E-book Gestão de Riscos, Imprevistos e Catástrofes

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Gestão do Desenvolvimento Territorial

Andréa Ventura e José Célio Andrade

Gestão de Riscos, Imprevistos e Catástrofes


GESTÃO DE IMPREVISTOS, RISCOS E CATÁSTROFES


UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA ESCOLA DE ADMINISTRAÇÃO GESTÃO DO DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

Andréa Cardoso Ventura José Célio Silveira Andrade

GESTÃO DE IMPREVISTOS, RISCOS E CATÁSTROFES

Salvador 2020


UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA Reitor: João Carlos Salles Pires da Silva Vice-Reitor: Paulo César Miguez de Oliveira Pró-Reitoria de Extensão Universitária Pró-Reitora: Fabiana Dultra Britto Escola de Administração Diretor: Horacio Nelson Hastenreiter Filho. Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social Tânia Maria Diederichs Fischer Superintendência de Educação a Distância -SEAD Superintendente Márcia Tereza Rebouças Rangel Coordenação de Tecnologias Educacionais Haenz Gutierrez Quintana Coordenação de Design Educacional Lanara Souza CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Presidente da Caixa Pedro Duarte Guimarães Vice-Presidente de Habitação: Jair Luís Mahl Superintendente Nacional SUHEN: Rodrigo Souza Wermelinger Gerente Nacional GEHPA: Angélica Djenane Philippe Correa Gerente Executiva: Renata Heringer Gadia da Costa

Gestão do Desenvolvimento Territorial Coordenadora: Profa. Tânia Maria Diederichs Fischer Design Educacional: Agnes Bezerra Freire de Carvalho; Coordenação Executiva: Rodrigo Maurício Freire Soares; Supervisão de Tutoria: Gizele Amorim Conceição

Luana Lopes; Michele Duran; Rafael Moreno; Vitor Sousa

Produção de Material Didático Coordenação de Tecnologias Educacionais CTE-SEAD Núcleo de Estudos de Linguagens & Tecnologias - NELT/UFBA Coordenação Prof. Haenz Gutierrez Quintana

Direção: Haenz Gutierrez Quintana

Projeto gráfico Prof. Haenz Gutierrez Quintana Foto de capa: Equipe de Revisão: Edivalda Araujo; Julio Neves Pereira Márcio Matos; Simone Bueno Borges Equipe Design Supervisão: Alessandro Faria Editoração / Ilustração: Amanda Soares Fahel; Bruno Deminco; Davi Cohen; Felipe Almeida; Flávia Moreira; Jéssica Menezes;

Gerente de AVA: Jose Renato Oliveira Design de Interfaces: Raissa Bomtempo Equipe Audiovisual

Produção: Ana Paula Ramos; Daiane Nascimento dos Santos Câmera, teleprompter e edição: Gleydson Públio; Valdinei Matos Edição: Adriane Santos; Alan Leonel; Lara Menezes Maria Giulia Santos; Sabrina de Oliveira. Animação e videografismos: Alana Araújo; Camila Correia; Gean Almeida Mateus Santana; Roberval Lacerda. Edição de Áudio: Filipe Aragão; Mateus Aragão Pedro Queiroz; Rebecca Gallinari

Esta obra está sob licença Creative Commons CC BY-NC-SA 4.0: esta licença permite que outros remixem, adaptem e criem a partir do seu trabalho para fins não comerciais, desde que atribuam o devido crédito e que licenciem as novas criações sob termos idênticos. V468 Ventura, Andréa Cardoso. Gestão de imprevistos, riscos e catástrofes / Andréa Cardoso Ventura, José Célio Silveira Andrade. - Salvador: UFBA, Escola de Administração; Superintendência de Educação a Distância, 2020. 113 p. : il. Esta obra é um Componente Curricular do Curso de Especialização em Gestão do Desenvolvimento Territorial com Ênfase em Política Habitacional na modalidade EaD da UFBA. ISBN: 1. Catástrofes naturais - Prevenção. 2. Catástrofes naturais – Questões territoriais. 3. Climatologia urbana. 4. Política urbana - Prevenção. 5. Planejamento urbano. I. Andrade, José Célio Silveira. II. Universidade Federal da Bahia. Escola de Administração. III. Universidade Federal da Bahia. Superintendência de Educação a Distância. IV. Título. CDU: 502

Catalogação elaborada por Nonono Nononono Nono, CRB 07/007


Sumário Apresentação ....................................................................................09 Unidade 1 ..........................................................................................11 Aula 1 - A Compreensão de riscos e desastres frente às problemáticas climáticas e de desenvolvimento ....................11 1.1 Sociedade de Risco........................................................................................11 1.2 Desastres e Catástrofes: o problema na prática .....................................18 1.3 Eventos Extremos Mundiais na Atualidade .............................................19 1.4 Eventos Extremos no Brasil .........................................................................21

Aula 2 - Marcos conceituais e legais ...........................................23 2.1 Risco .................................................................................................................23 2.2 Desastres .........................................................................................................25 2.3 Vulnerabilidade ............................................................................................27 2.3.1 Vulnerabilidade e Pobreza .........................................................................28

2.4 Percepção de Riscos ....................................................................................29

Aula 3 - O risco no contexto das mudanças climáticas .............30 3.1 Riscos de Mudanças Climáticas no Brasil ...............................................35 3.1.1 Setores com Maior Previsão de Impacto .................................................36

3.2 Tipos de Enfrentamento Climático: mitigação e adaptação ...............39

Unidade 2 ..........................................................................................49 Aula 1 - Aprofundamento do conhecimento sobre desastres brasileiros ......................................................................................49 1.1 Tipo de Impacto .............................................................................................57 1.2 Secas e Estiagens...........................................................................................60 1.3 Enxurradas ......................................................................................................62


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1.4 Inundações .................................................................................................... 64 1.5 Exemplos de Outros Desastres ..................................................................67

Aula 2 - Políticas de enfrentamento aos desastres naturais ....70 2.1 Atuação Internacional ..................................................................................71 2.2 Atuação Latinoamericana ...........................................................................76 2.3 Atuação Latinoamericana ..........................................................................77 2.3.1 Legislação Brasileira Sobre Desastres ......................................................79 2.3.2 O Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC .................81 2.3.3 A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC...................81 2.3.4 Programa de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres ......................85

Aula 3 - Estratégias e instrumentos de gestão de risco ............89 3.1 Ações de Prevenção ....................................................................................92 3.1.1 Ações de Prevenção .....................................................................................92 3.1.2 Planejamento Urbano ................................................................................ 94 3.1.3 Tecnologia e Conhecimento para Prevenção e Respostas ................ 94 3.1.4 Sistemas de Monitoramento e Alertas .................................................. 96 3.1.5 Atividades de Respostas a Alertas .......................................................... 98 3.1.6 Responsabilizações .................................................................................... 99

3.2 Ações de Resposta ..................................................................................... 100 3.2.1 Ações de Socorro ........................................................................................101 3.2.2 Ações de Assistência às Vítimas ..............................................................101 3.2.3 Ações de Restabelecimento dos Serviços Principais ..........................102

3.3 Desafios a Serem Enfrentados ................................................................103 3.4 Resiliência como Estratégias de Gestão de Riscos ............................. 104

REFERÊNCIAS. ..............................................................................108


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Sobre os autores Andréa Cardoso Ventura Professora adjunta da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Possui pós-doutorado em Administração pela UFBA, universidade em que fez seu doutorado em Administração (2013), com doutorado-sanduiche em Engenharia Industrial realizado na UPM - Universidad Politécnica de Madrid (2012/2013), tendo como enfoque tecnologias sociais no semiárido baiano. Fez Mestrado em Administração (2008), também pela UFBA, e em Estudios Contemporaneos de América Latina (2009), pela UCM - Universidad Complutense de Madrid, sendo ambas as dissertações com estudo enfocado os conflitos socioambientais. A pesquisadora, que é graduada em Comunicação Social, habilitação em Relações Públicas, pela UNESP - Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1999) e em Direito, pela ITE - Instituição Toledo de Ensino (1996), também possui especialização em Marketing, pela Unifacs (2003). Atualmente, é coordenadora do Grupo de Pesquisa em Governança para Sustentabilidade e Gestão de Baixo Carbono, com pesquisas focadas em inovações e propostas de solução em busca do desenvolvimento sustentável. Foi coordenadora do Núcleo de Responsabilidade Social do Centro Universitário Jorge Amado (UNIJORGE) e vencedora do Prêmio Vale-Capes de Ciência e Sustentabilidade 2014, com a melhor tese em tecnologias socioambientais com ênfase no combate à pobreza. É pesquisadora colaboradora da Cátedra Unesco em Sustentabilidade. José Célio Silveira Andrade Professor Titular da Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia. Pesquisador Produtividade CNPq. Possui pós-doutorado em Ciências Políticas e Relações Internacionais pela Université Laval - Québec - Canadá (2008), doutorado em Administração pela Universidade Federal da Bahia (2000). Pesquisador Convidado da Universidad Politécnica de Madrid (UPM) - 2016/2017. Professor Permanente, ex-Coordenador do Núcleo de Pós Graduação em Administração (NPGA) (20132015). Professor-Pesquisador do Programa de Engenharia Industrial (PEI) da Escola Politécnica da UFBA e do Mestrado Profissional em Desenvolvimento e Gestão Social do Centro Interdisciplinar de Desenvolvimento e Gestão Social (CIAGS). Foi editor da Revista de Gestão Social e Ambiental (RGSA). Pesquisador sênior do grupo de pesquisa Governança para Sustentabilidade e Gestão Baixo Carbono (GpS). Tem experiência nas áreas de Administração e Engenharia Ambiental, atuando principalmente nos seguintes temas: governança ambiental global, mudanças climáticas, mercado de carbono, inventario de gases do efeito estufa, pegada de carbono, mecanismos de desenvolvimento limpo, REDD+, cobenefícios projetos de redução de emissões de gases do efeito estufa, energias renováveis e economia de baixo-carbono.


Apresentação Caro(a) aluno(a), bem-vindo(a) à disciplina Gestão de Riscos, Imprevistos e Catástrofes! Você já parou para pensar o quanto as questões ambientais impactam a vida das pessoas? Já observou o quanto, à cada dia, presenciamos nos jornais e nas mídias sociais notícias sobre desastres envolvendo o meio ambiente e a sociedade? Infelizmente, esses fatos e suas respectivas consequências vêm se avolumando ano a ano. A realidade é que, além das situações de riscos e catástrofes causadas pela própria natureza (como secas, enchentes, tufões, furações, terremotos...), a sociedade atual vem passando por uma grave crise ambiental causada por seu próprio modo de vida e os efeitos colaterais das ações antrópicas, ou seja, causadas pelo ser humano, geram resultados muitas vezes avassaladores. Como afirma Viana (2017), se nas sociedades pré-modernas os perigos eram causados sobretudo pela natureza, hoje eles decorrem, na maioria das vezes, de decisões humanas conscientes. Assim, esses perigos passam a ser denominados de riscos. Nesta disciplina, vamos compreender quais são os riscos de desastres aos quais a humanidade está sujeita, especialmente considerando-se um novo fato: a constatação das mudanças climáticas globais. Obviamente, que não podemos negligenciar a existência de diversos tipos de riscos, talvez até mais associados à ação direta do homem sobre o meio, como por exemplo o risco de desabamento de um prédio, causado por incompetência ou inabilidade de engenheiros. No entanto, esse não será o tipo de risco trabalho nesta disciplina. Nela, nós optamos por apresentar a você questões maiores, e que estão exigindo novos olhares e formações técnicas. Isto não significa, no entanto, que não apresentaremos exemplos de riscos ligados à temáticas diferenciadas, a exemplo do rompimento recente das barragens de mineração no Brasil. Felizmente, nem tudo são más notícias. A boa notícia é que há formas de prevenir os riscos. Entretanto, quando o desastre ocorre, é importante saber como enfrenta-lo. Para isso, muitas estratégias de recomposição de países, cidades e suas populações vêm sendo desenvolvidas, para torná-los mais resilientes. Está preparado(a)? Vamos lá! Andréa Cardoso Ventura, José Célio Silveira Andrade


Foto: Steve Buissinne


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Apresentação Nesta primeira Unidade, vamos entender por que estamos diante de uma sociedade de risco e quais os principais temas a ela relacionados. Isto será realizado através de textos, mapas, fotos, gráficos, quadros e tabelas, que farão com que, juntos, desenvolvamos reflexões sobre o tema. Aula 1 A COMPREENSÃO DE RISCOS E DESASTRES FRENTE ÀS PROBLEMÁTICAS CLIMÁTICAS E DE DESENVOLVIMENTO 1.1 Sociedade de Risco Talvez você já tenha ouvido falar que nossa sociedade atual é considerada uma sociedade de risco. Esta afirmação é originalmente atribuída ao sociólogo alemão Ulrich Beck (2002), que define a vida moderna como uma “sociedade de risco global”. Saiba mais! Para compreender um pouco sobre o pensamento do sociólogo, consulte o texto “Ulrick Beck: a imanência do social e a sociedade de risco”, de José Manuel Mendes, disponível em http:// analisesocial.ics.ul.pt/documentos/ AS_214_o01.pdf

Para ele, há diversos perigos – aqui chamados de riscos –, que são intrínsecos à civilização contemporânea. Entre estes riscos podem ser citados os naturais, os socioeconômicos, os geopolíticos, os tecnológicos etc.

Atualmente, como afirmam os técnicos do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (CEMADEN) em publicação que procura definir conceitos e termos relacionados a riscos, para auxiliar no processo de educação da população (CEMADEN, 2019), nos últimos anos, os níveis de risco estão aumentando. Para eles, isso ocorre em razão de fatores como as alterações climáticas, mas também devido à própria pobreza de grande parcela da população, e a falhas de planejamento e gestão no ordenamento


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territorial. Para o órgão, o risco de desastres representa um grande desafio à capacidade humana de se proteger e resistir a seus possíveis impactos, ou seja, ser resiliente. Esta não é uma opinião exclusiva dos técnicos do CEMADEN. Para o professor Angelo José Rodrigues Lima (2019), baseado em relatórios de institutos como o Institute for Public Policy Research (IPPR), de Londres, e do Fórum Econômico Mundial, é necessário entender que o principal elemento que ameaça a sociedade é o ambiental, porque os impactos humanos negativos ao meio ambiente vão além das mudanças climáticas. Diversos outros sistemas naturais estão desestabilizados, fazendo com que estejamos diante de um possível colapso ambiental. Entre os dados apresentados ressaltamos os seguintes: • Os 20 anos mais quentes desde o início dos registros já realizados pelo ser humano, em 1850, foram nos últimos 22 anos. O ano de 2019 foi o quinto mais quente já registrados na história.

Figura 1 A seca no Nordeste brasileiro Fonte: Le Monde

• A população de seres vertebrados caiu, em média, 60% desde a década de 1970. • Mais de 75% do solo do planeta está substancialmente degradada. A


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camada superficial do solo está sendo perdida 10 a 40 vezes mais rapidamente do que é reabastecida por processos naturais. Desde meados do século XX, 30% da terra arável do mundo tornou-se improdutiva devido à erosão. • Desde 1950, foram observadas mudanças em muitos eventos meteorológicos e climáticos extremos. Nesses eventos, é possível realizar uma associação provável com o aumento na frequência de ondas de calor em grandes partes da Europa, Ásia e Austrália, e a frequência ou intensidade de eventos de precipitação pesada na América do Norte e Europa.

Atenção! Em junho de 2019, a Europa enfrentou uma onda de calor excepcionalmente intensa, chegando a 45,9 oC na França. A média registrada foi 2oC acima do normal. As altas temperaturas representam ameaças à saúde das pessoas, à produção de alimentos e ao próprio meio ambiente.

• Em 2015, quase 100 milhões de pessoas tiveram suas vidas destruídas ou desestruturadas por desastres “naturais” (LIMA, 2019). Temos que ter em mente que esses desastres “naturais” causam impacto direto não apenas às pessoas e seus modos de vida. O prejuízo econômico associado a essas questões costuma ser significativo. Cada vez mais temos fatos que cruzam a questão ambiental, a economia e a social. Uma grande enchente pode desestabilizar a economia de uma dada população, causando grandes impactos sociais. Esses impactos atingem a diferentes atores sociais de maneiras diferentes. Obviamente, os que mais sentem costumam ser aqueles menos capazes de reagir eles. Milhares de pessoas perdem todos os seus pertences e muitas vezes suas vidas em desastres ambientais. Muitas vezes, o desastre obriga à reconstrução de toda uma cidade ou até mesmo de uma região inteira. Os governos em todas as suas esferas e a sociedade como um todo precisa preparar-se para ser capaz de enfrentar os riscos, e ser capaz de se reerguer após uma eventual catástrofe. Os Relatórios do Fórum Econômica Mundial, desde 2015, reconhecem questões ambientais como elementos de grandes riscos para negócios. Entre os exemplos deste reconhecimento estão a crise da água, os eventos extremos, a mudança climática e a crise na produção de alimentos. O

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chamado Relatório de Riscos Globais, em sua edição de 2019 (Global Risks Report 2019), que inclui não somente riscos associados à área ambiental, mas também outros relacionados a questões até mesmo criminais apresentou diversos novos riscos ligados à crise climática. O quadro que segue apresenta os principais riscos globais: Riscos por Probabilidade

Riscos por Impacto

1. Eventos climáticos extremos (por ex., inundações, tempestades, etc.)

1. Armas de destruição em massa

2. Falha na mitigação e adaptação às mudanças climáticas 3. Grandes desastres naturais (por ex., terremoto, tsunami, erupção vulcânica, tempestades geomagnéticas) 4. Incidente maciço de fraude/roubo de dados 5. Ataques cibernéticos em grande escala Interconexões de Risco 1. Eventos climáticos extremos + falha na mitigação e adaptação às mudanças climáticas 2. Ataques cibernéticos em larga escala + quebra de infraestrutura e redes de informação críticas 3. Desemprego ou subemprego estrutural elevado + consequências adversas dos avanços tecnológicos 4. Desemprego ou subemprego estrutural elevado + instabilidade social profunda 5. Incidente maciço de fraude/roubo de dados + ataques cibernéticos em larga escala 5. Falha de governança regional ou global + conflito interestadual com consequências regionais Quadro 1 - Riscos globais. Fonte: ZURICH SEGURADORA GLOBAL (2019)

2. Falha na mitigação e adaptação às mudanças climáticas 3. Eventos climáticos extremos (por ex., inundações, tempestades, etc.) 4. Crises hídricas 5. Grandes desastres naturais (por ex., terremoto, tsunami, erupção vulcânica, tempestades geomagnéticas) Principais Tendências 1. Mudança climática 2. Crescente dependência cibernética 3. Aumento sociedades

da

polarização

das

4. Aumento da desigualdade de renda e riqueza 5. Aumento do sentimento nacional


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Conforme você pode observar, em todos os “top five” apresentados no quadro há ao menos um risco relacionado a questões ambientais. Os riscos de probabilidade e por impacto são a maioria. No entanto, não podemos simplesmente considerar esses riscos como “naturais”, ou seja, como simples resultado da ação da natureza.

Saiba mais! Para ter acesso aos relatórios de risco global da Zurich Seguradora Global (2019), desde sua edição de 2015 clique em https://www.marsh.com/br/insights/research/ global-risks-report-2019.html

A afirmação de sermos uma sociedade de risco deve-se ao fato de que, muitos dos riscos que vivenciamos são produzidos por nós mesmos. Entre eles podemos citar, por exemplo, acidentes nucleares, contaminação de alimentos, enchentes causadas por acúmulo de resíduos nos bueiros ou por sistemas de drenagem subdimensionados, doenças epidêmicas (dengue, zika, ebola, H1N1, COVID 10 etc), incêndios florestais, problemas ligados à degradação de ecossistemas, ou pelo modelo de desenvolvimento socioeconômico desigual. Além do aumento dos riscos, temos que compreender que a grande diferença do momento atual é que muitos deles ultrapassam as fronteiras dos Estados nacionais. Desta forma, a importância das esferas pública e privada torna-se ainda mais relevante! Muitas das decisões tomadas em nível local impactam no que ocorre no global, e a recíproca é verdadeira. Como reforça Viana (2017), os agentes privados e gestores públicos têm uma grande responsabilidade com o gerenciamento de riscos. E como veremos, muito vem sendo realizado no mundo inteiro para o enfrentamento dos riscos. Veremos estratégias que vêm sendo adotas em âmbito global, e também como elas vêm sendo utilizadas no Brasil. A adoção de ações coordenadas para o gerenciamento do risco, tanto no âmbito público como no privado, deve ser pensada de modo a promover maior resiliência para as populações e seus territórios.

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Glossário! A resiliência é um termo utilizado em diversas áreas, como psicologia, administração, ecologia e física. Em linhas gerais, significa a capacidade de voltar ao seu estado natural, principalmente após uma situação crítica e fora do comum.

Hoje, não há como dizer que ignoramos a existência de riscos associados a nossas ações e decisões. O nível de conhecimento que temos sobre os problemas globais existentes e também sobre suas possíveis soluções nos impedem, em nossa opinião, de falarmos sobre “imprevistos”. De acordo com o Dicionário Michaellis, imprevisto é aquilo que não foi previsto; algo súbito, repentino. O Dicionário Aurélio vai além na definição e fala sobre aquilo que não se pode prever. Trata-se de questões inesperadas ou ainda incertas, ou seja, das quais temos incertezas e não sabemos ainda calcular o risco. Entretanto, podem ocorrer casos em que ainda não se imagina a existência do risco. Mas nesses casos em que há incerteza, deveria ser adotado o princípio da precaução. A precaução vem antes da prevenção. As pessoas (leia-se aqui sociedade, empresas e governos) deveriam precaverse de situações em que pode haver o risco. E não apenas prevenir-se sobre riscos dos quais já há certeza científica. Precaver-se significa atuar para que o potencial de risco sequer se desenvolva. As atitudes não podem circunscrever-se apenas a evitar os danos que se sabe que podem ocorrer (prevenção), deve-se agir para evitar qualquer risco de sua ocorrência (precaução).

