Plano Urbano do Brincar

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SUMÁRIO

Contextualização

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Apresentação Cidade brincante Por que pensar uma cidade brincante? Horizontes de cidade Princípios Valores

Diagnóstico Local de atuação A Brasilândia

O Plano

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Estruturação Eixo condutor Eixos de ação Objetivos Propostas Propostas-inspiração

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Potências

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CONTEXTUALIZAÇÃO

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APRESENTAÇÃO O que é um Plano Urbano do Brincar (PUB)? O Plano Urbano do Brincar é uma proposta para olhar e pensar a cidade a partir de um outro ponto de vista. É pensar os espaços urbanos a partir da perspectiva da infância, tomando o brincar como ponto de partida para imaginar novas possibilidades. É favorecer uma mudança de paradigma tomando a criança como novo parâmetro a partir do qual se pensa a cidade, visando-se passar de uma cidade com alguns poucos espaços de brincar para uma cidade brincante, onde o lúdico seja parte integrante e cotidiana na vida de todos.

Pra que serve o PUB? O PUB serve enquanto proposta para que o planejamento da cidade seja feito de uma maneira outra, para que seja possível sonhar com uma cidade mais acolhedora, inclusiva, diversa e brincante. É uma proposta que direciona o olhar das propostas urbanas para a infância e, a partir dela, constrói novas possibilidades para a cidade.

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Qual seu principal objetivo? O PUB tem como seu principal objetivo favorecer uma mudança de paradigma, tomando a criança como novo parâmetro a partir do qual se pensa a cidade, possibilitando a criação coletiva de uma cidade brincante, a qual tenha, possibilite e incentive infraestruturas e usos lúdicos para todos, partindo da infância e da potência do brincar de pensar novas possibilidades.

Como pensar sua implementação? O PUB pode ser apropriado pela Prefeitura, de forma a pensar sua expansão para toda a cidade, mas volta-se especialmente para as Subprefeituras, entendendo a importância da descentralização e de uma ação que possa cuidar das particularidades de cada território. Ainda, acredita-se que pode ser um Plano apropriado pela sociedade civil, uma vez que muitas das ações propostas podem ser lideradas por cidadãos envolvidos com questões locais. De toda forma, reforça-se que apenas o controle social e a participação da população, independentemente de sua esfera de implementação, podem garantir sua efetivação.

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Cidade Brincante A cidade brincante é uma cidade que dá colo, que acolhe, que convida e que abraça as possibilidades de se intimar, de explorar e de construir continuamente lugares (imaginários ou reais). É um convite à imaginação, ao movimento e à interação; à ação, à experiência, ao envolvimento e à participação. É toda uma realidade que se inverte, libertando-se das amarras adultocêntricas e ampliando as oportunidades urbanas. É a experiência e a experimentação por excelência, que permitem alcançar lugares não ocupados, sonhos imaginados, verdades desconhecidas, recriar memórias vividas. É a criação de possibilidades desejáveis, utópicas e que podem ser exploradas como forma de questionar o mundo real e transformá-lo. É entender que a imaginação é um mundo e é, ao mesmo tempo, a possibilidade de sonhá-lo de novo.


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POR QUE UMA CIDADE BRINCANTE?

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É uma forma de devolver a cidade às crianças e o brincar à cidade

Expande a experiência educativa

Brincar pode ir além do limitado

Brincar melhora a saúde e o bem-estar

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É uma forma de eliminar barreiras e construir uma cidade mais humana

A cidade precisa ser ocupada

Os entornos brincantes enriquecem a vida comunitária e social

Os espaços de brincar de qualidade naturalizam e o entorno urbano

É uma forma de planejar que abrange todos

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HORIZONTES de cidade

Entendemos enquanto horizontes de cidade as características que pretende-se alcançar, ao longo dos anos, desde a perspectiva de uma cidade brincante. Isto é, que tipo de cidade quer-se construir e pensar a partir do olhar para as crianças. É com base nesses horizontes que são desenvolvidos os eixos de ação do plano, bem como os objetivos a serem atingidos.

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Uma cidade onde as crianças têm o direito de brincar e ter tempo livre e todos recuperam o prazer de brincar no espaço público • um modelo de cidade que convida as crianças e os jovens a serem protagonistas da vida cotidiana da cidade e a sair, encontrar-se e brincar na rua, parques e praças, porque situa a infância e o seu bem-estar entre as prioridades chave da cidade. • uma cidadania que incorpora o hábito e o prazer de brincar e divertir-se em todas as idades, começando pelos menores, e onde adultos e idosos desfrutem de brincadeiras intergeracionais e ambientes vivos que também são adequados às suas necessidades. • uma cidade que reconhece a importância social e os benefícios coletivos do brincar com uma política urbana relevante que interrelaciona estratégias de cidade saudável, educadora, inclusiva, acessível e sustentável

Uma cidade que promove a saúde, o desenvolvimento integral e o bem-estar através do brincar, dos jogos e da atividade física ao ar livre • uma cidade que cuida do brincar e do tempo livre das crianças e adolescentes como um direito humano tão importante para seu desenvolvimento saudável quanto a alimentação, a moradia, a saúde ou a educação, assim como recorda o Comitê dos Direitos das Crianças da ONU. uma cidade que convida a uma vida saudável e que promove e dá importância à atividade lúdica na vida cotidiana por seus benefícios tanto para a saúde física e combate ao sedentarismo, obesidade infantil e vício nas telas, quanto para a saúde mental e o bem-estar emocional, a gestão de riscos, a resiliência e a autonomia pessoal. • uma cidade com oportunidades e entornos urbanos lúdicos e educativos ricos com múltiplas propostas de brincadeiras e jogos criativos e com desafios que incorporem as principais atividades e necessidades lúdicas das crianças e adolescentes, estimulando aprendizagens (motoras, emocionais, cognitivas e sociais) que são vitais para um bom desenvolvimento integral.

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Uma cidade que oferece e integra mais e melhores oportunidades de brincar

• uma cidade com espaços e oportunidades de qualidade para brincar, bem desenhadas diversas, coeducativas, seguras e estimulantes. Espaços que considerem a opinião das crianças e que não limite as áreas de brincar, mas que integre infraestrutura, elementos urbanos e táticos que estimulem o brincar em todo entorno urbano, de maneira prioritário ao redor de parques e praças e de entornos escolares. • uma cidade que incorpora o planejamento da infraestrutura lúdica no marco de ecossistemas lúdicos, buscando assegurar acesso a espaços de brincar de qualidade, próximos e com equilíbrio territorial, aproveitando o potencial e a diversidade de cada bairro • uma cidade na qual os centros educativos sejam equipamentos de bairro com limites mais permeáveis e maiores usos lúdicos comunitários de pátios escolares naturalizados, com entornos imediatos dos centros com praças e espaços de estadia e jogos, caminhos escolares efetivamente mais lúdicos e seguros, favorecendo uma mobilidade autônoma e sustentável

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Uma cidade com entornos naturalizados, seguros e pacificados que permitem o brincar na rua • uma cidade com maior infraestrutura verde e um espaço público mais naturalizado para favorecer a atividade física ao ar livre, o respeito, o contato com a natureza, o verde e elementos naturais diversos • uma cidade cidade com amplas zonas com trânsito pacificado, gerando maior segurança para as crianças e adolescentes e recuperando o espaço público para o uso de toda a sociedade, tendo como prioridade os pedestres


Uma cidade que estimula o brincar inclusivo, levando em consideração a diversidade de idades, gêneros, origens e capacidades funcionais

Uma cidade que enriquece a vida comunitária e a convivência de pessoas com usos voltados ao brincar

• uma cidade que estimula os usos lúdicos do espaço público com desenhos e dispositivos endereçados à atividade lúdica de todos os vizinhos, dos 0 aos 99 anos, e que promova a convivência intergeracional

• uma cidade que estimula o brincar compartilhado, coletivo, cooperativo e intergeracional com propostas que incorporam a necessidade de colaboração para maximizar os benefícios psicossociais do brincar

• uma cidade onde todas as pessoas possam sentir-se convidadas a brincar em espaços inclusivos e respeitosos com a diversidade cultural, incorporando uma perspectiva de gênero e sendo coeducativos

• uma cidade onde os espaços lúdicos são concebidos como um recurso comunitário e lugar de encontro para atividades diversas e que considera as necessidade da vida cotidiana a partir do desenho, de elementos urbanos e intervenções comunitárias adequadas para permanecer

• uma cidade que promove espaços inclusivos de brincar que concretizam o direito à acessibilidade universal nos espaços elementos lúdicos, levando em consideração a necessidade das pessoas com necessidades especiais ou com diversidade funcional

• uma cidade que aproveita e leva em conta as iniciativas cidadãs e os usos diversos do espaço público, assim como entende a importância de conhecer e considerar os interesses específicos das crianças e seu importante papel no co-desenho e corresponsabilidade na gestão do espaço com usos adequados • uma cidade que faz possível mais tempo livre para a infância, com maior conciliação dos usos do tempo e uma maior corresponsabilidade social no cuidado com a infância, tornando mais fácil para os vizinhos se encontrarem, tecerem relações com a comunidade e enriquecer a coexistência nos bairros em torno de espaços de lazer

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PRINCÍPIOS da cidade brincante

Lúdica É reconhecer a cultura como possuidora de um caráter lúdico e valorizar o prazer como importante para todos. Tonificar o mundo com a alegria que envolve o brincar e possibilitar outro uso do tempo, que permite um cotidiano mais livre, mais leve, mais alegre.

Diversa É defender e acolher o diferente, entendendo e construindo um cenário complexo e abrangente.Busca-se que a diversidade que nos constitui passe a fazer parte de uma nova visão de cidade que integre, veja e cuide de todos e cada um.

Inclusiva É a busca por uma cidade que possa ouvir mais e distintos atores, especialmente as crianças, considerando minorias em suas decisões urbanas. É a busca por pensar e fazer um espaço urbano que seja mais representativo e olhe para todos.

Pacificada É preocupar-se com e garantir a segurança viária, olhando de outra maneira para o trânsito de forma a priorizar os meios de transporte ativos, redesenhando e repensando as ruas. É uma quebra de paradigma que busca garantir espaço para as pessoas.

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Educativa É entender que a educação e a formação de seus habitantes é uma das funções da cidade. Ativando seu potencial educativo, as políticas, os espaços, os tempos e os atores são entendidos como agentes pedagógicos capazes de influírem no desenvolvimento dos cidadãos.

Participativa A sociedade deve fazer parte das tomadas de decisão de qualquer projeto que se dê sobre seu espaço cotidiano, permitindo recolher o conhecimento acumulado e as experiências vivenciadas pela população; bem como a implicação e negociação coletiva do projeto.

Interescalar Qualquer projeto urbano, quando analisado a partir de escalas diferentes, da cidade à esquina, nos oferece leituras múltiplas. O que enxergamos em uma escala é diferente das outras e essas leituras são complementares para garantir um espaço inclusivo.

Sustentável Um urbanismo que coloca no centro a cura dos ecossistemas nos quais vivemos e possui um modelo urbano compatível e respeitoso com os recursos naturais existentes. Um urbanismo que fomenta a regeneração dos bairros e fomenta o bem-estar comunitário.

Flexível Um planejamento flexível prevê as necessidades de mudança e transformação ao longo da vida de um projeto e, portanto, pensa de maneira aberta e modificável, que assegura novos modelos urbanos e pequenas intervenções e usos temporais do espaço urbano.

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VALORES que busca construir

Autonomia Que as crianças possam conquistar um governo de si próprio relacionado à capacidade de tomar decisões e analisar criticamente, permitindo sua autonomia por meio de uma postura ativa de intervenção no mundo.

Liberdade Que as crianças sejam livres para ser hoje, livres para brincar, para caminhar pelas ruas de seus bairros, para crescer brincando, livres para se expressar, para se desenvolver em igualdade de oportunidades e livre para decidir o que querem para si e para a cidade.

Cidadania Por experiências que contribuam na constituição de um conjunto complexo que abraça, ao mesmo tempo, a adesão a valores, a aquisição de conhecimento e atividades práticas na vida pública, que construam uma formação democrática para cidadania.

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Diálogo Que as crianças usem o poder da palavra como uma ferramenta para a transformação das relações sociais desde a infância.

Cooperação Por uma rede que pensa junto nas resoluções dos desafios de cada projeto e realidade, criando uma força tarefa para a distribuição das energias e potências, pensando e agindo sempre coletivamente.

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DIAGNÓSTICO

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LOCAL DE ATUAÇÃO Entendendo que não seria possível atuar no âmbito de toda a cidade - apesar de ter o desejo de tal -, parti de uma unidade menor, o distrito, acreditando que, posteriormente com a replicação da metodologia de análise e consequentes proposições, seria possível alcançar a escala da cidade. Ao mesmo tempo, entendo que, trabalhando com uma escala mais palpável, é possível aproximar-me de forma mais efetiva dos elementos existentes no bairro, aproximar-me do cotidiano e das experiências das crianças. Assim, a partir dessa primeira leitura local, é possível ampliar as noções até chegar à escala da cidade. Como diz Paulo Freire Antes de tornar-me um cidadão do mundo, fui e sou um cidadão do Recife, a que cheguei a partir de meu quintal, no bairro da Casa Amarela. Quanto mais enraizado na minha localidade, tanto mais possibilidades tenho de me espraiar, me mundializar. Ninguém se torna local a partir do universal. O caminho existencial é inverso (1995, p. 25).

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A ideia de pensar a partir do distrito seria, então, de construir uma visão global, capaz de compreender as múltiplas dimensões, a complexidade e a riqueza das relações entre o local, o regional e o global, que cuida do olhar para o pequeno e sistematiza-se no grande. Desta forma, era necessário que eu delimitasse um espaço de estudo e atuação. Minha escolha teve origem no Mapa da Desigualdade da Primeira Infância 1, metodologia elaborada pela Rede Nossa São Paulo. Escolhi esse mapa pois, de modo geral, são poucos os dados levantados diretamente sobre a criança. Na maioria das vezes, parte-se da família para entendê-las (QVORTRUP, 2011) 2, e o Mapa analisa a infância a partir das perspectivas das crianças, o que muito me interessava. Ele faz uso de 28 indicadores municipais para identificar oferta de equipamentos e serviços públicos e sua qualidade para a infância nos 96 distritos da capital. Os indicadores foram selecionados a partir do Programa Cidades Sustentáveis (PCS) e estão associados aos eixos do Urban95, uma iniciativa da Fundação Bernard Van Leer, e aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Contemplam áreas como educação, saúde, assistência social, meio ambiente, direitos humanos, entre outras.

1. Vale destacar que o mapa trata de crianças de 0 a 6 anos, não abrangendo todo o período entendido enquanto infância. Entretanto, reflete muito de sua realidade na totalidade. 2. Esse fator já é um grande indicativo do não olhar para as crianças na formulação de políticas públicas. Qvortrup (2011) chama isso de “capitalização da infância”, a qual sugeriria que o Estado demanda somente dados que são absolutamente necessários para seu planejamento e esforço de elaboração de políticas; ao mesmo tempo que ressalta a invisibilidade da infância e sua visão como imaturas e alguém que virá a ser. “Então, aparentemente não parece existir necessidade de contar as crianças por elas mesmas” (QVORTRUP, 2011, p. 208).

O mapa trabalha, também com a ideia de que uma cidade acolhedora para crianças é uma cidade melhor para todas as pessoas: Um lugar onde tanto as gestantes como seus bebês têm acesso a um atendimento de saúde de qualidade; onde adolescentes não precisam abandonar seus estudos devido a uma gravidez não planejada; um lugar onde não exista violência doméstica e sexual contra crianças. Além disso, essa cidade [acolhedora para com a infância] oferece serviços e acessos de qualidade em toda sua extensão: esgoto, coleta de lixo, iluminação pública, áreas verdes, parques e praças, consultas pediátricas e programas de atendimento à família. (REDE NOSSA SÃO PAULO, 2020, p. 2).

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As desigualdades urbanas influenciam no desenvolvimento das crianças. Destacar essas desigualdades traz a possibilidade de repensar a cidade - ou as diversas cidades existentes dentro de São Paulo - e de atuar nessas desigualdades. A ideia é que uma cidade acolhedora seria capaz de garantir direitos mais igualitários para todas as crianças. Então, o mapa é elaborado a partir da aplicação dos indicadores na menor unidade administrativa da cidade, ou seja, em cada um de seus 96 distritos. Dessa forma, é possível identificar as diferenças territoriais da cidade, ranqueá-las e calcular o fator de desigualdade entre os distritos, a partir da relação entre o melhor e o pior distrito em cada um dos indicadores. No exemplo ao lado, foi utilizado como indicador o tempo médio para agendamento de consulta pediátrica. O Morumbi apresenta-se como o melhor distrito da cidade, com tempo médio de 2 dias. Já a Brasilândia aparece como pior distrito, com 41 dias de espera para agendamento. Portanto, identifica-se uma diferença de 20,5 vezes entre esses dois distritos que vivem situações extremas do indicador. De acordo com o estudo, os piores distritos são aqueles que aparecem mais vezes entre os 30 piores no conjunto dos 28 indicadores utilizados no Mapa da Primeira Infância. E entender essa lógica é fundamental: 500 mil crianças da capital vivem nos 26 piores distritos, mostrando a discrepante diferença de acesso, infraestrutura e serviços existentes na cidade. Isto é, 4 em cada 10 crianças de até 6 anos moram nos piores distritos de São Paulo para a primeira infância, dado alarmante por si só, mas que torna-se ainda mais urgente considerando ser a fase crucial para o desenvolvimento social, cognitivo e psicológico da criança. Dessa forma, entendi que esses lugares deveriam ser entendidos como prioridade e era fundamental que minha proposta se desse em algum desses locais. Portanto, entendendo essa urgência de atuação, optei por analisar os quatro piores distritos da cidade de acordo com o Mapa da Desigualdade da Primeira Infância, selecionan-

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Exemplo: tempo médio de atendimento para uma consulta pediátrica

41 DIAS

Brasilândia

2 DIAS Morumbi

20,5

desigualtômetro

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Cachoeirinha Brasilândia

26 distritos entre os piores indicadores 1. Grajaú

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2. Cachoeirinha

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3. Jardim Ângela

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4. Brasilândia

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5. Cidade Ademar

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6. Guaianases

15

7. Parelheiros

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8. Parque do Carmo

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9. São Rafael

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10. Tremembé

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11. Cidade Dutra

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12. Cidade Tiradentes

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13. Itaim Paulista

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14. Jd. São Luís

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15. Marsilac

14

16. Cangaíba

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17. Jaçãna

13

18. José Bonifácio

13

19. Lajeado

13

20. Perus

13

21. São Miguel

13

22. Sapopemba

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23. Capão Redondo

12

24. Morumbi

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25. Pedreira

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26. Raposo Tavares

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Jd. Ângela

Grajaú


do Grajaú, Cachoeirinha, Jardim Ângela e Brasilândia como possíveis locais de estudo e atuação. Faltava, agora, analisá-los sob a ótica de indicadores que eram interessantes para a minha pesquisa.

3. Esses dados podem ser acompanhados na tabela da página 45.

Iniciei olhando para os dados básicos de cada um deles: área, população, população infantil e população de crianças menores de 6 anos. O Grajaú tem uma área de 92 km2; uma população de 390.096 pessoas; 86.406 crianças, que corresponde a 22,15% do total do distrito; e 43.691 crianças de 0 a 6 anos, 11,20% do total. Já na Cachoeirinha, a área é de 13,3 km2; a população é de 146.387 pessoas; 31.341 crianças (21,41% do total); e 15.678 crianças de 0 a 6 anos (10,71% do total). No Jardim Ângela, a área é de 37 km2; a população total é 338.265 pessoas; 77.666 crianças (22,96% do total); e 38.156 crianças de 0 a 6 anos (11,28% do total). Por fim, a Brasilândia tem uma área de 21 km2; população total de 281.977 pessoas; 64.432 crianças (22,85% do total); e 32.766 crianças de 0 a 6 anos (11,62% do total) 3. Para efeito de comparação, é interessante olhar para os números do município: 18,99% da população é composta de crianças e, olhando apenas para crianças de 0 a 6 anos, elas compõem 9,4% do total da população. Assim, fica evidente que as populações infantis nos 4 distritos analisados têm uma expressividade maior que na média geral da cidade. Também vale destacar que, em números relativos, o Jardim Ângela, dos quatro, é o que tem maior número de crianças em relação à população total, com uma pequena diferença para a Brasilândia; e a Brasilândia a que tem maior população relativa de crianças de 0 a 6 anos. Em seguida, olhei para a densidade demográfica dos distritos. Entender as diferenças de densidade populacional me pareceu importante pois uma atuação local impacta mais quanto mais pessoas houver. A densidade demográfica é um indicador que me permite entender onde há mais crianças e, portanto, onde minhas propostas terão mais impacto. Apesar de interessar mais a esse trabalho a densidade demográfica infantil e possuir dados suficientes

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DENSIDADE DEMOGRÁFICA

legenda habitante / hectare até 92 92 - 146 146 - 207 207 - 351 351 - 30346

0

1

2 km

fonte: Geosampa. Representação da autora.

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cachoeirinha

brasilândia


jd. ângela

grajaú

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4. Quadro do Paisagismo do Brasil, um processo de pesquisa iniciado em 1994 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, deu origem ao Laboratório de mesmo nome e pretende, desde então, desenvolver estudos sobre o paisagismo e a paisagem brasileira

para calculá-la, não consegui dados para espacializar-lá em mapas. Entretanto, pude perceber que a densidade demográfica infantil, nesses distritos, dialoga diretamente com a densidade demográfica total e, por isso, a espacializei para entender as regiões mais densas. De toda forma, vale dizer, enquanto número bastante importante para a minha escolha, os números de densidade demográfica infantil de cada um dos distritos: o Grajaú possui 939,2 crianças/km2; Cachoeirinha 2356,47 crianças/ km2; Jardim Ângela 2099,08 crianças/km2; e Brasilândia 3068,19 crianças/km2. Os mapas nos permitem visualizar essa diferença demográfica. Me detive também sobre a densidade construtiva desses distritos, bastante significativa para entender onde havia espaço livre que poderia ser utilizado como espaço de brincar livre. Para realização desses mapas, foi considerada apenas a área urbanizada dos territórios, isto é, a Serra da Cantareira, por exemplo, não foi considerada. Ao olhar para os mapas de densidade construtiva dos distritos, já é possível identificar uma diferença marcante entre eles, sendo os da zona sul muito menos densos construtivamente que os da zona norte, existindo, então, mais espaços disponíveis para se pensar o brincar. É ainda mais clara essa relação quando olhamos para os dados separadamente. Os mapas de densidade construtiva foram elaborados a partir de dados levantados pelo Quapá 4 acerca dos espaços disponíveis na cidade. Foram classificadas todas as quadras de acordo com o espaço livre, em média, existente na quadra, organizando-as em 3 categorias: 1 - de 0 a 30% de espaços livres: nessas quadras os espaços livres ocupam no máximo 30% da sua área total. Significa dizer que todos os espaços livres existentes, quintais, jardins, etc. são pequenos e estão compactados em meio às construções, situação esta correspondente a lotes muito construídos e cujas construções tem poucos

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ou pequenos recuos, muitas vezes limitados a pequenos corredores e pátios. 2 - de 30 a 50% de espaços livres: no total de sua área, os espaços livres tem uma importância, configurando quintais, pátios, corredores, jardins, etc. de algum porte. Quadras inseridas nesta categoria correspondem em geral a áreas residenciais horizontais, verticais ou mistas, nas quais é possível se encontrar com facilidade áreas permeáveis na forma de pequenos jardins, quintais e canteiros arborizados. Correspondem a trechos residenciais horizontais ou verticais, em geral habitados por segmentos de classes média e alta e ainda a algumas áreas industriais, nas quais pátios de manobra, de depósito e estacionamento tem algum porte. 3 - de 50 a 100% de espaços livres: no total de cada quadra pelo menos metade da sua área é ocupada por espaços livres. No que correspondem a quadras divididas em grandes lotes, muitas vezes de caráter residencial, contendo casas cercadas de jardins, grandes estacionamentos arborizados, áreas de pequenas chácaras urbanas, áreas pouco densas construtivamente, com muito espaço vazio, etc. São quadras em geral com grandes áreas permeáveis, à exceção daquelas de caráter industrial ou comercial, que contém estacionamentos e pátios de manobras, caso, por exemplo, de estacionamentos de shopping centers, predominando as áreas impermeáveis. Olhando, então, separadamente para essas categorias, constatamos que o Grajaú possui 62,1% das suas quadras na categoria 1; 8,2% na categoria 2; e 29,7% na categoria 3. Cachoeirinha possui 67,3% das quadras na categoria 1; 10,7% na categoria 2; 22,0% na categoria 3. Jardim Ângela 65,6% na categoria 1; 16,2% na categoria 2; 18,2% na categoria 3. Brasilândia, por fim, 74,6% na categoria 1; 15,4% na categoria 2; e 10,0% na categoria 3.

CLASSIFICAÇÃO DAS QUADRAS

01 0 a 30% de espaços livres

02 30 a 50% de espaços livres

03 50 a 100% de espaços livres

Considerando apenas o número, já é possível perceber uma grande diferença entre a Brasilândia, aquela que possui mais quadras na categoria 1 (74,6%) para o Grajaú,

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DENSIDADE CONSTRUTIVA

legenda espaço livre intraquadra 50 a 100% 30 a 50% 0 a 30%

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fonte: Quapá Representação da autora.

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0 a 30% de espaço livre intraquadra espaço livre intraquadra 0 a 30%

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fonte: Quapá Representação da autora.

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67,3% das quadras

74,6% das quadras


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65,6% das quadras

62,1% das quadras

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DENSIDADE CONSTRUTIVA

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30 a 50% de espaço livre intraquadra espaço livre intraquadra 30 a 50%

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fonte: Quapá Representação da autora.

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10,7% das quadras

15,4% das quadras


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16,2% das quadras

8,2% das quadras

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DENSIDADE CONSTRUTIVA

legenda

50 a 100% de espaço livre intraquadra espaço livre intraquadra 50 a 100%

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1

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fonte: Quapá Representação da autora.

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22,0% das quadras

10,0% das quadras


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18,2% das quadras

29,7% das quadras

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ESPAÇOS LIVRES PÚBLICOS

GRAJAÚ 30 praças 7 parques

CACHOEIRINHA

76 praças 0 parques

JD. ÂNGELA

45 praças 4 parques

BRASILÂNDIA

66 praças 1 parque

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o qual possui menos quadras na categoria 1 (62,1%). Porém, ao olhar para esses números espacializados nos mapas, as diferenças ficam ainda mais marcantes considerando as áreas dessas quadras. Por exemplo, quando olhamos para as quadras de categoria 3, as com 50 a 100% de espaços livres, o número por si só no Grajaú (29,7%) já é maior que o da Brasilândia (10%). No mapa, a diferença escancara-se: a maior parte da área do Grajaú é tomada por essas quadras. Por fim, olhei para os espaços livres públicos existentes em cada um dos distritos, entendendo que esses são espaços potenciais para o brincar. O Grajaú possui 30 praças e 7 parques, totalizando 378.670 m2 de espaços livres públicos. Cachoeirinha possui 76 praças e nenhum parque, totalizando 55.032 m2. Jardim Ângela possui 45 praças e 4 parques, totalizando 3.755.243 m2. Brasilândia possui 66 praças e 1 parque, totalizando 70.040 m2. Porém, esses números puros podem enganar. Primeiramente olhei para o quanto esses espaços significavam do território total do distrito. Isto é, dividi a metragem quadrada de espaços livres pela área total do distrito. Assim, encontramos que 0,41% do Grajaú é composto por espaços livres públicos; 0,41% também da Cachoeirinha; 1,01% do Jardim Ângela; e 0,33% da Brasilândia. Depois, e ainda mais essencial, olhei para a metragem quadrada em relação às pessoas do distrito, de modo a entender o quanto esses espaços são, de fato, capazes de atender a demanda populacional. Assim, o Grajaú, pensando na população infantil, possui 4,38 m2 de espaço livre por criança e 1,22 m2 de praças por criança. Cachoeirinha tem 1,76 m2 de espaço livre por criança e 1,76 m2 de praças por criança. Jardim Ângela 48,35 m2 de espaço livre por criança e 0,39 m2 de praças por criança. Brasilândia tem 1,09 m2 de espaço livre por criança e 0,30 m2 de praças por criança. Apenas foram considerados os espaços que podem ser usufruídos pela população.


