Revista INFORME Ciência ê Têcnologia C on h e c i m e n to s e m fr on te i r as U ma c a t e g o r i a d e c u r s o s v i r t ua i s , d e n í v e l u n i v e r s i t á r i o , d a d o s d e g r a ç a p e l a w e b e q u e c o s t uma m a t r a i r mi l h a r e s d e a l u n o s sã o o s M o o c s. P á g . 6
O Sono na Adolescência É saudável? Os pais devem se preocupar? Pág. 4
Astronomia a ciência que estuda o universo, confrontando teorias. Pág. 8
Arte e Tecnologia Contra a discriminação e o Preconceito. Pág. 13
Idosos aderem ao mundo Digital. Pág. 14
Mulheres na lut a por Igualdade. Pág. 18
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Informe Expediente Ano 2 - n.º 3 - Março 2014 Direção de Redação Editoração Executiva
Ao Leitor Hoje é comum dizer que vivemos na era da ciência, da tecno-
Editoração Eletrônica
logia e da informação. O mundo atual apresenta constantes
Ana Katia C. Reis
transformações que surgem todos os dias. Essas mudanças exi-
Douglas Lemos Patrícia B. de Oliveira
gem da sociedade competências para entender a ciência e adquirir novas formas de pensar. Estamos interligados pelos email, YouTube, Twitter, Blog, Facebook, uma realidade virtu-
Helgair Aguirre
al onde a informação é passada de forma instantânea. Há 30
Eliane Ferreira
anos atrás seria inimaginável conversarmos e vermos alguém do outro lado do planeta por um telefone móvel, hoje em dia é
Colaboração Elenice Andersen
tarefa das mais simples. A forma de se comunicar quebrou barreiras e fronteiras, aprender a lidar com essas constantes mudanças e acompanhar o ritmo acelerado pelo qual “as coisas” caminham tem sido um desafio à parte à sobrevivência humana. Neste contexto nos pareceu importante criar este veículo digital de divulgação científica e tecnológica preocupada em transmitir o discurso científico de uma forma simples e de fácil entendimento. A revista Informe, através do mundo digital criou a possibilidade de levar o conhecimento à um público leitor ilimitado, com a proposta de estreitar laços e diminuir fronteiras, levando à todos leitores assuntos ligados a ciência e a tecnologia contribuindo na construção de uma sociedade bem informada.
Ana K.C. Reis 2
Sumário
4 . Artigo de Opinião - O Sono na adolescência 6. Educação sem fronteiras 8. Um pouco de astronomia 12. A arte na luta contra o preconceito 14. Idosos na rede 18. Igualdade de direitos entre homens e mulheres: uma realidade ? 3
Artigo de Opinião O Sono na Adolescência Numa época
em que a função biológica
do sono e sonhos era desconhecida, Freud teorizou que os sonhos refletiam a experiência inconsciente e era um guardião do sono. Para ele, os desejos reprimidos são, particularmente, aqueles associados ao sexo e à hostilidade, os quais eram liberados nos sonhos quando a consciência era diminuída. Ele dizia, por exemplo, que os sonhos representam a satisfação de desejos. “Na linguagem da neurociência, significaria que sonhos ligam fragmentos de memórias de forma a simular expectativas futuras de recompensa e punição mediadas por dopamina” (A dopamina é um neurotransmissor, ele é um mensageiro químico que ajuda na transmissão de sinais no cérebro e outras áreas vitais), explica o neurocientista Sidarta Ribeiro, que é um dos maiores responsáveis no Brasil por pesquisas nessa área. “Tudo indica que o sonho tem a função de simular compor-
“Tudo indica que o sonho tem a função de simular comportamentos, tanto os que levam a recompensa (os bons), como os que levam a punição (os pesadelos).
tamentos – tanto os que levam a recompensa (os bons) como os que levam a punição (os pesadelos). Portanto, sua função seria evitar nição vam “Hoje
ações que resultem em pue procurar aquelas que leà satisfação do desejo.” sabemos que a reverbera-
ção (reflexo) das memórias, que Freud chamava de ‘restos’ do dia, acontece durante o sono profundo. Durante o sono REM, quando os sonhos acontecem, são ativados os genes que promovem a fixação das memórias”, diz Sidarta. Somente agora, no entanto, com os progressos da neurociência, compreende-se muito mais seu papel real na vida cotidiana – a prática e a emocional.
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O sono
Entender o que se passa no cérebro adolescente é na adolescência é uma ca-
racterística bem comum dos nossos jovens. Nessa fase da vida odiamos quando alguém nos acorda pela manhã. As mães, geralmente, são responsáveis por essa árdua tarefa, a qual se repete todos os dias antes da escola. O que mais deixa o adolescente feliz é quando chega o fim de semana, pois assim poderá dormir até mais tarde. O que devemos parar para pensar é porque isso ocorre? É normal? É saudável?
fundamental para orientá-lo e educá-lo. Não é porque seu cérebro apresenta uma estrutura chamada amígdala - que não é a da garganta - que está aumentada e mais ativa nesta fase e que é responsável pelas reações mais emocionais em detrimento das reações mais racionais, que devemos permitir que o jovem pegue o carro de seus pais na surdina da noite. Ou ainda que não acorde para a primeira aula porque ficou na internet - que dá muito mais prazer - até altas madrugadas.
Entre as principais recomendações para uma boa higiene de sono para a criança e o adolescente temos:
Tentando entender esse fenômeno tão corriqueiro na vida dos jovens fiz
1) estabeleça horários regulares para dormir e despertar;
um levantamento, baseado na neuro-
2) evite ativi-
ciência, pois é a ciência que explica o funcionamento do cérebro, para explicar o porquê desse fenômeno tão comum na vida de nossos jovens. O neurocientista Russel Foster, professor da Universidade de Oxford, em recente artigo na New Scientist, diz que pesquisas comprovam que os jovens precisam de mais tempo de sono que os adultos para se recomporem.