Figura 2 : Precaução versus Prevenção Fonte: Wikimedia


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Assim, podemos realmente afirmar que um desmoronamento de um morro é um imprevisto? Que um episódio de seca é um imprevisto? Que incêndios florestais são imprevistos? Se há informações sobre ocorrências anteriores, probabilidades, previsão do tempo, tecnologias para impedir as ocorrências não é um imprevisto. É um risco. Vamos tentar entender melhor: de acordo com a Agência das Nações Unidas para Redução de Riscos de Desastres (UNISDR, 2009), o risco é entendido como a probabilidade de ocorrência de um evento e suas consequências negativas. Já o perigo, palavra que utilizei anteriormente, pode ser entendido como um evento ou fenômeno que pode causar perda de vidas ou ferimentos a pessoas, danos a propriedades, rupturas sociais ou degradação ambiental. O risco é, assim, entendido como um perigo calculável. Se o risco é um perigo que pode ser calculado, isto significa que podemos ter algum tipo de controle sobre ele. Se já sabemos que há uma probabilidade de ocorrência de um evento, podemos agir de modo preventivo. Em países com riscos de abalos sísmicos, a exemplo do Japão, já há diversas ações preordenadas para realizar o enfrentamento do risco, caso venha a concretizar-se. Isso não significa, no entanto, que temos controle sobre absolutamente tudo que nos rodeia. Nosso controle sobre os riscos é limitado. Mas temos que ser capazes de gerenciar aquilo que está a comando. Para isto, é necessário que a sociedade conheça profundamente os riscos associados a suas ações. Quando os riscos deixam de ser um perigo e se transformam em um caso concreto, em um problema real, é preciso que as pessoas e organizações que deveriam ter agido frente ao risco sejam responsabilizados. Mas, para Beck (2002), nossa sociedade ainda não está sendo capaz de prevenir nem distribuir os riscos, muito menos de responsabilizar os culpados pelos danos sociais e ambientais que ela própria provoca, criando o que o autor chama de “irresponsabilidade organizada”. Mas, antes de compreendermos melhor qual seria a forma de cada agente, seja ele público ou privado, de prevenir os riscos de nossa sociedade, e também de atuar de maneira assertiva frente a um desastre, vamos conhecer alguns exemplos do que estamos falando, quando falamos em desastres.

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1.2. Desastres e Catástrofes: o problema na prática Como falamos anteriormente, há diversos riscos enfrentados por nossa sociedade atual. E, infelizmente, muitos deles acabam se efetivando em desastres, de ordem natural ou não, como detalharemos mais a seguir. O relatório elaborado em 2013, pelo Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IESC/UFRJ, 2013), intitulado “Desastres: estado da arte”, nos traz uma pequena fotografia desta realidade. Nele, verifica-se que em todo o planeta já foram registrados grandes desastres naturais que deixaram milhares de mortos e desabrigados. Estes fatos não são novos. Na China, em 1332, cerca de sete milhões de pessoas morreram afogadas e dez milhões passaram por situações que levaram a fome e doenças devido a uma inundação. No ano de 1755, em Portugal, ocorreu um terremoto de grande magnitudes, que atingiu 8,6 graus na escala Richter. Este evento causou cerca de 50 mil mortes, tanto por decorrência dos tremores de terra em si mesmos, mas também do tsunami e dos incêndios que se seguiram e devastaram Lisboa. Estudo realizado publicado no UOL História (OSSE, 2018), elenca as 10 piores catástrofes naturais já ocorridas no mundo. São elas: 1. Enchente na China, 1931, 4 milhões de mortos. 2. Seca na Índia, 1900, 3,25 milhões de mortos. 3. Terremoto na China, 1556, 830 mil mortos. 4. Ciclone na Índia, 1970, 500 mil mortos. 5. Tsunami na Indonésia, 2004, 280 mil mortos. 6. Terremoto em Antioquia, 526, 250 mil mortos. 7. Tsunami em Lisboa, 1755, 100 mil mortos. 8. Erupção na Indonésia, em 1883, 35 mil mortos. 9. Furacão no Caribe, em 1780, 27 mil mortos. 10. Erupção em Pompéia, no ano 79 d.C. (depois de Cristo), 16 mil mortos. Considerando-se o período de 1995 a 2015, tem-se que desastres deste tipo causaram perdas financeiras globais entre 250 e 300 bilhões de dólares, por ano (ONU, 2015). Este número pode ser subestimado diante de falhas e omissão na documentação. Também no mesmo estudo, o Brasil foi o


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único país das Américas a estar na lista dos 10 países com maior número de pessoas afetadas por desastres naquele período. O relatório foi elaborado pelo Escritório das Nações Unidas para a Redução de Desastres (UNISDR) em parceria com o Centro de Pesquisas de Epidemiologia em Desastres (CRED). O documento avalia catástrofes relacionadas a fenômenos climáticos no mundo e seus danos para a população. Os resultados apontam que 90% dos desastres estão relacionados ao clima. 1.3 Eventos extremos mundiais na atualidade Vejamos alguns exemplos mais recentes ocorridos no mundo. Considerando já o século XXI, houve a catástrofe ocasionada por um tsunami, em 26 de dezembro de 2004. O desastres atingiu várias nações banhadas pelo Oceano Índico e deixou mais de 170 mil mortos e 50 mil desaparecidos. Houve ainda quase dois milhões de pessoas desalojadas e 500 mil desabrigadas. Além dos danos humanos já citados, os desastres também são responsáveis por importantes danos econômicos. Segundo os registros do banco de dados internacional em desastres Emergency Events Database EM-DAT, utilizado como base nos estudos aqui mencionados, apenas no ano de 2011 os danos econômicos provocados por desastres naturais foram estimados em 366,1 bilhões de dólares, considerando-se os 101 países atingidos por esses eventos. Considerando-se desastres de impactos mais financeiros do que sobre vidas, é importante relembrar os danos causados pelo furação Katrina, nos Estados Unidos, em 2003. Considerado um dos desastres de maior impacto financeiro, o Katrina causou prejuízos da ordem de 176 bilhões de dólares. Com impactos ainda maiores, ocorreu, em 2011, no Japão, um terremoto de Tohoku seguido de tsunami que causou perdas estimadas em 210 bilhões de dólares. Considerando-se a década de 2000 a 2010, China, Estados Unidos, Filipinas, Índia e Indonésia constituíram os países que foram mais frequentemente atingidos por desastres naturais em todo o mundo. No ano de 2011, as Filipinas registraram o maior número de desastres naturais já da sua história, em um total de 33. Destes, foram 18 inundações e deslizamentos de terra, 12 tempestades, duas erupções vulcânicas e um terremoto (IESC/ UFRJ, 2013).

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Segundo os mesmos estudos, nesse mesmo ano, a China foi responsável por 65,1% (mais de 159 milhões de pessoas) do total global de vítimas de desastres. Em apenas uma enchente que afetou o país, houve 67 milhões de vítimas. Além disso, a China foi afetada por uma seca, de janeiro a maio do mesmo ano, que causou 35 milhões de vítimas. Uma visão geral dessas perdas pode ser observada no Quadro abaixo.

Quadro 2- Ranking dos 10 Países com Maior Registro de Vítimas Atingidas por tipo de Desastre em 2011. Fonte: IESC/UFRJ, 2013.

Vindo para períodos ainda mais recentes, temos que, apenas no primeiro semestre de 2019, as catástrofes naturais causaram prejuízos de 42 bilhões de dólares. Segundo os cálculos da seguradora alemã Munich Re, foram 370 grandes eventos em todo o mundo, causando 4.200 mortos (G1, 2019). Entre os desastres desse ano, podem ser mencionados: •

Temporal com fortes ventos e granizo na Grécia;

Terremotos no Peru, na Indonésia, nas Filipinas e na Grécia;

Ciclone em Moçambique;

Tornado nos EUA;

Avalanche no Canadá;


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Enchentes no Nepal;

Tempestade no Rio.

1.4 Eventos extremos no Brasil Não obstante, o Brasil não possuir falhas geológicas importantes, não ter vulcões e estar longe das zonas de atrito das placas tectônicas, o país já foi vítima de grandes catástrofes. Um dos exemplos deu-se em 1532, quando um maremoto atingiu São Vicente, no litoral de São Paulo, aterrando a entrada do porto da região (OSSE, 2018). Para além de casos pontuais, a história brasileira possui diversos registros de desastres provocados por razões naturais. Uma das mais conhecidas e recorrentes são as situações de secas extremas. O estado do Ceará, por exemplo, vem sendo marcado por históricos de secas, quase sempre acompanhadas por epidemias e mortes. Segundo publicação do Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2017a), das muitas secas que já atingiram o estado, a responsável pelo maior número de vítimas foi a “seca dos dois setes”, que durou de 1877 a 1879. Esta seca foi acompanhada por grande movimento migratório da população. Famílias inteiras se viram obrigadas a migrar para outros estados. Isto resultou em problemas como falta de alojamentos, de água, de alimentos, de remédios, de infraestrutura urbana e sanitária. Com isso, ocorreram inúmeros problemas de saúde pública, a exemplo de um surto de varíola. Calcula-se que 500 mil pessoas morreram por causa dessa grande seca. Um registro importante refere-se aos deslizamentos de terra em Caraguatatuba, São Paulo, no ano de 1967. Na ocasião, ocorreram 436 mortes. Os deslizamentos destruíram a Rodovia dos Tamoios, o acesso ficou interditado e a ajuda só foi possível por ar e por mar. Um dos eventos ocorridos no Brasil que mais chamou a atenção, na atualidade, foi o caso do ciclone tropical (ou furacão) Catarina. Ele atingiu a costa da região Sul, principalmente o litoral de Santa Catarina, entre os dias 25 e 28 de março de 2004. O ciclone provocou ventos de até 180 km/h, destruiu cerca de 1500 casas e danificou outras 40 mil. Outro desastre natural, também no estado de Santa Catarina, foi o provocado por dois tornados e vendavais de até 300 km/h, ocorrido em 20 de abril de 2015. Os impactos atingiram cerca de 800 mil pessoas, tendo sido registradas duas mortes (VIANA, 2017).

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Em 2017, 872 cidades brasileiras tiveram reconhecimento federal de situação de emergência causada por um longo período de estiagem. A região mais afetada pelas secas foi a Nordeste, com atenção particular ao estado da Paraíba. No ano de 2019, diversas cidades brasileiras, e mais especificamente no Estado de Minas Gerais, sofreram por inundações inesperadas, causadas por uma grande precipitação de chuvas em um curso espaço de tempo. As enchentes causaram dezenas de mortes, deixaram milhares de pessoas desabrigadas e trouxeram prejuízos econômicos da ordem dos milhões de reais.

Figura 3: Inundação no Brasil, Município de Divino-MG. Fonte: g1.globo.com

Não obstante a apresentação destes exemplos práticos, entendemos que é fundamental que você compreenda mais detalhadamente do que estamos falando quando falamos em risco, em desastre, vulnerabilidade, ameaça. Vejamos então, os marcos conceituais e legais que se relacionam com nossa disciplina.


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Aula 2. MARCOS CONCEITUAIS E LEGAIS Na primeira aula desta Unidade, falamos rapidamente sobre os conceitos de imprevistos, riscos e desastres (também conhecidos por calamidades). Mas, para compreender realmente o que significa cada um dos termos mais relevantes para a gerência dos riscos, é importante nos aprofundarmos mais no tema. 2.1. Risco Segundo a Estratégia Internacional das Nações Unidas para a Redução de Desastres (UNISDR, 2009), a palavra risco tem duas conotações distintas: (i) aquela em que a ênfase é dada sobre o conceito de acaso ou possibilidade de ocorrência (ex: o “risco de um acidente”) e (ii) aquela formulada no meio técnico, tendo a ênfase sobre as consequências ou danos (ex: as “perdas potenciais”) num dado local e período. De acordo com o CEMADEN, o risco é a probabilidade de que uma determinada população e seus bens materiais sofram consequências prejudiciais ou perdas diante do impacto de ameaças naturais (a exemplo de terremotos, ciclones etc.), ou antropogênicas (consequência das atividades humanas como industriais: poluição, explosão etc.). Risco é, então, uma possibilidade de dano. As chamadas “consequências prejudiciais ou perdas” podem ser lesões físicas, danos em propriedades, interrupção de atividade econômica etc., e a própria morte. Necessário, então, deixar muito claro que o risco não significa o desastre propriamente dito. O desastre é um risco que se concretizou. E sua intensidade depende de condições de vulnerabilidade em interação com as ameaças. Voltaremos em breve ao conceito de vulnerabilidade. Tomemos, neste momento, o conceito de risco de desastre. Ele pode ser explicado em termos de uma equação matemática que possui pelo menos duas variáveis interligadas: as ameaças (A) e as vulnerabilidades (V). Assim, o risco é igual ao nível de ameaças (que podem ser eventos naturais ou induzidos pelo homem) versus a vulnerabilidade (representada pelo conjunto de condições sociais, econômicas, políticas, culturais, técnicas, educativas e ambientais que deixam uma determinada população mais expostas a um dado perigo) da área ou das pessoas que podem ser impactadas negativamente por ela. A vulnerabilidade indica condições preexistentes que fazem com que os elementos expostos sejam mais ou menos propensos a ser afetados por uma determinada ameaça.

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Segundo o guia Noções Básicas em Proteção e Defesa Civil e em Gestão de Riscos, produzido pelo Ministério da Integração Nacional, a ameaça refere-se “a um evento físico, potencialmente prejudicial, fenômeno e/ou atividade humana que pode causar a morte e/ou lesões, danos materiais, interrupção de atividade social e econômica ou degradação do meio ambiente” (BRASIL, 2017, p. 23). R=A*V

Diversas ferramentas de análise de vulnerabilidade e riscos vêm sendo desenvolvidas ao redor do mundo. Como exemplo podemos mencionar a Move, ferramenta de controle e prevenção de riscos, desenvolvida pela consultora WayCarbon. Em aplicação recente realizada no início de 2019 no município de Belo Horizonte (MG), o instrumento identificou que 42% dos bairros da cidade eram considerados vulneráveis a fatores climáticos como chuvas e ondas de calor. A vulnerabilidade foi comprovada nas fortes chuvas enfrentadas pelo município em janeiro de 2020. Outras cidades brasileiras, a exemplo de Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e Salvador também terão sua vulnerabilidade avaliada, possivelmente no ano de 2020. De acordo com o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais (CEPED-UFSC, 2013), no tocante ao tipo, os riscos podem ser divididos em cinco categorias distintas: 1. Risco instalado: compreendido como o risco efetivo, atual ou visível existente e percebido em áreas ocupadas. A identificação do risco instalado é realizada com base na avaliação de evidências, ou seja, de condições “visíveis” de que eventos adversos podem se repetir ou estão em andamento em determinada área. 2. Risco aceitável: considerado aquele em que uma determinada população aceita como admissível, após considerar todas as possíveis consequências associadas a ele. 3. Risco tolerável: sendo aquele com que determinada população tolera conviver, mesmo tendo que suportar alguns prejuízos ou danos. Normalmente, esta tolerância ao risco está associada à existência de certos benefícios como, por exemplo, a proximidade do local de trabalho ou a determinados serviços, como pontos de ônibus.


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4. Risco intolerável: aquele que não pode ser tolerado ou aceito pela população. Eventuais benefícios ou vantagens proporcionadas pela convivência com o risco não compensam os danos e prejuízos potenciais a ele associados. 5. Risco residual: considerado como aquele risco que ainda permanece em um dado local mesmo após a implantação de programas de redução de risco. Na maioria dos casos, sempre existirá um risco residual. A gestão dos riscos trazem a mitigação de sua existência, mas, em geral, não determina sua total extinção. Glossário! A mitigação é entendida como o ato ou efeito de aliviar ou suavizar. No entanto, quando se fala em mudanças climáticas, refere-se às ações humanas para reduzir a emissão de gases de efeito estufa.

2.2 Desastres O termo “desastre” está relacionado a situações em que eventos adversos ocorrem em áreas que não possuem estrutura para resistir aos impactos. Como resultado destes eventos adversos tem-se danos humanos, materiais ou ambientais, com consequente prejuízos econômicos e sociais. De acordo com Viana (2017), a cada ano, mais de 226 milhões de pessoas são afetadas por desastres no mundo. Já, segundo dados do último World Disaster Report (Relatório de Desastres Mundiais), elaborado pela International Federation of Red Cross and Crescent Societies, apenas na década entre 2006-2016 ocorreram mais de 771 mil mortes atribuídas a desastres e dois bilhões de indivíduos foram afetados por eventos severos. Segundo esse relatório, os danos excederam US$ 1,5 trilhão. Para o CEMADEN (2019), o termo desastre representa uma séria interrupção do funcionamento de uma comunidade, causando mortes e/ou importantes perdas materiais ou ambientais. Ele é o resultado da combinação de ameaças/perigo, condições de vulnerabilidade e da insuficiente capacidade ou medidas para reduzir as consequências negativas e potenciais do risco. Esta capacidade de reduzir as consequências negativas de um desastre

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também é conhecida por resiliência. Nas estratégias de enfrentamento de desastres, a resiliência é entendida como a capacidade de um sistema, comunidade ou sociedade exposta a um desastre em resistir, absorver, adaptar e se recuperar de seus efeitos de modo oportuno e eficaz. Isto inclui a preservação e restauração de suas estruturas e funções básicas. Como você já deve ter percebido, há diversos tipos de ameaças que podem resultar em desastres, entre elas, podemos mencionar terremotos, inundações, secas, furacões e tsunamis. Esses perigos eminentes podem acarretar efeitos danosos sobre as pessoas, as economias e o meio ambiente. Observe que essas ameaças podem ter diferentes categorizações: a) Quanto à origem Ameaças naturais: que podem ser internas à dinâmica do Planeta Terra (ex. vulcanismo, terremotos, tsunamis etc.) ou externas a ela (ex. chuvas, vendavais, raios, seca etc.). No Brasil, a maior parte das ameaças ou perigos de origem natural provem da dinâmica externa da Terra, como inundações e enchentes, movimentos de massa (escorregamento ou deslizamentos de terras, rolamento de blocos rochosos etc.), e tempestades (chuvas fortes, vendavais, granizo), ressacas marítimas, erosão, além de secas e incêndios florestais (CEMADEN, 2019). Ameaças originárias das ações humanas: a exemplo de rompimento de infraestruturas, como barragens, tubulações e reatores, degradação ambiental, etc. Claro que você se lembra do rompimento das barragens de minério ocorridas em Minas Gerais, nas localidades de Mariana e Brumadinho. Nestes casos, não há como se falar em desastres naturais. b) Quanto à abrangência Podem ser individuais, combinadas ou sequenciais em sua origem e efeitos. Cada uma delas se caracteriza por sua magnitude ou intensidade, frequência e probabilidade. Como você pode imaginar, um desastre traz perdas e danos às pessoas (com ferimentos, mortes, doenças...), ao meio ambiente (impactos negativos às fontes de alimentação, água, saúde) e à infraestrutura (moradias, transportes, hospitais). Conforme mencionado anteriormente, as causas de desastres nem sempre são “naturais”, resultantes de movimentos e ciclos tradicionais da natureza. É necessário termos em mente que, muitas vezes, os desastres


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têm causas antrópicas, ou seja, são provocados exclusivamente pela ação humana. Outras vezes, também, as causas podem ser mistas. Como explica Viana (2017), isto ocorre quando, apesar de o evento desencadeador ser natural, seus efeitos são acelerados e multiplicados pela ação ou omissão humana. Para poder garantir o atendimento adequado a situações de desastres e considerando-se que, na grande maioria das vezes, esses desastres são previsíveis, quando já se sabe do risco “gestão de risco de desastre” compreende o planejamento, a coordenação e a execução de ações e medidas preventivas destinadas a reduzir os riscos de desastres e evitar a instalação de novos riscos. 2.3 Vulnerabilidade Conforme afirmado acima, o desastre é a resultante da combinação de ameaças, condições de vulnerabilidade e da insuficiência de capacidade ou medidas para reduzir as consequências negativas e potenciais do risco, também entendida como baixa resiliência. Vejamos, então, o que é a vulnerabilidade. Ela corresponde a um conjunto de condições sociais, econômicas, políticas, culturais, técnicas, educativas e ambientais que deixam as pessoas mais expostas ao perigo. De acordo com o CEMADEN (2019), ser vulnerável é estar fisicamente sensível a uma ameaça ou perigo e apresentar fragilidade diante do dano. Há alguns fatores significativos de vulnerabilidade. Entre eles, podemos mencionar: •

as formas de usar e ocupar o território;

má qualidade da construção das casas/prédios;

desconhecimento da ameaça;

rede precária de serviços básicos.