Segundo a Rede Social Brasileira por cidades justas e sustentáveis, São Paulo, em 2017, possuía 16,6 m2 de espaços verdes por habitantes. Entretanto, considerando apenas os espaços livres públicos, aqueles que podem ser utilizados, a média da cidade cai para 2,6 m2 por habitante, segundo estudo da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente. Os índices de áreas de lazer são menos de 1m2 por pessoas em mais de um terço das subprefeituras da cidade. As periferias e o centro possuem os piores índices, o que, de fato, se explicita na maioria dos números dos distritos estudados, enquanto bairros de classe média da zona oeste encontram-se bastante acima da média geral (ESTADÃO, 2012). É importante ressaltar que os números acima descritos por distritos são a área por crianças. Se considerássemos a área livre por total de habitante, os números seriam ainda menores e alarmantes: Grajaú: 0,97 m2/habitante; Cachoeirinha: 0,38 m2/habitante; Jardim Ângela: 11,1 m2/habitante; Brasilândia: 0,25 m2/habitante. Vale, ainda, pensar esses números em relação às recomendações de órgãos de saúde e educação. As recomendações variam, mas, mesmo assim, nenhum dos distritos - com exceção do Jardim Ângela que possui um parque estadual - chega perto dessas recomendações. O diagnóstico, realizado em 1975, pelo Governo do Estado de São Paulo, sobre as condições urbanas de saúde indicava como ideal 8 m2 de área verde por habitante (SÃO PAULO, 1975, p. 28). A organização mundial da saúde indica como recomendado que cada cidade provenha um mínimo de 12 m2 de espaços verdes urbanos por pessoas e 36 m2 por habitante como valor ideal (OMS, 2016). Estocolmo, que é a cidade referência da OMS, possui 86 m2 por habitante. A sociedade brasileira de arborização urbana (SBAU) propôs como índice mínimo para áreas verdes públicas destinadas à recreação o valor de 15 m2 por habitante (SBAU, 1996 apud HARDER; RIBEIRO; TAVARES, 2006). Vemos, então, que, independentemente do índice de recomendação adotado, há um grande déficit de espaços livres públicos nos distritos do Grajaú, Cachoeirinha e Brasilândia.

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ESPAÇO LIVRE PÚBLICO

legenda

praças parques

0

1

2 km

fonte: Geosampa. Representação da autora.

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plano urbano do brincar

cachoeirinha

brasilândia


jd. ângela

grajaú

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Ainda sobre o mesmo tema, porém analisado sob outra ótica, o Ministério da Educação recomenda para os solários das escolas, área livre descoberta para banho de sol, a dimensão de 1,5 m2 por criança. Se os solários devem atender a essas dimensões, quais não devem ser as medidas para as praças e parques para comportar o livre brincar das crianças? Foi, então, partindo dessa análise que escolhi meu local de atuação. Selecionei 3 indicadores que entendi como essenciais e representativos para essa escolha: densidade de crianças, metragem quadrada de espaços livres públicos por criança e porcentagem de espaços livres públicos em relação ao total do território. Certamente, tudo aqui analisado foi considerado para a escolha, porém entendi que esses três indicadores permitiam uma boa visualização da minha conclusão. Em relação aos três indicadores, me interessava o distrito com maior densidade demográfica, justamente por me permitir uma maior abrangência com intervenções e/ou propostas locais; aquele com menor metragem de espaços livres públicos por criança, o que eu traduzi como menores oportunidades para o brincar livre na cidade; e aquele com menor porcentagem de espaços públicos, pois indicava um maior déficit que precisaria ser pensado. Assim, a Brasilândia foi o distrito escolhido para meu trabalho, uma vez que possui a maior densidade demográfica infantil e os menores índices de metragem de espaços públicos por crianças e de espaços públicos em relação ao total do território.

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plano urbano do brincar


população infantl população

< 15 anos

porcentagem

0 - 6 anos

porcentagem

área (km2)

Brasilândia

281.977

64.432

22,85%

32.766

11,62%

21

Grajaú

390.096

86.406

22,15%

43.691

11,20%

92

Cachoeirinha

146.987

31.341

21,41%

15.678

10,71%

13,3

Jd. ângela

338.265

77.666

22,96%

38.156

11,28%

37

áreas livres quantidade praças

metragem (m2)

parques

total

parques

praças

total

Brasilândia

66

1

67

51.000

19.040

70.040

Grajaú

30

7

37

273.073

105.597

378.670

Cachoeirinha

76 45

0 4

76

0

55.032

55.032

49

3.724.689

30.554

3.755.243

densidade demográfica

densidade de crianças

crianças / espaços

metragem / criança

metragem / habtante

porcentagem

km2

km2 0,25

Jd. ângela

km2 Brasilândia

13427,48

3068,19

967,67

1,09

0,33%

Grajaú

4240,17

939,20

233,30

4,38

0,97

0,41%

Cachoeirinha

11006,54 9142,3

2356,47 2099,08

412,38 1585,02

1,76 48,35

0,38 11,10

0,41% 1,01%

Jd. ângela

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COMPARAÇÃO FINAL

legenda

densidade demográfica infantil espaço livre por criança espaço livre no território

0

1

2 km

m2 / criança

fonte: Produção da autora.

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2.356,47

criança / km2

plano urbano do brincar

%

1,76

3068,19 1,09

0,41%

0,33%


2099,08 48,35 1,01%

932,20 4,38 0,41%

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A BRASILÂNDIA Definido o distrito para o qual iria desenvolver o Plano Urbano do Brincar, a Brasilândia, era essencial que eu entendesse como se davam os espaços de brincar desse distrito, suas potências mas também suas principais fragilidades para, assim, levantar propostas que pudessem qualificar e reviver a alma brincante do território. O distrito, desde a década de 1940, veio se transformando em alternativa para moradia das classes mais carentes, que buscavam trabalho em outras regiões da cidade. “Até hoje esta região possui grande número de habitações precárias, localizadas, em sua maioria, em áreas sujeitas a risco” (SÃO PAULO, 2016, p. 5). Grande parte da Brasilândia apresenta severas restrições à ocupação urbana em decorrência do relevo acidentado, com altas declividades, solos suscetíveis à erosão, matacões e cabeceiras de drenagem. Apesar disso, a região viveu a implantação de loteamentos clandestinos nas encostas dos morros e fundos de vale, resultando em

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plano urbano do brincar


uma ocupação urbana inadequada com graus diversos de risco geológico e geotécnico. A numerosa ocupação dos morros do distrito aumenta o grau de impermeabilidade do território, acelerando o escoamento das águas em direção aos córregos e gerando graves problemas de alagamento. De acordo com o Plano Diretor Estratégico (PDE) de São Paulo de 2014, a região, de modo geral, está definida enquanto uma Zona Especial de Interesse Social I (ZEIS 1), caracterizada pela presença de favelas, loteamentos irregulares, empreendimentos habitacionais de interesse social e assentamentos habitacionais populares, nos quais podem ser feitas intervenções de recuperação urbanística, regularização fundiária e produção e manutenção de habitações de interesse social. Essa zona tem como objetivo urbanístico manter a população moradora e promover sua regularização fundiária. As ZEIS ocupam 32,4% do território da Brasilândia e existem, na subprefeitura, 6.861 moradores em situação de risco, a maioria deles, 95,53%, no distrito estudado. É importante destacar que é uma das regiões com a população etária mais jovem da cidade de São Paulo, sendo, na Brasilândia, o percentual de jovens menores de 14 anos 23,1%, o que é superior ao encontrado no município, 20,8%. O percentual de jovens no distrito é de 27,5%.

ZEIS 1

áreas caracterizadas pela presença de favelas e loteamentos irregulares, habitadas predominantemente por população de baixa renda.

Além disso, possui IDH de 0,765, inferior à média do município (0,805) e apresenta uma enorme carência de infraestrutura de lazer. Quase metade da população (46%) da subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia, onde está localizado o distrito, se encontra distante de um equipamento de cultura, sendo que, na Brasilândia, esse número chega a 53,43%. Em relação aos espaços livres públicos da região, especificamente, comecei olhando para as 66 praças existentes na Brasilândia e me chamou atenção o fato de muitas delas serem pequenas. Barcelona, por exemplo, considera como tamanho mínimo adequado para as praças 150 m2; Tel Aviv, por sua vez, a partir de 0,5 ha (5.000 m2). Entretanto,

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5. Importante dizer que a análise foi baseada na fonte de dados do GeoSampa, olhando para aquilo por eles classificado enquanto praça.

achei que o número proposto por Barcelona se enquadrava mais devido a densidade dos locais: Tel Aviv tem 7533 habitantes/km2, enquanto a Brasilândia possui 13427 habitantes/km2. Já Barcelona possui aproximadamente 219 habitantes/ha, e a Brasilândia 134 habitantes/ha. Apesar da densidade demográfica de Barcelona ser mais alta que a da Brasilândia, sua densidade construtiva é inferior. Desse modo, entendi que os números balanceavam-se e, por isso, adotei 150 m2 como uma referência para pensar o ideal mínimo para os espaços de brincar. De toda forma, separei as praças em três categorias: as menores de 50 m2, pois é uma área extremamente reduzida que quase não permite o brincar livre. Além disso, a grande maioria das praças dessa categoria, apesar de classificadas como praças pela prefeitura, não passavam de canteiros, como o da imagem ao lado, cuja função era mais separar ruas e menos estar e lazer. A “praça” da imagem possui 16 m2, mas existem outras ainda menores, chegando a até 5 m2. Se enquadram nessa categoria 23 das praças da Brasilândia, representando 34,8% do total, mais de um terço, número bastante expressivo. A segunda categoria é formada pelas praças que possuem entre 50 m2 e 150 m2, isto é, aquelas que ainda não possuem o tamanho ideal, mas que já permitem mais atividades e possibilidades. São 17 das 66 praças, representando 25,8% do total. E, por fim, as praças maiores de 150 m2, categoria na qual se enquadram 26 praças, isto é, 39,4% do total. Entretanto, olhar individualmente para cada uma dessas praças torna o cenário ainda mais alarmante. Analisei uma a uma as 43 praças que possuíam, no mínimo, mais de 50 m2. A partir dessa análise, entendi que muitas dessas praças 5 não poderiam ser entendidas como tal. Dessa maneira, para melhor compreensão, criei 6 categorias nas quais, a partir do meu olhar, as praças poderiam ser classificadas. A primeira delas seria a categoria de praça, propriamente dita. São os espaços entendidos como possíveis para realização de atividades lúdicas, para instalação de mobiliário

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plano urbano do brincar


16m2

> 150 m2

39,4%

50 - 150 m2

25,8%

0 - 50 m2

34,8%

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CLASSIFICAÇÃO DAS PRAÇAS

praça

praça-linear

divisória

rotatória

canteiro central

córrego

urbano e mobiliário brincante. Assim, são os espaços com maior oferta de equipamento lúdico: todas possuem árvores e bancos e muitas possuem mesas de xadrez, equipamentos de exercício e brinquedos. Nessa categoria foram enquadradas 9 das 43 praças maiores de 50 m2 de minha base de dados. A segunda categoria é a de praça-linear, a qual ainda Nessa categoria foram enquadradas 2 das praças. A terceira categoria são as praças que entendi enquanto divisórias, isto é, espaços que, de maneiras mais restritas, permitem o estar mas são muito pequenos se comparados com os das duas categorias anteriores. São espaços residuais que funcionam mais como divisórias de trânsito, espaços que organizam o fluxo dos carros. Muitos possuem árvores, poucos possuem bancos e paraciclo. Foram enquadradas nessa categoria 9 das praças. A quarta categoria é a de praça-rotatória, que, assim como a categoria anterior, funciona mais como separação viária que para o estar. Entretanto, nessa categoria o espaço é ainda mais reduzido e não há possibilidade de realização de atividades lúdicas. Alguns poucos espaços possuem árvores e nada mais. Enquadram-se na categoria 4 das 43 praças. A quinta categoria é a de canteiro central, sendo entendidas como aqueles espaços que mais funcionavam como uma separação entre as pistas de rolamento, sendo muito estreitas e, assim, não possibilitando uma grande variedade de atividades. A grande maioria possui árvores, mas não há mais nenhuma oferta, com exceção de uma delas na qual os moradores construíram um espaço para sentar. Foram enquadradas nessa categoria 17 das 43 praças. Por fim, a última categoria, que é quase irônica, é nomeada por córrego. São espaços que, apesar de classificados enquanto praças, são córregos murados que passam no centro de grandes ruas. Entram nessa categoria 2 das praças.

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plano urbano do brincar


Pensando nas possibilidades lúdicas que esses espaços oferecem, listamos 12 atividades (deslizar, balançar, escalar, equilibrar, saltar, sentir vertigem, correr e rodar, esconder, experimentar, interpretar, expressar, deitar e relaxar) que entendemos que sintetizam as atividades possíveis e olhamos para cada um dos espaços para entender quantas dessas 12 ofereciam. Foi bastante interessante perceber como a quantidade era semelhante em cada uma das categorias ao mesmo tempo que diminuía gradativamente de categoria para categoria. Ao olhar para cada espaço da categoria praça, foi possível perceber que a grande maioria deles possibilita, ao menos, 4 das atividades lúdicas, sendo alguns deles, inclusive, mais. Na categoria de praça-linear, todos os espaços possibilitam também 4 atividades lúdicas. Nas divisórias, grande parte dos espaços oferece apenas 1 possibilidade lúdica e alguns não oferecem nenhuma. Apenas um dos espaços-divisória possibilita 4 atividades lúdicas, é bastante interessante notar sua proximidade com uma escola, a CEI Vila Penteado. Na categoria de canteiro, quase a totalidade dos espaços não oferece oportunidade lúdica. São exceção apenas dois espaços, um deles ofertando apenas 1 possibilidade lúdica e o outro 3 possibilidades. Este último também encontra-se perto de uma escola, a EMEF Miltom Campos. As classificadas enquanto espaços-rotatório variam entre nenhuma e uma possibilidade de atividade lúdica. Olhando para a totalidade, apenas 3 de todos os 43 espaços estudados possuem 5 ou mais possibilidades lúdicas.

POSSIBILIDADES LÚDICAS • deslizar • balançar • escalar • equilibrar • saltar • sentir vertigem • correr e rodar • esconder • experimentar • interpretar • expressar • deitar e relaxar

Portanto, com essa análise, é possível dizer que, além de poucos, os espaços livres também possuem pouquíssima qualificação lúdica. Percebemos, ademais da pouca diversificação de atividades, que, de maneira geral, as calçadas são estreitas e os pedestres disputam espaço com os carros estacionados, lixo, postes e casas, que algumas vezes a ocupam toda. Os poucos espaços livres públicos sofrem com o descaso do poder público, que não realiza satisfatoriamente a coleta de lixo nem a manutenção adequada, resultando em sua gradual degradação. Ainda assim, a comunidade, por vezes, organiza-se de modo a

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01. PRAÇA Total: 9 das 43 praças (20,9%) Metragem quadrada média: 982,86 m2 Características: entendidos como possíveis para realização de atividades lúdicas, para instalação de mobiliário urbano e mobiliário brincante. Assim, são os espaços com maior oferta de equipamento lúdico. possui:

possibilidades lúdicas: 4 em média

árvores bancos mesas de xadrez equipamentos de exercício brinquedos

deslizar balançar escalar equilibrar correr e rodar esconder experimentar deitar e relaxar

exemplo:

praça Onesimo Pereira do Nascimento | Av. Padre Orlando Garcia da Silveira, nº 02

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plano urbano do brincar


02. PRAÇA - LINEAR Total: 2 das 43 praças (4,6%) Metragem quadrada média: 1460,85 m2 Características: possibilita a realização de atividades lúdicas diversas, mas, por seu caráter linear, precisa ser pensada a partir de algumas especificidades. Nesses espaços não existem mobiliários urbanos ou brincantes. possui:

possibilidades lúdicas: 4 em média

árvores pedras

escalar saltar correr e rodar esconder

exemplo:

praça sem nome | Av. Deputadp Cantidio Sampaio, nº 1880

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03. DIVISÓRIA Total: 9 das 43 praças (20,9%) Metragem quadrada média: 291,72 m2 Características: espaços que, de maneiras mais restritas, permitem o estar mas são muito pequenos se comparados com os das duas categorias anteriores. São espaços residuais que funcionam mais como divisórias de trânsito, espaços que organizam o fluxo dos carros. possui:

possibilidades lúdicas: 1 em média

árvores bancos paraciclos

balançar escalar correr e rodar esconder deitar e relaxar

exemplo:

praça sem nome | Av. Humberto Gomes Maia, nº 41

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plano urbano do brincar


04. ROTATÓRIA Total: 4 das 43 praças (9,3%) Metragem quadrada média: 80,26 m2 Características: funciona mais como separação viária que para o estar. Nessa categoria o espaço é ainda mais reduzido e não há possibilidade de realização de atividades lúdicas.

possui:

possibilidades lúdicas: 1 em média

árvores

escalar deitar e relaxar

exemplo:

praça sem nome | Cruzamento da Rua 1 com a Rua D.

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05. CANTEIRO CENTRAL Total: 17 das 43 praças (39,5%) Metragem quadrada média: 166,68 m2 Características: aqueles espaços que mais funcionavam como uma separação entre as pistas de rolamento, sendo muito estreitas e, assim, não possibilitando uma grande variedade de atividades.

possui:

possibilidades lúdicas: 0 em média

árvores bancos táticos

escalar correr e rodar esconder

exemplo:

praça sem nome | Av. Humberto Gomes Maia

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06. CÓRREGO Total: 2 das 43 praças (4,6%) Metragem quadrada média: 684,11 m2 Características: espaços que, apesar de classificados enquanto praças, são córregos murados que passam no centro de grandes ruas.

possui:

possibilidades lúdicas: 0 em média

água

saltar

exemplo:

praça sem nome | Rua Agenor Alves Meira.

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6. “The following approach is suggested: (...) 6. a linear distance of 300m is reasonable as it corresponds to approximately 5 minutes walking distance” (OMS, 2016, p. 31); “Everyone, wherever they live, should have an accessible green space of at least 2 hectares in size, no more than 300m linear distance (5 minutes walk) from home” (OMS, 2016, p. 25)

realizar a própria coleta de lixo e a manutenção de alguns espaços, como é o caso da organização Nossa Vila Limpa, que atuava na região da Brasilândia. Ainda, a região é carente de infraestruturas de lazer, algo reforçado pela porcentagem de apenas 4% das áreas construídas não se destinar ao uso residencial. Esse fato impulsiona as crianças a ocuparem espaços muitas vezes perigosos e insalubres, enquanto os espaços livres encontram-se subutilizados e os equipamentos são poucos. Nesse contexto, as crianças também saem prejudicadas, sem espaços que possibilitem seu brincar, uma das maiores potencialidades da infância. Acabam apropriando-se e ampliando a dimensão das ruas, que se tornam locais de convivências e trocas. Entretanto, ao contrário de ser a apropriação desejada de uma rua ativa, voltada para os pedestres e que promova a relação com a cidade, acaba por ser o que resta para as crianças, pois essas ruas não são e nunca foram projetadas para serem seguras para elas, tendo como prioridade os carros. Considerando o foco no brincar, era preciso, ainda, um indicador que refletisse a acessibilidade a espaços adequados para esse fim. Assim, fui olhar para a abrangência que as praças tinham sobre o território, isto é, se as pessoas conseguiam acessá-las facilmente. Segundo a OMS 6, a distância razoável até um espaço público é de 300m linearmente, o que corresponde a aproximadamente 5 minutos andando. Baseada nisso, levantei os raios de 300m de abrangência das praças. Considerei que seria interessante também olhar para a abrangência de 10 minutos a pé (600m) e 15 minutos a pé (900m), não como distâncias ideais, mas como possíveis. Na realização do mapa e no cálculo do alcance das praças, não foi considerada a área da Serra da Cantareira, a região que não pode ser acessada e, portanto, não é considerada nem urbanizada - inclusive no plano diretor é classificada enquanto rural - e nem espaço público livre. Assim, é subtraído 10 km2 (área não urbanizada) dos 21 km2 totais do

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plano urbano do brincar


distrito, considerando sempre 11 km2 a área para calcular-se as influências na área urbanizada. Considerando isso, ao fazer o mapa, foi possível mensurar o quanto essas praças abrangem do território: 5,82 km2 do território urbanizado, isto é, 52,9%, pouco mais da metade, têm acesso a uma praça com 5 minutos de caminhada. Esse número aumenta bastante quando consideramos os 10 minutos de caminhada (600m), subindo para 84,6% do território alcançado (9,31 km2). Flexibilizando para 15 minutos de caminhada (900 m), o número chega a 98,2% (10,8 km2), quase totalizando a abrangência do território. Apenas 1,8% do território fica sem acesso a uma praça a pelo menos 15 minutos andando.

7. Apesar de saber que muitas dessas não possuem a qualificação lúdica adequada, considerou-se a possibilidade de reforma e melhoria das mesmas a partir do PUB.

Entretanto, esses números são relativos. Primeiro, pois apesar de termos olhado para os 15 minutos enquanto possíveis, é uma distância bastante flexibilizada em relação ao recomendado pela ONU. Mas, depois, por saber, devido a análise anterior, que muitas das praças não representam de fato espaços para estar e brincar. Por conta disso, a análise foi refeita considerando apenas as praças maiores de 50 m2 7. Dessa maneira, 50,9% do território (5,6 km2) tem acesso a uma praça a 5 minutos andando, número que não é tão diferente do anterior. Entretanto, a variação é maior para a análise de 10 e 15 minutos caminhando. Nessas condições 73,3% do território (8,11 km2) acessa uma praça caminhando 10 minutos - valor 10,9 pontos porcentuais menor que o anterior -; e 87,8% do território (9,66 km2) possui acesso com 15 minutos de caminhada. Assim, na nova análise, 12,2% do território (1,34 km2) não consegue acessar uma praça, mesmo que caminhe 15 minutos. É importante, ainda, a análise considerando apenas as praças maiores de 150 m2, valor o qual adotamos como ideal mínimo. Nessa terceira análise, os números são bastante inferiores que os da primeira. Apenas 35,5% do território (3,91 km2) acessa uma praça com 5 minutos de caminhada. Quase dois terços do território não é alcançado pelas praças. Considerando 10 minutos a pé, 69,0% do

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ABRANGÊNCIA DAS PRAÇAS

legenda

5 minutos caminhando (300 m) 10 minutos caminhando (600 m) 15 minutos caminhando (900 m) sem abrangência

52,9% 84,6% 0

1

98,2%

2 km

fonte: Produção da autora.

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plano urbano do brincar

1,8%

todas as praças


50,9%

35,5%

73,7%

69,0%

87,8%

77,0%

12,2%

23,0%

maiores de 50 m2

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território (7,59 km2) é alcançado. E, para os 15 minutos andando, a abrangência chega em apenas 77,0% do território (8,47 km2), ficando 23% do território (2,53 km2) sem nenhuma cobertura. Comparando a última análise com a primeira, vemos que a abrangência do raio de 300m das praças caiu 17,4 pontos percentuais e a porcentagem do território que não consegue acessar uma praça nem com 15 minutos de caminhada subiu 21,2 pontos percentuais. Valia a pena também relacionar esses raios com as densidades, tanto construtivas quanto demográficas do local. Sobrepondo a mancha do raio de abrangência das praças com a densidade demográfica, era possível entender se essas praças davam conta, ou não, das regiões mais densas do distrito. Considerando todas as praças, os raios dão conta das regiões essencialmente mais densas, ficando de fora apenas uma região mais ao norte do distrito. Entretanto, considerando apenas as praças maiores de 150 m2, há regiões densas que não são alcançadas pelos raios de 5 minutos de caminhada. Ao sobrepor, ainda, esses raios com a densidade construtiva, foi possível entender se as regiões sem abrangência eram mais ou menos densas construtivamente, isto é, se haveria espaço ou a possibilidade de propor novas praças, ou se seria necessário pensar em outras alternativas. Entretanto, ficou claro que, independentemente das praças consideradas, a grande maioria do espaço não atendido pelas praças é bastante denso e, portanto, talvez fosse mais interessante pensar em outras alternativas. Por fim, olhei para esses raios em relação às escolas do território, para entender quais e quantas escolas poderiam acessar praças com 5 minutos de caminhada e, portanto, estabelecer algum tipo de relação direta com a cidade. Vale destacar, ainda, que a Brasilândia também faz parte do Programa Territórios Educadores, 2019 - 2030, o que aponta por uma relação e alinhamento com aquilo aqui proposto, tornando possível diálogos e aberturas. O projeto estabe-

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plano urbano do brincar


lece 10 regiões da cidade mais vulneráveis para a primeira infância com dados de crianças atendidas pelo Programa Bolsa Família. Tem coordenação da Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes, Secretaria de Governo e Comitê intersetorial, o que também é bastante interessante por trabalhar com diferentes órgãos, já apontando para uma abordagem complexa e sistêmica. Pretende implantar espaços públicos lúdicos no entorno de escolas de educação infantil: as “trilhas” e as “estações” educadoras. Garante a segurança das crianças no trajeto casa-escola com as Rotas Escolares Seguras, projeto a cargo da CET, com redução da velocidade do automóvel, novas sinalizações, lombadas e faixas de pedestres. Entretanto, o projeto ainda está bastante incipiente, com quase nenhuma das ações implementada. Esse primeiro diagnóstico das oportunidades do brincar no espaço público no distrito da Brasilândia permitiu orientar as ações e propostas do Plano a partir de dados, estabelecendo objetivos e eixos estratégicos. A análise também é útil como ponto de partida para detectar as possibilidades e abrangência dos impactos, os desafios e os espaços de oportunidades.

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DENSIDADE DEMOGRÁFICA + ABRAGÊNCIA DAS PRAÇAS

legenda habitante / hectare até 92 92 - 146 146 - 207 207 - 351 351 - 30346

abrangêcia 5 minutos caminhando (300 m)

0

1

2 km

fonte: GeoSampa Produção da autora.

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plano urbano do brincar

todas as praças


maiores de 50 m2

maiores de 150 m2

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legenda espaço livre intraquadra

DENSIDADE CONSTRUTIVA + ABRAGÊNCIA DAS PRAÇAS

50 a 100% 30 a 50% 0 a 30%

abrangêcia 5 minutos caminhando (300 m)

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2 km

fonte: Quapá Produção da autora.

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todas as praças


maiores de 50 m2

maiores de 150 m2

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ESCOLAS PÚBLICAS + ABRAGÊNCIA DAS PRAÇAS

legenda

escolas públicas 5 minutos caminhando (300 m)

0

1

2 km

fonte: GeoSampa. Produção da autora.

