Catálogo da Retrospectiva Luchino Visconti

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RETROSPECTIVA

28 de fevereiro a 14 de marรงo de 2018 CineSesc



Sumario 5

Qual compasso, por Danilo Santos de Miranda

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Uma arte impregnada do passado, por Giscard Luccas

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A vitalidade atemporal dos clássicos, por Sérgio Rizzo

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Visconti e a consciência da História, por Luiz Zanin Oricchio

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A beleza decadentemente historica de Visconti, por Fernando Brito

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A cada um o seu Visconti, por Luiz Carlos Merten

17 FILMES 18 Obsessão 20

A Terra Treme

22 Belíssima 24

Nós, as Mulheres

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Senso Sedução da Carne

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Noites Brancas

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Rocco e Seus Irmãos

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Boccaccio ‘70

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O Leopardo

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Vagas Estrelas da Ursa

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As Bruxas

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O Estrangeiro

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Os Deuses Malditos

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Morte em Veneza

46 Ludwig 48

Violência e Paixão

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O Inocente

52 EXTRAS



Qual compasso O tarde demais não é um acidente que se dá no tempo, é uma dimensão do próprio tempo. Gilles Deleuze Ao longo do século XX, aparatos diversos impactaram a percepção humana, notadamente no que se refere às referências temporais. O cinema ocupou lugar de destaque em tais dinâmicas – sua influência tornou-se peculiar por atuar em momentos de suposta descompressão, nos quais as pessoas estariam especialmente receptivas enquanto ocupavam seus ditos “momentos livres”. Artistas do movimento maquinal, os cineastas exploraram arranjos de tempo até então desconhecidos, suscitando reações encantadas, atarantadas, por vezes horrorizadas. A obra de Luchino Visconti dá contornos preciosos a esse contexto, construindo temporalidades raras. Seus filmes, notabilizados por composições visuais e tessitura dramática eloquentes, manejam peças de clara conotação temporal, sem recorrer a malabarismos formais: história e tradição, ascensão e queda, decadência e morte. Não por acaso, trata-se de um cinema com especial apreço pela música – um cinema do “tarde demais”, segundo o filósofo Gilles Deleuze. Considerando-se tal circunstância, a própria ideia de retrospectiva ganha sentidos inesperados. Propor um olhar em torno da cinematografia completa de Visconti permite ver aquilo que se insinua em cada um dos filmes isoladamente. É o que ocorre com o conjunto da obra de determinados artistas, cujas conexões internas reforçam linhas poéticas não raro subterrâneas. Em nossos hojes plenos de urgência, cabem apenas durações franzinas, pragmáticas, para comprar e vender. É próprio da arte desrespeitar essas constantes: o cinema de Luchino Visconti pensado como contraveneno para um presente perpétuo, empobrecedor. É próprio da ação cultural construir tais possibilidades: espaços para outros tempos, sugerindo o que já se julgava não urgir.

Danilo Santos de Miranda Diretor do Sesc São Paulo

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Uma arte impregnada do passado Giscard Luccas A casa 44 da antiga via Cerva, no centro de Milão, possuía um grande pátio interno, quadrado, onde ergue-se o pinheiro na época de Natal e onde as crianças insanas corriam de patins e bicicleta. Cornucópias, uvas e vinhas virgens ornamentavam os balaústres e caramanchões em seis arcos floridos de rosas que abrem-se para o terraço onde havia antigas árvores, jasmins e rosas que caíam sobre o espelho das águas mortas. Na casa principal, vastas escadas de mármore levavam ao andar nobre e à fileira de grandes salões, salas íntimas, gabinetes de trabalho revestidos de madeira dourada, onde passou toda a nata da sociedade milanesa. Era a morada para o “sonho, o amor e a melancolia.” O palácio dos Visconti di Modrone, na descrição acurada e saudosa de sua irmã Uberta Visconti para a biógrafa francesa Laurence Schifano, já espelha o cenário para as lembranças e escolhas que Luchino Visconti faria em seus filmes e muitas peças de teatro. Os bailes que seus pais ofereciam à sociedade milanesa apareceriam mais tarde em O Leopardo, e a própria história do casamento de seus pais – a mãe, Carla Erba, de família tipicamente burguesa, herdeira de um império de farmácias e laboratórios, a Casa Carlo Elba, e o lado aristocrático com seu pai, o Conde Visconti di Modrone - semelhante ao casamento de Tancredi com Angelica, na novela de Tommaso di Lampedusa. Com mais realidade, ainda, no bombardeio da casa da via Cerva pelos nazistas, onde a família inteira atuou para apagar o fogo e salvar o que foi possível – episódio também vivido por Lampedusa, em 1943. Luchino era visceralmente antifascista – e foi perseguido e preso pela polícia italiana por suas atividades “comunistas” e muito por ajudar a esconder em seus palácios outros perseguidos pelo regime fascista de Mussolini, episódio aventado em Violência e Paixão, quando o velho professor esconde Konrad, interpretado por Helmut Berger, em seu quarto clandestino, fugindo da perseguição neofascista. Visconti, a partir daí, seria o “conde vermelho”. Luchino teve uma infância dourada: freqüentava com seus pais o Scala, os clubes, os bailes e salões culturais da aristocracia. Recebia aulas de pintura, música e literatura – respirou a arte de viver da Belle Époque, desenvolveu o amor à arte e à cultura. Sua mãe empenhava-se em que ele não se tornasse um aristocrata cretino e medíocre. Domingos eram reservados ao cinema com seu pai, no Cinema Centrale, onde Luchino maravilha-se pelos filmes americanos de gângters. A mãe seria um personagem central em sua vida – há extensas referências em sua obra, como os véus idênticos que Laura Antonelli usou em O Inocente, que, embora entre os propostos pela figurinista

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fossem os que menos assentavam na atriz, eram como sua mãe usava nas idas ao Scala: “Longos véus em torno do pescoço, no chapéu”. Em Vagas Estrelas da Ursa, Visconti reserva aquela cena da mãe, ainda pianista, tocando acordes em vão e onde carrega longos colares de pérolas como os com que Carla Erba adorava se enfeitar. Da vida privada nas moradas da infância passa-se ao espaço público, principalmente em Milão, com seus canais, pontes e vielas cheias de neve - como em Noites Brancas - ao contato com o operariado e os trabalhadores migrantes do sul da Itália - e as dificuldades e preconceitos que sofrem, como a família Parondi em Rocco e Seus Irmãos. Está tudo ali, na visão e sensibilidade de Visconti, todos os acontecimentos do íntimo e da cidade, a decadência das famílias, os conflitos da existência, a inocência e, principalmente, o fracasso. Visconti transformou seu passado em arte e poderá ser contemplado em sua magnitude nas exibições dessa retrospectiva, em cópias 35mm cedidas pelo Centro Sperimentale di Cinematografia - Cineteca Nazionale, em Roma e outras em suportes digitais, alguns restaurados em 4K, como O Leopardo, Vagas Estrelas e Rocco. Há oportunidade única de assistir O Estrangeiro, filme que foi renegado posteriormente por Visconti e que nunca foi lançado em DVD e pouco circulou na época nos circuitos cinematográficos. Títulos pouco exibidos, como Obsessão, em que o cineasta vendeu as jóias de sua mãe a fim de financiá-lo, e A Terra Treme, falado em dialeto da região da Catânia, incompreensível para o resto dos italianos, também constarão, filmes que inauguraram o chamado neorrealismo, termo de que Visconti tentou se desgrudar em determinado momento, pois sugeria uma castração de sua liberdade e de possibilidades como artista: “O neorrealismo reuniu aqueles homens que achavam que a poesia nasce da realidade. Era a partida. Mas não quero a etiqueta absurda colocada como tatuagem – ao invés de ser um método, um momento – torna-se fronteira, lei”. Todo esse universo viscontiano expressa-se em suas paixões, sua crueldade com os atores e atrizes, sua fuga da decadência imposta por uma parcela dos críticos e da sociedade italiana, sua luta contra a destruição dos sentimentos e, talvez, o mais importante de seu universo onírico, a busca pelo prazer e pela contemplação da beleza, como em Morte em Veneza, e o conseqüente sofrimento, o castigo e a condenação à morte.

