações de grande responsabilidade para com o público que o paga. Servir a este povo não é nada mais nada menos do que obrigação. Mas servir da melhor maneira possível deve ser prerrogativa do brigadiano. 21


Já está se tornando um hábito o "Pergunte a um brigadiano". E o prestCgio do brigadiano não pode ser desmerecido. E nunca o será se a resposta for dada com cortesia, e ainda mais, se o inquiridor além da resposta receber uma "mãozinha" na solução do seu problema.

-VSER CORTES E DELICADO ATE COM OS DElINQUENTES A cortesia e a delicadeza devem ser qualidades primordiais do brigadiano. Com atitudes e palavras corteses ele contará com o apoio dos que o cercam e estará contribuindo para aumentar o conceito de sua Força. O brigadiano deve tratar seus semelhantes como gostaria de ser por eles tratado, mesmo que este seja um delinqüente. No desempenho de missões repressivas o ser cortês e delicado acalmará os ânimos exaltados, a que facilitará, sobremodo, a ação policial.

-ylSER EXEMPLO PARA JOVENS E ADULTOS Os atos de juventude nada mais são do que os reflexos da educação e exemplos que Ihes foram dados. Se existe uma juventude transviada é porque a educação ministrada aos jovens é deficiente, e os atos daqueles que os cercam ou que por eles são responsáveis, são exemplos de como se deve proceder. 22


Em vez de julgar os filhos devemos ensinar aos pais. E o brio gadiano, como defensor da sociedade tem de conduzir-se de modo que suas ações não dêem margem a maledicência ou censuras, dando assim bons exemplos aos pais, que por sua vez os transmitirão aos filhos.

-VIIAPRIMORAR SEUS CONHECIMENTOS Tt=CNICOS-PROFISSIONAIS

O brigadiano deve ter uma larga soma de conhecimentos sobre a profissão que abraçou. Isto lhe proporcionará maior certeza de estar agindo acertadamente no desempenho de suas atribuicões policiais. O ideal, no entanto, é que seus conhecimentos sejam sempre e cada vez mais aprimorados. Para tal, a observação dos atos de seus colegas, e o estudo dos assuntos técnicos-profissionais, - que proporcionarão ao brigadiano estar a par das últimas novidades, Ihes serão de grande valia.

GUARDAR ZELOSO O TESOURO DAS TRADIÇOES BRIGADIANAS

Criada em 18 de novembro de 1837, a Brigada Militar encerra toda uma vida de lutas e glórias em prol da legalidade. Embora muitas vezes ela tivesse que se apartar de sua superior destinação: o policiamento, e abraçar a beligerância, o fêz em beneffcio da sociedade, e dando mostras de sua capacidade de ação e trabalho em qualquer setor.

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o título "briosa" Brigada Militar custou-lhe muito sangue de bravos e tem de ser cultuado e cada vez mais merecido. Guardar as tradições brigadianas é ter sempre presentes exemplos de coragem, luta, fé e amor à causa pública.

-IXJAMAIS MACULAR A FARDA DA BRIGADA MILITAR

o

brigadiano sempre será prestigiado quando nas coisas da ordem pública ele aparece ao povo como seu guardião. Em promiscuidade com o povo, permutando idéias mais ou menos levianas, mostrando-lhe, inconscientemente suas naturais fraquezas de homem e, talvez, as suas deficiências de inteligência, - no café ou no bar - e tardado, o brigadiano está se banalizando. E como conseqüência banalizando a farda da Brigada Militar que enverga, e reduzindo a força de sua autoridade. Eis porque a farda da Brigada Militar jamais deve ser maculada, e obriga quem a enverga ao rigor da compostu ra extrema.

-XSER FIEL A SI MESMO, AO SERViÇO,

A PATRIA E A DEUS

Ser conscientemente fiel a causa que abraçou é uma obrigação moral que o brigadiano deve ter para consigo mesmo. No mundo conturbado em que vivemos os subornos, as tentações e os caminhos que levam ao mal a todo momento surgem ante o brigadiano. Quase que são precisos esforços extra-humanos para afastálos.

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Estes esforços o brigadiano tem de fazer para ser fiel a si mesmo, como homem bem formado, honesto e exemplo de virtude que é à saciedade. Ser fiel a si mesmo é ser fiel ao serviço, que necessita do brigadiano: ser fiel à Pátria, que necessita do serviço é ser fiêl a Deus, que quer paz entre os homens de boa vontade.

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POLl-CIA EM PfLULAS*

o Policial não deve se satisfazer com a teoria sobre a criminalidade. Deve conhecer a vida real do homem delinqüente. Como isto é improvável, deve, pelo menos, por-se em contato com o crime ~O criminoso no mundo da imaginação: - na literatura policial. "Vá a pol icia; eles sabem o que têm a fazer. Estão habituados a enfrentar problemas. São profissionais. No crime, as interferências de amadores dão mau resultado" Agatha Christie

"O crime é um rasgão que despedaça completamente a vida. Não é apenas a queda de uma malha. E deixa vestígios que não enganam, se uma pessoa tiver paciência para examinar todas as malhas", . Erle Stanley Gardner

"Se os assassinos nunca vissem maneira de escapar, depois de assassinarem, poucos crimes de morte viriam a ser cometidos". "Não devemos esquecer que o próprio Bertillon reconhece que há uma probabilidade entre cem mil de acharem duas impressões digitais semelhantes", Georges Simenon

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"Os policiais são os teus amigos, e bons amigos".

Bruno Bax

"Ninguém vem à polícia contar nada sobre ~m crim~ que.cometeu. Às confissões expontâneas geralmente sao puras unaqmações exacerbadas pela bebida". Willian F. Nollan "A Lei existe para evitar crimes".

Richard Deming

"Escusado será dizer-se que se tratando duma prova judicial é necessário preservá-Ia intata e como tal protegê-Ia de possfvel deterioração

ou destruição".

A. Varatojo

"Para os policiais os fatos é que contam, mais ou menos fantasistas".

e não as hipóteses Williann Irish

"Há malvados que aprenderam o crime na escola do diabo, e que escapariam ao próprio Deus ... " Emile Zola "A um menininho perdido: - Eu sei que seu pai se chama papai. Mas corno é que sua mãe costuma chamá-Ia?" I Avram Davidson "0

impulso natural de todos os criminosos sem arma

é o

estrangulamento". Anna Mary Wells "Todo criminoso de classe procura apresentar à polícia uma alternativa de sua culpa. Pode dar à morte uma aparência de naturalidade, fazê-Ia passar por acidente, ou empurrar as culpas para uma terceira pessoa". Thomas Flanagan 27


·"Os homens detestam cenas. Estão prontos a enfrentar, com as mãos vazias, um gatuno, mas preferem fugir como uns covardes a dizerem um adeus definitivo a uma mulher", William Irisch "A Lei deve agir para proteger o inocente e punir o culpado", Erle Stanley Gardner "As mulheres-policiais não são escolhidas pela beleza do seu rosto ou pela sinuosidade das suas curvas", Thomas B. Dewey "Um homem, que cometeu um crime, não terá mais que vinte e cinco por cento de escrúpulos em cometer outro". Raymond Chandler "O crime é o inevitável sub-produto dos ódios e das rivalidades nascidas de uma civilização que se baseia na concorrência". Erle Stanley Gardner "Muitos crimes foram descobertos rias, ao raciocfnio",

graças às conversas, às teoEllery Queen

"Os pensamentos

não matam. Não bastam para isso .. ." Agatha Christie

liA melhor maneira de prender um criminoso é seguir os mesmos processos que ele", Dr. A. Varatojo •• Frases recolhidas.

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MALOCA Misto de céu e inferno, de felicidade e desespero, de casa e sarjeta: MALOCA! Basta chegarmos em qualquer baldio, beira de morro, ou margem de imunda sanga, para encontrá-Ia. Pálida, com leves maçãs avermelhadas no exterior, devido a posição que algumas tábuas ocupavam em painéis abandonados, é a maloca o amontoado velho e apodrecido, que tenta imitar a forma de um cubo. Protege-a contra ingratas chuvas e raios solares de 29", enferrujada lâmina de zinco, palha Santa Fé e pedaços de latas de azeite. Maloca! Pouco de céu e casa, porque abrigou rnrsera famflia que veio do esquecido interior, "fazer fortuna" na metrópole ... Muito de inferno e sarjeta, porque lixo e fezes ornamentam seu jardim de macegas; porque com o calor, o mau cheiro asfixia um anjinho nu atacado por coqueluche; porque com as chuvas a úmidade de seu assoalho, terra socada, gripa as crianças que tem seus narizes sempre correndo ... E um pouco de felicidade, porque suas frestas são tapadas, ai í com o retrato de Getú lio Vargas; aqui com São Jorge matando o dragão, e acolá com recortes de jornais: o time do Internacional garotas de biquine, o que é um orgulho; porque a lenha entre 4 tijolos aquentará café "a Ia Di Primo Pobre", alimento "society" de todo dia ... E um barbarismo de desespero, porque a água da sanga trouxe o tifo; porque o choro dos 8 filhos é de fome; porque a Prefeitura vai demolir a "número 3045"; e, porque é uma MALOCA! 011

