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Passivos da mineração seguem castigando o Alto Rio das Velhas
Vazamento no Córrego Fazenda Velha não é única fonte de turbidez e presença de metais nas águas, explicam órgãos ambientais
O derrame de sedimentos no Córrego Fazenda Velha, denunciado por ribeirinhos no mês de março, fez com que a Diretoria do CBH Rio das Velhas oficiasse prontamente o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), solicitando fiscalização e providências para estancar a fonte da poluição que turvou e contaminou as águas do rio a jusante.
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De lá pra cá, mesmo após medidas determinadas pelos órgãos ambientais do estado à mineradora CSN (Companhia Siderúrgica Nacional), picos de turbidez seguiram indicando condições inadequadas para um rio de classe 2 que abastece milhões de habitantes da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).
Para jogar luz sobre a questão, conversamos com três técnicos da área ambiental do governo de Minas: Katiane Almeida, gerente de Monitoramento da Qualidade das Águas do IGAM; Ivana Coelho, coordenadora do Núcleo de Gestão de Barragens da FEAM (Fundação Estadual do Meio Ambiente) e Gustavo Endrigo, superintendente de Fiscalização Ambiental da Semad (Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável). Acompanhe.
Depois do monitoramento emergencial feito pelo IGAM, diário até 17 de abril e semanal a partir de então, qual a situação atual do Rio das Velhas com relação aos níveis de turbidez e à presença de metais pesados?
O IGAM iniciou o monitoramento emergencial do Rio das Velhas no dia 10 de abril em função da denúncia enviada pelo CBH Rio das Velhas. Foram avaliados parâmetros básicos de qualidade de água (temperatura, Oxigênio Dissolvido, turbidez e pH) e a série de metais (Fe, Mn, Al, Cu, Pb, Cr, As, Hg, Zn, Ni). Os resultados não indicaram presença de metais pesados durante esse período, tanto no Rio das Velhas quanto no Córrego Fazenda Velha.
As violações aos limites legais para rios de classe 2 se deram para ferro dissolvido, manganês total, turbidez e sólidos em suspensão totais e PH. Os dados mais recentes, dos dias 9 e 15 de maio, indicaram violação apenas para o parâmetro manganês total, no trecho do Rio das Velhas entre Itabirito e Rio Acima.
Os resultados do Rio das Velhas, tanto a montante quanto a jusante da contribuição do empreendimento, foram bem superiores aos do Córrego Fazenda Velha, com destaque para 15 de abril [dia chuvoso]. Além disso, verifica-se que valores elevados de turbidez, manganês total e ferro dissolvido são notados desde o Rio das Velhas a montante da sua confluência com o Rio Itabirito.
No que concerne à CSN, as medidas determinadas resolveram os problemas verificados no Córrego Fazenda Velha? Se a qualidade da água voltou aos padrões normais, como se explica o fato de a foz do Fazenda Velha continuar bastante turva?
Desde a primeira denúncia de alterações da turbidez no Rio das Velhas e no Córrego Fazenda Velha, a Semad vem atuando de forma ostensiva na fiscalização para frear as possíveis causas e mitigar possíveis efeitos ambientais provocados na região.
Fiscalização conjunta realizada pela FEAM e a Semad em 28 de março observou vertimento de sedimentos, de coloração avermelhada, em uma das três barragens da CSN na bacia do Córrego Fazenda Velha, a Ecológica 1. Nas fiscalizações posteriores, e com o estabelecimento das medidas pela FEAM, Semad e IGAM, que incluíram o desassoreamento da Barragem Ecológica 1, foi possível observar a diminuição de turbidez e cor aparente no Córrego Fazenda Velha.
Os dados do monitoramento da qualidade da água realizados pelo IGAM indicaram que houve redução da turbidez e da presença dos metais ferro, alumínio e manganês no Córrego Fazenda Velha. Já os resultados de alumínio dissolvido e turbidez, após o dia 10 de abril, não apresentaram violações aos limites de classe 2. Foi verificada também uma redução gradativa do parâmetro Manganês Total desde 13 de abril, apresentando após essa data somente uma violação, no dia 24 de abril.
Qual é a real condição do Velhas hoje e quais podem ser, na avaliação do órgão, os efeitos dessa poluição para a captação de Bela Fama e para o abastecimento seguro de milhões de pessoas na RMBH?
A bacia do Rio das Velhas apresenta o maior contingente populacional do estado, com uma expressiva atividade econômica concentrada na RMBH, onde estão presentes os maiores focos de poluição de toda a bacia. De acordo com a nota publicada à época dos fatos pela Copasa [Companhia de Saneamento de Minas Gerais], que realiza o monitoramento frequente da água para abastecimento público da região, toda a produção de água na Estação de Tratamento de Água [ETA] do Sistema Rio das Velhas encontra-se dentro dos parâmetros estabelecidos pela Portaria 888/21 do Ministério da Saúde, que determina os padrões de potabilidade e os procedimentos de controle da qualidade de água.
Quais são, na sua opinião, os efeitos das atividades de dragagem naquele trecho do Rio das Velhas?
As atividades de dragagem podem acarretar, além do revolvimento do leito dos rios destruindo habitats e ressuspendendo partículas sólidas e contaminantes para a coluna d’água, a contaminação química da água pela utilização de produtos durante o processamento, quando utilizados. Nesse sentido, o licenciamento ambiental deve avaliar os possíveis impactos das atividades licenciadas e determinar ações para mitigá-los.
A presença de ferro, manganês e outros metais no Rio das Velhas pode configurar um indicativo de lançamentos clandestinos de rejeitos, que se aproveitariam dos eventos de chuva para despejar efluentes nos rios, para além dos problemas com origem na CSN?
O alto curso da bacia do Rio das Velhas compreende toda a região denominada Quadrilátero Ferrífero – 60% de toda produção nacional de ferro sai dessa região. Um estudo coordenado pelo IGAM em 2001, acerca das interferências ambientais da mineração nos recursos hídricos do Alto Curso do Rio das Velhas, apontou também a grande susceptibilidade erosiva da região, além do carreamento de materiais e sedimentos pelo escoamento superficial, devido a passivos da mineração, com destaque para a sub-bacia do Rio Itabirito.
As características geoquímicas do solo, associadas às atividades minerárias do alto curso da bacia (além da magnitude de geração de cavas e de depósitos de estéril e de rejeitos), que remontam de séculos, constituem fontes potenciais da presença de metais e outros contaminantes no Rio das Velhas, o que monitoramento e fiscalizações contínuos, para combater irregularidades ambientais de mineradores de grande ou pequeno porte e minimizar impactos aos recursos hídricos.