Giscard Luccas é formado em jornalismo pela Faculdade Cásper Líbero. Sócio-diretor e curador da distribuidora de filmes FJ Cines, especializada em filmes clássicos há mais de 50 anos. Ator na companhia teatral Cia de Feitos, especializada em teatro infantil.

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A vitalidade atemporal dos classicos Sérgio Rizzo No extremo norte da ilha de Ísquia, a pouco mais de duas horas de Nápoles, um deslumbrante cenário natural pode ser descortinado a partir de La Colombaia, que um dia foi a residência de verão da família Visconti. Mansão em forma de castelo no alto de um morro à beira-mar, na comuna de Forio, essa vila hospeda, desde 2001, o único espaço cultural inteiramente dedicado à memória do mais célebre dos sete filhos de Giuseppe Visconti (1879-1941), duque de Modrone. Mas a visita pode decepcionar seus admiradores. O túmulo do personagem ilustre e de uma de suas irmãs, Uberta, fica no jardim. Dentro da casa, fotos, quadros, pôsteres e peças de decoração e vestuário relacionados a ele, à sua família e à sua obra espalham-se pelos cômodos. O local mantém ainda uma biblioteca e um bar com piano. Cruzar a ilha até seu extremo leste, para conhecer o Ristorante Visconti, poderá trazer uma sensação de desapontamento semelhante. O cardápio mediterrâneo faz salivar o apreciador da culinária italiana (e alguém por acaso não o é?), mas não há nada ali, a começar pela decoração despersonalizada do salão principal, que traduza a elegância e a sofisticação dos Visconti di Modrone. Parece razoável supor que a visita às pegadas de Luchino Visconti di Modrone (1906-1976) em Ísquia conduziria a um cenário como o de O Leopardo (1963). Na pior das hipóteses, a grandeza de sua obra deveria receber ali uma tradução museológica à altura de sua importância para o cinema e a cultura italianas. Nem uma coisa, nem outra. O tratamento dado a Visconti em Ísquia pode ser compreendido como um emblema do que restou de sua presença magnífica na arte europeia do pós-II Guerra Mundial: uma espécie de deferência quase burocrática a um nome que, embora ainda ecoe fortemente, pertence, para as novas gerações, a um passado empoeirado digno de registro e lembrança, mas não mais do que isso. Pena, porque esses vestígios de um tempo já distante -- seu último filme, O Inocente, foi lançado há mais de quatro décadas -- ajudam a iluminar um dos momentos mais importantes em toda a história do cinema, o neorrealismo italiano, bem como o alvorecer do cinema autoral em uma chave que caminha junto com a noção de espetáculo e com a busca incessante da beleza e do equilíbrio como valores estéticos sublimes. Manter viva a obra de Visconti equivale, portanto, a não perder a referência de um mundo e de uma cultura que se transformaram drasticamente nas últimas décadas, e que relegaram uma arte como a dele a nichos de mercado prestigiados por uma pequena fatia do público, como se fossem iguarias que, a muitos espectadores, sugerem coisa de gente esnobe e pretensiosa.

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Pois é importante lembrar, aos que desconhecem como eram os usos e costumes culturais nos mais de 40 anos em que Visconti trabalhou, que os seus filmes não eram restritos a um gueto. Ao contrário: tinham amplo lançamento internacional, atraíam um numeroso público adulto e foram reconhecidos até mesmo pela Academia de Hollywood -- Os Deuses Malditos (1969) foi indicado ao Oscar de roteiro original, enquanto O Leopardo (1963), Morte em Veneza (1971) e Ludwig (1973) disputaram o prêmio de figurino. Não havia a distinção artificial entre cinema de empenho artístico e cinema de alcance popular -- ainda que, evidentemente, alguns filmes fossem (e ainda sejam) concebidos para serem mais populares do que outros. Para Visconti, assim como para muitos de seus contemporâneos, o espectador médio era capaz de se envolver e de se emocionar com um espetáculo que não o tratasse apenas como uma criança em busca de recompensas emocionais primárias. O neorrealismo italiano esteve na gênese desse movimento fundamental para alçar o cinema à categoria de arte que diz respeito ao mundo em que vivemos e aos dramas que nos ocupam. Não houve movimento que tenha exercido impacto maior sobre o cinema na segunda metade do século 20, num campo de influência que inclui os "cinemas novos" dos anos 1960 (como a Nouvelle Vague francesa e o Cinema Novo brasileiro), o cinema industrial americano e boa parte do cinema autoral minimalista do século 21, aquele mais interessado em se aproximar do real do que em recriá-lo. Visconti, por sua vez, ocupou lugar muito especial na gênese do neorrealismo italiano, com Obsessão, que estreou em Roma ainda durante a II Guerra Mundial, em 16 de maio de 1943, e só chegou ao norte industrializado da Itália no ano seguinte. Era uma adaptação não-creditada do romance policial O Destino Bate à sua Porta, do americano James M. Cain, que ganharia versão oficial nos EUA em 1946, com Lana Turner e John Garfield dirigidos por Tay Garnett. Na adaptação livre de Visconti, participaram dois roteiristas que viriam a se tornar diretores, Giuseppe De Santis (Arroz Amargo) e Antonio Pietrangeli (O Magnífico Traído), e um jovem que experimentava a sorte no cinema antes de se consagrar na literatura, o escritor Alberto Moravia. O elenco trazia os novatos Clara Calamai e Massimo Girotti (que viria a se tornar um dos atores mais prolíficos de sua geração, atuando até pouco antes de morrer, em 2003). Ousado para a época ao abordar adultério, crime e homossexualidade em uma sociedade moral e materialmente devastada pelo fascismo, Obsessão foi apreendido logo depois do lançamento. Era um filme em torno de violência e crueldade, como assinala a biógrafa de Visconti, Laurence Schifano, em O Fogo da Paixão, lembrando um comentário do próprio diretor. "O que me interessa são as situações extremas, os momentos em que uma tensão anormal revela a verdade dos seres humanos", disse ele. "Gosto de afrontar os personagens e a matéria narrativa com dureza, com agressividade." Não se imagine, porém, que a escolha pelo tema refletisse a vida de Visconti naquele momento. "Essa violência estava mais nele do que na realidade que o cercava", afirma Schifano. "Santis e Girotti lembram-se do espantoso clima de paz que parecia reinar então naquela parte da Itália (no vale de Pó e na região de Ferrara, próxima a Bolonha), daquele verão tão quente (o de 1942, quando as filmagens foram realizadas), tão límpido, deslumbrante. E no entanto... nesse mesmo verão, o irmão mais moço de Visconti, Edoardo, também ele uma grande cabeça, fora posto na prisão por ter insultado alemães." Schifano considera que "muitas chaves do universo de Visconti encontram-se nessa obra cruel". "Tudo converge para traduzir uma 'obsessão' pessoal. O amor e a vida como maldição, a morte onipresente (...) esse lento e carnal retorno às fontes da vida, que são também as da morte." Não era apenas o neorrealismo que se apresentava, mas também as coordenadas de uma obra que, seja ao buscar inspiração na literatura, seja em argumentos originais, se alimentava

