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Se Miles foi o Picasso do Jazz, Monk foi o cubista do piano
EDUARDO RODRIGUES
Swings the Blues by Bennie Green (Blue Moon): faixa Love at Last. Freeman Lee creditado como compositor. 1960
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Shades of Blue (Black Lion Recording) Howard McGhee. faixa My Delight – composta por Freeman Lee. 1961
Voilà: The Preacher (Esquire): álbum de Babs Gonzales, Freeman nos vocais, fazendo scat como integrante do Modern Sounds. 1958
Ao contrário do que muitos pensam, Thelonious Monk tinha mãos pequenas. Seus dedos, porém, eram longos como pincéis a martelar as teclas do piano com tonalidades que só existiam na sua cabeça. Sua obra representa uma ruptura radical da composição tradicional e da perspectiva na música. Vê-lo tocar é o equivalente jazzístico a ter visto Picasso pintar.
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NEGRAS MELODIAS – Vol. II
Em comum, o número elevado de obras-primas. Round Midnight, um dos standards mais executados da história do Jazz, e Les Demoiselles d’Avignon, quadro icônico do gênio espanhol, são marcos incontornáveis da música e da pintura no século 20.
Picasso e outros mestres cubistas não tinham compromisso com a aparência real dos objetos que pintavam, Monk – o pianista de imagens fortes – ignorou os padrões musicais existentes para criar um repertório original feito de dissonâncias inesperadas, ritmos quebrados e uso criativo do silêncio.
Os dois revolucionaram a arte moderna, cada um a seu modo. Monk reinventou o piano, alargando suas fronteiras com poucas notas e intervalos duradouros. “Não toque tudo (ou o tempo todo). Deixe algumas coisas acontecerem. Improvise. O que você não toca pode ser mais importante do que o que você toca”, ensinou o pianista. Picasso, utilizando-se de técnicas diferentes, criou uma obra volumosa, inovadora e genial. Monk era um minimalista. Picasso, um artista polivalente: exibia igual talento em pinturas, esculturas, desenhos, cerâmicas e gravuras. Picasso gestou a revolução estética do cubismo, trabalhando a decomposição de objetos e figuras humanas. Monk concentrou toda a sua energia e imaginação na busca pela essência da música, tocando meia dúzia de notas; as notas certas, segundo a sua concepção.
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Há, no entanto, um lirismo que aproxima os dois. A música Ruby, My Dear, composta por volta de 1945, mas gravada dois anos depois, e o quadro Mulher Sentada, pintado por Picasso em 1949, são exemplos que evocam, por motivos diferentes, a importância da presença feminina em suas vidas. Acima de tudo, a celebração da mulher amada. Ruby é uma declaração derramada e amorosa à primeira namorada de Monk, Rubie Richardson. A mulher na tela retrata a amante e musa do pintor, Françoise Gilot, que à época estava grávida de sua filha Paloma. Analogias desse tipo ajudam a entender a gênese de uma criação, mas não explicam, em detalhes, a origem do talento de quem as criou.
A essa altura, que importa? Se Miles, com suas fases e revoluções, foi o Picasso do Jazz, Monk foi o cubista do piano.
Ouvir ao acaso um disco como Alone in San Francisco, preciosidade lançada em 1959 pela Riverside Records, é como pegar uma estradinha do interior e desembocar de repente em Giverny, Pienza ou Carmel.
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