Campus - nº 420, ano 45

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CAMPUS

BRASÍLIA, 21 A 27 DE ABRIL DE 2015

NÚMERO 420 ANO 45

CONEXÃO SÍRIA-BRASÍLIA Aumenta em 530% o número de refugiados sírios, como Mohammed Hasem, que mora no Paranoá

SENADO

ELE, MULHER-CIDADÃ Resolução permite que homens concorram ao Diploma MulherCidadã Bertha Lutz

SAÚDE

FALTA ANESTÉSICO Hospital Veterinário reduz número de cirurgias devido a atraso na licitação de Propofol

POLÍTICA

MUDANÇA À VISTA Conheça as propostas de parlamentares do Distrito Federal para a reforma política


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CAMPUS

Brasília, 21 a 27 de abril de 2015

NA FILA

CARTA DO EDITOR Amanda Venicio Editora-chefe

A primeira edição de 2015 do Campus apresenta na capa a história de sírios que escaparam da guerra civil para se refugiar em Brasília. A matéria relata as dificuldades no processo de migração e de adaptação em um novo país. Descobrimos porque o Hospital Veterinário da Universidade de Brasília teve que reduzir o número de cirurgias realizadas. Devido a problemas com os fornecedores dos produtos solicitados, o HVet está sem o anestésico Propofol, fundamental para poder operar os animais. Outro assunto abordado pelo Campus são as principais propostas de reforma política feitas por parlamentares do Distrito Federal no Congresso. Os projetos vão desde o fim da reeleição para presidente até a proibição de propagandas eleitorais na televisão e no rádio. Além disso, graças a um projeto de resolução da senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), homens também po-

OMBUDSQVINNA*

derão receber o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz, criado em 2001 para homenagear aquelas que atuam na defesa dos direitos femininos. A medida revela uma divisão profunda de opinião. Enquanto alguns acreditam que premiá-los é usurpar o papel de protagonismo da mulher, outros defendem ser necessário dar destaque aos homens para que possam servir de exemplo a outros. Na página oito, mostramos como jovens nipônicos de Brasília se aproximaram da cultura do Japão por meio do taiko, tambor usado para comunicação, ação militar, teatro, cerimônias religiosas e até como suporte para movimentos sociais. Para os tocadores de taiko, o instrumento ensina disciplina e a preservação da cultura japonesa. Ao lado, na seção Na Fila, perguntamos a alunos da UnB qual melhorias poderiam ser feitas na Biblioteca Central.

*Feminino de ombusdman, termo que significa “provedor de justiça”, a ombudskivinna discute a produção dos jornalistas a partir da perspectiva do leitor.

MEMÓRIA

Nesta edição, entrevistamos frequentadores na fila da Biblioteca Central da Universidade de Brasília (BCE) para saber que melhorias, segundo eles, podem tornar o ambiente melhor.

Daniel Soares Estudante de Economia

“Eu acho que tem muita demanda para poucos livros, pois muitos livros obrigatórios que eu procuro não têm exemplares disponiveis.”

Karla Beatriz

O semestre chega ao fim e com ele as últimas experiências na edição de número 419 do Campus. Poderia me ater ao sentimentalismo de mais uma etapa cumprida, de muitas lágrimas, desilusões, paixões ou quaisquer outros sentimentos, mas prefiro fazer um balanço entre erros e acertos. Não com aquela pegada de que sei mais por estar apenas em um semestre a frente. Acredito que ao recebermos críticas conseguimos melhorar nosso desenvolvimento e assim conseguirmos chegar ao tão sonhado profissionalismo. Quantas vezes os descuidos colocaram as matérias em risco? Eram problemas com vírgulas, diagramação, fotos escuras ou excesso de bonecos. Ainda bem que o desejo de se tornar um verdadeiro foca despertou em cada um o empenho de escolher as melhores pautas, investigar, ter uma escrita mais concisa e informativa, além de prestar atenção aos detalhes. Inovação! Ao acompanhar a trajetória dessa turma, senti falta de pautas

que pudessem surgir de vivências, de uma simples observação mais detalhada do cotidiano. A partir dessa sugestão, a última edição do semestre trouxe relatos de repórteres-personagens, mas sem cair no clichê da autopromoção. O destaque vai para as matérias “Solidários contra a lei”, “De carona é mais legal” e “Fome de África”. Foram apresentados problemas que interferem no cotidiano da sociedade e cujos personagens merecem destaque. Houve cuidado para que os textos não parecessem aqueles manifestos perdidos. Partindo do enfoque correto, um assunto simples pode virar uma pauta para grandes meios. Viver o jornalismo e desenvolver o espírito de repórter é observar, observar, e somente depois de muito observar, escrever. Tudo bem, nas redações o deadline é curto, o chefe pede pra ontem, oc inúmeros imprevistos, mas a ousadia de se encontrar na profissão só começa com o observar.