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O PLANO

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O PLANO A criança e a cidade são elementos que se interligam, se complementam e promovem, simultaneamente, suas construções. Ao mesmo tempo, a apropriação do espaço pela criança se dá pelo brincar e a brincadeira extrapola a realidade, desconcerta a seriedade e aviva sonhos e desejos. É ingrediente para a criação, justamente porque é espaço de possibilidades. Assim, o brincar pode apresentar-se como experiência de criação de alternativas desejáveis que podem ser exploradas como forma de questionar o mundo real e transformá-lo. Nesse sentido, proponho um Plano Urbano do Brincar (PUB) enquanto possibilidade para refletir sobre os parâmetros urbanos da cidade. A ideia é ir além do cidadão médio, adulto, homem, branco, trabalhador, repensando, a partir da criança, e, essencialmente, do brincar, como exercemos o poder na cidade e a serviço de que e de quem sonhamos e propomos. Busco legitimar o papel das crianças enquanto agentes sociais estratégicos para formulação de políticas públi-

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plano urbano do brincar


cas urbanas; colocar luz, valorizar e estimular o papel das crianças como cidadãs plenas e como agentes de transformação das cidades; estabelecer ferramentas, espaços e modelos de participação cidadã para processos de co-construção e co-criação dos espaços da cidade, favorecendo um fazer mais inclusivo e coletivo; favorecer uma mudança no reconhecimento da importância social do brincar e dos espaços livres, aumentando a consciência de seus benefícios individuais e coletivos para todos os cidadãos; qualificar, expandir e diversificar as oportunidades de brincar livre na cidade, pensando não apenas nas áreas de brincar, mas também em espaços e entornos lúdicos e elementos urbanos brincantes; resgatar o uso do espaço público através do lúdico, criando ambientes de estadia que fomentem o vínculo social e a vida comunitária entorno das brincadeiras e incorporando ao desenho urbano as necessidades das crianças; incentivar que as crianças saiam de casa para brincar com o máximo de autonomia possível; ampliar o diálogo escola-cidade entendendo a escola como pólo centralizador no território. Portanto, o PUB visa melhorar e diversificar as oportunidades de brincadeiras e atividades físicas no espaço público por seus amplos benefícios tanto para o desenvolvimento e bem-estar de crianças e adolescentes quanto para um ambiente urbano mais adequado para o crescimento e a vivência da infância. É a busca por uma cidade melhor para todos. É um plano pensado para promover o exercício do direito de brincar das crianças como ponto de partida, mas também para que os jovens encontrem oportunidades mais atrativas para a atividade física, lúdica e de trocas no espaço público, e para que adultos e idosos recuperem o gosto pelo brincar e pela partilha do tempo e dos espaços lúdicos intergeracionais. Considerar a cidade vivida e a cidade construída a partir do brincar e de seus benefícios permite colocar no centro as necessidades da vida cotidiana, muitas vezes esquecidas, como o próprio brincar, a prática de esportes e a reunião

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REFERÊNCIAS • A Playful City Dublin

• Play London Londres

• Plano Diretor do Brincar Colônia

• Plano Diretor para o Brincar Mülheim

• Cidade Brincante Freiburg

• Plan de Juegos Barcelona

no espaço público e, ao mesmo tempo, ajudar a promover melhorias concretas para um ambiente urbano mais verde e naturalizado, mais seguro e pacificado para gerar mais e melhor oportunidades de brincar que, ao mesmo tempo, geram vida social nas ruas. Isto é, busca também responder a questões importantes para melhorias do quotidiano de toda a sociedade: o que oferece o ambiente urbano da Brasilândia para o brincar e o lazer ao ar livre pensando em primeiro lugar nas crianças mas também em adolescentes, jovens, adultos e idosos? Que intervenções podem ser reforçadas e promovidas para incentivar esta atividade lúdica em convivência com outros usos do cidadão no espaço livre público? O que do modelo urbano vigente precisa ser repensado para diversificar e melhorar a infraestrutura lúdica para além das áreas de lazer padronizadas? Portanto, minha proposta quer favorecer, de alguma maneira, uma mudança no reconhecimento da importância social do brincar e do espaço público como política urbana, propondo algumas alternativas que levem ao reconhecimento dos benefícios coletivos do brincar, no sentido de situá-lo como possibilidade potente de criação de uma cidade mais habitável com melhorias no bem-estar, na saúde e na vida comunitária. Procura, por um lado, permitir e garantir a participação das crianças no exercício de governo e de pensar as políticas públicas e, por outro, recuperar sua autonomia de movimento, vivência e deslocamento na cidade. Como diz Arendt (2005, p. 222) “uma regra geral neste século é que qualquer coisa que seja possível em um país pode, em futuro previsível, ser igualmente possível em praticamente qualquer outro país”. Assim, minha proposta toma como inspiração planos pioneiros como o de Dublin e o de Londres, o Plano Diretor de Mülheim e de Colônia, a cidade de Freiburg e, essencialmente, o Plan de Juegos de Barcelona, experiência-referência da prefeitura da capital catalã a qual tive a possibilidade de estudar e me apro-

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fundar in locu por meio de uma bolsa da Agência USP de Inovação durante o segundo semestre de 2019. Inspirada por essas cidades, então, trabalho com a necessidade de repensar os espaços e oportunidades que o espaço urbano oferece para o brincar diverso e inclusivo ao ar livre para crianças e adolescentes e, com isso, pensar na melhoria da vida comunitária para os cidadãos como um todo. Vale destacar que havia um desejo para que o Plano fosse desenvolvido de forma participativa, colaborativa e intersetorial com diversos agentes da comunidade da Brasilândia. Entretanto, devido a realidade imposta pelo COVID-19, essa abertura não foi possível. Partindo da análise do local escolhido, pude entender que as principais deficiências no que dizem respeito ao jogo na Brasilândia eram a falta de espaços brincantes com tamanho adequado; a estandardização e escassa qualidade em termos de jogabilidade; a acessibilidade apenas à espaços pré determinadas; desenhos e projetos que priorizam a segurança, a manutenção e a tranquilidade dos adultos; pouca conexão com a natureza e de possibilidades de sua exploração; projetos que não pensam em todas as idades e as suas diferentes necessidades de jogo. O Plano busca pensar e projetar espaços múltiplos que, apesar de adotarem a infância como parâmetro, possam ser utilizados por todas as idades, sem distinção de grupos específicos, onde as diferentes faixas etárias possam usufruir e encontrar-se em um mesmo local. Se trata de pensar em uma cidade mais ágil, mais sensível, na qual todos os cidadãos valham mais; de devolver as praças às pessoas e ao brincar das crianças. Portanto, elaboro o Plano visando construir mudanças em direção a uma política urbana que reconheça os benefícios coletivos do jogo e que contribua para uma cidade mais inclusiva, sustentável, saudável e amiga da infância. “Fazer dos espaços cotidianos da criança um laboratório para o desenvolvimento de um senso de liberdade, experimentação e comprovação” (LIMA, 1989, p.11).

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Tenho como ideia central mais e melhores oportunidades para o brincar no espaço público, ou seja, que o brincar forme parte das atividades que se podem fazer nos espaços públicos, desde o 0 aos 99 anos, e que essa seja uma atividade que se contemple e forme parte da vida da cidade, qualificando as experiências urbanas (cotidianas ou não) para todos os cidadãos. Procuro discutir uma nova forma de enxergar o brincar que abarca o espaço público e de enxergar o espaço público abraçando o brincar. Visando esse ideal, buscarei expandir e diversificar o brincar por meio de espaços lúdicos; desenvolver valores, objetivos e propostas para planejar e acompanhar o aumento e melhoria das oportunidades de jogo; promover a participação e corresponsabilidade dos cidadãos e atores sociais, principalmente das crianças (AYUNTAMIENTO DE BARCELONA, 2019). Entendo que é também fundamental delinear premissas e considerações de projeto de espaços designados aos brincares infantis, favorecendo a espontaneidade e liberdade nestas ações, atrelando-as a temas relativos ao desenvolvimento pleno das crianças, com enfoque na possibilidade de atuarem como colaboradoras neste processo complexo de criação da cidade (e de si mesmas) (NIVOLONI, 2018). O Plano levará em consideração as diversas necessidades e interesses nos usos do espaço público em relação à segurança, à gestão equilibrada de riscos e autonomia, ao estar e usufruir, à caminhabilidade, entre outros. É uma tentativa por desenhar as áreas de brincar, espaços lúdicos e entornos urbanos para melhorar e diversificar as oportunidades brincantes da cidade, projetando sua infraestrutura lúdica com base em análises e estimulando as diversas atividade de lazer ao ar livre, entendendo sua importância social, para com isso enriquecer a vida comunitária, a convivência, e a corresponsabilidade pelo brincar por meio de uma sistematização e integração dessas ideias. Há também a busca por ampliar o olhar e não se centrar unicamente nas áreas estritamente de brincar, ou para

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brincar, que limitam a liberdade, autonomia e criação, mas abrir-se também aos entornos e acessos das áreas designadas pelo jogo, concebidas como espaços lúdicos multifuncionais, assim como ao entorno urbano da cidade. Aqui, baseio-me no exemplo do sistema de “playgrounds” de Amsterdã, no qual os espaços de brincar são a menor peça do tecido urbano, as que asseguram coesão, e, a partir delas, é possível criar um sistema de espaços brincantes como projeto urbano que pense a cidade de forma participativa, intersticial e policêntrica (LEFAIVRE, 2007). Participativa pois passa a existir uma cultura de brincar suscetível a mudanças em função do entorno local. O mundo do brincar é maior que aquele imposto pelas áreas para jogo, revelando a importância da autocriação dos espaços de brincar.

8. entendimento de uma cidade brincante proposto a partir do Plan de Juegos de Barcelona, 2019.

áreas de brincar

espaços lúdicos e entorno cidade brincante

Intersticial pois os espaços de transição entre áreas públicas e privadas são essencialmente importantes para os menores, que podem brincar ali com maior segurança e independência. Para os adultos, é um bom local onde pode haver mobiliário urbano que os permita estar. E, por fim, policêntrica devido a rede lúdica dispersa pela cidade, visando sempre aumentar os usuários desses espaços, aumentando a oferta e complexidade das atividades que oferta. A rede de brincar oferecerá um tecido de espaço público que cria as condições para encontro e intercâmbio, dentro do qual o brincar é elevado à cultura urbana. A imagem ao lado 8 é bastante representativa dessa ideia, que busca expandir o brincar, não o prendendo apenas a um espaço delimitado. Assim, poderíamos entender as áreas de brincar como espaços designados especialmente para jogar que incorporam elementos de jogo desenhados expressamente e que requerem certificação. Já os espaços lúdicos e entorno seriam espaços que incluem uma área de brincar e que também oferecem possibilidades lúdicas no entorno e nos acessos, seja em parques e jardins, praças ou ruas peatonais. E, por fim, chega-se a totalidade

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da Cidade Brincante, isto é, um conjunto de espaços urbanos não vinculados a áreas de jogo nem ao seu entorno e acessos onde se joga e realiza atividade físico-esportiva de maneira mais ou menos espontânea e casual que permite maximizar as oportunidades de jogo por meio de táticas diversas (AYUNTAMIENTO DE BARCELONA, 2019). A visão da cidade como um espaço lúdico transborda os limites das atuais áreas designadas ao brincar, criando novos espaços nos quais, tanto a seleção das estruturas como a disposição dos elementos e o desenho de todo o espaço tornam-se dispositivos territorializantes (GOULART, 2017), os quais sejam estimulantes e brincantes e tenham em conta os múltiplos usos lúdicos e de convivência comunitária. Um espaço que convida a criança a brincar, a participar de um jogo de relação, principalmente com outras crianças, integrando a diversidade sociocultural. Um jogo no qual o real e o imaginário compartilham o mesmo espaço. Um brincar livre, que ainda não existe, que não está determinado, mas que a criança percebe como possível. Um brincar que propicia a expressão de sentimentos, a resolução de conflitos e o desenvolvimento integral, que valoriza a criança não por seu potencial futuro, mas pelo seu valor como pessoa no presente (DIAS; FERREIRA, 2015). Assim, proponho que a Brasilândia passe de um distrito com (pouquíssimas) áreas para o brincar para um distrito de brincar livre e diverso no espaço público, no limite, um distrito brincante. Há uma diferenciação importante de espaços para brincar e lugar de brincar (FOG; GULLOV, 2003 apud MORALES, 2015). O primeiro se refere aos lugares criados pelos adultos para as crianças, espacialmente delimitados e com usos especializados pré-determinados. O segundo diz da apropriação espacial das crianças em qualquer tipo de lugar, em diversas formas e graus, “colonizando pequenos lugares” (WARD, 1979) através da adaptação do entorno imposto. Os lugares de brincar são aqueles que permitem que o brincar se desenvolva da mais completa e libertadora forma.

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Os espaços das crianças podem estar em qualquer lugar e em todas as partes das cidades, não apenas nos espaços que foram determinados para eles, como parques e escolas. Assim, “uma cidade que se preocupa realmente por seus jovens fará com que o ambiente em sua totalidade seja acessível para eles” (WARD, 1979, p. 86, tradução nossa). Portanto, que o jogo transborde os entornos das áreas delimitadas e possa ir além, propondo um novo parâmetro (certamente não único e menos ainda totalitário) para se pensar o planejamento da cidade. Dessa forma, pode-se dizer que o Plano Urbano do Brincar, para além de ser uma proposta de planejamento da cidade, propõe uma mudança de visão. Uma cidade brincante não se resume a colocar brinquedos, envolve todo um processo maior sobre pensar em como aprender sensações e emoções, é uma outra maneira de entender a cidade e de olhar para seus diferentes atores. Entendo também como uma nova forma possível de pensar a arquitetura e a educação, contribuindo para a recuperação, no âmbito do distrito e da cidade, das políticas que valorizam os direitos da população, principalmente os das crianças, dos jovens e dos adolescentes, pouco lembrados e respeitados pelo adultocentrismo da sociedade; além de uma ação efetiva relacionada à educação cidadã no trânsito, à valorização e recuperação de espaços públicos, sejam eles abertos ou fechados, associada a projetos que melhorem também a cidade, tornando-a mais bonita, mais limpa, mais saudável e, portanto, num ambiente provedor da boa saúde em todos os sentidos. Assim, é essencial entender que conceber a cidade desde a perspectiva da infância não apenas é bom para as crianças, senão para todos os cidadãos. Isto é, para fazer um espaço jovem melhor, é necessário que haja espaços para que os adultos estejam bem; que os arredores dos espaços de jogo gerem vida comunitária, criem uma comunidade mais coesa. E, além disso, é uma visão que contribui também a todas as questões de cidade, como por exemplo a sus-

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tentabilidade, o verde, que são efeitos quase que diretos, uma vez que melhorar os entornos das áreas de jogo para que as crianças possam brincar de forma mais segura implica pacificar e, portanto, reduzir o tráfego, o que cria um espaço público mais convidativo, diminuindo índices de sedentarismo, etc. É uma forma de potencializar a cidade na construção social da criança e a criança na construção da cidade. Para além de dizer que as crianças têm direito ao brincar, é contribuir para garantir as melhores condições para isso e fazer com que haja uma consciência coletiva da ideia de que é melhor para todos e que é uma proposta que pode dialogar com os planos já existentes da cidade. Assim, é entender “o jogo como uma estratégia de modelo de cidade que cuida de crianças e com benefícios coletivos para todos os cidadãos, porque uma cidade projetada para crescer e viver a infância é uma cidade melhor para todos” (AYUNTAMIENTO DE BARCELONA, 2018, p. 50, tradução nossa).

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ORGANIZAÇÃO DO PLANO O PUB organiza-se a partir de um grande eixo condutor, que direciona todas as outras ações e propostas. A partir dele, desenvolvem-se três eixos de ação, isto é, aqueles a partir dos quais serão pensados os objetivos e as propostas efetivamente, materializando esses eixos. Portanto, cada um dos eixos possui alguns objetivos, que traduzem de forma mais específica o propósito de cada um dos eixos, isto é, onde pretende-se chegar, fornecendo a direção do que se deseja e deve fazer. Dessa maneira, a partir de cada um dos objetivos, são feitas algumas propostas de atuação efetiva, que apresentam-se enquanto materialização de cada um dos objetivos. Por fim, algumas dessas propostas são desenvolvidas enquanto propostas-inspiração como forma de aprofundamento.

1 eixo condutor

3 eixos de ação

8 objetivos

75 propostas

7 propostas-inspiração

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EIXO CONDUTOR

Favorecer uma mudança de paradigma tomando a criança e o brincar como novo parâmetro a partir do qual se pensa a cidade Acredita-se que adotando a criança como parâmetro, a cidade não deixará de atender ninguém, uma vez que ela teria uma diversidade intrínseca, que garantiria todas as outras diversidades. Isto é, se trata de adotar uma nova ótica, uma nova filosofia para programar, avaliar, projetar e modificar a cidade. Tomar as crianças e o brincar como parâmetro para pensar a cidade é também uma forma de abranger a todos - ou pelo menos mais - agentes sociais da cidade, pensando-a de forma inclusiva. A ideia é tomar o jogo como uma estratégia de modelo de cidade que cuida de crianças e que traz benefícios coletivos para todos os cidadãos, porque uma cidade projetada para crescer e viver a infância é uma cidade melhor para todos.

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EIXOS DE AÇÃO Criação coletiva de uma cidade brincante Este eixo visa ações que valorizem a co-construção da cidade brincante, entendendo-a como uma materialização coletiva, na qual a voz de todos e de cada um importa. Assim, proporcionar espaços de escuta, participação e co-criação, garantindo que a cidade seja mais inclusiva e abrangente, valorizando o brincar e suas potências

Infraestrutura lúdica em uma cidade brincante Este eixo inclui as ações destinadas a facilitar mais e melhores oportunidades para brincar no espaço livre, diversificando e qualificando os diferentes tipos de espaços brincantes e fornecendo uma infraestrutura lúdica a partir de novos critérios e parâmetros. Pensa-se na infraestrutura lúdica a partir de 3 camadas: espaços de brincar e pátios escolares; parques e praças e ambientes escolares; espaços livres urbanos.

Usos lúdicos em uma cidade brincante Este eixo abrange um conjunto de ações voltadas para estimular usos e tempo gasto em atividades lúdicas (culturais, de lazer, etc.) no espaço público da cidade. Além de ter um boa oferta de infraestrutura brincante, os usos lúdicos devem ser promovidos para que todos os cidadãos possam nutrir seu homo luden, aproveitando as oportunidades que oferece o ambiente urbano da cidade, contribuindo também para criar uma cidade mais brincante.

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OBJETIVOS por eixo de ação

criação coletiva de uma cidade brincante o papel das crian1 legitimar ças enquanto agentes sociais

estratégicos para formulação de políticas públicas urbanas

luz, valorizar e estimular 2 colocar o papel das crianças como cidadãs plenas e como agentes de transformação das cidades

ferramentas, 3 estabelecer espaços e modelos de partici-

pação cidadã para processos de co-construção e co-criação dos espaços da cidade, favorecendo um fazer mais inclusivo e coletivo

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infraestrutura lúdica em uma cidade brincante

Usos lúdicos em uma cidade brincante

uma mudança no 4 favorecer reconhecimento da importância

o uso do espaço pú6 resgatar blico através do lúdico, crian-

social do brincar e dos espaços livres, aumentando a consciência de seus benefícios individuais e coletivos para todos os cidadãos

expandir e diversifi5 qualificar, car as oportunidades de brincar

livre na cidade, pensando não apenas nas áreas de brincar, mas também em espaços e entornos lúdicos e elementos urbanos brincantes

do ambientes de estadia que fomentem o vínculo social e a vida comunitária em torno das brincadeiras e incorporando ao desenho urbano as necessidades das crianças

que as crianças saiam 7 incentivar de casa para brincar com o máximo de autonomia possível

o diálogo escola-cidade 8 ampliar entendendo a escola como pólo centralizador no território

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investimento em projetos existentes

OBJETIVO

1

legitimar o papel das crianças enquanto agentes sociais estratégicos para formulação de políticas públicas urbanas

mobiliário urbano

estabelecer estrutura de gestão adequada dar prioridade absoluta às crianças articular intersetorialmente os programas valorizar os pedestres


ruas compartilhadas

estrutura de governo intersetorial

aumentar as calçadas

acervo de projetos e iniciativas existentes

pequenas intervenções

mais ciclovias

enquetes periódicas municipais


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PROPOSTAS objetivo 1

1

Estrutura de governo intersetorial Desenvolver uma estrutura de governança intersetorial que reja as políticas públicas urbanas para a infância. Isto é, criar uma estrutura de gestão municipal adequada com recursos municipais suficientes para organizar e garantir a implementação adequada do Plano, com referências, equipamentos e organização claros em termos de recursos humanos e econômicos, seja nas diretorias, serviços e institutos, como em todos os bairros. Isto é, propomos a criação de uma estrutura que fique responsável por pensar, trabalhar, desenvolver e divulgar as questões relacionadas à infância e cidade da subprefeitura.

Referência: Barcelona - Institut Infància i Adolescència | Departamento Barcelona Ciudad Educadora

2

Acervo de projetos e iniciativas existentes É fundamental recolher e organizar as iniciativas que já ocorrem ou ocorreram na cidade e que dialogam com as outras propostas do plano como possibilidade de banco de referências, de estabelecimento de redes e de multiplicação da ação para outros territórios por meio da ação do poder público, favorecendo a escalabilidade da ação. Entendemos que faz mais sentido olhar para aquilo que já ocorre na cidade do que limitar-se a sentar em um escritório para desenhar propostas que, muitas vezes, fogem da realidade. O fato de já se desenvolverem inúmeras propostas nesse sentido alimenta a discussão e é um grande embasamento para pensar aquilo que pode ser feito.

Referência: publicação CECIP “Projetos com participação infantil no Brasil” - Rio de Janeiro

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3

Investimento em projetos existentes Partindo do acervo de projetos e iniciativas existentes, é possível chegar em diversos coletivos e organizações que já realizam ações bastante importantes pensando na relação da criança com a cidade e entendendo-a como um território brincante. A ideia é replicar as boas iniciativas que já se dão, fomentando e ajudando que esses coletivos/organizações consigam multiplicar suas ações. É uma maneira de fazer com que iniciativas importantes alcancem mais territórios e comunidades bem como de fortalecer, valorizar e incentivar os coletivos e organizações existentes.

Referência: Projeto ELLA - Viena | Grätzloase action program - Viena | Stadtmakers Fonds - Amsterdã

4

Pequenas intervenções Necessitamos projetos imediatos de pequenas unidades ou espaços de urbanidade nos quais o comportamento cooperativo tome o lugar das regulações impostas e controladoras, olhando para as necessidades concretas das pessoas. A ideia, então, seriam desenhos em pequena escala e de implantação rápida, que tomassem como base as crianças e seus cuidados e partissem de uma perspectiva de gênero, uma vez que, na grande maioria das vezes, são mulheres as que acompanham as crianças. Exemplos dessas intervenções seriam zonas de descanso para gestantes e mães com crianças de colo, estacionamentos de carrinhos de bebê, banheiros públicos, etc.

Referência: Microintervencions urbanes, Plan de Juegos - Barcelona

5

Aumentar as calçadas Se queremos uma cidade brincante, é preciso que os espaços livres públicos sejam os primeiros a aderirem a essa mudança. Sendo o sistema viário extremamente representativo em área e considerando que toda - ou quase toda - rua possui uma calçada e essa é, por excelência, do pedestre, defendemos que uma das primeiras grandes medidas pensadas enquanto política pública seja a ampliação das calçadas. Primeiro porque estas, na subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia, são extremamente pequenas. Segundo porque com calçadas maiores elas se tornam espaços mais convidativos ao estar e ao brincar. E terceiro porque calçadas mais largas são fundamentais para toda a sociedade para possibilitar encontros, trocas e atividades. Referência: R. Enric Granados - Barcelona | Superilles - Barcelona | Ronda de Sant Antoni - Barcelona

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6

Ruas compartilhadas Muito relacionada à mudança de paradigma no uso e fruição da rua e em consonância com os recentes debates internacionais, grande parte da ideia das ruas compartilhadas é a devolução do espaço livre público ao cidadão, ao pedestre, à criança. É a busca por recuperar a rua como um espaço público, mais do que uma via de circulação, a partir de estratégias de pacificação do trânsito motorizado. A rua recupera suas muitas possibilidades de atividades, as pessoas passam a poder utilizá-las e os carros são obrigados a diminuir a velocidade.

Referência: Vester Voldgade - Copenhague| Padre Alonso de Ovalle - Santiago| R. Buenos Aires - Rio de Janeiro

7

Mobiliário urbano Aumentar o mobiliário urbano é levar em conta as necessidades diárias e criar ambientes de vida em toda a cidade e, em particular, em áreas de lazer e parques infantis. Isso envolve investir e acelerar a instalação de itens para sentar, mesas de piquenique, fontes de água potável, áreas de sombra entre muitos outros. Isso qualifica o lugar e possibilita a ocorrência de encontro social, de atividades não essenciais, de brincadeiras, etc. Qualifica as experiências e torna a cidade mais habitável.

Referência: Concurso de ideias para elementos de mobiliário urbano - São Paulo

8

Mais ciclovias Como maneira de caminhar rumo a uma cidade mais inclusiva, democrática e acolhedora, com outro parâmetro prioritário que não o adulto motorista, propõe-se o estabelecimento de uma rede cicloviária no distrito, que permita deslocamentos ativos e a reapropriação da rua. Além de ser uma maneira de ocupação do espaço público, um modal pouco poluente e de garantir maior segurança viária, é uma forma de fazer com que crianças, idosos e qualquer outro pedestre sinta-se mais seguro na rua e, assim, queira fazer uso dela. As ciclovias também proporcionam uma outra retomada do uso das ruas pelas crianças, sendo uma opção de lazer que resgata uma faceta da infância há muito esquecida nas regiões mais urbanizadas da cidade. Referência: cidade de Curitiba | Cidade de Copenhague

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9

Enquetes periódicas municipais Propõe-se a incorporação de pesquisas municipais periódicas sobre frequência e satisfação com relação aos espaços de brincar da região. As enquetes devem abarcar tanto o tempo destinado ao brincar, a qualidade dos espaços, a oferta de possibilidades, etc. Podem ser elaboradas enquetes voltadas para as crianças, no qual elas contêm de suas experiências, a qual poderia ser veiculada com apoio das escolas; e enquetes voltadas aos adultos; pais, educadores, cuidadores, etc, visando entender sua percepção sobre o assunto e sobre a qualidade dos espaços para eles.

Referência: Enquestes periòdiques municipals, Plan de Juegos - Barcelona

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oficinas periódicas

OBJETIVO

2

colocar luz, valorizar e estimular o papel das crianças como cidadãs plenas e como agentes de transformação das cidades

proporcionar espaços de escuta para sua voz criar ferramentas de participação infantil empoderar as crianças enquanto cidadãs plenas


detetives do bairro

conselho das crianças

modelo de cocriação

audiências públicas infantis

espaço de reivindicações


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PROPOSTAS objetivo 2

10 Conselho das crianças A proposta visa a criação de um Conselho das Crianças enquanto um mecanismo para incluir sua voz nas decisões políticas, fazendo com que as crianças passem a ter mais participação nas decisões dos distritos e/ou da cidade. É uma maneira de fazer com que os tomadores de decisão nas cidades ouçam as crianças que ali moram, representadas em seu Conselho, que vêem na cidade diversas oportunidades para transformá-la em um cenário que beneficiaria a todos, uma vez que as crianças apontam problemas distintos, os quais os adultos tendem a não ver ou subestimar, como a falta de espaço e tempo para brincar, a proteção excessiva, ou a impossibilidade de mobilidade autônoma.

Referência: Comitê das crianças - Jundiaí | Consejo de niñas e niños - Rosário

11

Audiências públicas infantis São um mecanismo de participação através do qual a sociedade e, nesse caso específico, as crianças, fazem propostas à prefeitura sobre a gestão da cidade. São convocadas audiências públicas com jovens entre 11 e 17 anos para discutir propostas e leis que se relacionem diretamente à infância e à adolescência ou que, indiretamente, as afetem, possibilitando espaço de diálogo e participação aos jovens como cidadãos de pleno direito. Eles refletem, intercambiam ideias, imaginam e buscam soluções para, finalmente, emitir sua opinião e demanda a respeito do proposto.

Referência: Las audiencias públicas a los chicos y chicas - Barcelona

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12 Espaço de reivindicações A ideia é a criação de canais que facilitem as reivindicações das crianças. Propõe-se, inicialmente, dois canais principais. O primeiro deles, uma plataforma online no qual as crianças possam perguntar suas dúvidas acerca da cidade, as quais serão respondidas por especialistas e/ou gestores. O segundo, caixas de correio, instaladas em todas as escolas, nas quais as crianças possam depositar suas reivindicações para a cidade. Esses papéis, sejam eles escritos ou desenhados, são recolhidos e levados frequentemente aos gestores.

Referência: L’alcadessa respon als infants - Barcelona

13 Oficinas periódicas Oficinas abertas que convidem as crianças a colocarem-se no lugar de gestores da cidade: que ações fariam se fossem prefeitos? Oficinas com crianças de 1 a 14 anos, separados por idade, considerando as necessidades de diferentes metodologias, que funcione como espaço de escuta e possa trabalhar com as crianças temas diferentes. Cada oficina deve tratar de um tema específico: segurança, mobilidade, educação, cultura, saúde, direito à cidade, memória, etc., buscando entendê-los sob perspectiva da infância. São feitas propostas lúdicas para que as crianças expressem como o cotidiano das cidades afeta suas vidas. Podem ser firmadas parcerias com instituições infantis, como espaços de brincar, escolas, CEUs, Centros de Referência de Assistência Social (CRAS), CCAs, etc. Referência: Vozes da cidade - Salvador

14 Modelo de Cocriação Desenvolvimento de um modelo piloto de co-criação de parques e praças com crianças. Propõe-se a elaboração de uma metodologia que possa ser replicada em diferentes espaços, com diferentes idades, em diferentes tempos, levando em consideração possíveis adaptações às especificidades do lugar e da faixa-etária. A Ação possui dimensão dupla: é uma forma de materializar e exemplificar o como fazer, bem como garante a abrangência em nível municipal da ideia de co-criação urbana com crianças, fortalecendo também seu papel enquanto cidadãs.