“As horas do sono humano, como a de outros mamíferos, mudam conforme a idade. Assim que a puberdade começa, a hora de dormir e acordar fica mais tarde”
Os resultados,
explica Russel, têm
a ver com a própria biologia humana. “As horas do sono humano, como a de outros mamíferos, mudam conforme a
idade. Assim que a puberdade começa, a hora de dormir e acordar fica mais tarde”, afirma o pesquisador, que ressalta que essa tendência continua até os 19,5 para as mulheres e 21 para os homens.
dades que estimulam a vigília após o jantar como internet, games, TV, celular e discussões; 3) estabeleça uma rotina de relaxamento na hora de deitar como banho morno, leitura e alongamento; 4) exercício físico pode ajudar o sono desde que realizado antes das 17 horas; 5) na medida do possível o quarto deve ter temperatura confortável, ventilação, escuridão e silêncio (tire a TV do quarto); 6) a cama só para dormir (fazer tarefa, assistir TV e jogar games na cama pode atrapalhar o sono); 7) uma soneca após uma manhã inteira de aulas pode ajudar a consolidar a memória declarativa (relativa a fatos, nomes, acontecimentos, etc.); 8) assegure exposição adequada à luz natural 5 para o ajuste natural do relógio biológico (ciclo sono-vigília). Ana Katia Reis
Educação sem fronteiras A educação é cada vez mais importante para as pessoas, corporações, países, para o mundo como um todo. Com as tecnologias cada vez mais rápidas e integradas, o conceito de presença e distância se altera profundamente e as formas de ensinar e aprender também. Hoje, as escolas, em geral, estão despreparadas para acompanhar o ritmo das mudanças no mundo do trabalho e de atender às expectativas profissionais concretas, quanto mais para antecipar mudanças. As
tecnologias
na
educação também se multiplicam e se integram; tornam-se mais e
mais audiovisuais,
instantâneas e abrangentes. Caminhamos para formas fáceis de ver, ouvir, falar, escrever a qualquer momento, de qualquer lugar, a custos cada vez menores (embora altos para
Agora estão entrando mais firmemente em cursos a distância, principalmente de especialização e de graduação, além dos de extensão, de curta duração. Uma categoria de cursos virtuais, de nível universitário, dados de graça pela web e que costumam atrair milhares de alunos são os Moocs, cursos online dirigidos a um público amplo (na sigla inglesa para Massive Online Open Course), esses cursos têm se multiplicado em ritmo acelerado pela rede nos últimos anos, eles visam oferecer, para um grande número de alunos, a oportunidade de ampliar seus conhecimentos num processo de coprodução, eles foram criados recente para a área de educação à distância e normalmente não exige pré-requisito, mas também não oferecem certificados de participação.
a maior parte da população). As universidades e escolas demoraram em aceitar e incorporar a educação a distância (EAD), se preocuparam em ir criando uma cultura própria. Começaram atendendo a áreas academicamente problemáticas como
São cursos sobre os mais diversos assuntos, lecionados por professores de todas as partes do mundo, completamente abertos ao público e disponíveis gratuitamente, sem limite de número de participantes.
atender a alunos reprovados ou que apresentavam maiores dificuldades, principalmente quando vindos de outras instituições. Depois passaram a organizar cursos parcialmente a distância, algumas disciplinas em áreas problemáticas como estatística, metodologia de pesquisa ou disciplinas comuns a vários cursos como Sociologia, Filosofia, Língua Portuguesa.
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Os cursos funcionam da seguinte maneira: Os docentes se organizam e gravam aulas, muitas vezes interativas, adaptadas e atualizadas para aproveitar as particularidades do ambiente virtual. Depois, essas aulas são liberadas para alunos do mundo inteiro através da internet. Muitos MOOCs são altamente dinâmicos, abrindo espaços para tirar dúvidas, discussão online, tarefas de casa, provas e tudo mais que se pode esperar do ensino presencial. Além disso, o fato de contarem com um número muito maior de participantes que numa sala de aula tradicional amplia bastante o debate e a diversidade de feedback (comentários) relativo aos assuntos estudados. Os fóruns de discussão potencializa a aprendizagem dialógica (troca de ideias), contrastando com a forma de ensino monoO Veduca é uma plataforma totalmente inovadora de lógica (pessoal) que ainda perdura em muiaprendizado online. Aqui você encontra conteúdo de ensino superior a internet, previamente selecionado e orgatas instituições tradicionais.
“
nizado por áreas de conhecimento. Registrando-se, você pode fazer buscas nas legendas, fazer anotações referenciadas na timeline das videoaulas, acompanhar sua evolução, testar seus conhecimentos e obter certificados de conclusão de cursos.
”
7 Ana Reis
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9 Douglas Lemos Quadros
Entrevista
C a
O Prof.º Guilherme possui graduação em ( licenciatura?) Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1998), mestrado em Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2000) e Doutorado em Física pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2003). Fez Pósdoutorado no Observatoire de la Côte dAzur (França) e no INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Atualmente é professor adjunto da Universidade Federal do Pampa. Possui trabalhos nas áreas de física nuclear, astrofísica, gravitação, ensino de física e ensino de astronomia. Trabalha com Divulgação da Astronomia e também é coordenador do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências.
“ é P a t m c a t p c z c
- Como se define a astronomia? “É a ciência que estuda o espaço, os astros, como se formam, como evoluem, desde pequenos planetas até grandes galáxias e principalmente fazem essa relação com o que temos de útil e prático aqui na Terra”.
d v r
- Como surgiu seu interesse pela Astronomia?
