NĂşmero 4 | Ano 4 | Novembro 2015
Fragmentos do Cotidiano: Cidade & Universidade
27 PRÊMIOS REGIONAIS -Melhores Trabalhos do Sudeste (Intercom/Expocom) 2009 – na UFRJ: Categoria: “Áreas emergentes”; Modalidade: “Fotografia Artística”; Categoria: “Jornalismo”; Modalidades: “Radiojornal”, “Fotografia” e “Produção em Jornalismo Informativo”; 2010 – na UFES: Categoria: “Jornalismo”; Modalidades: “Jornal-Laboratório Impresso”, “Jornal Impresso” e “Fotografia”. Categoria: “Produção Editorial e Transdisciplinar”; Modalidades: “Blog”, “Website” e Produção multimídia”. 2011 – na Fecap/SP Categoria: “Jornalismo”; Modalidades: “Jornal-Laboratório Impresso”, “Radiojornalismo”; Categoria: “Produção Editorial e Transdisciplinar”; Modalidades: “Fotografia”, “Website”. 2012 – na UFOP Categoria: “Jornalismo”; Modalidade: “Jornal-Mural”. Categoria: “Produção Editorial e Transdisciplinar”; Modalidade: “Website”. 2013– na UNESP Categoria: “Jornalismo”, Modalidade: “Jornalismo Literário”; Categoria: “Produção Editorial e Transdisciplinar”; Modalidades: “Fotonovela”, “História em Quadrinhos”. 2014– na UVV/ES Categoria: “Jornalismo”; Modalidades: “Produção de Audiojornalismo e rádio”; “Jornalismo literário” e “Jornal Mural”; Categoria: “Produção Transdisciplinar”; Modalidade: “Fotonovela”. 2015– na UFU/MG Categoria: “Jornalismo”; Modalidades: “Documentário em rádio”;Categoria: “Produção Editorial e Transdisciplinar”; Modalidades: “Charge”; Categoria: “Rádio, TV e Internet”; Modalidade: “Ficção em áudio e rádio”.
8 PRÊMIOS NACIONAIS – Melhores Trabalhos do Brasil (Intercom/Expocom)
2008 – Categoria “Coletivo”, Trabalho: “Café Com Papo”; 2009 – Categoria “Radiojornal”, Trabalho: “De mala e cuia”; 2010 – Categoria “Jornalismo”, Trabalho: “Outro Olhar Viçosa”; Categoria “Produção Editorial”, Trabalhos: “Site Laboratório” e “Território Livre”. 2011 – Categoria “Jornalismo”, Trabalho: “Coisas de Minas”. 2012 – Categoria “Jornalismo”, Trabalho: “Jornal O Expresso” 2013 – Categoria “Produção Editorial”, Trabalho: “O Caminho do Alimento”. 2014 – Categoria “Jornalismo”, Trabalho: “Flanando na Praça”; Categoria “Produção Editorial”, Trabalho: “Fotonovela Vitrine”. 2015 – Categoria “Rádio, TV e Internet”, Trabalho: “Vivendo a Agroecologia”.
Editorial Coordenação e Edição Geral do Projeto Prof. Ricardo Duarte Gomes da Silva (MTB-DRTPE 3123) Assistente de Edição Bruna Guimarães Edição de Fotografia e Revisão Geral Laene Mucci Daniel Foto de Capa Guilherme Queiroz Design Gráfico Diogo Rodrigues Redatores Isadora Canela e Gabriel Novaes (8º período); Robson Filho, Mateus Pereira, Larissa Abreu, Jorge Oliveira , Ana Carolina Leão, Laira Carnelós, Núbya Fontes, Patrícia Freitas , Thalison Oliveira, João Negrelli, Ricardo Almeida, Leonardo Gonçalves , Ana Clara de Assis, Camila Santos, Ingrid Carraro, Guilherme Pimenta, Gustavo Pires, Robson Filho, Mateus Pereira, Larissa Abreu e Jorge Oliveira (6º período); Sérgio Felix, Isabela Lopes, Leonardo Pereira, Maria Clara Epifania, Ana Eduarda Ferreira, Isac Godinho, Sayonara Ribeiro, Ellen Ramos, Carla Teixeira, Marina Gontijo, Leonardo Coelho, Aline Soares, Malena Stariolo, Mariana Barbosa e Tábatha Valetim (4º período).