Referência: CoCriança - São Paulo

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15 Detetives do bairro É uma forma de garantir que as crianças possam olhar e dizer sobre seu entorno de forma contínua. Assim, levantam-se voluntários que, em parceria com escolas, desenvolvem um questionário para que as crianças observem ao longo de seus trajetos o que está bom, as barreiras no caminho e os lugares que podem ser perigosos do ponto de vista delas. Propõe-se a utilização de mapas dos trajetos que as crianças fazem no bairro, onde elas qualificam os espaços entre bom, médio ou regular. Os resultados devem ser apresentados para diferentes atores da cidade: moradores, polícia, secretaria de trânsito, etc.

Referência: Detetives do bairro - Freiburg

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OBJETIVO

3 plataforma de orçamento colaborativo

estabelecer ferramentas, espaços e modelos de participação cidadã para processos de co-construção e co-criação dos espaços da cidade, favorecendo um fazer mais inclusivo e coletivo

consolidar mecanismos de participação da sociedade abrir canais de escuta para questões locais incorporar princípios de gestão democrática propiciar processos descentralizados


conselhos locais

incentivo ao urbanismo colaborativo gestão compartilhada


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PROPOSTAS objetivo 3

16 Conselhos locais Visando impulsionar a participação cidadã e sua implicação ativa na formulação de políticas públicas, bem como fomentar o diálogo aberto entre poder público, sociedade civil e organizações, propõe-se a criação de Conselhos Locais. Considerando o mapeamento, a articulação comunitária e a cocriação de projetos de melhoria urbana na escala do bairro, a composição dos conselhos deve ser paritária, e seu processo de desenho já deve prever a participação da sociedade civil, incluindo crianças, bem como o estabelecimento de regras claras e democráticas de criação, acesso e composição paritária entre setor privado, setor público, academia, organizações da sociedade civil e a sociedade civil não organizada.

Referência: Foros locales - Madrid

17 Incentivo ao urbanismo colaborativo A proposta é que seja destinado pelo menos parte dos recursos de mitigação de impactos de grandes obras a editais ou outros caminhos que financiem intervenções de urbanismo colaborativo voltados para atividades organizadas a partir da sociedade civil e que incluam o olhar para a infância. É importante que esses sejam o mais desburocratizados possível, contando com campanhas de capacitação para a participação da população na formulação de propostas. Ao privilegiar o financiamento de ações e projetos colaborativos, é possível dar escalabilidade às soluções propostas e prototipadas pela própria comunidade, incluindo a criação de uma comissão ou júri destinado ao desenvolvimento de outros fundos mais permanentes. Referência: BipZip - Lisboa | Programa de Mejoramiento Barrial y Comunitario - Cidade do México

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18 Gestão compartilhada de espaços públicos Desenvolver e implementar leis e/ou protocolos que dêem suporte às iniciativas cidadãs, abrindo a possibilidade para a gestão compartilhada dos espaços públicos para seu uso comum, flexibilizando os procedimentos para o uso e ocupação temporária destes espaços. Além disso, propõe-se a desburocratização do processo para intervenção em espaços públicos, desenvolvendo uma regulamentação – pensada em conjunto com a sociedade civil – por exemplo para hortas urbanas, ações urbanas de requalificação em espaços públicos e de atividades de plantio em mutirão, bicicletários, parklets, feiras de economia solidária, espaços de brincar, etc. Propõe-se, ainda, que essas ações iniciem-se por praças.

Referência: Lei (16.212) de Gestão Participativa de Praças - São Paulo | Bologna Regulation - Bolonha

19 Plataforma de orçamento colaborativo Para conduzir processos de maneira mais transparente, propõe-se espaços virtuais institucionalizados de participação social e cocriação de projetos urbanos e políticas públicas para garantir um ambiente de diálogo permanente com a população nos processos de tomada de decisão relativos ao dinheiro público, fazendo uso das tecnologias de comunicação. A plataforma deve estar acompanhada de uma campanha de sensibilização e engajamento cidadão.

Referência: Decide Madrid - Madrid| Decidim Barcelona - Barcelona

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ruas brincantes

OBJETIVO

4

favorecer uma mudança no reconhecimento da importância social do brincar e dos espaços livres, aumentando a consciência de seus benefícios individuais e coletivos para todos os cidadãos

sensibilizar sobre os mecanismos de exclusão e invisibilidade das crianças nos espaços públicos sensibilizar sobre a importância do brincar para o desenvolvimento integral das crianças ampliar a percepção sobre a importância de espaços acessíveis adequados

estabelecer datas que celebrem o brincar

valorizar os espaços livres enquanto estratégicos no planejamento urbano


dia do brincar

escadões vibrantes

campanha de sensibilização

ciclo de cinema: direitos das infâncias dia sem carro

novo nome para os espaços brincantes


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PROPOSTAS objetivo 4

20 Ruas brincantes A ideia é recuperar o espaço público para os pedestres, para o brincar, possibilitando uma reocupação do espaço da rua. Propõe-se uma retomada e ampliação do programa “Ruas de Lazer” do município, favorecendo que mais ruas sejam abertas aos pedestres. Trata-se de fechar temporariamente o trânsito em algumas ruas do distrito para ganhar, regularmente, novo espaço público para brincadeiras ao ar livre e atividades físicas da promoção de hábitos saudáveis que ​​ melhorem o bem-estar e a qualidade do lazer compartilhado, começando com a infância. Acreditamos que a abertura de espaços públicos para as pessoas promove uma cidade mais sustentável, saudável, lúdica, com locais de convivência da diversidade, de lazer e fruição do espaço urbano. Referência: Av. Paulista - São Paulo | Obrim Carrers - Barcelona

21 Dia do brincar O objetivo é reivindicar, reforçar e difundir que brincar é um direito das crianças bem como potencializar o uso dos espaços públicos para o brincar infância. Dia 28 de maio é o dia internacional do brincar, celebrado por mais de 40 países. Incentiva-se que o dia seja celebrado com atividades, jogos, espetáculos e oficinas para toda a família espalhados pelos diferentes espaços do distrito: parques, praças, ruas, vielas, etc.

Referência: Semana Mundial do Brincar - São Paulo | Día Internacional del Juego - Barcelona

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22 Ciclo de cinema: direitos das infância É uma proposta pedagógica desenhada sob a perspectiva da infância com o objetivo de criar espaços de reflexão e debate sobre os direitos das crianças. Pretende-se dotar tanto as crianças com elementos e ferramentas para o desenvolvimento de uma cidadania ativa, refletindo sobre direitos individuais e coletivos; quanto adultos - pais, cuidadores, família, educadores - da importância desse direito infantil, de garantir às crianças seu direito ao brincar.

Referência: Cicle de Cinema dels Drets dels Infants - Barcelona

23 Novo nome para os espaços brincantes A partir da convicção de que as palavras produzem sentido, criam realidades e, às vezes, funcionam como potentes mecanismos de subjetivação, propõe-se que seja designado um nome específico para esses espaços. Uma das maiores evidências do descaso com os espaços de brincar na cidade é que eles nem mesmo nome tem. Às vezes são chamados de parquinhos, algo que já assumiu contação infantil em seu pior sentido, mas, na maioria das vezes, o nome que comumente aparece é ‘playground’, um termo em inglês para designar algo tão inato às crianças.

Referência: -

24 Campanha de sensibilização Desenvolver campanha de comunicação e conscientização sobre a importância social do brincar e seus benefícios coletivos e urbanos para todos. Propõe-se ações de comunicação online e materiais físicos, como displays em pontos de ônibus. Também incluem-se palestras dirigidas a famílias por meio de associações de estudantes.

Referência: La inventora de joguines - Barcelona

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25 Escadões vibrantes Propõe-se a requalificação dos escadões enquanto lugares mais seguros e agradáveis para passagem mas também que possibilite atividades de permanência. Estimula-se a integração com a comunidade no mapeamento de passagens e a elaboração de propostas para a melhoria local. O processo pode ser realizado com moradores do entorno, com escolas públicas, CCAs, integrantes do programa Escola da Família, entre outros e envolver, ainda, com artistas locais. A ideia é que seja um processo participativo no qual os agentes envolvidos sejam escutados em suas necessidades e desejos, podendo, inclusive, contar com a instalação de elementos lúdicos, como escorregadores.

Referência: Olhe o Degrau, Jardim Ângela - São Paulo

26 Dia sem carro Na década de 1990, algumas cidades começaram a adotar o dia mundial sem carro, uma iniciativa para desincentivar o uso do automóvel e fazer um chamado aos cidadãos a deixar esse meio de transporte por um dia e provar novos meios de deslocamento. O dia ainda é comemorado em 22 de setembro como um manifesto pela necessidade de reduzir a presença de automóveis na cidades para que a sociedade desfrute de melhores condições ambientais, acústicas e de qualidade de vida em geral. Propõe-se que a data seja incorporada ao calendário de São Paulo, suspendendo a circulação de veículos em algumas avenidas principais e ruas (considerando fluxos importantes, como hospitais) e, além disso, são propostas diversas atividades lúdico-culturais de ocupação das ruas para todas as idades. Referência: Dia sin coche, Via Laietana - Barcelona

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espaços acessíveis

OBJETIVO

5

qualificar, expandir e diversificar as oportunidades de brincar livre na cidade, pensando não apenas nas áreas de brincar, mas também em espaços e entornos lúdicos e elementos urbanos brincantes

ampliar a oferta de espaços lúdicos e acessíveis estimular a criação e revitalização de espaços urbanos lúdicos

renovação dos espaços brincantes

critérios para desenhar áreas de brincar

reservas naturais da infância

adotar a percepção das crianças como premissa de planejamento diversificar as oportunidades lúdicas na cidade

terrenos de aventura


requalificação das áreas estandardizadas

ateliês temporários

transformação de praças existentes

salão para os pais

brincar com água

pontos de empréstimos

serviço de apoio ao brincar

jogamos na praça: itinerante

mínimo de 5 atividades lúdicas

renovação das especificações técnicas

contato com a natureza manual operativo


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PROPOSTAS objetivo 5

27 Renovação constante dos espaços brincantes A norma técnica NBR 16071 prevê que uma vistoria técnica deve ser feita a cada seis meses para se observar as estruturas e os demais pontos que compõe o local e uma vistoria com responsabilidade técnica, na qual verifica-se todos os requisitos de segurança listados na norma. Entretanto, essas vistorias limitam-se às questões de segurança, não atentando-se para a qualidade brincante do espaço. Assim, propõe-se que todos os espaços de brincar devem passar por uma revisão quanto a sua ludicidade e, se necessário, reforma, a cada 3 anos, garantindo sua qualidade. Assim, aproveitando-se das revisões constantes, deve-se sempre adequar o espaço para as novas diretrizes propostas pelo Plano, fazendo com que, gradualmente, todos os espaços estejam de acordo com o previsto. Referência: Plan de Juegos - Barcelona

28 Revisão das atuais especificações técnicas dos parques infantis Revisar as atuais especificações técnicas dos espaços de brincar (parques infantis) de forma a adaptá-los à mudança de paradigma do brincar na cidade e aos novos modelos de espaços lúdicos e de cidade brincante. Há muitas indicações na norma brasileira existente (NBR 16071) que não dialogam com o que se propõe no Plano. Por exemplo, são previstos espaços dividido em áreas de acordo com a faixa etária, o que limita as trocas e pressupõe atividades específicas, dadas, estruturadas, que condicionam e não permitem livre imaginação e uso; ou, ainda, que todas as superfícies destinadas a entrar em contato com os pés devem ser horizontais e uniformes, quando entendemos que superfícies com desníveis são muito interessantes para as crianças. Referência: UNE- EN 1176 - União Europeia

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29 Critérios para desenhar áreas de brincar Propõe-se o estabelecimento de 7 critérios que sejam levados em consideração quando forem desenhados espaços de brincar. São eles: 1. múltiplas propostas de jogos criativos e com desafios para o desenvolvimento saudável das crianças; 2. espaços físicos diversos, estimulantes, conectados e acessíveis; 3. espaços de jogos inclusivos para distintas idades, gêneros, culturas e descapacidades; 4. contato com a natureza, o verde e a exploração dos elementos naturais; 5. jogo compartilhado e cooperativo; 6.lugar de encontro e convivência comunitária; 7. ecossistemas lúdicos e entornos seguros e brincantes.

Referência: criteris per al disseny d’àrees de joc i espais lúdics, Plan de Juegos - Barcelona

30 Manual operativo de execução técnica dos critérios Elaboração de um manual operativo de execução técnica dos critérios para a concepção de espaços de brincar e espaços lúdicos, sejam eles de nova criação ou de renovação. O manual deve levar em conta requisitos de diversidade, inclusão, manutenção, higiene, acessibilidade e design, bem como alguns padrões mínimos de suficiência na qualidade do jogo para orientar como o projeto técnico incorpora os critérios em cada caso.

Referência: Manual operatiu, Plan de Juegos - Barcelona

31 Mínimo de 5 atividades lúdicas por espaço A proposta é garantir que cada espaço de brincar possua pelo menos cinco dentre essas atividades, visando a diversidade de ações e de criar: 1. deslizar (escorregadores de diferentes medidas e formas); 2. balançar (balanços individuais e coletivos distintos); 3. escalar (árvores, escaladas, pirâmides de cordas, esculturas brincantes); 4. equilibrar (barras, circuitos, rodas giratórias); 5. saltar (camas elásticas, estruturas flexíveis de rede); 6. sentir vertigem (rodas giratórias, tirolesa, pontes); 7. correr e rodar (circular correndo, de bicicleta, skate, patinete); 8. esconder (casinhas, arbustos, tubos); 9. experimentar (areia, vegetação, córregos, estruturas sonoras); 10. interpretar (casinha, cozinha, trens, carros); 11. expressar (giz, espaços cênicos, espelhos, música); 12. deitar e relaxar (bancos, mesas). Referência: mínim de 6 activitats lúdiques diferents, Plan de Juegos - Barcelona

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32 Requalificação das áreas estandardizadas A partir dos 7 critérios propostos e das atividades lúdicas listadas, bem como através do recurso da vistoria frequente e possível reforma, garantir a transformação dos espaços estandardizados já existentes.

Referência: Praça Israels Plads - Copenhague

33 Transformação de praças existentes Além de poucas e, muitas vezes, pequenas, as praças existentes no distrito apresentam pouca variedade lúdica. Assim, pretende-se que essas praças sejam requalificadas através de modelo de co-criação bem como baseando nos critérios estabelecidos pelo Plano. Dessa forma, acredita-se haver maior escuta e cuidado com os desejos e necessidades das crianças, criando espaços mais inclusivos, diversos e brincantes.

Referência: Praça Livre Para as Crianças, CoCriança - São Paulo

34 Brincar com água Propõe-se o aumento do jogo com a água como recurso essencial na infraestrutura lúdica da cidade. São três as principais linhas de ação: instalação de fontes de água potável fáceis de usar para crianças em áreas recreativas e ambientes de jogos com uso duplo: hidratação e brincadeira; adaptação de espaços para o jogo de esguichar-se e refrescar-se durante a temporada de verão; e incorporação de um kit de jogos aquáticos para o verão. A água pde ser um recurso lúdico bastante interessante para a ocupação do espaço público.

Referência: Projeto rios e ruas - São Paulo | Praça Primavera de Tainan - Tainan

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35 Pontos de empréstimo Criação de uma rede de empréstimos em áreas de lazer para oferecer banheiros, trocadores e empréstimos de kits ou jogos para brincar. Há um objetivo quadruplo: garantir que haja acesso livre e gratuito aos banheiros; oferecer um serviço de empréstimo de material para brincar com um kit básico de jogos (espuma de bola, corda, balde e pá, giz, badminton, jogos de tabuleiro ...); melhorar o bem-estar de todos e prolongar o tempo de permanência e a qualidade do brincar; estimular os comércios locais.

Referência: Guinguetes-bar - Barcelona | Communal Toy Box - Rotterdam

36 Terrenos de aventura Trata-se de introduzir, conduzir e garantir na cidade um modelo de espaço destinado a crianças de 8 a 14 anos, bem como para adolescentes. Concebido para uso vespertino, aos finais de semanas e feriados, seriam supervisionados por equipe especializada, oferecendo oportunidades para jogos experimentais, criativo e livre, assumindo riscos em um ambiente seguro por meio de atividade autodirigida com base no manuseio e construção com resíduos e materiais naturais (tecidos, rodas, papelão, terra, madeira, água ...).

Referência: Adventure Playgrounds - Berlim | Kinderabenteuerhof - Freiburg | Komazawa Harappa Play Park - Tokyo

37 Ateliês temporários Buscando responder à necessidade de crianças por um espaço de brincar de livre acesso em local público, especialmente em momentos nos quais não estivessem na escola, somado à possibilidade das ruas brincantes bem como a pouca existência de espaços culturais, propõe-se um ateliê de estrutura modular com atividades culturais e oficinas para crianças que se instala na rua durante os finais de semana (montado no sábado de manhã, desmontado no domingo a noite). As atividades têm duração de 50 minutos, mas as crianças podem permanecer em quantas atividades quiserem pelo tempo que desejarem. Seria, então, um complemento às atividades já realizadas e permitiria mais uma forma de dinamização cultural e ocupação dessas ruas. Referência: El Tanque, coletivo Bonde Zero e TXP - Quito | Floating University - Berlim

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38 Contato com a natureza Brincar ao ar livre envolve a prática de brincadeiras ativas que estimulam as habilidades motoras, essenciais para o bom desenvolvimento físico e psicológico. Ao estimular os sentidos, o contato com a natureza possibilita o desenvolvimento da sensibilidade e dos órgãos de percepção da criança, aspecto fundamental para que ela cresça saudável e integralmente. Na natureza, o corpo e os sentidos das crianças estão totalmente despertos, abertos às diferentes sensações táteis, gustativas, olfativas, visuais, sonoras que a natureza possibilita. Ao contrário dos brinquedos prontos, ou da televisão, que já possuem forma, função e conteúdo definidos, os elementos da natureza convidam a criança a agir ativamente no mundo, transformando a matéria a partir de sua imaginação e ação. Referência: Criança e Natureza, Alana - São Paulo

39 Reservas naturais da infância Considerando a localização do distrito e sua abrangência do Parque da Cantareira, propõe-se a criação de reservas naturais da infância como possibilidade de usufruir da experiência na natureza e que, ao mesmo tempo, esses espaços possam associar-se enquanto lugares de aprendizagem para programas de educação.

Referência: Cidade Escola Ayni - São Paulo | Jardins de infância florestais

40 Jogamos na praça: itinerante Com o objetivo de enriquecer a vida da comunidade e os diversos usos nas praças e recuperar o hábito de brincar na rua, trata-se de lançar um programa de dinamizações e propostas lúdicas efêmeras para as praças da cidade, que forneçam materiais que geram diversas possibilidades de jogo. Torná-lo um serviço urbano itinerante no qual todos os distritos podem enriquecer a vida nas praças.

Referência: Racó dels Jocs - Barcelona

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41 Espaços acessíveis É essencial que os espaços de brincar sejam acessíveis, seja em nível de lugar ou em nível de estrutura brincante. Isto é, propõe-se que os entornos brincantes sejam também possíveis às pessoas com descapacidades funcionais e que as estruturas ou brinquedos tenham uma possibilidade inclusiva.

Referência: El Pop, Parc de la Pegasu - Barcelona

42 Serviço de apoio ao brincar para crianças com diversidade funcional Há meninos e meninas que não podem desfrutar em igualdade de condições das zonas e atividades de brincar. Às vezes, a participação da criança nos espaços lúdicos é condicionada pela situação de necessidades especiais de seus companheiros, ou pela necessidade de intenso suporte que requer sua própria pessoa. Nesse contexto, a figura de um suporte pessoal configura-se como condição necessária para traduzir na prática o direito à igualdade e à não discriminação, em um ambiente, o da brincadeira, fundamental para o desenvolvimento integral da criança.

Referência: Servei de Suport al Joc, Plan de Juegos - Barcelona

43 Salão para os pais A fim de garantir que os cuidadores se sintam conectados e apoiados em suas comunidades, propõe-se espaços nos quais os pais possam ir com seus bebês e ter apoio para o brincar das crianças na primeira infância. Um espaço onde os pais possam se reunir, conversar e brincar com seus bebês, com instalações como uma cozinha compacta para aquecer alimentos e fazer chá e café, e um espaço de jogos. As disposições espaciais devem ser feitas para permitir o apoio social e o intercâmbio

Referência: Bouken Tamago - Tokyo

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OBJETIVO

6 recuperar festas na cidade

resgatar o uso do espaço público através do lúdico, criando ambientes de estadia que fomentem o vínculo social e a vida comunitária em torno das brincadeiras e incorporando ao desenho urbano as necessidades das crianças cortejo poético

reforçar que a rua é de todos e pode ser espaço lúdico

recuperar brincadeiras históricas

promover atividades lúdicas nos espaços livres públicos incentivar o uso dos espaços livres públicos favorecer atividades de lazer intergeracionais

faça você mesmo seu brinquedo urbano


ampliação das fábricas de cultura

intervenções lúdicas em grandes estruturas elementos lúdicos intergeracionais

elementos lúdicos no catálogo de mobiliário urbano

escola móvel ilha dos inventos

picnic noturno descobrindo meu bairro

horticultura

virada da educação sessões de cinema ao ar livre


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PROPOSTAS objetivo 6

44 Recuperar festas na cidade A ideia é pensar a cidade como um terreiro, recuperando o DNA brincante das cidades e aquilo que nos permite transcender. Propõe-se olhar para as origens e heranças culturais do lugar, recuperando festas e rituais que costumam ser feitos, aumentando a consciência territorial e fugindo do ritmo acelerado do agora. É também uma maneira de entender a rua como espaço dessas manifestações e pensar a cidade como esse lugar dos cortejos, das festas, de brincar o boi, por exemplo, rituais que vão nutrindo a alma brincante das cidades e, assim, das pessoas.

Referência: Festa do boi - São Paulo | La mercé - Barcelona

45

Intervenções lúdicas em grandes estruturas urbanas Propõe-se que sejam instalados, de forma temporária ou permanente, estruturas lúdicas em grandes estruturas urbanas, como viadutos, terminais de ônibus, etc., que enfatizem a importância do espaço público como ponto de encontro e interação nas cidades, propiciando a transformação social mediante estratégias lúdicas e participativas, recuperando, também o lúdico aos adultos. Sugere-se que as intervenções possam ser feitas de materiais reutilizados bem como que ocorra a abertura de processos para que coletivos possam trazer novas e variadas propostas.

Referência: A cidade é pra brincar, Viaduto do Chá, Coletivo Basurama - São Paulo

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46 Ampliação das Fábricas de Cultura A política pública estadual Fábrica de Cultura, compõe espaços de acesso gratuito que disponibilizam diversas atividades artísticas com o objetivo de ampliar o conhecimento cultural por meio da interação com a comunidade. São realizadas inúmera atividades nas quais qualquer criança, jovem ou adulto com necessidades especiais pode inscrever-se. Entretanto, a primeira infância não é contemplada no programa, no qual as atividades são propostas para crianças a partir dos 6 anos (e na maioria das vezes 8 anos). Assim, propõe-se uma ampliação do programa de forma a abranger também a primeira infância, podendo, se necessário, criar unidades anexas exclusivas à essa faixa etária.

Referência: Fábrica de Cultura Brasilândia - São Paulo

47 Ilha dos inventos A Ilha dos inventos pretende ser uma possível nova vertente do programa apresentado anteriormente das Fábricas de Cultura. Propõe-se espaços de investigação, exploração e aprendizado, cruzando ciências, artes e tecnologia. São oferecidas atividades diversas que trabalhem com a multiplicidade das linguagens, possibilitando e incentivando a exploração científica e tecnológica por meio do lúdico, construindo coletivamente as possibilidades e descobertas.

Referência: Museu Catavento - São Paulo | Las islas de los inventos - Rosário

48 Cortejo poético A proposta é que sejam caminhadas poéticas que dão visibilidade ao lúdico no espaço público. Ocupar a cidade através da poesia e do caminhar, possibilitando a prática estética de despertar questões inconscientes da cidade, relações e sensações. É uma maneira de colocar as relações do corpo no espaço urbano como poesia, entendendo o ambiente urbano como terreno relacional de um criar participativo e coletivo. Propõe-se que sejam realizados anualmente Cortejos poéticos inicialmente envolvendo escolas com propostas itinerantes de vivência lúdica e poética na cidade, mas os quais podem e devem expandir-se para as famílias e toda a população, estimulando artistas e qualquer um que sinta o convite de participar. Referência: Cortejo da EMEI Gabriel Prestes - São Paulo | Sobrenome liberdade, Grajaú - São Paulo

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49 Virada da educação Propõe-se a ocupação do espaço público de maneiras diversas, sejam elas artísticas, sensíveis ou poéticas, visando atingir os moradores locais e sensibilizá-los da importância da educação, e, ainda mais, da potência educativa que possuem os espaços públicos. É entender como a escola pública transborda seus muros, ocupa territórios e faz com que a rua também seja percebida como espaço educativo. Isto é, uma forma de ocupar a cidade por meio da educação, propondo um final de semana no qual seja celebrado este encontro. O evento já ocorre na cidade de São Paulo, ainda que de forma não totalmente divulgada, mas limita-se ao centro da cidade. Entendemos que é fundamental que possa expandir-se para outras regiões e consolidar-se enquanto evento. Referência: Virada Educação - São Paulo

50 Elementos lúdicos intergeracionais Propõe-se que sejam incorporados aos espaços de brincar elementos lúdicos também para adultos e idosos, adaptando o brincar para todas as idades. Além de trazer para o cotidiano a cultura do lúdico, esses elementos podem contribuir para maior relação entre as crianças e pessoas de outras faixas etárias, além de ser um convite para que também esses agentes permaneçam no espaço público.

Referência: Park ‘n’ Play - Copenhague

51 Recuperar brincadeiras históricas Através do trabalho de rememoração, estabelecemos uma relação pessoal com o passado que é comum e, por isso, fonte para formação de identidade. As brincadeiras tradicionais são um momento no qual a criança consegue inserir-se na memória coletiva. Olhar para as brincadeiras que aconteciam na cidade e já não podem ou conseguem mais ocorrer, além de retomar um tanto da história do lugar como forma de conectar pessoas e territórios, é uma forma de reviver a alma brincante da cidade, que vem se apagando e, sem dúvida, ao ser reacesa, trará mais dinamicidade e ludicidade para as experiências cotidianas na rua. A brincadeira também é a história de um lugar, interliga seus membros e os aproxima, assim, recuperar brincadeiras históricas é também rememorar experiências na cidade. Referência: Dia dos Jogos Tradicionais - Lokossa

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52 Descobrindo meu bairro A proposta tem caráter multidisciplinar, pensando na realização de atividades integradas que contemplem diversas áreas do saber. A ideia é descobrir as particularidades de cada bairro, suas potências, suas questões, sua história, figuras importantes, etc., por meio de um percurso guiado, entendendo o caminhar também como uma maneira de a transformação do lugar e dos seus significados. Podem participar crianças, adultos e idosos, uma vez que entende-se que conhecer o lugar no qual se está inserido é importante para todos, proporcionando a construção da identidade.

Referência: Cultura e história do meu bairro - Uberaba | Ape - São Paulo

53 Picnic noturno Há uma questão latente de segurança, especialmente durante a noite, no distrito trabalhado, e o medo vai afastando as pessoas dos espaços comuns. Assim, com o objetivo que eles possam ser mais habitados, promovendo seu uso e desfrute, propõe-se a apropriação noturna desses espaços pela cidadania por meio de picnics. Deve ser uma atividade gratuita que consiste em convidar as pessoas, uma vez por mês, para encontrar-se, desfrutar e compartir os espaços públicos, como, por exemplo, o Parque Linear do Canivete. Cada picnic deve contar com uma atividade cultural que emoldura a atividade, como música ao vivo, por exemplo. Também pode-se fazer pedidos, de forma online, de comidas saudáveis que serão fornecidas por comerciantes locais Referência: Picnics Nocturnos - Rosário

54 Sessões frequentes de cinema ao ar livre Propõe-se sessões de cinema ao ar livre como maneira de possibilitar um outro uso para a cidade, ressignificando suas ofertas e trazendo espaços de valorização do tempo livre de lazer. Deve-se priorizar uma programação mista, que contemple diferentes gêneros do cinema bem como dê conta de abarcar todas as idades. Propõe-se, também, a reativação do cinema Morro Grande, desativado há pelo menos 40 anos, bem como a transformação do restante do prédio em um espaço cultural.