“ t c o d n d
“No mestrado e no Doutorado devido as pesquisas e aos experimentos em física teórica e em física nuclear. Em ambos projetos tinha uma aplicação em astronomia, o que me fez aprofundar os estudos na área. Um acontecimento que marcou e contribuiu para o interesse pela astronomia foi na infância. Aos 9 ou 10 anos vi a passagem do cometa Halley, eu tinha uma luneta simples mas pude ver, naquele momento eu sofria de uma doença crônica respiratória, estava a algum tempo em casa, recluso. Embora eu não tivesse naquela época noção da gravidade, aquela visão foi marcante, eu estava em um período delicado. Lembro até hoje a visão que tive naquela noite. Talvez tenha sido apenas um início, já o estudo aprofundado, foi mesmo no mestrado e no doutorado”.
m o d
- Como surgiu o Projeto de divulgação da Astronomia? “Foi iniciado por outro professor da Unipampa, Fabrício Ferrari, que atualmente trabalha na Furg. Foi ele quem tomou conhecimento de um edital do CNPQ para divulgação da Astronomia, em 2009. Nesse ano, foi decretado pela ONU como sendo o “Ano da Astronomia” em comemoração aos 400 anos de observações e relatos de Galileu Galilei. Então o professor me convidou para que juntos enviássemos um projeto e foi quando adquirimos um telescópio e começamos a fazer as palestras de divulgação da astronomia”. - A astronomia é uma das ciências mais antigas. Até hoje se se confunde astronomia com astrologia, talvez porque os povos mais antigos atrelavam uma a outra. Qual a explicação para isso? “Os mais antigos não separavam astronomia da astrologia, quando digo povos antigos não quer dizer que seja a milênios atrás, o que se fazia a pouco tempo era uma coisa só. Galileu mesmo sobrevivia vendendo mapas astrais. Com a evolução da ciência a divisão ocorreu, mas por uma questão de crenças pessoais algumas pessoas ainda defendem a união da astronomia e da astrologia”.
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“ m s t t s p e q g r t e t d “ s p u c c
Como é essa relação das pessoas com o astro atrelado a astrologia?
“Está diretamente ligado a crenças pessoais, o que é bastante delicado de se trabalhar nas palestras. Porque nosso objetivo não é derrubar crenças de alguém, queremos apenas levar a informação. É um trabalho delicado porque o objetivo é passar a informação que julgamos correta e respeitar a opinião, a crença das pessoas. As vezes me perguntam qual é a relação entre astronomia e astrologia, eu digo, vou te explicar o que diz a astronomia, astrologia não posso te dizer porque não pertence a minha área de conhecimento. Algumas vezes costumo brincar dizendo: se cortar o cabelo na lua cheia ajudasse no crescimento, eu não seria careca”. (risos).
- Quais foram os grandes avanços que tiveram desde o início dos primeiros povos que observavam e faziam relatos da astronomia? Como isso refletiu na prática, no cotidiano da sociedade?
“Os antigos gregos dominavam algumas ferramentas que eram essenciais para fazer a astronomia necessária naquela época, que era basicamente a geometria, por meio desse cálculo eles eram capazes de determinar algumas coisas. Influenciou também nas leis da Filosofia, sem dúvida foi um povo que se destacou”.
- Grandes descobertas foram feitas na astronomia. Nesse processo de evolução, quais foram os reflexos dessas descobertas na vida prática das pessoas?
“A evolução levou a alguma coisa, direta ou indiretamente, por exemplo, hoje em dia, não sobrevivemos sem satélite, temos satélites para monitoramento do tempo, monitoramento de crescimento urbano, para telecomunicações, tudo isso é realizado a base de satélite. Só se pode colocar um satélite no espaço porque a gente sabe como é a órbita dele. Outro exemplo, são as primeiras imagens da astronomia que eram feitas em filmes, as primeiras câmeras digitais, eram na verdade aparelhos desenvolvidos para se usar nas observações da astronomia. Com o tempo essa tecnologia tornou-se de custo acessível e passou a ser comum a aquisição de câmeras digitais. Outro feito importante foi a criação de um site da NASA (Agência Nacional Americana) chamado “spinoff” (http://spinoff.nasa.gov/) que divulga os resultados das pesquisas de novas tecnologias que podem ser úteis no dia-a-dia. A cada ano é lançado um boletim. O que acontece é que muitas vezes você precisa desenvolver uma tecnologia para uma coisa e as vezes ela é mais útil para outra”.
