Historia da Construção em Portugal

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João mascarenhas-mateus (ed.)

história da construção em portugal

A presente obra reúne um conjunto de estudos, assinados por autores de referência de diferentes universidades portuguesas, que pelo seu conteúdo se propõem como modelos para o estudo da História da Construção em Portugal. Um conjunto de textos organizados cronologicamente, cimentados e consolidados por investigações focadas nas problemáticas relacionadas com as formas de construir em Portugal ao longo da História. Desde a I Conferência sobre a História da Construção em Portugal – Alinhamentos e Fundações realizada em 2010, que uma série de iniciativas tem vindo a consolidar o debate sobre as especificidades portuguesas deste campo de conhecimento, entre as quais a organização dos dois congressos luso-brasileiros (2013 e 2016) e a criação da Sociedade Portuguesa de Estudos de História da Construção em 2015.

João mascarenhas-mateus

história da construção em portugal

Investigador Principal FCT na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa. Presidente da Direcção da SPEHC – Sociedade Portuguesa de Estudos de História da Construção. Organizador da I e II Conferências sobre a História da Construção em Portugal (2010 e 2015). Autor de vários trabalhos dedicados ao aprofundamento de métodos e de fontes para o estudo deste campo de conhecimento em Portugal e no Brasil.

consolidação de uma disciplina João mascarenhas-mateus (ed.)

Capa: *Montagem das armaduras de cimento armado da Agência da Caixa Geral dos Depósitos em Setúbal, construída pela Sociedade de Engenharia ERG” in Indústria Portuguesa, n.º 4, Junho 1928, p.3.

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União eUropeia Fundo Social europeu

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história da construção em portugal consolidação de uma disciplina

© edição João Mascarenhas-Mateus (ed.)

© autores João Mascarenhas-Mateus Arnaldo Sousa Melo Maria do Carmo Ribeiro Soraya Genin Helder Carita Sandra M. G. Pinto Teresa Cunha Ferreira Rui Fernandes Póvoas Clara Pimenta do Vale Vítor Cóias

design e maQuetagem José Dias Design, Lda.

produção editorial Forma, design

impressão Gráfica Diário do Minho 1.ª Edição, 2018

isBn 978-989-8614-66-7

depósito legal 440714/18

A presente obra é financiada pelo Programa Investigador FCT (IF/00792/2014/CP1259/CT0001), pelo Fundo Social Europeu e pelo Programa Operacional Potencial Humano.

Biblioteca Nacional de Portugal – Catalogação na Publicação A HISTÓRIA DACONSTRUÇÃO EM PORTUGAL, 2, Lisboa, 2018 A história da Construção em Portugal: consolidação de uma disciplina; ed. João Mascarenhas-Mateus ISBN 978-989-8614-66-7 I - MASCARENHAS-MATEUS, João (ed.) Nota do Editor: A adesão do acordo ortográfico ficou ao critério de cada Autor, assim como as normas de citação e bibliográficas.

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índice 7

introdução João Mascarenhas-Mateus

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a história da construção em portugal ENTRE O SINGULAR E O UNIVERSAL João Mascarenhas-Mateus

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o estudo da construção na idade média em portugal mETOdOLOGIAS E pERSpETIVAS dE INVESTIGAçãO Arnaldo Sousa Melo Maria do Carmo Ribeiro

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as aBóBadas da igreJa do mosteiro de Vilar de Frades ANÁLISE HISTÓRICA E ARQUITETÓNICA Soraya M. Genin

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empreitada, regimento e contrato de oBras, nas estratégias de actuação da proVedoria das oBras reais (SÉCULOS XVI-XVII) Helder Carita

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as AdvertênciAs de Valério martins de oliVeira ou o manual dos mestres pedreiros e carpinteiros portugueses do período moderno Sandra M. G. Pinto

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Font’alVa (1894-1911) um estaleiro na transição do século XiX para o XX CONTRIbUTOS dE ALfREdO dE ANdRAdE pARA A HISTÓRIA dA CONSTRUçãO, ENTRE ITÁLIA E pORTUGAL Teresa Cunha Ferreira

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o papel dos arQuitectos na introdução do Betão em portugal ALGUNS EXEmpLOS pARAdIGmÁTICOS Rui Fernandes Póvoas

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as instalaçÕes técnicas e as redes prediais no início do século XX UmA CARACTERIZAçãO A pARTIR dOS mANUAIS dA ‘bIbLIOTECA dE INSTRUçãO pROfISSIONAL’ Clara Pimenta do Vale

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aspetos históricos do proFissionalismo na construção ciVil (SÉCULOS XIX E XX) Vítor Cóias

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NOTAS bIOGRÁfICAS

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introdução João Mascarenhas-Mateus

Primeiro executam-se os alinhamentos, depois abrem-se os caboucos, passa-se, de seguida, às fundações e, fiada a fiada, assentam-se então os blocos para erigir as paredes do edifício… Tal como fazer crescer uma edificação no meio da paisagem, criar condições para o debate de um novo campo do conhecimento é um processo que exige saber, materialidade, técnica e organização. A discussão e implementação da História da Construção em Portugal tem seguido esse percurso próprio da arte de bem construir: compreender o terreno, os materiais, as técnicas e os homens, a sua história e cultura, combinando as suas melhores qualidades para criar uma construção sólida capaz de permanecer e de se adaptar à “paisagem cultural e académica” onde se insere. Desde a Primeira Conferência sobre a História da Construção em Portugal, organizada em Lisboa em Fevereiro de 2010, seguida da Conferência organizada em Braga nesse mesmo ano, muito caminho foi percorrido, ou por outras palavras, muito se adiantou na edificação do debate desta disciplina no contexto português. Este avanço deu-se não só com a discussão de temas portugueses como também com o aprofundamento da análise das relações históricoconstrutivas de Portugal com o Mundo, em particular com o Brasil, procurando sempre integrar estas duas componentes no que hoje é o estudo da História da Construção a nível internacional. Neste quadro, realizaram-se os dois primeiros Congressos Internacionais de História da Construção Luso-Brasileira em Vitória do Espírito Santo (2013) e no Porto (2016). Constitui-se igualmente em 2015, a SPEHC – Sociedade Portuguesa de Estudos de História da Construção, à semelhança das congéneres britânica, norte-americana, espanhola, francesa e alemã.