Importante notarmos que a crise socioambiental vivenciada pela sociedade de risco em que nos encontramos, intensificada pelas mudanças no clima, aumenta a intensidade e frequência de desastres socioambientais. Como consequência, há um aumento, também, nas vulnerabilidades existentes. Por esta razão, o termo vulnerabilidade (res)surge com grande importância para tratar do contexto de mudanças climáticas. Assim, torna-se urgente a adoção de medidas de mitigação, resiliência e adaptação que reduzam tanto os riscos quanto as vulnerabilidades existentes, especialmente no atual

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momento em que nos encontramos. Como veremos com mais detalhes, as medidas de resiliência estão localizadas justamente na intersecção entre as de mitigação e adaptação. Elas irão preparar as pessoas e seus territórios a serem capazes de adaptar-se de maneira mais rápida, podendo reconstruirse, caso se deparem com situações de desastres. De acordo com Iwama et al (2016), para analisar a vulnerabilidade frente às questões climáticas, é necessário, primeiramente, observarmos que, em realidade, a vulnerabilidade possui diversos significados ou conceitos. Há ao menos duas diferentes interpretações sobre como analisar a vulnerabilidade, e estas têm implicações no tratamento do problema e em sua solução. A primeira interpretação tem um enfoque geralmente baseado em aspectos biofísicos. Ou seja, estudos com esta perspectiva tendem a considerar que as pessoas mais vulneráveis são aquelas que vivem em ambientes físicos precários ou em ambientes que sofrerão as consequências físicos das mudanças climáticas de maneira mais dramática (regiões abaixo do nível do mar, regiões semiáridas, etc.). Nesse caso, a capacidade de resposta às mudanças climáticas tanto de um indivíduo, considerado isoladamente, quanto de um grupo social, determina ou influencia sua vulnerabilidade. Essa análise considera a vulnerabilidade como um resultado de análises de características do meio físico. Por outro lado, há uma interpretação que assume que há múltiplos fatores e processos, para muito além do ambiente físico, que têm grande influência na análise de vulnerabilidade. Nessa perspectiva, questões ambientais, sociais, econômicas, políticos e culturais influenciam diretamente a vulnerabilidade dos indivíduos e sua capacidade de resposta frente aos efeitos das mudanças climáticas. E compreendê-los é um pré-requisito fundamental para sua redução. 2.3.1 Vulnerabilidade e Pobreza Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), as mudanças climáticas entre os principais desafios da atualidade. Toda a humanidade enfrenta riscos no médio e longo prazo. Mas, para a Organização das Nações Unidas (ONU) é evidente que os riscos e vulnerabilidades derivados da mudança climática tendem a se concentrar nas pessoas mais pobres do mundo (potencialmente as mais vulneráveis). Essa posição é participada pelo Grupo de Trabalho Mudanças Climáticas, Pobreza e Desigualdades, ligado ao Fórum Brasileiro de Mudanças


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Climáticas. Para os integrantes do grupo, as pessoas mais vulneráveis das regiões mais pobres, urbanas ou rurais, são e serão os mais afetados pelas mudanças do clima. O grupo participou da elaboração do documento de Subsídios para a Elaboração do Plano Nacional de Adaptação aos Impactos Humanos das Mudanças Climáticas brasileiras, que integrou o PAN, anteriormente citado. Como você deve saber, áreas de extremo risco de desastre estão ocupadas por comunidades inteiras, em geral comunidades em situação de extrema vulnerabilidade social. Esse quadro amplia em muito a magnitude de qualquer evento natural, tornando-o trágico. É sempre importante ter em mente que, em uma situação de risco, não só o patrimônio local, ambiental e físico está ameaçado, mas, principalmente, vidas humanas. Ou seja, a análise de aspectos ligados a riscos e vulnerabilidades deve considerar não apenas condicionantes físicas, mas também as condições vivenciadas cotidianamente por essas populações. Os processos históricos de segregação na forma de ocupação dos espaços afetaram (e seguem afetando) diretamente o acesso a bens e a infraestruturas adequadas. Então, as populações menos favorecidas seguem tendo que realizar a instalação de moradias em zonas de maior risco de escorregamentos, inundações e outros eventos. De acordo com estudos publicados pela ONU em 2016, no relatório “Pobreza e Mortes: Mortalidade em Desastres (1996-2015)”, 90% das mortes ligadas a desastres acontecem em países de renda baixa e média. Durante o período de abrangência do relatório, mais de 1,35 milhão de pessoas perderam suas vidas em mais de 7 mil desastres em países de baixa e média renda. Segundo o estudo, enquanto os países de renda alta sofrem grandes perdas econômicas em desastres, os países de baixa renda são efetivamente impactados com a perda de vidas. Essas perdas estão diretamente associadas a questões como: falta de recursos tecnológicos e financeiros, ausência de sistemas de alerta adequados, infraestruturas precárias etc. 2.4 Percepção de Risco Nem todas as pessoas têm a mesma percepção de estar ou não sujeito a um risco de desastre. O que se vê, na prática, é que nem sempre os indivíduos compartilham a mesma percepção sobre o significado e as causas dos diferentes tipos de riscos.

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Por essa razão, diversos pesquisadores afirmam a necessidade de compreender como a percepção de risco influi sobre as estratégias de enfrentamento e adaptação aos riscos. Isto é extremamente importante quando se trata de risco, vulnerabilidade e adaptação. Vamos refletir um pouco sobre a questão da percepção de riscos. O entendimento ou compreensão da existência de um risco tende a ser maior na medida em que há também maior experiência ou vivência do problema. Ou seja, as pessoas que moram próximas a áreas de alto risco de inundação ou elevação do nível do mar, ou ainda áreas de maior probabilidade de ocorrência de um deslizamento ou regiões de seca terão uma percepção maior do risco do que aquelas que não estão próximas a áreas assim. No entanto, é importante sabermos que, conforme alguns estudos mais recentes, foi possível perceber que esta percepção de risco é influenciada por diversos fatores, a exemplo de: •

Fatores psicológicos, simbólicos e socioculturais;

Elementos relacionados ao lugar e proximidade de perigos/riscos

• Acesso às informações e a forma como estas são divulgadas pelos peritos e pela mídia Esses fatores, associados a diferentes crenças, atitudes e experiências de cada indivíduo ou grupo social, interferem nas condutas individuais e coletivas e nas ações preventivas e mitigadoras por eles tomadas. AULA 3. O RISCO NO CONTEXTO DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS O debate sobre desastres vem se intensificando ao redor do mundo, especialmente em razão do aumento da frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o maior impacto desses acontecimentos vêm sendo vivenciado em zonas urbanas de países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. Uma das maiores problemáticas dos eventos extremos (como chuvas intensas, vendavais, furacões, inundações causadas por marés influenciadas pela força dos ventos e da pressão atmosféricas, chamadas marés meteorológicas, e grandes secas), para além de seu maior poder de destruição, está a impossibilidade de prevê-los com exatidão. Isso dificulta enormemente o gerenciamento dos riscos e a elaboração de planos tanto para seu enfrentamento e atenuação de seus efeitos.


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É sabido que o Planeta Terra sempre passou por eventos climáticos extremos. No entanto, existe um consenso científico no mundo, liderado especialmente por pesquisas realizadas pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), de que o aumento do número de ocorrências e a força desses episódios estão diretamente associados à ação humana. O IPCC é formado por um grupo intergovernamental de cientistas, criado pela Organização Meteorológica Mundial e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente com o objetivo de sintetizar e divulgar informações científicas sobre as mudanças climáticas. As ocorrências extremas estão direta ou indiretamente ligadas a um elemento muito expressivo do clima: o aumento da temperatura. Para o IPCC, há 95% de certeza de que a ação humana, por meio de seu modo de vida, é a grande responsável pela elevação das temperaturas do Planeta. Não podemos negar que há cientistas que questionam a responsabilidade das ações humanas sobre as recentes alterações climáticas no planeta. Entretanto, o entendimento de que as ações humanas têm grande relação com as ocorrências climáticas extremas é crescente e majoritário entre os estudiosos do clima. O próprio IPCC (2007) afirma que, independentemente da exatidão da certeza do que vem causando estas alterações potencialmente causadoras de desastres, deve-se utilizar o princípio da precaução contra a incerteza que porventura ainda existam sobre os riscos dessas mudanças. Ou fazemos isso, ou correremos (e estamos correndo) sérios riscos de impactos sobre a humanidade. Vamos tentar entender o que ocorre. O fato é que o efeito estufa é um fenômeno natural e necessário para a preservação da vida na Terra. É ele quem mantém o planeta aquecido e habitável, ao permitir que parte da radiação solar refletida de volta para o espaço seja absorvida pela Terra. No entanto, especialmente desde a Revolução Industrial, vem ocorrendo um grande aumento na concentração de Gases de Efeito Estufa (GEE) na atmosfera. Esses gases são resultantes não apenas da queima de combustíveis fósseis nos processos produtivos das fábricas e do funcionamento de automóveis, mas também oriundos do desmatamento e certos métodos de cultivo do solo. Com isso, à medida que as populações, as economias e os padrões de vida crescem, o mesmo acontece com o nível cumulativo de emissões de GEE.

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Saiba mais! Os GEE são aquelas substâncias gasosas que absorvem parte da radiação infravermelha emitida, principalmente, pela superfície terrestre. Dentre eles estão o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4), o óxido nitroso (N2O) e os perfluorcarbonetos (PFCs).

Desde sua criação, o IPCC vem realizando pesquisas e publicando relatórios para informar à sociedade o que vem ocorrendo com o clima no mundo. Os relatórios apontam, com alto grau de certeza científica, vínculos muito claros entre o aumento da concentração de GEE na atmosfera e o aumento da temperatura terrestre. Entre os principais dados publicados pelo IPCC estão: •

De 1880 à 2012, a temperatura média global aumentou 0,85 °C.

• De 1901 a 2010, os oceanos se aqueceram, as quantidades de neve e gelo diminuíram e o nível do mar aumentou. A média global do nível do mar aumentou 19 cm à medida que os oceanos se expandiam, devido ao aquecimento e ao derretimento do gelo. • A extensão do gelo marinho no Ártico diminuiu em todas as décadas sucessivas desde 1979, com 1.07 × 106 km² de perda de gelo por década. • Dadas as concentrações atuais e as emissões contínuas de GEE, é provável que o final deste século registre um aumento de 1 a 2°C na temperatura média global acima do nível de 1990. Isto significa uma temperatura cerca de 1,5 a 2,5° C acima do nível pré-industrial. • Em 2100, prevê-se que o aumento médio do nível do mar seja de 40 a 63 cm, em relação ao período de 1986-2005. • A maioria das consequências da mudança climática persistirá por muitos séculos, mesmo se as emissões forem interrompidas (ONU, 2019).

Atenção! Em 2013, o IPCC divulgou seu Quinto Relatório de Avaliação. Nele, há evidências de que a mudança climática é real e que as atividades humanas são sua principal causa.


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Em realidade, de acordo com a própria ONU, há evidências alarmantes de que pontos críticos cruciais podem já ter sido alcançados, ou até mesmo ultrapassados. Isto leva a mudanças irreversíveis nos principais ecossistemas e no sistema climático planetário. As alterações da dinâmica do clima atribuídas à ação do homem, somadas à urbanização crescente e desordenada, são apontadas como as causas principais da dilatação do cenário de riscos naturais aos quais a sociedade moderna está exposta. (IPEA, 2011) Por conta dos riscos existentes, foi estabelecido, durante a Eco-92 (Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento), a chamada UNFCCC (sigla em inglês para Convenção-Quadro das Nações sobre a Mudança do Clima). Trata-se de um tratado internacional firmado entre quase todos os países do mundo, tendo como objetivo a estabilização dos GEE e o controle das alterações climáticas. A UNFCCC realiza reuniões anuais para acompanhamento dos resultados das ações acordadas entre os países. Uma das mais importantes reuniões realizadas é conhecida como COP 21. Essa foi a Conferência das Partes (COP) realizada em Paris no final de 2015. Nela, os países signatários do tratado firmaram um novo pacto: o Acordo de Paris. O Acordo de Paris estabelece que o aquecimento global deveria ser contido abaixo de 2 ºC, considerando-se a temperatura média da Terra no periódo pré-industrial. Em realidade, o Acordo afirma que esta temperatura deve ser mantida em, preferencialmente, no máximo 1,5 ºC superior a esse nível. É importante salientar que muitos cientistas e analisas políticos consideram esse pacto pouco ambicioso e não acreditam que esse limite máximo de aquecimento será cumprido, isso porque o Acordo de Paris deixa a critério de cada país estabelecer quais são suas metas de redução de emissão de GEE, não deixa claro os meios de financiamento e não apresenta as penalidades os países que descumprirem suas metas. Há um consenso de que as metas voluntárias apresentadas pelos países não serão capazes de conter o aquecimento no nível máximo pretendido. Tomando como base o limite estabelecido no acordo, o IPCC publicou, em outubro de 2018, o Quinto Relatório de Avaliação. Nele, foram analisados os impactos de um aquecimento global na ordem de 1,5°C. De acordo com o órgão, há benefícios claros para as pessoas e ecossistemas naturais se

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conseguirmos manter o aquecimento nesse nível máximo, em comparação com análises sobre os impactos de 2°C. As pesquisas por ele apresentadas indicam que há uma chance de 40% de o aquecimento global ultrapassar o limite de 2ºC, mesmo com redução das emissões. No entanto, segundo o Relatório, para conseguirmos limitar o aquecimento global em 1,5°C, será necessário que toda a humanidade, em especial os Estados-Nação e as empresas nele situadas, promovam mudanças rápidas, profundas e sem precedentes. Essas mudanças deverão ocorrer em todos os aspectos da sociedade. Entre os exemplos de áreas que deverão sofrer alterações urgentes estão a energia, a indústria, os edifícios, os transportes e as cidades como um todo. Importante ressaltar que as estimativas anteriores dos impactos das mudanças climáticas se concentravam em estimar os danos se as temperaturas médias subissem 2°C. Esse novo Relatório mostra que muitos dos impactos adversos das mudanças climáticas já ocorrerão na marca de 1,5°C. Para poder atingir o limite máximo de aumento da temperatura, deverá haver uma limitação nas emissões de GEE. Segundo a ONU (2019), as emissões globais líquidas de dióxido de carbono (CO2) causadas pelo homem precisariam cair, até o ano de 2030, cerca de 45% em relação aos níveis do ano de 2010, conforme pode ser observado no gráfico que segue. Seria necessário, ainda, que estas emissões atingissem o chamado ‘zero líquido’ por volta de 2050. Isso significa que quaisquer emissões remanescentes precisariam ser equilibradas pela remoção do CO2 da atmosfera.

Gráfico 1: Níveis de emissão de GEE resultantes da implementação das metas voluntárias do Acordo de Paris e sob outros cenários (giga toneladas de CO2 equivalente por ano). Fonte: Adaptado de Ecodebate (2019).


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O fato é que nossos padrões de emissão de GEE atuais fazem com que estejamos nos aproximando de aumentos na ordem de 3°C a 7°C. Ou seja, a probabilidade de enfrentarmos altos graus de temperatura e, com isso, de vermos aumentado a quantidade e a intensidade de eventos climáticos extremos é muito alta. Entre os exemplos de fenômenos extremos estão: • aumento catastrófico dos níveis do mar, em razão do derretimento dos mantos de gelo da Groenlândia e da Antártica Ocidental. Considera-se que essas áreas de gelo equivalem entre 7 e 10 metros de aumento do nível do mar. Se isto vier a ocorrer, cidades litorâneas como o Rio de Janeiro e Recife seriam profundamente afetadas; • interferências agudas na disponibilidade de água, impactando desde a geração de energia em usinas hidrelétricas à produção agrícola; • enormes riscos de extinção de espécies da extraordinária biodiversidade brasileira; • ondas extremas de calor, que podem ser tão severas a ponto provocarem mortes; •

secas de grandes proporções;

aumento nos riscos de incêndios;

chuvas intensas;

inundações, tufões e furações mais intensos e frequentes;

alagamentos e deslizamentos de terra;

• aumento de doenças causadas por vetores, mas também por problemas cardíacos e respiratórios; Creio que a esta altura de nossa disciplina, já esteja claro que as mudanças climáticas precisam ser compreendidas pelos formuladores de políticas públicas e empresariais como uma questão de gestão de riscos. A avaliação desses riscos deve ser feita sistematicamente e atualizada regularmente. Além disto, essa avaliação deve levar em conta as características de cada território e setor empresarial. E deverá haver respostas específicas para cada caso e a cada momento. 3.1 Riscos de Mudanças Climáticas no Brasil Tendo como base os estudos realizados pelo IPCC, diversos pesquisadores vêm tentando analisar a situação brasileira no caso de efetivos aumentos na

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temperatura terrestre. Importante, no entanto, ter em mente que, conforme afirma a publicação da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), os eventos climáticos extremos e sua relação com as mudanças climáticas globais não foram, até agora, totalmente estudados pela comunidade científica brasileira. Talvez os cientistas brasileiros tenham começado a dedicar maior atenção aos eventos extremos do clima em 2004, quando o Furacão Catarina atingiu a costa brasileira. Foi o primeiro registrado no Atlântico Sul. Estudos como os realizados por MARENGO, SCHAEFFER e ZEE, de 2009, nos fazem lembrar que o Brasil já vem passando, há tempos, por outros “eventos incomuns”, como uma onda de calor em 2004, que ocasionou grandes perdas agrícolas no estado de São Paulo, áreas que eram, geralmente, úmidas da Amazônia que estão secando, entre outras. Entre as mudanças no clima brasileiro previstas por esses estudos estão: • aumento na frequência e na intensidade das chuvas no Sul e no Sudeste; • Redução das chuvas no sul e no centro da Amazônia, no centro-oeste do país e na maior parte da região Nordeste; • amplificação dos períodos secos (ou secas) no leste da Amazônia e em parte do Nordeste. 3.1.1 Setores com Maior Previsão de Impacto De acordo com as pesquisas, a maioria dos modelos climáticos testados indica que não apenas choverá menos como também as secas serão mais intensas. Relatório divulgado pela Agência Nacional de Águas em 2006 (BRASIL, 2006) aponta que até o ano de 2025, mais de 70% das cidades com população acima de 5.000 habitantes do Semiárido enfrentarão crise no abastecimento de água para consumo humano. Claro que, conforme já informado anteriormente, o que temos de estudos sobre o clima futuro são previsões. Análises de possibilidades baseadas em diversos tipos de cenários diferentes, considerando diversas possíveis ações a serem realizadas para enfrentar o clima. E, portanto, graus diferenciados e aumento da temperatura terrestre. Para termos uma noção do que aconteceria com nosso país, caso alcancemos aumentos de temperatura superiores a 4oC, vejamos o que dizem estudos realizados por Nobre at al (2018), para os setores da


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agricultura, da saúde, da biodiversidade e da energia. a) Agricultura Os impactos do clima sobre a agricultura são altamente dependentes do local. Ou seja, a depender da localidade e seus recursos, há uma grande diferença nos possíveis impactos a serem sofridos. Um aquecimento igual ou superior a 4°C pode gerar: • Para o arroz, limitação de sua produção às áreas irrigáveis e com boa oferta de chuva (Goiás, Norte do Mato Grosso e Pará). • Em termos nacionais, a tendência é que a produção de feijão seja limitada aos Estados de Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, onde as temperaturas são mais amenas e há menor déficit hídrico. É possível que parte do sul de Minas Gerais também se mantenha como área produtora. • O risco da produção de milho aumenta substancialmente, em função do aumento da temperatura e da deficiência hídrica. Há que se considerar, no entanto, que na região Sul poderá ser beneficiada, diante da redução das geadas. Há restrições de produção em quase todo território nacional. • A soja poderá chegar a uma perda de até 81%. Em termos nacionais, a tendência é que as lavouras migrem para o norte do Estado de Mato Grosso. Em realidade, segundo os pesquisadores responsáveis, esta migração já está acontecendo. Há de se considerar que, em virtude dos impactos já conhecidos, estão sendo desenvolvidos cultivos com alta tolerância à seca e à deficiência hídrica. Além disso, estão em desenvolvimento sistemas de produção mais equilibrados em manutenção da água no solo e sequestro de carbono. Essas inovações poderão minimizar os efeitos do aquecimento global. b) Saúde Os impactos de um aquecimento extremo no setor da saúde serão diretos e indiretos. Em realidade, eles compõem-se de problemas de desenvolvimento já existentes no país, que deverão ser agravados. Vejamos alguns dos impactos: Temperaturas máximas contínuas acima de 37ºC, somadas à umidade do ar, impedem o organismo humano de perder calor por transpiração. Isto pode causar a morte, em caso de exposição prolongada. Municípios das regiões Norte e Centro Oeste, e também dos Estados do Maranhão e Piauí, no Nordeste, poderão apresentar condições climáticas consideradas de alto

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risco para mortalidade. De acordo com as pesquisas apresentadas, entre os grupos mais vulneráveis, a taxa de mortalidade em idosos pode ser até 7,5 vezes maior. Em algumas regiões, deverá haver aumento na incidência de insetos transmissores de doenças, como o Aedes aegypti. Em contrapartida, partes do país podem atingir temperaturas médias tão altas que prejudiquem a própria reprodução do mosquito. O calor extremo poderá gerar uma perda de produtividade laboral. Há previsão de redução de até 268 horas anuais de trabalho em áreas como agricultura, indústria e construção civil. Possibilidade de aumento de desastres naturais em municípios com maior risco e vulnerabilidade para inundações e secas prolongadas. Essa previsão é importante para municípios do Nordeste, especialmente no que diz respeito à indisponibilidade de água tratada, contaminação de alimentos e falta de higiene pessoal. Municípios do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina poderão experimentar um aumento de mais de 150% nos casos de leptospirose, decorrentes do aumento das chuvas. Cerca de 34% dos municípios e 64% da população infantil da região Norte brasileira poderá apresentar aumento de 50% nos casos de diarreia, até 2099. Em geral, a diarreia é altamente dependente das condições sóciodemográficas, de saneamento e serviços de atenção básica à saúde. Nas regiões Norte e Nordeste, aproximadamente 80% dos municípios apresentam vulnerabilidade muito alta para condições de saúde, considerando-se a previsão de um aumento médio de 5°C na região Nordeste e 7°C na região Norte, no período de 2071-2099, em cenários mais extremos. c) Biodiversidade De acordo com os estudos, um aumento igual ou superior a 4oC na temperatura média pode levar a um aumento de 15,7% no risco extinção de espécies no Brasil. Importante notar que o risco de extinção de espécies na América do Sul já é o mais alto do mundo. Perdas como a das abelhas da Mata Atlântica, de plantas comestíveis do cerrado e de espécies do litoral poderão trazer grande impacto socioeconômico. Para o cenário de emissões mais altas, há risco de savanização e empobrecimento de florestas nas décadas finais do século.


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d) Energia O setor de energia é considerado um dos que mais poderá ser afetado pelo aquecimento extremo do país. No entanto, conforme afirmam os pesquisadores, a vulnerabilidade desse setor dependerá da própria trajetória de evolução desse sistema no futuro. Partindo da análise de um impacto negativo quantificado sobre as hidrelétricas brasileiras, considerando-se um cenário de aquecimento maior de 4oC, os impactos projetados seriam: • Déficit praticamente inevitável no atendimento da demanda elétrica no país, até 2040. • Maior demanda por eletricidade, para que os habitantes possam lidar com temperaturas ambientes mais elevadas. • Crescimento na importância de fontes renováveis, como eólica e solar, mas também nas estratégias tecnológicas ligadas à captura e armazenamento de carbono emitidas na geração de energia por fontes fósseis. 3.2 Tipos de Enfrentamento Climático: mitigação e adaptação Entende-se que há duas formas principais de enfrentar as mudanças climáticas, seja no Brasil ou em qualquer lugar do mundo: a mitigação e a adaptação (UNFCCC, 2001). Em linhas gerais, a mitigação pode ser definida como a redução ou captura e armazenamento de GEE, para reduzir seus impactos sobre o clima. Isto é realizado através de mudanças na maneira de produzir ou a realização de substituições tecnológicas. Para o Instituto Nacional de Tecnologia (INT, 2009), diversas tecnologias de mitigação podem e devem ser desenvolvidas no Brasil, contribuindo não apenas para enfrentar as mudanças climáticas, mas também para promover o desenvolvimento sustentável do país. Entre essas tecnologias, que abarcam possibilidades mais amplas do que as propostas até o momento pelo governo, estão: •

melhorias no aproveitamento de terras degradadas;

estímulo à plantação de florestas energéticas;

aumento da eficiência no uso da energia elétrica;

• redução dos desperdícios de matérias-primas e insumos básicos, como água; •

diminuição da fermentação entérica do gado;

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aprimoramento do uso dos fertilizantes nitrogenados;

• estímulo ao aproveitamento de resíduos agrícolas e urbanos para geração de energia; •

produção de álcool a partir da celulose;

• geração de eletricidade através de fontes alternativas ou menos emissoras, tais como eólica, fotovoltaica, bagaço de cana e pequenas centrais hidroelétricas (PCH); •

produção de motores mais eficientes.