- Quais tecnologias poderia mencionar que passaram por esse processo do uso para ciência astronômica para a vida social? “Alguns exemplos que eu cito nas palestras. A caneta que usamos para escrever, se virarmos para cima, ela não funciona, as canetas tinteiro de antigamente só funcionavam reto, para baixo, para assim a gravidade puxar o líquido, e só tinha isso na época em que o homem estava indo para o espaço. Então a caneta esferográfica que hoje usamos e é uma marca reconhecida com o nome Bic, foi desenvolvida para o homem escrever no espaço, claro, já havia o lápis que poderia fazer os registros desses profissionais, porém, o risco de perder as informações era grande, apenas uma passada de dedo no papel apagaria tudo. O que não acontece com o registro feito a caneta. Outro exemplo, a comida desidratada, para que pudessem ter menos peso. O monitoramento do sol, para sabermos a respeito da radiação na Terra, esse estudo é importante na medicina para prevenir a sociedade de doenças de pele”. - Qual o público alvo do projeto de divulgação da astronomia e qual o local de realização das palestras? “É um trabalho aberto ao público, no início era realizado no Palacete Pedro Osório em Bagé-RS, e por uma questão de otimizar o tempo e por razões de logística, atualmente as palestras são realizados no auditório da universidade – Unipampa. O lado ruim disso é que a maior parte do público é composto por acadêmicos, uma vez que a localização é distante do centro da cidade, quando era central, naturalmente algumas pessoas passavam na rua, viam o cartaz e assistiam a palestra”. O professor comenta que já levou o telescópio para observação nas escolas de Bagé e região, exemplo, na cidade de Santiago-RS, para alunos do Ensino Médio, ele foi acompanhado de seus bolsistas. - Como é visto a astronomia dentro da escola? “É extremamente importante para o desenvolvimento intelectual, por exemplo, o que contribuiu para o desenvolvimento e destaque da sociedade grega, foi o estudo da astronomia. A forma como eles observavam o mundo, a riqueza de detalhes, a atenção, isso é algo que cada vez mais deixamos passarem nossa sociedade atual, 11o ritmo de vida acelerado muitas vezes não nos permite observar o céu, as estrelas, acabamos deixando a observação e a ciência”.
A arte na luta contra preconceitos assaram p s a l e sd de “Muita elatos r r a h n i la encam esde bu d ( s a i violênc té estu a a l o c a es lying n nesses a d a e s ba o pros) e produz m é b m ta relatos alguma m o c s e çõ ilustra ssa deo p e u em q mensag r para a t r e l a re inuncia de sofr s e õ ç a itu . essas s diário” mento
Evelyn Queiroz é uma artista engajada, tanto no movimento feminista como nos direitos humanos igualitários em geral, ela é o nome e o rosto por trás da personagem Negahamburguer, que vem se popularizando nas redes sociais pela forma como retrata a realidade física das mulheres através de seus desenhos.
Usando a internet, como não poderia ser diferente, Evelyn nos respondeu algumas perguntas e explicou um pouco de como a internet é usada por ela. I-Qual o papel da internet para o movimento feminista? O movimento feminista não é apenas pelos direitos femininos, mas de gêneros minoritários em geral, como isso é feito na rede, quais as estratégias? E- Atualmente, a internet funciona como um mecanismo para divulgação de causas, e seu uso produz um engajamento bem rápido com efeitos positivos e fortalecendo a união entre pessoas com mesmo interesse, como no caso do movimento feminista. Pela internet as mulheres podem denunciar situações de opressão e também compartilhar informações importantes para outras mulheres. Outra situação que vem se desenhando é a divulgação do que é o próprio feminismo, esclarecendo de diversas maneiras o que vem a ser a causa, sua importância e combatendo definições pejorativas sobre o movimento. Não estou envolvida em uma ONG ou coletivo diretamente, mas acredito que meu trabalho 12 sirva de suporte para muitas mulheres, inclusive, já foi utilizado em matérias, blogs e mídias especializadas.
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I- Poderia nos explicar em que consiste o teu trabalho na rede?
E- Sou uma artista e a internet foi um meio que facilitou a divulgação do meu trabalho. Sempre quis fazer algo que fosse mais do que um trabalho artístico, mas que também tivesse uma atitude política, com isso criei uma personagem (a Negahamburguer) que incorpora aspectos rejeitados pela sociedade, estimulando a aceitação do próprio corpo mesmo que fora de padrões de beleza. Muitas mulheres se identificam com meus desenhos, com as mensagens que passo por meio das ilustrações e isso me aproximou ainda mais de questões importantes como o combate a violência sexual ou moral. Muitas delas passaram a encaminhar relatos de violências (desde bullying na escola até estupros) e baseada nesses relatos também produzo ilustrações com alguma mensagem que possa denunciar e alertar para essas situações de sofrimento diário. Acredito e vejo que essas ilustrações são uma forma também de oferecer um conforto e carinho para tantas mulheres que passam por essas agressões. ...Atualmente, Evelyn tem se dedi-
cado a elaboração de um livro, que nasceu do projeto “beleza real” que visa resgatar nas mulheres a sua real beleza, incentivando a aceitação, deixando de lado os padrões impostos pela moda e pela mídia... 13
Patrícia B. de Oliveira
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Idosos em Rede
A
tê pouco têmpo a têcnologia nao êra coisa para pêssoas da têrcêira idadê, mas uma pêsquisa dêsên-
volvida pêla profêssora Mê. êm Educaçao Karolinê Guêdês dê Olivêira mostra quê a inclusao digital pêrmitê aos idosos dêscobrir suas proprias potêncialidadês diantê do procêsso dê ênvêlhêcimênto. Tal pêsquisa intitulada "Inclusao Social ê Aprêndizagêm dê Adultos ê Idosos no Cibêrêspaço" êsta vinculada a UFRGS (Univêrsidadê Fêdêral do Rio Grandê do Sul) ê financiada pêlo CNPQ (Consêlho Nacional dê Dêsênvolvimênto Ciêntífico ê Têcnologico) têndo como oriêntadora a profêssora Dra. Liliana M. Passêrino. A profêssora Karolinê conta quê na UFRGS êxistêm varios trabalhos voltados para a inclusao dê pêssoas com nêcêssidadê êspêciais, mas o sêu ê voltado para a inclusao digital dê idosos têndo êm vista o grandê aumênto dêsta parcêla da populaçao sêgundo o IBGE (2011). Sêu trabalho busca analisar a êstrutura ê organizaçao dos procêssos dê inclusao digital para quê haja apropriaçao dê novas praticas culturais mêdiadas por têcnologias êm rêdê com idosos. 14
“atualmente, percebe-se uma tendência acentuada no interesse do idoso pela inclusão digital. Em consequência disto, o desenvolvimento das novas práticas culturais referente ao universo digital surge em função da pressão social por se manter atualizado e, também, como forma de aproximação da família e amigos de gerações mais novas"
A pêsquisa êsta basêada na êtnografia - Estudo dêntro do ambiêntê dê pêsquisa ê da nêtnigrafia- dêntro do ambiêntê virtual. O Cibêrêspaço utilizado foram primêiramêntê Orkut (2010) ê êm sêguida o facêbook (2011). Quando olivêira chêgou a UFRGS êstê projêto ja êstava êm andamênto têndo êncontros sêmanais, dêpois passou a sêr quinzênal. Nos êncontros buscavam-sê formas dê sê apropriar da informatica para uma mêlhor qualidadê dê vida. Os idosos prêcisavam do uso da informatica por difêrêntês intêrêssês, alguns quêriam mantêr contato com algum parêntê quê mora longê, outros para rêêncontrar amigos, êtc.