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No que se refere às especificidades portuguesas do estudo da Historia da Construção a Primeira Conferência de Fevereiro de 2010 – que propositadamente tinha tido como subtítulo “Alinhamentos e Fundações” e se destinou a servir como uma pedra basilar para a disciplina em Portugal - foi seguida, em 2015, por uma Segunda Conferência. Esta decorreu mais uma vez no Centro de Informação Urbana de Lisboa, e foi organizada com a Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, já com o apoio da SPEHC. Esta Segunda Conferência, que decorreu no dia 6 de Novembro de 2015, adoptou o subtítulo “Consolidação de uma Disciplina”, tendo em conta o percurso seguro e consensual efectuado entre 2010 e 2015, no debate proporcionado pelas reuniões científicas referidas anteriormente. Por essa razão, o evento contou com uma série de comunicações feitas por convite a especialistas portugueses e dedicadas a diferentes temáticas e períodos históricos considerados incontornáveis para o estudo da disciplina em Portugal. A presente obra pretende reunir uma parte considerável das comunicações da Segunda Conferência, organizadas de forma cronológica e com um texto adicional da Investigadora Sandra Pinto do CHAM – Universidade Nova de Lisboa. Depois de um primeiro texto de João Mascarenhas-Mateus dedicado a uma panorâmica da bibliografia disponível sobre os principais capítulos da História da Construção em Portugal, segue-se o estudo de Arnaldo de Sousa e Melo e Maria do Carmo Ribeiro dedicado aos aspectos metodológicos a adoptar na investigação dos processos construtivos usados em Portugal, durante o período da Idade Média. Sempre centrado neste longo período histórico definidor da cultura portuguesa, o ensaio de Soraya Genin conduz o leitor à interpretação da relação íntima entre desenho e construção das abóbadas de um exemplar paradigmático deste tipo de construções em Portugal, através da combinação de técnicas de reprodução geométrica computorizada com uma análise histórica da tratadística. De seguida, o texto de Helder Carita revisita a importância da legislação e da gestão das obras reais na conformação de uma maneira “própria” de construir em Portugal e nos domínios da Expansão, que deixou marcas profundas na cultura construtiva de contribuição portuguesa. Com o pretexto da legislação, Sandra Pinto apresenta a vida e a obra de um dos primeiros autores portugueses de uma obra impressa dedicada a problemas particulares dos processos construtivos portugueses, no período em torno ao grande terramoto de 1755. Segue-o século xix, através das realizações de um arquitecto-historiador da construção apenas recentemente descoberto por Teresa Ferreira, servindo de pretexto à compreensão das teorias construtivas da modernidade e da aplicação do aço e do betão armado num país como o nosso, extremado entre tradição e inovação. Como contributo para o estudo da introdução da cultura do betão armado em Portugal, o texto de Rui Póvoas explica as inspirações estéticas e tecnológicas de um grupo de arquitectos, entre os primeiros a usar plenamente o novo processo construtivo. A introdução das instalações técnicas da modernidade e das redes de equipamentos na prática corrente da construção é analisada por Clara Pimenta do Vale através da leitura dos Manuais de Instrução Profissional que constituem uma referência da literatura técnica da primeira metade do século xx. O último capítulo de Vítor Cóias e Silva aborda outra secção menos conhecida da História da Construção em Portugal muitas vezes demasiado centrada no papel dos arquitectos e dos engenheiros: a contribuição dos mestres-de-obras, das empresas constructoras e dos operários da construção civil, nos dois últimos séculos.

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9 Tal como uma construção que se consolida pela adição de fiadas de blocos assentes e dispostos sabia e solidamente, assim também este livro colectivo pretende ser “aparelhado” por critérios e metodologias próprias de um campo de conhecimento que se tem vindo a consolidar com o tempo. Pretende, portanto, constituir um exemplo dos muitos estudos que estão em curso e que será necessário realizar ainda para melhor compreender a história da(s) nossa(s) cultura(s) construtiva(s). Porque compreender a história da nossa cultura passa por estudar a maneira como a sociedade portuguesa se organizou para construir num determinado local e num dado momento histórico, mas também estudar com que conhecimento, com que materiais, técnicas e maquinaria, e ainda em que quadro legislativo particular e em que condições económicas e sociais. Não esquecendo o que fomos e o que somos podemos imaginar o que seremos; como construímos e como estamos construindo podemos projectar como construiremos.

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a história da construção em portugal ENTRE O SINGULAR E O UNIVERSAL João Mascarenhas-Mateus CIAUD - Faculdade de Arquitectura, Universidade de Lisboa

introdução Fazer o ponto de situação sobre o estado da História da Construção em Portugal implica começar por identificar os primeiros estudos e iniciativas que se podem considerar integrados no conceito de disciplina independente, prefigurada pelo posicionamento dos estudos recentes, sobretudo a partir dos anos 1980-1990 e do primeiro congresso internacional de Madrid, em 2003. Considerando igualmente que se trata da primeira vez em que uma avaliação é feita sobre a situação portuguesa, esses estudos não bastariam para definir os contornos do que são as especificidades do estudo da disciplina em Portugal. Importa pois, elencar igualmente os capítulos ou os ramos principais em que a disciplina deve ser estudada, tendo em consideração o percurso histórico singular do país, os seus materiais, os momentos de inovação e de hibridação cultural, de consolidação e de transformação social e económica. O texto que se apresenta é por esta razão dividido em duas partes principais. Uma primeira, dedicada à situação actual da disciplina em termos organizativos e uma segunda parte em que se apresentam os temas de estudo que a História da Construção pode e deve tratar no caso de Portugal, as fontes históricas para o seu estudo e as últimas pesquisas que têm vindo a ser desenvolvidas em cada um desses temas.