Nesta Edição, a Revista traz alguns textos e imagens produzidas ao longo da disciplina COM 270 “Semiótica”, nos períodos letivos 2014/1 e 2015/2. Outros materiais foram gentilmente cedidos por alunos de outros períodos do Curso de Jornalismo. O tema “Fragmentos do Cotidiano: Cidade & Universidade” nos remete de imediato à experiência de vida em Viçosa. Um dos fragmentos mais importantes que compõem esta relação é a interação da cidade com a universidade. Ou seja, todos os esforços, discussões e possíveis soluções dadas aos problemas públicos, mas também os eventos culturais no gramado, na Giannetti e o trânsito das pessoas nos finais de semana que envolvem, de maneira significativa, dois ambientes muito diferentes. Como toda a relação, “Cidade & Universidade” se constrói com tensões, negociações e aderências de toda espécie. Uma visão otimista pode mascarar os problemas reais, enquanto que a pessimista isola um lugar do outro. Em quase 100 anos de relação, os fragmentos que formam a tessitura da “Cidade & Universidade” se traduz em uma experiência que medeia o conhecimento das pessoas sobre o cotidiano. Contudo, outras relações também compõem Viçosa: a relação com o divino, com aquilo que não vemos; com lugares de passagem, que a pressa nos impede de enxergar; assim também com os personagens típicos do centro da cidade, invisíveis aos apressados; a relação com os recursos naturais, com a preservação do patrimônio e o espaço urbano; a relação com a saudade de viver longe dos familiares. O leitor irá perceber e sentir que alguns textos tratam dos fragmentos do cotidiano em Viçosa com uma abordagem mais próxima da crônica, do literário e da interpretação; outros são mais opinativos e inclinados ao estilo reportagem. Trechos de poemas foram inseridos para ampliar a experiência com os fragmentos, aguçar a interpretação dos leitores. Portanto, escolha um momento menos agitado, um lugar tranquilo e tenha uma boa leitura! Ricardo Duarte Editor
2015/1 (exceto os textos da Isadora Canela e do Gabriel Novais).
Os materiais publicados foram produzidos durante a disciplina COM 270 (“Semiótica”), nos semestres letivos de 2014/1 e
ÇÃ OS O CI UN IC A
Endereço Vila Gianetti, casa 39 Campus Universitário Viçosa – MG. CEP: 36570-900 Telefone: 3899-2878 www.com.ufv.br
O M
Distribuição Gratuita
AL
Tiragem: 800 exemplares. E AM ART DEP
O NT
DE
C
PH Rolfs
3
ÍNDICE
18
6 A fé que move montanhas 8 Chão que se pisa mas não se conhece 10 A tentativa de substituir o insubstituível 12 Vida de cão em Viçosa 14 Gente que chega pra ficar e quem vai pra nunca mais 16 Outro olhar sobre o morro 18 O Muro das Lamentações
22
10
20 Da natureza nada se cria ou perde: tudo se transforma 22 Terno amarelo de meu tio 24 O anônimo famoso 26 Opinião: Crise Hídrica 4
PH Rolfs
6
Cidade e Universidade por Isadora Canela
Ó
mundo moderno! São tantas demandas, tantos desejos, tantos infinitos pontos de vista, será que a concordância não poderá, então, tapar buracos? Vez ou outra, cá no interior de Minas, me deparo com a desavença vazia, que pra nada serve além de comprovar a tal inércia que, convenhamos, já não precisa de mais provas. O senhor passeia calmamente num domingo de sol, levando no carrinho seu neto recém nascido. Vai só de uma ponta a outra, impedido pela falta de calçamento apropriado. Do outro lado, a moça corre com a mala, da rodoviária para casa, de casa para a aula, atrasada. Mas desiste, nessas ruas tão largadas e estreitas, seria impossível cumprir horário, precisa mesmo de um taxi. A prova de cálculo se aproxima, ele já repetiu a matéria três vezes, se não passar agora nada de formatu-
ra, e adivinha? Festa de criança na vizinhança. O balão mágico se confunde com as raízes, matrizes, e sabe lá mais quantas fórmulas ele deveria decorar. Pais de primeira viagem, o grito de dor de barriga do filho faz arder o coração. Depois de muito, muito esforço o pequetito pega no sono. Não mais de uma hora depois da tranquilidade a música ensurdecedora da república ao lado que se despede, acorda a criança. Ele vai de bicicleta, de casa em casa, entregando os jornais à quase 20 anos. Conhece cada canto, cada antigo morador e leva sempre junto às notícias um alegre sorriso. Enquanto ela lá mal humorada que só vendo, vai de bicicleta pra aula chata que não pode mais faltar. O caminho é o mesmo, e com sorriso ou sem sorriso, as bicicletas, sem ciclovias, se arriscam entre motos, carros, pedestres e caminhões. Que diferença faz se são cinco
meses, cinco ou cinquenta anos, se um dia qualquer, por um acidente, doença ou coisa assim, não podemos buscar amparo na péssima rede pública de saúde municipal? Ó mundo moderno, pra que tantos rótulos se eles todos, seja gótico, servidor, professor doutor ou micareteiro, bebem da mesma água poluída? Vez ou outra me deparo com uma esperança de não ver mais minha querida cidade dividida em dois polos. Não nasci aqui e provavelmente não viverei aqui para sempre, mas tenho no meu coração e mente a vontade de ver essa, que também é minha cidade, ser somente uma. As claras e indignantes divisões entre cidade e universidade do mundo físico, escancaradas ali bem no centro, precisam se desmanchar primeiro no mundo simbólico, na mente dos cidadãos que dividem os ônibus, os hospitais, as ruas, que compartilham o cotidiano viçosense.
