Danielle Alves Lessio. Llamado Expositores

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MEMÓRIA E ESPAÇO URBANO A INTERVENÇÃO NO PATRIMÔNIO INDUSTRIAL COMO MÉTODO DE REVITALIZAÇÃO DA MOOCA Danielle Alves Lessio Aluna de graduação – dez/2015 (trabalho final de graduação – TFG) danielle.lessio@gmail.com

Universidade Presbiteriana Mackenzie Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

SÃO PAULO, 2017


RESUMO A reflexão proposta nesta pesquisa consiste no debate sobre a reutilização de patrimônios históricos do período industrial de São Paulo para a reconfiguração de um espaço urbano fragmentado. Bairros que surgiram atrelados ao desenvolvimento industrial sofreram, a partir do final do século XX, com seu esvaziamento e abandono. Suas estruturas raramente são reconhecidas e tratadas como ícones da história da cidade, mantendo-se esquecidas e alvos da especulação imobiliária. A escolha da Mooca como recorte espacial se dá pela sua importância histórica. Com este estudo de caso é possível representar diversos outros espaços que sofreram metamorfoses semelhantes (a industrialização e então o esvaziamento) e que hoje são áreas obsoletas, terrenos vagos, com grandes potenciais de regeneração por meio da memória. O projeto urbano de desenvolvimento sustentável é aqui apresentado como alternativa que beneficía a paisagem urbana e sua história por meio da promoção de novas funções em patrimônios industriais.

PALAVRAS-CHAVE: patrimônio industrial, terrain vague, desenvolvimento sustentável, reutilização, memória

INTRODUÇÃO O recorte espacial foi escolhido por se tratar justamente de um bairro da cidade de São Paulo onde está inserida a primeira linha férrea paulista. A Mooca foi um importante polo industrial que, por volta de 1980, sofre com as mudanças no método de produção fabril e com a implantação de novas malhas rodoviárias. Estes processos desencadearam o início do esvaziamento dos bairros operários, e a transformação nos edifícios industriais em estruturas obsoletas (KÜHL, 1998). O esquecimento das estruturas industrias se torna ainda mais problemático ao pensarmos na desarticulação da malha urbana. Por ser cortado pela linha férrea e por diversos viadutos novos o bairro se encontra entre diversas barreiras que agravam a abandono de seu território e o esquecimento de sua importância para a história da cidade. Lotes, galpões e armazéns se converteram em áreas semi-aproveitadas, degradadas, componto espaços improdutivos que promovem cada vez mais a descaracterização do espaço (LEITE, 2002; TITTON, 2012). Atualmente, a Mooca sofre também com outro processo: o da especulação imobiliária. O mercado vê nesse local precário uma oportunidade para construção de condomínios sem que exista diálogo com as preexistências. Esse tipo de processo gera locais genéricos que não suportam sua antiga história. Neste contexto, a pesquisa aborda o conceito de desenvolvimento sustentável, que evidencia a importância do patrimônio como ferramenta de requalificação e de suporte da memória coletiva. Sendo assim, os grandes lotes industriais da Mooca e seu espaço subutilizado podem ser recursos para a regeneração por meio de projetos de desenvolvimento sustentável que atribuem novas funções para


antigos edifícios. Assim, sua memória e história não é esquecida e o crescimento do bairro ocorre em conjunto com o combate à especulação imobiliária desordenada.

Fig. 1: Galpões na Mooca, 1947

Fig. 2: Mooca atualmente

JUSTIFICATIVA O contexto estudado de esvaziamento industrial pode ser observado não só em São Paulo como em diversas cidades ao redor do mundo que se estruturaram no por meio de bairros operários (como acontece em cidades na França, Inglaterra e nos Estados Unidos). A partir do final do século XX, com o crescimento rodoviário, esses territórios foram abandonados e fadados ao esquecimento, fragmentando a malha urbana (KÜHL, 1998). A pesquisa se faz relevante no cenário atual pois a história e o passado industrial dessas estruturas são ameaçados pela especulação imobiliária, que vê estes espaços como grandes potenciais para demolição dos antigos edifícios e implantação de condomínios sem identidade. Neste contexto se faz necessário compreender a importância de manter alguns dos edifícios industriais icônicos e que representam o desenvolvimento da cidade. Ao fornecer para estas estruturas um novo uso, permitimos que o espaço cresça e volte a dialogar com o seu entorno com uma função resignificada, porém carregando sua identidade (CANCLINI, 1994).