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alinhamentos e FundaçÕes Apesar da apresentação de comunicações de investigadores portugueses em todos os congressos internacionais de História da Construção, desde o primeiro congresso de Madrid de 2003, a discussão da História da Construção como disciplina independente foi iniciada em Portugal há relativamente pouco tempo. As primeiras teses de doutoramento destinadas a analisar a evolução do modus faciendi de actividades relacionadas com a actividade da Construção através de uma abordagem integrada das tecnologias, da ciência das construções, da organização social e económica dos processos construtivos, da transmissão do conhecimento e da sua relação com a cultura em sentido lato, datam do início do nosso século. Trataram-se de teses pioneiras apresentadas no campo da História das Ciências e da História das Instituições (Matos 1994), da Conservação Arquitectónica (Costa 1999) e da Engenharia Civil (Mascarenhas-Mateus 2001). Relativamente ao ensino, uma primeira unidade curricular “Arquitectura e História da Construção” (resp. Madalena Cunha Matos) esteve activa no Mestrado em Construção do Instituto Superior Técnico de Lisboa entre 2001 e 2004. O seminário “Arte e Ciência na Construção de Patrimónios Comuns” no Programa de Doutoramento em Patrimónios de Influência da Universidade de Coimbra, foi organizado pelo autor nos cursos 2010-2012 e 2012 e 2014 e a disciplina “História da Construção: Fontes e Métodos” foi ofertado no Curso de Estudos Avançados em Património Arquitectónico da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, ambos organizados pelo autor. A disciplina de História da Construção como optativa do Curso de Doutoramento em Arquitectura da Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa foi criada em 2010 por Madalena Cunha Matos e continua activa desde 2015 com co-organização do autor, na mesma faculdade da Universidade de Lisboa. O primeiro encontro científico intitulado “Primeira Conferência sobre a História da Construção em Portugal – Alinhamentos e Fundações” teve lugar a 19 de Fevereiro de 2010, no auditório do Centro de Informação Urbana de Lisboa. A proposta da sua realização e a coordenação dos conteúdos foi também efectuada pelo autor, no âmbito das actividades de pesquisa do Núcleo de Cidades, Culturas e Arquitetura do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. O evento incluiu uma comunicação inaugural pelo Prof. Santiago Huerta da Universidade Politécnica de Madrid e foi seguida de dez comunicações feitas por académicos portugueses convidados das áreas da História Económica e Social e das Histórias da Engenharia e da Arquitetura. O espectro das matérias abordadas pretendeu constituir simplesmente o pretexto para uma primeira discussão de algumas especificidades da Construção em Portugal ao longo da História. Deste evento fundador resultou um livro com o mesmo título que procurou apresentar-se como um texto de referência demonstrativo da postura investigativa própria da nova disciplina (Mascarenhas-Mateus 2011). Depois dos primeiros dois capítulos dedicados aos aspectos mais gerais da História da Construção e ao delinear cronológico e temático dos principais capítulos a estudar pela disciplina em Portugal, seguiram-se seis estudos de caso. Organizados de forma cronológica, ofereceram uma primeira visão do tipo de análise que se pretendia implementar. Ao estudo do estaleiro tardo-medieval do Mosteiro da Batalha no dealbar da expansão portuguesa, seguiu-se uma rápida análise dos aspectos

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complexos e inovadores da reconstrução pombalina anti-sísmica de Lisboa depois de 1755 e à análise da obra do Palácio Real da Ajuda de Lisboa no período neoclássico. Revisitados estes exemplos da era pré-industrial, com o capítulo sobre a criação da rede de caminhos-de-ferro em Portugal seguiu-se a abordagem de outro factor determinante para a transformação radical das formas de construção tradicional – a introdução do cimento Portland e o registo das primeiras patentes de betão. Por último, já bem mais próximo da nossa época, a apresentação do percurso singular do engenheiro Edgar Cardoso chamou a atenção para a importância da criatividade do cálculo estrutural da construção globalizada. Em Dezembro de 2010, foi organizado também o I Colóquio Internacional História da Construção pelo Centro de Investigação Transdisciplinar Cultura, Espaço e Memória e pelo Departamento de História da Universidade do Minho, sob coordenação de Arnaldo Sousa Melo e de Maria do Carmo Ribeiro. Dedicado ao tema dos Construtores, teve a colaboração de Robert Carvais da École Nationale Supérieur d’Architecture de Paris, de Valérie Theis da Universidade Paris-Est Marne La Vallée e de Philipe Bernardi do Laboratoire de Médiévistique Occidentale de Paris, resultando num livro reunindo 11 comunicações centradas na Idade Média (Melo and Ribeiro 2011). A primeira conferência de Lisboa em Fevereiro de 2010 teve como consequência directa a formação do grupo de pesquisa denominado “História da Construção Luso-Brasileira” que se formou a partir de um projeto aprovado pelo Programa de Apoio a Núcleos de Excelência – Pronex, promovido pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Brasil. Foi iniciado em Janeiro de 2011 e nela participaram a Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), o CES - Universidade de Coimbra, a Universidade Federal Fluminense, a Universidade Federal do Rio de Janeiro e a Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa. Neste âmbito foi organizado nos dias 24 e 25 de Outubro de 2011 o “Seminário da História da Construção Luso-Brasileira” no campus da UFES, que resultou na publicação do livro “Subsídios para uma História da Construção Luso-Brasileira” (Ribeiro 2013a). Em 24 de Outubro 2012 foi organizado um workshop intitulado “História da Construção, Contributos para a Conservação” por José Aguiar Portela da Costa, no âmbito do 2.º Encontro Internacional sobre o Património de Origem Portuguesa na Universidade de Coimbra, dando a conhecer as intenções do projecto de investigação luso-brasileiro. Este mesmo grupo de investigação organizou de 4 a 6 de Setembro de 2013, o Primeiro Congresso Internacional de História da Construção Luso-Brasileira, também na UFES (Ribeiro 2013b). A primeira grande reunião internacional em língua portuguesa sobre História da Construção que contou com 116 comunicações e quase 300 participantes. Em 2011, 2012 e 2013 seguiram-se os ii, iii e iv Colóquios Internacionais de História da Construção organizados pela Universidade do Minho dedicados, sucessivamente aos temas dos “Materiais”, “Arquitetura e Técnicas Construtivas” e “Perspectivas Atuais” dos quais resultaram até à data dois livros com as comunicações apresentadas em 2011 e 2012 (Melo and Ribeiro 2012, Melo and Ribeiro 2013). Estes colóquios, centrados sobretudo em temas da Antiguidade e da Idade Média têm reunido investigadores franceses, italianos e espanhóis. Em 2015, procedeu-se à constituição da Sociedade Portuguesa de Estudos de História da Construção (SPEHC) que tem a sua sede no Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa. O II Congresso de História da Construção Luso-Brasileira que se pretendeu aberto aos territórios onde existe património de influência portuguesa decorreu em 2016