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de uma sensação de dor ancorada às vezes em um sentimento de inadequação, às vezes na dificuldade de assimilar a passagem do tempo e as transformações trazidas por ela. Visconti encontrou matéria-prima criativa para explorar esses temas muito além do domínio neorrealista, em Dostoiévski (Noites Brancas, 1957), Giovanni Testori (Rocco e seus Irmãos, 1960), Giuseppe Tomasi di Lampedusa (O Leopardo), Albert Camus (O Estrangeiro, 1967), Thomas Mann (Morte em Veneza, 1971) e Gabrielle D'Annunzio (O Inocente, 1976). Esse conjunto o estabelece como um dos grandes mestres de transcriação da literatura para o cinema -- e, entre todos, Morte em Veneza é o que melhor representa a sua capacidade de manter nos filmes o que era essencial nas obras literárias originais sem deixar de torná-los, também essencialmente, viscontianos. Por outro lado, o filho de duque que viria a se transformar em entusiasta do comunismo embebeu seus filmes mais ostensivamente políticos de uma ambiguidade extraordinária -- algo incomum hoje, quando muitos acreditam que, a uma obra de arte, se apresentam somente as opções militantes do "a favor" ou "contra". O olhar de Visconti sobre o Risorgimento, por exemplo, comporta diversas possibilidades de entendimento dos fenômenos que levaram à formação do Estado italiano, no século 19, e às mudanças sociopolíticas decorrentes da unificação dos pequenos Estados que até então compunham a península. Sedução da Carne (1954) e especialmente O Leopardo são exemplos dessas recriações históricas realizadas com base em uma perspectiva multifacetada. O crítico Guido Aristarco, em ensaio publicado com o roteiro de Rocco e seus Irmãos, afirma que "a leitura dos clássicos, dos grandes narradores do século 19, sem dúvida contribuiu para tornar adulto o jovem Visconti, que através deles tomou consciência não só de certos aspectos decisivos da vida mas ainda de uma concepção artística do cinema como narrativa estreitamente ligada ao romance". Aristarco lembra, no mesmo ensaio, que o próprio Visconti admitira que "uma das maiores dificuldades que me pareceram se opor a esse desejo (de fazer cinema) e à ambição de compreender o filme como obra poética foi a constatação da vulgaridade e, se me permitem o termo, da miséria que se encontra frequentemente na base do comum dos roteiros". O ambicioso projeto estético de Visconti procurava também dar conta dessa particularidade, sem prejuízo do aspecto visual e da mise-en-scène; era um realizador de cinema que foi também diretor de teatro e de ópera. Ao estabelecer uma ponte com os clássicos, terminou por criar uma obra que se impõe hoje como clássica, de acordo com várias das propostas que o escritor Ítalo Calvino apresenta em Por que Ler os Clássicos. Um clássico é o que "nunca terminou de dizer aquilo que tinha para dizer", aquele que possibilita a toda releitura ser "uma leitura de descoberta como a primeira" e que "persiste como rumor mesmo onde predomina a atualidade mais incompatível", para citar três das características apontadas por ele. O que de Visconti talvez pareça oculto aos que visitam a antiga vila da família na ilha de Ísquia tem a ver com essa vitalidade atemporal. Quando confinados ao papel de peças de museu, os clássicos transformam-se em obra morta a ser apreciada apenas para lembrar que um dia existiram. Mas, se nos relacionamos com eles segundo o que propõe Calvino, podem se revelar obras vivas, ainda provocantes e, no caso de Visconti, de uma beleza inesgotável.

Sérgio Rizzo é jornalista, mestre e doutor em Audiovisual pela ECA-USP. Apresentador do canal de TV Arte 1, crítico do jornal O Globo, colaborador da Folha de S. Paulo. Professor da FAAP, da Academia Internacional de Cinema, do Colégio Augusto Laranja, da Casa do Saber e do Espaço Itaú de Cinema. Membro dos comitês de seleção do É Tudo Verdade - Festival Internacional de Documentários, da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo e do Festival Internacional de Curtas-Metragens de São Paulo.

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Visconti e a consciencia da Historia Luiz Zanin Oricchio Membro da geração engajada do neorrealismo, Luchino Visconti foi político ao longo de sua obra, de maneira explícita às vezes, implícita outras. Mas se pode dizer que, de ponta a ponta, manteve aquela consciente concepção de seus filmes como “agentes da História”, segundo a fórmula proposta por Marc Ferro para definir o movimento cinematográfico do pós-guerra italiano. Ao longo de sua carreira, Visconti mudou. Mas a inspiração inicial se manteve. Na verdade, Visconti surge antes mesmo do neorrealismo propriamente dito, com seu precursor Obsessão (1943), história de um crime passional (tirada de O Destino Bate à Sua Porta, de James Cain), mas que vai muito além do fait divers em sua “pintura sem concessões do proletariado”, nas palavras do crítico francês Jean Tulard. Por trás da trama escabrosa, em que uma mulher frustrada usa seu amante para se livrar do marido, toda uma realidade italiana se desvela, sem a estilização cosmética habitual do cinema da época. Essa, a sua grande novidade e força. O registro cru despertou a atenção da censura fascista que, no entanto, acabou por liberar a obra. Nos anos seguintes, Visconti roda A Terra Treme (1948), obra poderosa, em tom semi-documental, sobre o duro cotidiano e a pobreza dos pescadores sicilianos, que interpretam a si mesmos. Não se trata de mero registro. Na narrativa, sempre encenada pelos próprios personagens reais, mostra-se a luta de um jovem pescador e sua família para escapar à dominação dos patrões no porto de Catânia. Hipotecam a casa e tentam estabelecer comércio próprio, mas o “sistema” atropela iniciativas individuais. Ambos - Obsessão e A Terra Treme - fariam parte do conjunto de filmes que “escrevem” o manifesto neorrealista, ao lado de Roma, Cidade Aberta (1945) e Ladrões de Bicicleta (1948), de Vittorio De Sica. No entanto, essa consciência da História, acompanhada do desejo de nela intervir, o que define o ato político, aparece de maneira ainda mais exposta em duas das obras-primas do cineasta - Rocco e seus Irmãos (1960) e O Leopardo (1963). Entre os dois, Visconti roda um apenas em aparência inofensivo média-metragem, O Trabalho, parte do filme de episódios Boccaccio 70 (os outros são de Mario Monicelli, Federico Fellini e Vittorio De Sica). Em Rocco e seus Irmãos, Visconti, através da saga da família Parondi, discute a “questão meridional”, cavalo de batalha da desigualdade social italiana, geração após geração. O Sul atrasado versus o Norte desenvolvido. Os preconceitos, o frio, a tristeza, dureza das relações, a dissolução dos laços culturais quando os meridionais, premidos pela sobrevivência, buscam empregos no Norte - tudo está lá, na comovente história da família Parondi, que sai

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da Lucânia para Milão em busca de vida melhor. Do Sul ao Norte: na Itália invertem-se os sinais do percurso que, no Brasil, traz migrantes do Nordeste para o Sudeste desenvolvido. Apesar da geografia, idioma e circunstâncias históricas particulares, são processos bastante semelhantes em suas causas e efeitos. Os Parondi são a mãe (Katina Paxinou) e cinco filhos. Que devem permanecer unidos “como os cinco dedos de uma mão” para que a família siga forte. Mas, como sabem os que conhecem o filme, a cidade grande, com suas exigências e tentações, esfacela esse vínculo familiar de solidariedade. Não de maneira uniforme. Rocco (Alain Delon) é a bondade absoluta e vigilante da integridade familiar ameaçada. Simone (Renato Salvatori) sucumbe à violência. Vincenzo (Spiros Focás) aburguesa-se. Ciro (Max Cartier) é o operário, a consciência sindical, passagem entre a identidade agrária e a proletária. E Luca (Rocco Vidolazzi), o menino, o futuro incerto, que ninguém sabe como entrará no jogo do neocapitalismo instaurado após os anos de guerra. No horizonte da família, o sonho sempre adiado de voltar ao “paese” longínquo, deixado por necessidade e agora convertido em paraíso perdido. Já em O Leopardo prevalece uma reflexão histórica de amplo alcance, embora situada em época e local bem delimitados. É obra que busca no passado a compreensão do presente, entendimento sempre problemático e, no limite, irrealizável. Baseado no romance homônimo de Giuseppe Tomasi di Lampedusa (de origem nobre, como Visconti), trata da ascensão da classe burguesa que desbanca uma aristocracia em declínio. A aliança entre o título nobiliárquico e o dinheiro novo é selada pelo casamento entre o jovem Tancredi (Alain Delon) e Angelica (Claudia Cardinale), celebrado sob o olhar do Príncipe de Salina (Burt Lancaster). Ele é o “Leopardo” decadente, que vê sua classe social e ele próprio envelhecerem e aproximarem-se da morte. Nos dois filmes, Visconti toma casos particulares para evocar movimentos sociais mais amplos. No primeiro, a família que se desintegra para mostrar os efeitos de desenvolvimento desigual em um país tardiamente unificado. No segundo, a substituição de uma classe dominante por outra, com a manutenção do povo explorado e à margem do processo, como se ouve na frase famosa do romance de Lampedusa: “É preciso que tudo mude para que tudo permaneça como está”. No original: “Se vogliamo che tutto rimanga come è, bisogna che tutto cambi”. Trata-se de divisa de valor universal para as classes dominantes. Mudar tudo para nada mudar. Entre Rocco e O Leopardo, Visconti roda o episódio O Trabalho, para Boccaccio 70. Um aparente divertissement, baseado em relato sulfuroso de Guy de Maupassant chamado Au Bord du Lit. O conde Ottavio (Thomas Millian) casou-se, por dinheiro, com a rica e mimada Pupe (Romy Schneider). Estoura um escândalo porque ele é flagrado por paparazzi num bordel de alto custo. Em crise, Pupe resolve encontrar uma ocupação e seu trabalho será cobrar do marido, a cada vez que com ele for para a cama, cachê semelhante ao das profissionais do sexo. Como observa o crítico Lino Micciché (em Cinema Italiano: gli anni ‘60 e oltre, Marsilio Editori, Venezia, 1975), embora bastante fiel ao texto original francês, Visconti introduz uma mudança forte de entonação. Aquilo que em Maupassant era uma história de costumes, leve e um tanto perversa, em Visconti ganha contorno de degradação de classe, tornando-se uma “amarga e desesperada sátira da aristocracia milanesa”. As lágrimas em primeiro plano de Romy Schneider (magnífica como a estouvada e em seguida consciente Pupe) não deixam margem a dúvidas quanto ao caráter deletério imposto pelo cineasta ao relato. Visconti deixa uma pista clara do que pretende. Em um momento da briga entre Ottavio e Pupe, vê-se um livro esquecido no sofá. O título: Der Leopard, em alemão, já antevendo o futuro longa-metragem e no qual o mesmo tema será desenvolvido de maneira mais ampla.