Fig. 3: Pichações na Mooca

Fig. 4: Condomínios na Mooca OBJETIVOS A pesquisa busca compreender como edifícios industriais, que recentemente passaram a ser caracterizados como um tipo de patrimônio cultural, são capazes de se relacionar com os moradores de seus bairros e atuar como ferramenta mediadora para projetos de requalificação (TOLEDO, 1996). Através do estudo histórico das atividades industriais e pós-industriais de São Paulo é possível observar as consequências provocadas por estas mudanças intensas do uso do território. Assim a pesquisa pretende analisar o desenvolvimento da cidade e entender a importância da inserção de novos usos em permanências, reaproveitando áreas existentes e combatendo o esquecimento da história. A compreensão do conceito de memória coletiva e de afeto é também de grande importância para evidenciar a relevância destes edifícios e para estudar como a proposta de reciclagem de recursos é uma maneira de revitalizar o local sem que sua história seja perdida, mantendo sua essência perante à sociedade.

MARCO CONCEITUAL A história da Zona Leste e da orla ferroviária, contada por Regina Meyer em A Leste do Centro, juntamente com o conceito de desenvolvimento sustentável e novas funções em estruturas preexistentes de Carlos Leite foram um estudo urbanístico que, associado com questões relacionadas


à memória e história fundamentam o estudo. Autores como Benedito Lima de Toledo, Nestor Garcia Canclini e Ulpiano Meneses entendem o espaço através de sua identidade e seu passado, reforçando as questões abordadas na pesquisa. Outros autores como Beatriz Kühl complementam o conceito de patrimônio histórico industrial. Já Rem Koolhaas em seu texto A Cidade Genérica fala, em contraposição, sobre ausência de identidades e patrimônios em um territórios.

METODOLOGIA Foi criado um processo metodológico para responder as questões levantadas: primeiramente a montagem do corpus bibliográfico contendo teses, livros e artigos referentes ao tema em conjunto com documentos e desenhos técnicos do bairro da Mooca no período industrial, encontrados no Arquivo Histórico de São Paulo. Após esta coleta de informações surge a produção de mapas indicando o cenário atual do espaço e a comparação com os conceitos e diretrizes da Operação Urbana Consorciada Mooca-Vila Carioca, para uma análise urbana do local e de seus patrimônios. Por final, foram analisados três casos em que foram dadas novas funções para edifícios industriais – a Cinemateca Brasileira, o SESC Pompeia e o Museu da História do Estado de São Paulo, sendo possível notar neles a revitalização do entorno, a lembrança da história de seus edifícios e a memória afetiva.

RESULTADOS Coletando o resultado desses três estudos foi possível notar que, através do incentivo dado pela Operação Urbana, é possível criar estratégias projetuais que abordem a refuncionalização de edificações para o despertar da memória afetiva do bairro, trazendo uma identidade e relacionamento com o espaço capaz de combater alguns aspectos da especulação imobiliária.

CONCLUSÕES Para que exista um relacionamento afetivo entre homem e espaço, a cidade não pode ser pensada como uma produção em massa, apenas uma especulação do mercado. Esse tipo de abordagem fragiliza o território e gera um abandono da identidade. A cidade deve se rearticular de maneira cautelosa, renovando seus significados e espaços mas mantendo seus patrimônios, que podem ser revitalizados através de novas funções. Quando a globalização atua em conjunto com a reutilização se torna possível que áreas como a Mooca mantenham-se coesas, sem fragmentos, e dotadas de memória. É possível notarmos a necessidade não apenas da simples conservação e do restauro, mas do desenvolvimento dos patrimônios com novos usos, integrados à cidade.