PH Rolfs
5
A fé que move mon por Aline Soares, Malena Stariolo, Mariana Barbosa, Tábatha Valetim
S
ão diversos os clichês referentes ao sentimento de acreditar em algo que ninguém prova e, ao mesmo tempo, não precisa de comprovação. Assunto difícil de discutir, mas para quem sente, não há discussão necessária. A conexão espiritual se sobrepõe a qualquer explicação lógica. É uma questão de energia, de ser tocado sem saber como, mas ter a certeza de que algo mudou. O mundo, para quem tem fé, é visto de olhos fechados. É caminhar pelo desconhecido sabendo que o destino lhe trará o bem. É ver o futuro como uma nova chance, ser tomado pelas mãos e levado a caminhar segundo uma vontade superior, uma vontade sempre positiva, benevolente. A fé comove, unifica, acolhe. Não distingue cor, raça, religião. Seja num grande templo, numa linda capela ou num pequeno terreiro, ela sempre fala mais alto do que qualquer divergência e se manifesta para dar o conforto necessário para quem a busca. Alternativa única para muitos que não tem mais ao que recorrer. É a luz no fim do tunel, a certeza de dias melhores, a esperança de um novo amanhecer, melhor do que o anterior. Incentivo para seguir em frente, para colocar todos os desejos de um coração inquieto nas mãos de alguém que pode fazer melhor,
6
PH Rolfs
e que com certeza fará. Não só um refugio, a fé também funciona como momento de agradecer, de rever as belezas da vida e aproveita-las da melhor maneira possível. A
fé funciona como figura essencial, compõe de maneira especial a rotina daqueles que acreditam, daqueles que devotam um momento para buscar respostas e encontrar a paz.
ntanhas Missa de domingo na Igreja Matriz de Santa Rita de Cรกssia
PH Rolfs
7
Chão que se pisa mas não se conhece por Carla Teixeira, Marina Gontijo ,Leonardo Coelho
T
em um nome de alguém que, aos poucos, todo mundo conhece. Quem mora aqui ou quem só chega de passagem, escuta a palavra “Vila Gianetti”, mas só a experiência pode fazer a conexão do “nome” com a “pessoa”. No caso, trata-se de um lugar, um caminho de idas e voltas. Mas essa moça que se chama “Gianetti” poderia ser uma das “coisas da Natureza” despertando encantos, assim como o poeta Mario Quintana se referiu. Pela vila, passam todos e olham para baixo, por vezes ignorando a beleza das árvores, das casinhas históricas e da história que cada casa esconde a duras penas. A Vila Giannetti está em lugar estratégico no cenário urbanístico de Viçosa,
8
PH Rolfs
bem na passagem entre a Cidade e a Universidade. É lar dos Museus, dos laboratórios de ensino e das atividades de Extensão. Mas também é muito mais do que o que aparenta ser. Só a conhecemos pelo nome. Mas um simples nome não resume a história da Gianetti. Já foi lugar de gente importante, morada de mestres e intercambistas. Hoje é lazer e prazer, uma Vila que encanta e precisa dos cuidados urbanísticos e arquitetônicos necessários. De segunda a sexta, as calçadas aguentam o vai-e-vem das pessoas, até chegar na tarde do sábado, quando ela se tranca injustamente, frustrando aqueles que desejam passear e apreciar a paisagem. O tráfego vicioso de todos os dias é substituído pelo deserto incólume.
Na sua quietude, Giannetti esconde suas histórias. Na sua agitação, ela continua marcando a experiência de vida de tanta gente nova que a cada dia chega ali. Ah, Gianetti! Se cada um que passa por ti começasse a te olhar mais atentamente... enxergariam o quão rica e natural é sua simplicidade. O tempo passa deixando seus vestígios. Gianetti também é um fragmento do nosso cotidiano, do nosso tempo em Viçosa. A cada caminhada que damos pela Vila passamos a conhecê-la novamente, reconfigurando seus traços e dando a ela novas razões de existir. Assim sendo, não há porque Gianetti se preocupar, pois “a gente continua morando na velha casa em que nasceu ”.