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A decadência de classe será uma constante temática em Visconti porque faz parte do movimento dialético da História. Além de O Leopardo e O Trabalho aparece também na notável adaptação da novela de Thomas Mann, Morte em Veneza (1971). A cena mais tocante é a final, quando a maquiagem de Aschenbach (Dirk Bogarde) se dissolve sob a chuva, devolvendo ao moribundo as feições do velho. Não se trata apenas de um idoso que morre, mas toda uma faceta áurea da burguesia europeia esclarecida. E surge, também, no reencontro com Burt Lancaster em sua penúltima obra, Violência e Paixão (1974). Agora Lancaster é o professor, um colecionador de pinturas. Solitário, sentindo o fim se aproximar, ele consente em alugar o andar de cima de sua casa para uma tempestuosa família, composta por Monica Vitti e seu amante (Helmut Berger), e mais dois adolescentes. Konrad (Berger) é egresso das lutas de 1968 e põe a vida de Il Professore de cabeça para baixo. Ao mesmo tempo, esses intrusos imprimem certa vitalidade a uma existência estática, como a lhe conceder um sursis, uma pequena prorrogação antes do silêncio final. Há esse núcleo duro em Violência e Paixão, o dos ecos das lutas generosas dos anos 60 que se degradam no terrorismo dos 70. Il Professore é anterior a tudo isso. Lutou na 2ª Guerra, acreditou num mundo melhor e agora encontra-se nesse presente que não domina e não entende. Indeciso entre o abrigo de sua sala repleta de obras de arte e o ambiente caótico e ameaçador das ruas. Diz Lino Micciché: “(Konrad) é o núcleo central da história que interessa ao diretor, isto é, transgressão e morte, solidão e danação, passado em dissolução e presente inapreensível”. Essas figuras da decadência (Salina, Aschenbach, Il Professore) colocam alternativamente Visconti nessa relação problemática entre passado e presente, com vistas ao hipotético futuro. Pensando politicamente, estamos longe do otimismo revolucionário que fazia o explorado pescador de A Terra Treme proclamar, do fundo de sua revolta, que o futuro estava ao alcance da mão. Também vai longe da família Parondi, atingida pela tragédia, mas cujos dois membros, Ciro e Luca, talvez completem a transição do agrário ao proletário no contexto do capitalismo italiano do pós-guerra, o que os levará a novas lutas, novos sofrimentos e talvez a alguma esperança. Há algo aí que tensiona essa visão de mundo e se expressa nas obras - sempre magníficas do ponto de vista da mise-en-scène, e por vezes ambivalentes quanto à posição autoral. Essas figuras da decadência são simples alter egos de Luchino Visconti di Modrone, conde de Lonate Pozzolo? Sim e não. Sim, porque Visconti envelhece e sente o estranhamento de um mundo cada vez mais indecifrável. Por outro lado, através de sua arte, transcende essa condição de classe e, quando olha para o passado, não o faz como puro gesto nostálgico, mas de apelo à compreensão. E a esse gesto damos o nome de História. Seria Visconti apenas então o ser dividido, uma consciência infeliz, um nobre de nascença com o coração voltado à esquerda? Um aristocrata politizado, o “conde rosso” (conde vermelho) como o chamavam? Nada mais duvidoso. Transcendendo a limitações de classe ou desilusões com o presente, essas contradições, ou “aporias” (caminhos sem saída) revelam-se férteis como momentos de impasse a se expressarem em sua magnífica filmografia. Obra que não é nem culto ao passado nem reverência ao presente ou confiança cega num futuro promissor, mas dúvida e questionamento político de tudo isso. Luiz Zanin Oricchio é crítico de cinema do jornal O Estado de S. Paulo. Presidiu a Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema (2011-2015). Editor do suplemento Cultura, do jornal O Estado de S. Paulo (2000-2009). Autor dos livros Cinema de Novo – Um Balanço Crítico da Retomada, pela Editora Estação Liberdade (2003), Guilherme de Almeida Prado - um Cineasta Cinéfilo (Imprensa Oficial, 2005) e Fome de Bola – Futebol e Cinema no Brasil (Imprensa Oficial, 2006), além de participação com capítulos e ensaios em diversas obras coletivas.

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A beleza decadentemente historica de Visconti Fernando Brito “...quem quiser ver em profundidade, tem de aceitar o contraditório, nos períodos e nos autores, porque, segundo uma frase justa, ‘é o próprio nervo da vida’.” Antonio Candido “Sempre me trataram como decadente. Assim como Thomas Mann, tenho da decadência uma opinião bastante favorável. Estou imbuído desta decadência.” Luchino Visconti “O conde vermelho”... a mais famosa alcunha de Luchino Visconti di Modrone, conde de Lonate Pozzolo (19061976), fatalmente cruzará o caminho de todos aqueles que se interessarem em conhecer melhor esse fundamental cineasta italiano. O que à primeira vista pode parecer um mero rótulo redutor, bem ao gosto da crônica biográfica mais superficial, demonstra ser, após o contato com o conjunto de sua filmografia, uma qualificação reveladora, pois percebe-se que a contradição que é a própria existência de um nobre comunista – união de duas forças históricas antagônicas – não serve apenas para definir o homem Visconti, mas também a estrutura formal de sua obra, na qual se misturam de forma indissociável outros dois opostos, o realismo e o decadentismo. Portanto, aceitar o contraditório em Visconti, como nos aconselharia o professor Antonio Candido, que aliás foi um grande apreciador do maestro italiano e coautor de um excelente texto sobre Os Deuses Malditos e com quem o escrevinhador dessas linhas teve o prazer de “compartilhar” uma sessão de Sedução da Carne na retrospectiva Esplendor de Visconti; é o primeiro passo para irmos além da narrativa tradicional que divide sua filmografia basicamente em uma fase neorrealista, de Obsessão (1943) a Belíssima (1951), e outra decadentista, de Sedução da Carne (1954) a O Inocente (1976), com o desvio neorrealista de Rocco e Seus Irmãos (1960). Essa divisão destaca erroneamente uma suposta ruptura entre esses dois momentos da criação viscontiniana, enquanto, na verdade, há uma continuidade extremamente coerente, como afirma Carlo Lizzani em seu documentário sobre o cineasta. A sensibilidade decadente com sua visão de mundo pessimista já se fazia presente em Visconti na sua articulação neorrealista assim como o cinema engajado do neorrealismo, ainda que despido de seu imediatismo e transformado em realismo em chave histórica, nunca abandonou o diretor em seus melodramas sobre o declínio da aristocracia europeia nos séculos XIX e XX. Nesse sentido, é interessante notar como Visconti sempre permaneceu fiel aos