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na Universidade do Porto. A organização do primeiro congresso português da História da Construção que constituiu um repto lançado na Primeira Conferência de Fevereiro de 2010, procura todavia condições para a sua concretização.

períodos, Fontes e estudos da história da construção em portugal O território que hoje se chama Portugal foi desde o início testemunha e objecto da actividade da Construção. Os menires, os dolmens, as antas, os castros proto-históricos, as casas com cobertura de colmo, com telhados de xisto, as de blocos de granito, as casas-palhoças de feno seco ou as de giesta constituem exemplos primordiais da Construção em Portugal. Para o conhecimento destes períodos são particularmente úteis os estudos realizados entre o final do século xix e os anos 1970, os primeiros de teor etnográfico e os últimos integrados já nas disciplinas da Antropologia e da Geografia Humana. Obras como as de José Leite de Vasconcelos (1933-1942), Orlando Ribeiro (1961) ou Ernesto Veiga de Oliveira (1969) constituem fontes preciosas de detalhes para entender as culturas construtivas mais arcaicas do território português. Sobre a sua utilização para a História da Construção foi realizado um estudo recente (Mascarenhas-Mateus 2012). Levantamentos de detalhes construtivos característicos de determinadas regiões do país têm sido desenvolvidos de forma sistemática (Teixeira and Belém 1998) (Ribeiro 2008). De referir igualmente as inúmeras publicações sobre as técnicas da arquitectura vernacular de terra, em particular a taipa e o adobe, de que se salientam as dos investigadores portugueses pertencentes à rede CRAterre – Centre International de la Construction en Terre de Grenoble (Fernandes and Correia 2005) (Fernandes and Lopes 2011). Com a romanização, o território da zona da Hispania que hoje é Portugal, sofreu um incremento construtivo considerável com uma rede de estradas e de pontes de que ainda restam testemunhos. Novas urbes com os seus fora, teatros, arenas, edifícios administrativos e, extramuros, vilas agrícolas e fábricas de salga, passaram a ser abastecidas por aquedutos e barragens. Um período em que a cultura construtiva portuguesa foi integrada definitivamente num contexto “global”. O levantamento e a descrição de pormenores de construções desta época, como a ponte de Sacavém hoje desaparecida, interessaram os primeiros humanistas portugueses como Francisco de Holanda na sua obra “Da fábrica que falece à cidade de Lisboa”, publicada em Lisboa em 1571. Os desenhos das ruínas do teatro romano de Lisboa por Francesco Saverio Fabri em 1797 marcaram outro momento do estudo das construções romanas em Portugal que tiveram a sua continuidade nos artigos publicados entre 1877 e 1909 no Boletim da Real Associação dos Arquitectos Civis e Arqueólogos Portugueses fundado em 1863. Estudos de arqueologia iniciados a partir de 1980 como os de Jorge Alarcão, para a ponte romana sobre o Mondego (2012), ou os de Virgílio Correia (2010), sobre os materiais e processos construtivos de Conímbriga, contribuíram significativamente para a História da Construção

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deste período. De referir ainda outros trabalhos dedicados aos materiais, tecnologias e organização do trabalho como a tese de doutoramento de Jorge Ribeiro (2010) no âmbito dos trabalhos de Manuela Martins da Universidade do Minho. O conhecimento construtivo romano foi particularmente enriquecido com a tradição meridional mediterrânica no momento da ocupação muçulmana. Sobretudo no Sul, a taipa, a taipa militar, a taipa de rodízio, a de fasquio ou as açoteias sobre abobadilhas marcaram profundamente as construções defensivas e os tecidos urbanos. Sobre este capítulo da História da Construção em Portugal é de salientar a obra percursora de Pedro Dias sobre a arquitectura mudéjar (1994) e as publicações e teses produzidas no contexto do Campo Arqueológico de Mértola (Torres 2010). Com a Reconquista, as grandes encomendas passam a ser as da Coroa, da nobreza e das ordens religiosas e militares. Portugal constrói castelos, cidades, novas pontes, aquedutos, mosteiros e conventos, à imagem do resto da Europa cristã e católica. Aprende-se a construir as abóbadas de pedra, nervuradas de ogiva, de cruzaria, artesoadas, com liernes e terciarões, as janelas de traceria. Cuida-se da estereotomia de cúpulas e de abóbadas em leque em igrejas-salão. Constroem-se cais de embarque, faróis, engenhos, moinhos de maré e de vento. Uma actividade intensa baseada numa rede sustentável de pedreiras e barreiros que serviam os fornos de cal, de telha e de tijolo. A estes materiais juntam-se a madeira de qualidades autóctones, as pregaduras metálicas e outros de reutilização. A maior parte de todas estas matérias-primas era distribuída pelo país através do transporte marítimo de cabotagem ao longo do litoral, em associação com o intercâmbio de produtos agrícolas. Uma situação que se prolongou até ao início do século xx. As primeiras publicações sobre construções medievais em Portugal foram publicadas no Boletim da Real Associação dos Architectos Civis e Archeologos Portuguezes, em particular, na série denominada “Resumo Elementar de Archeologia Christã” editada entre 1886 e 1890 e nos artigos dedicados à “Architectura Ogival” (1882 e 1887) e à “Architectura na Edade Média” (1890). Nestes textos são pela primeira vez analisadas em português, as funções dos diversos elementos estruturais dos sistemas góticos. Relativamente à organização jurídica e social de todas as actividades económicas, incluídas as da construção, a obra de Henrique da Gama Barros, “História da Administração em Portugal nos séculos xii a xv”, constitui uma referência de investigação incontornável. Nas últimas décadas, este período tem sido estudado de diversas perspectivas. O manuscrito denominado “Livro das Fortalezas” elaborado entre 1509 e 1510 por Duarte de Armas para o Rei D. Manuel I com as panorâmicas de 56 praças fortes fronteiriças de Norte a Sul do país, juntamente com muitos outros documentos coevos, tem servido de fonte para estudos sobre as construções civis e militares (Conde 2011), em temas tão variados como a origem e processamento de materiais (Nunes 1988) ou as unidades de medida usadas na construção (Barroca 1992, 2003). Para além das inovações construtivas na defesa das praças militares, vem sendo desenvolvida investigação sobre a história da construção de complexos monásticos emblemáticos. O estudo dos princípios orientadores das construções cistercienses (Real 1998) ou a análise da organização do estaleiro do Mosteiro da Batalha constituem um bom exemplo (Gomes 2010). A estereotomia das abóbadas góticas artesoadas tem sido estudada por Soraya Genin (Genin, Jonge and Palacios 2009) e a hidráulica monástica por Virgolino Ferreira Jorge (Jorge 2012). Por fim, é de referir o grande esforço desenvolvido para compreender os regimes jurídicos que regiam a construção das cidades portuguesas neste período histórico (Carita 1999) (Pinto 2016).