Raquel Reis Estudante de Engenharia Elétrica

“Gostaria que o horário no final de semana fosse extendido. Seria muito bom se fosse 24 horas.” Perseguições contra raça, religião, nacionalidade, opinião política ou até grupo social são alguns dos motivos para estrangeiros saírem de seus países de origem e se refugiarem no Brasil. A reportagem da edição 402 do Campus, de outubro de 2013, aborda a vontade de votar dos estrangeiros que vivem e trabalham em Brasília. A repórter Brunna Ribeiro compartilha relatos de refugiados que desejam a concretização dos seus direitos como brasileiros.

Estudante de Letras

“Acredito que mais atividades acadêmicas dentro da biblioteca, em termos de encontros, palestras e conferências com professores e alunos.”

Lucas Vinicius

EXPEDIENTE Editora-chefe: Amanda Venício Secretária de redação: Thaissa Leone Editores: Bianca Marinho, Mariana Lozzi Repórteres: Andressa Rios, Fellipe Rocha, Laís Bêrber, Sara Resende e Bachir Gemayel Diretor de arte e foto: Anna Luiza Felix Fotógrafos: Hanna Guimarães e Rafael Montenegro

Ivonilton Silva

Projeto Gráfico: Amanda Venício, Anna Luiza Felix, Bárbara Cruz, Bianca Marinho, Luiza Antonelli, Maria Paula Abreu, Matheus Bastos, Wenderson Oliveira Monitoras: Juliana Perissé, Bruna Lima Professores: Ana Carolina Kalume, Solano Nascimento Jornalista: José Luiz da Silva Gráfica: Colorprint

Estudante de Engenharia de Redes

Jornal-laboratório da Faculdade de Comunicação da

Universidade de Brasília

“Pelo que eu vi até agora, estou bastante satisfeito e gosto da estrutura que encontrei por aqui.”


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GÊNERO

NO LUGAR DELAS Dentre as cinco vagas destinadas à premiação Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz, uma pode ser ocupada por homens a partir de 2016

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ANDRESSA RIOS

nstituído pelo Senado Federal em 2001, o Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz foi criado para reconhecer mulheres que tenham contribuído para a defesa dos direitos femininos e questões de gênero no Brasil. A premiação ocorre durante as atividades do Dia Internacional da Mulher e contempla, anualmente, cinco mulheres de diferentes áreas de atuação. A indicação pode partir de entidades governamentais e não governamentais. Contudo, em 11 de março deste ano, a proposta mudou. Foi publicada no Diário Oficial da União a aprovação do projeto de resolução que propôs a possibilidade de concessão do Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz a homens. A resolução prevê que indivíduos do sexo masculino com atuação relevante em prol da causa feminina também possam concorrer a uma das cinco vagas a partir do ano que vem. A autora do projeto é a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB–AM), designada como a primeira Procuradora Especial da Mulher, em 2013. A Procuradoria, criada pelo Senado Federal, tem o objetivo de inserí-lo em debates sobre questões de gênero e na luta por igualdade entre homens e mulheres. A coordenadora da Procuradoria Especial da Mulher, Milena Flores, explica que, a princípio, o objetivo era premiar apenas mulheres, mas viu-se a necessidade de reconhecer homens que trabalham pela causa. Segundo ela, uma luta em que as mulheres só falem para elas próprias não teria sentido, deve-se falar para os dois gêneros. OPINIÕES DIVERGENTES A Presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, Creuza Maria Oliveira, uma das agraciadas com o prêmio Diploma MulherCidadã Bertha Lutz deste ano, não concordou com o projeto. “Os homens não poderiam ter essa visibilidade em uma luta que é das mulheres”, afirma. Sara Macêdo de Paula, uma das fundadoras do Movimento Feminista

DIVULGAÇÃO

Olga Benário, da Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC-GO), disse que a premiação desvaloriza a atitude protagonista da mulher, cuja luta é diferente da do homem. “Seria como se brancos compusessem uma bancada de opinião negra”, opina. Acredita também que o homem “feministo”, que diz defender os direitos das mulheres, entrou no movimento para ser o centro das atenções. “Como se ele fosse especial por ser menos um machista no mundo, uma utopia, já que isso não passa de sua obrigação.” Uma das fundadoras do Fórum dos Direitos da Criança e do Adolescente de Roraima e vencedora da premiação em 2015, Ivanilda Pinheiro Salucci, não foi contra a proposta. Segundo ela, não se deve mais categorizar o que é de mulher e o que é de homem e essa é uma questão de direitos e de cidadania. “Por que só mulher pode ganhar? Estamos em uma sociedade que se diz livre e democrática, mas falta muito ainda.” Com sede em Recife, o Instituto Papai desenvolve projetos sobre temas relativos à saúde, sexualidade e reprodução, a partir do enfoque feminista e de gênero. Atualmente, o instituto tem projetos nas áreas de paternidade e direitos reprodutivos, homens e violência de gênero, diversidade sexual e cidadania. “Há muitos homens que querem mudanças profundas na estrutura machista de nossa sociedade e isso não significa defender direitos femininos, mas sim defender os direitos humanos inalienáveis como um todo” conta o coordenador executivo e de projetos do instituto, Sirley Vieira. Ele acredita que o diploma deveria continuar sendo destinado apenas às mulheres, pois incluir os homens tira um pouco da visibilidade do prêmio. “Se fosse oferecido às entidades, talvez até pudesse incluir homens.” Em nota ao Campus, a senadora e ouvidora-geral do Senado Federal, Lúcia Vânia (PSDB-GO), que esteve presente no plenário durante a premiação, afirma que a proposta é positiva e a in-