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HONRA CRIOULA Conto adaptado de um fato O tal de Gomercindo era de fato um guasca de grande valor pela sua bravura no lombo de um bagual xucro. Grudava-se no serigote que nem carrapato em picanha de boi gordo. Certo dia, Seu Lufz, proprietário da Fazenda Rosário, obsequiou Gomercindo com um potrilho zaino. Animal com fama de indomável. Seu Luíz, no entanto, exigia como condição indispensável, que Gomercindo quebrasse o corincho do redomão em sua presença. Nosso personagem não fez muito da oferta. Achou que o velho Luíz queria fazer mofa. Até mesmo esqueceu que ganhara o potro. Meses mais tarde Gomercindo resolveu visitar um de seus primos que era peão da Fazenda Rosârio. Quando lã chegou, ao saudar o proprietário expondo a razão de sua presença, Seu Luíz, em troca, e talvez para inticar, disse-Ihe com fingido assombro: - "Buenas, fndio velho I Pensei que viesse enfrentar o zaino! Faz horas que o espera, ou será que lhe mete medo por acaso?" - "Medo! - grunhiu o gaúcho, ao tempo em que um relâmpago fugaz brilhou em suas pupilas verdes. Mostrava seu amor prõprio ferido. - "Medo!" - repetiu - "Agora mesmo vou quebrar-lhe o queixo, e em pelo! Saltarei nele do travessão da porteira do curra.11" E dez minutos mais tarde, Gomercindo esta pendurado na trave do curral. Abriram a porteira e o zaino disparou como se lhe tivessem atado couro cruna sola. Ao sair Gomercindo largou-5e do 30


travessão e acomodou-se, que nem guri em beira de rancho, no lombo do colhudo. Esse, anima! de poderosa musculatura, prendeu-se o corcovear e dar priscos de arrepiar. Gomercindo só lhe corria pelas paletas as chilenas de prata, no mais. . O zaino escarvejava. Bufava. Ia se boleando, quando o guasca manoteou do mango de cabo de guajuvira e se botou a relhaços e socos na ganacha do chucro. A mango, soco e espora, levou-o para bandas donde o velho Lu fz assistia tudo, se abrindo que nem cordeona em baile. Bem perto dele, levantou pela última vez o mango e grudou-lhe no meio da testa. O cavalo caiu como fulminado. Gomercindo deu alguns passos para espichar as pernas. E, no silêncio que marcou sua façanha só se escutou o ressonar de suas esporas nazarenas, donde corria ainda o sangue do bagual. Gomercindo dirigiu-se ao palanque onde deixara seu pingo atado. Montou sem tocar no estrivo, e com um seco - "1 nté mais ver!" - despediu-se dos presentes com uma saudação geral. - "Ei! - gritou Luíz, -- "Nõa leva o zaino: E seu, tchê. Ganhou-o ... " - "Obrigado Patrão - respondeu o gaúcho - Deixo ar. Poderá servir-lhe para puxar as pipas de água de volta do poço. E inclinando-se sobre a cruz do cavalo, partiu batendo na marca rumo da porteira da estância ...

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MUNDANISMO

Hoje, dentre as trepadeiras que o contornam, num pátio em que frondosas árvores procuram escondê-Io, o vivo castelo de tempos idos parece chorar saudoso. Ah! Bons tempos aqueles em que os acordes suaves e inebriantes de variadas valsas espalhavam-se por todo seu interior. Até mesmo fugiam por suas janelas para entrelaçar mais e mais os casais amorosos, na vastidão de seus arredores arborizados e floridos. Quanta luz de luxuosos candelabros e magnfficos lustres se espalhava no amplo, rico salão de festas. Dava o mais belo colorido que os olhos podem ver, ao desfile de decotados vestidos de gala, que cobriam angelicais jovens sorridentes ... Era algo de maravilhoso o tempo que lá foi ... Até agora é lembrada saudosa, a irritante voz de Madame. Ela fazia questão de entoar melodias I(ricas acompanhada pela orquestra de cordas. Como essa anfitriã desagradava, então, a mocidade apaixonada pela dança ... Quanta alegria banhada em champanha. Quanta felicidade lá teve seu gênese ao compasso do ritmo vienense que ecoava pelo solar ... Mas, passou ... Agora o abandono e a escuridão moram em seus aposentos. Os ratos são os dançarinos no momento, ou em poltronas aristocráticas, ou em estufarnentos pintados a mão de cadeiras seculares. Saracoteiam ao som enlouquecedor da sinfonia dos pernilongos. Suas cortinas de veludo, umas abrigam aranhas, que as unem à pintura emoldurada mais próxima com suas teias vigorosas. Ou-

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tras balançam no sentido do agitado vento que invade as janelas pelos vidros quebrados por pedras que a garotada atira. E lá fora, enquanto as árvores são despidas de suas folhas que caem ao chão, o zumbir do vento. parece choro e soluços deste casarão abandonado, relembrando os felizes dias em que r,,1adame o tornava o mais alegre lugar mundano ...

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FUGA FRUSTRADA

Quando o telefone rompeu o profundo silêncio da noite, minha mão procurou o despertador. E meu dedo mergulhou no resto de uísque que sobrara no fundo do copo. Meio que despertei ... Na escuridão ainda não compreendia bem a ausência do despertador. Era ele sempre que me acordava ... Tirando o dedo do morno líquido do copo, levei-o à boca. Uísque! Seu gosto de palha apressou meu despertar. Bebi de um gole o que restava no copo. Ainda não atinava com a origem do rufdo que me estourava a cabeça ... I Aos poucos lembrei-me que não podia ter nenhum despertador sobre a mesa de cabeceira, e sim um copo e uma garrafa vazia de "Queen Anne". Nesta noite .eu não dormia em casa... dormia num destes apartamentos que se alugam para uma noite, e que existem aos borbotões nesta cidade. Custando a abrir os olhos e bocejando constantemente, dirigime ao telefone. Sim, era ele que me acordava I Ia levantar o fone quando deixou de tocar. Que parvo havia sido! Inventara uma desculpa qualquer a fim de passar a noite fora de casa, somente para receber este telefonema ... traçar nossos planos de fuga ... E meu torpor não mo havia deixado. Lancei o copo ao solo. Partiu-se estrondosamente em mil pedaços. Maldito u fsque! E o telefone voltou a chamar como um eco do espatifar-se do copo. Corri ao telefone. Tropecei no tapete caindo de bruços sobre os cacos. Todo doído ainda consegui levantar o fone, levar o auscultador ao ouvido.

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- E ... você Luana? - Sim, anjo sou eu e cheinha de saudades tuas. - Como. . . ansiava este momento ... Luana ! Tenho tantas coisas ... para te dizer ... e acho que não mais poderemos ... - Mas porque, anjo? Temos ainda bastante tempo para conversar, afinal noite é uma criança ... Alô! Alô ... Alô! lia

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o sangue corria de meu pulso tingindo de vermelho o fone e o fio ... Cortara-me nos cacos do copo. Já não tinha forças para abrir os lábios, balbuciar qualquer palavra ... Esvafa-rne em sangue. Era evidente minha morte ... Encontrariam-me morto, banhado em sangue, e com o produto do desfalque em meus bolsos. Era o triste fim de um pretenso banqueiro honrado ... E ela? Pronta para fugir comigo ... ficaria me esperando algum tempo, por certo. Que impressão a meu respeito guardaria para o resto da vida? ... "Cortou o pulso ... suicidou-se o covarde. Não foi bastante homem para enfrentar a realidade ... "

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NOITE MADRINHA

...

Quando a inspiração n~o vem e o pensamento é um caos, as letras vão tropeçando sem formar sentido. Ouase sempre querem se agrupar em palavras. Tolas palavras que por nada expressarem vão sendo riscadas. Eis que agora elas parecem querer harmonizar-se, dar a luz a românticas frases. Mas não desejam sobreviver. E eu tenho de dar-Ihes vida. necessário que vivam! Com elas também eu viverei mais esta noite. NOITE, MADRINHA DOS DESAFORTUNADOS! Isto é quase outra súplica! Elas começam a viver! Veio a luz, vieram estrelas, veio a música ... E meu pensamento foi perambulando, ganhando vida em rumo qualquer. A música é quente, é suave ... NOITE, MADRINHA DOS DESAFORTUNADOSI Isto é quase uma súplica! Veio o mar, a areia, a brisa ... E lua, e estrelas, e música levaram-me para uma noite a beira mar. E ela estava lá. Reflexos dourados nos sedosos cabelosacastanhados, tez clara, olhos penetrantes, lábios gostosos, pés descalços ... Encanto de mulher. Envolvo-a em meus braços e bailamos. Só os olhos falam ... palavras de carinho, palavras de amor. E a areia salpica nossos pés, e a água morna e espumante os molham, e nossos lábios se encontram. Doce ilusão! Feliz pensamento I NOITE, MADRASTA DOS DESAFORTUNADOSI

t:

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MULHER

- Não! A verdadeira mulher é aquela que tem o coração como centro de todos os seus pensamentos e ações. E aquela que com a sua presença nos faz possuidor de uma alegria infinita. Engendrar os mais sublimes ideais. E, até mesmo, querer conquistar o universo. E aquela que tem, ainda que com o coração partido pela mais cruel desilusão, um sorriso nos lábios e braços abertos para mais uma vez receber o dono de seu amor. E quem tendo seu orgulho para o resto do mundo, dobra-o perante aquela voz que a chama - "Querida .. ." E é aquela que sabe participar da felicidade de seu eterno namorado, assim como acompanhá-Io nas amargas dores com beijos, carinhos e palavras de conforto. Esta sim é a única a quem se pode chamar mulher. E quem mais merece, um dia, ouvir de lábios inocentes o doce nome "mamã". Pois soube dominar o orgulho, que é terreno. Mostrou carinho e renúncia, sublimes ...