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A Expansão trouxe consigo novos desafios construtivos. Depois da conquista de Ceuta em 1415, Portugal começa a exportar materiais e mão-de-obra para os castelos, feitorias e cidades que se edificam ao longo da costa africana aplicando o saber acumulado com a cabotagem “doméstica”. Destes “exploits” construtivos, são paradigmas iniciais as fortalezas de Mazagão (e as suas cisternas) e o Castelo da Mina, construídos em parte com cal e pedra portuguesa. Essa exportação de tecnologia construtiva estendeu-se mais tarde ao Brasil e à Ásia. Como exemplos mais tardios, de referir a rede de fortalezas do Brasil em função dos sucessivos tratados de demarcação territorial entre Portugal e Espanha. Empresas construtivas sistemáticas e monumentais aplicadas também no continente numa primeira fase, à luz dos conhecimentos mais avançados da “fortificação moderna” de tratadistas espanhóis e italianos, sob iniciativa filipina, nas cidades e na defesa da costa. Posteriormente, nas linhas de defesa da fronteira do interior, já no período de predomínio das teorias francesas de Vauban e de outros autores holandeses e alemães. É exactamente a variedade de culturas, materiais, técnicas e condições climáticas encontradas pelos portugueses nas regiões descobertas e colonizadas que constitui um dos capítulos mais interessantes da História da Construção em Portugal. As situações dignas de estudo são múltiplas e requerem a avaliação dos modos de construir exportados, importados e adaptados no território que actualmente é Portugal e nos territórios de influência portuguesa. A divulgação de espécies exóticas de madeiras na Europa, as primeiras representações de certas espécies de fauna e flora em elementos arquitectónicos, a suposta influência oriental das técnicas de construção de telhados de tesouro em Tavira ou – até mais recentemente, no final do século xix a importação de interpretações de construções victorianas de desinência revivalista ao gosto brasileiro, com os emigantes regressados a Portugal – são apenas alguns casos ilustrativos. Inversamente, poderia falar-se, por exemplo, da implantação no Brasil de muitas das técnicas construtivas hoje denominadas tradicionais: a taipa de mão, a azulejaria, a carpintaria de armar, a cantaria, etc. Para o estudo deste período há que referir que até ao final do século xx, a leitura dos antigos tratados e manuais de construção foi pontual e com objectivos muito diversos. Em Portugal, a obra de Vitrúvio terá sido traduzida pela primeira vez por Pedro Nunes entre 1537 e 1541, para ensino na Escola Particular de Moços Fidalgos do Paço da Ribeira, criada em 1562. No entanto, a primeira obra impressa sobre Vitrúvio no nosso país será uma reedição de “Medidas del Romano”, de Diego Sagredo, com três edições em Lisboa, por Luís Rodrigues, entre 1541 e 1542. As primeiras traduções para português a partir de Perrault (Rua 1998) ou do manuscrito em latim Harleianus (Maciel 2006) são muito recentes. O ensinamento escolástico propriamente dito da Arquitectura e das noções de Arte Militar esteve nessa época circunscrito à já mencionada Escola Particular de Moços Fidalgos e à Aula da Esfera do Colégio Jesuíta de Santo Antão, criada (c.1580) sob a regência de João Baptista Lavanha que foi indigitado em 1582 regente da recém-constituída Academia de Matemática e Arquitectura de Madrid. A partir de 1641, o ensino da Arquitectura Militar começou a ser ministrado na Aula de Artilharia e Esquadria da Ribeira das Naus que foi transformada em 1647 na Academia Militar de Lisboa, instalada no Paço da Ribeira. A criação da Academia Militar de Lisboa marcou o início de uma nova fase do ensino da Arquitectura Militar que se caracterizou pela publicação das primeiras obras especializadas em português e pela tradução de obras estrangeiras representativas dos sistemas de defesa