A senadora Vanessa Grazziotin foi a autora da proposta que prevê a possibilidade de concessão do Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz a homens.

serção de homens veio para modernizar a luta da mulher. “É um incentivo à busca da transformação social e igualdade de gênero pelas quais tanto temos lutado.” Entre prós e contras, a coordenadora da Procuradoria Especial da Mulher, Milena Flores, traz o exemplo do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello que, em 2014, engajou-se junto à senadora Vanessa Grazziotin na campanha de

incentivo a uma maior participação da mulher na política. Esse é um dos exemplos que ajudaram a trazer ao Diploma Mulher-Cidadã Bertha Lutz a questão da inserção dos homens. A premiação é realizada em março e recebe inscrições até novembro do ano anterior. A indicação deverá ser encaminhada à Mesa do Senado Federal, acompanhada do currículo do candidato com a justificativa de sua indicação. u

PRÊMIO BERTHA LUTZ Bertha Maria Julia Lutz foi uma das figuras mais importantes do feminismo e da educação no Brasil no século XX. Nasceu em agosto de 1894 na cidade de São Paulo e morreu em 1976. Criou as bases do feminismo no Brasil e buscou influenciar os detentores do poder sobre a importância da contribuição das mulheres para o mundo público. Foi fundadora da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino (FBPF), organização que trabalha em prol dos direitos da mulher. Uma das principais bandeiras

defendidas pela ativista era o sufrágio feminino, reforma política com o objetivo de estender o direito de voto às mulheres. Em 1932, por meio do Código Eleitoral, as mulheres brasileiras adquiriram o direito de votar e, em 1934, tal direito foi assegurado no texto da Constituição Federal. Atualmente, existe o Museu Virtual Bertha Lutz, site dedicado à atuação política e científica da ativista, desenvolvido pela Universidade de Brasília com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


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REFUGIADOS

HISTÓRIAS QUE A

De 2011 a 2014, o número de solicitações de abrigo no DF feita por sírios qu sírios ultrapassa o de haitianos e

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BACHIR GEMAYEL

céu de fumaça de Damasco foi substituído pelo azul límpido de Brasília. Amputados da terra natal devido à guerra civil, refugiados sírios buscam se consolidar na capital brasileira. A representação no Distrito Federal (DF) do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão presidido pelo Ministério da Justiça, registrou 87 solicitações de refúgio provindas de sírios desde o início da guerra, em março de 2011. No primeiro ano de conflito, apenas uma solicitação foi feita no DF. Três anos depois, em 2014, já eram 53 pedidos de reconhecimento, um aumento de 530% da demanda. O Brasil tem a maior comunidade de refugiados da América Latina, e atualmente abriga 7.289 refugiados de 81 nacionalidades distintas, sendo São Paulo a cidade com maior procura para recomeços, de acordo com o Conare. A maior fatia desse grupo (20%) é formada pelos sírios, que já são cerca de 1.700 reconhecidos pelo governo brasileiro desde o início da guerra civil. Mais de três milhões de refugiados haviam abandonado a Síria até outubro do ano passado em decorrência do

conflito armado, segundo as informações do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). Eles saem à procura de um país que lhes proporcione condições mínimas de reerguer a vida com dignidade. Além da contagem oficial de refugiados sírios no DF, fornecida pelo Conare, há ainda o registro de imigrantes sírios que também procuraram ajuda no Instituto de Migrações e Direitos Humanos (IMDH), entidade não-governamental que atua na inclusão social de imigrantes no DF. O instituto apontou um número ainda maior de sírios assentados em Brasília. No ano passado, 70 solicitantes sírios buscaram auxílio no IMDH e, até o mês de março deste ano, a entidade foi procurada por 10 novos estrangeiros. Segundo a irmã Rosita Milesi, diretora do IMDH, quando os sírios recém-chegados não possuem hospedagem, o instituto procura um local para acomodá-los, já que não há albergues disponíveis ou em condições de recebê-los em Brasília. O IMDH conta com uma rede de interpretes voluntários da mesma nacionalidade ou que falam o mesmo idioma para auxiliar os refuHANNA GUIMARÃES

Mohammed Hasem usa um turbante preto e branco, homenagem aos guerrilheiros palestinos.