A pesquisa foca no desenvolvimento de praticas culturais (novas) ê dê lêtramênto. As êxplicaçoês êram bêm basicas dêsdê procêdimêntos simplês dê como ligar o computador, a postura quê sê dêvê têr ao usar as rêdês sociais ê outras mais complêxas, como compartilhar ê/
Os êncontros rêalizavam-sê dê acordo com a dêmanda dos idosos, com a nêcêssidadê dêlês.
ou postar um vídêo.
Oliveira: "Por exemplo, se no encontro
gêns, mas diz “êssa aprêndizagêm dê-
antêrior o intêrêssê dos participantês êra
manda têmpo ê ê procêssual”
sabêr o quê êra um ê-mail ê como funcionava, êssa êra a pauta do proximo êncontro. Isso êra significativo para êlês, nao êra uma aula imposta"
Dê acordo com Karolinê a pêsquisa durou dois anos ê gêrou muitas aprêndiza-
Olivêira êxplica quê apênas dois participantês foram acompanhados, idêntificados como sujêito A ê sujêito Z. 15
A- Não tinha a prática de usar a informática com frequência, não tinha o habito construído. Preferia usar telefone e carta,
não tinha nenhum indício de prática voltada para as TICS. Em 2010, A teve sua primeira manifestação no ambiente virtual Orkut e em 2012 apesar de tímido, já havia indícios de práticas (evolução), no final da pesquisa ele passa em torno de meia hora
Através desta pesquisa tive a oportunidade de perceber que não há limites para a aprendiza-
(por dia) no bate-
gem. Pois quando motivados em
papo. “Ele sentiu-
grupos os sujeitos sentem-se em-
se
poderados e passam a adquirir
parte
deste
contexto.” Z- Tinha computa-
novos saberes e novos hábitos através das novas tecnologias. (Oliveira)
dor, mas não interagia, não sabia fazer uso das ferramentas que o computador podia lhe oferecer, como não tinha amigos na rede o contato era face a face. Em 2012, era ele que alimentava a comunidade e até hoje alimenta postando alguma coisa interessante, falando sobre os direitos dos idosos ou postando mensagens de conforto, carinho.
16
A professora Karoline se emociona ao falar de todo o processo da pesquisa que foi permeado por muita afetividade
e,
principal-
mente, em falar dos resultados. Segundo ela o sujeito
A,
se
considerava
"burro" que não sabia e não iria aprender,
mas
aprendeu muito e até sua alto estima melhorou, passou a ir aos encontros mais arrumado, de paletó. Tornou-se mais comunicativo e amigo. Já o sujeito Z, como diz a professora gando",
"chegou
motivado.
cheSabia
que aquela ferramenta iria lhe trazer outras possibilidades de aprendizagens.
Agora “O sujeito A entrou em nosso grupo com a imagem deteriorada. Contu-
ele quer apren- do, gradativamente está imagem foi sendo modificada. Ao final da der a fotografar.
pesquisa, observou-se que a autoestima melhorou e o mesmo encontrava-se mais participativo na rede”. “O sujeito Z, no início da pesquisa já demonstrava um perfil atuante, participativo e com certo domínio do computador. Ao final da pesquisa percebeu-se que os Letramentos encontram-se em construção buscando sempre novos aprendizados e novos horizontes para se aventurar”. (Oliveira)
Eliane Ferreira
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Igualdade de direitos entre homens e mulheres: uma realidade ?