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o MEDALHAO

DA CORRENTE

Em minha mente, quase toda acabrunhada, um pensamento só existia: fugir! Aqueles apitos que mantinham a ligação dos policiais, aquele zumbir de projéteis que raspavam pelo meu corpo, me davam mais forças para continuar na fuga, para amaldiçoar cada vez mais a sociedade. Até o tempo parecia querer expulsar-me da face terrestre. Torrencialmente, e alagando tudo, a chuva caia. Cada relâmpago· que estourava, fazia com que eu me atirasse ao solo. Não poderia ser visto por meus perseguidores. Totalmente embarrado, com as mãos sangrando e as roupas em frangalhos, embrenhava-me mais e mais na mata verde coberta pelo preto véu de uma noite tempestuosa. Agora já não me jogava ao chão para não ser localizado. Ati-· ravam-me a ele. Era a ventania que queria desfolhar os ramos. Eram os galhos secos que, no chão, me faziam tropeçar, em vez de estarem ardendo no fogão de alguma velha pobre. . Sempre que tombava e sentia meus lábios encontrar a lama, praguejava contra os estampidos. Praguejava contra os que clamavam justiça. Minhas forças já eram diminutas. O cansaço tornava lerdos os movimentos que fazia para tirar meu corpo de uma poça d'âgua. Eis que grossa faísca clareou a mata. Eis que pequena chama iluminou um cano. Novamente no chão eu estava. Mas desta vez abraçado pela dor. Mansamente minha mão foi se colocar no peito ferido. Doia muito, mas ... segurei algo ... Não achava a feridal Segurei uma corrente com um medalhão!

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A imagem santa de minha mãe me veio a mente. Era um presente que me dera dizendo; olha para ela!,. recorda-te de mim ... " Estava louco? Por que fugia? Não, minha mãe, não é teu filho! Não é teu filho que se acovardou assim ... Mãe! Perdoa! Matei um homem! E ele tinha também o direito de viver ... Tinha um lar cheio de alegria. E agora ... agora terá seu corpo num ataúde preto, no mármore frio da sepultura branca ... Mãe! Não chores! Sou culpadol Sou um assassino ... e ele ... e ele ... Mas, não era a lama que beijava agora. Era algo macio. Levantando o olhar eu vi mamãe. Com sua mão acariciava meu rosto. Tentava, risonha, acordar-me, choroso ... li •••

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CEMITERIO

As folhas do velho portão batiam-se. Excitava os nervos de quem por ali passasse. Muros amarelecidos pelo tempo. Partes sem reboco. Algumas já sem tijolos. Pequenas trepadeiras a bailar no assustador ritmo do vento que reinava no lusco fusco deste dia invernoso. Era, em verdade, horripilante postal de um cemitério abandonado. Seus túmulos pareciam nascer do capinzal, Um arbusto seco, no centro de um masoléu, permanecia na inércia. Dava idéia de gigantesca mão descarnada que se estendia ao céu implorando misericórdia. A um canto, grossa árvore caída sobre um bloco de mármore, impressionava. Suas inscrições e figuras metálicas, umas não mais existiam: outras jazidas amassadas. A cruz que por certo o ornava outrora, por vezes aparecia entre os galhõs, coincidindo com o clarão dos relâmpagos. Era tudo que se destacava após pequena capela. Impregnada pelo cheiro do sebo de vela, misteriosamente, nela era iluminado seu santo. O mais eram ervas daninhas e pontos brancos ... E o vento continuava a assobiar sua fúnebre canção. Movia até o mínimo ramo. Parecia querer tudo afastar do sinistro cemitério, onde só a natureza afoita vivia ...

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CARITAS .•.

o

povo começou a aglomerar-se nas calçaoas. a fim de contemplar um lamentável espetáculo de uma odiosa exploração capitalista. Com efeito, um guri rnaqricela, de seus 11 anos de idade, empurrava penosamente um carrinho de mão. carregado até as bordas de mercadorias, com o fito de subir uma respeitável ladeira. A pobre criaturinha, desfeita em suor, punha seu pequeno ombro contra o veículo e este se movia lentamente. Da multidão de curiosos, elevou-se a voz de uma mulher, que, como C;P sabe, são muitos sensfveis aos "sofrimentos humanos", dizendo: - Não é vergonhoso que se explore assim um mísero garoto? A multidão concordou unanimemente num sussurro. Mas ninguém se moveu. De repente interveio um homem possante, e lan çando um olhar circular aos demais, esclareceu a teoria da mulher: - ~ indigno que deixemos este pequeno empurrar sozinho o carro! Não estão vendo que ele não tem força para tal? E dando exemplo, pôs-se a empurrar ao lado do menino. Esta atitude decidiu aos outros. Três ou quatro dos curiosos foram dar uma "mãozinha" ao garoto. Isto foi o suficiente para que o carrinho subisse rapidamente. - Para onde vais? - perguntou um, já no topo da ladeira. O menino apontou uma direção que ia dar lá onde o diabo perdeu as botas. Pronto! Novos protestos entre os presentes contra os patrões que tinham o cinismo de encarregar tão débil criatura de semelhante tarefa. - Mas não pudeste dizer a teu patrão que não podias subir a ladeira sozinho? 41


- Claro que disse!! - contestou o jovem. - E que te respondeu este monstro? - Ele encolheu os ombros e me disse: "Anda, vai de uma vez, que antes de chegares na esquina, encontrarĂĄs alguns idiotas que te darĂŁo uma "mĂŁozinha!" ... , *Traduzido

de um autor desconhecido.

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NEGRINHO

Mãos nos bolsos de uma bombacha remendada nos fundi lhos. Cabeça erguida. Lá ia assoviando uma toada, o piazito de cabelos loiros despenteados, por deserta rua. Era um destes tipinhos comuns dos fins ~e linha dos bairros populares. Gazeava a aula para jogar bolita, caçar pardais ou fazer travessuras em alguma sanga. Por certo procurava algum 7 para pintar. Foi ao olhar para um terreno baldio, que sua mente despreocupada trabalhou. Juquinha assoviou mais alto. Deu, sem querer, um ritmo mais alegre à canção. Apressou suas passadas em direção do terreno. - Que pereira maravilhosa! - por certo disse para si mesmo. Na verdade, dentre aqueles montões de lixo depositados no terreno, uma pereira coberta de frutos parecia imitar uma árvore de natal ... Carregadinha ... Uma maravilha ... Quando ia pular para a árvore, ouviu um fraco latir choroso sair dentre um punhado de papéis sujos e cascas de laranjas. Parou e aguçou os ouvidos. Correu para o local donde vinham os latidos. Revirou rapidamente o cisco. Seus olhos pequeninos e verdes depararam com um cachorrinho de uns poucos dias de vida. Encolhido e arrepiado chorava sua orfandade. No írrtimo de Juquinha fora vencida a idéia de comer peras. Nem mais pensou em frutas ... Seu coração voltou-se para o indefeso animal. - "Não chores, Negrinho, vou dar um jeito em tua vida! ... " Segurou o cusco junto ao peito. Esfregou-lhe a mão no corpo e com assoprões limpou seu pelo.

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Juquinha tomara a direção de sua casa na subida da coxilha. Até chegar em seu casebre, eram palavras de carinho e promessas de proteção que o pequenino dizia a sua prenda. Pé ante pé, Juquinha aguardava um descuido da sua mãe, na cozinha. Afinal surrupia leite. Vira o buião e o leite cai dentro de uma lata enferrujada de sardinhas. Dispara para o fundo do quintal. "Negrinho" lambusava-se todo. Nunca teve tanto leite ao seu dispor desde que nascera. Para o resto do dia Juquinha privou-se de suas brincadeiras com a garotada da vizinhança. Esteve construindo uma casinha para seu achado. Quando a noite caiu, "Negrinho" encontrava-se escondidfssimo num velho pelego em seu primeiro lar. Juquinha, em sua cama, virava de um lado para o outro. Não conseguia dormir. Seu pensamento estava voltado para o cachorrinho: - Estaria ele passando bem? Não teria frio?" E, com estas perguntas, suando, esperou que seu pai apagasse a impertinente luz do candieiro e fosse se deitar. Pronto! Agora era sua vez de agir. Com cuidado saltou a janela de seu quarto. Queria mais uma vez ver "Negrinho". A tentação foi grande ... Meia hora depois, o garoto dormia feliz e cheio de satisfação. Encolhidinho em sua cama, envolvia seu novo companheiro: o viralatinha que lhe impregnara o coração de amor e carinho ...

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UMA BOLA ... Na mesa do bar, bebendo um martini, procurava algo para uma crônica. Pensava na música e no álcool e na noite enluarada lá fora. Pensava em tudo. Não pensava em nada ... Entrou afobado um quarentão, que desviou minhas reflexões. Tropeçou no pé de uma cadeira. Caiu! O pessoal ao lado da minha mesa gargalhou gostosamente. E, quase que em coro, disseram: "Ele é uma bola!" Mas ele levantou ... Olhou feio para todos. Puxou um revólver ...

Lembrei-me então do cronista Antônio Maria que numa deliciosa crônica aconselhava: "Não queira nunca, meu amigo, por mais que este prazer te fascine, ganhar a fama de engraçado, vil/o, talentoso ou inteligente. Tua vida vai ficar um inferno. Quando entrares num bar, haverá sempre uma mesa, onde estarão sentados senhoras e senhores "bem". Então ouvirás uma voz gritar: - Chegou elel Ele és tu. Aí, chamarão para ser da mesa, e tu irás, porque não haverá outro jeito. Quando estiveres sentadinho, a moça vai dizer ao ouvido da outra: - Ele é engraçadíssimo. E depois, virando-se para o teu lado, perguntará: - O que é que você tem feito? Nessa altura, irmão, não terás o direito de responder: "Nada.