Referência: Projeção ao ar livre - Ibirapuera, São Paulo | Freiluftkino am kulturforum - Berlim | CineSolar - Brasil

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Incorporação de elementos urbanos lúdicos no catálogo de mobiliário urbano Realizar uma prototipagem de possibilidades de elementos lúdicos contando com a participação de crianças, entendendo sua opinião como fundamental ao tratarmos do lúdico. Em seguida, incorporar esses elementos no catálogo de mobiliário urbano , ampliando progressivamente as possibilidades de intervenção no território urbano, tendo como base os elementos brincantes prototipados. Quer-se incentivar que toda a população jogue e que o espaço urbano seja mais brincante.

Referência: ErêLab - São Paulo

56 Faça você mesmo seu brinquedo urbano: manual Entendemos que não é necessário pensar em grandes estruturas para oferecer experiências lúdicas às crianças. Considerando-se também os custos de manutenção, é essencial que sejam apreciadas outras formas de estimular crianças a brincarem plenamente, sem necessitar de vultosos recursos materiais. Assim, a ideia é, a partir do “lixo”, tema bastante complexo na realidade da Brasilândia, propor a criação de alguns brinquedos urbanos por meio de manuais simples e acessíveis, que estariam disponíveis para o acesso da população. Além de ampliar as possibilidades de brincar, construir seu próprio brinquedo aproxima a criança do processo, abre espaço para inúmeras criações e não limita as crianças às propostas dos brinquedos industrializados que indicam como deve ser usado aquele objeto. Referência: Poltrona de pneus, Basurama - São Paulo

57 Escola móvel Propõe-se a criação do programa Escola Móvel, no qual crianças, adolescentes e adultos são convidados a conhecer diferentes espaços públicos da cidade. Os roteiros são planejados de acordo com a idade, sempre considerando a cidade como território de aprendizagem e prevê atividades de sensibilização, articulando linguagens distintas. As propostas pedagógicas das rotas educativas bem como os espaços visitados vão variando, visando oferecer outros olhares, outras experiências e novos lugares para transitar. Podem ser realizados percursos de transporte público, a pé ou de bicicleta, fazendo-se também uma reflexão sobre esses modais.

Referência: Escuela Móvil - Rosário

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58 Horticultura: integração intercultural Propõe-se a criação de uma horta coletiva onde possa ser abarcada uma comunidade intercultural e inclusiva. Não importa de onde você vem, qual língua você fala, quantos anos você tem, se você tem uma deficiência ou não, se você tem conhecimento em jardinagem ou não. Busca-se o trabalho e a ação coletiva sempre aprendendo uns com os outros. Além das hortas, podem ocorrer no espaço diferentes atividades para atrair os moradores, como festas, fogueiras e aulas. As pessoas podem contribuir para o local com doações voluntárias ou com 12 horas de trabalho anuais nas hortas.

Referência: Zusammen Gärtern - Freiburg

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OBJETIVO

7

incentivar que as crianças saiam de casa para brincar com o máximo de autonomia possível

incentivar a mobilidade ativa pacificar o trânsito sinalizar de maneira acessível

buscar fachadas ativas

itinerários peatonais


mapas úteis da cidade

bicicleta infantil compartilhada

informação acessível à nivel dos olhos

comércio amigo

informações visuais

site e aplicativo das oportunidades de brincar


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PROPOSTAS objetivo 7

59 Site e aplicativo das oportunidades de brincar existentes no entorno Propõe-se a criação de um site e de um aplicativo móvel sobre as oportunidades de jogos oferecidas pela cidade. Deve incluir um mapa interativo para que a pessoas possa localizar as oportunidades em seu entorno próximo. Assim, a proposta tem três objetivos: localizar geograficamente e identificar as características das áreas de brincar e espaços lúdicos, conseguindo um mapeamento detalhado da cidade; divulgar e conhecer as propostas de atividades lúdicas e de lazer programadas em toda a cidade; e facilitar a avaliação dos espaços e propostas pelos cidadãos, bem como a comunicação de ocorrências e necessidade de manutenção.

Referência: DigiTel - Tel Aviv

60 Mapas úteis da cidade O desenho e a criação de cartografias e representações da cidade permite conhecer e dar visibilidade aos valores dela, desde sua localização e os lugares atrativos de atividade, a expressão clara e em tempo real do que acontece ou pode ser importante. A imagem da cidade reforça a identidade e a compreensão de um lugar, assim como a promoção de ambientes mais seguros e agradáveis para o uso variado. A construção de imagens claras e visões úteis dos entornos urbanos deve ser uma ferramenta para o conhecimento. Assim, propõe-se a criação de uma cartografia urbana acessível do distrito, que possa comunicar sobre pontos importantes e ajudar no deslocamento, podendo contar também com uma cartografia insurgente como ferramenta de efetivação de direitos. Referência: Plànol nova xarxa de bus - Barcelona

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61 Itinerários peatonais Propõe-se criar itinerários peatonais que conectem pontos de interesse no bairro, como escolas, UBS, CRAS entre outros, a espaços livres, como praças e parques. A ideia é que as ruas por onde passam as rotas funcionem também como espaços de lazer, onde seja priorizada a velocidade lenta, implementação de ciclovias e arborização viária. Isto é, são ruas mais caminháveis, pacificadas, verdes, compartilhadas e lúdicas.

Referência: Rutes Saludables - San Feliu de Llobregat

62 Comércio amigo Propõe-se um diálogo com o comércio local visando o estabelecimento de pontos seguros, nomeados comércio amigo, nos quais as crianças possam parar e pedir ajuda caso necessitem ao longo de seu deslocamento e uso da cidade. Idealmente seria dado algum tipo de incentivo para garantir a adesão e segurança do programa para as crianças. Os comércios envolvidos devem ser identificados.

Referência: Comerç amic - Barcelona

63 Informação acessível e ao nível dos olhos Poucas, senão nenhuma, das informações dispostas pela cidade garantem alcance visual para as crianças. Além disso, muitas placas são apenas escritas e a sinalização para cegos também não abarca toda a cidade. Assim, propõe-se que sejam dispostas placas as quais as crianças consigam enxergar e entender, mesmo as que não leem, assim como que seja garantida a sinalização para deficientes visuais.

Referência: -

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64 Informações visuais Propõe-se a inclusão de placas informativas nas ruas indicando que “Há crianças brincando”, como forma de alerta aos moradores e veículos, que necessitam diminuir sua velocidade. Em certa medida, a sinalização, relacionada à pacificação, permite maior segurança para que as crianças possam brincar na rua.

Referência: DigiTel - Tel Aviv

65 Bicicletas infantis compartilhadas Propõe-se criar um sistema de bicicletas compartilhadas para crianças, como forma de atividade de lazer saudável e não poluente bem como uma possibilidade de deslocamento para as crianças, incentivando a criação do hábito de pedalar. As bicicletas possuem tamanhos variados, dando conta de diversas idades bem como rodinhas retráteis.

Referência: Mini-bicicletar - Fortaleza

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OBJETIVO

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ampliar o diálogo escola-cidade, entendendo a escola como pólo centralizador no território

território CEU

estimular a criação de territórios educadores pensar os entornos escolares como espaços lúdicos favorecer as possibilidades democráticas e cidadãs da escola


muros das escolas

porquês dos nomes das ruas pátios escolares abertos praças pequenas: hortas e canteiros escolares

zonas 30 km/h

entornos pacificados

proteger as escolas

ônibus a pé

caminhos escolares


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PROPOSTAS objetivo 8

66 Pátios escolares abertos Considerando a alta densidade construtiva da Brasilândia, a falta de espaços livres para brincar e a ampla rede de escolas públicas existentes, propõe-se abrir os pátios escolares à comunidade em períodos extraescolares. Assim, pretende-se ganhar espaço público nos ambientes das escolas e institutos e adaptá-los às micro ações urbanas para que elas se tornem locais de permanência como pequenos lugares e incorporem elementos jogáveis. Ao mesmo tempo, é uma maneira de transformar os pátios escolares com diversificação de propostas de jogos, coeducação e naturalização e de aumentar a relação da escola com o local. Busca-se construir o pátio escolar como um território de passagem entre a escola e a cidade, que fortalece e potencializa essa relação. Referência: Patis Escolars Oberts al Barri - Barcelona

67 Entornos escolares pacificados Propõe-se entornos escolares pacificados como possibilidade de incentivar o uso recreativo de praças e ruas próximas às instituições de educação e torná-las áreas prioritárias para brincadeiras com a co-responsabilidade de associações educacionais. Devem ser feitas pequenas intervenções urbanas, como ampliar calçadas, nos arredores de ambientes escolares para tornarem-se lugares de encontro e vida comunitária. Pode-se, também, promover a interação social de crianças e adultos na entrada dos centros educacionais. É uma outra possibilidade de estabelecer o vínculo das pessoas com o lugar, e, ainda, do lugar com o lugar, isto é, conectar a escola com a praça, a escola com a rua, etc. Além disso, propõe-se também que as ruas escolares sejam fechadas nos 30 minutos da entrada e da saída. Referência: Cidade de 15 minutos - Paris

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68 Zonas escolares (30 km/h) Propõe-se a criação de zonas escolares, isto é, que as ruas dos entornos escolares sejam designadas como zona 30 km/h. Isso garante maior segurança para as crianças e permite que cheguem com maior autonomia na escola. Não apenas às crianças, mas a medida proporciona maior segurança para toda a população. Também pode ser experimentado um novo traçado de rua que induza o motorista a reduzir a velocidade, o qual deve ser delimitado com pinturas no asfalto e vasos de planta, podendo vir a ser permanente caso funcione bem.

Referência: Rua Simão Tamm - Belo Horizonte

69 Proteger as escolas As escolas são lugares com grande volume de pessoas que passam por elas todos os dias, sejam alunos, docentes, pais, mães, etc. Entretanto, muitas vezes não há um espaço que acolha essas pessoas ainda no espaço livre público, na rua, que as convide a se encontrar e permanecer. Assim, propõe-se a criação de espaços de encontro, de estar e de trocas na frente das escolas, espaços nos quais as crianças podem ficar esperando seus pais, conversando com os amigos pós aulas, que os pais podem trocar na entrada e na saída, que toda a sociedade possa também fazer uso, fomentando a construção da relação escola-território. Além disso, é uma maneira de proteger a frente das escolas, resguardando-as do trânsito com esses espaços. Referência: Entorno escolar do Institut Viladomat - Barcelona | Protegim las escuelas - Barcelona

70 Caminhos escolares A proposta dos caminhos escolares tem como principal objetivo oferecer às crianças a possibilidade de ir e vir a pé de suas escolas ou centro educativos, sozinhos ou em grupo, de maneira autônoma, saudável, segura e sustentável, fazendo com que a rua seja um espaço seguro, acolhedor e formativo e colocando as crianças enquanto protagonistas do projeto. Constituem-se enquanto itinerários que partem de pontos de interesse do distrito e/ou bairro, passando pelas vias mais utilizadas pelos alunos. Devem ser pensadas em colaboração com a sociedade civil, a comunidade educativa, os alunos, os pais, os professores, etc. Portanto, cada caminho escolar deve ser desenvolvido em um entorno concreto.

Referência: Caminho escolar de Paraisópolis - São Paulo | Caminhos escolares de Griesheim

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71 Ônibus a pé Propõe-se um sistema que incentive pais, familiares, responsáveis e voluntários a levarem de uma maneira segura e alternativa as crianças às escolas. As crianças são reunidas em grupo e caminham a pé rumo à escola, junto a monitores responsáveis. Há “pontos de ônibus”, isto é, paradas estratégicas onde as crianças vão juntando-se ao ônibus a pé. Visa motivar a comunidade a caminhar, incentivando um estilo de vida mais saudável para as crianças e despertando a consciência ambiental. Também é uma maneira de maior contato com o bairro e com o entorno da escola, despertando noções cidadãs.

Referência: Ônibus a pé, Paraisópolis - São Paulo

72 Território CEU O projeto já existe em âmbito municipal e visa a integração dos CEUs com outros equipamentos existentes, de forma a reutilizá-los, revitalizá-los, e incorporar esta estrutura aos equipamentos existentes. Isto é, busca, em um raio de 600m (o que dá cerca de 10 minutos caminhando para uma criança), consolidar vias sinalizadas, acessíveis e iluminadas que conectem diferentes equipamentos e até novos programas sociais, criando uma rede que tem o CEU como centralidade importante. Assim, propõe-se que o projeto seja implementado no CEU Paz, na Brasilândia, mas que também leve em consideração aquilo já elencado no Plano, podendo-se, inclusive, pensar o território CEU como integrante da rede de itinerários peatonais. Referência: proposta do Território CEU - São Paulo

73 Muros das escolas Muitas vezes, os muros das escolas são barreiras físicas e simbólicas que separam a escola do mundo, que as limitam a si mesmas, como organismo a parte que não faz parte da cidade e, menos ainda, dialoga com ela. Entretanto, entendemos que a escola tem grande poder enquanto articulador no território e muito pode-se construir dessa relação. Assim, propõe-se uma mudança material nos muros escolares. Propõe-se que eles possam ser substituídos por grades ou que, de certa forma, possam fazer transparecer as reflexões das crianças sobre a escola e sobre a cidade, que os muros possam ser uma passagem para a cidade, e não uma barreira a ela.

Referência: EMEF Presidente Campos Salles - São Paulo

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74 Praças pequenas: hortas e canteiros escolares A partir da análise e observação da existência de muitas praças que não possuem tamanho mínimo para que possam ser pensadas enquanto espaços de brincar qualificado, propõe-se que as praças pequenas sejam ressignificadas. Assim, a ideia é que sejam convertidas em hortas, cada uma sob responsabilidade de uma ou algumas escolas. O objetivo é difundir práticas que melhorem os hábitos alimentares por meio de ações educativas e interativas, que motivem as famílias a fazerem escolhas mais conscientes, desenvolver práticas sustentáveis, criando oportunidades para que os alunos do ensino público se tornem protagonistas de hábitos alimentares saudáveis na escola e dentro de casa, bem como criar maior relação escola-comunidade. Referência: Canteiros coletivos - Salvador

75 Porquês dos nomes das ruas Propõe-se que seja feito com as crianças, em parceria com as escolas, um projeto de estudo dos nomes das ruas, entendendo sua origem e, assim, possibilitando uma grande pesquisa e entendimento da região em que vivem. A partir das pesquisas das crianças, as placas das ruas passarão a conter também explicação do porquê de seus nomes.

Referência: Bairro-escola Nova-Iguaçú

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PROPOSTAS-INSPIRAÇÃO

Entende-se que a elaboração do plano se dá por etapas processuais. Dessa maneira, após a consolidação e estruturação das propostas que buscam materializar os objetivos do plano, essas deveriam ser aprofundadas, especificando o porquê e como fazê-las. Entretanto, para o escopo deste trabalho, não seria possível realizar o estudo de todas as propostas previstas. Assim, dentre o conjunto de 75 propostas do plano, foram selecionadas 7, consideradas propostas-inspiração e destacadas com cor nas páginas anteriores. Essas propostas foram mais desenvolvidas que as outras, adentrando em uma camada um pouco mais profunda daquilo que se prevê para elas. Dessa forma, são consideradas inspiração pois dizem de forma mais clara como se efetiva aquela ação, possibilitando, a partir disso, que todas as outras também fossem estudadas e aprofundadas. Essas propostas foram escolhidas por alguns motivos. O primeiro deles diz de meu interesse particular de estudo sobre essas ações. Além disso, também foi considerada sua visibilidade pública no que diz respeito a destacar a mudança envolvida no Plano; sua viabilidade de iniciar a execução da ação em curto prazo, pelo pouco investimento financeiro necessário para realização; e por seu potencial em conquistar transformações que se movem em direção ao horizonte de uma cidade brincante. As propostas-inspiração são uma pequena amostra da riqueza e potência que podem ter essas ações se pensadas de forma sistêmica.

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pátios escolares abertos

caminhos escolares

modelo de cocriação

recuperar festas na cidade

pontos de empréstimos

jogamos na praça: itinerante

ruas brincantes

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07. MODELO DE COCRIAÇÃO

Eixo estratégico do plano

Principais agentes implicados

Criação coletiva de uma cidade brincante

é fundamental que sejam envolvidas secretarias diversas de forma a garantir que o processo seja multi e transdisciplinar e possam ser abordadas variadas visões

Objetivo do plano 2 - colocar luz, valorizar e estimular o papel das crianças como cidadãs plenas e como agentes de transformação das cidades

Pessoas destinatárias (x) crianças (x) adolescentes ( ) jovens ( ) adultos ( ) idosos

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• Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras • Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano • Secretaria Municipal de Educação • Secretaria Municipal de Esportes e Lazer • Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania • Comunidade - pode fazer parte do grupo inicial e par ticipar da formação de replicadores qualquer agente da sociedade civil interessado


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Ambiental

• Chamada aberta para formação de grupo

• médias de concentração de gás e poluição no ar

• Criação de um grupo interdisciplinar com professores, gestores, arquitetos, etc.

• percepção de conforto relativo à poluição sonora local pelos beneficiários

• Sistematização da metodologia

II. Urbano

• Revisão da metodologia

• em que medida houve transformação dos elementos do desenho urbano local

• Identificação dos espaços para atuação

• Reuniões abertas de debate sobre a metodologia

• número de pessoas utilizando o espaço

• Seleção dos espaços de oportunidade para atuação

• número e variedade de atividades de apropriação do espaço

• Estruturação das oficinas

• meio de transporte de acesso às ruas brincantes • local de origem dos frequentadores • fluxo de passageiros nos meios de transporte público • em que medida alterou a percepção de segurança dos usuários

• Realização da aplicação piloto da metodologia • Execução das reformas • Avaliação da aplicação piloto • Curso aberto para formação de multiplicadores • Formação de novos grupos para aplicação • Replicação da metodologia

III. Social: • frequência e tipo de exercícios físicos realizados pelos beneficiários • frequência e tempo de permanência na rua brincantes • variedade deatividades realizadas pelos usuários IV. Econômica: • em que medida alterou o volume de venda e faturamento

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OBJETIVO DA PROPOSTA O principal objetivo do projeto é estabelecer um modelo de processo participativo para co-criação de espaços de brincar com crianças que possa tornar-se uma ferramenta a ser utilizada sistematicamente em transformações urbanas. Portanto, é entender as crianças como informantes essenciais para fornecer conhecimento especializado sobre o brincar e valorizar sua voz nos processos de transformação urbana.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO De la Taille (1992), ao falar sobre a interação social para Piaget, faz uma distinção entre dois tipos de relação social: a coação e a cooperação. A primeira seriam as relações dominantes onde há uma autoridade e a outra pessoa não participa da produção, qualquer que ela seja, aceitando apenas o produto final como verdadeiro. As relações de cooperação pressupõe a coordenação entre dois sujeitos sem assimetria, imposição, repetição ou crença. Há trocas, discussões e argumentos, sendo o tipo de relação que possibilita e promove o desenvolvimento das operações mentais (DE LA TAILLE, 1992). Assim, é possível entender a cooperação como essencial para toda e qualquer troca entre cidadãos. Conforme afirma Toro (2005), se faz cidadão a partir de sua capacidade de criar e modificar a ordem social em cooperação com outros. É fundamental que as crianças se coloquem - e que todos as reconheçam - nessa posição enquanto agentes ativas para podermos consolidar a premissa de que crianças são sujeitos sociais plenos, dotados de capacidade de ação, participação e ressignificação (BORBA, 2005) e, portanto, têm desejos, opiniões e contribuições para o lugar que habitam O direito das crianças à cidade, assim como também o é para o adulto, vai além do acesso aos equipamentos

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públicos que esse espaço pode oferecer; é um direito de participar de sua transformação para atender as necessidades coletivas e torná-la mais democrática em seus usos. Dessa forma, independentemente da condição social ou da faixa etária a qual pertençam, todos os cidadãos têm o direito de serem escutados e respeitados em suas demandas, deixando seus papéis de consumidores dos espaços urbanos, para tornarem-se agentes. Não são apenas as crianças que são desconsideradas nestes processos, mas, para elas, isso torna-se ainda mais latente, pois estão excluídas dos meios de decisões e necessitam de estruturas ‘adaptadas’ para que sua participação possa se efetivar. A participação infantil é assegurada legalmente pelo artigo 12 da Convenção sobre os Direitos da Criança, aprovada pelo Unicef em 1989 e instituída pelo Brasil em 1990, e pelo artigo 16 do Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990 e atualização posterior, que garante à criança o direito de expressar sua opinião sobre questões que lhe digam respeito e de tê-la levada em consideração para a tomada de decisões no âmbito da vida comunitária e política: Participar é um dos principais instrumentos na formação de uma atitude democrática. Quem participa ativamente da vida pública de uma comunidade, de uma cidade, estado ou país, torna-se sujeito de suas ações, é capaz de fazer críticas, de escolher, de defender seus direitos e também de cumprir melhor os seus deveres (UNICEF, 2013, p. 26).

Esse direito, ainda, é defendido na carta das cidades educadoras, da qual São Paulo faz parte. Em seu preâmbulo, a Carta defende a ideia de que as crianças e os jovens já não devem mais ser passivos na vida social e na cidade, devendo tornar-se sujeitos e protagonistas.Em 1989, com a Convenção das Nações Unidas, foi outorgado às crianças direitos civis e políticos, tornando-as cidadãos de pleno direito. Portanto, as crianças e os jovens deveriam deixar de ser passivos na vida social e, por conseguinte, na cidade. Dessa forma, pensar esses grupos sociais na cidade não se limita à sua proteção, mas deve ampliar sua condição enquanto cidadãos e garantir a coexistência, igualdade e respeito entre as gerações. PUB • o plano

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Para Mayumi (1989), o processo de projeto, especialmente de espaços de brincar, precisaria, então, se modificar e incorporar a participação e/ou coautoria das crianças (as usuárias). Ela aponta, para tanto, ser fundamental compreender suas linguagens, seus universos culturais, suas formas de expressão e, especialmente, sua apropriação e percepção do espaço, libertando-as, estimulando-as, abrindo os espaços à sua ação (NIVOLONI, 2018). Algo que também destaca Tonucci (2015): Faz falta estarmos convencidos de que as crianças tem coisas para nos dizer e dar, e são diferentes das que sabemos e somos capazes de fazer e que, portanto, vale a pena deixá-los expressar o que pensam de verdade. Para fazer isso, tem de se ajudar as crianças a libertar-se dos estereótipos, das respostas óbvias e triviais [...]. Tem-se que estimular às crianças a atrever-se, a desejar, a inventar e, então, surgirão suas ideias, suas propostas, suas contribuições. Finalmente, tem que se compreender as crianças indo para além da aparente simplicidade de suas propostas. Então estas ideias nos permitirão não somente ter em conta as exigências das crianças, senão fazer que seja melhor a cidade de todos (TONUCCI, 2015, p. 59-60).

Assumindo consciência de sua intervenção e do mundo onde estão, atuando a favor daquilo que querem e propõe, podendo validar sua opinião e decisão a partir da sua própria relação com o mundo e com os outros, “ao impregnarem o mundo de sua presença criadora através da transformação que realizam nele, na medida em que dele podem separar-se e separando-se, podem com ele ficar, os homens, ao contrário do animal, não somente vivem, mas existem” (FREIRE, 2017, p. 89). Esse movimento de participação também gera empoderamento a elas e uma relação com o campo social, impactando em sua constituição individual e coletiva. Ao permitir que a criança se relacione com o mundo e que ela se enxergue em condição ativa, a mediação com o mundo permite a formação completa e a preparação para a vida cidadã.

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Atuando, pensando e propondo a cidade, as crianças reconhecessem como delas aquele espaço. “Podemos estar seguros de que se as crianças participam dos projetos da cidade a sentirão, hoje sendo crianças e amanhã sendo adultos, como ‘sua’, a cidade que hão de cuidar e defender” (TONUCCI, 2015, p. 62, tradução nossa). Ao repensar e refazer a cidade, essas crianças estão refazendo a si mesmas e a sua condição (HARVEY, 2013). Ao modificar o entorno, a criança expressa seus desejos, formando a cidade, mas também a si mesma. Como defendido por muitos autores (LEFEBVRE, 1968; GRANNELL; VILA, 2003; LIMA, 1995; HARVEY, 2013; PARK, 1967; FREIRE, 2017), a cidade é a expressão daquilo que somos e, portanto, permite a construção de nós mesmo. Assim, ao elaborar o Plano, para além de defender a ideia de participação, é preciso também concretizá-la. Deve-se buscar elaborar, na construção e no processo projetual dos espaços, reflexos de uma educação que contrarie a opressão, fincada em construção coletiva, colaborativa, realizada por todos – que possuem, dentro do processo, a mesma importância – e que, ao mesmo tempo, considera e respeita cada um individualmente sob uma perspectiva sensível, humana.

DESCRIÇÃO A transformação da Brasilândia em um distrito brincante então, deve levar em conta as crianças e os adolescentes, convidando-os a participar na elaboração de políticas e estratégias relacionadas ao brincar e ao lazer e na criação de parques e desenhos de entornos adequados à infância. Devem constituir-se uma equipe criativa e interdisciplinar na qual outras pessoas especializadas também forneçam soluções técnicas, regulatórias e orçamentárias, desenvolvendo uma metodologia de co-criação que possa ser replicada em diversos locais do território.

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Para a elaboração de todo o processo participativo devem ser levados em consideração 4 aspectos chave: 1) Crianças como informantes essenciais: as crianças fazem parte de uma equipe de desenho fornecendo conhecimento especializado sobre o jogo para construir um bom parque. Constituem uma equipe criativa onde outras pessoas especializadas também fornecem soluções técnicas, regulatórias e orçamentárias. 2) Reflexão, observação e análise: trabalhamos com materiais oferecidos às crianças como elementos de inspiração, reflexão, observação e análise para avaliar o espaço atual. Não se espera que eles façam uma seleção de elementos específicos do jogo ou projeção de detalhes específicos do espaço. 3) Contribuições bem pensadas: se trata de gerar um breve processo para que as crianças expressem suas opiniões e desejos sobre o que gostariam de fazer e quais atividades lúdicas lhes deve oferecer o espaço, para que suas contribuições sejam informadas e fundamentadas. 4) Pensando em toda a comunidade: O processo não se limita a reunir apenas seus interesses, eles são convidados a pensar nas pessoas de toda a comunidade: meninos e meninas, pessoas com diversidade funcional, adultos etc. Os parques devem ser locais de encontro e convivência É importante chegar a uma metodologia flexível, que cuide das singularidades de cada espaço mas que permita sua replicação, uma vez que com a disseminação, o impacto gerado pela metodologia é enorme, marcando uma lógica de prototipado que seja flexível em conteúdo, ferramentas, tipos de espaço, participantes e destinatários. Propõe-se como possibilidade para replicação a metodologia CoCriança 9, desenvolvida pelo grupo entre 2017 e 2020. Me parece bastante possível que a metodologia fosse sistematizada, possibilitando sua replicação em escala, uma vez que as diferenças socioterritoriais já são consideradas em suas diferentes aplicações.

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Nela, as crianças são consideradas como parte fundamental, protagonista e ativa da ressignificação, transformação e revitalização dos espaços públicos. A metodologia caminha da investigação e reconhecimento do mundo das crianças e da sua visão sobre ele, ao entendimento de desejos e concepção de projetos para os espaços que utilizam, bem como à sua participação na transformação urbana, a partir de sua concepção como sujeitos ativos. Se dá por meio da realização de oficinas, que envolvem a co-criação e são lúdicas, com a finalidade de fazer as crianças sentirem-se à vontade para se expressar e auxiliá-las a desenvolver e organizar uma opinião crítica a respeito do espaço em que vivem, permitindo entender sua visão sobre esses espaços e sua percepção enquanto cidadãs.

9. O CoCriança é um coletivo do qual sou co-fundadora e facilitadora. Promovemos aprendizagens vivenciais que incentivem a criança enquanto agente de transformação social e fonte criadora e estruturadora dessas transformações; garantindo o pertencimento à comunidade e a cidadania e gerando impacto social positivo e cuidado com o entorno. Trabalhamos com metodologia própria de co-criação de espaços da cidade junto às crianças, colocando-as enquanto protagonistas dos processos e garantindo seus espaços na cidade.