As coisas Mario Quintana O encanto sobrenatural que há nas coisas da Natureza! No entanto, amiga, se nelas algo te dá encanto ou medo, não me digas que seja feia ou má, é, acaso, singular... E deixa-me dizer-te em segredo um dos grandes segredos do mundo: é simplesmente porque não houve nunca quem lhes desse ao menos um segundo olhar!
Casinha branca Peninha “Eu queria ter na vida Simplesmente Um lugar de mato verde Pra plantar e pra colher Ter uma casinha branca De varanda Um quintal e uma janela Para ver o sol nascer”
PH Rolfs
9
A tentativa de substituir o insubstituĂvel por Ana Eduarda Ferreira, Isac Godinho, Sayonara Ribeiro e Ellen Ramos
10
PH Rolfs
A
gente quer tanto. A gente quer tanto e acha que pode tudo. Poderia mudar o mundo em uma entrevista de estágio – emprego ainda está longe – a gente pode cuidar de aula, trabalho, prova, amigos, casa, contas, estágio, gato, cachorro, namorado(a), ficante, festa e trabalho de novo. Tanto, tanto que não para. E, de repente, é como andar de bicicleta, que se parar, cai. Mas ai, a gente está no DCE – fazendo um trabalho – e olha numa direção que já olhou várias vezes mas dessa vez
VÊ, ao invés de só OLHAR: “Qual o número da sua saudade?” E aí, quem quer tudo não quer mais nada. Ou melhor, o nada agora é tudo. É ambíguo em mais maneiras que o coração está acostumado a sentir e mais do que a caneta é capaz de explicar. É aquele aperto no peito de repente, assim, do nada, que as palavras rabiscadas de um desconhecido causam. Fazem querer pegar a primeira condução pra ir pra casa. Mas de novo, aqui é “casa” agora. É o endereço que está na conta de luz, no registro da faculdade. Está escrito. Está determinado. Está no olhar atravessado que seus pais lhe dão quando você diz “lá em casa...”. Não é de propósito, mas é assim. É o desejo de buscar mais do que eu tenho hoje, alcançar o que os olhos (não) podem ver. Esse desejo de buscar mais, fez com que a gente escolhesse a UFV. Chegando aqui é tudo novo e assustador. Cada pessoa que você conhece traz consigo uma bagagem única, singular. E quando as bagagens se conectam, é criado um laço muito forte, ultrapassa as barreiras da amizade. Essa é sua nova família, elas que vão suprir a falta de casa, elas serão seu novo alicerce. Como não se pode morar junto com toda essa família, o DCE se torna a “sala de casa”. É lá, que nas horas vagas, você marca de encontrar/reencontrar essa grande família. É pra lá que você vai matar a saudade dos membros do seu novo lar. E, quando você for embora de Viçosa, ah... são dessas lembranças do DCE que você vai lembrar. E aí dependendo da saudade de cada um, o que fica no rosto é um sorriso ou uma lágrima.
(Toda estrada é uma subida escorregadia Mas sempre há uma mão na qual você pode se segurar)
93 Million Miles – Jason Mraz
PH Rolfs
11
Vida de cão em Viçosa por Guilherme Pimenta e Gustavo Pires
U
m velho problema público conhecido pelos moradores de Viçosa: você sabia que mais de dois mil cachorros já foram abandonados na cidade? Eles são deixados pelos donos, que não oferecem os cuidados básicos, como alimentação e saúde, por exemplo. Os dados são levantados há, aproximadamente, dez anos, quando foram iniciados os trabalhos de recuperação e controle de animais soltos. O Centro de Veterinária da UFV atua na castração desses cachorros, por meio do Projeto Copa (Controle de População de Animais de Viçosa). A prática impede a procriação, o que ajuda a conter a quantidade de cães nas ruas. O problema, porém, está mais ligado à conscientização dos donos. De acordo com o estudante de veterinária, Adam Widmer, muitos dos abandonos acontecem por pessoas de cidades próximas, que os deixam dentro do campus universitário. Mas a novidade é outra. Casos recentes vêm sendo relatados nas redes sociais na internet, por testemunhas que presenciam a agonia de cachorros, em diversos pontos da cidade. Alguns dos animais chegam à morte. Em todas as ocorrências, um cenário semelhante: carne crua recheada de chumbinho, uma substância tóxica
12
PH Rolfs
de comercialização proibida no Brasil, próxima aos bichos. A prática de extermínio por envenenamento tem crescido em Viçosa. A lei 9605/98 configura a ação como maus-tratos, assim como o abandono, e pode gerar pena de três meses a um ano de reclusão, além do pagamento de multa. Atualmente, a cidade conta com dois centros de veterinária, um hospital veterinário e com a Sociedade Viçosense de Proteção aos Animais (Sovipa), que atua no abrigo dos bichos que são deixados pelos donos. Mas, segundo a coordenadora da entidade, Fernanda Marisa, a iniciativa está sobrecarregada. A atuação da entidade também envolve a castração, além de buscar novos lares para os cachorros que estão sob os cuidados da organização. Ainda conforme a coordenadora, o trabalho foca na conscientização dos proprietários sobre o trato com os cães e o custo gerado para um possível dono, a fim de evitar novos casos de abandono. Maus-tratos a animais é crime. Ao presenciar uma situação que coloque em risco a vida e a dignidade do animal, denuncie à Polícia Militar, através do 181 (denúncia anônima) ou 190. A atitude pode evitar que mais cães sejam abandonados ou assassinados na cidade.