giados no processo de acomodação na cidade. Para Rosita, o acolhimento dos conterrâneos é o grande gesto facilitador da adaptação. “É muito frequente os sírios e os libaneses acolherem uns aos outros.”, explica. Na busca por emprego, alguns passos devem ser seguidos. Após obter o protocolo da Polícia Federal, os imigrantes recém-chegados solicitam o número de CPF, seguido do pedido de Carteira de Trabalho e Previdência Social. Com os documentos em mãos, frequentam aulas de português para iniciar a comunicação básica. O comerciante Mufid Salem, 45 anos, já estendeu a mão para muitos refugiados árabes e colabora ativamente com o IMDH no amparo de imigrantes. Ele atua na busca por emprego e na compreensão da língua desconhecida. Nascido na Colômbia, o comerciante passou a adolescência na Palestina e veio para o Brasil, onde se assentou. Desde então, preencheu sua história com uma sequência de viagens pelo país e três casamentos. Converteu-se em evangélico fervoroso quando conheceu uma igreja barroca em Minas Gerais, há 15 anos. Foi aí que os 30 anos de crença no Islã de Mufid chegaram ao fim. O comerciante reside com o sobrinho de 19 anos em um apartamento na avenida central da cidade satélite do Paranoá, e, atualmente, abriga o sírio de 44 anos Reefat Shood, habitante do DF há cerca de dois meses. Com a ajuda de Mufid, Reefat arrumou um emprego no restaurante de comida árabe Sadik, localizado no sudoeste, onde ganha um salário mínimo. Antes do hóspede atual, Mufid também abrigou uma família síria até que pudesse se sustentar por conta própria. “O abrigo, que iria durar cinco dias, acabou virando seis meses”, recorda. Na cidade de Homs (Síria), Reefat era proprietário de um restaurante. Hoje, apesar de passar o dia lavando pratos e limpando mesas, diz que mantém o tino comercial. O ex-comercian-

Osama Barbur tem 21 anos e mora em um apartamento n embarque para o Brasil, conheceu o sírio Mohammed Has

te sírio perdeu quase todos os bens na destruição maciça da cidade, uma das mais afetadas pela guerra. Na falência econômica e no receio de encontrar o fogo cruzado entre as guerrilhas rebeldes e o exército de Bashar Al-Assad, atual presidente da Síria, Reefat fugiu com a família dos escombros do conflito até a cidade litorânea de Tartus, localizada a 100 quilômetros de distância de Homs. Não demorou para que uma nova onda de destruição o fizesse seguir para o Líbano. Após dez dias de apreensão, conseguiu embarcar para o Brasil com o que restava das economias, convertidas no valor da passagem até o aeroporto de São Paulo, estimada em mil dólares. Ter um amigo sírio estabelecido em Brasília influenciou na escolha de Reefat pela capital. Ao desembarcar, conseguiu o contato de Mufid através do IMDH e obteve condições de se estabelecer no Paranoá, onde ainda busca assimilar as características culturais do novo país. “O brasileiro possui uma humanidade muito grande. A discriminação racial aqui é menor do que na Síria, onde as diferenças de pele são mais acentuadas”, comenta, traduzido por Mufid. Refaat faz parte de uma minoria síria que é cristã, e, ao partir, dei-


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A GUERRA CONTA

ue fogem da guerra civil aumentou 530%. No Brasil, o número de refugiados atinge a marca de 1.700 pessoas HANNA GUIMARÃES

tiva destes vizinhos”, esclarece.

no Paranoá com o pai e os quatro irmãos. Na fila do sem, que agora vive com eles.

xou os pais e um filho de 17 anos, que permanecem no Líbano na expectativa de obter refúgio. REFUGIADOS DO BRASIL A presença crescente de árabes na capital é fruto da política humanitária adotada pelo país. Devido aos riscos de vida que a permanência na Síria poderia acarretar, o Conare aprovou em 2013 a Resolução nº17, que facilita os pedidos de solicitação de abrigo no intuito de fugir do conflito sírio, ao providenciar um visto simplificado de turista, válido por 90 dias. Segundo explica Sofia Zanforlin, professora da Universidade Católica de Brasília (UCB) e pesquisadora associada do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Migratórios da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), à medida que os países da Europa fecham as portas para os refugiados sírios, o Brasil reforça a postura acolhedora. Os países árabes vizinhos da Síria, como a Jordânia e o Líbano, estão em situação de inchaço populacional devido à presença de um milhão de refugiados que cruzaram as fronteiras e alteraram de forma significativa o quadro demográfico dos destinos almejados. “A situação culminou no fim da postura recep-