Fig. 5: Mapa criado para projeto urbano final

Fig. 6: Projeto de novo uso proposto para galpão na Mooca

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KÜHL, Beatriz Mugayar. Arquitetura do ferro e arquitetura ferroviária em São Paulo: reflexões sobre a sua preservação. São Paulo: Ateliê Editorial, 1998. LEITE, Carlos; AWAD, Juliana di Cesare Marques. Cidades sustentáveis: desenvolvimento sustentável num planeta urbano. Bookman, 2012. LEITE, Carlos. Fraturas urbanas e a possibilidade de construção de novas territorialidades metropolitanas: A orla ferroviária paulistana. Tese de doutorado. São Paulo: FAUUSP, 2002 MARCON, Mariana. Patrimônio arquitetônico da industrialização. A intervenção contemporânea no antigo Matadouro de São Paulo. Dissertação de mestrado. São Paulo: FAU-USJT, 2012. MENESES, Ulpiano Bezerra de. Identidade cultural e patrimônio arqueológico. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, n.20, p. 33, 1984. MESENTIER, Leonardo Marques de. Patrimônio urbano, construção da memória social e da cidadania. Vivência, n.28, p.167, 2005. MESTRINER, Gustavo Luiz. A cidade compacta e os projetos urbanos contemporâneos: inventário analítico de estudos de caso em vazios urbanos em áreas centrais. Dissertação de Mestrado. São Paulo: FAU Mackenzie, 2008. MEYER, Regina Maria Prosperi; GROSTEIN, Marta Dora. A leste do centro: territórios do urbanismo. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2010. OLIVEIRA, Liana Paula Perez. A capacidade de dizer não: Lina Bo Bardi e a fábrica da Pompéia. Dissertação de Mestrado. São Paulo: FAU Mackenzie, 2007. PEIXOTO, Nelson Brissac. Paisagens urbanas. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2004. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Associação Comercial de São Paulo – Distrital Mooca: Bairros do Tamanduateí. São Paulo, 2014. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/biblioteca_digital/ operacoes_urbanas/index.php?p=173214> Acesso em: 04 de abril de 2015. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Diretrizes para projeto: Operação urbana Mooca – Vila Carioca. São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www.habitacao.sp.gov.br/casapaulista/downloads/ppp/diretrizes_projeto_operacao_urbana _mooca_vila_carioca.pdf> Acesso em: 15 de março de 2015. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Estudo de impacto ambiental: Operação urbana consorciada MoocaVila Carioca. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/biblioteca_digital/o peracoes_urbanas/index.php?p=173214> Acesso em: 04 de abril de 2015. PREFEITURA DE SÃO PAULO. Subprefeitura da Mooca: Operação Urbana Consorciada: Bairros do Tamanduateí. São Paulo, 2014. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/desenvolvimento_urbano/biblioteca_digital/


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LISTA DE FIGURAS Figura 1: Galpões na Mooca, 1947 (Fonte: <https://catracalivre.com.br/sp/muito-maissaopaulo/indicacao/sao-paulo-em-1947-vista-pela-revista-life/> Acesso em: 11 de novembro de 2015) Figura 2: Mooca atualmente (Fonte: <ht tp://www.habitacao.sp.gov .br/casapaulista/downloads/ppp/diretrizes_projeto_operacao_urbana_mooca_vila_carioca.pdf> Acesso em: 15 de março de 2015). Figura 3: Pichações na Mooca (Fonte: Autora) Figura 4: Condomínios na Mooca (Fonte: Autora) Figura 5: Mapa criado para projeto urbano final (Fonte: Autora) Figura 6: Projeto de novo uso proposto para galpão na Mooca (Fonte: Autora)


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