PH Rolfs
13 Fotos: Luana Mota
Gente que chega pra ficar e quem vai pra nunca mais por Ana Clara de Assis, Camila Santos e Ingrid Carraro
O
que realmente é a vida se não um milhão de encontros e desencontros todo dia, mês e ano por anos? A partida e a chegada, sempre tão emocionantes, carregam uma imensidão de tempo relativo entre elas que te permite mudar depois que parte e enquanto não chega. Não se sabe exatamente quantos minutos se passam no extenso caminho de 100 metros após sair da escola em direção a sua casa, caminhando sozinho em um sol quente, com dor de cabeça e muito sono. Em contrapartida, apenas alguns segundos passam quando você parte da sua casa e faz o mesmo trajeto com seus amigos, caminhando e rindo sob o nascer do sol. Incontáveis décadas passam em um mês em que esteve visitando uma nova região, ou outro país. A chegada é sempre nova, carregada de novas experiências e aprendizados. A partida é sempre corajosa e emocionante, positiva ou negativamente. Seja uma ou outra – realmente não importa – é marcante para cada indivíduo particularmente em qualquer lugar, em qualquer época. Isso é amplificado em um local no qual grande parte da população que o habita não pertence a ele; é flutuante. Nesse pedacinho de ter-
14
PH Rolfs
ra, os choros, sorrisos, a ansiedade, aflição e as novas experiências são constantes. E ele tem um ambiente importante por onde todos passam: a rodoviária. Em Viçosa é assim. Devido à universidade, a cidade se desenvolveu mais que as vizinhas e atraiu muitos estudantes e trabalhadores de outras regiões. Por esse motivo tornou-se um local diversificado, com pessoas de diferentes origens, costumes, sotaques e culturas, criando um ambiente extremamente rico e interessante. Porém, como a população não é daqui, acaba tendo que viajar muito, o que destaca a importância da rodoviária na cidade. Localizada na Avenida Mal. Castelo Branco, a rodoviária de Viçosa tem uma aparência visualmente desagradável. Os bancos são desconfortáveis e ela parece sempre suja. Apesar disso guarda muitas histórias. Palco de reencontros calorosos depois de longos períodos e despedidas dramáticas. Por todo lado veem-se pais preocupados, amigos ansiosos, namorados deprimidos... É um vai-e-vem constante. É um recomeço a cada instante. E os sentimentos seguem nos compartimentos de bagagens de cada ônibus. A Rodoviária é esse pequeno fragmento da vida desse nosso lugar.
Diogo Rodrigues
“A hora do encontro é também, despedida. A plataforma dessa estação é a vida desse meu lugar” (Milton Nascimento)
PH Rolfs
15
Outro olhar sobre o morro por Thalison Oliveira, João Negrelli, Ricardo Almeida e Leonardo Gonçalves
“O senhor na bicicleta não sai do traçado do trilho. E lá se vai mais um passageiro de algum trem que levou os vagões invisíveis da memória. Morro do Café: café com pão, café com pão, café com pão, café com pão. Antes de sair para o trabalho, o trabalhador comeu sua média e seguiu seu caminho empoeirado. Neste caminho, algumas belas flores teimam e resistem ao abandono do lugar. A balaustrada “gorda” esconde a fome de cada dia. É hora de sair para trabalhar. Como diria Manuel Bandeira: foge, bicho, foge, povo, passa ponte, passa poste, passa pasto... E neste “trem de doido” o bicho-homem foge com sua bicicleta, seguindo na labuta sem perder o trem, sem sair dos trilhos. Uma figura do povo que sobe e desce onde já não existe mais pasto. Só asfalto inacabado” da Editoria Geral
16
PH Rolfs
‘V
ivo, vivo num morro que quanto mais de longe mais bonito é de se ver não há quem resista ao meu morro dentro da luz azul que sai da TV”. O trecho da música Vivo num Morro, da banda Pato Fu, remete a maneira como a maioria das pessoas pensa sobre morros ou favelas, sem ao menos ter chegado perto de uma. Em nossas fotografias, tiradas no Morro do Café procuramos mostrar que, além do que estamos acostumados a ver em programas sensacionalistas de TV, há beleza nas favelas. Mostrar um outro lado de Viçosa, um olhar diferente daquele habitual composto pelo centro e pela universidade. Esse é o tipo de percepção que as imagens devem provocar. Um bairro menos favorecido, muitas vezes caracterizado como
favela por estar mais afastado, num local de morros e não estar nos padrões idealizados da sociedade não significa em hipótese alguma que seja um lugar feio e criminalizado. Esse tipo de lugar também tem sua história, suas belezas e suas características específicas. Um trilho de trem e uma estrada de terra. Elementos que nos remetem ao passado e que conta um pouco da história do município. O trilho interligava toda a cidade. O trem de ferro passava, levava as pessoas para o trabalho e os trazia novamente para o conforto do lar. Vemos estrada de terra, que hoje serve de caminho para o centro. Um senhor andando de bicicleta no meio do trilho, seria um elemento intrigante e até mesmo contraditório. No lugar onde se passava um trem, hoje se passam bicicletas. Morro e favela como sendo um lugar de barracos e casas velhas é