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Não tenho feito nada". Tens que dar uma resposta bem inteligente, dessas que a mesa toda caia dura, morta de tanto rir. E o pior é que estarás morrendo de cansaço. Na realidade não és engraçado, nem talentoso, nem nada. Es vivo, até o dia em que a morte te vier apanhar. Então, outra moça da mesa vai dizer: - Ele é uma bola ... E tu não és uma bola. E tu mereces o direito de solidão, de silêncio, de mansa e contemplativa burrice. Ninguém te quer dar essa paz. - Por quê? E dolorosa, bom moço, cansativa e cruciante a fama do teu talento ... Compra um revólver, companheiro. Põe-no à cintura. Entra, depois, no bar. Quando a mesa de "gente bem" te chamar, puxa o teu revólver e dize: - Tá aqui prá voces! E nem será preciso atirar ... "

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Mas ele quis atirar, completo eu nesta crônica meio roubada. Puxou o gatilho. Um jato d'água saiu do cano da arma (de borracha) ... A mesa toda caiu dura, morta de tanto rir ... Ele era mesmo uma bola ...

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CALrGULA: LUNATICO OU SENSATO?

Sempre .tive o Imperador Romano Cal fgula em conta de louco. Convenhamos, nomear Consul "Incitatus" é um gesto eqüino em todos os sentidos. Confesso, porém, que até então apenas lera friamente as narrativas dos livros de História Universal referentes a Calígula e seu cavalo "Incitatus". Nunca tinha tido a curiosidade de embrenhar-me a fundo na interpretação de seus atos. Eis que lendo "Calendário do Crime", obra de Ellery Queen, fiquei deveras impressionado com as justificativas dadas às atitudes de Calfqula. inéditas. Pelo menos para mim. Quando Cal (gula se tornou imperador nomeou seu consul, Incitatus. Sendo Incitatus um cavalo, compreende-se o rigor dos historiadores ao colocarem o neto de Tibério na categoria dos loucos. Esta classificação é discutível. Temos conhecimento de outras nomeações, e não apenas entre os romanos, muito menos atilados. Atribuiu-se, também, a Calígula o assassínio de seu filho adotivo, Lucius. Era seu hábito, igualmente, mandar para a arena os cidadãos que não lhe agradavam e jogar, nas horas de ócio, com dados viciados. Que estes fatos são históricos, parece indubitável, mas justificarão eles as conclusões tiradas? Já comentamos o episódio do cavalo. No que se refere a Lucius, este era, segundo o testamento de Tibério, co-herdeiro de Cal (gula e um Imperador que fett: desaparecer do número dos vivos o seu co-herdeiro poderá ser considerado um indivíduo de temperamento nervoso ou cauteloso mas, nunca louco. Atirar os inimigos para a arena junta o interesse particular com o prazer do público e é um Indício de clarividência

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política. Finalmente, se é certo que não se justifica moralmente o emprego de dados viciados, não é menos verdade que essa prática reduz consideravelmente as probabilidades negativas para o jogador que os utiliza. Resumindo, conclui Ellery Oueen - longe de ser um lunático, Cal ígula era um homem sensato". Que Calícula fosse sensato, não creio. Que fosse louco, estou inclinado agora a não mais crer. Ficarei no meio termo: Acredito que agora estou sendo mais justo à memória do Imperador. Se Cal (gula nomeou consul seu cavalo Incitatus, os pau listas elegeram vereador seu rinoceronte "Cacareco". Quem sabe se Calígula ao tomar aquela atitude não julgava lá ter suas razões para tal, como também as julgavam ter os paulistas para elegerem "Cacareco"? (se bem que, por mais puras que Ihes parecessem tais razões, contaram com minha antipatia incondicional). • Descansa em paz Calígula. Para mim V. Excia. já não foi um -louco, uma personalidade psicopática. Pode ser que mais tarde eu ainda venha a considerar V. Excia. um sensato. Mas por enquanto não.

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MOLEQUE IRO

E quase nada este projeto de cavalo. Pequenino por fora, o mouro é gigante de coração. Quando pela manhã o tiram da baia, sempre sai mancando de uma das patas. E o golpe que aplica para não ser trabalhado. Criança fiteira que inventa doença para "matar" a aula. Acabe com esta farsa, quando lhe começam a escovar o corpo. Vira, então, moleque. Orelhas para trás, boca aberta, dentes â mostra, e pronto! Um descuido do tratador basta para que virando o pescoço, tente mordê-Io. Nunca soube de alguém vítima de seus dentes ameaçadores. E modalidade de brincadeira do IRO. Demonstra nisso, alegria e amizade ao que procura seu dorso amigo. Ei-lo troteando e galopeando na praça h (pica. Enquanto é distendido, noto que sua pequenês desaparece. Começa a crescer ... _crescer... Avança para o primeiro obstáculo armado. Verdadeiro monstro colorido, que se torna infantil sob o magestoso salto do IRO. Outro mais adiante é o pi':óximo que ter-á de transpor. Em cadenciado galope, com franqueza de mestre, arrojo de "puro sangue" (que ele não tem), e bem enquadrado, marca o salto. Levanta seus anteriores, encolhendo-os. Emprega o pescoço, baixando-o como em esforço vital. Um corpo no ar. Uma montueira de paus, que me representa tremer de medo. Novamente no chão. Retoma sua andadura anterior. Segue saltando ... - Chega por hoje, mourinho! 49


Cavalo e cavaleiro confraternizam-se. Este acariciando-o, e com tabletes de açúcar na mão oferece àquela que, sedento pelo prêmio de sua maestria, os devora lambendo e babando a mão que o ouia. Lá vai ele para o banho. Ainda percebo seu rítmico andar. Sempre sincronizado com a cola que levemente se agita. Cá e lá ...

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A ESTORIA DO ROGERIO

Estava em casa, sentado em minha poltrona favorita. Dava gostosas baforadas em meu cachimbo holandês de porcelana, enquanto lia Dostoievsky. "Recordações Ida Casa dos ...Mortos", para ser mais preciso. Uma edição popular bastante condensada. Mantem, no entanto, todo o vigor e horror das memórias de Alexandre Petrovitch Goriantchikof, publicada por Dostoievsky. Absorvia-me com os "forçados" e suas desv.enturas. Fui interrompido bruscamente. Meu garotinho pulou para meu colo. - "Tá lendo, uma histólia papaiziu? - Estou, meu querido. Uma história triste ... - "Eu conto uma pá ti". - Então conta. Quero ver se é bonita. - "Ela uma vêz um cavalo blabo. Ia colendo na rua com o sodado. Caiu dentlo do bulaco. Cavalo fez dodoi na péna i u sodado botô meculio na péna do cavalo. Cavalo ficô boml Bacana!" - Mas é uma estória muito linda, filhinho. Quem te ensinou? - "Rogélio sane, papaiziu!" E eu bem que sabia que a estorinha saira de sua cabecinha. Não me consta que alguém lhe contasse algo similar.

.

*

*

Hoje Dostoievsky sou eu. Não publico "Recordações da Casa dos Mortos". Publico recordações da casado pequeno vivo. Só não digo que Dostoievsky, hoje, é o meu Rogério, porque não creio que com apenas dois anos e dois mesesde idade (a de Roqériolesse

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escritor russo já soubesse fazer estória. E estória humana, com pé e com cabeça. Já sei! Acham que sou pai-coruja ... Mas também não fiz estorinhas com dois anos de vida ...

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"PLATERO

E EU"

Longe estou de querer fazer uma crítica literária. E ainda mais em se tratando de uma obra de Juan Ramón Jimenez (Pl'~ mio Nobel). Mas lendo "Platero e eu" (volume II da Coleção Catavento da Globo), sinto-me jovem, puro, alegre. Uma paz de espírito se apodera de mim. Percebo que vou aos poucos esquecendo tudo que me cerca. E meu pensamento parece flutuar nas paisagens inebriamtemente descritas por Jimenez. Cada passagem de "Platero e eu" ébela e reconfortante. Vou-me identificando com os fatos e personagens andaluzes, e passo a viver nessa sensível prosa poética ... Eu era quem regressava com Platero quando caía a tarde de abril. "Tudo quanto era de ouro, no poente, se transformou de súbito em prata - uma alegoria limpa e luminosa, de açucenas de cristal. Depois o vasto céu foi como uma safira translúcida, transmudada em esmeralda. Eu vinha triste ... " Platero, por certo, também. E eu, também ... E realmente notável estar no cimo para ver a paisagem rubra: "Aí está o ocaso, todo em púrpura, ferido de seus próprios punhais de luz, que o fazem sangrar. Ao explendor crepuscular, o pinheiral verde se veste de vagos tons alaranjados. E a grama e as florinhas, rubras e transparentes, embalsamam o sereno instante de uma essência úmida, penetrante e luminosa. "Ficamos

Plrtero e eu (e eu) extasiados ao crepúsculo verme-

lho". Continuo extasiado até agora. Mesmo com o fim de Platero.

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Mas neste momento em que o rememoro na "paisagem rubra" vou ficando rubro e este devaneio também. Ele pelo calor que lhe deram as maravilhosas visões de Jimenez da natureza, e que estão entre aspas. Eu, de cólera - já começo a sentir-me flutuando porque nada mais posso dizer de "Platero e eu", senão: - Leia-o ... Leia- ... Lei ... Lei ... Le ...