A metodologia tem duração de 6 meses e é organizada em 5 etapas: Etapa I: Investigação e percepção dos espaço - tem como objetivo criar familiaridade e aprender o máximo sobre o território e as pessoas com quem iremos trabalhar, realizando coleta de dados e uma aproximação dos atores Etapa II: Sensibilização dos atores e formação continuada - tem como objetivo explicar os porquês da metodologia aplicada, abrindo diálogo para questões relacionadas ao direito da infância à cidade e ao espaço público, ampliando assim o olhar da comunidade para o reconhecimento das crianças como sujeitos ativos nos processos de transformação urbana e social Etapa III: Oficinas de projeto - tem como objetivo entender o que as crianças sonham e desejam, que parte de uma investigação e exploração, que diz respeito ao conhecimento do mundo dessas crianças e da sua visão sobre ele; e chega nos desejos e projetos mais concretos, que diz respeito à aproximação dos desejos das crianças para os espaços que utilizam bem como à sua participação na transformação urbana

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Etapa IV: Oficinas de construção - tem como objetivo a co-materialização do espaço , entendida em duas etapas: planejamento das ações junto com as crianças e posterior execução ações que as crianças planejaram para deixar o espaço com a sua cara. Etapa V: Avaliação - tem como objetivo fazer um balanço da atuação e olhar criticamente para os resultados obtidos, através de critérios e indicadores estabelecidos a fim de determinar o mérito e a relevância do trabalho, além de identificar pontos de melhoria. Apesar de ser a última da metodologia, ela tem início ainda no começo do processo, por meio do planejamento, e prossegue durante toda a ação, através do monitoramento, feito através da organização dos registros.

EXEMPLO projeto: transformação do Parque de La Pegaso e do Central de Nou Barris local: Barcelona, Espanha responsável: Prefeitura de Barcelona com apoio da cooperativa Raons Publiques e do Institut Infància i Adolescència Esse projeto vem no sentido do “Plan de Juegos” desenvolvido na cidade de Barcelona, que visou repensar os espaços e oportunidades que a cidade oferece para brincadeiras diversificadas e inclusivas ao ar livre para suas crianças e adolescentes e para melhorar a vida da comunidade como um todo de cidadania. A cidade entendeu que para essa transformação da cidade era essencial escutar as crianças e os adolescentes, convidando-os a participar da elaboração de políticas e estratégias relacionadas ao brincar livre e com a criação de parques e entornos adequados às necessidades infantis. Assim, buscaram dinamizar os processos de co-criação com as crianças por meio da transformação coletiva de

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dois parques - o Parque de La Pegaso e o Central de Nou Barris - em espaços lúdicos. O principal objetivo do processo de cocriação foi dar voz às crianças, para que elas se tornassem informantes-chave, expressando suas ideias para transformar todo o parque em um espaço de brincar. O processo consistiu em três sessões com seis atividades, 3 para reflexão, 2 para análise e 1 para propostas, e uma sessão de retorno final em que a Câmara Municipal de Barcelona juntamente com o Instituto da Infância e Adolescência explicou às crianças o resultado do processo de trabalho e apresentou um estudo prévio da equipe de arquitetos com as possíveis intervenções para a transformação do parque. O processo contou com a participação de diversos agentes e cada um pode aportar o seu saber em relação a transformação do parque, visando sempre dar vez e voz às crianças, para que elas pudessem expressar as suas ideias para transformar todo o parque em um espaço lúdico. Buscava-se chegar em um protótipo do processo, isto é, o resultado dos processos é importante, mas é de igual importância a possibilidade de aplicação do mesmo em qualquer outra realidade, bairro ou praça ou parque, ou coletivo. Buscou-se marcar uma lógica de prototipado que pudesse ser flexível em conteúdo, ferramentas, tipos de espaço, participantes, destinatários. Portanto, de forma resumida, a ideia era que as áreas de jogo do Parque de la Pegaso (Sant Andreu) e do Parque Central de Nou Barris, que atualmente tem um desenho estandardizado, como a maioria das áreas na cidade, se transformassem para tornarem-se espaço lúdicos multifuncionais, referência do novo modelo de jogo de Barcelona. Esses processos de transformação foram co-criados com um grupo de crianças do bairro como agentes chave e imprescindíveis para o desenho; e com a colaboração de uma escola e de um espaço próximos aos parques. Assim, foi desenvolvida uma metodologia para que as crianças pudessem expressar suas necessidades e inte-

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resses em relação ao brincar e à permanência no parque. A revitalização abriu uma estrutura de conteúdos e ofereceu ferramentas de reflexão, observação e análise de forma a estimular e ampliar o olhar em relação ao possibilidades que um parque pode oferecer como espaço de lazer. O processo serviu para crianças fazerem propostas criativas e, ao mesmo tempo, extrair informações valiosas para orientar a transformação de parques. A primeira sessão buscou uma reflexão e identificação do que as crianças gostavam de brincar, inspirando-se em de parques ao redor do mundo. A primeira atividade fazia uma apresentação do processo e abria um debate para ampliar e aprofundar a visão sobre o brincar na cidade, iniciado com cada criança apresentando 1 ou 2 palavras que relacionam ao brincar e uma posterior categorização dessas palavras. A segunda atividades propunha uma seleção daquilo que mais gostavam de brincar por meio de cartas. Isto é, estavam dispostas inúmeras cartas com diversas possibilidades de ação-brincante, como por exemplo escalar, escorregar, contato com a natureza, etc. Em um primeiro momento, cada criança selecionava sua carta, depois repetiam o processo pensando no que as crianças mais velhas e as mais novas gostariam de fazer. Por fim, na terceira atividade, as crianças tinham imagens-referência de espaços de brincar em diversos lugares do mundo. Deveriam escolher aquela que mais gostavam relacionando-a com uma palavra. Essa primeira sessão buscava um diagnóstico daquilo que mais agrada as crianças relativo ao brincar. A segunda sessão buscava uma observação dos parques visando reconhecer sua realidade e identificar os espaços que poderia oferecer ao brincar bem como avaliar o estado atual do parque, recolhendo de forma consciente quais são os aspectos essenciais para mudança. Na primeira atividade, em grupos de 3 ou 4, as crianças deveriam identificar os lugares onde brincam no parque, independentemente se estão desenhados para tal ou não. A segunda atividade é uma valoração individual do parque visando detectar aspectos que se podem manter, aspectos a potencializar e

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aspectos que devem ser melhorados. As crianças faziam isso por meio de uma ficha, organizada em 15 indicadores, os quais avaliam através de cores: verde, amarelo ou vermelho. A terceira sessão tinha como intenção compartilhar os resultados das duas primeiras sessões e, a partir disso, que as crianças criassem uma proposta para a transformação do parque por meio de uma colagem coletiva. Por fim, a última sessão era uma sessão de retorno, na qual concretizava-se o reconhecimento das crianças como informantes chave e protagonistas para melhorar a possibilidade brincante do parque por meio da apresentação de um primeiro projeto para a transformação, apontando onde estão cada uma das propostas que fizeram e ouvindo o que pensam as crianças sobre essa proposta.

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20. RUAS BRINCANTES

Eixo estratégico do plano Infraestrutura lúdica em uma cidade brincante

Objetivo do plano 4 - favorecer uma mudança no reconhecimento da importância social do brincar e dos espaços livres, aumentando a consciência de seus benefícios individuais e coletivos para todos os cidadãos

Pessoas destinatárias (x) (x) (x) (x) (x)

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crianças adolescentes jovens adultos idosos

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Principais agentes implicados • Companhia de Engenharia de Tráfego (CET) • Subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia • comunidade local


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Ambiental

• Definição de um raio de abrangência das ruas brincantes

• médias de concentração de gás e poluição no ar • percepção de conforto relativo à poluição sonora local pelos beneficiários

• Levantamento de possíveis ruas para serem ruas brincantes • Cruzamento de dados entre a abrangência e a possibilidade de ruas

II. Urbano

• Consulta pública à população sobre as ruas levantadas do cruzamento

• em que medida houve transformação dos elementos do desenho urbano local

• Estudo de impacto do fechamento da rua para carros

• número de pessoas utilizando o espaço

• Definição das ruas que serão abertas ao brincar

• número e variedade de atividades de apropriação do espaço • meio de transporte de acesso às ruas brincantes • local de origem dos frequentadores • fluxo de passageiros nos meios de transporte público • em que medida alterou a percepção de segurança dos usuários III. Social: • frequência e tipo de exercícios físicos realizados pelos beneficiários

• Divulgação do programa e das ruas que serão abertas • Elaboração do cronograma do final de semana de elaboração • Implementação do programa em 3 ruas pilotos. Primeiro final de semana com programação de atividades convidativas e estimulantes para a população nas ruas • Aplicação de 6 mês de teste-piloto • Avaliação da implementação e impacto • Implementação do programa em todas as ruas escolhidas

• frequência e tempo de permanência na rua brincantes • variedade deatividades realizadas pelos usuários IV. Econômica: • em que medida alterou o volume de venda e faturamento

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OBJETIVO DA PROPOSTA O principal objetivo da proposta é oferecer novas oportunidades de uso e significação das ruas de maneira periódica, favorecendo hábitos saudáveis e qualificando as possibilidades lúdicas da cidade. Busca-se pensar um novo uso das ruas, começando pelo brincar.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO Atualmente, a rua é percebida apenas como lugar de passagem e perigoso, sendo mais relacionada no ideário social aos automóveis que aos pedestres. Ao mesmo tempo, os espaços designados para jogar são limitados e limitantes, controlam e impõe o que se deve fazer neles. Segundo Herrington (2007), as grandes estruturas voltadas ao brincar costumam ficar cerca de 87% do tempo vazias. Quando as crianças os utilizam é para estar embaixo deles ou como forma de observação do entorno. “Apenas 3% do tempo total, elas o utilizam segundo foi proposto pelos profissionais que o conceberam” (NIVOLONI, 2018, p. 29). Além disso, a partir do diagnóstico feito sobre o território, vimos os baixíssimos números de espaços livres disponíveis na Brasilândia, ao mesmo tempo que é grande a quantidade de espaço dedicada aos automóveis. A cidade atualmente dedica 60% do seu espaço público disponível para carros, fato que dificulta as possibilidades de brincar e as atividades físicas e lúdicas em ambientes seguros e apropriados. Portanto, o brincar na rua, que já foi tão comum e corriqueiro em gerações passadas, vem perdendo cada vez mais espaço para os carros e para a insegurança gerada a partir deles. Isso apenas reforça a invisibilidade das crianças nos espaços públicos das cidades e revela, uma vez mais, uma sociedade que prioriza os desejos dos adultos, com pouca visibilidade para os direitos das crianças. Assim, devolver o

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espaço da rua a elas é também fazê-las mais visíveis e dar ênfase às necessidades dos cidadãos pedestres. Nesse sentido, vale destacar, ainda baseado nos diagnósticos do local, que as crianças da Brasilândia, sem espaços que possibilitem seu brincar, acabam apropriando-se e ampliando a dimensão das ruas, que se tornam locais de convivências e trocas efetivamente. Entretanto, ao contrário de ser a apropriação desejada de uma rua ativa, voltada para os pedestres e que promova a relação com a cidade, acaba por ser o que resta para as crianças, pois essas ruas não são e nunca foram projetadas para serem seguras para elas, tendo como prioridade os carros. As crianças já fazem uso da rua, mas esta não se mostra adequada.

10. Essa atividade foi realizada com 24 crianças do CCA Elisa Maria, no Jardim Elisa Maria, bairro da Brasilândia, em 2019 para o desenvolvimento do meu trabalho de conclusão de curso do curso de Pedagogia no Instituto Singularidades. Convidei as crianças a desenhar seu lugar preferido de brincar.

Ainda nesse sentido, quando perguntamos à essas crianças 10 qual seu lugar preferido de brincar, foi possível perceber, através de seus desenhos e falas, que os espaços urbanos livres públicos aparecem como seus lugares preferidos de brincar. Dos 23 desenhos realizados, apenas 4 não representavam espaços públicos, sendo esses quatro desenhos das próprias casas. Dessa forma, percebemos que mais de 80% das crianças da turma entendem espaços da cidade – e, por espaços da cidade, entendemos espaços públicos, e não privados – como os lugares nos quais mais gostam de brincar. Inclusive, em um dos desenhos, o autor escreveu: “sair de casa é bom”. Isto é, pensar em ruas brincantes é garantir esse espaço de forma adequada e segura para as crianças. É também defender que a rua não é um mero vazio para os carros passarem. A rua é uma complexa instituição na qual, desde crianças, aprendemos a socializar e construir nossa comunidade. É entender a rua como lugar de convergência da pluralidade e da diferença, da descoberta e da convivência, da aprendizagem e do deslocamento. A rua é o local de acesso a todos e de possibilidades diversas com seus espaços abertos, gramados, quadras, calçadas, etc. A rua é o ponto de encontro, assim como a brincadeira, entendida como o vínculo, a interação, e uma possibilidade de vida

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11. Superilla de Sant Antoni, Barcelona - Espanha; Oxford Street, Londres - Inglaterra; bairro de São Miguel, São Paulo - Brasil, entre outros.

para as ruas. O lúdico carrega consigo o poder de ressignificar a imagem que temos da rua. Diversas experiências de pacificação permanente no Brasil e no mundo 11 demonstram os benefícios para a vida da comunidade e para o uso do espaço público quando devolvemos aos cidadãos o espaço livre até então destinado à veículos. É necessário, para além de qualificar o desenho das ruas, complementar com medidas periódicas para oferecer oportunidades para outros usos em caráter temporário e, ao mesmo tempo, corriqueiro. O fechamento de ruas para veículos, abrindo-se ao brincar, é uma importante ferramenta para mudar a maneira como os cidadãos se relacionam com a cidade e vislumbrar novas formas de apropriação dos espaços públicos, isto é, para criar possibilidades em diversas regiões do distrito para que se desenvolva o potencial das ruas para mudar hábitos e aumentar a atividade física e lúdica ao ar livre entre todos os cidadãos, pelo menos um dia por semana. Grande exemplo de nossa cidade é a Avenida Paulista, que recebe milhares de paulistanos todos os domingos, os quais realizam inúmeras e variadas atividades. Ela faz parte do programa “Ruas de Lazer” da prefeitura de São Paulo, que propunha que uma rua de cada distrito se abrisse aos pedestres uma vez por semana. Porém, nem todas as ruas propostas de fato fecham-se aos domingos, como é o caso da Avenida José Natividade Saldanha, na Brasilândia, que funciona de maneira irregular, sem a presença de agentes da CET. A Avaliação de Impacto da Paulista Aberta indicou que 73% dos frequentadores do programa entrevistados afirmaram que a abertura também os motivou a frequentar outros espaços públicos no dia a dia. A Paulista Aberta também tem sido positiva para os indicadores econômicos: 63% dos frequentadores afirmam consumir produtos no local e mais de 80% dos comerciantes notam que o impacto é favorável para seu estabelecimento, já que o volume de vendas aos domingos aumentou desde o início do programa.

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DESCRIÇÃO A proposta visa retomar e ampliar o programa Ruas Abertas já existente no município, de forma a expandi-lo no distrito da Brasilândia. Portanto, busca-se fazer uma seleção de ruas que dê conta de abranger, com determinado raio de influência, todo o município e fechá-las temporariamente aos carros. Isto é, visa-se, aos domingos e feriados, das 10h às 16h, abrir as ruas selecionadas ao brincar e a diversidade de possibilidades de usos lúdicos. Assim, intenta-se ganhar, periodicamente e regularmente, um novo espaço público para brincadeiras ao ar livre e atividade física a partir da promoção de hábitos saudáveis que melhoram o bem-estar e a qualidade do lazer compartilhado dos vizinhos. É uma maneira de propor novos espaços de estar e lazer em uma região muito densa e de devolver o espaço dominado pelos carros para os pedestres de forma geral, e para as crianças e o brincar especificamente. Permite o convívio social, os movimentos amplos, amplia noções espaciais e incentiva o convívio familiar para que a criança possa brincar muito. É uma iniciativa que não requer muito investimento do poder público ou grandes transformações de infraestrutura. É uma medida simples que garante mais espaço de lazer à população, novas possibilidades ao brincar infantil e ressignifica o uso da rua enquanto espaço público.

EXEMPLO projeto: ‘Play Street’ - Murrain Road local: Londres, Reino Unido responsável: Muf Architecture/ Art O projeto desafia a percepção de uma rua como um espaço utilitário, introduzindo materiais naturais e uma atmosfera

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teatral. Ao fazê-lo, suscita um debate sobre o potencial do nosso tecido urbano para ser adaptado e a densidade interpretada como uma possibilidade de intensificação do uso. Assim, a Murrain Road, transformada na “Play Street” é um exemplo de rua que foi cuidadosamente projetado tendo-se as brincadeiras infantis em mente. Parte da via ainda é usada para tráfego local, entretanto, outra parte foi permanentemente destinadas ao brincar e ao lazer. A fim de criar a percepção de que este é um espaço que pertence às crianças, os designers incorporaram objetos lúdicos ao longo de toda a via. Isso inclui rochas e troncos para escalada, rede para relaxar e cubos feito de ramos de salgueiro para as crianças se esconderem. A longa superfície da rua é perfeita para patinar e para andar de bicicleta ou, ainda, fornecendo uma superfície plana para desenho com giz. Bancos de madeira e espreguiçadeiras em várias alturas e formas foram colocadas sob as árvores e voltadas para os objetos brincantes, encorajando os residentes a permanecer e relaxar. Grafismos lúdicos foram pintados no chão para indicar que esta é uma rua onde as pessoas vêm em primeiro lugar. É importante ressaltar que os apartamentos do térreo têm visibilidade direta sobre a via, garantindo uma rua viva e ativa com residentes entrando e saindo de suas casas. A conexão direta entre as casas térreas e a rua também significa que as crianças podem mover-se facilmente de dentro para fora enquanto brincam na porta de casa. A combinação da vigilância ativa, ainda que não necessariamente intencional, dos residentes e pedestres ao lado das intervenções de design cuidadosamente selecionadas contribui para um espaço que estimula a imaginação e estimula comportamentos lúdicos e sociais. Ainda, a rua é complementada por uma série de pátios comunitários que proporcionam o cultivo comunitário de flores e vegetais, além de outras oportunidades para brincar, socializar e descansar da vida doméstica. 158

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35. PONTOS DE EMPRÉSTIMOS

Eixo estratégico do plano Infraestrutura lúdica em uma cidade brincante

Objetivo do plano 5 - qualificar, expandir e diversificar as oportunidades de brincar livre na cidade, pensando não apenas nas áreas de brincar, mas também em espaços e entornos lúdicos e elementos urbanos brincantes

Pessoas destinatárias (x) (x) (x) (x) (x)

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crianças adolescentes jovens adultos idosos

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Principais agentes implicados • Comerciantes locais • Subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia • Comunidade local


Indicadores de Monitoramento I. Possibilidades brincantes • número de empréstimos realizados pelas crianças • atividades realizadas pelas crianças • em que medida as relações entre as crianças nos espaços públicos se alteraram • em que medida alterou os cuidados dos usuários com o espaço público • em que medida influenciaram na utilização do espaços públicos • número de crianças utilizando o espaço ao redor do ponto de empréstimo • número e variedade de atividades de apropriação do espaço II. Acesso a banheiros • quantidade de banheiros reformados • número de pessoas utilizando os banheiros públicos • em que medida influenciou na permanência no espaço

IV. Dinamização dos comércios locais • em que medida alterou o volume de vendas e faturamento dos comércios locais • em que medida alterou o fluxo de clientes • em que medida alterou a frequência de consumo e gastos no local

Ações Concretas • mapeamento de comércios próximos à praças e parques • chamamento público para os comerciantes interessados • verificação da existência de banheiros nos estabelecimentos e incentivo para sua qualificação • definição da rede de comércios que será equipada para empréstimos • mapeamento das áreas não atendidas por comércios • definição de espaços onde serão alocados os contêineres de empréstimos • campanha de arrecadação de brinquedos e jogos • seleção dos brinquedos e jogos

III. Lazer e permanência dos adultos • tempo de permanência nos espaços • número de empréstimos realizados pelos adultos • número de adultos utilizando os espaços

• compra de brinquedos e jogos para completar os kits de empréstimos garantindo diversidade e representatividade • distribuição dos brinquedos e jogos entre todos os pontos de empréstimos • explorar maneiras de gestão relacionadas à economia social e solidária

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OBJETIVO DA PROPOSTA A proposta abarca quatro grandes objetivos: aumentar as possibilidades e o acesso a brinquedos e oportunidades lúdicas das crianças, criando um senso de comunidade e de coletivo; disponibilizar o acesso a banheiros públicos; promover o lazer também aos adultos que acompanham as crianças; e dinamizar os comércios locais já existentes.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO Entendendo a realidade socioeconômica do local e, a partir de experiências já vividas com crianças da região, destaca-se, além da falta de espaço para brincar, acesso limitado a uma variedade de brinquedos ou atividades extracurriculares. Assim, entende-se a potência que se apresenta ao trazer uma nova variedade de possibilidades às crianças. Não por entendermos que são essenciais ao brincar, porque muitas vezes, o brincar livre acontece naturalmente e qualquer elemento pode tornar-se um brinquedo. Mas por entendermos que, ao compartilhar brinquedos e novos materiais, não apenas se ampliam as possibilidades de criação como também, e talvez essencialmente, suscita-se o senso do coletivo, do compartilhar. E, a partir disso, desenvolve-se uma maior sensação de pertencimento, entendendo que a cidade acolhe o seu brincar e disponibiliza oportunidades diversas à ele. Além disso, oferecer materiais que convidem ao uso do espaço público é também uma maneira de dinamizar o seu uso e ocupação, gerando condições que enriquecem a dinâmica comunitária e as relações entre vizinhos, que vão se dando em torno do brincar. Assim, estimula-se que espaços de lazer recuperem ainda mais sua função enquanto espaço de encontro cotidiano e rotineiro. E, ainda, essa dinamização do espaço não se dá apenas através das crianças. Garantindo espaços para os adultos, que também possuem pouquíssimo espaço de lazer, al-

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cança-se um público ainda maior. Ainda, disponibiliza-se materiais que trazem de volta o lúdico ao universo adulto, possibilitando um tempo outro, de priorizar o lazer e validá-lo como também importante. Relacionar esses materiais de lazer a comércios e bares, onde a estadia dos adultos é confortável e duradoura estimula ainda mais a permanência. Incentivamento a permanência no espaço público por meio dos comércios já existentes, valoriza-se também a economia local, dinamizando e aumentando o uso e consequente consumo nesses espaços. Assim, acredita-se criar uma rede local articulada, que valorize o espaço público e o brincar e que também se beneficie dessa associação. Vale dizer que, ao mesmo tempo, é uma concretização importante de planejamento urbano com perspectiva de gênero. Isto é, proporcionar banheiros públicos acessíveis e gratuitos é garantir a permanência de mulheres e crianças no espaço público, seja porque as mulheres necessitam ir ao banheiro mais vezes, seja porque são elas que, em grande medida, assumem as tarefas de cuidado com a infância e, portanto, precisam trocar a fralda, trocar a roupa, etc. Assim, com pequenas intervenções de planejamento urbano e oferecimento de serviços, busca-se gerar um espaço público mais confortável para as necessidades da vida cotidiana de todas as pessoas. Assim, destacamos que é uma intervenção simples, de baixo custo e que não necessita de muito espaço para ser implementada - seja pela utilização de locais já existentes, seja pelo tamanho moderado de um container. Ao mesmo tempo, é uma ação de alto impacto em diversos campos e agentes.

DESCRIÇÃO Busca-se criar uma rede de pontos de empréstimos de brinquedos, jogos, equipamentos e materiais lúdicos visando qualificar o brincar das crianças da região, garan-

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tindo infraestrutura para isso (banheiros), estimulando que os adultos acompanhantes também permaneçam e desfrutem do espaço e, assim, possa-se dinamizar a economia local. A proposta concretiza-se em dois modelos diferentes. Em um primeiro momento, pretende-se selecionar comércios já existentes, oferecendo-lhes incentivo, para que estes tornem-se pontos de empréstimos de jogos. Isto é, os comércios precisariam qualificar seus banheiros, garantindo acessibilidade e acesso às crianças e receberiam um kit brincante, que ficaria no estabelecimento e seria gerenciado pelos atendentes locais. Em um segundo momento, visando alcançar e atender todo o território, seriam implementadas estruturas de empréstimos nas regiões sem comércio inscrito no programa. Essas estruturas seriam feitas de container, com banheiro alocado. Isto é, são estruturas simples, que requerem pouco investimento e são pequenas, podendo ser alocadas facilmente. Esses novos pontos também seriam equipados com kits brincantes. Os kits brincantes, nos dois modelos, possuem materiais diversos e são pensados tanto para as crianças quanto para adultos. Para as crianças há brinquedos, jogos de tabuleiro, jogos espaciais (como taco e corda, por exemplo), materiais lúdicos (como giz, baldes, bolas diversas), livros, entre outros. Para o adultos, jogos de tabuleiros, livros, baralho, entre outros. Para realizar o empréstimo, as crianças e seus acompanhantes devem fazer um cadastro, que é gratuito, apenas para controle das retiradas. Após feito o cadastro, qualquer um pode retirar o material e utilizá-lo nas proximidades, sendo a devolutiva feita obrigatoriamente no mesmo dia. Assim, entendemos a proposta como uma possibilidade simples, aplicável e replicável para garantir o brincar livre qualificado e diverso das crianças, apresentando materiais pouco explorados e, até então, pouco acessíveis a elas. Também são importantes para garantir espaços qualifica-

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dos também aos adultos, recuperando sua permanência nos espaços públicos trazendo o lúdico enquanto possibilidade para tal. Para garantir o serviço de banheiros de livre acesso aos residentes e vizinhos, garantindo maior permanência dos usuários e buscando acessibilidade universal. E, ainda, estimular a dinamizar o comércio local. Acreditamos que a soma de todas essas conquistas vão compondo um cenário mais harmonioso e coletivo, onde as trocas e os encontros são estimulados e passam a estruturar-se de forma mais colaborativa.

EXEMPLO projeto: Duimdrop local: Rotterdam, Holanda responsável: Prefeitura de Rotterdam Com preocupações crescentes em relação ao declínio número de crianças brincando em parques públicos, a cidade de Rotterdam iniciou um programa chamado Duimdrop, no qual materializa-se a ideia de "caixas de brinquedos" em contêineres de empréstimos de brinquedos, jogos e equipamentos, alocados em praças ou parques públicos. A cidade tinha como objetivo estimular o brincar em espaços públicos e encorajar a interação social entre os pais e cuidadores. Estão disponíveis para empréstimos nos contêineres triciclos, patins, go-karts, skates, materiais artesanais e outros. As crianças podem fazer gratuitamente seu cartão de sócio e, com ele, alugar os brinquedos e utilizá-lo no espaço público. Em Rotterdam, os contêineres são gerenciados por voluntários (muitas vezes pais ou avós), que cuidam do equipamento e de gerir o espaço. A fim de incutir um senso de responsabilidade, as crianças podem coletar selos ajudando em pequenas tarefas, como varrer o chão ou consertar brinquedos. Usando esses selos coletados, eles podem

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alugar um brinquedo especial. A ideia da cidade, com isso, é ensinar as crianças a olhar para o outro e para o espaço comum, entendendo também suas responsabilidades. A prefeitura da cidade diz que grande parte do sucesso do projeto se dá quando as organizações comunitárias, como o centro comunitário, a polícia e a escola primária, entre outros, trabalham bem entre si e com os residentes, criando uma atmosfera coletiva e criando uma rede de conexões locais. Dessa forma, a iniciativa da “caixa de brinquedos” é uma intervenção simples que oferece um espaço seguro para crianças e pais reunirem-se e conhecerem-se. Além da rotina cotidiana de empréstimos, os voluntários também organizam eventos sazonais da comunidade, como clubes de leitura e eventos artesanais. Esta intervenção simples traz alegria e vida de volta para lugares públicos acolhendo crianças e pais de todas as origens para brincar juntos.

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40. JOGAMOS NA PRAÇA: ITINERANTE

Eixo estratégico do plano Infraestrutura lúdica em uma cidade brincante

Objetivo do plano 5 - qualificar, expandir e diversificar as oportunidades de brincar livre na cidade, pensando não apenas nas áreas de brincar, mas também em espaços e entornos lúdicos e elementos urbanos brincantes

Pessoas destinatárias (x) crianças (x) adolescentes (x) jovens (x) adultos ( ) idosos

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Principais agentes implicados • coletivos • organizações da sociedade civil • Subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia • comunidade local


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Enriquecer a vida na comunidade

• levantamento de iniciativas já existente

• em que medida alterou as relações intergeracionais no espaço

• curadoria das iniciativas existentes

• em que medida ampliou a faixa etária das pessoas que frequentam os espaços e as atividades itinerantes

• levantamento das praças com capacidade para acolher as atividades • seleção das praças do programa, levando em consideração sua localização e a abrangência de todo o território.