PARA PEDIR ASILO O visto de turista com destino ao Brasil é emitido na embaixada brasileira do país onde o sírio se encontra, geralmente um vizinho das fronteiras do combate. Com o visto em mãos, os solicitantes custeiam do próprio bolso a viagem até o aeroporto em São Paulo. A primeira coisa que os recém-chegados devem fazer é se apresentar à Polícia Federal e pedir refúgio. Segundo a versão oficial do Conare e da Acnur, o processo ocorre sem burocracia e quase todos os pedidos são prontamente reconhecidos. Entretanto, a versão contada por quatro recém-chegados sírios, atuais residentes do Paranoá, mostra uma história diferente. O jovem Mohammed Hasem, 22 anos, nem arriscou conseguir um visto de turista na embaixada brasileira em Beirute, pois dois primos haviam feito quatro tentativas vãs. Desde o começo do ano, a entrada no Brasil foi dificultada. Uma carta convite feita por um conterrâneo residente no Brasil e registrada no cartório passou a ser necessária, em um processo chamado “manutenção”. Mohammed conseguiu contatar conhecidos sírios no Brasil, que providenciaram a recomendação para liberar a viagem, e denuncia que, muitas vezes, a polícia libanesa cobra propina de refugiados para deixá-los entrar na embaixada brasileira. Após um ano de espera no Líbano, viu suas expectativas realizadas. Dois meses se passaram desde os primeiros passos em abrigo brasileiro. Chegou ao aeroporto de São Paulo, com apenas 300 dólares no bolso e nenhum conhecimento da língua portuguesa. Mohammed não carregava documentos, diploma da universidade, ou sequer mala de roupa. Sua bagagem é a lembrança da casa na Síria, destruída por um bombardeio noturno, caído do céu junto com a chuva, enquanto os moradores estavam reunidos no térreo. Como saldo, a insônia de uma

família separada pela guerra. O irmão de Mohammed, que trabalha como pintor e já esteve no Brasil, conseguiu visto de entrada na Alemanha e se juntou ao pai deles em Munique. A mãe e outros quatro irmãos não conseguiram sair de Beirute, e aguardam uma brecha para reencontrar parte da família na Alemanha. O jovem com nome de profeta cursava Química em uma universidade de Damasco cuja estrutura foi danificada por estilhaços de explosivos. Atualmente, trabalha das 8h às 20h em uma loja de R$1,99, em Itapoã. Nos momentos de lazer, joga baralho com os colegas de apartamento e fuma cigarros. Quando olhou para as ruas do Paranoá pela primeira vez, Mohammed se deparou com algo que nunca presenciara: “Aqui no Brasil existem pessoas que dormem do lado de fora da casa, fazem cama na rua. Como vocês chamam isso aqui mesmo, de mendigos? Antes da guerra, não havia pessoa, por mais pobre que fosse, sem teto na Síria”, lembra. NOVO LAR O minúsculo apartamento onde Mohammed mora é dividido entre sete refugiados. Um deles, o serralheiro Osama Barbur, de 21 anos, mantém o ar jovial a todo custo, mesmo quando foi atormentado pela burocracia da vinda até o Brasil. O pedido de visto foi negado três vezes e a solução foi contatar um primo que já estava aqui, a fim de obter a recomendação para a viagem. Osama estudou até o ensino médio e foi o último de quatro irmãos a chegar ao Paranoá, sendo que os outros já haviam se alojado com o pai. Anteriormente, sua família era dona de uma serralheria voltada à construção civil no coração de Damasco. À medida que os viadutos da cidade foram reduzidos a ferrugem e as crateras no asfalto passaram a servir de trincheiras para metralhadoras, a partida em direção ao Líbano se tornou inevitável. Foi na fila da embaixada que Osa-

EM ASCENSÃO

Dados do Conare sobre os pedidos de refúgio feitos por sírios em Brasília e do IMDH sobre os refugiados sírios residentes na capital.

ma e Mohammed se conheceram e, coincidentemente, pegaram o mesmo voo para São Paulo. Atualmente, os jovens vivem com o pai e os irmãos de Osama, e com o ex-professor de árabe Ahmed Hussen, de 25 anos. Assim como Mohammed, Osama e Ahmed trabalham em lojas de R$ 1,99. O que mais causou choque cultural nos três foi o modo ocidental de se vestir: “Não estávamos acostumados a ver mulheres com roupa curta”, comenta Osama. Ahmed, Osama e Mohammed são netos de palestinos. Os jovens se sentiam mais palestinos do que sírios, pois o governo sírio e de outros países árabes não reconhecem a nacionalidade de filhos de palestinos, mesmo que nascidos em seu território. Na noite de terça-feira, 31, após um dia de trabalho, Ahmed reuniu os colegas de apartamento em torno de um círculo e entoou uma famosa música síria cuja letra evoca saudade e esperança de retorno: “Que eu possa voltar um dia para a terra que foi minha e que possa matar a distância”. u


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SAÚDE

À ESPERA DE UM ANESTÉSICO Escassez de anestésico no Hospital Veterinário na UnB diminui o número de cirurgias realizadas em comparação com 2014