uma concepção ultrapassada, como se pode ver, a cor está presente nas fotos através das flores e das casas. Achar algo belo é uma experiência perceptual de prazer e satisfação daquilo que está ao alcance dos olhos. É isso que o contraste entre as flores amarelas e a Kombi azul trazem aos nossos olhos. Contraste de cores, de elementos e de percepção, daquilo que é belo e vivo com o que aparentemente está abandonado. A vista do morro e de tudo o que o compõe, mostra o crescimento da cidade, e nos da uma visão maior de tudo o que está ao nosso redor, que muitas vezes não percebemos ou se quer paramos para apreciar e pensar no lugar onde vivemos. As três fotografias revelam esse outro olhar, mostrando beleza, cor, e de uma certa forma, nos contanto um pouco da história do lugar onde vivemos. Elas são a janela pela qual enxergamos o bairro em questão.
PH Rolfs
17
O Muro das Lamentações por Ana Carolina Leão, Laira Carnelós, Núbya Fontes e Patrícia Freitas
A
cordo às 5h e pego um ônibus lotado. Passo o dia obedecendo a ordens. Não sei exatamente de quem e nem pra quê, só as cumpro. Saio do trabalho as 6h, sou assaltado à caminho da minha casa no subúrbio. Sento para assistir à TV as 10h em casa, estava passando um programa eleitoral que dizia que moradores da minha região da cidade não enfrentam problemas com traficantes e senti falta do meu pai morto há um mês, por dívidas de drogas. Somos de uma geração considerada sem voz. Somos de uma geração considerada apática no meio e perdida no âmbito virtual. Somos na verdade de uma geração que tem muita a dizer, mas não sabemos exatamente onde falar. Muitos de nós decidimos, então, intervir visualmente no espaço público, o lamento de um muro. A grande obra humana é interferida pela arte vista da perspectiva dos elementos que estão no cenário urbano. Porém, a cidade sendo considerada a própria arte, alguns
18
PH Rolfs
de seus detalhes que compõem sua magnitude são ofuscados pela sua magnitude. Estes detalhes são intervenções urbanas.Buscando compor os espaços como forma de inserir um ritual artístico e excêntrico no cotidiano da cidade. A cidade pode ser pequena, mas as intervenções de cunho artístico estão sempre presentes no ambiente. Basta reparar. As intervenções urbanas possuem o objetivo ínfimo da comunicação entre os indivíduos que as executam na sociedade. Ela procura a mudança social através de uma mensagem, gerando uma modificação. É uma forma de canalizar as transformações sociais almejadas. Reflete uma necessidade, que principalmente os jovens possuem, de se abrir para o mundo. Essa necessidade é gerada pelo imediatismo eufórico da jovialidade, podendo justificar o anseio de uma conexão mais evidente e adaptações no espaço. Elas ilustram o grito para o mundo, as insatisfações, as posturas políticas e o desejo de mudanças de cada um,
“Por um mundo melhor eu mantenho minha fé Menos desigualdade, menos tiro no pé Andam dizendo que o bem vence o mal Por aqui vou torcendo pra chegar no final É, quanto mais fé, mais religião A mão que mata, reza, reza ou mata em vão” “Deixa, deixa, deixa Eu dizer o que penso dessa vida Preciso demais desabafar” “Quando a arte se torna maior que a criação Muitos a chamam de obra Quando a obra se torna maior que o homem Ela se chama cidade” Marcelo D2 - “Desabafo”
possibilitando uma relação de não repressão com o mundo (se não querem nos ouvir, que nos vejam, que nos leiam). Por isso possuem um componente crucial que permite o conhecimento da sociedade que a contorna. Invadem as ruas sem preconceitos artísticos e contribui transformação e democratização da sociedade. A parte material do paredão é sim privada, mas a parte estética é pública, fica além dos limites da propriedade. Em Viçosa não é diferente. Notamos depois das manifestações estudantis de 2013 que essa arte de cunho intervencionista no meio urbano se intensificou. Aquelas que eram apenas paredes brancas começaram a ganhar vida, a ter um significado para quem as observa. Sabemos que em toda cidade há um dito “grafite” ou “pichação” em algum, ou muitos, lugares, mas ressaltamos a singularidade desse movimento em Viçosa, uma cidade estudantil, com grande confluência de pessoas, culturas e ideias. Damos ênfase aqui ao “Muro das Lamentações”, que fica no conhe-