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mais avançados. Na verdade, o primeiro tratado impresso em português nesta área, o “Methodo Lusitanico de Desenhar as Fortificações das Praças Regulares e Irregulares” (Lisboa, 1680) destinava-se essencialmente às aulas da Academia e foi escrito pelo seu regente Luís Serrão Pimentel. Os sistemas franceses de Pagan e Vauban foram ensinados utilizando primeiro as obras na sua língua original e depois apresentados na tradução do livro de Antoine Deville, O “Governador de Praças” (Lisboa, 1708) e na obra do alemão Pfeffinger, “Fortificaçam moderna” de 1713. Seguiu-se a primeira obra escrita em português de Manuel de Azevedo Fortes, engenheiro-mor de D. João V, destinada ao ensino da Academia Militar e publicada em Lisboa entre 1728 e 1729. O seu título “O Engenheiro Português”, assemelha-se muito ao homónimo francês, “L’ingénieur français”, de Naudim, de 1695, e ao espanhol “El Ingeniero” de Fernandez de Medrano, de 1687. No campo da identificação da tratadística portuguesa devem referir-se os primeiros artigos de Rafael Moreira sobre os tratados com circulação em Portugal durante a época do Renascimento (Moreira 1981) e sobre o primeiro tratado português de Arquitectura (Moreira 1998), assim como estudos que reinvindicam o conhecimento dos descobrimentos para a ciência europeia (Polónia 2005). Levantamentos sistemáticos dos processos construtivos de fortificações e cidades nos territórios da expansão portuguesa, identificando as relações entre construtores, tratadística, regulamentação, materiais e tecnologias continuam hoje a ser desenvolvidos depois das obras pioneiras de Pedro Dias para o Norte de África (2000) e Brasil (2004) e de Rafael Moreira para o resto do Mundo (1989), da relação entre a tratadística portuguesa e a europeia (Mascarenhas-Mateus 2001) e da regulamentação de produção de materiais (Carita 2013) e do urbanismo (Pinto 2015). De salientar igualmente, a obra da investigadora brasileira Beatriz Siqueira Bueno (2011) que posiciona o conhecimento português em relação com a mais alta erudição europeia até à independência do Brasil. Uma obra que identifica de forma pioneira a “cultura de mão” baseada nas sebentas e nos resumos de lições das diversas academias de fortificação, que necessitam ainda grande trabalho de interpretação e explicam o reduzido número de traduções para português de obras estrangeiras da especialidade. A afirmação do poder absolutista implicou o empreendimento de complexos programas construtivos não só nas zonas da expansão como também em Portugal, que envolveram um elevado volume de materiais e de mão-de-obra. Na primeira metade do século xviii, é importante recordar os (estimados) 30.000 operários e 7.000 soldados ocupados em manter a ordem dos trabalhos da Igreja-Convento-Palácio de Mafra entre 1717 e 1730 (Pimentel 2002). Falando de dificuldade técnica de execução, refira-se o Arco Grande ogival do Aqueduto das Águas Livres (1731) em Lisboa com 65 metros de altura e 21metros de vão ou ainda os 75 metros da Torre dos Clérigos no Porto (1732). O terramoto de 1755, constituiu uma nova prova à capacidade técnica construtiva portuguesa. A reconstrução de Lisboa colocou-a como uma das primeiras cidades modernas do ocidente e em documentos construtivos pioneiros como o “Cartulário Pombalino” ou o “Tratado de Ruação” de José de Figueiredo de Seixas, ca.1760. Esta complexidade tecnológica incluiu a construção sistemática com um sistema antisísmico de entramado de madeira e alvenaria (gaiola), a normalização das dimensões de elementos estruturais e secundários prefabricados em larga escala, a definição da largura das ruas e a limitação da cércea dos edifícios tendo em atenção uma hipotética situação de colapso das fachadas, a perequação da propriedade, a utilização sistemática de paredes corta-fogo e um sistema racional de recolha e

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condução de esgotos. Para os detalhes construtivos deste sistema construtivo português são de mencionar as obras de Vitor Cóias e Silva (1997) e de Jorge Mascarenhas (2004). No que se refere ao complexo esquema jurídico da reconstrução salienta-se o texto de Cláudio Monteiro (2010). Durante o século xviii, o ensino da Academia Militar do Paço da Ribeira em Lisboa, foi complementado com as academias de fortificação em Elvas e Almeida, durante o reinado de João v. Em 1762 foram criadas no Porto as Aulas de Náutica, Debuxo e Desenho. Após a reforma introduzida pelo Marquês de Pombal foram iniciadas as aulas de Arquitectura e Desenho no Colégio dos Nobres. Em 1772, foi criada a Faculdade de Matemáticas da Universidade de Coimbra, e em 1790 a Academia das Ciências de Lisboa. Durante esse século, apesar da criação de todas estas novas instituições, foram no entanto poucas as monografias publicadas originalmente em português ou traduzidas para português no campo da Construção. No que se refere a tratados gerais, acresce a tradução para português do tratado clássico de Vignola, “Regras das Cinco Ordens de Architectura” (1787), certamente com fins didácticos, completado com a tradução de parte da obra do italiano Ferdinando Galli da Bibiena (Mascarenhas-Mateus 2001: 39). Ao longo do século xix, e apesar do lento processo de mecanização da produção, as melhorias dos fornos de cal e de tijolo contribuíram para o estabelecimento da produção industrial dos materiais primários. No campo dos materiais metálicos, iniciativas (de curta duração) como o alto forno da Iron & Coal Company de Pedernais, constituíram pontos de partida para as profundas alterações provocadas com a implementação dos caminhos-de ferro. Depois da fundação em 1845 da Companhia de Obras Públicas, as ferrovias empregaram residentes das zonas por onde eram construídas, fixaram novas comunidades ao longo das novas linhas, substituindo em muitos casos, o tradicional transporte viário e fluvial de pessoas e mercadorias e incrementando a exploração mineira e o escoamento de matérias-primas. Neste contexto destacou-se o complexo industrial da Pampilhosa do Botão. Situada na confluência das linhas Lisboa-Porto e Figueira da Foz-Vilar Formoso, tratava-se de uma zona rica em barreiros naturais e em exploração florestal apta a constituir um importante centro de produção de materiais de construção no período que mediou entre a fundação da filial da Companhia Cerâmica das Devesas do Porto em 1886 e a abertura da Fábrica de Produtos Químicos e Resinosos, em 1923. Com a ferrovia, as proezas técnicas sucederam-se nas pontes metálicas e de alvenaria. No que se refere ao estabelecimento da Ciência das Construções, a Geometria Descritiva teve estudiosos importantes entre os quais Souza Pinto, Castro Freire, Pina Vidal, Moreira d’Almeida, Motta Pegado e Schiappa Monteiro, embora nenhum deles se tenha dedicado especialmente às suas aplicações no campo da Estereotomia. Na segunda metade do século xix, a discussão das últimas teorias de cálculo estrutural era apresentada na Revista de Obras Públicas e Minas, na Revista de Engenharia Militar e nas publicações da Academia Real de Ciências de Lisboa. Este debate teórico foi feito desde cedo no campo da Estática, com a memória “Theoria da Composição das Forças” (1812), de Simões Margiochi e a “Memória sobre a Rotação das Forças em torno dos Pontos d’Aplicação” (1851), de Daniel da Silva. No que se refere ao cálculo de arcos e abóbadas, aplicado sobretudo à construção de pontes, foi publicado o “Guia do Engenheiro na Construção das Pontes de Pedra” (1844), seguido entre 1894 e 1896, dos artigos de Xavier Cordeiro e de João Severo Cunha na Revista de Obras e Públicas e Minas e na Revista de Engenharia Militar.