II. Aumentar e diversificar os usos nas

• elaboração de calendário da rotatividades e local das atividades

praças

• divulgação das atividades

• número de pessoas que frequentam as atividades itinerantes

• início das atividades por meio das iniciativas existentes selecionadas

• diversidade das atividades propostas

• avaliação das primeiras experiências

• qual a frequência de uso do espaço pelas crianças e adultos

• chamamento aberta para novas iniciativas

III. Recuperar o hábito de brincar na rua • quantas pessoas frequentam a praça quando não há atividade • em que medida as crianças passaram a usar mais o espaço • em que medida alterou as atividades que se dão no espaço quando não há proposta itinerante IV. Ressignificar o imaginário coletivo • em que medida as crianças se fazem mais responsáveis por esses espaços • em que medida as crianças passaram a olhar para o espaço público positivamente

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OBJETIVO DA PROPOSTA Os principais objetivos da proposta são enriquecer a vida da comunidade e aumentar e propor usos diversos nas praças, recuperando o hábito de brincar na rua e ressignificando o imaginário coletivo dos espaços públicos por meio da sistematização de propostas itinerantes.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO O ambiente urbano é o espaço onde se dão as relações entre diversos sujeitos sociais, em uma rede na qual coexistem contextos e espacialidades que abarcam subjetivações coletivas. Isto é, todos que convivem no espaço urbano também o modificam, em termos de imaginário coletivo, ao mesmo tempo que vão atribuindo-lhe sentidos individuais. Essa construção de sentido e imagem do espaço urbano vai acontecendo por meio do encontro, das experiências e das vivências. Assim, ocorre, concomitantemente, a construção social do espaço e a construção espacial das práticas sociais (DIAS; JÚNIOR, 2017). Entretanto, a cidade vem perdendo sua característica de espaço relacional com a transformação dos espaços livres públicos em espaços de passagem. Isto é, vem ocorrendo uma ressignificação do seu uso, que diminui sua ocupação e, consequentemente, a troca entre os indivíduos e a percepção de que tem e fazem parte dos espaços. Também como consequência a isso, observa-se a diminuição do lazer, das atividades comunitárias e da expressão para o exercício da cidadania. A cidade tem sido cúmplice desse processo, que não favorece espaços e situações que valorizem e estimulem o lazer e o lúdico. Assim, pensar em atividades lúdicas itinerantes nas praças é pensá-las também como centralidades momentâneas que convidam diversos agentes a estar e experienciar o espaço. A rotatividade garante alcance a todo território, ao

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mesmo tempo que, localmente, cria eventos convidativos e pontuais, que atraem atores diversos. Além disso, ser temporário permite oferecer oportunidades lúdicas com itens ou materiais que, por diversos motivos (manutenção, custo, segurança, etc.), não podem ser instalados permanentemente no espaço público. Nesse sentido, pode ser entendido como a possibilidade de criar novos modelos socioculturais (de estar, conviver, ocupar) que transformam a sociabilidade ao modificar os usos e as formas de relacionamento dos e nos lugares, ressignificando a prática socioespacial e, assim, o valor simbólico do espaço para seus usuários. Portanto, é uma maneira de (re)criar um espaço percebido, vivido, subjetivado e ressignificado. Passa, assim, a ser um espaço afetivo e simbólico relacionado à experiências possíveis. Ao criar, diversificar e valorizar a diversidade de usos em seus espaços públicos, abrindo espaço ao lúdico, a cidade converte-se em um espaço físico carregado de identidade, em lugar simbólico de construção da cidadania (DIAS; JÚNIOR, 2017). Ressaltando-se as alternativas a partir do espaço já existente, qualifica-se e diversifica-se seu uso, dando a ele uma nova vida e significando o espaço público enquanto espaço da cidadania. É a possibilidade de, a partir do lúdico, recriar o imaginário do lugar através de novos usos e relações. Portanto, mais do que alterar fisicamente o espaço, é transformá-lo simbolicamente por meio do brincar, que fortalece os vínculos comunitários, além de ser uma importante ferramenta na construção de uma cultura de paz. Assim, assume-se a experiência vivencial no espaço como recurso retórico e tático e enquanto estratégia metodológica para recuperar o espaço público como referencial e preferencial para as inter-relações entre indivíduos e coletividade, reforçando a cidade como lugar vivencial e do encontro, centrando-se no lúdico a partir dos espaços livres públicos.

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DESCRIÇÃO A proposta trata-se de lançar um programa de sistematização e dimensionamento à nível de programa distrital de propostas itinerantes nos espaços públicos da cidade, com dinamizações e intervenções efêmeras em torno do brincar nas praças dos diferentes bairros do distrito, seja para trabalhar na diversificação e coexistência de usos no bairro, seja como parte da programação cultural de rua, onde a brincadeira é a proposta principal. Assim, busca-se um mapeamento inicial de iniciativas já existentes que possam ser feitas enquanto propostas lúdicas na praça. Seria feita uma curadoria e, a partir disso, incentivos para que essas iniciativas fossem incorporadas ao programa, estabelecendo um calendários de atividades rotativas. Conseguiria-se, então, um compilado de propostas que abarcassem diversas idades e atividades. Isto é, podem ser propostas atividade de pintura corporal com crianças, peças de teatro ao ar livre para diferentes idades, oficinas de contação de história, de produção de brinquedos, de plantio, de compostagem, entre muitas outras. Após essa experiência inicial, abriria-se chamamento de novas iniciativas que pudessem ser incorporadas ao programa, buscando que as praças do programa tivesse atividades pelo menos a cada 15 dias.

EXEMPLO projeto: Juguem a les places local: Barcelona, Espanha responsável: prefeitura de Barcelona A iniciativa teve início na Vila de Gracia, um bairro da cidade catalã. Era uma campanha com diferentes propostas para promover a atividade lúdica entre as famílias e para melho-

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rar a convivência nas praças do bairro por meio de jogos tradicionais, oficinas criativas, jogos de tabuleiro, bolas de espuma, entre outros. Nos meses de verão, quatro praças do distrito recebiam, cada uma em um dia diferente da semana, atividades pontuais que podiam ser usufruídas por todos. Assim, crianças, jovens e adultos desfrutam das praças do bairro como ponto de encontro para aprender a valorizar e melhorar o uso do espaço público. As crianças descobrem jogos tradicionais e contemporâneos, compartilham oficinas criativas com a família e participam na confecção de um mural pictórico enquanto aprendem os valores da brincadeira compartilhada e do respeito. A iniciativa vem ocorrendo desde 2018 e, em 2019, com a consolidação do Plan de Juegos, objetiva-se que seja uma ação em âmbito municipal. Assim, inspirada pela iniciativa pontual d bairro, que mais regiões e praças na cidade possam contar com o serviço.

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44. RECUPERAR FESTAS NA CIDADE

Eixo estratégico do plano Usos lúdicos em uma cidade brincante

Objetivo do plano 6- resgatar o uso do espaço público através do lúdico, criando ambientes de estadia que fomentem o vínculo social e a vida comunitária em torno das brincadeiras e incorporando ao desenho urbano as necessidades das crianças

Pessoas destinatárias (x) (x) (x) (x) (x)

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crianças adolescentes jovens adultos idosos

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Principais agentes implicados • Subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia • Secretaria Municipal de Cultura • comunidade


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Reviver a alma lúdica da cidade

• pesquisa das origens dos moradores da Brasilândia

• em que medida foi possível encontrar e valorizar festas e manifestações culturais tradicionais • em que medida passou-se a ocupar mais a rua • em que medida a comunidade se organizou para criar celebrações locais II. Reviver o lúdico em cada um • em que medida ocorreu o envolvimento da comunidade • em que medida alterou nas pessoas a percepção e entendimento do lúdico

• levantamento de memórias de festas, rituais e celebrações por meio de entrevistas • oficinas de trocas sobre experiências vividas e lembradas • abertura de espaços colaborativos de organização das festas • mapeamento de coletivos de manifestações culturais existentes no distrito e fomento a esses grupos • incentivo e apoio para apropriação da cidade • criação e elaboração de novas celebrações significativas ao distrito

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OBJETIVO DA PROPOSTA O principal objetivo da nas ruas, reviver a alma sagrada, possibilitando possam encontrar seu espaço público

proposta é, por meio das festas lúdica da cidade em sua dimensão que todos, de todas as idades, eu brincante e celebrar o e no

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO Brincar em um “parquinho”, situação comum do brincar atual, pouco conta sobre a cidade, são poucas as trocas e interações e a percepção intergeracional é mínima, uma vez que os brinquedos só são feitos para crianças. Isto é, os parquinhos não permitem, por exemplo, que os idosos rebrinquem. Voltemos, então, ao “brincantes”, termo que designa, no Nordeste, os artistas populares dedicados aos folguedos tradicionais, onde podem cantar, dançar, tocar instrumentos, etc. Ao realizar um espetáculo, esses artistas dizem que vão brincar. Os brincantes e, assim como eles, as festas na cidade, são uma possibilidade de maior conexão com os espaços urbanos a partir do olhar para a dimensão do sagrado, que também faz parte da cidade. Haviam, em São Paulo, inúmeras procissões, como o Divino, Nossa Senhora do Rosário, Nossa Senhora Achiropita, Corpus Christi, ou ainda festas em comemoração aos santos Pedro, João e Antônio, da Penha, São Vito, São Benedito, Reis, entre muitas outras que foram se perdendo no ritmo da cidade (SILVA; GARCIA; FERRARI, 1989). Recuperar a possibilidade dessas festas nas ruas nos permite olhar para as origens e heranças, aumentando a consciência territorial e fugindo do ritmo acelerado do agora, assim como entender a rua como espaço para dilatação desses corpos que se expandem. É devolver às ruas sua

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sensibilidade, ludicidade e solidariedade, hoje deixadas de lado, e resgatar sua magia. Ao olharmos para nossas celebrações e rituais, entendemos também nossa humanidade: “somos um povo rico e diverso, reconhecidamente alegre e festivo, a despeito dos dissabores” (SAURA, 2015, p. 52). Festas e manifestações populares espalham-se por todo território nacional, celebrando, sobretudo, a vida em seus muitos aspectos cotidianos e comuns. Terrenos embandeirados, fogueiras, barraquinhas de comidas, cantos, danças, reis, rainhas, santos, bichos e monstros misturam-se animadamente em inumeráveis terrenos. Entretanto, ainda que muito heterogêneas, as culturas populares apresentam um arcabouço imaginal comum que facilmente identificamos na estrutura de todas elas. Isso porque, independentemente do meio no qual estejam inseridas – ainda que dialoguem em profundidade com a realidade, com o ambiente e com a cultura local -, as manifestações operam com temas comuns à humanidade em geral. São consideradas tradicionais por causa dessas características atemporais. E, justamente por esse sentido tão abrangente e simples as manifestações populares devem ser vividas em todas as suas dimensões, abraçando os processos de passagem, as preparações e o tempo individual de cada um. As festas na cidade são ocupações pontuais do espaço mas trazem a dimensão da celebração, do sagrado. O brincar transcende o objeto, as origens vão para além da memória, é algo vivo, do tamanho de uma comunidade e serve para todo mundo brincar. É a possibilidade de acessar profundezas de quem sou e de vincular-se a lugares que apenas acessamos com as brincadeiras. Além disso, muito da potência dessas festas populares está na reunião de todos em torno de um fazer junto, coletivo, que convida as crianças para esse processo enquanto co-autoras. Muitas de suas maiores significações se dão nas relações que ali acontecem, tão importantes quanto o folguedo em si. E os cortejos passam louvando a alma da

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cidade com uma alegria que comemora o fato de estarem todos juntos na cidade (GOULART, 2020), celebrando a essência do grupo em um corpo coletivo e possibilitando que cada um acesse esse terreiro do brincar. Porque o terreiro é qualquer espaço de intimidade de uma comunidade. Espaço de experimentação dos limites e possibilidades que socialmente não teriam lugar. É o espaço que fica longe das vistas do controle e do julgamento (TERREIROS DO BRINCAR, 2017). Assim, possibilita-se o corpo que sente, que vivencia, um corpo que brinca e que carrega o olhar da criança, que enxerga mais vividamente a matriz das cores do seu entorno, percebendo coisas que normalmente não percebemos. As manifestações populares são ritualizações de uma palavra que é indizível.

DESCRIÇÃO Vale ressaltar que essa proposta não é uma ação pontual. É a busca por recuperar as memórias coletivas de manifestações já existentes bem como o apoio para a formalização de novas celebrações que possam fazer uso da ocupação da cidade. Assim é um processo coletivo sem resultado final definido, uma vez que dependerá extremamente da memória das pessoas moradoras do distrito da Brasilândia. Há uma grande ênfase no processo. Assim, haverá um primeiro momento de trocas e reavivamento das memórias dos agentes locais, em uma tentativa de aproximação daquilo que lhes é afetivo e significativo por ter alguma relação com suas histórias. Prevê-se a realização de oficinas onde estas trocas sejam efetivas e que possam, elas mesmas, funcionarem enquanto espaço cultural de contação de memórias populares. Nesse processo, haverá o incentivo e atividades que ajudem na retomada dessas celebrações, festas e rituais presentes na memória dos moradores. Em um segundo momento, haverão espaços de organização popular visando a esquematização desses rituais

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rememorados mas também para a concretização de novas celebrações que façam sentido àquela comunidade. Será incentivado a consolidação de festas de bairro, em que cada localidade possa celebrar suas particularidades, sejam por meio de mostras, rituais, shows, ou o que for significativo a comunidade. Pensa-se, também, no estabelecimento de relação com escolas, onde os conhecimentos e sabedorias dos folguedos possam ser transmitidas de maneira efetiva, afetiva e significativa. Isto é, que não seja apenas uma questão cenográfica e possam adentrar em sua simbologia e significado originário.

EXEMPLO projeto: Cortejo de Maracatu no Glicério local: São Paulo, Brasil responsável: Criança Fala na Comunidade – Escuta Glicério! - Nayana Brettas Os Cortejos de Maracatu estão inseridos no contexto da iniciativa do Escuta Glicério, desenvolvida pela CriaCidade em parceria com o programa São Paulo Carinhosa, no bairro de mesmo nome, desde 2015. O objetivo do projeto é, por meio de uma metodologia lúdica de escuta, incluir em políticas públicas, projetos arquitetônicos e pedagógicos, além de equipamentos, o que falam, pensam, veem e querem as crianças que vivem nesta região. Após alguns meses construindo o processo, meninas e meninos de diferentes idades saíram pelo território com desenhos, textos e poesias nas mãos acompanhadas por um grupo de Maracatu. Um levantamento de onde as crianças estudavam resultou no envolvimento de três escolas públicas em uma etapa inicial, de criação de vínculos que se estendeu pelo primeiro ano do projeto. Os alunos das escolas passaram a se encontrar para a realização do cortejo de maracatu, do qual mais de 450 estudantes

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participam. Atualmente o cortejo passou por mudanças propostas e implantadas pelas próprias escolas, que dividiram as salas em grupos menores e fizeram mudanças de percurso, introduzindo pontos de parada no roteiro. Uma vez por mês, as crianças do Glicério passaram a realizar cortejos de maracatu pelas ruas do bairro. Nessas ocasiões, eles exibem desenhos, textos e poesias para toda a comunidade. Para a socióloga Nayana Brettas, responsável pelo projeto, os Cortejos promovem a presença das crianças na cidade, humanizando os espaços públicos e sensibilizando as pessoas. Além disso, instauram um processo de aprendizagem e fortalecem os vínculos com a comunidade.“ No caminhar pelas ruas, as crianças vão aprendendo e apreendendo os códigos da cidade, vão se apropriando e sentindo que fazem parte dela.” O Grupo Mergulhatu, além de acompanhar os Cortejos, começou, neste mês de Agosto, a realizar uma oficina com 15 alunos da EMEF Duque de Caxias que sempre estão presentes no Cortejo. A ideia é fortalecer esse grupo para que, futuramente, elas mesmas liderem o evento. Além disso, a oficina trabalha o tema que será representado que, no caso, é a origem das famílias do Glicério, a partir das histórias e culturas familiares. Para trabalhar o tema, houve uma dinâmica em que as crianças desenharam retratando a origem de suas famílias.

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66. PÁTIOS ESCOLARES ABERTOS

Eixo estratégico do plano Usos lúdicos em uma cidade brincante

Objetivo do plano 8 - ampliar o diálogo escola-cidade entendendo a escola como pólo centralizador no território

Pessoas destinatárias (x) (x) (x) (x) (x)

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crianças adolescentes jovens adultos idosos

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Principais agentes implicados • alunos • professores • famílias • comunidade • gestão escolar


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Gestão e diálogo

• organizar o projeto, entendendo participantes, frentes de atuação, objetivos e cronograma

• em que medida as pessoas estão satisfeitas com a gestão do espaço? • em que medida ampliou-se o debate entre toda a comunidade escolar?

• divulgar o projeto para toda a comunidade escolar • apresentar o projeto para toda a comunidade escolar

II. Qualidade do espaço

• realizar debates com os professores

• quantas pessoas passaram a utilizar o pátio?

• realizar observações do pátio durante seu funcionamento

• em que medida alterou a relação de poder no pátio?

• realizar debates com a comunidade

• quantas novas atividades passaram a ser realizadas?

• realizar percursos de exploração do entorno escolar

• em que medida alterou a ocupação do espaço por meninos e meninas? E por crianças de diferentes idade?

• realizar atividades para entender a visão dos alunos • debater com os alunos

III. Engajamento da comunidade

• entender os resultados obtidos a partir das atividades e definir estratégias de atuação

• quantas pessoas da comunidade estiveram envolvidas?

• realizar um desenho colaborativo das propostas

• em que medida mudou a relação da escola com o entorno?

• fazer um documento técnico a partir das propostas

• qual a frequência de uso do espaço pela comunidade?

• refletir sobre o que é abrir o pátio • definir um modelo de gestão • estabelecer ações de continuidade

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OBJETIVO DA PROPOSTA O objetivo da proposta é ganhar espaço público por meio dos ambientes das escolas e institutos, transformando os pátios escolares com diversificação de propostas de jogos, coeducação e naturalização e, ao mesmo tempo, fortalecer o diálogo escola-cidade. Tem, como questão central, construir pátios escolares que sirvam como locais complementares ao aprendizado da escola, e que, ao mesmo tempo, possam ser usufruídos pela comunidade externa. Como questão estrutural, como valorizar os pátios escolares tão importantes para a cidade contemporânea brasileira, com espaços livres tão escassos para recreação.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO O pátio escolar pode ser entendido como um importante, senão o primeiro, espaço de socialização da criança, sendo um lugar de exploração e de experimentação. Entretanto, muitas vezes, ele é visto apenas como oposição à sala de aula, que seria o espaço interno e da mente, enquanto o pátio o externo, o do corpo, do ócio. Essas duas esferas não são comumente entendidas em sua possibilidade complementar. Assim, buscamos pensar e destacar o pátio escolar não como lugar exclusivo da recreação, mas também como locus da ação educativa, de produção de conhecimento, como um espaço importante. Atualmente, vem crescendo pesquisas e linhas pedagógicas que reconhecem sua importância enquanto espaço de troca e de convívio, bem como sua possibilidade enquanto ambiente de aprendizagem, que pode caracterizar-se como uma extensão da sala de aula ou, ainda, exercer funções semelhantes a mesma, complementando e renovando as atividades pedagógicas convencionais, possibilitando o estabelecimento de identificações e apropriações coletivas e individuais. Valorizar o pátio escolar é valorizar também o brincar, os jogos coletivos e as relações interpessoais para a construção do conhecimento, os quais não devem limi-

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tar-se a conteúdos, passando também por aprendizagens processuais, relacionais e intrapessoais. Contraditoriamente, os pátios nas escolas vem diminuindo em tamanho e/ou qualidade, o que se dá por motivos diversos. Retoma-se a pouca importância pedagógica, apesar das pesquisas, que as escolas os atribuem, acrescida da necessidade de ampliação do número de salas para atendimento da demanda crescente, da falta de terrenos adequados em tamanho e topografia, da redução do tempo livre em função da necessidade de implantação dos tempos de reforço escolar, e uma a síndrome de desaparecimento do tempo livre, que rouba não apenas os espaços livres das escolas, como também do restante da cidade.

12. Entretanto, o espaço não se apresenta como o mais adequado. Apenas em 2007, em São Paulo, a Secretaria Municipal de Saúde registrou a morte de pelo menos 81 pessoas, a maioria delas crianças, devido à queda de lajes. O número real de acidentes é ainda maior, pois segundo levantamento da Secretaria Estadual de Saúde, as quedas de lajes foram responsáveis por 74,6% das 184.240 internações de crianças de 0 a 15 anos, por acidentes, em 2005 (MARIZ, 2017).

Assim, ao mesmo tempo, em especial nas periferias urbanas, como é o caso da Brasilândia, os espaços livres públicos existentes também estão diminuindo. Estudos do Quapá confirmam “que o crescente adensamento e a consolidação da cidade brasileira têm levado ao adensamento das quadras, à sua quase completa ocupação” (MARIZ, 2017, p. 25). Nos bairros populares, a demanda por habitação gera a construção de novas moradias nos espaços remanescentes do lote, casas atrás de casas e casas sobre casas. Muitos lotes são densamente ocupados e acaba-se por usar as lajes como áreas livres 12, uma vez que, como na Brasilândia, por exemplo, apenas 0,33% do território é composto de espaços livres públicos. Os pouco existentes são mal qualificados e equipados, fortalecendo uma demanda de utilização dos espaços livres (não edificados), como é o caso do uso e da apropriação do pátio escolar pela comunidade. Portanto, especialmente na realidade que encontramos no distrito estudado, o pátio escolar, apesar de pouco estudado dentro do sistema de espaços livres da cidade, destaca-se como um dos mais importantes (MACEDO, 2017). A complexidade e a diversidade de funções e categorias do sistema de espaços livres urbanos justificam o interesse em entender o papel e a importância dos pátios escolares como ambientes de lazer e socialização - absorvendo fun-

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13. Segundo a OMS, a distância razoável para se ter de um espaço público é de 300m linearmente, o que corresponde a aproximadamente 5 minutos andando. Baseada nisso, levantei os raios de 300m metros de abrangência das praças na análise do distrito da Brasilândia e, agora, a fim de determinar a abrangência da rede de escolas públicas, fiz o mesmo para elas.

ções antes atribuídas às praças de vizinhança -, e como protagonista do processo educativo, o que implica reconhecer a influência do entorno e de suas características socioespaciais. Reforçamos a importância da sua abertura para a comunidade também devido a estruturada rede de escolas públicas, que pode funcionar enquanto importante instrumento de qualificação e transformação da paisagem e das possibilidades de apropriação urbana. Segunda Lima, “a escola é o único espaço que as cidades paulistas oferecem universalmente como possibilidade dos espaços públicos e populares – domínio das atividades lúdicas (jogos e brinquedos)” (1989, p. 101). Ainda, quando traçamos um raio de 5 minutos caminhando (300m) 13 a partir das escolas, vemos que a mancha criada abrange quase todo o território da Brasilândia, isto é, quase todos tem acesso a um espaço público (os pátios) com 5 minutos de caminhada. Somando, ainda, essa mancha aos raios das praças (no mapa abaixo foram consideradas apenas as maiores de 150 m2 por ser a situação ideal), quase todo o território da Brasilândia consegue acessar um espaço público de lazer, sem a necessidade de flexibilizar para 10 ou 15 minutos de caminhada, como feito na análise do território. Considerando as escolas de ensino fundamental da Brasilândia somadas às praças locais, 84,54% do território consegue chegar a um espaço público com 5 minutos de caminhada. Assim, entende-se como uma proposta bastante abrangente que daria conta de qualificar o brincar das crianças e da cidade e possibilitaria a revisão do papel dos centros educativos dentro da comunidade, possibilitando pensá-los enquanto potentes espaços multifuncionais e autênticos corações cívicos do bairro, o que muito diz também da educação em sua função de formar cidadãos. Isto é, já sendo um espaço intrinsecamente pedagógico e lúdico, poderia também oferecer espaço de transformação para a população em geral, além de possibilidades mais qualificadas para as crianças.

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Pensar a abertura desses espaços para a comunidade é também pensar sua qualificação e, portanto, melhorá-los para seu público mais frequente: os alunos da escola. O que também é benéfico para a escola, que ganha novo suporte para as relações didático-pedagógicas. E, ainda, a cidade ganha uma ampla rede de equipamentos para a realização de diversas atividades. Além disso, abrir os centros educativos criaria necessários novos espaços para a participação e socialização intergeracional, ao mesmo tempo em que poderia gerar nos alunos um aumento de sua autoestima, de seu sentimento de pertencimento e, de certo modo, de orgulho de formar parte de um lugar que passou a ser uma referência na vida pública do bairro ou cidade ao qual pertencem. É também uma forma de garantir espaços na cidade para as crianças, espaços que as pertencem e são acolhedoras a elas, enfocando, para isso, espaços em que realmente habitam e com os quais já estabelecem certa relação e intimidade. Portanto, se é possível pensar os pátios escolares como espaços também urbanos, pertencentes ao sistema de espaço livres da cidade, também cabe considerar os mecanismos e os processos de interação interior-exterior da instituição, ou seja: como é possível ampliar a conversa desses ambientes com a cidade, considerando as dinâmicas de conexão entre o intramuros e o extramuros da escola (AZEVEDO; RHEINGANTZ; T NGARI, 2017). Entende-se os pátios das escolas como espaço de diálogo entre o dentro e o fora, entre a cultura escolar e a cultura urbana, entre a escola e a cidade, num caminho de mão dupla, onde o cidadão se transforma em aluno e o aluno retoma seu papel de cidadão (GOULART, 2017). Assim, é possível pensar que na abertura desse diálogo, que quebra os muros que dividem escola/cidade, o entorno comunitário, com suas questões e dinâmicas sociais, culturais, políticas e econômicas, passa a ser contexto de discussão e aprofundamento, trazendo as aprendizagens escolares para contextos reais, que, além de significarem as aprendizagens apresentam-se enquanto possibilidade de transfor-

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mação. É caminhar também no sentido de uma educação contextualizada que se enraíze no universo amplo das experiências de socialização que ali ocorrem. Havendo essa vinculação mais orgânica entre a escola e a cidade, pode-se falar em um projeto educativo integral e integrador. O primeiro enfoque se refere à dinamicidade e multiplicidade dos elementos que a escola pode mobilizar para ampliar o horizonte de formação dos estudantes com base no contexto dos quais são atores sociais. O segundo enfoque pode ser visto como uma abordagem que vincula escola e sociedade, a fim de que a cultura escolar esteja norteada pelo propósito de promover um processo de conscientização que possibilite às pessoas a leitura do mundo e atitudes politizadas, além da necessária apropriação dos processos culturais e sociais que propiciam o surgimento do apego ao lugar e construção do sentimento de coletividade. Assim, pensar esse diálogo é pensar da perspectiva da educação integral, de formação completa nos âmbitos social, físico, cultural, intelectual e emocional e, ao mesmo tempo, da cidade educadora, que possibilita que todos os seus espaços sejam formativos. Orientada pela perspectiva de formar sujeitos críticos e participativos na sociedade, o papel da escola na cidade educadora se efetiva na medida em que temos uma Escola Cidadã e uma Cidade Educadora quando existe diálogo entre a escola e a cidade. Não se pode falar de Escola Cidadã sem compreendê-la como escola participativa, escola apropriada pela população como parte da apropriação da cidade a que pertence (GADOTTTI, 2006, p.65).

Partindo dessas perspectivas, conseguimos estabelecer uma comunidade de aprendizagem, que entende a escola como o coração da comunidade, um centro cultural, um lugar importante para o entorno. “Uma comunidade humana organizada que constrói um projeto educativo e cultural próprio para educar a si própria, suas crianças, seus jovens e adultos, graças a um esforço endógeno, cooperativo e solidário, baseado em um diagnóstico não

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apenas de suas carências, mas, sobretudo, de suas forças para superar essas carências” (GOULART, 2017, p. 41). Para tal, nos ajuda pensar o sentido etimológico da palavra, que deriva do latim patēo es ēre: estar aberto, exposto, estender-se; abrir-se. Ideias que sugerem tanto a abertura quanto o relacionamento, sendo possível entender os pátios como o espaço das relações sociais. E, nessa disponibilidade para o diálogo, no sentido freireano de ‘abertura respeitosa aos outros’, é possível potencializar todos os agentes educativos enquanto instituições formadoras, o que possibilitaria que a escola fosse afetada de maneira positiva pelas práticas comunitárias, pela liberdade e autonomia presentes nos espaços de educação informal, pela concretude e pelo movimento da vida cotidiana (GOULART, 2017). Seriam formados, então, dentro do Sistema de Espaços Livres do distrito, redes entre os pátios escolares, conectando espaços públicos, conectando a escola e a cidade, abrindo possibilidades formativas e possibilidades de lazer para um distrito extremamente denso. Dessa forma, considerando a alta densidade construtiva da Brasilândia, a falta de espaços livres para brincar, a ampla rede de escolas públicas existentes, e a potência de estabelecer maior diálogo entre escola e cidade, se faz importante pensar a abertura dos pátios escolares para uso comunitário no tempo extraclasse. Busca-se construir o entendimento do pátio escolar como um território de passagem entre a escola e a cidade e como uma possibilidade lúdica na cidade.