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MOSCA A pior hora para fazer uma crônica é após o almoço, num dia de calor. Pego o lápis. Cheio de preguiça espicho a mão à uma folha de papel. Rabisco duas palavras. Quebro a ponta do diabo do lápls.: Mais preguiçoso ainda levanto da cadeira. No porta-casacos, tiro, do bolso de meu paletó, a caneta. Volto à mesa. Esfrego os olhos. Zumbindo, faz uma volta alegre e 01 fmpica na minha cabeça uma mosca. Não faltava mais nada. Com todo este calor terei que espantar o inseto? Acomodei-me sobre o papel. Lá vem a mosca. Risco o que à lapis havia escrito. Escrevo meia dúzia de frases a tinta. - Até tu, caneta! Não tinhas outra hora para secar? - Saia daqui, inseto ingrato! Tudo me irrita. Quebro a ponta do lápis, seco a tinta da caneta, a mosca Plaft! (Ainda te mato, raiol) Ela voou de minha testa. O suor corre em meu rosto. Olho o relógio. 14,10. - Só? A mosca pousa desta vez no meu braço. Como em passos de samba, saltita entre os cabelinhos. Que coceira! Plaft! ... Cinco dedos ficaram marcados nele. E nela? Nada ... Calmamente faço a ponta no lápis. Inicio outra vez a crônica. "Mosca". Sugestivo nome. Ela de novo! Perco a "elegância". Tiro o lenço do bolso da calça. Passo pela testa. Ficou encharcado. Ponho-me de pé. Aguardo este imponente inseto díptero. Ali vem ele cheio de alegria. Corro ao seu alcance com o lenço na mão, para abatê-Ia.

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Perdi-o de vista.

O Deus meu! Ah! pousou na minha orelha. Plaftl. .. A ponta do lenço bate no meu ombro. Fico irritado. A mosca esquivandose pousou sobre o papel onde escrevia suas aventu ras ... Pé ante pé vou chegando à mesa. Sento-me na cadeira. Dou duas voltas ao lenço no ar deixo-o cair sobre a mosca. Matei-a. Pego novamente no lápis. A preguiça morreu com ela. Consegui escrever em paz ...

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PROCISSAO -'

Por- trás dos vidros da ampla ~nela de um dos aristocráticos palacetes da Avenida Independência, a velhinha, embrenhada em pensamentos sublimes, deixava sair de seus lábios tributos de louvor ao Senhor Rei do Universo. Quem sabe (JJêInto ela, com a mais forte fé de seu coração feminino, nIo pedia ao Pai Miser-icorólO50 •••

Lágrimas saiam de seus olhos.. Era visível sua ansia em salta •..a janela Como ela desejaria ser parte daquele milhar" de católicos por que ai f passava em acompanhamento -ã ProcissIo do Corpo de Deus ... Desde seu tempo de meninota, era a primeira vez que dela não participava ... Suas pernas nJo mais se moviam ... Comovedora cena. ConbJdo, sua .-asionomia nJo se mostrava de todo sofredora. Ainda dispunha de forças nos dedos para rnexeI" as contas de seu rosário. De voz para conversar com Cristo ... Por Ele esperava. Pediria bençãos para alguém. AI!JIém que muito queria ver- com uma vida pura e cheia de saúde. Mais um colégio cantando ••Hóstia Santa". Uma Associação de Moças ecoando o Padre Nosso. E"ISos coroinhas de vermelho. Antecipam o Santíssimo. E o Corpo de Deus que se aproxima ... Sonindo a sexagenária senhora acompanhou a imagem com 05 olhos. Ergueu seus braços ao céu, corno numa prece desesperada. E aquele menininho bobo na calçada, vendo-a com as mãos para o ar apontou o dedinho inólCêldol" e fez alguns '"bang". "OOng", e deu Qosto-3ÕSgargalhadas. __ _ No entanto era por ele ~e a anciã orava . . _ Pelo seu únic' netinho. __

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A BRIGADA DE HOJE OUTRORA MANOBRAS E COMBATESI HOJE "POLICIA QUEREMOS SER, NÃ PAZ E NA GUERRA! SO POLICIAl NADA MAIS!" A Brigada Militar de hoje, deixou aquelas velhas lides militares que as situações de épocas remotas exigiam, para abraçar sua superior destinação: POLICIAMENTO. Se outrora um 29 RC vencia Honório Lemes num Combate da Conceição, hoje uma Companhia de Polícia permite que o povo, numa estação rodoviária ou ferroviária, num Aeroporto Salgado Filho, embarque e desembarque livre de preocupações e veja a mão amiga dum "Pedro ou Paulo" apontar: - ~ ali, meu Senhor! Se outrora um Coronel Pilar dava vitórias à legalidade em Cerrilhada ou Ipamoroti, hoje, um Regimento de Polícia Rural Montada vence moléstias, epizootias, e toda calamidade pública que sem a vigilância do "aba larga" imperava na zona rural gaúcha. Se outrora um 19 BC inebriava-se no sabor da vitória num Km 298, hoje, um Corpo de Bombeiros, dia e noite de olhos abertos, zela E PROTEGE o bem e a vida alheia do pavor do fogo. Se outrora as situações exigiam a espada, hoje, a vida moderna exige que a Brigada Militar se mantenha alerta para a existência de ordem perfeita entre os homens de boa vontade. E uma conseqüência do desenvolvimento do intelecto humano, que apreciamos. Armas em último caso. O povo reclama seus direitos. A Brigada zela seus pertences enquanto isso. Para tal, aí está ela, atendendo solicitações diversas para ajudar a resguardar o direito do homem. Se na foto da página anterior vemos uma cena de campanha,

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por volta de 1903, vemos metralhadoras aprestadas para as marchas bélicas, nas outras'vemos os brigadianos dos batalhões de caçadores, orgulhosos, resguardando navegações enquanto a classe rnarítirna reivindica o que de seu direito julgava. Esta é a transformação radical que notamos na Brigada de .Ho]e, Nada de revoluções. Nada de lutas. Apenas policiais militares resguardando direito, zelando patrimônios. f o século XX que evolui. E a Brigada Militar que abraça, com o aplauso do povo, a nobre missão de POLrCJA. Polícia como o homem quer: defensora, ordeira, DE CONFIANÇA

• Refere-se às fotos publicadas

na revista

Briasd«

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Gaúcha.


A PAZ CHEGOU NOS PAMPAS ... 365 DIAS DE POLICIAMENTO

RURAL

Criado no dia 30 de setembro de 1956, o Regimento de Polícia Rural Montada completará em setembro próximo seu primeiro ano de atividades. Completará 365 dias de Policiamento Rural nas coxilhas, canhadas e pampa gaúcho. Neste curto espaço de tempo, os abas-largas já estão capacitados a nos transmitir um pouco dó triste panorama do interior pelos seus fe.itos maravilhosos e quase miraculosos. Impregnadas de dor, devido ao estado em que encontraram a população rural, são as entrelinhas dos relatórios periodicamente enviados ao comando do Regimento pelos policiais de abas-largas .. Foi lendo esses relatórios que ficamos contagiados da mesma dor. Conhecendo os alarmantes surtos de tracoma na infância rural, do bócio endêmico, subnutrição, analfabetismo, abigeato, desordens, mortes ... ficamos desejosos de escrever esta reportagem - para mostrar um trabalho anônimo que o povo glorificou ... Indiscutivelmente para esta gente rural, os soldados desta unidade nova da Brigada Militar, do RPR Mont, tem sido mais do que defensores, tem sido seus lídimos "heróis anônimos". Numa homenagem justa, pois, a estes "heróis anônimos", e para mostrar ao leitor alguma coisa dos relevantes serviços prestados em prol da causa pública no hinterland, nestes quase 365 dias de polieiamento rural, pegamos um dos relatórios que chegaram a sede do RPR, Montado do 39 Pelotão, sediado em São Gabriel e comandado pelo 29 Ten. Oritz Morari Abiz, e mais alguns dos muitos casos dignos de nota.

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039 PELOTAO DO 29 ESQUADRAO

o

29 Esquadrão do RPR Mont, com sede em Alegrete, destacou o seu 39 Pelotão para o rnunicfpio de São Gabriel, no dia 20 de dezembro de 1956. Este Pelotão, passou a atender, com seus grupos, os municfpios e distritos de São Gabriel, Dom Pedrito e Lavras do Sul. O 39 Pelotão é composto de 53 homens no total. São eles; 1 - 29 tenente; 1 - 29 sargento; 7 - 39 sargentos; 2 - 39 sargentos motoristas mecânicos; 1 - 39 sargento enfermeiro-veterinário; 12 - cabos de fileira; 28 - soldados de fileira; e 1 - soldado clarim.

SEUS PRIMEIROS TRABALHOS Mal tinham os abas-largas do 39 Pelotão desencilhados os cavalos para acantonar, um rosário de solicitações e queixas os colocaram imediatamente em ação para a defesa do gaúcho. De sua família. De seu patrimônio. "Batendo na marca", sairam os abas-largas pelos diversos distritos de São Gabriel. Diligências e mais diligências. Buscas e mais buscas. O fruto da fatigosa missão surgiu - surpreendente. Do dia 20 de dezembro de 1956, até o dia 28 de fevereiro de 1957 (dois meses e 10 dias), registramos só em São Gabriel os dados que seguem: - gados roubados: localizados e restitufdos aos seus proprietários: 88; - eqüinos roubados: localizados e restitu (dos aos seus proprietários: 9; . - patrulhas para policiar carreiras de cancha reta: 7; - armamento apreendido em reuniões e batidas: revólveres 8; facas diversas: 61; facões de mato: 11 e munições: 20 balas; _. captura de foragido: 1; - socorros de urgência prestados: 24; - alguns medicamentos usados: Penicilina 400.000 unidades, Dibiotil, Dechelim, Anecrozam forte - Polidase LaborAgocholine, Lizine, Sulfa em pó, pomadas diversas, Linfo61


cilim, água oxigenada, iodo, mercúrio-cromo; - condução de enfermos em jipes: 5; - busca de cadáver: 1 (em uma lagoa); - tropas apreendidas por falta de documentação !:-:ga!ou suspeita: 4; - levantamento de marcas e sinais dos animais C" 84 fazendas.