cido Balaústre. É possível notar sua constante transformação, modificações feitas pelo próprio cidadão que vê ali um meio e um espaço de se manifestar e se impor perante a sociedade, tanto artisticamente através de grafites quanto apenas escrevendo o que lhe aflige. Pelo muro pode-se observar também a comunicação entre as pessoas que o modificaram, existem respostas para o que foi escrito antes ou até mesmo um “oi” deixado para um conhecido que assinou um grafite. É fácil compreender a intenção ao intervir no espaço urbano. Mas essas intromissões intervêm no que? A essência das interferências esta naquilo que o homem deseja falar através dela. Muitas resistem ao espaço e ao tempo, mas sempre lembrando à humanidade quem um dia esteve ali, querendo dizer alguma coisa. As formas de intervenções respondem ao objetivo, ao lugar e, sobretudo, ao resultado que podem alcançar. A importância de enxergarmos nos indivíduos a mudança social, uma vez que eles dão vida e espírito às intervenções.
PH Rolfs
19
Da natureza nada se cria ou perde:
tudo se transforma
por Sérgio Felix, Isabela Lopes, Leonardo Pereira, Maria Clara Epifania
O
ser humano se diferencia por ser o único a ter consciência sobre sua finitude. No pensamento popular, a morte é compreendida como o fim de um ciclo. Parece servir de consolo ante o sofrimento que nos é imposto pela morte. Quem nunca ouviu a expressão: “agora lhe chegou o descanso”. A ideia de que muitas vezes, a melhor saída para algumas situações vividas é a sua cessação, seu fim, seu aniquilamento. Por ser algo desconhecido, a morte acaba ganhando visões diferentes a seu respeito. Uns acreditam que é o início de uma nova etapa. Uma etapa que vai além da vida terrena, que perpassa os limites da física. Grande número de religiões e seitas apoiam-se nesse modo de compreender a finitude do ser humano, afirmando algumas, a imor-
talidade da alma. A verdade é que o fim da vida deve ser encarado como uma possibilidade existencial. A morte é compreendida não como um acontecimento particular, um início ou fim de um ciclo de vida do homem, mas como uma possibilidade que está sempre presente na vida humana, e que pode surpreendê-la a qualquer momento. Não é o fim, mas a continuação de um processo vital. Tal frase do Tagore, abaixo, lembra outra frase conhecida do químico francês Antoine Lavoisier que disse que “na natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma”. Assim como as flores apresentam a esperança em um ambiente cercado pelo cimento e pelos túmulos, a frase de Tagore mostra que a vida é mais forte que a morte, independente do ambiente.
“Quando morre uma flor, nasce uma semente; Quando uma semente morre, nasce uma planta. E a vida continua seu caminho, mais forte do que a morte.” Tagore
20
PH Rolfs
Cemitério Dom Viçoso, Centro de Viçosa
PH Rolfs
21
Terno amarelo de meu tio por Gabriel Novais
U
ma vez ou outra ligo para minha velha e pergunto sobre todos familiares que possa me recordar. Pergunto como jornalista, psicólogo, médico e, principalmente, parente desavisado. Mamãe geralmente se diverte e embala minha curiosidade com risadas, segundos de silêncio, detalhes e falta de detalhes. É como escutar um noticiário, onde aquela dona que tem preguiça de ler e escrever é a âncora e repórter dos casos de gente do meu sangue. Numa dessas ligações o noticiário foi breve, uma nota seca apenas. Seu tio vai ser operado. Traguei meu cigarro espantado e questionei o motivo. De velhice, meu filho. Como de velhice? Não perguntei. Calei-me e mudei de assunto, disse que faria uma visita em breve, tentando disfarçar minha ausência de mais de meses. Ela se despediu cansada da velhice e da juventude, a ligação se encerrava antes mesmo do cigarro. Depois disso me apressei em ir para casa em que cresci. Não se passaram muitos cafés da manhã
22
PH Rolfs
até que estava diante de meu tio com seu terno amarelo e detalhes brancos. O senhor que via na minha frente parecia o mesmo de anos atrás, com toda pompa possível. Parecia porque sua voz agora falha não deixava parecer. Antes sua voz forte me falava de política e de gente importante. Agora ele resmungava com a faxineira dizendo onde ela não devia mexer e me contava como estavam sendo seus dias pós-morte de sua mulher e pré-cirurgia de velhice. – Me disseram que se não me abrirem não tem jeito, a morte me pega – Estendi-lhe um copo de água e ele recusou. A cirurgia era em alguns dias e por isso resolvi ficar. Meu tio e eu resolvemos sentar diante da janela toda tarde e observar o movimento como antes. Fazer daquela abertura entre a casa e a rua uma espécie de televisor onde assumiríamos o papel de comentaristas. Em verdade tentamos fazer como antes, mas as pautas eram outras. O comércio e a política não eram mais os mesmos, os amigos e vizinhos muito menos. De velhice também os outros foram sumindo.