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pressupostos daquilo que apresentou como “cinema antropomórfico” em artigo homônimo escrito em parceria com Gianni Puccini para a lendária revista Cinema em 1943, com seu “empenho de narrar histórias de homens vivos: de homens vivos entre as coisas, não as coisas em si” e por nunca ter se prestado a “evasões culposas da realidade” em seus filmes. Sendo assim, a beleza e a opulência estética da obra de Visconti, frutos de sua rica cultura humanista na qual o cinema dialoga brilhantemente com o teatro, a ópera, a música erudita, a pintura e a literatura, não devem ser reduzidas a um esteticismo vazio com seu culto ao belo, a “arte pela arte” tão cara aos decadentistas. O décor, a fotografia e a música em seus filmes não são ornamentos ou penduricalhos para encantar os incautos, pois nunca são destituídos de significado histórico e/ou dramático, subordinando-se sempre às necessidades narrativas. E, voltando uma vez mais ao seu artigo sobre o “cinema antropomórfico”, esses elementos apenas são importantes desde que sirvam para Visconti “encontrar os dados da verdadeira humanidade” de suas personagens. A célebre sequência do baile de O Leopardo é um perfeito exemplo da estética viscontiniana. Tudo ali, da valsa de Giuseppe Verdi à tela A Morte do Justo de Jean-Baptiste Greuze, passando pelos lustres deslumbrantes que provocam os comentários exibicionistas do burguês Don Calogero e o quarto com penicos repletos de excrementos dos convidados, têm função dramática de representar o funeral da aristocracia tradicional italiana personificada pelo príncipe de Salina. Afinal, o que poderia ser o relato subjetivo de um indivíduo em crise por ver a ruína de um mundo que gira ao seu redor e a ascensão de uma nova ordem transforma-se em um registro multifacetado do Risorgimento, o longo processo histórico da unificação da Itália já examinado pelo diretor anos antes em Sedução da Carne. Em Visconti, o interior se funde ao exterior, a subjetividade está fortemente ancorada em sua realidade histórica. Mesmo quando se busca a alienação, o escapismo e o artificialismo, não há como fugir da política e da história, como tragicamente descobre Ludwig II, o rei louco da Baviera. Por fim, retrospectivas completas como esta promovida pelo CineSesc, que nos permitem ver a filmografia de um cineasta em sua totalidade, são ainda mais essenciais no caso da obra de um artista profundamente marxista como Visconti, cuja visão de mundo justamente deve ser apreendida em sua totalidade, para que se possa desnudar os nexos subterrâneos das relações sociais e das forças históricas que formam os cenários percorridos por toda uma fauna de angustiados, decadentes e melancólicos, do vale do rio Pó aos salões refinados da Roma de fin-de-siècle.

Fernando Brito é doutor em Literatura Inglesa pela Universidade de São Paulo, pesquisador, professor e crítico de cinema, colaborou ao longo de sua carreira com diversas publicações, como a Sci-Fi News Cinema e o Jornal do Vídeo, além de proferir palestras e ministrar cursos sobre os mais diversos realizadores e movimentos cinematográficos. Desde 2001, trabalha como curador da Versátil Home Video.

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A cada um o seu Visconti Luiz Carlos Merten Qual é, para o cinéfilo do século 21, principalmente se for jovem, o sentido de redescobrir um autor que pertence à história, como Luchino Visconti? Aristocrata de nascimento, comunista pelo projeto de sua vida, Visconti viveu intensamente a contradição. No final da vida – morreu em 1976, aos 69 anos –, contestado por uma nova geração de críticos e diretores, projetou-se no personagem de Violência e Paixão, e Burt Lancaster, que já havia sido o príncipe Salinas de O Leopardo, gritava, como o próprio Visconti - “Não sou um reacionário.” Com fama de perfeccionista, é impossível imaginar um Visconti atraído pelas novas tecnologias, fazendo filmes baratos. Amava o fausto, a ópera e o melodrama, conhecia profundamente a literatura e o teatro. Doze de seus filmes estarão de volta em película, os restantes em digital, e todos restaurados. Visconti antecipou o neorrealismo com Obsessão e deu ao movimento um de seus mais belos filmes – La Terra Trema. Também foi dos primeiros a se distanciar do neorrealismo, com o painel histórico de Sedução da Carne. Faz parte do folclore viscontiano – para atingir a espessura da neblina que queria para as suas Noites Brancas, e com um custo elevadíssimo, preencheu o espaço entre a câmera e os objetos, os atores, com tule. Nos anos 1960, descobriu a lente zoom e a utilizou com crueza. Cada um terá seu Visconti de preferência. O meu é Rocco e Seus Irmãos, seguido de Vagas Estrelas da Ursa, O Leopardo, O Trabalho, Violência e Paixão, Sedução da Carne, Os Deuses Malditos. Morte em Veneza e Ludwig viraram paradigmas. Visconti encarava a (própria) homossexualidade. Em Rocco, história da desintegração de uma família meridional em Milão, capital do Norte industrializado, o Visconti progressista deveria eleger o irmão que adquire consciência de classe e se engaja no movimento sindical – Ciro. Mas sua câmera é atraída por Rocco, cuja bondade, como diz Ciro, “provoca estragos”. Na verdade, toda a obra de Visconti, seus argumentos originais, as adaptações e até os filmes que não conseguiu concretizar – uma sonhada versão de Em Busca do Tempo Perdido –, é profunda e pungentemente autobiográfica. E se ele sempre narrou as derrotas e descreveu as almas solitárias e os destinos destroçados pela realidade, cada filme escondia sempre outro, que ele nunca fez, sobre a grandeza e decadência da família Visconti.

Luiz Carlos Merten é crítico de cinema do jornal O Estado de S. Paulo. Trabalhou no Diário de Notícias, Folha da Manhã e Diário do Sul, em Porto Alegre. Autor do livro Cinema – Entre a realidade e o artifício (editora Artes e Ofícios).

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Filmes

Luchino Visconti durante as filmagens de ViolĂŞncia e PaixĂŁo.


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Obsessao

Gino Costa (Massimo Girotti) é um desocupado que entra no bar de Bragana (Juan de Landa) e acaba se insinuando para a mulher dele, Giovanna (Clara Calamai). De comum acordo, ela e Gino planejam a morte de Bragana, simulando um acidente de carro, que acaba levantando suspeitas da polícia. O relacionamento entre os dois amantes entra em crise, com o medo de Giovanna de que ele possa se desinteressar dela a qualquer momento. Ela ajuda Gino a cuidar do restaurante, mas o clima de desconfiança se acentua. Baseado no romance O Destino Bate à sua Porta, de James M. Cain.

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Ossessione. Itália, 1943. 142 minutos. 35mm. 14 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Luchino Visconti, Mario Alicata, Giuseppe De Santis, Gianni Puccini, Alberto Moravia, Antonio Pietrangelli Elenco: Clara Calamai, Massimo Girotti, Juan de Landa, Dhia Cristiani, Elio Marcuzzo, Vittorio Duse, Michele Riccardini

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A Terra Treme

Na adaptação para o cinema do romance I Malavoglia, de Giovanni Verga, falado em dialeto siciliano e com atores não profissionais, Visconti cria um quase documentário para narrar a história do pescador ‘Ntoni Valastro (Antonio Arcidiacono), que se rebela contra os atacadistas de peixe no povoado de Aci Trezza, e hipoteca a casa para se tornar independente com sua família. Mas, durante uma pescaria promissora, perde o barco em uma tempestade, é obrigado a vender o peixe a um preço vil e não tem mais como recuperar a casa, tornando-se odiado no povoado e vendo sua família se dispersar. Vencedor do prêmio internacional do Festival de Veneza.

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La Terra Trema. Itália, 1948. 160 min. 35mm. Livre. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Antonio Pietrangeli e Luchino Visconti Elenco: Antonio Arcidiacono, Giuseppe Arcidiacono, Giovanni Greco, Agnese Giammona, Nelluccia Giammona, Nicola Castorino, Rosario Calvagno, Lorenzo Valastro, Rosa Costanzo

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Maddalena Cecconi (Anna Magnani) inscreve a filha, Maria (Tina Apicella), em um concurso que vai eleger a mais bela criança de Roma e que atuará em um filme do diretor Alessandro Blasetti (interpretado por ele próprio). Maddalena se sacrifica para pagar um fotógrafo, uma professora de balé e de recitação, costureira e cabeleireira para aumentar as chances da menina. Contraria o marido (Gastone Renzelli), que não concorda com essa obsessão, e enfrenta a difícil concorrência de centenas de mães, que também lutam pela chance de estrelato de suas filhas. E a pressão sobre a criança se torna brutal.