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LAÍS BÊRBER

RAFAEL MONTENEGRO

Hospital Veterinário da UnB (HVet) está realizando menos da metade do total de cirurgias de seis meses atrás. A baixa ocorreu devido à redução da quantidade disponível de Propofol, anestésico fundamental em procedimentos cirúrgicos. Apenas os casos emergenciais estão sendo submetidos à cirurgia. O animal passa por uma triagem e, caso precise de cirurgia sem urgência, há a recomendação para procurar outro hospital veterinário, fator que representa uma queda de 58,33% no número de cirurgias realizados no mês de março de 2015 em comparação com outubro de 2014. De acordo com o decano de Planejamento e Orçamento da UnB, César Tibúrcio, a falta de anestésico não ocorre em função do corte de gastos do governo de 1/3 no orçamento das universidades federais. Segundo ele, os meses de janeiro e fevereiro foram encerrados dentro do esperado e as contas, no geral, estão em dia. Conforme o coordenador do Banco de Sangue do HVet, Jair Costa, a baixa quantidade do Propofol ocorreu por problemas burocráticos relativos ao processo licitatório exigido por lei. “A licitação dos materiais utilizados no HVet é feita com um ano de antecedência, mas

os materiais da licitação realizada no início de 2014 ainda não chegaram”, afirma. O processo de licitação que possibilita compras de materiais possui duas fases: uma é a tramitação interna do documento, que passa pelo departamento de compras da Universidade, incluindo o registro da pesquisa de preços. A segunda fase é a abertura da modalidade de licitação pregão, com a convocação dos interessados e com o registro de ofertas. Vence o pregão a oferta com o menor preço, podendo haver negociação ao final. Depois dos trâmites legais, o fornecedor estará apto a entregar o material. Segundo o diretor de compras da UnB, Fernando Couto, o processo de solicitação do anestésico utilizado em cirurgias pelo HVet chegou à diretoria de compras em fevereiro de 2014. Em outubro, o resultado das pesquisas de preços de mercado e o processo foram encaminhados para a Procuradoria Jurídica da UnB, que deixou de analisálo pela ausência de uma assinatura no Termo de Referência. Isso gerou atraso no andamento do processo, que retornou ao Departamento de Compras em novembro para correções e alterações. Por isso, as propostas de preço para o anestésico Propofol perderam a

FONTE: ADMINISTRAÇÃO DO HVET

EM QUEDA

De outubro de 2014 para março de 2015 o número de cirurgias caiu 58,33%.

Esta é uma das poucas caixas do medicamento que sobraram no HVet. Donos de animais aguardam a chegada do anestésico ou buscam clínicas privadas.

validade de seis meses e precisarão ser refeitas. A licitação deve “extrapolar o segundo semestre”, diz Couto. Nesse caso, o HVet pode comunicar à Diretoria de Compras o que está ocorrendo e tentar solicitar um processo para aquisições urgentes que será analisado. “O HVet poderia colocar uma justificativa da necessidade emergencial e explicar que pode estar acarretando essa falta”, completa. O Hospital Veterinário da Universidade de Brasília não é um hospital público. Ele funciona como hospitalescola e atende animais de pequeno e grande porte. O atendimento é gratuito apenas nos casos de projetos sociais como o Projeto Carroceiro, no qual alunos e professores prestam atendimentos a cavalos de carroceiros do Distrito Federal, sem custos de medicamentos, cirurgias ou internação. A diminuição do número de cirurgias afeta Juliana Lucena, dona de Otto, cão da raça Schnauzer. “Ainda não descobriram o que ele tem, porque ele está no processo de estudo há dois anos.” Otto terá que fazer uma biópsia no fígado, retirar uma pedra na vesícula e precisa extrair os dentes o quanto antes. Ainda assim, Juliana pretende continuar esperando para fazer a cirurgia no Hospital Veterinário da UnB

em função do preço mais baixo. “Até o momento eu não cogito procurar outra clínica”, afirma. Ligia dos Anjos também não conseguiu marcar cirurgia no HVet para extrair alguns dentes de Fofão, cachorro da raça Shitsu. “A gente iria precisar do anestésico para fazer a cirurgia, então não é possível realizar no HVet.” Ligia preferiu pagar o procedimento em uma clínica particular. u

SERVIÇO O Hospital Veterinário da UnB é um hospital-escola e atende animais de grande e pequeno porte. Os animais domésticos são atendidos no HVet, localizado no Campus Darcy Ribeiro, e os animais de grande porte na Granja do Torto. Algumas especialidades do HVet são: neurologia, oftalmologia, cardiologia, fisioterapia, medicina crítica e intensiva, medicina felina e o banco de sangue. Mais informações: Granja do Torto: (61) 3468-7255 Campus Darcy Ribeiro: (61) 31072801


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POLÍTICA

DE OLHO NA REFORMA Conheça as propostas de parlamentares do DF para impulsionar mudanças político-partidárias SARA RESENDE