Considerando-se as especificidades dos tipos de emissões de GEE no Brasil, provenientes, em sua maioria, de desmatamentos e da atividade de agropecuária e agricultura, entende-se que as ações de mitigação a serem desenvolvidas devem focar nessas áreas. Alterações nesses segmentos podem promover a redução de 85% das emissões nacionais (VENTURA, FERNANDEZ e ANDRADE, 2013). Destaca-se que, segundo dados da Climate Watch, no ano de 2016 o Brasil era o sexto maior emissor mundial de GEE. Veja como se deu a distribuição das emissões brasileiras de GEE, entre os anos de 1990 e 2017. Observem que atividades que são tradicionalmente consideradas grandes emissoras entre os demais países do mundo, que é o setor de energia, com 78% das emissões globais, segundo do Parlamento Europeu, têm menor representatividade em nosso país. No entanto, se retirarmos as emissões causadas pela mudanças do uso da terra (como a agropecuária e o desmatamento), o setor energia passa a ser o segundo emissor brasileiro, atrás apenas da agropecuária.

Gráfico 2: Emissões brasileiras de GEE. . Fonte: SEEG (Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa) (2019).


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Saiba mais! Para saber mais sobre o tipo de emissão de cada país, consulte: http:// www.europarl.europa.eu/news/pt/headlines/society/20180301STO98928/ emissoes-de-gases-com-efeito-de-estufa-por-pais-e-setor-infografia

De acordo com as Contribuições Nacionalmente Determinadas (iNDC, em sua sigla em inglês) brasileiras, apresentada às Nações Unidas em 2015, as principais metas de redução do Brasil são: • Reduzir, até o ano de 2025, as emissões de gases de efeito estufa em 37% abaixo dos níveis de 2005. • Reduzir, até 2030, as emissões de gases de efeito estufa em 43% abaixo dos níveis de 2005. Interessante destacar que a iNDC do Brasil corresponde a uma redução estimada em 66%, em 2025, em termos de emissões de GEE por unidade do PIB. Este tipo de medição está diretamente associado à intensidade de emissões. O número chega a 75% de redução em termos de intensidade, quando se consideram as metas para 2030. Para atingir as metas, o governo brasileiro propôs-se a: 1. No setor florestal e de mudança do uso da terra: i. fortalecer o cumprimento do Código Florestal, em âmbito federal, estadual e municipal; - fortalecer políticas e medidas com vistas a alcançar o “desmatamento ilegal zero” na Amazônia brasileira ii. compensar as emissões de GEE provenientes da supressão legal da vegetação; iii.

restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas;

iv. ampliar a escala de sistemas de manejo sustentável de florestas nativas, por meio de sistemas de georeferenciamento e rastreabilidade 2. No setor da energia i. aumentar 18% a participação de bioenergia sustentável na matriz energética brasileira; ii. ampliar 45% a participação de energias renováveis (como eólica, biomassa e solar) na composição da matriz energética, para

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além da energia hídrica; iii.

alcançar 10% ganhos de eficiência no setor elétrico.

3. No setor agrícola: i. Fortalecer o Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (Plano ABC) como a principal estratégia para o desenvolvimento sustentável na agricultura; ii.

Restauração de hectares de pastagens degradadas;

iii.

Incremento sistemas de integração lavoura-pecuária-florestas.

4. No setor industrial: i.

Promover novos padrões de tecnologias limpas;

ii. Ampliar medidas de eficiência energética e de infraestrutura de baixo carbono. 5. No setor de transportes: i.

Promover medidas de eficiência;

ii. Melhorias na infraestrutura de transportes e no transporte coletivo em áreas urbanas. Entretanto, como afirmado anteriormente, há medidas de mitigação e de adaptação (além daquelas focadas na promoção de resiliência). Esta segunda é necessária, visto que há impactos que ocorrerão (e já estão ocorrendo) no planeta, independentemente das medidas de redução de GEE. Assim, a adaptação é entendida como o desenvolvimento de formas de lidar com os impactos trazidos pelas alterações no clima. Ela diz respeito aos ajustes nos sistemas natural e humano em resposta aos efeitos climáticos atuais ou futuros. Há vários tipos de adaptação, que variam desde a preventiva ou reativa, adaptação pública ou privada, autônoma ou planejada. A adaptação é entendida como o ajuste dos sistemas sociais, econômicos e ambientais aos efeitos atuais e esperados do aquecimento global, prevenindo seus impactos de forma a diminuir a vulnerabilidade, especialmente das comunidades e regiões mais pobres, à mudança ou variabilidade climática. Esse processo social deve considerar não apenas os efeitos, mas também as causas do problema. A esse respeito, o governo brasileiro lançou seu Plano Nacional de Adaptação à Mudança do Clima (PNA) em maio de 2016. Seu


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objetivo geral dialoga, em grande medida, com os objetivos do nosso curso. Ele pretende “promover a gestão e redução do risco climático no país frente aos efeitos adversos associados à mudança do clima, de forma a aproveitar as oportunidades emergentes, evitar perdas e danos e construir instrumentos que permitam a adaptação dos sistemas naturais, humanos, produtivos e de infraestrutura”. (BRASIL, 2016, p. 5)

O PNA tem como visão a constatação de que todos os setores considerados vulneráveis às mudanças climáticas devem possuir estratégias para a gestão do risco climático. As áreas de atuação consideradas prioritárias nesse sentido são: segurança alimentar e nutricional, hídrica e energética. A proposta é que, para garantir a efetiva adaptação do Brasil para as mudanças climáticas seja adotada a estratégia de inserção da gestão do risco da mudança do clima em todos os planos e políticas públicas setoriais e temáticas existentes. Além disso, esta gestão de risco deve estar presente nas estratégias de desenvolvimento nacional. Para tanto, o PAN estabelece os seguintes objetivos específicos (BRASIL, 2016, p. 6): • Orientar a ampliação e disseminação do conhecimento científico, técnico e tradicional apoiando a produção, gestão e disseminação de informação sobre o risco climático, e o desenvolvimento de medidas de capacitação de entes do governo e da sociedade em geral; • Promover a coordenação e cooperação entre órgãos públicos para gestão do risco climático, por meio de processos participativos com a sociedade, visando a melhoria contínua das ações para a gestão do risco climático; • Identificar e propor medidas para promover a adaptação e a redução do risco associado à mudança do clima. Também foram definidas onze áreas de atuação, para suas respectivas estratégias setoriais e temáticas, quais sejam: 1. Agricultura: se prevê a análise das vulnerabilidades existentes frente à mudança do clima; apoio ao setor agrícola na implementação de ações para promoção da resiliência dos agroecossistemas; desenvolvimento de transferência de tecnologia; e fornecimento de subsídios para a revisão do Plano de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono, em particular no que diz respeito ao programa de adaptação nele contido. 2. Biodiversidade e Ecossistemas: se pretende analisar os impactos

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da mudança do clima sobre a biodiversidade no país e avaliar possíveis medidas de adaptação para reduzir sua vulnerabilidade; e avaliar o papel da biodiversidade e dos ecossistemas na redução da vulnerabilidade socioeconômica através da provisão de serviços ecossistêmicos. 3. Cidades e Desenvolvimento Urbano: propõe considerar a lente climática no âmbito das políticas públicas para o planejamento e desenvolvimento urbano, além de identificar ações de adaptação que promovam benefícios aos setores, independentemente dos impactos previstos para a mudança do clima se realizarem ou não. 4. Desastres Naturais: ligado à promoção de ações visando desenvolver capacidades para a redução de riscos, preparação e resposta a desastres no contexto da mudança do clima. 5. Indústria e Mineração: se pretende apresentar os conceitos e diretrizes básicas complementares para o tratamento das questões de adaptação à mudança do clima no Plano Indústria e no Plano de Mineração de Baixo Carbono, bem como destacar a transversalidade das ações necessárias e as lacunas ainda existentes. 6. Infraestrutura (Energia, Transportes e Mobilidade Urbana): visa apresentar aos setores listados os impactos e vulnerabilidades associados à mudança do clima, bem como diretrizes para enfrentá-los. 7. Povos e Populações Vulneráveis: busca identificar grupos populacionais vulneráveis à mudança do clima, visando promover sua adaptação. 8. Recursos Hídricos: objetiva de analisar os impactos da mudança do clima sobre os recursos hídricos e seus principais usuários, identificando as medidas de adaptação para melhorar a capacidade de resposta da gestão dos recursos hídricos e a governança em um cenário de maior variabilidade climática. 9. Saúde: visa a apresentar as vulnerabilidades, os impactos e os riscos da mudança do clima sobre a saúde humana, além das diretrizes e estratégias para o Sistema Único de Saúde (SUS), compatíveis com a Política Nacional sobre Mudança do Clima. 10. Segurança Alimentar e Nutricional: objetiva avaliar vulnerabilidades, impactos e riscos da mudança do clima sobre a segurança alimentar e nutricional brasileira e identificar diretrizes e práticas que contribuam para


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a redução da vulnerabilidade. 11. Zonas Costeiras: busca identificar a exposição atual da zona costeira brasileira à mudança do clima, inclusive os principais impactos e vulnerabilidades relacionadas, além de indicar ações necessárias ao desenvolvimento de sua resiliência climática. Importante destacar que os setores de agricultura, indústria, mineração, energia e saúde possuem Planos Setoriais de Mitigação e Adaptação à Mudança do Clima, conforme definido pela Lei no 12.187 de 2009 e Decreto no 7.390 de 2010. Como você deve ter percebido na explicação do que está contido em cada uma das estratégias previstas para as 11 áreas de atuação do PAN, nem todas estão ligadas ao foco de nossa disciplina. Desta forma, iremos nos focar nas determinações que dizem respeito à Estratégia de Gestão de Risco de Desastres, que estão mais diretamente associadas ao foco de nosso estudo. As principais diretrizes de adaptação previstas no PAN, no que se refere à gestão de riscos e desastres perante as mudanças do clima são: 1. Regulamentação da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (Lei 12.605) e garantia de cumprimento das ações nela previstas. Os responsáveis pela elaboração do plano brasileiro de adaptação consideram que diversas melhorias já estão previstas na lei. Entre elas: criação de Sistema Nacional de Informações e Monitoramento de Desastres; cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis a deslizamentos e inundações; e promoção de Planos Estaduais de Prevenção a Desastres. É necessário fazer com que estas ações, que ainda carecem de regulamentação sejam implementadas. 2. Consolidação de um Sistema de Alertas Precoces, visando ao aumento da capacidade de predição de ocorrência de desastres. Esse sistema também poderá contribuir para o aumento da percepção do risco e para a promoção de estudos a ele relacionados. 3. Incentivo a pesquisas focadas na compreensão do risco aos desastres. É necessário termos a compreensão desses riscos em diferentes escalas, em especial a nível local. O PAN sugere, inclusive, subsídios indiretos para as pesquisas relacionadas a mudanças climáticas, permitindo o aumento de projetos temáticos de pesquisa, pós-graduações com linhas de pesquisas relacionadas e, consequentemente, publicações na área.

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4. Mecanismos de seguros ou transferência de riscos, que seriam realizados através de elaboração de seguros para populações mais expostas e vulneráveis aos desastres, permitindo o seu posterior pagamentos de prêmios de seguro, no caso se serem impactadas por eles. 5. Medidas de adaptação baseadas em ecossistemas. Para tanto, é necessário aumentar os serviços ambientais já prestados pela floresta (seja por replantio ou pela própria preservação). Também são necessárias ações de conservação do solo e de promoção de estabilidade das encostas. Entre as ações já realizadas em busca da adaptação do Brasil à crise climática está o lançamento, em 2017, da plataforma de conhecimento AdaptaClima. Ela foi constituída de maneira colaborativa entre governo e organizações da sociedade civil, com o objetivo de compartilhar experiências e conhecimentos. Saiba mais! Para conhecer a plataforma AdaptaClima clique em http://adaptaclima.mma.gov.br/

Não obstante estarmos tratando das medidas de adaptação e de mitigação como elementos separados, cada vez mais se reconhece que essas medidas não podem ser independentes, mas sim interdependentes e complementares, para que se possa alcançar uma sociedade mais resilientes as mudanças climáticas. A ligação entre vulnerabilidade, adaptação e mitigação requer estudos de diferentes disciplinas e a colaboração entre ciência e política. Diversos estudos vêm indicando opções promissoras em desenhos de soluções socialmente aceitáveis e economicamente viáveis para a política climática que integram adaptação e mitigação. Síntese da Unidade Nesta Unidade I, apresentamos os principais conceitos da área dos estudos dos riscos e impactos climáticos – riscos, desastres, mitigação e adaptação. Como visto, esta escolha foi realizada por serem os fatores climáticos aqueles que mais veem trazendo riscos de aumento de desastres naturais (como secas, enchentes, tufões, furações, terremotos) em todo o mundo, estando entre os principais riscos globais. Para além de exemplos


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de desastres ambientais, foram trazidos, brevemente, outros tipos de riscos que envolvem ações humanas. Durante a exposição, foram apresentados diversos exemplos de riscos que se transformaram, de fato, em catástrofes, não apenas no Brasil, mas em diversas partes do globo. Também, iniciamos uma discussão sobre o que deve ser feito para precaver-se destes riscos, especialmente frente a um cenário de mudanças climáticas, já vivenciadas em maior ou menor grau por grande parte da população do planeta. Um dos pontos importantes destacados na Unidade foi o quanto os riscos se apresentam de maneira diferenciada diante da vulnerabilidade de cada população e da preparação existente em cada território. A vulnerabilidade e o conhecimento existente sobre os fatores de risco atuam diretamente sobre a percepção dos riscos e, consequentemente, sobre as estratégias desenvolvidas para fazer frente a eles.

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Foto: James Frid


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A Unidade 2 irá aprofundar os conhecimentos sobre os principais tipos de desastres naturais, tomando como exemplos, mais especificamente, o contexto brasileiro. No entanto, é importante termos em mente que, mesmo antes de se ter a consciência da intensificação desses desastres por consequência do aquecimento global, já havia diversas ações sendo realizadas em todo o mundo para tentar amenizar os desastres e catástrofes naturais. Veremos, assim, as principais estratégias criadas em âmbito internacional para fazer frente ao eventos de catástrofes naturais e como elas se desdobraram para a América Latina e para o Brasil. Finalizaremos a Unidade apresentando uma visão geral sobre como o Brasil vem se preparando para enfrentar os desastres naturais. Finalmente, serão trazidos os principais instrumentos de gestão de risco. AULA 1. OS DESASTRES BRASILEIROS Como sabemos, o Brasil é um país privilegiado em termos de formação geológica. Assim que, no nosso país, não sofremos com tremores provocados por terremotos e não há praticamente riscos de furacões, por exemplo. Aqui, as ocorrências de desastres, em especial os de origem natural, coincidem com a deterioração das condições de vida nas cidades. O crescimento significativo da população em áreas urbanas no século passado, acompanhado do tipo de ocupação do território, vem acarretando o aumento do número de ocorrências, danos e prejuízos (BRASIL, 2017a). Considerando-se que a maior parte dos desastres ocorridos no Brasil e no mundo está diretamente associada à má utilização dos espaços e dos próprios recursos naturais, nós temos dificuldades em encará-los como “desastres naturais”. Para nós, a erupção de um vulcão está muito mais associada a um desastre natural do que, por exemplo, uma inundação decorrente de uma canalização de rios ou ainda de um desmoronamento de terras ocorrido pela ocupação de um morro por moradias ou, até mesmo, por ciclones cuja força e intensidade foi aumentada em razão da concentração de gases do


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efeito estufa, causando as mudanças climáticas globais. Entretanto, considerando-se que essa é a nomenclatura adotada nos instrumentos de análise e também das políticas públicas mundiais e nacionais, daremos continuidade à disciplina tratando dos “desastres naturais” sem estar todo o tempo colocando-o entre aspas. Mas precisamos que você, quando estiver lendo o material, vendo os gráficos e imagens, e refletindo sobre o que estamos apresentando tenha sempre isso em mente. Faremos um breve apanhado dos principais desastres naturais ocorridos no país, tendo como base o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais (CEPEDUFSC, 2013), elaborado pelo Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (CEPED), da Universidade Federal de Santa Catarina, em parceria com a Secretaria Nacional de Defesa Civil (SEDEC). Não obstante tratar-se de documento produzido em 2013, tendo como base registros dos desastres ocorridos entre os anos de 1991 a 2012, entendemos que se trata de um estudo ainda válido sobre a realidade brasileira, que deve ser utilizado como documento orientador das ações nacionais. Nesse estudo, foram analisados cerca de 39.000 registros existentes no país.

Saiba mais! A versão completa do Atlas Brasileiro de Desastres Naturais, com seus 27 volumes, apresentando os dados gerais do países e de cada um dos 26 estados da federação, pode ser acessado em https://s2id.mi.gov.br/paginas/atlas/#

Como afirmado no próprio Atlas, o conhecimento sobre os fenômenos climáticos e os desastres naturais e tecnológicos a que nosso território está sujeito é fundamental para a efetividade de uma política consistente de redução de riscos. Esse é o objetivo principal da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil. Os tipos de desastres no Brasil são categorizados de acordo com a Codificação Brasileira de Desastres (COBRADE). Conforme vemos no quadro abaixo, temos 11 tipos principais de desastres.


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Quadro 3: Principais tipos de desastres ocorridos no Brasil entre 1991 e 2012 . Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 18)

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Vejamos uma breve descrição de cada um dos tipos de desastre: • Movimentos de Massa: também denominado como deslizamento, escorregamento, ruptura de talude, queda de barreiras, entre outros, se refere aos movimentos de descida de solos e rochas sob o efeito da gravidade, geralmente potencializado pela ação da água (CEMADEN, 2016). • Erosão: processo geológico de desbaste da superfície terrestre, ocorrido em rochas, solos e coberturas vegetais por ação de agentes erosivos (água da chuva ou pluvial, água de rios ou fluvial, de vento, de gelo, de correntes e marés, de embate de ondas). À depender da força da gravidade provoca e de determinadas condições específicas limites, pode ocorrer erosão direta na forma de queda de blocos de rochas que se soltam, de deslizamentos de solos, gelo, rochas e vegetação nas encostas ou canalizadas ao longo de vales como correntes de lamas, pedras e árvores que vão destruindo e levando tudo de arrasto vale abaixo (SIGEP, 2020).

Figura 4: Riscos da erosão Fonte: Manu Dias / GOVBA

• Inundações: é o processo em que ocorre submersão de áreas fora dos limites normais de um curso de água em zonas que normalmente não se encontram submersas, geralmente ocasionado por chuvas distribuídas e alto volume acumulado na bacia de contribuição (CEMADEN, 2016).


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Figura 5: Compreendendo as inundações. Fonte: CEMADEN (2016)

• Enxurradas: podem ser identificadas pelo escoamento superficial concentrado e com alta energia de transporte, que pode estar ou não associado ao domínio fluvial (do rio), podendo ser provocado por chuvas intensas e concentradas. Esse processo apresenta grande poder destrutivo, podendo arrastar veículos, pessoas, animais e mobílias por vários quilômetros. A força das águas pode ainda provocar o rolamento de blocos de pedras, arrancar árvores, destruir edificações e causar corrida de massa (CEMADEN, 2016). • Alagamentos: caraterizados pela extrapolação da capacidade de escoamento de sistemas de drenagem urbana e consequente acúmulo de água em ruas, calçadas ou outras infraestruturas urbanas, em decorrência de precipitações intensas. Não se trata de um desastre natural (CEMADEN, 2016). • Ciclones/vendavais: são fortes áreas de nuvens bastante carregadas, que provocam chuvas torrenciais e que giram no sentido dos ponteiros do relógio (horário) em torno de um centro pressão atmosférica muito baixa. Ocorrem em função do aquecimento de uma superfície (TERRA, 2020). • Estiagem/seca: a seca meteorológica ou estiagem é caracterizada por um período prolongado de baixa ou nenhuma pluviosidade, em que a perda de umidade do solo é superior à sua reposição. À medida que a duração da estiagem se prolonga, durante o período de tempo suficiente para que a falta de precipitação provoque grave desequilíbrio hidrológico, ela passa a ser denominada de seca hidrológica, quando reservatórios e

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níveis de rios são afetados. A estiagem pode ser considerada uma versão moderada da seca, visto que, na primeira, a ausência de chuvas ocorre em uma determinada temporada; enquanto na seca ela é mais permanente, ocorrendo de forma mais cíclica. Em ambos os casos, a produtividade agrícola é afetada devido ao impacto na umidade do solo (CEMADEN, 2013; LETRAS AMBIENTAIS, 2019). • Tempestade local/conectiva – granizo: fenômeno atmosférico resultante da precipitação de pelotas de gelo formadas no interior das nuvens pelo processo de condensação de minúsculos cristais de gelo e gotículas de água. Durante a queda até a superfície continuam a aglutinar moléculas e aumentam de tamanho (FREITAS, 2020). • Onda de frio – geadas: fenômeno meteorológico que consiste em depósito de gelo nas superfícies expostas ao frio que estejam em temperaturas iguais ou inferiores a 0°C (FREITAS, 2020). • Incêndio florestal: queimadas de grandes proporções, relacionadas à combustíveis inflamáveis expostos a materiais acesos. Os incêndios florestais geram impactos sociais e ambientais onde ocorrem. O grande problema é que, de acordo com a análise de 22 anos de dados realizada pela equipe do CEPED-UFSC, o número de ocorrência desses desastres vem aumentando substancialmente no país. Do total de 38.996 registros de desastres, 8.515 (22%) ocorreram na década de 1990; 21.741 (56%) ocorreram na década de 2000; e apenas nos últimos três anos da década de 2010, este número já somava 8.740 (22%) dos casos registrados (CEPED-UFSC, 2013).

