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bicicleta e mobilidade urbana em s達o paulo caderno 2 cidade para os carros


trabalho final de graduação FAU USP junho 2012 Camille Laurent orientador Prof. Alexandre Delijaicov


bicicleta e mobilidade urbana em s達o paulo caderno 2 cidade para os carros


São Paulo é uma cidade com muita influência sobre o mundo e a América Latina, mas não consegue influenciar seus próprios espaços públicos. Basta andar nas ruas para perceber a falta de preocupação do poder público. As calçadas são o exemplo mais chocante da falta de consideração com os cidadãos: responsabilidade do proprietário, sem um padrão a ser seguido, na maioria das vezes não oferecem passagem confortável para o pedestre. Não é raro ter que ir até a rua para contornar um obstáculo e continuar a andar, não são feitas e pensadas para acolher pedestres idosos, cadeirantes ou com alguma dificuldade. Esse descaso com o espaço tem influência sobre todo o restante da cidade; sem políticas públicas, sem responsabilização da cidade nesse aspecto, a consequência é a falta de preocupação com os espaços comuns. Em São Paulo, há poucos espaços de convívio público como praças, parques, praça verde, calçadas largas e agradáveis de estar. Sem dar a devida atenção e importância aos espaços comuns, a cidade se torna mais insegura. Ao não se preocupar com seus espaços públicos, o governo paulistano negligencia também toda a infraestrutura da cidade. É o caso do transporte público, que é privatizado, sem relação e sem controle do governo. Mesmo existindo uma Secretaria dos Transportes, a cidade não tem um transporte coletivo de qualidade. Em pesquisa realizada pelo instituto Toledo e Associados, sob a coordenação da Associação Nacional de Transporte (ANTP), publicada no dia 31 de janeiro 2012, é notado que 41% dos usuários acham o transporte coletivo ruim, reclamando da falta de infraestrutura, da superlotação diária e do preço abusivo da passagem. Existem


hoje poucas faixas de ônibus e poucas linhas de metrô e trem eficientes. Quanto às reformas feitas na cidade, essas mostram ainda mais a desconsideração da importância de um transporte de massa eficiente e de um transporte alternativo que pode ser feito com bicicleta. Nós podemos notar, ao olhar exemplos como a marginal Tietê, a Av. Faria Lima ou a Av. Eliseu Almeida, a falta de vontade do poder público de mudar a cidade. A reforma da marginal Tietê foi feita para melhorar o trânsito, mas não foram pensadas alternativas ao uso do carro. A reforma foi simplesmente ampliar e colocar mais de 22 km de vias, sem criar mais ligações com o trem e mais vias para o transporte coletivo. Não foi pensada, também, a possibilidade de complementar essa reforma com a criação de ciclofaixa ao longo toda a marginal e não apenas em alguns trechos. A reforma da Av. Faria Lima é um exemplo de desconsideração do poder público com a bicicleta. Em 1996, era prevista a construção de uma ciclovia no canteiro central. Em 2005, a ciclovia foi feita, mas nunca foi respeitada. O trajeto é cortado por bancos públicos, pontos de ônibus e alguns retornos da avenida, deixando a maioria do percurso impraticável.



SVMA Secretaria do Verde e Meio ambiente


São muitos os exemplos desse tipo em São Paulo. A prefeitura pensa em melhorar o trânsito com uma política de mais vias e tudo volta a esse ponto: com mais vias, há espaço para mais carros e, assim, para mais trânsito. Essas reformas são resposta da cidade ao mercantilismo do carro, não uma tentativa de melhoria do trânsito. A cidade é feita pelos cidadãos. Não há somente o governo. Cada cidadão tem a possibilidade de interagir com o espaço em que vive. No caso das políticas públicas em mobilidade, podemos ver como o cidadão não ajuda a mudar. Há uma cultura muito grande do uso do carro, que é visto como a prova de um sucesso, de superioridade social, pois§marca seu status na sociedade; o motorista se sente superior ao pedestre porque tem um carro ou superior a outro motorista porque tem um carro maior, mais moderno e mais caro. Essa cultura da superioridade, do seu lugar na sociedade através de o que você tem, mostra uma grande pobreza das mentes brasileiras. Essa pobreza pode ser também o reflexo de uma sociedade que considera o seu conforto como o mais importante, em que as pessoas não se preocupam com o bem-estar do outro, e o que é perceptível na cidade. Como esperar que as pessoas se preocupem com as outras, se o poder público não se preocupa com seus cidadãos? O conforto próprio fica em primeiro lugar, cada um se preocupa consigo e com sua família e não perde tempo pensando nos outros. O carro reflete ainda mais essa cultura do conforto pessoal e da individualidade.


Todas essas questões estão ligadas ao mundo atual, que exige velocidade cada vez maior. Tudo – seja a mídia, a indústria, a política – tem que ir rápido. A rapidez das informações desse mundo globalizado atinge toda a sociedade civil, os cidadãos ficam preocupados em chegar sempre mais rápido e com mais conforto. Em uma cidade que não oferece transporte coletivo de qualidade, o cidadão usa o mais óbvio, que ele conhece mais e que a educação dele ensinou: o carro. A prefeitura não propõe uma alternativa ao carro e também não ajuda o cidadão a considerar outras formas de transporte, mantendo uma política obviamente focada no carro, como mostra a reforma da marginal Tietê, por exemplo, que foi um projeto totalmente a favor do carro como produto. Assim como a prefeitura de São Paulo, o governo federal atua na mesma dinâmica de valorização e dominação do automóvel. Esse ano, a redução do IPI (imposto sobre produtos industrializados) vai trazer ainda mais carros nas ruas. O estado federal poderia pensar em um plano de redução do preço das passagens de transporte a fim de dinamizar o uso, mas as políticas estão nas mãos de empresas bem mais poderosas do que o cidadão que precisa do transporte público. A cidade é claramente feita para acolher carros e não quem os dirige. Vias feitas para carros, reformas a favor de um uso sempre maior, leis não respeitadas e não cobradas pelo usuários e estacionamentos que nascem como uma praga em todos lugares vazios da cidade. Ao olhar das políticas públicas


nos não temos alternativas ao uso do carro, e não são oferecidas melhorias no transporte público ou nas condições de pedestres ou ciclistas, ou seja, qualquer outra forma de se locomover na cidade. Pensando assim, parece que a cidade está parada e não tentando resolver o problema do trânsito paulistano. Parece que a nossa cidade não olha mais os cidadãos com uma massa que precisa ser protegida, que precisa ajudar numa nova forma de vivência. Pensando nas problemáticas do meio ambiente, de uma busca de novas energia, São Paulo deveria tornar-se um exemplo em política de transporte diferenciado. Foram dados alguns passos, como a criação de infraestrutura para bicicletas, mas ainda não é suficiente.


Valdinei Calvento igualvoce. wordpress.com



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