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Bellissima. Itália, 1948. 114 min. 35mm. Livre. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, Francesco Rosi e Luchino Visconti (a partir de uma ideia de Cesare Zavattini) Elenco: Anna Magnani, Walter Chiari, Tina Apicella, Gastone Renzelli, Tecla Scarano, Arturo Bragaglia, Lola Braccini, Liliana Mancini, Alessandro Blasetti, Mario Chiari

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MOVIETIME SRL


Nos as Mulheres

Filme composto por cinco episódios (incluindo um prólogo, dirigido por Alfredo Guarini), idealizado por Cesare Zavattini, nos quais uma atriz interpreta a si mesma no dia a dia, com direção de quatro cineastas: Alida Valli, por Gianni Franciolini; Ingrid Bergman, por Roberto Rossellini; Isa Miranda, por Luigi Zampa; e Anna Magnani, por Luchino Visconti. No episódio de Visconti, Anna Magnani pega um táxi a caminho do teatro onde vai se apresentar e se nega a pagar um adicional pelo transporte de seu cachorro. Ela reclama para um policial, mas ele a multa por não possuir licença para condução do animal. Mas o caso ainda está longe de ser solucionado.

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Siamo Donne. Itália, 1953. 95 min. 35mm. 12 anos. Episódio Anna Magnani Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico e Luchino Visconti Elenco: Anna Magnani, Alida Valli, Ingrid Bergman e Isa Miranda

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PATRIZIA MEZZOGORI


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Senso Seducao da Carne Durante a luta pela reunificação da Itália, em meados do século XIX, quando Veneza ainda estava sob ocupação da Áustria, a condessa Livia Serpieri (Alida Valli), casada com o conde Serpieri (Heinz Moog), apaixona-se pelo tenente austríaco Franz Mahler (Farley Granger), a quem entrega o dinheiro destinado ao esforço de guerra dos patriotas italianos, que lhe havia sido confiado por seu primo, o marquês Ussoni (Massimo Girotti). À custa de trair seu país, Livia continua fiel ao amante e tenta, mesmo assim, protegê-lo, temerosa de que a vitória italiana coloque sua vida em risco. Baseado em conto homônimo de Camillo Boito.

CRISTALDI FILM

CRISTALDI FILM

Senso. Itália, 1954. 123 min. 35mm. 12 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico e Luchino Visconti (com a colaboração de Carlo Alianello, Giorgio Bassani, Giorgio Prosperi, Tennesse Williams e Paul Bowles) Elenco: Alida Valli, Farley Granger, Massimo Girotti, Heinz Moog, Rina Morelli, Marcella Mariani, Christian Marquand, Tonio Selwart, Sergio Fantoni

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CRISTALDI FILM


Noites Brancas

Mario (Marcello Mastroianni) é um jovem e solitário empregado transferido para a cidade de Livorno, onde encontra Natalia (Maria Schell) durante seus passeios noturnos. Arredia, ela acaba lhe confidenciando que está apaixonada por um homem (Jean Marais), inquilino de sua avó, que não vê há um ano, mas que prometeu reencontrá-la naquele local. Apaixonado pela moça, Mario consegue encontrá-la mais vezes, na esperança de que supere o antigo amor, mas a possibilidade de retorno do misterioso inquilino está sempre presente. Baseado no conto homônimo de Fiódor Dostoiévski, ganhou o Leão de Prata de melhor direção no Festival de Veneza.

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CRISTALDI FILM

Le Notti Bianche. Itália, 1957. 102 min. 35mm. 14 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, e Luchino Visconti Elenco: Maria Schell, Marcello Mastroianni, Jean Marais, Clara Calamai, Marcella Rovena, Dirk Sanders

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CRISTALDI FILM


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Rocco e Seus Irmaos

Com a morte do marido, Rosaria (Katina Paxinou) parte da Lucânia, região pobre do sul da Itália, para Milão com quatro filhos: Simone (Renato Salvatori), Rocco (Alain Delon), Ciro (Max Cartier) e Luca (Rocco Vidolazzi). Eles vão se reunir com Vincenzo (Spiros Focás), o irmão mais velho, que migrou primeiro para o norte rico e industrializado em busca de um futuro melhor. Simone, que sonha vencer na vida como pugilista, se envolve com uma prostituta, Nadia (Annie Girardot), que o troca por Rocco, o mais suave e terno dos irmãos, e termina sendo pivô da tragédia que marca a vida dos dois e dela própria.

INTRA MOVIES

INTRA MOVIES

Rocco e i Suoi Fratelli. Itália, França, 1960. 177 min. DCP 4K. 14 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Luchino Visconti, Suso Cecchi d’Amico, Pasquale Festa Campanile, Massimo Franciosa, Enrico Medioli Elenco: Alain Delon, Katina Paxinou, Renato Salvatori, Max Cartier, Rocco Vidolazzi, Spiros Focás, Annie Girardot, Roger Hanin, Paolo Stoppa, Suzy Delair, Claudia Cardinale, Corrado Pani, Adriana Asti, Claudia Mori

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Boccaccio 70

Filme com quatro episódios, dirigidos por Mario Monicelli (Renzo e Luciana), Federico Fellini (As Tentações do Dr. Antonio), Vittorio De Sica (A Rifa) e Luchino Visconti (O Trabalho), tendo como pano de fundo a sátira ao moralismo e ao puritanismo dos anos 1960, conceitualmente inspirado em Giovanni Boccaccio, autor de Decameron. No episódio dirigido por Visconti, Pupe (Romy Schneider) que teve sua conta bancária bloqueada pelo pai, passa a cobrar do marido, o conde Ottavio (Tomas Milian), pagamento por sexo. A exigência começa como um jogo bizarro, mas Pupe passa a acreditar que as relações matrimoniais são uma forma de prostituição. Baseado no conto Au Bord du Lit, de Guy de Maupassant.

SURF FILM SRL

SURF FILM SRL

Boccaccio ’70. Itália, França, 1962. 205 min. DCP. 14 anos. Episódio O Trabalho (Il Lavoro) Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico e Luchino Visconti Elenco: Romy Schneider, Tomas Milian, Romolo Valli e Paolo Stoppa

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SURF FILM SRL


O Leopardo

Baseado no romance de Giuseppe Tomasi di Lampedusa, drama histórico, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, mostra a chegada dos revolucionários de Giuseppe Garibaldi à Sicília e seu impacto na nobreza local, que teme perder privilégios. Em 1860, a notícia do desembarque das forças revolucionárias em Marsala interrompe as orações no palácio do príncipe Fabrizio di Salina (Burt Lancaster). Tancredi (Alain Delon), seu sobrinho, se alista nas fileiras garibaldinas e Salina vê na iniciativa uma forma de manter seus privilégios. Percebe também a ascensão da burguesia, na figura do prefeito dom Calogero (Paolo Stoppa), e atua para unir seu sobrinho à filha dele, Angelica (Claudia Cardinale).

TWENTIETH CENTURY FOX / PARK CIRCUS LTD

TWENTIETH CENTURY FOX / PARK CIRCUS LTD

Il Gattopardo. Itália, França, 1963. 186 min. DCP 4K. 12 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, Enrico Medioli, Pasquale Festa Campanile, Massimo Franciosa e Luchino Visconti Elenco: Burt Lancaster, Alain Delon, Claudia Cardinale, Paolo Stoppa, Rina Morelli, Serge Reggiani, Romolo Valli, Leslie French, Ivo Garrani, Lucilla Morlacchi, Pierre Clémenti, Giuliano Gemma

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TWENTIETH CENTURY FOX / PARK CIRCUS LTD


Vagas Estrelas da Ursa Sandra (Claudia Cardinale) e o marido, Andrew (Michael Craig), partem de Genebra para um breve retorno à cidade de Volterra, na Toscana, para uma homenagem ao pai dela, morto num campo de concentração nazista durante a II Guerra. A volta ao antigo palacete da família, o reencontro com a mãe (Marie Bell), internada em uma clínica psiquiátrica, o padrasto (Renzo Ricci) e a chegada do irmão, Gianni (Jean Sorel), deixam-na perturbada. Suspeitas sobre a deportação do pai e a revelação de um segredo oculto no passado da família aumentam a tensão do encontro, com desdobramentos imprevisíveis.