Gráfico 3 : Desastres naturais no Brasil entre os anos de 1991 e 2012 Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 34)


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Importante observar que não se pode afirmar que os desastres aumentaram em 78% nos últimos 13 anos. Isto porque há uma grande fragilidade do Sistema de Defesa Civil em manter seus registros atualizados. À medida em que o Sistema foi sendo fortalecido, houve melhoras na obtenção de dados. No entanto, não se pode negar o potencial crescimento desse tipo de ocorrência. Segundo o Atlas, os desastres que mais afetam o território brasileiro são: seca e estiagem; inundação (brusca ou gradual); vendaval e/ou ciclone e granizo.

Gráfico 4 : Totais de registros dos desastres naturais mais recorrentes no Brasil (Período 1992 a 2012) Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 118)

A análise dos dados permite concluir que esses desastres de origem natural têm incidência diferenciada, de acordo com a região do país. De acordo com o Atlas, os estados do litoral brasileiro apresentaram a maior concentração de desastres, com destaque para Pernambuco e Alagoas, Espírito Santo, Rio de Janeiro e Santa Catarina. Esta diferenciação não se dá apenas entre as regiões brasileiras, mas também no interior de cada região: • Região Norte: a maior frequência concentra-se no Estado do Pará, mais especificamente na sua porção Centro-Norte; • Região Nordeste: recorrência engloba a maior parte dos Estados da região, com exceção do Maranhão e do Oeste baiano;

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• Região Centro-Oeste: é a que apresenta áreas com menos frequência de desastres, sendo que estes se concentram apenas no Noroeste do Estado do Mato Grosso; • Região Sudeste: o Norte mineiro, o Norte do Rio de Janeiro e, praticamente, todo o Estado do Espírito Santo apresentam-se como áreas de maior frequência de desastres; • Região Sul: as maiores frequências abrangem o Sudoeste do Rio Grande do Sul e, praticamente, toda a extensão territorial do Estado de Santa Catarina (CEPED-UFSC, 2013). Observem na Tabela abaixo, que apresenta dados mais recentes do que os do Atlas, como a concentração desigual de desastres se distribui em nosso país. É possível verificar que a região Nordeste concentra a maior parte dos desastres. Mesmo a soma de ocorrências dos dois segundos colocados (Sul e Sudeste, respectivamente), não se aproxima do número de registros do Nordeste, onde ocorrem, principalmente, secas e estiagens.

Tabela 1: Número de registros por desastres por tipo e por região geográfica – 2013 e 2014. Fonte: BRASIL (2017 a, p. 29)

Entretanto, considerando-se os dados históricos do país como um todo apresentados no Atlas, pode-se afirmar que as estiagens e secas são os desastres associados a fenômenos naturais que mais ocorrem no Brasil, seguidos das enxurradas. Os primeiros tipos “estão relacionados, principalmente, a adversidades climáticas, assim como pela crescente intervenção humana no meio ambiente e pelas formas de utilização e


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manejo dos recursos hídricos da região” (CEPED-UFSC, 2013, p. 119) 1.1 Tipo de impacto Os desastres naturais afetam as pessoas de maneira diferenciada. Enquanto as secas e as estiagens podem causar dificuldades de acesso a água e alimentos, as enxurradas e as inundações costumam provocar um grande número de pessoas desalojadas e desabrigadas. O impacto dos desastres está diretamente ligado ao grau de vulnerabilidade de cada pessoa. Há uma pequena, mas importante, distinção entre desalojados e desabrigados.Ambos tiveram que desocupar temporária ou definitivamente suas habitações, por causa de evacuações preventivas, destruição ou avaria grave decorrentes dos desastres. No entanto, os desalojados não precisam, necessariamente, de abrigo provisório fornecido pelo Sistema. Já os desabrigados precisam de abrigo.

Glossário! Para conhecer melhor a terminologia utilizada em desastres e situações de riscos, acesse o Glossário de Proteção e Defesa Civil, editado pelo Ministério Nacional de Integração em 2017 (BRASIL, 2017c) e disponível em http:// interaguas.ana.gov.br/Lists/Licitacoes_Docs/Attachments/266/-%20 Produto%207.2_Gloss%C3%A1rio_27.11.pdf

Conforme pode ser visto no gráfico abaixo, a estiagem e a seca são o desastre que mais afeta a população brasileira, por serem mais recorrentes, com 51% do total de registros. O segundo tipo de desastre é a enxurrada, com 21%, seguida por inundação, com 12%. Na região Norte, por exemplo, há grande número de pessoas desalojadas, por conta do deslocamento sazonal das populações ribeirinhas durante o período das cheias dos rios da Bacia Amazônica. As inundações das áreas de planície comprometem a agricultura de subsistência, a pesca e a caça da região. No entanto, quando se considera a perda de vidas humanas propriamente dita, a enxurrada é o tipo de desastre que causou o maior número de mortes, com 58% do total, seguido dos movimentos de massa (como deslizamentos e queda de barreiras) com 15% (CEPED-UFSC, 2013). O gráfico abaixo permite ter uma noção detalhada dos impactos dos desastres sobre a vida humana no Brasil, considerando-se o tipo de desastre.

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Grรกfico 5: Afetados por tipo de desastre Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 35)

Grรกfico 6: Afetados por tipo de desastre Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 35)


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Além do número geral de vidas humanas perdidas pelos desastres, é importante observar como os impactos são diferenciados em cada região brasileira, conforme mostra o gráfico abaixo.

Gráfico 7: Mortos e afetados por região brasileira Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 36)

De acordo com o Atlas, a região Sudeste é a única que supera a média brasileira de 18 mortos por milhão de habitantes. As regiões Norte e Nordeste apresentaram praticamente o mesmo índice de mortos por milhão de habitantes: 8 e 10, respectivamente. Obviamente, não podemos nos esquecer de que os desastres não afetam apenas a vida humana, causando mortes, desalojamentos e deixando milhões de pessoas desabrigadas. Eles deixam atrás de si um rastro de destruição nas infraestruturas públicas (estradas, pontes, ruas, hospitais, escolas) e também na propriedade privada, provocando perdas significativas. Estas perdas não se restringem a questões ligadas aos seres humanos. Em realidade, os desastres costumam afetar muito fortemente, também, a fauna e a flora. Entretanto, ignorando as inter-relações existentes entre o meio ambiente e a vida humana, o que se verifica é que, quando ocorre um evento catastrófico, todos os demais aspectos que não impactam diretamente o ser humano são esquecidos. Isto ocorre porque o que domina a visão dos tomadores de decisão é uma visão antropocêntrica dos fatos, ou seja, focada exclusivamente no ser humano.

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Mas, você já parou para pensar em quantas árvores foram destruídas, por exemplo, na Floresta Amazônica no final de 2019 por razão dos incêndios ocorridos? Já imaginou a quantidade de pássaros, répteis e mamíferos foram afetados por conta disso? Já imaginou como estas perdas de vidas animais e de plantas podem ter impactado o ecossistema amazônico? Apenas para não ficarmos restritos ao Brasil, vamos lembrar também dos incêndios ocorridos na Austrália entre o final de 2019 e início de 2020. Ao menos naquele desastre vimos uma discussão, ainda que tímida, sobre a quase dizimação dos coalas e sobre a perda da biodiversidade local. Os danos humanos gerados em um desastre, de maneira geral, refletem a vulnerabilidade da população diante dos riscos. Assim, a vulnerabilidade é diferenciada de acordo com as condições dos grupos sociais: classes socioeconômicas, aspectos étnicos, gênero, educação, cultura, entre outros. Estas condições se diferem de uma região brasileira para a outra. Ou seja, as diferentes relações entre tais dimensões citadas determinam diferentes formas de exposição da população a uma mesma ameaça. (CEPED-UFSC, 2013, p. 55)

De acordo com a mesma publicação, a Região Nordeste se destaca pelos totais de enfermos, desabrigados, desaparecidos e por outros tipos de danos, a exemplo da falta de acesso a alimentos. Já a Região Sudeste apresentase como a mais afetada em termos de vidas humanas perdidas e pessoas impactadas. Vejamos mais detalhadamente os três desastres naturais mais recorrentes no Brasil, assim como vamos lembrar de algumas catástrofes que não estão diretamente relacionadas com o meio ambiente ou com o clima, mas que impactaram fortemente nosso país. 1.2 Secas e Estiagens De acordo com a Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, apenas no ano de 2013, 4.433 entre os 5.570 municípios brasileiros foram afetados por desastres, sendo 70,99% deles devido à secas e estiagens. O mapa abaixo nos dá uma noção sobre a concentração desse desastre.


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Figura 6: Mapa Registros de estiagem e secas no Brasil de 1991 a 2012. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 40)

Os números acima apresentados podem ser contrastados com os do Atlas de Desastres Brasileiro (CEPED-UFSC), que mostra, entre os anos de 1991 e 2012, 19.517 registros oficiais de estiagem e seca. Esse número representa 48% do total de 39.837 ocorrências de desastres no Brasil durante o período analisado. O gráfico abaixo mostra sua distribuição entre as regiões brasileiras.

Gráfico 8 Mapa Registros de estiagem e secas no Brasil de 1991 a 2012. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 40)

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Conforme se verifica, a região Nordeste (composta por nove estados, Alagoas, Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe) é a mais afetada por este tipo de desastre, concentrando quase 60% dos registros de ocorrência do fenômeno, atingindo 55.963.164 habitantes, deixando 220.906 casos de enfermidades e resultando em 176 óbitos (CEPED-UFSC, 2013). Segundo o CEMADEN (2013), essa região é especialmente vulnerável devido à grande concentração de estabelecimentos de agricultura familiar, que se constituem por pequenas propriedades que utilizam o sistema de sequeiro, ou seja, sem irrigação. Os impactos da estiagem são manifestados na perda de safras e rebanhos, afetando os demais setores produtivos e a economia regional. Entretanto, observa-se que os estados da região Sul também sofrem com a escassez de água. A região registrou o expressivo número de mais de 550.000 pessoas afetadas. Na região Norte, apesar do baixo número de mortes, registrou-se aproximadamente 85.000 pessoas enfermas como consequência desse tipo de desastre. Convém esclarecer que as enfermidades aumentam à medida que não há acesso a água de qualidade para o consumo humano. “Os períodos de estiagens prolongadas ocasionam a falta de água potável nos poços artesianos residenciais e deixam as represas e os riachos completamente secos” (CEPED-UFSC, 2013, p. 121). A falta de água leva ao consumo de água sem tratamento adequado. Vale registrar que as ocorrências de estiagem e seca tiveram picos nos anos de 1991, 2002, 2003, 2005, 2009 e 2012. 1.3 Enxurradas Conforme falamos anteriormente, as enxurradas são o segundo tipo de desastre com maior registro de ocorrência no Brasil. Sua ocorrência se concentra nas regiões Sul e Sudeste, como pode ser visto no gráfico ao lado.


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Gráfico 9: Distribuição das enxurradas por região brasileira. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 47)

Um dos estados com maior concentração de enxurradas relativas ao seu pequeno tamanho é Santa Catarina. As regiões do Oeste catarinense e Vale do Itajaí somaram 50% de todas as enxurradas registradas no estado, ocorridas principalmente entre 2008 e 2012. Tomemos a região Sul do Brasil como exemplo, para verificarmos os impactos negativos ocasionados por enxurradas no período analisado pelo Atlas.

Gráfico 10: Danos humanos associados às enxurradas na Região Sul. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 49)

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Além dos números assustadores, os dados analisados revelam que o número de registros de enxurradas vem aumentando expressivamente nos últimos anos, passando de uma média de 227 eventos/ano entre 1991 e 2001 para uma média de 504 eventos/ano entre 2002 e 2012. “Este fato chama a atenção para a implementação de medidas preventivas mais eficazes, bem como uma maior atenção aos estados” (CEPED-UFSC, 2013, p. 49). Em novembro de 2008, por exemplo, verificou-se um grande volume de precipitação no Estado de Santa Catarina. As chuvas, que colocaram 60 municípios em situação de emergência e 14 em estado de calamidade pública, deixaram mais de 80 mil pessoas desalojadas e desabrigadas. Houve 110 mortes decorrentes do desastre, sendo 97% dos casos resultantes de soterramento após o deslizamento de encostas. Calcula-se cerca de 429 mil pessoas afetadas e prejuízos estimados pelo Banco Mundial da ordem de R$ 4,75 bilhões (BRASIL, 2017a). 1.4 Inundações A ocorrência de inundações, também chamadas de alagamentos urbanos, está diretamente associada à forma de assentamento urbano adotado pelo ser humano. Como é sabido, assentamentos urbanos encontram-se geralmente localizados em áreas próximas a rios, onde ocorrem planícies de inundação. Com o crescimento desordenado das cidades, têm sido observado um aumento expressivo da intensidade e alcance dos eventos de inundação, assim como de seu impacto sobre a população. Conforme ressalta o CEMADEM (2016), deve-se considerar que, somado à impermeabilização dos solos nas cidades, causada pelo asfaltamento das ruas e pelas construções, ainda há a falta de infraestrutura das cidades e o desmatamento da mata ciliar. Estes últimos dois aspectos favorecem o aumento do volume de vazão das águas e a velocidade de propagação da onda de inundação. As regiões do Brasil mais afetadas são representadas no Gráfico abaixo. Os municípios atingidos até 2012 situam-se, em sua grande maioria, na região Sudeste, com 34% do total dos eventos. Na sequência, tem-se a Região Nordeste com 25%, a Sul com 22%, a Norte com 13% e, por último, a Centro-oeste, com 6%.


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Gráfico 11: Percentual de ocorrências de inundações nas regiões brasileiras. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 53)

De acordo com os dados levantados, os episódios de inundações se distribuem ao longo do ano, de acordo com as características climáticas de cada uma das regiões brasileiras. Enquanto nas regiões Norte, Nordeste e Centro-oeste os eventos ocorrem em maior número entre os meses de janeiro e agosto, na região Sudeste as precipitações concentram-se entre os meses de primavera e verão, ou seja, de setembro a março. Na Região Sul as precipitações são bem distribuídas ao longo do ano, com máximos durante os meses de primavera e verão e picos durante o outono e inverno, entre final de março e final de setembro (CEPED-UFSC, 2013). Vale lembrar que, em 2010, fortes inundações atingiram os Estados de Pernambuco e Alagoas. Nesse último, 20 municípios foram fortemente atingidos, afetando cerca de 269 mil pessoas, sendo 36 mortas, 44 mil desalojadas e 28.500 desabrigadas. As perdas e danos decorrentes das inundações daquele ano totalizaram R$ 1.89 bilhões; cerca de 8% do PIB do estado do ano anterior. Do total estimado, 83% são referentes aos danos (custos diretos do desastre) e 17% correspondem aos custos indiretos das inundações (BRASIL, 2017a). Em Pernambuco, as inundações do mesmo período afetaram 67 municípios, sendo que 42 decretaram estado de calamidade pública ou situação de emergência. As ondas derrubaram casas, hospitais, prédios da administração pública, escolas, estabelecimentos comerciais, pontes, estradas, entre outros. Calcula-se que cerca de 740 mil pessoas foram afetadas, sendo 20 mortas, 86.464 desalojadas e 19.520 desabrigadas. Os prejuízos, da ordem de R$ 3,4 bilhões, correspondem a mais de 4% do PIB

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estadual. Em janeiro de 2011, ocorreu o até então considerado o pior de desastre brasileiro dos últimos tempos: as inundações e deslizamentos da região serrana do Rio de Janeiro. O evento causou 905 mortes em sete cidades e afetou mais de 300 mil pessoas, ou 42% da população dos municípios atingidos e 1,9% da população do estado do Rio de Janeiro. Os prejuízos totais foram estimados em R$ 4,8 bilhões. Entretanto, considera-se que este valor omite impactos importantes em setores como o da educação e o da saúde (BRASIL, 2017a). Os anos de 2019 e 2020 também representaram anos de grandes desastres causados por enxurradas inundações. Nesse período, os estados mais atingidos foram os de Minas Gerais e São Paulo. Vale destacar, conforme salienta do grupo ambientalista Coalização pelo Clima, que não é mais possível aceitar os discursos dos governantes de que as chuvas são inesperadas. A torrencialidade das chuvas é a “nova normalidade climática” (ECODEBATE, 2020). Saiba mais! Para compreender os argumentos trazidos pela Coalização pelo Clima, acesse sua entrevista para o portal de notícias Ecodebates disponível em https://www.ecodebate.com.br/2020/02/26/ eventos-climaticos-considerados-excepcionais-ja-sao-a-nova-normalidade/.

Vale lembrar, ainda, que, geralmente, as inundações e enxurradas estão associadas a um outro tipo de desastre ambiental, os movimentos de massa. Em geral, esses movimentos apresentam maior concentração nas mesorregiões próximas ao litoral, sendo esse fato observado com maior clareza nas regiões Sudeste e Sul. Eles estão associados a um conjunto de fatores, tais como: combinação da alta declividade das encostas, elevados índices pluviométricos, características geológicas e forma de ocupação dos solos (CEPED-UFSC, 2013).


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Gráfico 12: Percentual de ocorrências de inundações nas regiões brasileiras. Fonte: CEPED-UFSC (2013, p. 53)

1.5 Exemplos de Outros Desastres Como já discutimos anteriormente, não apenas os desastres ambientais constituem riscos sobre os quais todo e qualquer gestor deve estar atento e preparado. O Brasil e diversos países do mundo já vivenciaram grandes desastres de proporções assustadoras que nada tiveram a ver com fenômenos da natureza. A maioria desses desastres poderiam ter sido evitados ou, ao menos, ter seus impactos minimizados se houvesse sido adotados os princípios da precaução e da prevenção. Não obstante termos dito que iríamos nos focar nos desastres que estão se amplificando por causa das mudanças climáticas, consideramos extremamente relevante relembrar a grande possibilidade de ocorrência das outras catástrofes. Vejamos, então, alguns exemplos dessas catástrofes ocorridas em nosso país. Um importante desastre de causas tecnológicas foi o episódio de contaminação por radioatividade, ocorrido em 1987, conhecido como acidente com o Césio 137, em Goiânia/GO. Um aparelho utilizado em radioterapias e que estava esquecido dentro de uma clínica abandonada foi encontrado por catadores de um ferro velho. Esse aparelho foi desmontado expondo cerca de 1.000 pessoas aos efeitos do césio, entre as quais 129 apresentaram contaminação corporal interna e externa, desenvolvendo diversos sintomas como (vômitos, náuseas, diarreia e tonturas). Por muitos dias, o caso foi tratado como uma doença contagiosa. Somente depois de

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vários dias foi possível constatar-se que se tratava de uma contaminação radioativa. Oficialmente, quatro pessoas morreram por decorrência direta desse que é considerado o maior acidente radioativo do Brasil e o maior do mundo ocorrido fora das usinas nucleares. Entretanto, calcula-se que o número de mortos supere 80 pessoas. (BRASIL, 2017a; NADAI, 2018). No intervalo de tempo decorrido antes mesmo desse acidente até chegar aos deslizamentos na região serrana do Rio de Janeiro, esse de causas naturais, já reportado anteriormente, diversas tragédias podem ser mencionadas: diversos incêndios em edifícios, boates e comunidades; acidentes aéreos; naufrágios; explosões; entre muitos outros. Entretanto, acreditamos que alguns casos, em que a relação entre o meio ambiente e a ação do homem é facilmente identificada devem ser destacados. Outra catástrofe importante de ser rememorada diz respeito ao rompimento da barragem de rejeitos da Samarco Mineração, controlada pela Vale e pela BHP Billiton, em 2015. A barragem encontrava-se na divisa entre os municípios de Mariana e Ouro Preto, em Minas Gerais. Tratouse de um dos desastres ambientais de maior proporção já vivenciados no Brasil e também no mundo. Entre os principais impactos identificados dessa tragédia encontram-se: 18 mortos e uma pessoa desaparecida; a destruição do Povoado de Bento Rodrigues, com cerca de 600 moradores, quase que totalmente coberto de lama; diversos pequenos povoados afetados pela lama; 39 municípios com abastecimento de água temporariamente interrompido, sendo 35 no estado de Minas Gerais e quatro no Espírito Santo; 644 desabrigados e 716 desalojados; 8.567 outras pessoas direta ou indiretamente prejudicadas; interrupção temporária no fornecimento de energia de quatro usinas hidrelétricas, sendo que a Usina de Candonga sofreu completo assoreamento de seu reservatório; cerca de 1.500 hectares de mata ciliar destruídos; mais de dez toneladas de peixes mortos, afetando centenas de pescadores; 80 km2 de área no mar afetada pela pluma de rejeitos, juntamente com dezenas de quilômetros de ambiente costeiro; queda da arrecadação de cerca de R$4 milhões por mês do município de Mariana, em decorrência da paralisação das atividades de mineração; destruição de obras sacras do século XVIII, que constituíam patrimônio cultural de Bento Rodrigues; impactos sobre a pesca e usos da água para a comunidade indígena de Krenak; paralização das atividades da indústria de papel Cenibra; alta concentração de metais pesados (arsênio, manganês, chumbo e selênio) na foz do rio Doce e no litoral norte do Espírito Santo. Vale ressaltar que o valor do tangível e intangível dos impactos causados sobre os ecossistemas naturais e a perda de biodiversidade ainda estão


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sendo avaliados. A altas concentrações de quatro metais pesados levou o Ministério Público a proibir a pesca na região (BRASIL, 2017a). Em janeiro de 2019, a atividade de mineração foi palco de outra grande tragédia. Dessa vez, uma barragem localidade em Brumadinho, operada pela Vale S.A., também se rompeu. No entanto esse segundo evento se destacou pela quantidade de vidas humanas perdidas: 257 pessoas morreram e 13 seguem desaparecidas. Não obstante o “acidente” ter ocasionado grande perda de vidas animais e de vegetação, com grande impacto negativo à biodiversidade, quase nada se falou sobre isso nesse desastre. A causa identificada do rompimento foi a mesma do ocorrido em Mariana: liquefação, ou seja, perda de resistência da estrutura de forma significativa e repentina. Trata-se, até hoje, da maior operação de busca e salvamento já realizada no país (G1, 2019).