O

s pedidos por reforma política nas manifestações de junho de 2013 funcionaram como catalisador da participação popular e contribuíram para disseminar o termo Brasil afora. Este ano, três parlamentares do Distrito Federal apresentaram ao Congresso projetos que buscam modificar os sistemas eleitoral e partidário brasileiros. O deputado federal Ronaldo Fonseca (PROS-DF) e os senadores Cristovam Buarque (PDTDF) e Reguffe (PDT-DF) pretendem diminuir, de forma drástica, os gastos das campanhas eleitorais. Em fevereiro, a Câmara dos Deputados instalou a comissão especial que irá discutir a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 352/13) da Reforma Política. O texto prevê o voto facultativo; o fim da reeleição para presidente, governadores e prefeitos; além de alterar a forma de coligação partidária e determinar que as eleições municipais, estaduais e federais coincidam a partir de 2018. O colegiado terá prazo de até 40 sessões ordinárias para votar um relatório. Em seguida, a matéria precisará ser apreciada nos plená-

rios da Câmara e do Senado, em dois turnos cada. Favorável às duas primeiras proposições da PEC 352/13, o senador Reguffe, eleito ano passado, é autor de sete projetos em consonância com a reforma política. O parlamentar defende o financiamento público de campanhas e alega que a prática facilita o acesso do “cidadão comum” à política. O pedetista apoia o projeto de única reeleição para cargos do Legislativo, uma medida que, de acordo com ele, visa renovar as cadeiras do Congresso. Das sete propostas do congressista, seis foram idealizadas em parceria com outros senadores. Dentre elas, a PEC 8/2015 pode ser considerada a mais severa. O documento trata da revogabilidade de mandato, ou seja, o parlamentar que não cumprir suas promessas estará sujeito à perda do cargo. Segundo Reguffe, se aprovada, a PEC dará ao eleitor a garantia legal do cumprimento das promessas feitas pelos políticos. Questionado sobre a viabilidade do projeto, o senador explica que “o candidato deverá registrar previamente suas propostas de campaFOTOS: AGÊNCIA CÂMARA E AGÊNCIA SENADO

PROPOSTAS DE PARLAMENTARES DO DF Cristovam Buarque Vedar qualquer espécie de propaganda eleitoral paga ou gratuita no rádio e na televisão para reduzir os custos das campanhas eleitorais. Reguffe Fim reeleição para cargos do Executivo, única reeleição para cargos do Legislativo, permitir candidaturas avulsas, perda de mandato devido ao descumprimento de promessas de campanha, fim do voto obrigatório, instaurar o voto distrital puro, proibir o financiamento privado de campanhas Ronaldo Fonseca Punir o partido político que tiver envolvimento em atividades ilícitas

nha na Justiça Eleitoral”, assim, o cidadão que se sentir lesado terá a possibilidade de instaurar um processo contra representantes tanto do Legislativo quanto do Executivo. “As pessoas vão começar a votar na proposta, e não no candidato”, afirma. Reguffe ainda é a favor da candidatura avulsa e do voto distrital puro. FINANCIAMENTO O deputado federal Ronaldo Fonseca se declara contrário ao financiamento público de campanha. “Os cofres públicos não conseguem atender à saúde e à educação. Se as demandas mais imediatas não estão sendo cumpridas, o dinheiro não deve ser usado com partidos políticos”, justifica. Para Fonseca, somente pessoas físicas devem auxiliar os candidatos a angariar votos. “Quem vota é pessoa física, e não jurídica. Essa lógica também vale para as contribuições financeiras”, afirma. Assim, seria estipulado um limite para o valor das doações. Este teto impediria que grandes empresários investissem em políticos com o intuito de beneficiar suas corporações. Quando questionado sobre o desvirtuamento das disputas políticas, o parlamentar lembra o caso Mensalão, no qual o CNPJ de partidos foi utilizado para cometer crimes. Hoje, em caso de atividade ilícita, apenas os integrantes da sigla são condenados, mas Fonseca indica, por meio do Projeto de Lei 880/2015, que o registro do partido seja cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), se comprovada a fraude. INICIATIVA POPULAR A reforma política consiste em uma soma de propostas que aperfeiçoa o sistema democrático brasileiro, consolidado na Assembleia Nacional Constituinte de 1988. A última lei aprovada que modifica a norma eleitoral foi a da Ficha Limpa, de iniciativa popular. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Conferência Nacional

dos Bispos do Brasil (CNBB), Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), Central Única dos Trabalhadores (CUT) e União Nacional dos Estudantes (UNE) são algumas das 103 entidades que fazem parte da Coalizão em Defesa da Reforma Política Democrática. O grupo acredita que a participação dos cidadãos é instrumento da democracia direta e incentiva o recolhimento de assinaturas via internet para projetos de lei de iniciativa popular. Atualmente, a coalizão trabalha para a aprovação do Projeto de Lei 6316/2013, que prevê, entre outras coisas, eleições proporcionais em dois turnos para o cargo de deputado. Nesse modelo, o eleitor escolhe o partido no primeiro turno e o candidato no segundo. Grande parte das propostas descritas ferem interesses dos congressistas. As manifestações de junho de 2013 incentivaram a presidente Dilma Rousseff (PT) a propor um plebiscito e uma Constituinte exclusiva para a reforma política. Se aprovadas, as propostas permitiriam que o povo coordenasse o tom das mudanças. O Congresso, porém, rejeitou a sugestão da presidente, que não recebeu apoio nem da base aliada. Segundo pesquisa do Datafolha, realizada em fevereiro deste ano, os brasileiros consideram a corrupção o segundo problema mais grave do país, perdendo apenas para a precariedade da saúde. A busca por transparência política é explicitada por Cristovam Buarque através do Projeto de Lei do Senado 142/2015, que proíbe a propaganda eleitoral, seja ela paga ou gratuita, no rádio e na televisão. O pedetista observa que o marketing político é antidemocrático. “Os milhões de reais gastos em propagandas devem ser convertidos em uma abordagem direta com o cidadão. O político deve estar nas ruas para se comunicar ‘olho no olho’ com o eleitorado”, salienta o senador. u