E
ntre as discriminações existentes na sociedade, uma das mais antigas é a sofrida pelas mulheres. Elas, ainda hoje, são vítimas de discriminação e estão no topo das preferências, seja em comerciais de cerveja, em comerciais de sapatos, sempre esbanjando sensualidade. A mulher símbolo de desejo, tem que ser a mais bonita e sempre aos moldes de uma sociedade que cada vez mais visa a projeção do que a realidade dos fatos, negando toda diferença e capacidade de auto conhecimento, até mesmo tentar manter um casamento com casos de violência. Ligado a isso, existem preferências diferentes por parte da mulher, nas profissões, nos esportes e na forma como se relacionar com a sociedade. Lutando cada vez mais para conseguir manter o papel que deseja, a mulher se enxerga num movimento antigo e importantíssimo: o feminismo, movimento social que defende igualdade de direitos e status entre homens e mulheres, que devem ter a liberdade de decisão garantida sobre suas carreiras e modos de vida. Interessante notar que o movimento feminista ganhou forma na Revolução Francesa, tendo como norte a exigência das mulheres de trabalharem no serviço público e nas forças armadas, porém, como na época, em 1792, não havia habilidade de pensamento no congresso francês, as mulheres foram suprimidas pelo terror e houve esquecimento do que haviam dito, foram silenciadas. 18
Quase meio século depois toda a Europa presenciava o pedido das mulheres por melhores condições, por salários compatíveis aos dos homens e o direito ao voto. No século XIX, com a industrialização, as mulheres estavam trabalhando em oficinas e reivindicavam condições e salários semelhantes aos dos homens, com isso, os homens passaram a concorrer com elas, pois os industriais preferiam contratá-las para pagarem salários menores. Isso pode ter ocasionado o que chamamos agora de “herança cultural”: estamos culturalmente presos a uma sociedade patriarcal e que aumenta ou elimina a concorrência entre os sexos. Atrelados a outras questões sociais, os movimentos feministas se envolveram, por exemplo, com o abolicionismo nos Estados Unidos, e no século XX, no Reino Unido, ativistas foram presas e condenadas por lutarem pelo direito ao voto, começando aí, uma série de fatos históricos que talvez expliquem que a luta contra a sociedade que venda os olhos para as diferenças não termina tão rápido. Não obstante, temos no Brasil um fato que hoje se consolidou como uma das maiores leis empreendidas: a Lei Maria da Penha. Caso extremo de violência doméstica a vítima que dá nome à lei lutou por mais de 15 anos na justiça e no governo para ser ouvida, depois de vários atentados e nenhuma medida foi tomada pelo órgãos competentes. A violência contra a mulher e contra a criança, justifica toda a conscientização e tentativas de erradicação de lares opressores.
A seguir, uma entrevista com a Advogada, ativista, mãe, esposa, filha e Coordenadora da Coordenadoria Municipal da Mulher do município de Bagé, Lélia Lemos de Quadros. Revista Informe: A luta pelos direitos da mulher despertou seu interesse desde muito cedo. A senhora poderia contar como isso aconteceu? Lélia: Bem, eu fui criada por uma mulher muito lutadora, que era a minha avó, pessoa por quem eu sempre tive muito respeito, muito carinho. Ela passava para a gente, enquanto mulher, enquanto netas e filhas, uma força, uma determinação e uma coragem muito grandes de enfrentar os problemas da vida mesmo naquele período e onde morava que era em São Domingos, num lugar muito distante e que quase não acesso aos meios de comunicação não fosse comum, aquilo era nato dela. Isso passou para nós, e também, naquele espaço onde a gente vivia, naquela pequena comunidade, observávamos muitos casos de violência, já violência contra a mulher. E que naquele período, final dos anos 60, começo dos anos 70, recém estava começando o movimento feminista.
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Revista Informe: Podemos considerar que a sociedade já enxerga a mulher como o ser humano que, além de tantas coisas, provém o sustento da casa? Lélia: Eu acredito que sim. Porque nós hoje temos mulheres em todos os tipos de segmentos da sociedade, temos essa consciência, que hoje somos vistas também como provedoras do sustento da família, mas infelizmente ainda ganhamos menos pelo mesmo trabalho feito pelos homens. Essa mesma sociedade que nos enxerga como provedoras, nos discrimina ao oferecer-nos menores salários, condições inferiores; e se for comparar com a mulher negra, a diferença é muito grande. A sociedade melhorou muito, porém, os dados comparados mostram que a mulher tem dupla, tripla jornada. Uma pesquisa feita constatou que o tempo de trabalho em casa da mulher, comparado ao do homem, é o dobro: a mulher dispensa 35 horas de trabalho doméstico por semana, já o homem dispensa 15 horas. Em pleno século XXI a gente continua tendo coisas de homem, coisas de mulher, trabalhos de homem, trabalhos de mulher. Assim como a questão das profissões, nós observamos que as profissões de cuidado são as mais ocupadas por mulheres, por exemplo, Assistência Social, 98% são mulheres, Pedagogia, Enfermagem, Letras é um curso que é muito ocupado por mulheres. Avançamos muito, nós enquanto mulheres, com toda essa luta que temos, mas ainda tem muito para sermos totalmente iguais e plenamente livres.
Coordenadora Municipal da Coordenadoria da Mulher, Lélia Teresinha Lemos de Quadros
“Outra coisa que é muito importante que se diga é que nós lutamos pela Lei Maria da Penha, e que não é uma lei contra o homem, ela é uma lei contra a violência e o nosso trabalho não é no sentido de destruir os lares, de fazer com que as mulheres se separem dos seus maridos, é no sentido de fazer com que a violência termine”. 20
Revista Informe: A senhora como a pessoa à frente da Coordenadoria da Mulher de Bagé ativista em lutas e projetos ligados à melhoria da qualidade de vida da mulher pode relatar avanços nesse aspecto? Lélia: Com certeza, acredito que nós temos um ápice de avanço das políticas públicas para as mulheres, a partir da criação da Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres, em 2003. Porque antes o que se tinha de políticas para as mulheres eram delegacias e casas abrigo, mas era só. Não havia a consideração da mulher nessa sua condição feminina, com todas as peculiaridades, não se tinha um olhar voltado para a mulher dessa forma, como aconteceu com a criação da Secretaria de Políticas Públicas para as Mulheres. Começamos a ter conferências municipais, nacionais e todas as mulheres desses vários rincões do país são ouvidas nas conferências. A última que nós fizemos foi com as mulheres rurais e quilombolas. Fizemos a I Conferência Municipal com as mulheres apenadas, tratamos das questões geracionais, das mulheres idosas, temos um grande número em nossa cidade. Na conferência nacional conseguimos reunir a voz das mulheres de todo o país para que pudéssemos elaborar o 3º Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. A partir desse trabalho a Secretaria Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres desenvolve e aporta recursos para as regiões e demandas mais solicitadas durante a conferência.