Figura 7: Região afetada pelo rompimento da barragem de Brumadinho (MG) Fonte: Veja

Entre os anos 2000 e 2019, vazamentos de óleo também estiveram entre os exemplos de tragédias ao meio ambiente com causa ou interferência direta ou indireta humana. Em janeiro de 2000, houve o rompimento de um duto que ligava a Refinaria Duque de Caxias ao terminal Ilha D’água, na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro. O episódio ficou conhecido como o vazamento de óleo na Baía de Guanabara e é reconhecido como um dos maiores acidentes ambientais ocorridos no Brasil, visto ter exterminado

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praticamente todo o ambiente marinho da região, afetando diretamente a economia local. Em novembro de 2011, a petroleira norte-americana Chevron foi responsável por um derramamento de grandes proporções de óleo na Bacia de Campos, também no Rio de Janeiro. O vazamento matou diversas espécies marinhas. É preciso mencionar, também, o vazamento de óleo, ainda sem culpados declarados, que chegou a impactar mais de três mil quilômetros de praias, localizadas especialmente no nordeste do país. Entre setembro e dezembro de 2019, 1.009 localidades de 11 estados brasileiros, foram impactadas por toneladas de petróleo cru, na maior tragédia brasileira por derramamento de óleo já registrada. Mais de 5 mil toneladas de resíduos foram recolhidas, mas se desconhece o total do volume derramado que atingiu praias, mangues e áreas marinhas protegidas. As investigações sobre a tragédia, que impactou a vida de centenas de pescadores e prejudicou a cadeia econômica do turismo, seguem em andamento. Todo o ecossistema marinho, incluindo peixes, tartarugas, baleias, frutos do mar, corais, aves e mamíferos aquáticos, foi diretamente afetado (CORREIO BRAZILIENSE, 2020; WWF, 2019). Vale destacar que a atuação do Governo Federal neste caso foi extremamente criticada, especialmente por não ter sido acionado o Plano Nacional de Contingência de Incidentes com Óleo em Água (PNC), criado em 2013. Conforme matéria publicada na Folha de São Paulo, esta inação decorreu, em grande parte, da extinção de comitês ligados ao PNC. Um deles, o Comitê Executivo, seria o responsável pela elaboração de simulados e treinamento de pessoal, assim como por manter recursos para a resposta à emergência (WATANAB e PAMPLONA, 2019).

Saiba mais! Para outros exemplos de tragédias que marcaram a história de nosso país, acesse http://m.acervo.estadao.com.br/noticias/acervo,tragedias-quemarcaram-a-historia-do-pais,70002703878,0.htm ou ainda https://www.bbc. com/portuguese/brasil-47206026 e também https://etica-ambiental.com.br/ desastres-ambientais-do-brasil/

AULA 2. POLÍTICAS DE ENFRENTAMENTO AOS DESASTRES NATURAIS Nesta aula, vamos apresentar a vocês como foram sendo construídas as políticas de enfrentamento aos chamados desastres naturais. Faremos isso começando pelas estratégias internacionais, passando pelas regionais, no


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âmbito da América Latina, até chegar ao Brasil. Daremos maior enfoque ao nosso país, apresentando o modo como se estrutura seu sistema e política de gerenciamento de riscos. 2.1 Atuação Internacional Mais precisamente desde a década de 1960, a ONU vem atuando nos desastres de origem natural. Isto é realizado através de diversas e sistemáticas resoluções. Na década de 1970, foram desenvolvidas ações importantes para a organização da assistência a ser realizada em situações de desastres naturais (IESC-UFRJ, 2013). Entretanto, é a partir da década de 1990 que as ações das Nações Unidas nessa temática tomam um novo rumo, mais ambicioso. Em Assembleia Geral realizada em 22 de dezembro de 1989, a ONU aprovou a Resolução 44/236, que considerou o ano de 1990 como o início da “Década Internacional para Redução dos Desastres Naturais”. De acordo com o IESC/UFRJ (2013), as principais metas da Década Internacional foram: • otimizar as condições que cada país possui para reduzir, com rapidez e eficácia, as consequências dos eventos danosos; • estabelecer diretrizes e estratégias adequadas à aplicação do conhecimento técnico-científico já acumulado sobre o assunto, considerando, no entanto, as características culturais e econômicas de cada nação; • estimular atividades científicas e técnicas tendentes a suprir lacunas críticas do conhecimento; • difundir informações técnicas (já existentes ou futuras) sobre medidas de avaliação, prevenção e diminuição dos efeitos dos desastres naturais existentes; • tomar medidas de avaliação, prevenção e diminuição dos efeitos dos desastres naturais por meio de programas de assistência técnica e transferência de tecnologia, projetos de demonstração e atividades de educação e formação adaptadas ao tipo de desastre e local de sua ocorrência. Muitos são os instrumentos internacionais que regulamentam a gestão do risco de desastres no mundo. Acredita-se que as principais convenções, resoluções e iniciativas relacionadas ao tema sejam, em ordem cronológica (adaptado de IESC-UFRJ, 2013): a) Criação do Banco Internacional de Dados de Eventos de Emergência (EM-DAT) (1988):

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Desenvolvido com o apoio original da Organização Mundial da Saúde e da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional de Assistência a Desastres no Exterior (USAID/OFDA). Contém dados básicos essenciais sobre a ocorrência e os impactos de desastres no mundo, desde 1900 até o presente momento. Os dados são compilados a partir de várias fontes, incluindo agências da ONU, organizações não-governamentais, companhias de seguros, institutos de pesquisa e agências de notícias. Seu objetivo maior é servir aos propósitos de ação humanitária, em nível nacional e internacional. Ele auxilia na racionalização da tomada de decisões, para a preparação aos desastres. Além disto, fornece uma base de informações objetiva para avaliação de vulnerabilidade e estabelecimento de prioridades. b) Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) (1992): Assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, mais conhecida como RIO-92. Nela, 175 países reconheceram a mudança do clima como “uma preocupação comum da humanidade”. A Convenção propõe a elaboração de uma estratégia global “para proteger o sistema climático para gerações presentes e futuras”. c) Agenda 21 Global (1992): Assinada durante a Rio-92, traz aos países participantes o compromisso e o desafio de internalizar, em suas políticas públicas, as noções de sustentabilidade e de desenvolvimento sustentável. Trata-se de um plano de ação para ser adotado em âmbito global, nacional e local, por organizações do Sistema das Nações Unidas, governos e pela sociedade civil, em todas as áreas que a ação humana impacta o meio ambiente. d) Estratégia Internacional de Redução de Desastres (EIRD) (2002): Representa um secretariado que integra várias agências das Nações Unidas, com a função de coordenar, promover e fortalecer a redução do risco de desastres a nível mundial, regional, nacional e local, buscando com isso reduzir os impactos dos desastres. Tem a missão de facilitar e apoiar ações para proteger as vidas humanas e aumentar a resiliência das comunidades. Está sediada em Genebra, na Suíça, com escritórios regionais nas Américas, África, Ásia e Europa. O trabalho da EIRD é realizado em parceria com agências das Nações Unidas, governos, organizações internacionais, atores regionais, ONGs, sociedade civil e setor privado. A busca é a construção de capacidade de resiliência e promover a redução do risco de desastres. Também procura maior ação por parte dos governos, para a redução de risco de desastres promovendo a integração das políticas públicas bem


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como legislação sobre o planejamento para o desenvolvimento sustentável. Observe que a missão da Estratégia é proteger as vidas humanas. Como havíamos dito antes, a preocupação das autoridades, infelizmente, costuma se ater aos impactos diretos sobre o ser humano, ignorando (ou diminuindo em muito) a importância da vida vegetal e animal para a perpetuação das espécies sobre o Planeta Terra. Seria extremamente importante que houvesse uma alteração na forma de pensar e agir sobre os desastres, para incluir a proteção à biodiversidade terrestre. e) Marco de Ação de Hyogo (2005): Resultado da II Conferência Mundial sobre Desastres. Define atividades e medidas políticas para o decênio 2005-2015. É um importante instrumento para a implementação da redução de risco de desastres, adotado por países membros nas Nações Unidas. Seu objetivo é aumentar a resiliência das nações e comunidades diante de desastres visando a redução considerável das perdas ocasionadas por desastres. As cinco áreas prioritárias do Marco de Hyogo para ações e medidas para redução das vulnerabilidades são: (i) redução do risco de desastre como prioridade; (ii) conhecimento do risco e adoção de medidas para a redução do risco; (iii) desenvolvimento de uma maior compreensão e conscientização; (iv) redução dos riscos; e (v) fortalecimento da preparação de respostas eficazes em situações de desastres, em todos os níveis. f)

Global Health Cluster (GHC) (2005):

Composta por 42 organizações humanitárias internacionais conectadas com a resposta de saúde em situações de emergência e crises. Tem a coordenação da Organização Mundial de Saúde (OMS). A visão da GHC é otimizar os resultados de saúde através da coordenação oportuna e eficaz das ações antes, durante e depois das crises. Sua missão é construir um consenso sobre ações prioritárias de saúde na assistência humanitária e reforçar as capacidades de todo o sistema para assegurar uma resposta previsível e eficaz. g) Campanha Mundial de Redução do Risco de Desastres (2010): Denominada “Construindo Cidades Resilientes: minha cidade está se preparando”, a campanha representa um plano de ação em dez passos. Nele, estão incluídos aspectos essenciais para a resiliência da cidade, elaborados tendo como base as cinco prioridades traçadas no Marco de Ação de Hyogo. Considera-se que, se uma cidade alcançar alguns dos 10 passos, estará caminhando para tornar-se mais resiliente e, portanto, mais preparada para reduzir seus desastres. Isto porque, o foco da resiliência a

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desastres refere-se ao trabalho das cidades em “planejar, mitigar, responder, recuperar-se, adaptar-se e crescer após grandes desastres, tendo em conta suas circunstâncias físicas, econômicas, ambientais e sociais particulares” (BRASIL, 2017a, p. 36). O quadro que segue resume os 10 passos previstos na campanha mundial “Construindo Cidades Resilientes”, voltados para gestores públicos locais.

Quadro 4: Passos para tornar a cidade resiliente. Fonte: Brasil (2017b)

h) Declaração (ou Marco) de Sendai (2015): Documento oriundo da Terceira Conferência Mundial da ONU para a Redução de Riscos de Desastres, realizada em Sendai (Japão). Representa o Marco para a Redução de Riscos de Desastres 2015-2030. Seu objetivo é avançar e ampliar nos resultados até então obtidos como o Marco de Hyogo, não apenas reduzindo a exposição e a vulnerabilidade a desastres, mas também evitando a criação de novos riscos. O novo Marco de Sendai, apresenta sete metas globais, quais sejam: 1. Reduzir substancialmente a mortalidade global por desastres até 2030, com o objetivo de reduzir a média de mortalidade global por 100.000 habitantes entre 2020-2030, em comparação com 2005-2015. 2.

Reduzir substancialmente o número de pessoas afetadas em todo o


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mundo até 2030, com o objetivo de reduzir a média global por 100.000 habitantes entre 2020-2030, em comparação com 2005-2015. 3. Reduzir as perdas econômicas diretas por desastres em relação ao produto interno bruto (PIB) global até 2030. 4. Reduzir substancialmente os danos causados por desastres em infraestrutura básica e a interrupção de serviços básicos, como unidades de saúde e educação, inclusive por meio do aumento de sua resiliência até 2030. 5. Aumentar substancialmente o número de países com estratégias nacionais e locais de redução do risco de desastres até 2020. 6. Intensificar substancialmente a cooperação internacional com os países em desenvolvimento por meio de apoio adequado e sustentável para complementar suas ações nacionais para a implementação deste quadro até 2030. 7. Aumentar substancialmente a disponibilidade e o acesso a sistemas de alerta precoce para vários perigos e as informações e avaliações sobre o risco de desastres para o povo até 2030.

Saiba mais! Para conhecer em detalhes o Marco de Sendai, clique em https://www.unisdr. org/files/43291_63575sendaiframeworkportunofficialf.pdf

Além das sete metas acima descritas, o Marco de Sendai também determina quatro prioridades de ação, que, a partir de sua validação, passam a ser: 1.

Compreensão do risco de desastres;

2.

Fortalecimento da governança para gerenciar o risco de desastres;

3.

Investimento na redução do risco de desastres para a resiliência;

4. Melhoria na preparação para desastres, com foco em resposta efetiva e na máxima “Reconstruir Melhor que Antes”. Esta máxima é aplicável às ações de recuperação, reabilitação e reconstrução. Observe-se que, conforme destacado pelo Ministério da Integração (BRASIL, 2017a), na década de 1990 a expressão mais amplamente aplicada

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era “desastres naturais”. A partir da década 2000, passou-se a utilizar o termo “risco” junto ao “desastre”. Isso ocorreu em razão da perspectiva da construção social do risco, que se relaciona com o ser humano – e não com a natureza. Assumindo a existência de riscos, a sociedade assume a responsabilidade de evitá-lo. Assim, “as ações de proteção e defesa civil iniciaram-se com foco em resposta e ao longo dos anos e décadas foram incorporando elementos de prevenção igualmente importantes, saindo do foco nos desastres, para o foco nos riscos” (BRASIL, 2017a, p. 32). As Nações Unidas tiveram um papel primordial para que os governos regionais e nacionais passassem a ampliar sua atuação frente aos riscos. Esta ampliação envolve uma visão de uma gestão sistêmica do risco. Ou seja, trabalha com a articulação de diferentes áreas do conhecimento, profissionais e sociedade. 2.2 Atuação Latinoamericana Considerando-se a localização geográfica do nosso país e também as questões políticas, enquanto espaços de cooperação e possível atuação conjunta, é importante compreendermos como a América Latina se estrutura para o enfrentamento do risco de desastres. Entre as principais estratégias latinoamericanas encontram-se: a) Rede de Estudos Sociais em Prevenção de Desastres na América Latina – La Red (1992): É uma das mais antigas e importantes estruturas que trabalham com a temática de desastres na América Latina. É uma das responsáveis pelas bases do que atualmente se convenciona denominar gestão de risco. Atua prioritariamente em cinco áreas de intervenção: •

Estado, sistemas políticos e prevenção de desastres.

Desastres e modelo de desenvolvimento.

Desastres e cultura.

• Modelos organizativos-administrativos para a prevenção de desastres. • Sistemas de instrumentos para a prevenção, atenção e recuperação a desastres. b) Grupo de Alto Nível Sobre Gestão de Riscos de Desastres (2013): Criado durante a Reunião Ordinária do Conselho de Ministras e Ministros de Relações Exteriores da União de Nações Sulamericanas (UNASUR).


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Tem como propósito identificar elementos chave que possam servir como insumos para a formulação de uma Estratégia Sul-americana para a Redução do Risco de Desastres. O grupo foi estabelecido por representantes de Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Paraguai, Peru, Suriname, Uruguai e Venezuela. Entre os objetivos do grupo destacam-se: • Definir as capacidades, riscos e desafios comuns em matéria de gestão de risco de desastres. • Promover a adoção de mecanismos e protocolos comuns que permitam uma gestão eficaz da assistência humanitária. • Contribuir para a adoção de políticas, estratégias e ferramentas compartilhadas em matéria de redução do risco de desastres. • Promover a cooperação sobre o tema por meio de programas, projetos e outras ações de cooperação sul–sul. • Promover o fortalecimento das capacidades e o estabelecimento de mecanismos e sistemas comuns de avaliação das ações relacionadas a redução do risco de desastres decorrentes de eventos naturais ou induzidos pelo ser humano na região da América Latina e Caribe. • Fomentar o desenvolvimento de programas de redução do risco de desastres que permitam a diminuição dos níveis de risco nas comunidades da região, tendo foco na gestão integrada de bacias hidrográficas. • Impulsionar o desenvolvimento de uma estratégia regional que promova uma cultura de prevenção e resiliência. c) Declaração de Assunção (2016): Estabelecida durante a Primeira Reunião Ministerial e de Autoridades de Alto Nível sobre a Implantação do Quadro de Sendai para a Redução do Risco de Desastres 2015-2030 nas Américas. Afirma a necessidade de se ir além dos acordos internacionais já firmados, para avançar na erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais. Enaltece a indispensabilidade de avaliar os avanços da implementação de políticas de gestão de riscos. 2.3 Atuação Brasileira Segundo documento elaborado pelo Ministério da Integração Nacional (BRASIL, 2017a), o primeiro estabelecimento de uma estrutura governamental no Brasil para fazer frente a desastres foi a criação, em 1960, do Ministério do Interior. A principal razão de sua criação teria sido

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as grandes secas na região Nordeste e cheias na região Sudeste. Entre as funções então estabelecidas estava a assistência às populações atingidas pelas calamidades públicas. Foi também em decorrência das cheias no Sudeste, que o então Estado da Guanabara, hoje Rio de Janeiro, foi a primeira unidade federativa no Brasil a criar um órgão denominado Defesa Civil Estadual. A atuação desses órgãos esteve concentrada em ações resposta e atendimento de populações afetadas, não mais por guerras, mas por calamidades públicas, como inundações, secas e epidemias. Entretanto, foi apenas mais recentemente, por causa das diversas inundações e movimentos de massa (como deslizamentos e desabamentos) ocorridos durante os anos de 2008 e 2011, que provocaram a morte de dezenas de pessoas, é que passou a haver uma grande reformulação no sistema de proteção e defesa civil em nosso país. Mas, antes de compreendermos as mudanças ocorridas, vamos à uma curiosidade: Você sabia que há um símbolo único (Figura, abaixo), no Brasil e em todo o mundo, para representar a proteção e defesa civil?

Figura 8: Símbolo da Proteção e Defesa Civil no Brasil e no Mundo Fonte: BRASIL (2017B)

O triângulo equilátero representa a cooperação de todos. A união de esforços, com o objetivo de proteger a vida. A base desse triângulo representa a segurança e estabilidade. Os dois vértices representam a prevenção e a ação, medidas fundamentais para a proteção de toda a população. Já as mãos que amparam o triângulo representam o cuidado e o amparo à


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população em geral. Até mesmo as cores utilizadas têm um sentido: a azul remete à tranquilidade, ao equilíbrio e serenidade necessárias na realização das atividades de proteção; já o laranja busca traduzir o calor humano e a solidariedade. O histórico da proteção e defesa civil ao redor do mundo está ligado à atuação das nações frente às situações de guerra. No entanto, com o final da Segunda Guerra Mundial, as instituições então criadas foram adequando sua atuação às necessidades da população (BRASIL, 2017a) e passaram a incluir, assim, questões como a gestão de riscos de desastres. 2.3.1 Legislação Brasileira Sobre Desastres Cabe à União legislar sobre desastres, nos termos do art. 22, inciso XXVIII, da Constituição Federal. Seguindo esse preceito, nas décadas de 1990 e 2000, foram editados decretos dispondo sobre a organização do Sistema Nacional de Defesa Civil (Sindec). Um dos movimentos precursores nessa direção foi a criação da Semana Nacional de Redução de Desastres, por meio de decreto, em 2005. Em 1º de dezembro de 2010, foi promulgada a Lei no 12.340, que “dispõe sobre as transferências de recursos da União aos órgãos e entidades dos Estados, Distrito Federal e Municípios para a execução de ações de prevenção em áreas de risco de desastres e de resposta e de recuperação em áreas atingidas por desastres e sobre o Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil”. Mas, de acordo com Viana (2017), a principal normativa a respeito da matéria de desastres no país é a Lei no 12.608, de 10 de abril de 2012. Esta é norma, que, entre outras providências, “institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDec; dispõe sobre o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil – Sinpdec e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil – Conpdec (...)”. O chamado novo Estatuto de Proteção e Defesa Civil reformulou a gestão de desastres no País. Coube a esse documento detalhar as competências dos três entes federados (união, estados e municípios), tratando não apenas de ações de resposta e reconstrução, mas inserindo, também, a prevenção entre as obrigações do Poder Público. Trataremos mais adiante sobre cada um destes conceitos. O importante agora é termos em mente que isso foi realizado visando minimizar os impactos dos desastres, ou mesmo evitálos, quando possível. O artigo 8o do Estatuto confere aos municípios as maiores atribuições em termos de prevenção de desastres. Contudo, ainda de acordo com

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Viana (2017), mesmo com todas as determinações legais existentes, os prefeitos continuam sendo omissos em relação à ocupação de áreas de risco. Isso estaria ligado ao fato de eles raramente serem responsabilizados por desastres provocados por enchentes, deslizamentos de encostas etc. Essa omissão costuma ser diferenciada em casos de grandes desastres que promovem maior comoção popular. Segundo o autor, nessas ocasiões, uma das primeiras atitudes dos governantes é a proposição um projeto de lei ou norma infralegal que busca enrijecer os regramentos acerca das possíveis causas do evento ou até mesmo aumentar as sanções, tanto para os responsáveis por sua ocorrência como para aqueles ligados à fiscalização deficiente ou ausente. Uma outra temática relevante em relação a desastres que é amparada pela legislação brasileira é a saúde. Isso porque, como já vimos, ela é dos fatores mais fortemente impactados em situações de calamidades. O tema foi introduzido de maneira específica pelo Ministério da Saúde como uma das áreas de atuação do Subsistema Nacional de Vigilância em Saúde Ambiental (SINVSA). Esse subsistema é parte integrante do Sistema Nacional de Vigilância em Saúde do Sistema Único de Saúde (SUS). Isto foi realizado através da Instrução Normativa 01, de 7 de maio de 2005. Assim, o setor da saúde passou a contar com o Modelo de Atuação da Vigilância em Saúde Ambiental dos riscos de desastres (Vigidesastres) (IESC-UFRJ, 2013). Cabe destacar a Portaria nº. 372, de 10 de março de 2005, desse Ministério que “constitui a Comissão referente ao atendimento emergencial aos estados e municípios acometidos por desastres naturais e/ ou antropogênicos”. Não podemos, ainda, nos esquecer que, a Constituição Federal brasileira estabelece a “Saúde como direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. Estipula também ser de competência da união “Planejar e promover a defesa permanente contra as calamidades públicas, especialmente as secas e as inundações” (Capítulo II, Título III, artigo 21, inciso XVIII). Mas, voltemos às alterações anteriormente citadas, ocorridas na forma brasileira de fazer frente aos riscos. Entre os anos de 2009 e 2010 foi realizada a 1ª Conferência Nacional de Defesa Civil e Assistência Humanitária. Nela, ocorreram debates para a revisão do então Sistema Nacional de Defesa Civil. A principal demanda era a de criar mecanismos e instrumentos de gestão que favorecessem a prevenção de ocorrências de desastres e a diminuição de seus impactos.