CAMPUS 4

Brasília, 21 a 27 de abril de 2015

CULTURA

ágina 8 P ESPÍRITO E PERCUSSÃO

BÁRBARA CRUZ

E

FELLIPE ROCHA

m Brasília, um grupo de jovens se reúne semanalmente em busca de aprimoramento pessoal. Ao questionarem suas condutas de maneira coletiva, os integrantes precisam estar em sintonia física e espiritual para que seus valores morais e culturais sejam mantidos. Ações que poderiam facilmente descrever algum tipo de ritual ou cerimônia religiosa são, porém, resultado da prática diária de um instrumento musical japonês: o Taiko.Traduzido para o português, o termo Taiko (pronuncia-se taikô) significa tambor e engloba uma variedade de instrumentos de percussão criados no Japão. Os tambores, que podem apresentar diferentes tamanhos e afinações, geralmente têm uma superfície de couro de vaca unida a um corpo de madeira por meio de cordas. São tocados com as mãos ou com o uso de baquetas, o que exige habilidade rítmica e preparo físico do tocador para sustentar as batidas. A arte milenar tem em sua essência a união dos percussionistas, que compartilham de uma mesma energia em comunhão com os instrumentos. A história do Taiko se iniciou há mais de dois mil anos com propósitos sociais, religiosos e militares. O tambor foi muito utilizado como meio de comunicação entre pessoas geograficamente distantes. Servia também como instrumento de ligação com as almas dos antepassados em festividades religiosas. Nas guerras, o instrumento marcava o ritmo das marchas, o que motivava os soldados e assustava os inimigos. A tradição milenar de se anunciar as horas pelo Taiko ainda é uma tradição existente em algumas vilas do Japão. Fundado em 2005, o Hikaridaiko é um grupo de Taiko brasiliense. O nome, que significa “Tambor da Luz”, é uma referência a brilho e esperança: fundamentos da filosofia oriental adotados pela equipe, composta por 20 jovens. Os tocadores são, em sua maioria, brasileiros de descendência japonesa que promovem a integração entre o Brasil e o Japão por meio do som vibrante e místico do instrumento. “Antes de ser um bom tocador, seja uma boa pessoa”, é este o lema do grupo de tocadores. A estudante Cínthia Aryssa Okada (16), uma das líderes do Hikaridaiko, está no grupo desde 2008. A integrante, de mãe brasileira e pai japonês, iniciou as atividades com o instrumento por incentivo da irmã, que já tocava. “O grupo não ensina somente a técnica do Taiko, mas também a ser uma boa pessoa. Isso é muito importante, pois o mundo precisa de pessoas melhores. Não consigo pensar na minha vida sem o Taiko e o Hikaridaiko.” APRESENTAÇÕES ARTÍSTICAS A partir da Segunda Guerra Mundial, o toque coletivo do tambor possibilitou o seu uso em espetáculos e concertos, o que aumentou o número de apreciadores e engrandeceu o universo musical. Atualmente, a tradicional melodia dos tambores japoneses é uma das manifestações culturais mais presentes em festivais. As apresentações de Taiko são constituídas por elementos como ritmo, figurino e outros tipos de instrumentação. O Hikaridaiko utiliza, além dos tambores, instrumentos como fuês (flautas) e chapas (pratos) que se integram ao conjunto. Após meses de treinos diários e intensos no Clube Nipo de Brasília, o grupo foi o grande vencedor da categoria júnior do XI Campeonato Brasileiro de Taiko, em 2014, e teve a oportunidade de representar o Brasil este ano na 17ª Competição Júnior de Taiko, no Japão. A equipe ganhou um prêmio especial entre os 15 melhores grupos da competição. Jennifer Yumie Sonobe Hable (16), integrante do Hikaridaiko há 5 anos, se esforça para conciliar as atividades escolares com as do grupo. A estudante, de descendência japonesa, não conhecia o Japão e pôde viajar ao país devido ao seu envolvimento com o Taiko. “Foi emocionante e fantástico ter a oportunidade de participar do campeonato representando o Brasil, sou muito agradecida por isso. Não aprendi somente técnicas do Taiko, também aprendi sobre agradecimento, respeito e disciplina, o que levarei para o resto da minha vida.” u

Cínthia Okada, Jefferson Seidy e Jennifer Yumie (foto 1) são integrantes do Hikaridaiko. A flor de cerejeira e o ipê do uniforme simbolizam a união entre Japão e Brasíla. O Taiko (foto 2) define, hoje, a prática de uma arte. Jennifer (foto 3), descendente de japoneses, foi ao Japão pela primeira vez para representar o Brasil no Campeonato Nacional de Taiko.


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