Além disso, possibilitou que os estados tivessem suas secretarias e organismos de políticas para as mulheres, que os municípios criassem organismos de políticas para as mulheres e que se tenha espaços onde se discuta políticas públicas que venham em benefício da vida das mulheres, à saúde da mulher e ao enfrentamento à violência contra a mulher. Temos muito no que avançar, mas avançamos consideravelmente, com certeza. “Outra coisa que é muito importante que se diga é que nós lutamos pela Lei Maria da Penha, e que não é uma lei contra o homem, ela é uma lei contra a violência e o nosso trabalho não é no sentido de destruir os lares, de fazer com que as mulheres se separem dos seus maridos, é no sentido de fazer com que a violência termine. E eu sempre digo: nós temos vários casos em que a mulher saiu do ciclo de violência, se separou, foi ser dona da sua própria vida, do seu destino e conseguiu seguir sua vida com seus filhos. Ao mesmo tempo temos casos em que o homem foi encaminhado para tratamento, em que eles continuaram com sua família, com seus filhos e que a partir de uma intervenção aquela família foi reestruturada, as crianças ganharam um novo lar, um lar sem violência e reestruturaram suas vidas sem estarem separados. 21
Isso é muito importante que se diga, pois às vezes a gente ouve “mas não tem o João da Penha?”. A nossa luta não é essa e o Feminismo não é isso: a nossa luta não é menos nem mais, a gente só quer direitos iguais, a gente não quer destruir lar de ninguém. Graças a Deus tenho meu lar, amo muito e é um lar sem violência.”
mas é um em quantos? Quantas mulheres negras juízas nós temos? Temos o absurdo do extermínio dos jovens negros, porque em nosso país, principalmente no Rio Grande do Sul se observa que mais da metade dos jovens mortos são negros. Então existe sim a discriminação contra o negro, contra a negra, contra a mulher. É um fato e deve ser muito bem trabalhado, ter um olhar muito atento de nós gestores, das políticas públicas para as mulheres e das políticas públicas como um todo. Tratar com desigualdade os desiguais, através das cotas, através de políticas públicas afirmativas, específicas para os negros e para as mulheres, todos somos iguais perante a lei, temos que tratar desigualmente as desigualdades para que se atinja essa igualdade verdadeira que tanto se deseja.
Revista Informe: É importante que as políticas públicas compreendam questões como o racismo? Falaste das mulheres negras e a educação contra o racismo. Lélia: Nosso trabalho é feito para as mulheres como um todo. Ouvimos muito “mas não existe discriminação contra as mulheres, muito menos contra os negros, os negros é que se discriminam”, não é verdade. Em um estudo que fizemos em determinados lugares, não direi o nome do município por uma questão de ética, em que as crianças, as pessoas negras que chegam ao shopping, o gerente avisa o segurança para cuidar o grupo que chegou, simplesmente por serem negros. Eles são acompanhados por serem negros, pobres, por não estarem bem vestidos. Nós temos hoje o mi- Centro de Referência da Mulher – Município de Bagé, prédio que abriga a Coordenadoria da Municipal da Mulher nistro do STF negro,
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Revista Informe: Também se nota a vontade de todas as mulheres em participar, esse querer participar e lutar. Lélia: Sim, de todas as mulheres! Nós temos aqui no município a orientação do gestor do Executivo que é o trabalho com todas as mulheres, por todos os direitos e que as políticas para as mulheres devem estar no mesmo patamar em que estão as políticas da saúde, da segurança e da educação. A família é o núcleo da sociedade, o primeiro lugar em que a gente convive. Quem maltrata a mulher, maltrata a família toda. Então, mudando a vida da mulher, conseguiremos mudar a vida da nossa sociedade. Revista Informe: A senhora apoia a Marcha Mundial das Mulheres, Mulheres da Paz, Mulheres em Situação de Prisão, etc. Poderias enumerar benefícios para a senhora, ou seja, para o ativista? Lélia: É uma realização pessoal muito grande. Quanto mais se trabalha e quanto mais se conquista, mais feliz a gente fica. O trabalho é árduo, trabalhamos noite e dia, ficamos muito tempo longe da família (o que não é fácil), sente saudade dos filhos e do marido, mas é gratificante, mesmo assim. Com as mulheres em situação de prisão, além da tentativa de transformar a vida delas, temos vários projetos. Nós fomos criticadas, fiz uma campanha de arrecadação de livros para o presídio, para montar uma biblioteca para as mulheres e hoje elas tem uma biblioteca!
Eu lembro que quando comecei a campanha alguém me disse “tu não acha que é perda de tempo não estar te ocupando com tantas mulheres que estão apanhando aqui fora, te preocupar com as que estão presas?”. Mas eu não vejo dessa forma. A mulher apenada já esta cumprindo sua pena, pagando de alguma forma o que deve à sociedade. A vida particular dessas mulheres ou o que fizeram não nos interessa, o que nos interessa é a modificação, o que a gente pode fazer que mude a vida da mulher e das crianças aqui fora. Porque até nisso a mulher é discriminada: o homem quando vai preso a mulher vai visitá-lo, leva os filhos, a família acompanha, não é sempre, mas acontece. Agora, quando a mulher é presa, ela acaba sendo abandonada pela família e pelo marido. Além disso, a mulher tem os filhos que aqui fora ainda precisam dela. Mesmo estando lá dentro, se a mulher tem algum ganho, tudo que ela ganha é enviado aos filhos que estão aqui fora. De alguma forma, tentamos incluir essas mulheres, não vou dizer que a gente consiga incluílas na sociedade, mas tentamos fazer com que ao sair, elas saiam transformadas internamente.