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As discussões não ficaram restritas a um evento fechado. Elas envolveram as universidades e a população, chegando até ao Senado e Câmara dos Deputados. Chegou-se, assim, ao texto da atual Lei Federal 12.608, aprovada em 10 de abril de 2012. De acordo com Brasil (2017a), foi a primeira vez que um ato legal brasileiro estabeleceu diretrizes do agora Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil – SINPDEC através do Poder Legislativo (como Lei Federal) e não mais no Executivo (como decreto ou medida provisória). O SINPDEC, juntamente com a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC) passaram a adotar o termo “proteção”. Essa foi a maneira encontrada para reforçar as demandas identificadas de prevenção, atenção social e redução de vulnerabilidades (BRASIL, 2017a). 2.3.2 O Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC O Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC) é constituído por órgãos e entidades da administração pública federal, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e também por entidades públicas e privadas de atuação significativa na área de proteção e defesa civil. Sua atuação está centralizada na Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil, órgão do Ministério do Desenvolvimento Regional, que é responsável por coordenar o planejamento, articulação e execução dos programas, projetos e ações de proteção e defesa civil. A atuação da Secretaria é descentralizada para órgãos estaduais e do Distrito Federal, em nível estadual, e em órgãos municipais também de proteção e defesa civil e suas respectivas regionais, em nível municipal. Desta forma, os três âmbitos de governo estão envolvidos nas ações de Proteção e Defesa Civil. De acordo com o Ministério de Desenvolvimento Regional (2019), “o SINPDEC poderá mobilizar a sociedade civil para atuar em situação de emergência ou estado de calamidade pública, coordenando o apoio logístico para o desenvolvimento das ações de proteção e defesa civil”. Cabe a ele a implementação da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil. 2.3.3 A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil – PNPDEC A Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC) tem relação direta com outras políticas públicas extremamente relevantes, como: o ordenamento territorial, o desenvolvimento urbano, a saúde, o meio ambiente, as mudanças climáticas, a gestão de recursos hídricos, a geologia, a infraestrutura, a educação, a ciência e a tecnologia e as demais políticas setoriais ligadas à promoção do desenvolvimento sustentável. Todas elas estão diretamente relacionadas à gestão de riscos.

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Seguindo as diretrizes internacionais, nossa PNPDEC estabelece uma abordagem sistêmica para a gestão de risco. Ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação devem ser consideradas em suas relações entre si e jamais de maneira isolada. O conjunto dessas ações é um processo contínuo. Mas, para compreender esse processo, é necessário, inicialmente, conhecer de que tratam as principais ações de defesa civil.

Figura 9: Gestão Integrada em Proteção e Defesa Civil. Fonte: SEDEC/MI (2017, apud BRASIL, 2017b)

Vejamos como o Ministério da Integração conceitua cada uma destas ações: • Prevenção: diz respeito a “medidas e atividades prioritárias, anteriores à ocorrência do desastre, destinadas a evitar ou reduzir a instalação de novos riscos de desastres”. • Mitigação: refere-se às “medidas e atividades imediatamente adotadas para reduzir ou evitar as consequências do risco de desastre”. • Preparação: é entendida como “medidas e atividades, anteriores à ocorrência do desastre, destinadas a otimizar as ações de resposta e minimizar os danos e as perdas decorrentes do desastre”.


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• Resposta: é referente às “medidas emergenciais, realizadas durante ou após o desastre, que visam ao socorro e à assistência a população atingida e ao retorno dos serviços assistenciais”. • Recuperação: refere-se às “medidas desenvolvidas após o desastre para retornar à situação de normalidade, que abrangem a reconstrução da infraestrutura danificada ou destruída, e a reabilitação do meio ambiente e da economia, visando ao bem-estar social” (BRASIL, 2017b, p. 23). Como bem explica o Ministério da Integração (BRASIL, 2017b, p. 18), “mesmo em momentos de recuperação, por exemplo, a perspectiva da prevenção deve estar presente”. De acordo com o documento, é a isso que se refere o Marco de Sendai quando menciona a máxima “Reconstruir Melhor que Antes”, que mencionamos anteriormente. Todas as ações estipuladas na Política brasileira seguem algumas diretrizes básicas: •

Articulação integrada entre União e seus entes federados;

• Gestão que inclua ações de prevenção, mitigação, preparação, resposta e recuperação; •

Prioridade à prevenção e minimização de desastres;

• Adoção da bacia hidrográfica como unidade de análise, em situações específicas; •

Ênfase ao planejamento com base em pesquisas e estudos;

Garantia à participação social (BRASIL, 2017b).

De acordo com o Ministério da Integração Nacional, as diretrizes e estratégias estabelecidas pela PNPDEC seguem uma tendência internacional de se pensar o risco e o desastre como um processo de construção social. Ou seja, é necessário perceber a configuração do risco a partir da visão de planejamento do território. É necessário, então, estar atento às influências históricas, políticas, sociais e ambientais existentes. Esse novo modelo de gestão compreende, por exemplo, que as áreas de risco, especialmente em áreas urbanas, foram se construindo ao longo do tempo, devido a fatores como migrações, dificuldade de acesso à moradia, falta de acesso a recursos técnicos, entre outros. É preciso que estejamos atentos ao fato de que as áreas geralmente rejeitadas ou até mesmo vetadas para o mercado imobiliário, como encostas e várzeas inundáveis, acabam se tornando a única opção

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de moradia para muitos. Essas áreas são, efetivamente, mais vulneráveis a desastres. Portanto, as estratégias de gestão de risco passam a exigir da administração pública um trabalho de fato integrado com outros órgãos. Para trabalhar a prevenção e a mitigação é preciso articular esforços. Esta visão exige, também, que todos os instrumentos de planejamento e gestão devem trabalhar para além da dimensão estrutural. Aspectos como a percepção de risco, a comunicação e a participação devem ser fortemente considerados. Importante notar que o próprio Ministério da Integração (BRASIL, 2017b) reconhece que a adoção desta nova forma de gerir riscos é algo que está sendo adotado de maneira paulatina pelos municípios brasileiros. Especialmente nos municípios pequenos (menos de 70 mil habitantes), considera-se que, de maneira geral, os técnicos que trabalham com defesa civil possuem uma formação estritamente técnica, que dificilmente o permita visualizar as questões de maneira mais ampla. Como pode ser visto, a legislação brasileira segue a proposta encontrada na Estratégia Internacional para a Redução do Risco de Desastres (UNISDR). Esta indica a necessidade de se prevenir ao máximo, evitando totalmente ou parcialmente (quando inevitável a total prevenção) os potenciais danos ligados a riscos de desastres socioambientais (CEMADEN, 2019). Para tanto, a prevenção abrange um conjunto de ações que devem estar interligadas entre si, para poder potencializar sua eficácia: •

identificação, mapeamento e monitoramento do risco;

• medidas estruturais (obras de engenharia, a exemplo de contenção de taludes, implantação de sistemas de drenagem, construção de pontes, de recifes artificiais etc.); e • medidas não estruturais (ligadas às políticas públicas, como planejamento do uso de solo, planos preventivos, processos educativos, formação de lideranças locais etc.). Saiba mais! Para acesso à Lei 12.608 (2012), que institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDC) acesse http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato20112014/2012/Lei/L12608.htm.

Conforme explica o Ministério de Desenvolvimento Regional (2019), o SINPDEC, estabelece os princípios, os objetivos e instrumentos de como a


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gestão de riscos de desastres e a gestão de desastres propriamente ditos serão implementadas no Brasil. Essas gestões têm como propósito “assegurar condições sociais, econômicas e ambientais adequadas para garantir a dignidade da população e garantir a promoção do desenvolvimento sustentável”. Ainda de acordo com o Ministério, a PNPDEC trouxe algumas inovações a exemplo de: • Integração com diversas outras políticas públicas, conforme anteriormente mencionado; • Elaboração e implantação dos Planos de Proteção e Defesa Civil nos três níveis de governo, trazendo metas de curto, médio e longo prazo; • Determinação de um Sistema Nacional de Informações e Monitoramento de Desastres; • Profissionalização e a qualificação dos agentes de proteção e defesa, em caráter permanente; • Criação de cadastro nacional de municípios com áreas suscetíveis à ocorrência de deslizamentos de grande impacto, inundações bruscas ou processos geológicos ou hidrológicos correlatos; • Inclusão nos currículos do ensino fundamental e médio dos princípios da proteção e defesa civil e a educação ambiental. 2.3.4 Programa de Gestão de Riscos e Resposta a Desastres No Brasil, governo incluiu, desde seu Plano Plurianual (PPA) 2012 -2015, um programa especial: o Programa Temático 2040 – Gestão de Riscos e Resposta a Desastres. O mesmo foi mantido no PPA 2016-2019. Entre os principais objetivos trabalhados pelo Programa, que tem entre seus indicadores o número de desalojados e desabrigados provocados por desastres, de municípios com decreto de situação de emergência ou calamidade pública reconhecido pelo governo federal (separando aqueles com apenas estiagem/seca dos demais), e de óbitos provocados por desastres, estão: • Identificar riscos de desastres naturais por meio da elaboração de mapeamentos em municípios críticos (órgão responsável: Ministério de Minas e Energia); • Apoiar a redução do risco de desastres naturais em municípios críticos a partir de planejamento e de execução de obras (órgão responsável: antigo

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Ministério das Cidades, agora Ministério do Desenvolvimento Regional); • Aumentar a capacidade de emitir alertas de desastres naturais por meio do aprimoramento da rede de monitoramento, com atuação integrada entre os órgãos Federais, Estaduais e Municipais (órgão responsável: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação); • Aprimorar a coordenação e a gestão das ações de preparação, prevenção, mitigação, resposta e recuperação para a proteção e defesa civil por meio do fortalecimento do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC), inclusive pela articulação federativa e internacional (órgão responsável: Ministério da Integração Nacional); • Promover ações de resposta para atendimento à população afetada e recuperar cenários atingidos por desastres, especialmente por meio de recursos financeiros, materiais e logísticos, complementares à ação dos Estados e Municípios (órgão responsável: Ministério da Integração Nacional). Saiba mais! Para conhecer a íntegra do Programa 2040: Gestão de Riscos e Desastres, incluído no Plano Plurianual (PPA) 2016-2019 do governo federal acesse o Anexo I do PPA em http://www.planejamento.gov.br/assuntos/planeja/ plano-plurianual

É necessário realizar-se uma verificação mais apurada de como se deu o andamento das ações voltadas ao atendimento dos objetivos desse Programa no PPA 2016-2019. Pelo que pudemos verificar, ao menos até 2017, havia problemas importantes a serem resolvidos. Fiscalização realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) identificou dois problemas, quais sejam: (i) falta de objetividade na priorização dos municípios a serem beneficiados com recursos; e (ii) número elevado de obras atrasadas, paralisadas ou não iniciadas (TCU, 2017). De acordo com o relatório, o uso de critérios inadequados na seleção das propostas de prevenção a desastres estava ocasionando a destinação de verbas para locais menos necessitados e aplicação ineficiente e ineficaz de recursos. O Programa prevê o mapeamento das áreas ambientalmente frágeis, que geralmente são as áreas de preservação permanente, definidas pelo Código Florestal e o seu monitoramento. O objetivo é o controle e fiscalização sobre as ocupações inadequadas de áreas de risco, tornando mais efetiva a


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implementação das leis ambientais e urbanísticas. Dentro das ações previstas no Programa estão os investimentos em intervenções estruturais de caráter preventivo, ou seja, em medidas que, conforme define o CEMADEN (2019), antecedem situações que possam causar impactos negativou aos cidadãos e aos seus bens materiais, à sociedade e ao ambiente. Entre os exemplos dessas ações preventivas estão: • o manejo adequado das águas pluviais mediante novos parâmetros para os projetos de drenagem; • a implantação rápida de usos adequados em áreas onde ocorreu remoção de moradias em situação de risco, evitando-se novas ocupações; • e a criação de parques e áreas de esporte e lazer em APP de margens de rios (BRASIL, 2017a). A gestão de riscos e desastres continua sendo tratada como um programa especial no PPA 2020-2023. Agora, o chamado “Programa 2218 - Gestão de Riscos e Desastres”, tem como diretriz a “Promoção da melhoria da qualidade ambiental, da conservação e do uso sustentável de recursos naturais, considerados os custos e os benefícios ambientais”, estando sob a responsabilidade do Ministério do Desenvolvimento Regional (BRASIL, 2020c). O Programa se apresenta com o objetivo único de “Investir na Compreensão e Redução do Risco, Ampliar a Preparação e Reduzir os Efeitos dos Desastres”, com a meta de “Ampliar de 2,68 para 3,31 a capacidade dos municípios, buscando a preparação frente aos riscos e a resposta aos desastres”. No tocante aos objetivos ligados ao cadastro dos municípios e mapeamento dos riscos, anteriormente mencionados, valem aqui ser destacadas algumas iniciativas: 1. Projeto Mapeamento: “Dados e Análise da Vulnerabilidade a Desastres Naturais para Elaboração de Mapas de Risco e Apresentação de Proposta de Intervenções para Prevenção de Desastres”. O projeto está sendo desenvolvido pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC), em 275 municípios brasileiros já mapeados pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), por meio da “Ação Emergencial de Setorização de Áreas de Risco”. Através dele, pretende-se obter visões de mapas e dados de municípios pertencentes a todos os estados da Federação.

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2. BATER (Base Territorial Estatística de Risco): metodologia Saiba mais! desenvolvida em parceria entre o Para acompanhar o andamento Instituto Brasileiro de Geografia e do Projeto Mapeamento clique Estatística (IBGE) e o CEMADEN, em https://www.mdr.gov. que delimitou novas áreas para br/protecao-e-defesa-civil/ projeto-mapeamento. associação de dados demográficos às áreas de risco. Associa diferentes geometrias de representação, áreas de risco e dados espaciais do Censo Demográfico de 2010, permitindo a obtenção de análises intraurbanas sobre a população exposta ao risco de desastres no Brasil. Seus resultados iniciais foram divulgados em 2018. Dos 872 municípios brasileiros até então monitorados, estima-se que 8.270.127 habitantes e 2.471.349 domicílios privados permanentemente ocupados estavam localizadas em áreas de risco (SOUZA et al, 2019). Já que falamos, no Projeto Mapeamento, sobre a SEDEC, vamos conhecer sua estrutura. Observe-se, em suas coordenações gerais, a existência da visão sistêmica estipulada por nossa Política. Às ações de monitoramento, articulação, prevenção e reconstrução são dados os mesmos pesos.

Figura 10: Estrutura da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC). Fonte: Brasil (2017a, p. 41)

3. Sistema Integrado de Informações sobre Desastres (S2ID) O sistema integra diversos produtos e ferramentas da SEDEC, com o


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objetivo de qualificar e dar transparência à gestão de riscos e desastres no Brasil. Nele, é possível registrar desastres, consultar e acompanhar os processos de reconhecimento federal de situação de emergência ou de estado de calamidade pública, assim como buscar informações sobre ocorrências e gestão de riscos e desastres com base em fontes de dados oficial. Saiba mais! Para conhecer os dados trazidos pelo S2ID acesse https://s2id.mi.gov.br/.

AULA 3. ESTRATÉGIAS E INSTRUMENTOS DE GESTÃO DE RISCOS A gestão de risco, de um modo geral, tem a finalidade de reduzir, prevenir, controlar e gerenciar os riscos de desastres. Essa gestão envolve um conjunto de ações, conforme se observa no quadro abaixo:

Quadro 5: Atividades de Gestão de Risco e Respostas a Desastres. Fonte: CEMADEN (2019, p. 7)

É importante termos em mente que as ações envolvem três fases, quais sejam: •

Antes do desastre (fase preventiva): são realizadas as ações de análise

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e antecipação de riscos e ameaças, buscas de redução das vulnerabilidades, agrupamento de recursos necessários, formalização dos planos de contingenciamento e preparação das equipes para a atuação em casos de emergência. É fundamental que as comunidades também sejam preparadas. • Durante o desastre (fase de resposta ou atendimento): esta é a fase em que os recursos são mobilizados e os planos colocados em ação. Conforme destacado no quadro acima, deve-se dar grande atenção às vidas. • Depois do desastre (fase de reconstrução): é o momento de recuperação e reestabelecimento da ordem. É nesse momento que se busca a reparação dos danos gerais causados ao ambiente. Conforme destaca o Ministério a Integração Nacional (BRASIL, 2017b, p. 34), estas ações de resposta após o desastre podem levar “horas, dias, semanas e até meses, a depender da intensidade do impacto do desastre e da capacidade local para o enfrentamento do evento, para garantir o atendimento das demandas emergenciais”.

Figura 11: Principais ações de resposta a desastres. Fonte: Brasil (2017b, pág. 34)

Como já dissemos, essas ações são de atribuição do poder público nas três esferas governamentais (federal, estadual e municipal), em especial das instituições ligadas ao SINPDEC. Entretanto, elas sempre deverão ser realizadas com apoio da sociedade (CEMADEN, 2019) Aproveitando que falamos sobre as atribuições dos estados, trazemos, apenas a título de exemplo, a tela inicial do Sistema de Defesa Civil do estado do Paraná. Observem que, em um único local de controle, é possível


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encontrar informações sobre ocorrências passadas e seus relatórios, o plano de contingência, com cadastro das áreas a serem monitoradas, os abrigos existentes, recursos disponíveis, dados dos voluntários etc. Isto tudo é parte de um sistema de gestão dos riscos, como veremos em detalhes a seguir.

Figura 12: Tela inicial de sistema de gerenciamento de riscos do Paraná. Fonte: CEPED (2016, pág. 95)

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3.1 Ações de Prevenção Você já deve ter percebido que, quando o assunto é gestão de riscos de desastres, a melhor estratégia é, sem dúvida, a prevenção. Todos (incluindo as autoridades públicas e os tomadores de decisão) devemos fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para, sempre que possível, não permitir que danos ocorram. Segundo a ONU, cada dólar investido em prevenção poupa sete dólares de gastos em reconstrução (IPEA, 2011). A prevenção pressupõe um grande conhecimento sobre os riscos existentes. Por isso, considera-se que um dos grandes desafios, especialmente no Brasil, são o levantamento, o registro e a organização de informações pertinentes à ocorrência de desastres sejam eles naturais, antropogênicos (causados pela ação humana) ou mistos. Uma das formas de tornar isso possível é realizando-se o cruzamento de informações meteorológicas e do mapeamento detalhado das áreas suscetíveis a deslizamentos e inundações. Pelo que vimos, isso vem sendo buscado em nosso país. No entanto, considerando-se a velocidade que vimos presenciando do aumento de desastres naturais, intensificados pelas mudanças climáticas, é necessário um avanço mais efetivo. Especialmente para os territórios com áreas e populações mais vulneráveis. De acordo com o IPEA (2011), para estarem preparados para dar respostas mais rápidas, os municípios precisam: •

elaborar o mapeamento de riscos do seu território;

consolidar um plano de intervenções estruturais;

• organizar seu sistema de defesa civil de maneira a estabelecer estados de alerta efetivos; •

planejar ações de remoção e abrigo, para os casos de necessidade;

reforçar sua capacidade de resposta durante e após desastres.

Para isso ser possível, é imprescindível a realização de cursos de capacitação, e também o repasse de recursos financeiros para assistência técnica na elaboração de planos diretores e setoriais. Estes recursos também devem ser utilizados para a elaboração de mapas de riscos e planos municipais de redução de riscos. Estas estratégias são oferecidas pelo Ministério de Desenvolvimento Regional. 3.1.1 Mapeamento de Riscos Como você viu, a primeira sugestão trazida pelo IPEA é que os municípios


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realizem o mapeamento dos riscos de seus territórios. Essa avaliação de riscos deve ser feita sistematicamente e atualizada regularmente. Além disso, como parece ser claro, ela não pode se restringir aos municípios, mas sim alcançar as esferas mais altas dos governos municipal, estadual e federal. Ter os riscos mapeados irá permitir a minimização dos riscos, ou seja, a formulação de políticas que deem prioridade à sua mitigação. As mudanças climáticas, por exemplo, precisam ser compreendidas pelos formuladores de políticas como uma questão de gestão de riscos. A figura abaixo, além de apresentar um exemplo de mapa da área de risco de movimento de massa (escorregamento de terra com ou sem rolamento de rochas) e enchente (imagem ao centro), traz uma descrição do local, orientações de prevenção, e fotos do trabalho de campo realizado por geólogos, engenheiros, agentes de defesa civil. Observe, no entanto, que os mapas devem ser atualizados com frequência, devido à dinâmica populacional e ambiental. Exemplo de Mapeamento de Risco

Figura 13: Exemplo de Mapeamento de Risco. Fonte: Serviço Geológico do Brasil/CPRM (apud CEMADEN, 2019, p. 9)

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Para definir a área de risco, os técnicos/cientistas precisam: •

identificar qual é o local e o risco;

delimitar a área; e

descrever os locais sujeitos ao risco (CEMADEN, 2019).

No caso do risco geológico, observa-se um conjunto de fatores naturais (relacionados ao perigo) e sociais (principalmente da vulnerabilidade da comunidade local), potencial de dano (humano e material) para analisar o escorregamento de terra e inundações. 3.1.2 Planejamento Urbano A realização de um planejamento urbano efetivo é também uma excelente forma de prevenção de desastres naturais. Conforme ressalta o IPEA (2011), o planejamento deve comportar duas vertentes principais: (i) a ampliação da oferta de terrenos bem localizados, urbanizados e regularizados para a produção habitacional de interesse social em áreas centrais, próximas de fontes de emprego e renda, de forma a combater a retenção especulativa dos terrenos nas áreas centrais e prevenir a formação de novas áreas de risco pela ocupação irregular das encostas e várzeas e (ii) a utilização de cartas geotécnicas de aptidão à urbanização (instrumento que define as áreas de maior suscetibilidade a desastres e estabelece diretrizes para sua ocupação segura, a partir da análise das condicionantes do meio físico – como geologia, geomorfologia, sistema de drenagem natural, vegetação etc.) como base para a elaboração de planos diretores, leis de uso e ocupação do solo, planos de expansão urbana e até mesmo para processos de licenciamento de novos parcelamentos do solo. 3.1.3 Tecnologia e Conhecimento para Prevenção e Respostas Como podem imaginar, a efetividade do planejamento urbano depende de diversos fatores. Entre eles, podemos mencionar a existência de recursos humanos, financeiros e tecnológicos. Para a ONU (2016), a tecnologia tem um papel extremamente relevante nessa atividade. Entre os exemplos de possíveis usos da tecnologia à serviço da prevenção de riscos de desastres estão: • previsão aprimorada de eventos extremos, a exemplo de plataforma web global que está sendo desenvolvida para permitir a prevenção de riscos de terremotos; •

desenvolvimento de práticas da agricultura resistentes a secas;


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construção de edifícios resistentes a terremotos e furações;

• desenvolvimento de medicamentos e vacinas para situações de calamidade em saúde; •

construção de estruturas de contenção de inundações;

entre tantos outros. Curiosidade!