5 DESTACAM

ENTOS

Os cinco primeiros destacamentos policiais rurais do 39 Pelotão foram instalados em: Catuçaba, Tiarajú, Azevedo Sodré, Suspiro e lbaré, respectivamente a 6, 8 e 9 de janeiro deste ano, os 3 primeiros; 7 e 10 de fevereiro deste ano, os dois últimos. Praticamente são de menos de um mês os dados dos trabalhos efetuados por estes destacamentos, que registramos em suas respectivas zonas. Por serem assombrosos, e demonstrarem a lacuna que preencheu o Regimento de Pol ícia Rural Montada, somamGS, os números dos 5 destacamentos e os trouxemos ao conhecimento público: - patrulhas para policiar carreiras de cancha reta: 9; - patrulhas noturnas e diurnas {ronda de campos e corredores):

-

50;

elementos detidos: 7; queixas recebidas: 45; ocorrências atendidas (diversas): 8; patru lhas em salões de bailes: 15; armamento apreendido em reuniões e batidas: revólveres: 6; facões de mato: 8, facas diversas: 25; levantamento de marcas e sinais dos animais de 45 fazendas; patrulhas em festas públicas: 2; escoltas para conduzir detidos: 2; levantamento de local de crime: 1; IPM instaurado: 1; socorros de urgência prestados: 28; empréstimos de pequenas importâncias de dinheiro para 62


compra de medicamentos de urgência: diversos; - busca de réus foragidos da justiça: 4; - Tropas apreendidas por falta de documentação legal ou suspeita: 3. Os dados que acima publicamos são indestrutíveis e puros. Tirados de fontes oficiais, falam pelos abas-largas. Dizem da nobreza de seus serviços, do carinho e abnegação com que cumprem suas atribuições e ordens, do quanto já Ihes são gratos os homens da campanha e o Rio Grande do Sul. Mas vamos um pouco mais adiante. Vejamos alguns dos muitos CASOS DIGNOS DE NOTA:

CAES OVElHEIROS Em Serro do Ouro, município de São Gabriel, o proprietário da Estância Santa Helena vinha alarmando-se com o desaparecimento periódico das ovelhas do seu rebanho. Quando o número atingiu a 31 foi dado parte pelo interessado ao Delegado de Polícia. Em seguida os abas-largas começaram a agir. Ao término de dois dias de trabalho, constataram os nossos montadas a falta de 31 ovelhas. Percorrendo o campo da Santa Helena encontraram, no fundo da estância uma sanga. Em suas margens lfrnpidas 10 ovelhas mortas foram localizadas. Exames minuciosos nos animais mostraram sinais de mordidas de cachorros ovelheiros. A esta altura desaparecera a suspeita de roubo. O morador mais próximo de Santa Helena, possuía dois ótimos cães ovelheiros soltos em seu campo. Ele mesmo já encontrara duas ovelhas suas mortas pelos seus cães. Como não houvesse cachorros na Estância Santa Helena, ficou certo que por lá agiam os cães do vizinho. De comum acordo os fazendeiros resolveram aceitar a sugestão dos abas-largas: - prenderam por 30 dias os cães. Não mais apareceram ovelhas mortas. E, para solucionar definitivamente o suposto roubo de ovelhas, os cachorros foram sacrificados por seu próprio dono.

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"TEJA PRESO", CASTELHANOI

o

jornalista Josué Guimarães, na reportagem "A sombra do aba-larga domina o chão dos parnpas", publicada na revista MANCHETE, contou este fato, que já se tornou singular, a fim de exemplificar os belos serviços dos montadas: "0 soldado de aba-larga curtira quatro noites e quatro dias na espera. O abigeatário reiúno havia de vir na escuridão da noite ou no clarear da madrugada. E veio mesmo, nas trevas. Apeou assobiando, o desalmado. Tirou da guaiaca o alicate e se aprontou para cortar o primeiro fio. Então, num de-repente, o Montada pulou da moita que já tinha a forma do corpo, apontou o mosquetão e deu voz de "teja preso". Num relancim reconheceu Castelhano, velho ladrão de gado de São Gabriel e redondezas. Daí o homem saltou como cobra em bote, puxou do fala-verdade e atirou no aba-larga. Um, dois tiros. E correu assustado para a égua que escarvava o chão, montando de golpe. Aí o Montada atirou no animal como recurso, e o pobre se pranchou de comprido. Mas Castelhano ganhou o mato como um corisco e desapareceu. Na volta, arreliado, o soldado deu conta ao comandante do fracasso: - E a í atirei na égua e ele ganhou o mato ... - Por que não atirou no Castelhano? - perguntou o comandante para experimentar. - Porque a ordem vossa, meu comandante, é de não matar ... A história é verídica e se passou com um homem da Polícia Rural Montada num dia qualquer, num corredor da campanha, entre as coxilhas do Rio Grande. Ela serve para dizer melhor do espfrito dos homens que integram a nova unidade da Brigada Militar."

DURA LEX SED LEX Quando entraram os abas-largas em ação no município de Alegrete, surgiu o primeiro "primoroso" caso: desvencilhar poderosa quadrilha de abigeâtários. O desenrolar da busca dos ladrões de gados e ovelhas, estranho para os que vivem nos grandes cen-

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tros, fez os jornais abrirem manchetes para atrair leitores. O pampa gaúcho passou a ser imaginado como um "far-west" em cinemascópia. Chegaram a chamar de "cow-boy" o aba-larga, contra o que protestamos solenemente. Aos abas-largas, se quiserem, que chamem de guasca, Indio, - de gaúcho. Nosso folclore possue figuras de respeito e mais belas do que qualquer outro pago. Não apelemos aos vizinhos no norte para adjetivar o arrojo dos soldados da Querência, dos soldados da Brigada Militar. Por serem gaúchos os abas-largas, sem receio, desmoronaram e apontaram como maiores abigeatários de Alegrete, uma quadrilha respeitada por ser composta de "homens tidos e havidos na opinião pública". Depois do término do rigoroso Inquérito Policial Militar, no qual verdadeira procissão de depoentes desfilou ante os elementos do RPP Mont, foi decretada a prisão preventiva dos indiciados. 633 ovelhas e 85 vacuns haviam sido roubados e foram apreendidos. Cr$ 447.700,00 o valor do roubo. Otima fórmula (criminosa) de enriquecer depressa. Formaram dois rebanhos roubados de diversos proprietários. "A fórmula deu certo até o dia que a PoIícia Rural Montada (em boa hora) entrou em cena". Apelaram. "Dura Lex Sed Lex". Presos. Vitória inconteste dos abas-largas em prol da honestidade e paz na querência. ANJOS- DA-G UAR DA Muitos outros casos não menos importantes e inéditos na história policial do Rio Grande do Sul, poderiam desfilar nesta reportagem-relatório". Não os relatamos. "Para o bom entendedor meia palavra basta", e para o bom gaúcho, o riograndense puro do interior, os abas-largas já se caracterizaram como homens de moral elevada, disciplinados de intenções nobres, quer na moral, quer no modo de ação. Hoje, o fardamento caqui dos abas-largas indica nas coxilhas e canhadas a aproximação dos novos e primeiros serviçais e providenciais ANJOS-DA-GUAR DA. "Inspiram sempre confiança aos homens do trabalho e da produção. Espantam desde logo os ladrões de gados", epidemias e o desamparo. E a lei que se aproxima. Não para restringir ou punir. Mas para orientar, prevenir, amparar ...

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A LITERATURA POLICIAL BRASILEIRA PERDEU UM VALOR E A POLICIA MONTADA UM OFICIAL Em 20 de Março de 1961 apresentamos, neste GABINETE, um artigo escrito, especialmente, pelo TENENTE CARLOS JONATHAS SPALDING sobre a POLfCIA MONTADA DO CANADA O tenente Spalding pertencia à Brigada Gaúcha do Estado do Rio Grande do Sul, corporação brasileira correspondente àquela organização policial canadense. De u'!la freqüente troca de correspondência nasceu entre nós uma sincera amizade, de tal modo que a notfcia da sua morte, em 14 de Outubro, nos impressionou vivamente. Com tão triste acontecimento, perdemos um valioso e inesquecível amigo. O tenente Spalding era um apaixonado da literatura policial e chegou a enviar-nos, em tempos, um. conto que ele considerava o seu "gatinhar" literário no trilho da ficção detectivesca. Adaptamos o conto à Rádio e transmitimo-Io no Quinto Programa, mas roubamos-lhe, então, o seu sabor caractedstico, pela dificuldade da interpretação de muitos vocábulos gaúchos. Hoje, porém, na singela homenagem que desejamos prestar ao TENENTE CARLOS JONATAS SPALDING, tomamos a iniciativa de o publicar "NA HORA DO CRIME", tal como nos foi remetido. Puro e real, violento e sincero no "Iinguajar sul-riograndense", como Spalding nos dizia na carta que nos foi remetida há precisamente um ano. A.V.