SONY / PARK CIRCUS LTD

SONY / PARK CIRCUS LTD

Vaghe Stelle Dell’Orsa. Itália, 1965. 105 min. DCP 4K. 16 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, Enrico Medioli e Luchino Visconti Elenco: Claudia Cardinale, Jean Sorel, Michael Craig, Marie Bell, Renzo Ricci, Fred Williams, Amalia Troiani

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SONY / PARK CIRCUS LTD


As Bruxas

Filme com cinco episódios, dirigidos por Mauro Bolognini (Senso Cívico), Vittorio De Sica (Uma Noite Como as Outras), Pier Paolo Pasolini (A Terra Vista da Lua), Franco Rossi (A Siciliana) e Luchino Visconti (A Bruxa Queimada Viva). No segmento de Visconti, Gloria (Silvana Mangano) é uma atriz que decide fugir do assédio dos jornalistas e paparazzi e se hospeda num chalé da amiga Valeria (Annie Girardot), que festeja seu aniversário de casamento. Gloria é cortejada por dois homens, um dos quais é o marido de Valeria (Francisco Rabal), e joga com a rivalidade despertada entre eles. Após um desmaio, Gloria se dá conta de que está grávida.

PARK CIRCUS LTD

PARK CIRCUS LTD

Le Streghe. Itália, França, 1967. 111 min. 35mm. 14 anos. Episódio A Bruxa Queimada Viva (La Strega Bruciata Viva) Direção: Luchino Visconti Roteiro: Giuseppe Patroni Griffi (em colaboração com Cesare Zavattini) Elenco: Silvana Mangano, Annie Girardot, Francisco Rabal, Massimo Girotti, Elsa Albani, Clara Calamai, Leslie French, Helmut Berger

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PARK CIRCUS LTD


O Estrangeiro

Na adaptação do romance homônimo de Marcel Camus, ambientado na Argélia colonial, Marcello Mastroianni é Meursault, francês de origem argelina que recebe a notícia da morte da mãe, que vivia em uma clínica. Sua indiferença diante do corpo choca os funcionários. No dia seguinte, Mersault reencontra Marie (Anna Karina), uma antiga colega de trabalho, e testemunha em favor de Raymond (Georges Géret), acusado de agredir a amante, despertando o desejo de vingança por parte de alguns árabes. No confronto que culmina com a morte de um deles, Meursault se vê envolvido em um processo no qual o que menos interessa é a punição pelo crime.

ÉDITIONS GALLIMARD

ÉDITIONS GALLIMARD

Lo Straniero. Itália/França, 1967. 104 min. 35mm. 14 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Luchino Visconti, Suso Cecchi d’Amico e Georges Conchon (em colaboração com Emmanuel Roblès) Elenco: Marcello Mastroianni, Anna Karina, Georges Wilson, Bernard Blier, Alfred Adam, Georges Géret, Jacques Herlin, Mimmo Palmara, Bruno Cremer

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ÉDITIONS GALLIMARD


Os Deuses Malditos

Ambientado na Alemanha durante o período nazista, com referências a Macbeth, de William Shakespeare, drama aborda a decadência da família Von Essenbeck, industriais do ramo siderúrgico. Em 1933, o patriarca Joachim von Essenbeck (Albrecht Schoenhals) reúne a família para passar a direção da siderúrgica ao oficial da SA Konstantin (Reinhard Kolldehoff), num gesto para agradar ao partido nazista. Indignado, o liberal Herbert Thallman (Umberto Orsini) se demite e se refugia no exterior. No mesmo dia, Joachim é assassinado e as suspeitas recaem sobre Herbert. Mas há mais interesses na morte de Joachim que envolvem a família Von Essenbeck.

DIVULGAÇÃO

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La Caduta Degli Dei. Itália, Alemanha, 1969. 156 min. DCP. 18 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Nicola Badalucco, Enrico Medioli e Luchino Visconti Elenco: Dirk Bogarde, Ingrid Thulin, Helmut Griem, Helmut Berger, Renaud Verley, Umberto Orsini, Reinhard Kolldehoff, Albrecht Schoenhals, Florinda Bolkan, Charlotte Rampling, Nora Ricci

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DIVULGAÇÃO


Morte em Veneza

Na adaptação do romance homônimo de Thomas Mann, o musicista Gustav von Aschenbach (Dirk Bogarde) está hospedado, em 1911, em um hotel no Lido de Veneza para se restabelecer de uma crise de estresse. Nos salões do hotel e na praia, se depara com o adolescente Tadzio (Björn Andrésen), filho de uma nobre polonesa, e fica encantado com sua beleza. Seus olhares são percebidos e correspondidos de forma ambígua pelo rapaz, em um jogo secreto que só faz aumentar a paixão despertada no músico. Abalado, Gustav decide deixar a cidade. Mas, a pretexto de um contratempo com a bagagem, retorna quando são descobertos sinais de uma epidemia.

PARK CIRCUS LTD / WARNER BROS

PARK CIRCUS LTD / WARNER BROS

Morte a Venezia. Itália, 1971. 130 min. 35mm. 16 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Luchino Visconti e Nicola Badalucco Elenco: Dirk Bogarde, Silvana Mangano, Björn Andrésen, Romolo Valli, Nora Ricci, Mark Burns, Marisa Berenson, Carole André, Leslie French, Antonio Appicella, Franco Fabrizi

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PARK CIRCUS LTD / WARNER BROS


Ludwig

Versão restaurada do filme, que recupera a montagem inicial de quatro horas de duração idealizada pelo diretor, acompanha a trajetória de Ludwig II, o Rei Louco da Baviera, morto aos 40 anos em circunstâncias misteriosas. Coroado em 1864, Ludwig (Helmut Berger) é mecenas do compositor Richard Wagner (Trevor Howard) e nutre uma paixão platônica pela prima Elisabeth (Romy Schneider), imperatriz da Áustria. Dois anos depois, com a entrada da Baviera na guerra austro-prussiana, contra sua vontade, Ludwig encontra oposição por ser considerado excêntrico. Envergonhado por sua decadência, busca refúgio nas artes e tem sua capacidade mental questionada por opositores palacianos.

DIVULGAÇÃO

COMPASS FILM SRL

Ludwig. Itália, França, Alemanha, 1973. 238 min. 35mm. 14 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Luchino Visconti e Enrico Medioli (em colaboração com Suso Cecchi d’Amico) Elenco: Helmut Berger, Romy Schneider, Trevor Howard, Silvana Mangano, Helmut Griem, Gert Fröbe, Izabella Telezynska, Umberto Orsini, John Moulder-Brown, Sonia Petrova, Folker Bohnet, Heinz Moog, Adriana Asti, Marc Porel, Nora Ricci, Mark Burns

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COMPASS FILM SRL


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Violencia e Paixao ^

Um velho professor (Burt Lancaster), colecionador de pinturas que retratam grupos familiares, vê seu modo de vida austero e sua intimidade alterados ao alugar para a marquesa Bianca Brumonti (Silvana Mangano) um apartamento de sua propriedade no andar superior ao seu. Bianca instala ali seu amante, Konrad (Helmut Berger), e a filha Lietta (Claudia Marsani) com seu namorado, Stefano (Stefano Patrizi). A vulgaridade dos inquilinos incomoda o professor, mas a personalidade de Lietta e de Konrad, que possui um passado de ativismo político, acaba aproximando-o da família. Mas essa convivência será abalada por um conflito inesperado, desencadeado por Stefano.

MINERVA PICTURES

MINERVA PICTURES

Gruppo di Famiglia in un Interno. Itália, França, 1974. 121 min. 35mm. 16 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, Enrico Medioli e Luchino Visconti Elenco: Burt Lancaster, Silvana Mangano, Helmut Berger, Claudia Marsani, Stefano Patrizi, Elvira Cortese, Romolo Valli, Dominique Sanda, Claudia Cardinale

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MINERVA PICTURES


O Inocente

Inspirado no romance de Gabriele D’Annunzio e ambientado na sociedade aristocrática do século XIX, Tullio Hermil (Giancarlo Giannini) mantém um casamento apenas formal com Giuliana (Laura Antonelli), que aceita sem demonstrar reação o relacionamento do marido com a amante, a condessa Teresa Raffo (Jennifer O’Neill). Num período de ausência dos dois, Giuliana conhece o escritor Filippo d’Arborio (Marc Porel), com quem também se envolve. Sentindo que está perdendo a mulher, Tullio se reaproxima e propõe a reconciliação. Quando tudo parece caminhar para uma nova e estável vida conjugal, Tullio descobre que a mulher está grávida do escritor.