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Os engenheiros inicialmente estrangeiros foram substituídos gradualmente por portugueses formados nos recém-criados cursos superiores da Escola do Exército (1837) e da Academia Politécnica do Porto (1836-1911), enquadrados no Corpo de Engenheiros Civis e Auxiliares (1864-1868) do Ministério das Obras Públicas, Comércio e Indústria. No campo da construção civil, destacou-se na época a publicação “Noções Theoricas de Architectura Civil” de José da Costa Sequeira, editada em 1839 e reeditada em 1858, destinada à aula de Desenho de Arquitectura Civil da recém-criada Academia de Belas Artes de Lisboa. O mesmo se pode dizer do manual de Moisy e Thollet “Vignole des propriétaires” com três edições em português entre 1853 e 1886. No campo da Engenharia Militar, é de salientar o “Curso de Construção de Estradas” (1849) de José Coelho do Amaral, “Construção e Baterias” de Pedro Manuel Tavares (1884) e o “Curso Elementar de Construções”, de Luís Augusto Leitão (1896). Os novos materiais de produção industrial necessitavam de normalização e homologação. Para esse fim foi criada a Direcção dos Estudos e Ensaios de Materiais de Construção em Lisboa (1886-1898) durante a construção do porto de Lisboa (realizado com técnicas de excavação de ar comprimido), o Laboratório de Resistência dos Materiais da Universidade do Porto (1910) e mais tarde o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (1946). No que se refere à Ciência dos Materiais, destaca-se o pioneiro “Estudo Chimico e Technologico sobre a Ceramica Portugueza” (1899), de Charles Lepierre do Laboratório Químico da Escola Industrial. Os primeiros estudos sistemáticos sobre as cais hidráulicas e pozolanas nacionais são iniciados com os artigos de divulgação de J. F. d’Almeida publicados no Boletim da Real Associação dos Architectos Civis e Archeologos Portuguezes, entre 1875 e 1877. Seguiram-se-lhe os artigos de Afonso Nogueira Soares, Castanheira das Neves e Pereira de Sousa, publicados na Revista de Obras Públicas e Minas, entre 1885 e 1914, dedicados à qualidade das cais magnesianas do Cabo Mondego, às pozolanas dos Açores, aos cimentos nacionais, às primeiras unidades fabris e aos testes efectuados para as argamassas e betões do porto de Leixões. No que se refere a manuais, são de referir os “Manuais do Operário”, da Biblioteca de Instrução Profissional dirigida sucessivamente por Tomás Bordalo Pinheiro e por João Emílio dos Santos Segurado e destinada às escolas industriais e comerciais. Estes manuais foram editados a partir de 1903 e sucessivamente reeditados até aos anos 1950. O ciclo da edificação em ferro e vidro afirmou-se com a inauguração do Palácio de Cristal no Porto (1865). O ferro passou a ser usado em naves industriais, em túneis e estações ferroviárias como a do Rossio em Lisboa, em 1890. Seguiu-se a introdução do cimento Portland com as primeiras importações do estrangeiro a partir da década de 1860. A produção nacional arrancou verdadeiramente a partir de 1894, com a abertura dos fornos verticais da fábrica da Companhia do Cimento Tejo em Alhandra e da fábrica da Rasca, na zona de Setúbal. Sobre a importância dos engenheiros militares da Escola do Exército para a ciência das construções e as grandes obras públicas do período têm sido desenvolvidos estudos recentes (Macedo 2012). Obras preocupadas com a História da Indústria contribuem igualmente para compreender o desenvolvimento tecnológico da produção de materiais de construção (Mendes 1999), do aço (Matos, Santos and Diogo 2004) e do vidro (Custódio 1997, 2000). Relativamente ao ensino e formação dos construtores, uma série de estudos têm sido desenvolvidos na senda de obras gerais pioneiras como o “Dicionário Histórico e Documental dos Arquitectos, Engenheiros e Construtores Portugueses ao Serviço de Portugal” (1899-904)

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de Sousa Viterbo, a “História dos Estabelecimentos Científicos, Literários e Artísticos de Portugal nos sucessivos reinados da Monarquia” (1871-1914) de José Silvestre Ribeiro (1871-1914) ou “História do Ensino em Portugal” (1986) de Rómulo de Carvalho. Neste âmbito, estudou-se profundamente a articulação entre a formação dos engenheiros militares e a utilização de novos materiais industriais nas realizações do Ministério das Obras Públicas na segunda metade do século xix (Matos 1999) (Matos & Diogo 2007) (Matos 2013). Iniciou-se igualmente um levamento da rica documentação sobre a construção de estradas do Ministério das Obras Públicas (Andrade 2002). A história da construção dos caminhos de ferro em Portugal foi analisada do ponto de vista da história económica e social (Pinheiro 2011), restando muito a fazer sobre tecnologia e maquinaria nas diversas fases de realização das linhas. A construção da rede de portos portugueses a partir do final do século xix, foi igualmente analisada do ponto de vista económico e social (Dias and Alves 2004), faltando ainda verdadeiros estudos sobre os processos, tecnologias e organização do trabalho usados na sua execução. A investigação sobre a construção das primeiras pontes metálicas realizadas em Portugal, várias delas desenhadas por Gustavo Eiffel teve um início modelar com a obra de Manuel Azeredo (2002). Sobre a utilização do ferro em edifícios resta ainda muito a fazer depois do trabalho pioneiro no campo da História da Arquitetura de José Coelho dos Santos (1989), da Arqueologia Industrial de Alfredo Tinoco e Jorge Custódio (1997) e da História Económica e Social de Ana Cardoso de Matos (1999) e José Amado Mendes (2000). A primeira construção em betão armado portuguesa terá sido executada em 1896 com o sistema Hennebique, na reconstrução de uma fábrica de moagem no Caramujo. Em 1904, foram criadas as primeiras regulamentações da utilização do cimento Portland e o primeiro regulamento nacional, por decreto de 1918. O Estado Novo passa a construir com o novo sistema em grande escala os novos bairros de habitação colectiva, as primeiras barragens destinadas à produção de energia eléctrica (Póvoa, Ribeira de Nisa, 1928), pontes sobretudo no norte do país, os portos de Leixões, de Aveiro, de Lisboa e de Sines, os estaleiros navais da Margueira (1967) e da Mitrena (1973), a rede eléctrica nacional e a rede rodoviária nacional, para citar algumas realizações mais importantes. A partir de 1950, os elementos pré-fabricados, as tintas plásticas, o alumínio, o aço inoxidável, o vidro temperado e uma inúmera variedade de materiais plásticos invadiram o mercado da construção. Maceira Lis, Secil, Companhia Portuguesa de Fornos Eléctricos, Siderurgia Nacional, Sacor, Solvay, ou Covina foram algumas das empresas responsáveis pela consolidação destas transformações radicais. Grandes estruturas nervuradas em betão como o Pavilhão Rosa Mota do Porto, a grande ponte pênsil sobre o Tejo, pontes de tirantes de última geração, cascas em betão como o Pavilhão de Portugal no Parque Expo 1998 de Lisboa, tenso estruturas e grandes estruturas articuladas em aço como as realizadas para os estádios do Euro 2004, constituem realizações recentes que universidades e indústria colocam em prática. Soluções sempre mais arrojadas em projectos como os Aeroportos do Funchal e de Macau, a barragem do Alqueva, as novas pontes Vasco da Gama e da Lezíria sobre o Tejo, a ponte S. João sobre o Douro ou ainda Igreja da Santíssima Trindade de Fátima. Eis pois uma rápida (muito rápida) revisitação da actividade construtiva portuguesa. Para a compreensão deste último e mais recente capítulo da História da Construção em Portugal, contribuiu de forma crucial a realização da grande exposição “Engenho e Obra – Engenharia em Portugal no século xx”, entre Janeiro e Março 2003 (Brito, Heitor and