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A CARTA Porto Alegre, Out., 22, 1960. Meu estimado amigo Varatojo. Com esta estou remetendo para a apreciação do grande amigo, um continho meio policial. E. ele um dos meus primeiros trabalhos dentro do tema ficção policial. Espero que você me envie sua apreciação sincera sobre seu conteúdo. Em princípio este conto vai dedicado ao amigo, pois muito embora você não imagine, quem me incutiu o gosto de escrever um conto policial foi o amigo. A leitura constante de seus interessantes trabalhos e as ricas seleções contidas em "ABC Policial", contagiaram-me. Assim vai anexo a esta liA hora do crime ... ". Por se tratar de um caso supostamente ocorrido no interior do Rio Grande do Sul, e por ser escrito por um gaúcho, o conto contém vários vocábulos do linguajar sul-rio-grandense. Para facilitar ao amigo, os termos gaúchos empregados estão em tipo redondo. Sua "tradução" para a I(nqua portuguesa segue abaixo. Carreira - O mesmo que corrida de cavalos, com a diferença de ser em cancha reta. Quando correm mais de dois cavalos a carreira toma a designação de "penca". Tordilho - Cor de animal cavalar ou muar em que predomina e pelo branco, havendo diversas variedades tordioho-negro, tordilho-vinagre ... Zaino - Pelo de animal cavalar mais escuro que vermelho. Boliche - Pequena casa de negócio na campanha, onde no gera I se vende bebida. Quadra - Medida linear e de superfície. E. também a extensão tomada por base para as carreiras de cancha reta, que vai do míni-

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mo de duas ao máximo de seis quadras. A quadra de carreira é de 132 metros. Canha - Cachaça, aguardente. Estrago - Vocabulário popular significando despesa. Mulher velha - Expressão popular carinhosa, significando a esposa, companheira. Mate - Bebida resultante da infusão das folhas da Ilex. (Veja adiante chimarrão). Palheiro - Cigarro feito com fumo picado de rama e envolto em um pedaço de palha de milho seca. Cobres - Expressão popular significando dinheiro. Pampa - Nome que com freqüência os filhos dos outros Estados do Brasil dão às campinas do Rio Grande do Sul - camoo aberto, planura. Chimarrão - Mate sem açúcar tomado em cúia; mate amargo. E a bebida predileta dos gaúchos. Sarro - Denominação popular dada à crosta que fica na boca quando se bebe muito. Adaga - Arma branca, mais larga e maior que o punhal. Cuia - Porongo, ou mais propriamente, cabeça de porongo, onde se prepara o mate para ser tomado com a bomba. Bomba - Canudo de prata ou de qualquer outro metal, que se introduz na cuia para se tomar mate. A bomba tem em uma das extremidades um bojo crivado de furinhos, e na outra uma parte achatada por onde se suga o mate tomado em cuia. Vivente - (Veja só, Varatojo) palavra portuguesa muito usual no Rio Grande do Sul, e ao que me consta, em desuso nos outros Estados. Significando pessoa, indivfduo. . Estrebuchar - Debater-se, agitar-se. Borracha - O que se dá ao v fcio da embriaguês, o que está ernbriaqado.. Bandas - Direção onde fica uma localidade em relação a outra. Chimarrear - Tomar chimarrão. Cancha - Campo. Meu caro Varatojo, para "traduzir" estas palavras para você utilizei o "Vocabulário Gaúcho", de Roque Callage, e o "Voca-

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bulário Sul Riograndense", de Carlos Morais. Aqui no Rio Grande do Sul nós possuímos mais de 2000 vocábulos, e o interessante é que eles são usados na linguajar corrente não só do interior como também da capital. Quando em 1958 estive no Rio de Janeiro, São Paulo e Pernambuco, às vezes em virtude de certas palavras que eu empregava não era compreendido. Então dava-me conta que estava empregando um regionalismo. O mesmo ocorre nos outros Estados da Federação, pois dado a extensão do Brasil, e a origem da população, vão surgindo vocábulos e mais vocábulos. Bem, Varatojo, não lhe vou roubar mais tempo. Aqui tudo corre calmamente e o calor já começou a aparecer. Andamos entre 23 a 30 graus centigrados. Com minhas recomendações aos seus familiares, envio-lhe um abraço muito amigo. SPALDING

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O CONTO NA HORA DO CRIME ... Por C. JONATAS SPALDING Em verdade a carreira tinha sido um espetáculo maravilhoso. O tordilho do seu Gomercindo ganhara por um pescoço ao zaino do Epaminondas. Seu Epaminondas pagara o valor da aposta e desaparecera. No boliche, seu Gomercindo festejava a vitória com os amigos. Puderai Ganhar numa carreira de 2 quadras e meia 200 contos, já dava para festejar. Parecia mesmo que Gomercindo sabia que esta seria sua última festa. Estalava a I(ngua a cada trago de canha, com um máximo de imponência. Gargalhava gostosamente! Contava vantagens e mais vantagens. E os amigos, que nestas ocasiões nunca faltam, o endeusavam. Era um Deus nos acuda de vivas ao seu Gomercindo e vivas ao tordilho do seu Gomercindo.

A noite já ia alta e os amigos de bar diminuiam. Seu Gomercindo pagou o "estrago". Deu as boas noites aos que sobraram e saiu estrada fora em passo miúdo. A alegria ficara no boliche. Ele, cheio de álcool, seguia cabisbaixo, pensando na mulher velha que o esperava em casa, todas as nc51tes,com um mate espumante. Com as mãos nos bolsos da calça apalpava os cento e noventa e tantos contos que restavam da brincadeira.

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E calmamente seguia a longa caminhada para casa. Caminhada que seria a derradeira, porque assim seu Epaminondas decidira. Caminhada que não o levaria ao seu lar, pois seria interrompida no caminho para que ele não mais caminhasse, não mais visse, não mais falasse ...

* Seu Epaminondas sabia que Gomercindo a esta altura estava de retorno a casa. Odiava-se por ter perdido a carreira e 200 contos. Odiava-se muito mais por saber que no boliche o seu dinheiro pagara a farra de seu antagonista. Que lá ele era objeto de mofa. Que lá gozavam a derrota de seu cavalo. E ele se sentia humilhado, sedento de vingança. Havia já três horas que estava na espreita. A figueira centenária da encruzilhada o abrigava, juntamente com seu ódio. Apertava na mão direita o punhal. Com a esquerda, em concha, levava aos lábios, constantemente um palheiro que não era fumado, e sim mordido pela raiva que o envolvia. * E o Gomercindo continua seu trajeto. Nem sequer olha para os lados ou para trás. Se ele imaginasse que sua vida estava por findar, talvez procurasse dar, com os olhos ao menos, um adeus à natureza. Mas ele não sabe que a morte o espreita. Ignora que jamais veria o Sol, que esta noite triste, sem Lua e estrelas, seria o cenário do seu assassinato. E o Gomercindo caminha lentamente, apalpando os "cobres" abarrotando no fundo dos bolsos. Vai meio que "costurando" a estrada dura e seca, pois o álcool cada vez se manifesta mais. Que triste fim, caminhar lentamente e cambaleante, quase sem saber que caminha para a morte que viria muito breve, sorrateira ... E por não saber que vai de encontro à morte, não ter a oportunidade de dizer adeus à vida, às árvores, ao pampa, ao céu negro, a terra que o haveria de cobrir ... Gomercindo ainda consegue pensar. Não na morte, mas no chimarrão que a mulher velha sabe tão bem preparar e que lhe tira71


rá o "sarro" do álcool. Se soubesse que uma adaga ponteaguda e fria o aguarda a pouco menos de uma quadra, não pensaria apenas em ter a cuia na mão. Pensaria e desejaria seguir outra estrada. que não este corredor da morte ... Fugir para chegar a casa ... Para beijar mais uma vez sua mulher, abraçar e dar mais uma vez a bênção aos seus oito filhos, dar umas apalpadelas no "tordilho" invenc (vel da região...

Seu Epaminondas tinha lido num jornal da capital que quando se crava um punhal bem no coração do vivente. ele cai de todo e só "estrebucha" por uns trinta segundos, sem poder reagir. E seu punhal atravessaria o coração de Gomercindo. E ele não teria dificuldade nenhuma, pois Gomercindo devia cruzar pela figueira bastante borracho para não reagir. Era só cravar o punhal, tirar' o dinheiro dos bolsos, jogar a adaga no arroio e correr campo fora. Nin~ém descobriria o seu crime. Nem mesmo o seu cabo Izidoro Padilha do Destacamento Policial da Brigada Militar, pois o seu cabo sabia que ele era um homem de bem ... Enquanto pensava e pensava, o Gornercindo ia se chegando. Agora Epaminondas apertava mais ainda o punhal. pois já divisava o vulto cambaleante de sua v(tima.

" E o Gomercindo está a uns 50 metros da morte e não sabe ... Será que Deus não lhe ilumina os miolos? De que adiantaria? Gomercindo gargalharia de Deus, pois não creria que seria estrebuchado nem na adaga de Epaminondas, nem da de ninguém, pois era muito macho. Mas o fato seria consumado e ele, borracho como estava, não teria forças para se defender. Como que um fantasma, um vulto surge na sua frente. Os olhos de Gomercindo, meio cerrados, meio abertos, vêem reluzir algo na sua frente ... Sente pesada mão segurar-lhe o braç-oe ouve-que lhe -falam: 72


- Eu ainda não lhe tinha cumprimentado pela carreira, seu Gomercindo, e o faço agora. Como prêmio vou lhe acompanhar até sua casa ... o senhor parece que se passou no festejo ...

E o cabo Izidoro, com a fivela de seu cirrturão sempre reluzindo, interrompeu a ronda que fazia por aquelas bandas, para entregar Gomercindo à sua mulher, e dar umas chimarreadas antes de retornar ao serviço que interrompera na encruzilhada da figueira ...

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FORTE "SAN LORENZO": ABRIGO DE NOBRES, PIRATAS E CRIMINOSOS Homenageando a memória do saudoso escritor riograndense Tenente Carlos Jonatas Spalding, falecido a 14 de outubro p. findo, inserimos em nosso jornal de hoje, a bela crônica de sua lavra, intitulada "Ponte San Lorenzo", escrita alg.Jmas semanas antes do seu fatal desenlace, e que foi a última e a primeira de uma série de crônicas que estava a escrever sobre o Canal do Panamá, onde esteve e fez um curso especial de Pol ícia Militar: Quando no século XVI, com o seu descobrimento, a América passou a ser verdadeira "corrida ao ouro" para os europeus, o Rei da Espanha houve por bem proteger suas possessões na América Central. Para tal, em 1597 Filipe 11 iniciou as obras de um forte no estratégico ponto situado à margem da desembocadura do rio Chagres no Oceano Atlântico, na hoje República do Panamá.