A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia de 2011, realizada anualmente no mês de outubro no Brasil pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, teve como tema principal “Mudanças climáticas, desastres naturais e prevenção de risco”.

A mesma instituição,no entanto,enaltece a importância dos conhecimentos tradicionais e indígenas como base de informação indispensável para a proteção do planeta contra as mudanças climáticas e contra os riscos naturais e aqueles provocados pelo homem (ONU, 2015). E, obviamente, não apenas esses conhecimentos devem ser considerados. É fundamental que toda a população seja envolvida para a construção de sociedades mais sustentáveis e mais resilientes frente aos riscos de desastres. Nesse cenário, conforme destaca o CEMADEN (2019), a educação ambiental representa uma oportunidade imprescindível para a criação de novas frentes de ações voltadas para sustentabilidade, mudanças climáticas, a geração de uma cultura de prevenção de riscos, resiliência, entre outros.A educação, portanto, tem um papel fundamental na redução do risco de desastres, na prevenção, no enfrentamento e na capacidade de adaptação das comunidades locais. Vale destacar, no entanto, que a existência de dados sobre desastres no Brasil proporciona ferramentas adequadas à realidade local para ações efetivas na redução dos riscos. Elas também podem (e devem) direcionar as decisões políticas e técnicas da gestão de risco. No entanto, como destaca o relatório da CEPED-UFSC (2013), é necessário criar uma cultura do risco, ainda inexistente no País. É preciso que os cidadãos estejam preparados para participarem da tomada de decisões. “Esta medida torna-se viável por meio do acesso à informação de qualidade e pela troca de impressões entre os principais agentes sociais, na busca da participação e do envolvimento de todos os setores da sociedade”. (CEPED-UFSC, 2013, p. 122) Tanto uso tanto de tecnologias, quanto a criação e valorização de conhecimentos devem ser utilizados pelos governos para a efetivação de suas estratégias de prevenção e de atuação frente a desastres.

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3.1.4 Sistemas de Monitoramento e Alertas No Brasil, o monitoramento para a prevenção de riscos de desastres está ligado a uma rede formada por diversos institutos e centros de pesquisas, além de instituições federais, estaduais e municipais. Uma das instituições-chave dessa rede é o CEMADEN, que já foi mencionado várias vezes no decorrer de nossa disciplina. Ele é o responsável pela análise de uma diversidade de dados e informações, além de gerar conhecimento que subsidia a emissão de alertas de risco de inundação, enxurradas, movimentos de massa, assim como boletins ligados a ações de mitigação. Vamos dar um exemplo. No caso de análise do risco de movimentos de massa e inundação, um dos fenômenos monitorados é a precipitação, isto é, a quantidade de chuva que caiu em um determinado tempo e lugar. A equipe do CEMADEN é responsável por analisar a quantidade de chuva que cai e que se acumula num determinado local, identificando se pode se configurar um cenário de risco de inundação e/ou deslizamento que cause impactos resultando, assim, em um desastre. Para tanto, também analisa as informações de vulnerabilidade do lugar. Os alertas do CEMADEN são emitidos ao Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres, ligado ao Ministério da Integração Nacional (CENAD), que os encaminha às prefeituras, Defesas Civis Estaduais e Locais. Abaixo, é possível ver quais são as fontes de informação utilizadas pelo CENAD.

Quadro 6: Forma de monitoramento do CENAD por tipo de ocorrência. Fonte: Brasil (2017b, pág. 45)


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Vale mencionar ainda a criação, em 2011, do Sistema Nacional de Alerta e Prevenção de Desastres Naturais, realizado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia. No momento de seu lançamento, a meta do governo federal era fazer com que a tecnologia, capaz de prever esses acontecimentos com pelo menos duas horas de antecedência, funcionasse em todo o país até 2014, conforme informa o IPEA (2011). Entretanto, não se encontram disponíveis as informações acerca desse sistema. Entretanto, cabem aqui ser destacadas as iniciativas individualizadas de governos municipais para terem seus próprios sistemas de alerta. Um dos exemplos encontra-se na cidade de Salvador, Bahia, que criou, em 2017, o Centro de Monitoramento e Alerta da Defesa Civil de Salvador (CEMADEC). Até aquele momento, Salvador era uma das cinco cidades brasileiras que dispõem de um centro de monitoramento próprio. Já que falamos sobre iniciativas individualizadas dos governos municipais, acreditamos ser interessante destacar uma das últimas alterações no sistema de controle de riscos realizada pelo governo da cidade do Rio de Janeiro. Após as inundações ocorridas em 2019, a prefeitura alterou a classificação dos riscos no município, que define os estágios operacionais em caso de chuva ou acidentes graves. Esta alteração se deu com a finalidade de agilizar a ação em casos de catástrofes climáticas (ECODEBATE, 2019b). A partir de 2019, os níveis de alerta passam de três (Normalidade, Atenção e Crise) para são cinco (Normalidade, Mobilização, Atenção, Alerta e Crise), acrescentando-se assim a Mobilização e o Alerta. Os comunicados para a população serão feitos a partir do estágio de Mobilização, ou seja, antes de os problemas se agravarem. Com isso, espera-se melhorar a prevenção e acelerar as respostas aos cenários adversos. Quando se chega ao nível de Alerta, a prefeitura passa a priorizar o gerenciamento da crise propriamente dito. Abaixo, a descrição dos cinco estágios operacionais adotados pelo Rio de Janeiro e como o cidadão deve agir em cada um deles: 1. Normalidade: não há fatores de risco de curto prazo e ocorrências que provoquem alteração significativa no dia a dia do carioca; 2. Mobilização: risco de ocorrência de alto impacto na cidade devido a um evento previsto ou a partir da análise de dados provenientes de especialistas. Não há impactos na rotina, mas cidadãos devem acompanhar os comunicados e redes sociais da Prefeitura; 3.

Atenção: uma ou mais ocorrências impactam a cidade, com reflexos

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relevantes na infraestrutura ou logística urbana, afetando a rotina de parte da população. A partir desse nível, o COR envia aviso aos órgãos, entidades municipais, cidadãos e imprensa; 4. Alerta: uma ou mais ocorrências graves impactam a cidade, causando reflexos graves na infraestrutura e logística urbana, afetando severamente a rotina da população. Os múltiplos danos e impactos causados começam a extrapolar a capacidade de resposta imediata das equipes da Prefeitura. A cidade ainda possui recursos para retornar aos estágios de Atenção e Normalidade, em um período de até 12 horas. 5. Crise: uma ou mais ocorrências graves impactam a cidade, afetando severamente a rotina da população. Os múltiplos danos e impactos causados extrapolam de forma relevante a capacidade de resposta imediata das equipes da prefeitura, que necessitam de período superior a 12 horas para retornar aos estágios de Atenção ou Normalidade.

Figura 14: Impactos de crise climática na cidade do Rio de Janeiro. Foto: Tânia Rêgo/ABr (apud ECODEBATE, 2019b)

3.1.5 Atividades de Respostas a Alertas Uma das atividades fundamentais para a gestão de risco são aquelas direcionadas a preparar a comunidade a lidar com uma situação de desastre.


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De acordo com o CEMADEN (2019), as mais comuns são: • elaboração dos planos de contingência/emergência, considerando todo o conjunto de ações necessários para salvar vidas e evitar danos materiais; •

definição das rotas de fuga;

determinação de formas de comunicação coordenadas e eficientes;

• realização de simulados e treinamentos de desocupação de área, com especial atenção para pessoas com necessidades especiais e atendimento a feridos; •

implantação de sistema de alertas;

• realização de cursos de assistência à comunidade e primeiros socorros; •

organização de kits de emergência;

definição de abrigos;

entre outros.

A defesa civil municipal ou estadual, os bombeiros, o SAMU são as instituições públicas mais indicadas para atuar junto à comunidade local nessa fase de preparação e na resposta num caso de emergência. 3.1.6 Responsabilizações Para Viana (2017), um dos principais fatores existentes para a baixa eficácia da gestão de riscos é a falta de clareza sobre as responsabilizações pelas catástrofes ocorridas. Isso ocorre porque a responsabilidade ambiental não é una. Ela permeia três diferentes ramos do direito – penal, administrativa e civil - com princípios e normas específicos, às vezes até contraditórios. Conforme destaca o autor, a Constituição Federal estipula, em seu art. 225, § 3o, essa tripla responsabilidade. Vamos buscar entender cada uma delas. • Responsabilidade penal: objetiva reprovar condutas violadoras de bens jurídicos considerados os mais importantes para a sociedade. Representa o dever jurídico de responder pela ação delituosa ou criminosa. • Responsabilidade administrativa: busca, pelo exercício do poder de polícia, punir uma conduta do agente público causador do dano que seja contrária ao mandamento administrativo. •

Responsabilidade civil: expressa o dever de reparar um dano

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ambiental ou indenizar por ele. No caso de crimes e infrações administrativas ambientais, tanto o servidor público quanto o agente privado podem ser culpabilizados nos termos da Lei no 9.605, de 12 de fevereiro de 1998 (Lei de Crimes Ambientais – LCA). Eventuais irregularidades no licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades utilizadores de recursos ambientais ou potencialmente causadores de poluição ou degradação ambiental, por exemplo, enquadram o servidor público nos crimes previstos nos artigos 66 a 68 desta lei. Já infrações administrativas estão previstas no art. 70, incluindo a omissão no exercício do poder de polícia. Já o agente privado pode responder pelas penas dos crimes previstos nos artigos 60, 69, 69-A ou de qualquer outra conduta lesiva tipificada na LCA. Viana (2017) ainda destaca que a tripla responsabilidade do servidor público também está prevista no Estatuto do Servidor Público (Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990). Outra norma usada para a responsabilização de agentes públicos é a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992 (Lei de Improbidade Administrativa). O autor destaca, ainda, como pano de fundo da responsabilização advinda dos efeitos dos desastres, o papel desempenhado pelos conselhos de fiscalização profissional de pessoas físicas ou jurídicas. Para ele, também é interessante observar questões ligadas à normalização, uma vez que alguns desastres podem ocorrer justamente pela falta de normas técnicas e legais quanto às unidades de medida, métodos e instrumentos de medição e outros, ou então pela ausência ou deficiência na fiscalização de seu cumprimento. Aqui, cabe lembrar o papel cobrado das instâncias de normalização e fiscalização quando do rompimento das barragens de Mariana e Brumadinho, anteriormente mencionadas. 3.2 Ações de Resposta Conforme falamos anteriormente, nos casos em que a prevenção não foi suficiente e houver a efetivação dos riscos, na forma de desastres, é necessário acionar a segunda fase da gestão de riscos. Entre em vigência a fase da resposta. Vamos compreender mais detalhadamente quais são as principais ações ligadas a essa fase. Observe que as ações aqui mencionadas não são exaustivas. A depender as particularidades de cada situação, novas medidas deverão ser adotadas, tanto pelos poderes públicos quanto pela sociedade.


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3.2.1 Ações de Socorro As ações de socorro são ações entendidas como aquelas que têm por objetivo preservar a vida das pessoas cuja integridade física esteja ameaçada em decorrência do desastre. Destacam-se: •

Busca, salvamento e remoção de vítimas;

Triagem para socorro de múltiplas vítimas;

Primeiros socorros;

Atendimento pré-hospitalar;

Busca de desaparecidos;

Resgate e salvamento de pessoas afetadas;

Assistência médica para a população afetada;

Atendimento médico cirúrgico emergencial;

Desocupação da população da área atingida;

Orientação e informação à população (BRASIL, 2017b, pág. 35).

3.2.2 Ações de Assistência às Vítimas As ações de assistência às vítimas têm por finalidade manter a integridade física das pessoas e restaurar as condições de vida digna daqueles que foram afetados pelo desastre até o retorno da normalidade. Entre elas, ressalta-se: • Instalação de abrigos para pessoas sem condições próprias de habitação; •

Promoção de ações de saúde e higiene pessoal;

Assistências psicossocial e psicológica;

Distribuição de água potável, de alimentação;

Distribuição de cestas de alimentos;

• Distribuição de colchões, de kits de higiene pessoal e de kits de limpeza; •

Distribuição de telhas ou lonas para cobertura de residências;

Gerenciamento de cadáveres e sepultamento;

Gerenciamento de animais domésticos;

Promoção de segurança pública;

Aluguel social temporário (BRASIL, 2017b, pág. 35).

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3.2.3 Ações de Restabelecimento dos Serviços Principais As ações de restabelecimento dos serviços principais têm por finalidade garantir o funcionamento dos serviços essenciais afetados pelo desastre. Quando se fala em Proteção e Defesa Civil, considera-se que os principais serviços considerados essenciais são a trafegabilidade, o saneamento, a comunicação, a saúde e a geração/distribuição de energia. Desta forma, essas ações envolvem: •

Restabelecimento do fornecimento de água potável;

Restabelecimento da oferta de alimentação;

Remoção de escombros e desobstrução das vias de acesso;

Restabelecimento do serviço de saúde;

• Construção de acessos públicos alternativos ou provisórios como alternativa a trechos interrompidos; • Recuperação emergencial de acessos públicos e obras de artes danificadas e/ou destruídas; •

Tratamento emergencial e destinação de resíduos sólidos;

Sepultamento de pessoas ;

• Enterro de animais em locais adequados, segundo normas da zoonose; •

Limpeza e descontaminação de edificações e instalações;

Desinfecção e desinfestação dos cenários de desastres;

Restabelecimento dos sistemas de comunicação;

Regularização de serviços básicos de educação e transporte coletivo;

Vistoria técnica às estruturas atingidas, emissão de laudos técnicos;

Desmontagem de edificações comprometidas;

• Mutirão de recuperação das unidades habitacionais (BRASIL, 2017b, pág. 35). Obviamente, para que qualquer governo esteja preparado para fornecer resposta efetiva a situações de desastres algumas providências mínimas são necessárias, tais como: (i) criação do órgão municipal de proteção e defesa civil; (ii) previsão orçamentária e financeira; (iii) abertura de conta corrente específica para o cartão de pagamento de defesa civil; (iv) capacitação dos agentes de proteção e defesa civil; (v) cadastro no S2ID, sistema de


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informações sobre desastres, anteriormente mencionado; (vi) identificação e catalogação de recursos de suporte (materiais necessários, locais de armazenamento, logística de distribuição, abrigos provisórios, aumento da capacidade de atendimento hospitalar etc.), (vii) cadastramento e Saiba masi! Para obter maior detalhamento sobre as providências a serem tomadas pelos governos frente a situação de desastres, recomendamos a leitura do módulo de capacitação elaborado pelo Ministério da Integração Regional disponível em https://www.mdr.gov.br/protecao-e-defesa-civil/publicacoest

capacitação de voluntários etc. 3.3 Desafios a Serem Enfrentados A experiência e a literatura, a exemplo de Freitas (2014) nos apresentam alguns desafios básicos a serem enfrentados no Brasil. Entre eles, podemos mencionar: • Escassa estrutura física e operacional na maioria dos municípios para gerenciar riscos. • Coordenadorias Municipais de Defesa Civil (Comdecs) inoperantes na maior parte dos municípios brasileiros as. • Necessidade de a sociedade brasileira passar, de fato, a integrar o sistema e defesa e gerenciamento de riscos e desastres; •

Criação de uma cultura de risco;

• Integração de iniciativas populares, da academia, de voluntários e de organizações privadas e não governamentais às estratégias de prevenção e redução de riscos de desastres (ênfase no saber interdisciplinar e no protagonismo social); •

Reconhecimento das dimensões bio-psquico-sociais;

• Cumprimento dos requisitos legais, por parte dos governos municipais, para recebimento dos recursos federais; • Ampliação da utilização de instrumentos de planejamento como Carta Geotécnica de Aptidão à Urbanização, leis específicas que contemple

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a prevenção de enchentes ou inundações graduais, ou enxurradas ou inundações brusca e de Planos Municipais de Redução de Risco. 3.4 Resiliência como Estratégias de Gestão de Riscos Não temos a intenção de esgotar a temática de gestão de imprevistos, riscos e catástrofes. Como deve ter percebido, não só a forma de realizar a gestão vem sendo bastante reformulada, tornando-se muito mais integrada e envolvendo as pessoas, como também devem ser observadas, durante todo o tempo, as características e peculiaridades de cada território. Há, ainda, um outro fator que nos impede de sermos exaustivos. O mundo está vivenciando as mudanças climáticas. Por mais que já tenham sido desenvolvidos diversos modelos de análise de cenários futuros, esses modelos não têm como prever, com exatidão, quais serão os riscos reais a serem enfrentados pela humanidade. E é justamente por isso que muito vem sendo falado sobre a construção de resiliência, ou seja, de ser desenvolvida, para cada comunidade, bairro, cidade, estado ou país a capacidade de resistir ou até mesmo de reconstruir-se após uma situação de desastre. “a resiliência pode ser entendida como a capacidade de um sistema, comunidade ou sociedade expostos a riscos, de resistir, absorver, acomodar-se e recuperar-se dos efeitos de um desastre, de forma oportuna e eficiente, através da preservação e restauração de suas estruturas essenciais e funções básicas”. (UNISDR, 2009, p. 24).

Tanto é assim que a campanha da ONU 2010-2015 para os municípios, anteriormente mencionada, consolidou-se em um guia que recebeu o nome de “Como construir cidades mais resilientes: um guia para gestores públicos locais”. De acordo com esse guia (ONU, 2012, pág. 11), uma cidade resiliente é aquela que: • É um local onde os desastres são minimizados porque sua população vive em residências e comunidades com serviços e infraestrutura organizados e que obedecem a padrões de segurança e códigos de construção; sem ocupações irregulares construídas em planícies de inundação ou em encostas íngremes por falta de outras terras disponíveis. • Possui um governo local competente, inclusivo e transparente que se preocupa com uma urbanização sustentável e investe os recursos necessários ao desenvolvimento de capacidades para gestão e organização municipal antes, durante e após um evento adverso ou ameaça natural. • É onde as autoridades locais e a população compreendem os riscos que enfrentam e desenvolvem processos de informação local e compartilhada com base nos danos por desastres, ameaças e riscos, inclusive sobre quem


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está exposto e quem é vulnerável. • É onde existe o empoderamento dos cidadãos para participação, decisão e planejamento de sua cidade em conjunto com as autoridades locais; e onde existe a valorização do conhecimento local e indígena, suas capacidades e recursos. • Preocupa-se em antecipar e mitigar os impactos dos desastres, incorporando tecnologias de monitoramento, alerta e alarme para a proteção da infraestrutura, dos bens comunitários e individuais – incluindo suas residências e bens materiais –, do patrimônio cultural e ambiental, e do capital econômico. Está também apta para minimizar danos físicos e sociais decorrentes de eventos climáticos extremos, terremotos e outras ameaças naturais ou induzidas pela ação humana. • É capaz de responder, implantar estratégias imediatas de reconstrução e reestabelecer rapidamente os serviços básicos para retomar suas atividades sociais, institucionais e econômicas após um evento adverso. • Compreende que grande parte dos itens anteriores são também pontos centrais para a construção da resiliência às mudanças ambientais, incluindo as mudanças climáticas, além de reduzir as emissões dos gases que provocam o efeito estufa. A obtenção dos resultado só será possível com o esforço e integração de muitos atores relevantes, entre eles, podem ser mencionados: (i) os próprios governos locais, responsáveis não apenas pela liderança do processo e envolvimento dos demais atores, mas também pela elaboração de leis e instrumentos de gestão e seu monitoramento; (ii) de representantes de setores como educação, saúde, transporte, ambiente etc., que integram expressiva parte dos planos de gerenciamento, tendo grandes responsabilidades em seu cumprimento; (iii) da academia e centros de pesquisa, que fornecem dados e análises relevantes; (iv) dos próprios cidadãos e grupos comunitários, incluindo aqui todas as comunidades e populações vulneráveis, que deverão não apenas estar ativamente informados, mas também assumirem responsabilidades individuais frente aos riscos;(v) o setor privado,envolvendo empresas e negócios de todos os portes e segmentos, cumprindo com os regulamentos de segurança e contribuindo com a comunidade na medida de suas possibilidades; (vi) grupos profissionais, a exemplo de avaliadores, engenheiros, arquitetos, planejadores, professores e jornalistas, fornecendo conhecimentos técnicos e especializados relevantes; (vii) a sociedade civil organizada, seja de base comunitária, religiosa ou de qualquer natureza, ajudando a organizar comunidades, coordenar e supervisionar as ações;

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(viii) autoridades e parlamentares dos governos nacionais, apoiando as ações de descentralização de capacidades com recursos, políticas públicas e legislação; e (ix) organizações internacionais, fornecendo cooperação técnica, capacidade de desenvolvimento, recursos, espaços para reuniões e encontros, entre outros tipos de apoio. Como visto, somente com a participação ativa de todos se constroem territórios resilientes. Síntese da Unidade Nesta Unidade, pudemos conhecer melhor os principais riscos de desastres atualmente enfrentados pelo Brasil, assim como seus principais impactos. Para tanto, focamos em seus três tipos principais de “desastres naturais”: secas e estiagens, enxurradas e inundações. Debatemos, também, alguns outros tipos de desastres já ocorridos em nosso país. Na sequência, pudemos compreender como vem sendo a evolução das políticas de enfrentamento a desastres no mundo inteiro, dando ênfase ao Brasil. Aqui, detalhamos as legislações atualmente vigentes, o sistema e a política nacional de proteção e defesa civil utilizadas, assim como o programa de gestão adotado no país desde 2012. Apresentamos, também, alguns dos principais instrumentos já desenvolvidos no país. A Unidade foi finalizada com um aprofundamento das estratégias e instrumentos utilizados para a gestão efetiva de riscos. Como vem sendo tratado em âmbito internacional, aqui também demos destaque à prevenção dos riscos. Essa é - e precisa que continuar sendo - a principal forma de enfrentamento dos riscos. Entretanto, como afirmamos, precisamos ampliar as ações de prevenção, considerando-se que não temos consciência total sobre os tipos de riscos que passaremos a enfrentar por conta das mudanças climáticas. Além disso, é necessário que nossa visão de gestão de riscos considere que há outras vidas (animal e vegetal), para além da humana, também impactadas por desastres.


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Gestão de Imprevistos, Riscos e Catástrofes

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Gestão de Riscos, Imprevistos e Catástrofes Há formas de prevenir os riscos. Entretanto, quando o desastre ocorre, é importante saber como enfrenta-lo. Para isso, muitas estratégias de recomposição de países, cidades e suas populações vêm sendo desenvolvidas, para torná-los mais resilientes.


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