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Rollo 2002) que mais tarde deu origem a uma publicação com cerca de 140 textos sobre todos os aspectos da engenharia em Portugal nesse período. Esta visão ambiciosa de abordar e integrar tantas actividades tecnológicas, constitui uma referência incontornável para o estudo da recente História da Construção em Portugal. Outras obras publicadas anteriormente tinham abordado aspectos sectoriais da indústria da construção. Às primeiras obras gerais sobre a história do betão armado e pré-esforçado em Portugal (Ferreira 1989) (Viseu 1993) seguiram-se novas pesquisas como as relativas às primeiras realizações portuguesas com o sistema Henebique (Tavares 2011). Para o conhecimento das primeiras construções hidroeléctricas e barragens portuguesas devem ser mencionados vários estudos pioneiros como os de Ilidio Simões (1997) e Luís Madureira (2005) que necessitam investigação complementar sobre os materiais e as tecnologias usadas. O impulso dado pelo Plano Marshall à construção de barragens (Rollo 2007, 633-43) ou a história das associações de engenheiros (Rollo & Pires 2012) têm constituído profícuos temas de estudo. Devem citar-se também outros estudos sobre materiais e técnicas de revestimento particularmente associadas a Portugal: o emprego da cortiça na construção tradicional (Silva & Vale 2010), a calçada portuguesa (Henriques 2009) (Teixeira 2010) ou sobre materiais globalizados como o plástico (Callapez 2010). No que se refere ao estudo das culturas construtivas de cal, da arte e das regras de construir na sua relação com a literatura técnica são de referir as obras de Mascarenhas-Mateus (2001) e José Aguiar Portela da Costa (1999), esta última dedicada unicamente a revestimentos. Para o estudo da Ciência das Construções, estão disponíveis estudos de referência para o cálculo de sistemas de arcos e abóbadas (Mascarenhas-Mateus 2001), (Lourenço 2001) e (Gago 2004). Para as estruturas entramadas de madeira e alvenaria (gaiola) do período pombalino são múltiplos os estudos, sendo de destacar o projecto internacional “Seismic Vulnerability of Old Masonry Buildings” iniciado em 2008 e coordenado por Rita Bento do Instituto Superior Técnico de Lisboa em conjunto com as faculdades e escolas de engenharia das universidades do Porto, Minho e Aveiro (Lopes et al. 2014).

conclusÕes e perspectiVas A História da Construção em Portugal apresenta significativas especificidades, associadas aos contextos históricos de desenvolvimento cultural, tecnológico, científico, económico e social do país. Estas singularidades têm vindo a ser contextualizadas e relacionadas com a História da Construção do resto da Europa, entre inovação global e local, muitas vezes de forma indirecta por outras disciplinas. Actualmente existem activas equipas de investigação que procuram contribuir para a História da Construção em Portugal, através de investigação da História Contemporânea Económica e Social, da História das Ciências, da Conservação do Património e da Reabilitação Estrutural, da História da Arquitetura e História da Engenharia, da Arqueologia Industrial, em Lisboa, Évora, Coimbra, Porto, Minho, Aveiro e Açores. A Faculdade de Arquitetura

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da Universidade de Lisboa, o Instituto de História Contemporânea da Universidade Nova de Lisboa, o Centro de Investigação Cultura Espaço e Memória da Universidade do Minho, o Instituto Superior Técnico e a Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto constituem, à data, os polos principais desta pesquisa integrada. Muitos dos temas tratados esperam por verdadeiros projectos de investigação capazes de estudar os ricos espólios arquivísticos de bibliotecas e instituições administrativas públicas e privadas espalhadas pelo país e no estrangeiro. Relativamente à História da Construção em territórios que tiveram influência portuguesa, as primeiras pontes sólidas foram já lançadas com o Brasil, havendo no entanto muito a fazer ainda no estudo da História da Construção comum de Portugal e de países africanos e asiáticos. Um repto lançado no Congresso Luso-brasileiro de 2016 e a desenvolver no próximo congresso de 2019, no Brasil. Desde a “cultura de mão” das academias de fortificação, à documentação administrativa das antigas colónias, passando pelos arquivos dos Ministérios das Obras Públicas, Indústria e Economia, dos antigos Ministérios da Marinha, Colónias e Ultramar, um longo caminho de investigação se abre ao futuro. Nos campos da modelação matemática de estruturas, da análise de modelos estereotómicos ou, por exemplo, no dos modelos de barragens do Laboratório Nacional de Engenharia Civil. Outros temas específicos como a relação da construção naval com as edificações ou as biografias integradas dos muitos construtores portugueses, esperam também ser analisados. Falta igualmente aprofundar a história de materiais tradicionais portugueses e outros de concepção recente, como por exemplo o linóleo, o papel de parede ou as tintas plásticas. Os ciclos de conferências organizados pela SPEHC e grandes exposições como as já realizadas sobre a Engenharia em Portugal no século xx ou outras mais pequenas como a recente mostra na Biblioteca Nacional dedicada a Luís Serrão Pimentel (Fevereiro 2014), constituem iniciativas modelares a seguir. A História da Construção em Portugal possui fundações consideráveis sobre as quais importa eregir um corpo de conhecimento e de ensino sólido e durável.

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