INTRA MOVIES

INTRA MOVIES

L’Inoccente. Itália, França, 1976. 125 min. 35mm. 16 anos. Direção: Luchino Visconti Roteiro: Suso Cecchi d’Amico, Enrico Medioli e Luchino Visconti Elenco: Giancarlo Giannini, Laura Antonelli, Jennifer O’Neill, Didier Haudepin, Rina Morelli, Massimo Girotti, Marc Porel, Marie Dubois, Roberta Paladini, Claude Mann

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INTRA MOVIES


Extras As páginas seguintes reproduzem publicações, documentos técnicos e cartazes em idioma original e de outros países de alguns dos principais filmes de Luchino Visconti. Este material traz uma fortuna crítica que exemplifica a importância da produção do cineasta com a utilização da arte e da técnica em suas composições. Cenas e elenco aparecem em destaque, valorizados nos lançamentos dos títulos nos cinemas. A reprodução destes extras permite resgatar materiais que se encontravam fora de circulação e que poderão ser apreciados pelo público brasileiro nesta retrospectiva.

52 Luchino Visconti.


Visconti e a censura Diversas vezes em sua carreira, o diretor teve seus filmes censurados ou com sua integridade prejudicada pela imposição de cortes, caso de Obsessão, A Terra Treme e também Rocco e seus irmãos. Obsessão foi projetado com muitos cortes, acusado de imoralidade e de uma ofensa ao povo italiano, no ápice do fascismo. O filme virou um símbolo antifascista. A Terra Treme, após a estreia fria no Festival de Veneza, ficou dois anos sem ser exibido nos cinemas, considerado uma afronta aos democratas-cristãos que assumiram o poder após a queda de Mussolini. Rocco foi acusado de obscenidade por sugestão de homossexualidade e pela cena de estupro, filmada com muito realismo. Jornais da época receberam enxurradas de cartas de leitores indignados contra Visconti por supostamente difamar a própria cidade, Milão, quando a critica subliminarmente por acolher os migrantes do sul com violência e preconceito. O filme chegou a ser apreendido em muitas cidades do interior da Itália. Abaixo, a carta aberta de Visconti contra as restrições sofridas para a exibição de Rocco e seus irmãos, em 24 de outubro de 1961, destinada ao ministro da Cultura, denunciando a campanha contra seu filme:

O senhor fez questão de deixar claro que, se dependesse apenas de seus poderes como ministro da República, Rocco e seus irmãos jamais teria aparecido nas telas, ou teria aparecido apenas na medida – não sei como, nem em que proporção – em que fosse clericamente mutilado. Tal atitude confirma minha convicção profunda de que as raras migalhas de liberdade de que podemos gozar neste país não as devemos aos governantes que têm a mentalidade que o senhor demonstra (e francamente nos interrogamos sobre o milagre que os fez ocupar cargos de uma tal importância), mas à vigilância, à resistência e à luta da oposição e da opinião pública democrática. Se a favor de Rocco e seus irmãos não tivesse havido, na época, o grande protesto, não só da cultura italiana mas também dos partidos, da imprensa e das organizações de esquerda, podemos estar certos, depois de suas declarações de hoje, de que se teria subtraído do filme o direito constitucional de ser apresentado a grandes massas de espectadores e de poder assim gozar desse sufrágio do público, que todos conhecem, e que – vale a pena assinalar – garantiu a melhor receita ao cinema italiano nestes últimos tempos, depois de A Doce Vida. Queira consentir que eu lhe lembre publicamente esses fatos, senhor ministro, pois um tal dado está estreitamente ligado a esse novo surto de prestígio cultural e industrial do cinema italiano, do qual o senhor e seus funcionários não deixam de usurpar os louros, quando emitem seus relatórios e declarações oficiais...[...]. No que me concerne diretamente, o senhor ministro não se furtou a usar o argumento mais venenoso, ao invocar, nem mais nem menos, o julgamento negativo de uma alta personalidade soviética que se encontrava de passagem na Itália... Não posso, evidentemente, excluir, por princípio, a possibilidade de que possam ainda sobreviver, entre os representantes oficiais de um grande país socialista como a URSS, idéias ultrapassadas e censuráveis sobre a arte. Se bem entendi, no entanto, a personalidade à qual o senhor faz alusão deplorava a proliferação da pornografia que se verificou no cinema italiano à sombra da censura administrativa dos governos democrata-cristãos. Já se perguntou, senhor ministro, se por acaso essa personalidade não se referia a filmes que levam a assinatura de cineastas que são seus companheiros de partido, e, de qualquer modo, autores que nunca se levantaram, nem por suas obras nem por suas palavras, contra a clericalização do Estado e que, muito ao contrário, ali prosperam como o verme na maçã?

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Documento apresentando a lista completa das mĂşsicas compostas por Nino Rota para o filme O Leopardo, contendo a assinatura do compositor na parte inferior. 54


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Cartaz italiano de ObsessĂŁo.

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Cartaz italiano de ObsessĂŁo. 57


Cartaz italiano de A Terra Treme. 58


Cartaz italiano de BelĂ­ssima.

Cartaz espanhol de BelĂ­ssima.

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Cartaz italiano de Boccaccio ‘70.

Cartaz internacional de Vagas Estrelas da Ursa.

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Cartaz italiano de Nรณs, as Mulheres. 61


Cartaz francĂŞs de O Leopardo. 62


Cartaz internacional de O Leopardo.

Cartaz internacional de O Leopardo.

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Cartaz americano de Os Deuses Malditos.

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Cartaz francĂŞs de O Estrangeiro. 65


Cartaz americano do filme As Bruxas. 66


Publicidade brasileira de Ludwig. 67


SESC – SERVIÇO SOCIAL DO COMÉRCIO Administração Regional no Estado de São Paulo PRESIDENTE DO CONSELHO REGIONAL Abram Szajman DIRETOR DO DEPARTAMENTO REGIONAL Danilo Santos de Miranda SUPERINTENDÊNCIAS Técnico-Social Joel Naimayer Padula Comunicação Social Ivan Giannini Administração Luiz Deoclécio Massaro Galina Assessoria Técnica e de Planejamento Sérgio José Battistelli GERÊNCIAS Ação Cultural Rosana Paulo da Cunha Adjunta Kelly Adriano de Oliveira Assistentes Talita Rebizzi e Rodrigo Gerace Estudos e Desenvolvimento Marta Colabone Adjunto Iã Paulo Ribeiro Assistente Ubiratan Nunes Rezende Assessoria de Relações Internacionais Áurea Leszczynski Vieira Gonçalves Assistente Heloisa Pisani Artes Gráficas Hélcio Magalhães Adjunta Karina C. L. Musumeci Assistentes Rogério Ianelli e Wendell Vieira Difusão e Promoção Marcos Carvalho Adjunto Fernando Fialho CineSesc Gilson Packer Adjunta Simone Yunes Programação Moara Zahra, Cecília Nichile, Graziela Marcheti Comunicação Adriano Almeida Assistentes Barbara Carneiro e Humberto Mota RETROSPECTIVA LUCHINO VISCONTI Curadoria Giscard Luccas Coordenação Editorial Neusa Barbosa Textos Inéditos Sérgio Rizzo, Luiz Zanin Oricchio, Fernando Brito e Luiz Carlos Merten Produção de Cópias Merten Fabio Savino Sinopses Luiz Vita Agradecimentos Francisco Luccas, Laura Argento, Maria Coletti, Centro Sperimentale di Cinematografia – Cineteca Nazionale, Surf Film Srl, Minerva Pictures, Park Circus Ltd, Compass Film Srl, Movietime Srl, Cristaldi Film, Intra Movies, Viggo Srl, Les Editions Gallimard, Imovision, Mostra Internacional de Cinema, Claudio A. Silva, Elias Oliveira



CineSesc Rua Augusta, 2075 CEP 01413-000 São Paulo - SP Tel.: 11 3087 0500 /cinesescsp

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