DESCRIÇÃO Pensar os pátios escolares abertos à comunidade é também pensar em um processo, isto é, não é uma ação pontual ou um conjunto de ações que resolvem-se em si mesmas. Há um primeiro momento de diagnóstico do pátio e, portanto, de pensar em sua qualidade brincante. Isso é feito pensando tanto nas crianças e no seu uso

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cotidiano do pátio quanto nas outras pessoas que serão futuros usuários do espaço. Dessa forma, serão realizadas algumas atividades para entender a visão dos diferentes atores da comunidade escolar sobre o pátio, debatendo suas questões, olhando para suas deficiências e potencialidades e pensando soluções para tal. Ainda, há uma tentativa de ouvir os desejos da comunidade para o espaço. Além de ouvir as pessoas envolvidas, há também uma observação fenomenológica da vivência das crianças no espaço, olhando para seus percursos e formas de ocupação do espaço. A partir dessas diversas vozes e olhares, há uma busca por reunir todas as visões e fazer um mapa coletivo do espaço, pensando estratégias de atuação para melhoria do espaço, seja para as crianças, seja para outras pessoas que irão utilizá-lo. De forma ainda coletiva serão elaboradas propostas de melhoria para o espaço. Ao final, é também co-criado um modelo de gestão para o espaço que pense e considere os diferentes papéis de todos os atores envolvidos. As regras de uso e convivências também são estabelecidas no grupo e todos os resultados compartilhados. Isto é, é um processo que pensa coletivamente a qualidade do espaço, buscando propor mais e diversas oportunidade de brincar ao mesmo tempo que estabelece um modelo de gestão para a funcionalidade do espaço. Visando esses dois objetivos consegue, ainda, engajar a comunidade de forma que a escola se faça mais democrática e todos sintam-se mais pertencentes à seu espaço. É uma forma de se abrir para além de seus muros.

EXEMPLO projeto: Patis Escolars Oberts al Barri local: Barcelona, Espanha responsável: prefeitura de Barcelona

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Há alguns anos, a prefeitura de Barcelona promove o projeto Patis Escolars Oberts (Pátios Escolares Abertos) ao Bairro como medida para otimizar recursos públicos investidos nas escolas, mas, sobretudo, para abrir novos espaços de relações sociais e cívicas onde os são promovidos os valores e atitudes de respeito, cooperação, esforço e responsabilidade das crianças, por meio da brincadeira compartilhada. Busca-se, em suma, por aumentar a equidade no acesso à educação nas horas de lazer. Nesse sentido, o programa visa otimizar o uso das escolas, por vezes subutilizado, com o objetivo de valorizar o seu aspecto educacional e social, facilitando a sua utilização pela população dos diferentes bairros, ao mesmo tempo em que gera segurança, educação e mais espaço com o objetivo de fomentar as lógicas de inter-relação e conhecimento mútuo. Assim, os pátios abertos promovem a corresponsabilidade social e a criação de espaços comuns nos diferentes bairros, especialmente naquelas considerados prioritários. A prefeitura entendia os pátios das escolas como espaços de uso social, como locais de encontro e lazer, podendo ser ator relevante na convivência e coesão social. Inclusive, algumas atividades extracurriculares já se davam nesses espaços. Contudo, a natureza principalmente privada das atividades extracurriculares na Catalunha tinha como consequência direta a exclusão de crianças e jovens de famílias desfavorecidas. Assim, foram pensados e implantados os pátios escolares abertos, que tiveram início entre 2005 e 2006 em 3 distritos da cidade. Deste programa, vistos os primeiros resultados positivos, decidiu-se promover a ferramenta, o que significou a revitalização e abertura de algumas áreas de escolas - um bem público não aproveitado em todo o seu potencial - ao público. Desta forma, acordou-se articular um programa integral da cidade promovido pelo Instituto Municipal da Educação de Barcelona que progressivamente pôs em funcionamento um conjunto de diferentes pátios escolas da cidade. Em 2011, o objetivo já era que todos os bairros tivessem pátios abertos à comunidade. Dessa forma, esses passaram a ficar abertos ao público à tarde, aos finais de semana e nos períodos de férias,

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14. O IMEB contrata uma empresa de atendimento externo, através do procedimento de concurso público, que colabora na gestão e execução do programa sob sua direção.

tornando-se espaços públicos e de lazer para as crianças, jovens e famílias, tenham eles vínculos com a instituição ou não. Buscam atender a necessidade de melhorar a qualidade do lazer e promover a coesão social do território, otimizando os recursos disponíveis. Para a ação, muito se considera o território no qual estão inseridas as escolas. Assim, os territórios com determinada composição socioeconômica obedecem a determinados perfis de pátios, enquanto outros territórios com características diferentes têm pátios abertos com outras morfologias. É a partir disso que, em 2008, foram colocados em funcionamento 13 pátios abertos, optando por um modelo integrado de jogo e lazer que procurou incorporar uma abordagem comunitária. Assim, além de abrir o espaço físico, decidiu-se colocar em funcionamento uma série de atividades esportivas e culturais com o objetivo de complementar a área de lazer gratuita, fomentar mais ações da comunidade e conseguir o envolvimento de todos os perfis de jovens e crianças (diferentes idades, sexo, etc.). Este programa de atividades era oferecido pontualmente, dependendo dos recursos disponíveis em cada momento. Atualmente, sob a direção do IMEB (Instituto Municipal de Educação de Barcelona) e da empresa concessionária 14 que administra o projeto, o programa abarca 71 pátios abertos na cidade e reúne o Consórcio de Educação de Barcelona, ​​os distritos, as escolas, o Mossos d'Esquadra (guarda urbana) e algumas organizações sociais e educacionais do bairro. Com essa distribuição de agentes, tem o compromisso de abrir espaço para brincar no bairro, principalmente nos bairros carentes de espaços públicos para o brincar, ao mesmo tempo em que se busca fortalecer a vinculação dos centros educacionais com o tecido social e familiar dos respectivos bairros. Então, o IMEB e a empresa que gerencia o projeto coordenam e contactam os técnicos do Consórcio de Educação de Barcelona (questões de manutenção), técnicos distritais (calendários e inaugurações de novos pátios), endereços de centros instituições de ensino, as AMPAs (dinamizações e atividades) e, na medida do possível, com entidades e grupos do território com o objetivo de

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que também participem do programa e realizem atividades educativas nos pátios escolares. Cada ‘Pátio Aberto’ tem um monitor (em alguns casos, dois) que é responsável pela gestão e bom funcionamento do pátio: horários de abertura e fechamento, relatório de uso, usuários e incidentes. Ele promove as dinâmicas no espaço e a sua boa gestão, fortalecendo o relacionamento entre todos os usuários (grandes e pequenos) do pátio. Ao mesmo tempo, em todos os pátios é realizada uma série de atividades (de três a quatro vezes por mês). As atividades realizadas são de quatro modalidades: artísticas ou culturais, esportivas, familiares e as maletas pedagógicas. As maletas pedagógicas duram três horas e são uma mala física com material sobre diversos temas: teatro, circo, contação de histórias, esportes, jogos de raquete, jogos de tabuleiro, etc. A mala é deixada no pátio e os usuários pegam o material e o utilizam. Para este tipo de atividade não é necessária uma pessoa para conduzir a atividade. As demais atividades contam com seus dinamizadores. Segundo a prefeitura da cidade, os principais objetivos do programa são: 1. Otimizar o uso das escolas, valorizando seu aspecto educacional e social, possibilitando o uso do pátio entre os grupos e / ou atividades que podem ser realizadas sem interferências, favorecendo a sua inter-relação. 2. Incentivar sinergias com o território imediato de cada cidadão e permitir-lhes usufruir e cuidar do espaço perto do espaço conhecido e poder criar um espaço comum entre todos. 3. Promover o papel dos pátios abertos na dinâmica do bairro, especialmente em bairros de ação prioritária. 4. Aumentar o networking e aprimorar a dimensão colaborativa e comunitária do programa a nível de vizinhança. 5. Promover o papel dos AMPAs (Associações de famílias de alunos) nas diferentes fases de implementação do programa. 6. Incorporar o olhar da criança e do adolescente nas diferentes atividades, tanto na concepção quanto na avaliação e revisão do programa.

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7. Promover relacionamentos intergeracionais e atividades inclusivas que permitam o acesso à dinamismo educacional para todas as crianças e jovens. 8. Incentivar o trabalho dos valores e atitudes de respeito, cooperação, esforço e responsabilidade das crianças e adolescentes. 9. Incentivar a coexistência e a brincadeira por meio da brincadeira compartilhada como fonte de aprendizagem pessoal e coletiva e transmitir valores como cooperação, trabalho em equipe e solidariedade entre todos participantes. 10. Possibilitar a igualdade de oportunidades e eqüidade no acesso à educação no lazer. Como pode ser visto, os objetivos gerais giram em torno de três áreas principais: a abertura de um equipamento públicos para a cidade, promovendo a lógica do "retorno social" do investimento público e favorecendo a revitalização de certas áreas da cidade, principalmente aquelas com menos equipamentos e / ou um maior vulnerabilidade socioeconômica; promover um certo tipo de jogo e atividades para as diferentes faixas etárias de caráter mais participativo e onde determinados valores e atitudes são levados em consideração; e promover o trabalho colaborativo como forma de construir uma rede social e envolver os diferentes agentes afetados pelo tecido social do bairro. Desse ponto de vista, o programa deve ajudar a fortalecer o olhar e o trabalho comunitário que a prefeitura quer potencializar. No início da proposta era o próprio IMEB, por meio de um Plano de Extensão Territorial, que definia o ritmo que seriam implantados e a localização dos pátios abertos. Ele fazia contato com o Distrito e depois com a escola que queria aderir ao programa. Entretanto, nos últimos anos, tem havido muitos pedidos de escolas públicas para adesão ao programa. Essas demandas são informadas ao IMEB ou à empresa concessionário com intermédio do distrito, os quais verificam a viabilidade da abertura do pátio (sua localização, prazo, orçamento necessário, e se toda comunidade educacional está de acordo). Sendo aprovado, há uma explicação mais aprofundada do programa à gestão do centro educacional e é feita uma análise do público potencial do pátio a fim de adequar as diferentes atividades e dinâmicas. Depois de acordados regras, horá-

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rios, dias, dinâmicas, etc, começam os preparativos para a festa de abertura do pátio. Ainda, a concessionária realiza um controle exaustivo das dinamizações (quantas, onde são feitas, quais tipologia, etc.). O objetivo é oferecer uma série de dinâmicas que façam sentido ao público usuário. O monitor responsável por cada pátio possui suas chaves e é responsável por abrir o pátio (uma ordem exaustiva é que as portas do pátio devem permanecer abertas para que os residentes possam interpretar que o pátio está aberto para todos), tornando-se visível por meio de um colete identificador. Se houver dinâmicas, vai colaborar para colocá-las em funcionamento - vai ajudar os monitores -, se não houver atividades, realiza o relato de usos e usuários e se encarrega de controlar para que haja um bom ambiente (gestão do espaço, inter-relação das crianças, etc.). Organizacionalmente, a concessionária mantém reuniões periódicas com os agentes envolvidos no acompanhamento do programa. Eles se comunicam com o IMEB todos os dias e se reúnem uma vez por semana para avaliar o funcionamento do programa, as ações que serão desenvolvidas e os incidentes ocorridos. Por outro lado, o IMEB reúne-se, duas ou três vezes por ano, com os representantes de todos os agentes envolvidos (IMEB, concessionária, bairros e Consórcio de Educação de Barcelona), à exceção dos gestores de todos os centros onde existem pátios abertos. Neste caso, o Consórcio Educativo representa a gestão do centro, agindo como transmissor das ideias e propostas levantadas neste âmbito de reuniões. Um elemento importante a considerar é o estabelecimento do protocolo de manutenção e incidente. Quando há problemas de manutenção ou danos, a direção da escola faz um relatório de manutenção e a equipe pertinente é responsável por reparar os danos em questão.

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70. CAMINHOS ESCOLARES

Eixo estratégico do plano Usos lúdicos em uma cidade brincante

Objetivo do plano 8 - ampliar o diálogo escola-cidade entendendo a escola como pólo centralizador no território

Pessoas destinatárias (x) crianças (x) adolescentes ( ) jovens ( ) adultos ( ) idosos

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Principais agentes implicados • alunos • escolas • Subprefeitura da Freguesia do Ó/Brasilândia • Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano • Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras


Indicadores de Monitoramento

Ações Concretas

I. Possibilidade de ir e vir

• definição de 3 escolas para implementação piloto da proposta

• quantas crianças passaram a ir sozinhas para escola

• estudo dos pontos de interesse nos raios de 2km das escolas

• quantas crianças gostam de ir sozinhas para a escola

• mapeamento junto às escolas do local de moradia dos alunos

• em que medida as crianças se sentem mais pertencentes ao espaço II. Autonomia • em que medida as crianças se sentem mais confiantes para irem sozinhas para a escola III. Aumentar a segurança • em que medida alterou a percepção de segurança dos usuários • em que medida diminuiu o número de acidentes

• pesquisa de deslocamento e mobilidade com os alunos das escolas • definição dos pontos de interesse nos entornos escolares • definição dos pontos de origem das rotas dos caminhos escolares • definição dos trajetos dos caminhos escolares • pesquisa para entender o que as crianças mais gostam e o que menos gostam de irem a pé para a escola • levantamento de agentes do território para apoio • incorporação dos objetivos do caminho escolar nos conteúdos curriculares • desenvolvimento de catálogo de atividades para serem realizadas nas escolas que dialoguem e construam sobre o tema • envolver a comunidade escolar no projeto • requalificação de calçadas no itinerário • diminuição da velocidade no itinerário • implementação de novas faixas de pedestre • implementação de sinalização com informações na altura dos olhos das crianças e indicando a existência do caminho escolar • desenvolvimento (preferencialmente participativo com as crianças) de elementos lúdicos para serem implementados no caminho • implementação de elementos lúdicos • aumento do tempo dos semáforos para pedestre PUB • o plano

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OBJETIVO DA PROPOSTA A proposta tem como principal objetivo oferecer às crianças a possibilidade de ir e vir a pé de suas escolas ou centro educativos, sozinhos ou em grupo, de maneira autônoma, saudável, segura e sustentável, fazendo com que a rua seja um espaço seguro, acolhedor e formativo e colocando as crianças enquanto protagonistas do projeto.

JUSTIFICATIVA E CONTEXTO O trânsito apresenta-se como elemento que restringe a mobilidade e independência das crianças na cidade, por apresentar vias de tráfego constante e de alta velocidade (Ward, 1978). Segundo Tonucci (2015, p. 88), “[...] a mobilidade dos adultos aumentou muito e, paralelamente, a mobilidade das crianças reduziu-se até quase desaparecer, em grande parte por causa dos riscos introduzidos pelos automóveis dirigidos por seus pais”. Estes riscos são geralmente assumidos pelos adultos como perigosos às crianças, que por sua vez são consideradas incapazes para resolver problemas relacionados a tais questões. De acordo com Ward (1978) e Tonucci (1996), os pais têm a ideia de que, na rua, as crianças estão expostas e vulneráveis a acidentes. Ao mesmo tempo, esses autores também afirmam que caminhar a pé pelas ruas ou andar de bicicleta são experiências vitais, e evitar que crianças utilizem esses meios de locomoção não descarta seus perigos, pois a “[...] não familiaridade com os meios de transporte e seus riscos pode ser tão letal quanto uma grande exposição a eles” (Ward, 1978, p. 125, tradução nossa). Ainda, de acordo com Quintáns (2014), um estudo dinamarquês, realizado com 20.000 crianças de 5 - 19 anos de idade, mostrou que caminhar ou pedalar aumenta a concentração das crianças até o fim do período de aulas, na execução de tarefas complexas, comparando-as com as que vão a escola em veículo motorizado.

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Além disso, acredito que os percursos diários até a escola bem como as experiências em seu entorno são também uma primeira vivência na cidade e de pertencimento a ela. Pode ser rotina para a criança desde pequena percorrer as ruas e sentir as experiências que a cidade traz. Utilizar transportes públicos, entender a lógica de atravessar a rua, ver diferentes construções, perceber diferentes relações e manifestações étnicas, filosóficas, culturais e raciais. Essas experiências cotidianas garantirão o uso da cidade, mesmo que mínimo. É também a possibilidade de pensar “as áreas de pedestre como uma política urbana integrada para desenvolver cidades vivas, seguras, sustentáveis e saudáveis” (GEHL, 2013, p. 6). Ainda nesse sentido, defende-se, muito relacionado ao que propõe Careri (2013), o caminhar também como uma forma de criar paisagens, de intervenção urbana. É a maneira através da qual pode-se compreender o espaço e preenchê-lo de significados. O caminhar, mesmo não sendo a construção física de um espaço, implica a transformação do lugar e dos seus significados. A presença física do homem num espaço não mapeado - e o variar das percepções que daí ele recebe ao atravessá-lo - é uma forma de transformação da paisagem que, embora não deixe sinais tangíveis, modifica culturalmente o significado do espaço e, consequentemente, o espaço em si, transformando-o em lugar (CARERI, 2013, p. 51).

Para além disso, melhora o conhecimento do bairro, o reconhecimento das situações de perigo, a eleição dos caminhos mais seguros e agradáveis; a formulação de propostas de melhorias e participação na sua execução. Ajuda a incrementar a capacidade de adaptação a situações novas, a aprender comportamentos novos adequados às circunstâncias reais, a alcançar hábitos mais saudáveis para si e mais sustentáveis para a cidade (BARCELONA, 2010). E, a possibilidade de elementos lúdicos ao longo desse caminho, assim como faz Freiburg, na Alemanha, é a possibilidade de desfrute para crianças, isto é, de tornar essa vivência na cidade agradável.

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É bastante interessante pensar os itinerários escolares em diálogo com a escala urbana como parte de uma estratégia maior para conexão entre os grandes espaços abertos e verdes urbanos, locais muito favoráveis também ao brincar, evidenciando-o como eficaz ferramenta para melhoria ambiental e social da cidade (IRRIBANE, 2015). Ao mesmo tempo, estudar a vida das crianças nas cidades desde o ponto de vista de sua mobilidade resulta essencial para aproximarmo-nos de suas experiências urbanas, entendendo os lugares que realmente habitam, e não apenas ficando com os lugares que esperamos encontrá-los.

DESCRIÇÃO Os Caminhos Escolares constituem-se enquantos itinerários que partem de pontos de interesse do distrito e/ou bairro, como equipamentos, passando pelas vias mais utilizadas pelos alunos e que seguem em direção a escolas, criando uma rede de conexões no entorno próximo (cerca de 2km) que permita que as crianças possam ir a pé e, muitas vezes, sozinhas para a escola. Tais caminhos devem ser acessíveis, seguros (no amplo sentido da palavra) e agradáveis, permitindo a simples ligação entre dois pontos e, ao mesmo tempo, gerando algum tipo de interesse em seus usuários. Devem ser pensadas em colaboração com a sociedade civil, a comunidade educativa, os alunos, os pais, os professores, etc. Portanto, cada caminho escolar deve ser desenvolvido em um entorno concreto. Para trabalhar esses caminhos, é importante que possuam sinalizações verticais e horizontais específicas, desenhos de ruas pacificadas, baixa velocidade dos carros, de forma a atuar no espaço público garantindo o espaço para as pessoas. Essa ação sensibiliza a cidadania através do trabalho com as escolas e as famílias; promove melhores hábitos de acesso a escola; potencializa o transporte público, a pé

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ou de bicicleta, o que pacifica as ruas e as garante como espaços mais possíveis de se estar e brincar; impulsiona ações que aumentem a segurança (BARCELONA, 2010). Desde um ponto de vista da mobilidade, melhora a coesão social do bairro e a recuperação do espaço público para todos. Apesar de ser uma proposta que parte das crianças, a prioridade são todos os pedestres, uma vez que atua-se sobre os caminhos pontualmente, mas também sobre o bairro como um todo. Portanto, deve-se pensar medidas que garantam a segurança viária, reduzam os acidentes e fomentem o respeito entre os usuários de todos os modelos de deslocamento. A cidade é o melhor cenário para sensibilizar a cidadania desde a proximidade. Assim, pensa-se também em responsabilizar a comunidade como agente educativo, começando pelos agentes mais significativos. Pode-se, então, articular mecanismo de coordenação com o professorado para que os objetivos do caminho escolar possam ser incorporados nas áreas curriculares e compartilhar essas atuações com as famílias, para que possam manter e complementar os mesmos objetivos em todo tempo extraclasse, que também é educativo. Além disso, favorecer a participação de outros agentes sociais interessados, como por exemplo comércios ou casas que se prontifiquem a ser ponto de apoio ao longo do trajeto escolar. Assim, caso alguma crianças precise de algo, esses lugares estarão identificados e capacitados para esse apoio. Pode dizer que grande parte dos esforços para a concepção dos caminhos escolares consiste em estabelecer alianças e aprender a trabalhar em conjunto. Despertar na criança a vontade de percorrer os trajetos, podendo brincar e aprender simultaneamente, é também fundamental. Assim, devem ser pensadas intervenções lúdicas nos caminhos para torná-los atrativos para a apropriação da cidade pelas crianças.

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Ainda, pode ser combinado com a proposta do ônibus a pé, especialmente para as crianças menores.

EXEMPLO projeto: Caminho Escolar de Paraisópolis local: São Paulo, Brasil responsável: Secretaria Municipal de Educação Um exemplo brasileiro bastante significativo e inspirador para essa proposta é o premiado projeto Caminho Escolar de Paraisópolis, primeira iniciativa brasileira com o objetivo de tornar as áreas escolares mais seguras em bairros vulneráveis. Foi realizado em 2011, em parceria com a Secretaria Municipal de Habitação, no contexto das obras de urbanização que haviam sido iniciadas na comunidade em 2006, e impactou 8.500 crianças (de Ensino Fundamental I e II) diretamente e, indiretamente, toda a comunidade. O projeto buscava construir a autonomia dos estudantes no caminho entre a casa e a escola, aumentando a segurança para que ele pudesse ir a pé. Era também uma maneira de garantir aos alunos seu direito à cidade ao mesmo tempo em que construía uma relação de respeito pelo espaço público enquanto espaço de aprendizagem. A iniciativa também foi importante para conscientizar a comunidade de Paraisópolis sobre a necessidade de gerar e manter condições que garantam a segurança e a convivência social no trajeto da comunidade escolar; o desenvolvimento de novas experiências educativas relacionadas ao uso e à manutenção dos espaços públicos, tanto dentro das salas de aula, como no entorno da escola; e a melhoria das condições de infraestrutura urbana e de trânsito nos trajetos mais utilizados pela comunidade escolar. A proposta envolveu duas áreas distintas da comunidade, abarcando, no total, 9 escolas e foi implementada em duas fases: na primeira, foram escolhidas duas escolas onde se apresentou um projeto, realizou-se uma aproximação dos hábitos e caminhos dos alunos, destacando seus problemas, e um catálogo de atividades que poderiam

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ser realizadas na escola. Na segunda buscou-se envolver a comunidade e as outras escolas. Em um levantamento realizado após a implantação, 85% dos estudantes que participaram contaram ir para a escola sozinhos. Na maioria das cidade que implementam Caminhos Escolares, a busca é por incentivar que as crianças se desloquem a pé para as escolas. Entretanto, em Paraisópolis, dado a grande quantidade de crianças que já chegam aos colégios caminhando, o desafio era tornar o trajeto mais seguro. Assim, no segundo semestre de 2012, as atividades foram focalizadas na educação em segurança viária, tema abordado nas escolas, nos espaços de saúde e pelas lideranças comunitárias. Além disso, foi identificada uma rua com grande trânsito de crianças e condições urbanísticas deficientes e que foi indicada para receber obras do projeto de urbanização municipal. O projeto foi detalhado e desenhado de acordo com as premissas do caminho escolar: priorização do pedestre, restrição dos espaços para carros, oferta de lugares de convívio e maior acessibilidade. O Caminho Escolar de Paraisópolis tem um componente importante de participação social, uma vez que os centros escolares são envolvidos na proposta, na gestão e implementação dos projetos desenvolvidos com os alunos, em parceria com a equipe externa coordenadora.

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Termino o PUB reforçando suas potências, muitas das quais já foram abordadas mas que entendi importante aparecerem uma vez mais enquanto síntese e fechamento. Começo por dizer que entendendo que ele não é unânime ou totalizante, isto é, que não dá conta de todas as questões da cidade - e nem o pretende - e, inclusive, não aborda muitos conflitos e desigualdades. Entretanto, o enxergo como uma possibilidade para olhar e repensar algumas das questões que me movem e, especialmente, um convite para sonhar sonhos possíveis. Uma possibilidade, como defendi logo no início do trabalho, de repensar a cidade, imaginá-la diferente, mais adequada a todos, incluindo as crianças. Uma cidade mais sensível, uma cidade dos cuidados e das curas, na qual todos os cidadãos valham mais. A possibilidade de sonhar uma cidade brincante, o que, de um jeito ou de outro, é banhar-me de sonhos e utopias, os quais me movem e, assim, entendo-os como possíveis por levar à ação e à criação de novas possibilidades. Assim, vejo muito da potência do Plano nas mesmas questões que me motivaram a sonhá-lo: a infância e o brincar. A infância como princípio e principiando, desde outro lugar, uma outra possibilidade de cidade: não a que exclui, segrega, fecha os olhos, mas a que escuta, acolhe, cuida. Infância como forma de experienciar o tempo, de habitar o presente, de se apresentar como uma presença curiosa, duvidante, atenta, inquieta, perguntadora, expectante. A infância como uma forma que outorga curiosidade, atenção, sensibilidade, alegria, vitalidade. É valorizar a potência criativa e curiosa da vida em qualquer idade. E, assim, uma cidade infantil, não por ser uma cidade da infância,

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mas por devir uma infância da cidade, uma cidade outra, menina, nascida da dúvida, curiosidade e ausência infantil de certezas 15. A infância por ser uma força reinventora do mundo, especialmente através do brincar.

15. Texto inspirado no de Walter Kohan, que faz a relação da infância com a educação, a qual traduzi para a relação da infância com a cidade. (KOHAN, 2019, p. 215).

E o brincar, por sua vez, como ato do imaginar capaz de transformar, capaz de concretizar o sonhado. De abrir a vida à possibilidades de que tudo possa ser (de maneira diferente de como é). O brincar pela possibilidade de recriar o mundo no espaço potente da imaginação, que carrega a individualidade, mas também as potências e crenças do coletivo. Pela possibilidade de deparar-se com o mundo e enxergá-lo diferente, recriá-lo, imaginá-lo. O brincar é o que ainda se reserva como sonho, potência, desejo e, portanto, o que ainda está envolto em mistérios, em possibilidade inéditas. É uma força afirmativa, sonhadora, criadora, transformadora. Portanto, entendo que os dois, a infância e o brincar, possibilitam sonhar com uma nova perspectiva de cidade e explorá-la a partir de um novo parâmetro. Sonhar para imaginar e realizar, para criar novas possibilidades e manter vivos os desejos. O desejo de infantilizar a cidade, no sentido de preservar as potências da infância, cultivando uma intimidade potente com uma infância não cronológica, a qual nos dá a condição de continuar a viver transformando o que parece como dado definitivo. E, então, de construir uma cidade brincante para trazer curiosidade, inquietação, o gosto por perguntar, por não temer sonhar, por querer crescer, criar, transformar. É isso que entendemos como cidade brincante: um desejo, um gosto, uma sensibilidade para as forças da vida, como a curiosidade, o sonho, a transformação. A infância e o brincar “contêm a mais afirmativa forma de liberdade como criação de uma vida coletiva carregada de possibilidades, sonhos e utopias" (KOHAN, 2019, p. 185). Talvez o fazer projeto e o projetar a cidade pudessem carregar em si uma alma mais brincante, que nos permite criar e construir novos mundos e sonhar com novas possibilidades.

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