..

Pouco eficaz, no entanto, foi a instalação de tropas espanholas neste forte batizado com o nome de San Lorenzo, frente à audaciosa e aventureira pirataria da época. Em 1668 Henry Morgan, pirata inglês, saqueava Porto Bello, nas cercanias, e três anos mais tarde conseguia tomar San Lorenzo onde seus elementos ficariam instalados para uma reorganização com o fim de destruir por fogo a cidade de "Panamá, le vieja". Depois de saqueada por Morgan, ficou esta região praticamente abandonado até princfpios do século XV 111. Em 1718 o Forte de San Lorenzo é restabeleci do para a Es-

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panha pelo Vice Rei de Nova Gramada, para ser, em 1740, demolido pela poderosa esquadra inglesa comandada pelo Almirante Vernon. Doze anos mais tarde foi o forte San Lorenzo reedificado em sua forma atual. Posteriormente foi utilizado como penitenciária, o que condizia perfeitamente com a época. Acredita-se que por volta do ano de 1846, os presos deixaram esta casa que ficou no abandono até 1955. Desde 55 é mantido e conservado pelas Unidades do Exército Norteamericano sediadas na região denominada Canal Zone por estar este forte localizado nas proximidades do Canal do Panamá. Apesar de ser uma área insegura dado já se encontrarem diversas edificações em ruinas, o Forte San Lorenzo é um dos recantos mais pitorescos da região, atraindo grande número de turistas. Em suas imediações existem logradouros para piqueniques e churrasqueadas, pois já em dois anos consecutivos os gaúchos que vão ao Cana! Zone freqüentar na Usarcarib School, o Curso de Polícia Militar, confraternizam com seus colegas de todos os damais países da América, oferecendo-lhes churrasco bem riograndense com seu típico aroma que por certo fez acordar espíritos adormecidos de nobres, piratas e criminosos que por ali teriam perdido a vida.

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Ten Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding FOI UMA AFIRMAÇAO DE INTELlGENCIA SUA TERRA E SUA GENTE

E DEDICAÇÃO A

O mundo lntelectualrioqrandense e a Brigada Militar particularmente, acabam de sofrer profundo abalo e perda irreparável com o prematuro falecimento do tenente Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding, elemento de escol da mil Icia estadual e uma das promissoras esperanças das letras do extremo meridional do Brasil. Jonatas Spalding faleceu em Porto Alegre, vitimado por insidiosa enfermidade contra a qual foram incapazes todos os recursos da medicina. Os leitores de A CI D Ô.DE estavam habituados à leitura dos belos trabalhos do intelectual extinto, eis que durante todo o primeiro ano de existência do jornal Jonatas Spalding esteve presente em nossas colunas com preciosas colaboração, às vezes de admirável sentido literário. Jonatas Spalding, por seus estudos e por seus trabalhos, se fizera admirado nos grandes centros universais onde os modernos e humanizados métodos de pai feia adquirem, à cada hora, mais amplos caminhos ao seu aperfeiçoamento. E que o intelectual riograndense vivia preocupado em melhorar as práticas policiais em relação à criatura humana, tendo escrito e publicado em A CIDADE os "X mandamentos do Brigadiano" que se constituiram em autênticas lições de austeridade, de equihbrio e de humanização nas relações entre policiais-militares e as populações. Terminado o curso de humanidade no Colégio Nossa Senhora das Dores, Jonathas Spalding ingressou no curso de oficial da Brigada Militar completando sua formatura em 28 de julho de 1956.

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Foi o orador de sua turma. Durante sua curta atuação no mundo das letras, Jonatas Spalding deixou dois magnificos trabalhos especializados: "X Mandamentos do Brigadiano" e "Serviços de PoHcia Militar", que alcançaram merecida repercussão não apenas entre os profissionais do policiamento como entre a população apreciadora de bons trabalhos. Era membro da "Federation Internacional e des Fonctionnaires Supérieurs de Police" e possuia o "Curso de Delegado de PoIrcla Militar" pela "Militarv Police Officer Course", do Panamá. O tenente Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding, que integrava a Casa Militar do governador Leonel Brizola, era casado com a exma. sra. d. Noris Salerno Spalding, tendo deixado dois filhos, Rogério e Magda. Era filho do escritor e historiador riograndense Walter Spalding e de sua esposa a exma. sra. d. Aida Borges Fortes Spalding.

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Cel LOURIVAL

R. SOBRAL

I

HOMENAGEM A UM BRIGADIANO Falando em relações públicas, ocorreu-me falar sobre um rapaz extraordinário que passou por aquele serviço e que pela sua abnegação, capacidâde produtiva, amor à tropa e concentração ao trabalho, foi o brigadiano que mais produziu em menor espaço de tempo. Vftima de súbita moléstia, faleceu aos 27 anos de idade, quando se revelava um dos mais brilhantes oficiais da B. M. Suas produções oferecidas à Corporação, aparecem em destaque, nas publicações das revistas da França! Sua passagem pelo CFO (onde ingressou depois de servir por mais de um ano como soldado, por não se conter na espera da abertura de matrícula) deixou uma trilha de exemplos a seguir. Na Sociedade Acadêmica e Grêmio Literário, foi dos que mais realizou. A Exposição que a Brigada Militar fez no sanguão do Edifício Mallet, em 1959, teve na sua capacidade e espírito organizador, um impulso decisivo na sua apresentação. Estive, por mais de uma vez, na salinha do sub-solo do Q.G. em que ele, dois sargentos e um soldado, preparavam dfsticos ilustrados com fotografias e quadros com farta demografia brigadiana. A esse extraordinário oficial que se chamou Carlos Jonatas Borges Fortes Spalding e que para nós era o "Caloca", rendemos o nosso preito de saudades, neste relato! - Pois falar na história da Brigada, sem mencionar um dos expoentes máximos da nova geração, seria negar ~ valioso reflexo de virtudes que ele soube espargir e silenciar os inestimáveis serviços prestados por esses jovens da Brigada de hoje! Seria olvidar um jovem que madrugou nas qualidades brigadianas! Combalido, convalecendo de grave intervenção cirúrgica, onde ficara sem um rim, apresentava-se ao seu chefe, dizendo78


se apto para o serviço! E meses após, já no leito de morte, onde fui visitá-I o, produzia para a Brigada! Para concretizar minhas afirmações, vou citar o livrete que mereceu correr dois mundos para ser transcrito na revista de maior tiragem da França! Foi a obra que o consagrou: "OS DEZ MANDAMENTOS PARA O BRIGADIANO": I - Fazer prevalecer a prevenção sobre a repressão. II - Empregar sempre o bom-senso. III - Estar permanentemente a serviço da sociedade. IV - Ser um servidor público no mais amplo sentido da palavra. V - Ser cortês e delicado até com os delinqüentes. VI - Ser exemplo para jovens e adultos. V II - Aprimorar seus conhecimentos técnico-profissionais. VIII - Guardar zeloso tesouro das tradições brigadianas. IX - Jamais macular a farda da Brigada Militar. X - Ser fiel a si mesmo, ao serviço, à Pátria e a Deus . . . . Ser conscientemente fiel à causa que abraçou é uma obrigação moral que o brigadiano deve ter para consigo mesmo. No mundo conturbado em que vivemos, os subornos, as tentações e os caminhos que levam ao mal a todo momento surgem ante o brigadiano. Quase que são precisos esforços extra-humanos para afastálos. Estes esforços o brigadiano tem de fazer para ser fiel a si mesmo, como homem bem formado, honesto e exemplo de virtudes que é a sociedade. Ser fiel a si mesmo é ser fiel ao serviço, que necessita do brigadiano; é ser fiel à Pátria, que necessita do serviço; é ser fiel a Deus, que quer paz entre os homens de boa vontade".

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OUTRAS OBRAS DA

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COUÇÁO

150anos BRIGADA MIUTAR u

ESBOÇO HISTORICO DA BRIGADA MILITAR DO RIO GRANDE DO SUL - Volume III - Aldo Ladeira 'Ubeiro CAUSOS DO GAÚCHO FARDADO II - Gelson Vinadé - Valnei Tavares- Ubirajara Anchieta - José Cassales CHARLA POLICIAL - Crônicas - Carlos Joanathas Spalding II ANTOLOGIA tamozo

DE POETAS BRIGADIANOS

-José Hilário .fie-

BRIGADA MILITAR DO RIO GRANDE DO SUL - Um monumento de tradições - A Ido Ladeira Ribeiro SIM OU NÃO - Romance - Jehu Thlbaro Marques da Silveira MARCA DE CASCO - Conto Infanto Juvenil - Aldira Correa Retamozo O ABA- LARGA - Revista em Quadrinhos - Oritz Morari Abiz e Antonio Telvio Oliveira SEIS COMBATES E UMA INVASÃO - Hélio Moro Mariante Fernando O. M. O'Donnel - Antonio Augusto Fagundes Coralio B. Cabeda - Orestes Carneiro da Fontoura - Audixford A 1meida Coronel - Apparlcio Silva Rillo (Coordenação: José Hilário Retsmozo). SAR ILHOS MILlCIANOS

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DE PRONTIDÃO - Causos brigadianos - Hélio Moro Mariante MEMORIAS DE 93 - Diário do Cel PILLAR - Hélio Moro Mariante


MEMOR IAS DO PITOR ESCO - Crônicas - Antonio Silveira da

Silva NOTfCIAS HISTORICAS' O PATRULHEIRO A HUMANIZAÇAO

Fonseca Filho

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