Sobre a torah e os gentios

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SOBRE A TORAH E OS GENTIOS

Segundo o movimento hassídico, aos gentios (não naturais) cabe apenas o cumprimento das chamadas 7 leis noéticas. Não estou de acordo com esta forma de pensar. Compreendo que pelo fato desse movimento ser um movimento ―piedoso‖ — como o adjetivo ―hassídico‖ indica —, sendo, desta forma, zeloso ao extremo e tendo por objetivo a preservação da cultura judaica, costumes, tradições e, sobretudo, a Torah dentro das leis orais (mishnas) e escritas, o que é importante, porém, acaba por ―exclusivizar‖ para si algo que, a meu ver, Deus – o Eterno reservou para toda a humanidade. Temos o exemplo do farisaísmo que surge no séc II a.C, no período helênico, durante a revolta dos Macabeus, como um movimento hassídico (piedoso) para preservar os costumes, as tradições e a Torah e que, infelizmente, por assim objetivar o zelo, gerou uma exclusão ou dificultou a entrada dos gentios (não naturais) nas promessas e bençãos confiadas a Israel. É preciso, entretanto, compreender que justamente por Israel ser um povo sacerdotal, ele é representativo, isto é, tudo o que foi confiado a ele é para ser transmitido, em outras palavras, as benções, as promessas, as alianças, a Torah, ... foram CONFIADOS para serem guardados, mas CONFIAR não é sinônimo de EXCLUSIVO. O rabino Paulo (Shaul) não nega esta confiança aos israelitas, pelo contrário, ele afirma: São israelitas. Pertence-lhes a adoção e também a glória, as alianças, a legislação (Torah), o culto e as

promessas; 5 deles são os patriarcas, e também deles descende o Ungido, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito para todo o sempre. Amém! (Romanos 9.4). Não há, no entanto, uma exclusividade. Em alguns momentos, Paulo combate esta exclusividade requerida por parte dessa classe judaica hassídica. No 1º séc, essa dificuldade de aquisição dos não naturais era uma realidade. No texto aos

Efésios, por exemplo, Paulo (Shaul) diz: Portanto, lembrai-vos de que, outrora, vós, gentios na carne, chamados incircuncisão por aqueles que se intitulam circuncisos, na carne, por mãos humanas,

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naquele tempo, estáveis sem o Ungido, separados da comunidade de Israel e estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo. 13 Mas, agora, no Ungido Yeshua, vós, que antes

estáveis longe, fostes aproximados (eggus - aperto como de um abraço; vir para perto) pelo sangue do Ungido. 14 Porque ele é a nossa paz (shalom – integridade), o qual de ambos fez um; e, tendo derribado a parede da separação que estava no meio, a inimizade, 15 aboliu, na sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças (dogmas – mandamentos de homens), para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz, 16 e reconciliasse ambos em UM SÓ CORPO com Deus, por intermédio do madeiro, destruindo por ela a inimizade.

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E, vindo, evangelizou paz (shalom – integreidade) a vós

outros que estáveis longe e paz também aos que estavam perto; 18 porque, por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Espírito (ruach – sopro, intenção , propósito). 19 Assim, já não sois estrangeiros e peregrinos,


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mas concidadãos dos santos, e sois da família de Deus, 20 edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, o Ungido Yeshua, a pedra angular; 21 no qual todo o edifício, bem ajustado, cresce para santuário dedicado ao Senhor,

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no qual também vós juntamente estais sendo edificados

para habitação de Deus no Espírito (ruach – sopro, intenção, propósito). (Ef 2.11-22). Aqui, percebemos que Paulo afirma que alguns circuncisos (naturais israelitas) estavam repudiando os incircuncisos (forma pejorativa para se referir aos não naturais que estavam entrando na Comunidade). No verso 14, há o relato de ―uma parede de seperação que estava no meio‖, uma parede que realmente existia no Templo, a fim de separar os estrangeiros dos judeus naturais no serviço e nas cerimônias. Paulo, em discordância, desfaz a ideia de separação dizendo que ―outrora, ÉREIS gentios na carne‖, ou seja, a partir do momento em que adentraram a COMUNIDADE (QAHAL – IGREJA) DE ISRAEL, eles já não eram mais estrangeiros e peregrinos, e sim concidadãos dos santos (povo separado), participantes dos mesmos direitos e deveres (mesma legislação – torah); eles participam da mesma cidadania. Ainda no texto aos Efésios está expresso algo de extrema relevância, está claramente manifesto o

sentido de quem é Israel — Povo do Eterno —, uma Comunidade formada por naturais e não naturais, participantes da mesma cidadania, sob os mesmos direitos e deveres. Assim sempre foi Israel desde a antiguidade. Quando ocorreu o Êxodo, Israel saiu e com ele também saíram estrangeiros: Subiu também com eles um MISTO DE GENTE, ovelhas, gado, muitíssimos animais. (Êx 12:38). Outros episódios