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O vínculo que elas tem na sociedade é com a Coordenadoria da Mulher. Com relação às Mulheres da Paz foi um trabalho extremamente gratificante, era um projeto inédito no país, então, não se tinha nenhuma referência de outros municípios, fomos criando e construindo juntamente com a empresa de consultoria e uma equipe que foi contratada. Essas mulheres tiveram capacitações sobre a Lei Maria da Penha, os Direitos da Criança, Estatuto do Idoso, puderam conhecer toda a rede de atendimento no município, todos os organismos e mecanismos que usamos para fazer o atendimento. O foco das Mulheres da Paz eram os jovens em situação ou em vulnerabilidade à violência. Com o projeto Mulheres em Construção, projeto voltado à capacitação de mulheres para a construção civil, foi uma quebra de paradigma, pensamos sempre em um trabalho voltado para as mulheres, que modificasse realmente a vida delas. Nosso público alvo eram as mulheres chefes de família e as mulheres vítimas de violência que eram atendidas por nós, porque sentimos nessas mulheres a falta de auto-estima, a falta de autonomia, essa dependência econômica muito grande, o que muitas vezes faz com que essa mulher continue nesse ciclo de violência. Foi quando decidimos capacitar essas mulheres a partir de um encontro em Canoas - RS.
Observamos que o que estava transformando a vida das mulheres era a construção civil. Então, pensamos que se em Canoas está dando certo, aqui não pode dar? Trouxemos a Bia, que é maravilhosa e que é da ONG Mulheres em Construção. Foi um projeto que trouxe resultados grandiosos. Trabalhamos muito a questão dos Direitos da Mulher, a violência doméstica, a autonomia dessas mulheres, a importância de elas serem donas de suas próprias vidas, e podemos observar mudanças gradativas. No dia da formatura, muitas delas já estavam empregadas! Lembro de uma, de tantas que eu atendi, que me chamou a atenção porque ela era uma mulher triste, cabisbaixa, na aparência se via o sofrimento. por nós.
“Com relação ao machismo e o preconceito da sociedade, é cultural, além do preconceito que sofremos com os homens, sofremos por parte de nós mulheres também, que muitas ainda tem essa visão machista, sexista e patriarcal, uma herança cultural. Por isso devemos estar diariamente nos policiando, e cuidando contra esse pensamento e atitude.” 24
Ela chegou aqui encolhida, chateada, magoada. Então, quando começamos a selecionar as mulheres para a construção civil, ela não veio e eu pensei: “mas aquela mulher é que está precisando dessa intervenção”. Nós fomos até ela, ela fez a capacitação e no final da capacitação a gente pode perceber a transformação no rosto dessa mulher. Ela foi uma das mulheres que permaneceu trabalhando em uma das empresas que contratou as que foram capacitadas por nós. E eu lembro das intervenções em lugares que trouxessem benefício à sociedade. O trabalho prático era feito em locais que necessitavam muito, por exemplo, na Vila Vicentina, foi feito pintura, piso, reboco. Preciso ressaltar o orgulho de dizer que o BIG foi construído pelas mãos de muitas mulheres. No período em que a empresa estava se instalando em Bagé, assinou um termo de compromisso conosco, se comprometendo de que na construção iria absorver a mão de obra qualificada para trabalhar na construção civil.
. Fazemos
um trabalho com as mulheres
rurais, pelo motivo de que na zona rural a dificuldade é muito grande, quando o marido sai para trabalhar no campo na madrugada, elas ficam em casa e se estraga o chuveiro ou tem que trocar uma lâmpada, precisavam esperar o marido voltar. . Essa
capacitação em peque-
nos consertos as mulheres tem a possibilidade de aprender e não depender mais disso. Esse projeto é binacional, pois envolve as mulheres do Brasil e do Uruguai. Infelizmente, de sete municípios, somente três possuem Coordenadoria da Mulher, mas o único que tem uma rede minimamente constituída é Bagé: temos o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher, Coordenadoria da Mulher, Centro de Referência da Mulher, Casa Abrigo para mulheres vítimas de violência, o Cartório da Mulher e em breve receberemos a Delegacia da Mulher. Revista Informe: A Internet é uma tecnologia que pode ser chamada de aliada na luta contra a violência e o machismo?
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Lélia: Ah, com certeza auxilia, muita coisa mudou. É sim uma aliada, mas infelizmente, tanto para o bem quanto para o mal. Com a explosão das redes sociais, semana passada tivemos a morte de uma menina por ter sido divulgado nas redes sociais um vídeo do relacionamento sexual dela, ceifando a vida de uma mulher por uma brincadeira de mau gosto dessas. Nesse sentido, eu considero que a Internet não está ajudando. Por outro lado, e bem melhor do que isso é o alcance e a efetividade que as ações tem através da Internet. Caso aconteça algo aqui em Bagé o país todo pode ter acesso, pois tudo ou quase tudo é transmitido em tempo real hoje em dia. Podemos construir muitas coisas, pois a web une pessoas e as conscientiza, fazer um trabalho melhor em todo o país, com certeza.
Simone de Beauvoir - figura emblemática do feminismo e da luta pela igualdade entre os sexos. Ela pregava seu ideal de independência feminista e igualdade.
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Informe Indica:
Livros: Sobrevivi, posso contar, de Maria da Penha Fernandes (2010) O útero é do tamanha de um punho, de Angélica Freitas (2012) Um teto todo seu, Virginia Woolf (1928) Filmes: Cidade do silêncio, de Gregory Nava (2006) Nunca mais, direção de Michael Apted (2002) Terra fria, de Niki Caro (2005) Volver, direção de Pedro Almodóvar (2006)
Reportagem
Helgair Aguirre
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Informe - Revista Informativa de Ciência e Tecnologia Grupo PET Letras - Unipampa Bagé RS
Iniciativa:
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