mostram que Israel tinha estrangeiros (não naturais): Fala a Arão, e a seus filhos, e a todos os filhos de Israel e dize-lhes: Qualquer que, da casa de Israel ou dos ESTRANGEIROS EM ISRAEL, apresentar a sua oferta, quer em cumprimento de seus votos ou como ofertas voluntárias, que apresentar ao Senhor em holocausto (Lev 22:18) ; Palavra nenhuma houve, de tudo o que Moisés ordenara, que Josué não

lesse para toda a CONGREGAÇÃO DE ISRAEL, e para as mulheres, e os meninos, e OS ESTRANGEIROS que andavam no meio deles. (Jos 8:35). Por Israel ser composta por naturais e não naturais, a lei (torah - instrução) era para todos, melhor, a Torah foi constituída como constituição do Povo, assim, aquele que desejasse fazer parte do Povo Santo, separado por Deus – o Eterno, deveria viver a Constituição. Sem Torah não havia cidadania ou naturalização de um ―não natural‖. É como, por exemplo, um estrangeiro que chega ao Brasil e deseja se naturalizar brasileiro, ele, obviamente, precisa conhecer, se adequar e viver a constituição brasileira, ele não pode viver a constituição (diferente) do seu país de origem. Certamente que ele não conhecerá todos os mandamentos da constituição brasileira, mas lhe é de obrigação absorver o necessário e o inicial para a sua convivência dentro do contexto brasileiro. Da mesma forma, a Torah foi dada como constituição do Povo de Deus, denominado Israel (naturais e não naturais). Quando Israel saiu do Egito foi necessária


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uma constituição para declará-lo como um povo livre, assim como quando o Brasil saiu do domínio de Portugal e precisou formalizar a sua própria constituição para se declarar livre do império português. Bom, com base neste pensamento, redundantemente, há somente um Povo, chamado Israel, formado por naturais e não naturais sob uma mesma legislação. Todavia, como disse em textos anteriores, é preciso compreender a constituição, estudá-la para saber o que é de ordem moral, ética, higiênica,

circunstancial, inicial, cerimonial,... No aspecto em questão, quanto a legislação não há gentio (não natural) ou judeu (natural): Uma e a mesma lei havereis, tanto para o ESTRANGEIRO como para o natural; pois eu sou o Senhor, vosso Elohim. (Lev 24:22 ). Outro ponto a ser pensado é que Deus – Eterno disse: Portanto, os meus estatutos e os meus juízos guardareis; cumprindo-os, O HOMEM

VIVERÁ POR ELES. Eu sou o SENHOR. (Lev 18.5) Ele não especificou ―o natural viverá por eles‖, ele disse ―o HOMEM viverá por eles‖. Pode haver diferenciação de vocação do natural e do não natural, mas não na legislação. Devido as bençãos dadas e descritas na Lei e nos Profetas a cada tribo israelita natural, pode haver exclusividade quanto a papéis a se desempenhar, entretanto, não de legislação. Entendo que

Paulo, aos Romanos, como exemplo, declara a vocação do Judeu (tribos de Benjamim, Judá e Levi do Reino do Sul): Qual é, pois, a vantagem do judeu? Ou qual a utilidade da circuncisão? 2 Muita, sob todos os aspectos. Principalmente porque aos judeus foram confiados os oráculos de Deus. (Rm 3.1,2). Para finalizar, tendo ainda muitas palavras a serem ditas sobre esse tema, acredito que o texto de Atos 15 — no concílio de Jerusalém —, pode colaborar para com o meu entendimento de que a Torah (como código legal) é para todos o que adentram o Povo, e não somente as chamadas leis noéticas: Pelo que, julgo eu, não devemos perturbar aqueles que, dentre os gentios, se convertem ao Eterno, 20 mas escrever-lhes que se abstenham das contaminações dos ídolos, bem como das relações sexuais ilícitas, da carne de animais sufocados e do sangue. 21 Porque Moisés tem, em cada cidade, desde tempos antigos, os que o pregam nas sinagogas, onde é lido todos os sábados. (At 15.19-21). O contexto mostra que havia discussões sobre como os gentios (não naturais) deveriam se comportar segundo a Torah. Alguns do grupo da circuncisão queriam impor a circuncisão como pré-requisito para entrar na Comunidade, no entanto, os discípulos condenaram a perturbação da imposição e deram algumas recomendações INICIAIS, porque os ―não naturais‖ que estavam iniciando estariam indo na sinagoga no shabat e lá ouviriam mais sobre a Torah (Moisés), aprendendo, desta forma, aos poucos, gradativamente.


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