Hotel Rubim, símbolo da história da cidade, situado próximo de outros patrimônios históricos: a Estação Ferroviária Central e a Casa Arthur Bernardes
Outros cafés da manhã se passaram e o dia chegou. Acompanhei o velho vestido com seu terno amarelo até o hospital. A papelada fazia um parâmetro de todo seu organismo como um projeto arquitetônico. Colesterol, cálcio, e uma porção de outras substâncias que não me lembro compunham meu tio. A cirurgia demorou uma tarde, a primeira em dias em que meu café era desacompanhado. Voltamos para casa numa ambulância, acompanhado de uma enfermeira que estaria com ele eternamente. Tio H. Rubim agora tinha uma cama especial, uma maca adornada com tubos e aparelhos modernos. Não poderia mais ser um comentarista da rua, pois sua essência havia sido alterada. A única coisa que lhe restava era seu frenesi com o terno amarelo, nada mais. Tio H. Rubim agora era como uma das muitas fachadas tombadas da cidade em que cresci, onde ninguém entende o motivo de se preservar uma parede para se fazer um prédio. Minha mãe, nem ninguém da família entendeu a eternidade de meu tio e seu terno.
PH Rolfs
23
O anônimo famoso por Robson Filho, Mateus Pereira, Larissa Abreu e Jorge Oliveira
N
o vai-e-vem constante do calçadão de Viçosa, tantas pessoas passam sem se reconhecerem e sem serem reconhecidas. De costas para o movimento, o engraxate Joaquim Alves Pereira tornou-se conhecido entre os desconhecidos. Um anônimo famoso da cidade. De boina, bigode e jeito português, o senhor de 64 anos trabalha no calçadão diariamente. Dos muitos pares de pés que por lá passam apressados, alguns passam pelas mãos dele. Mãos sujas de graxa que se fazem hábeis para acompanhar essa pressa, típica de um ritmo do cotidiano contemporâneo. Em poucos minutos, algumas palavras são trocadas entre seu Joaquim e seu freguês. Comentários sobre as notícias de ontem e o clima de hoje. Fofocas sobre fulano e cicrano. E pronto! Os clientes, com seus sapatos então lustrados, voltam para a correria. Mas o banco não fica vago por tanto tempo, pois é logo ocupado outra vez. E o trabalho mecânico se repete. E vem se repetindo há seis anos.
24
PH Rolfs
Seu Joaquim já foi metalúrgico em São José dos Campos, São Paulo. Prestes a se aposentar, não conseguiu outro emprego e, então, escolheu ser engraxate. Trabalhava na Praça Silviano Brandão e conseguiu licença para mudar-se para o ponto atual, substituindo o antigo engraxate que faleceu. No meio de um amontado de bugigangas, seu Joaquim presta também diversos outros serviços. Conserta sapatos, guarda-chuvas, eletrodomésticos. Arrecada o suficiente para sustentar a filha que estuda medicina em Juiz de Fora, da qual tanto se orgulha ao contar. O gosto pelo seu ofício é visível. De acordo com ele, a profissão lhe permite fazer várias amizades e conhecer muitas pessoas. E tornar-se conhecido também. Sobre Viçosa, conta seu Joaquim: “O povo daqui é muito bom. Gosto bastante dos viçosenses!” E ele mesmo se tornou um. Natural de Cachoeira de Minas, mudou-se para cá há 15 anos e “viçosou”. Como tantos outros. Característica marcante da cidade. “Me adaptei muito bem aqui e não pretendo mudar”.
PH Rolfs
25
Diogo Rodrigues
OPINIÃO
Crise Hídrica por Ernane Correa Rabelo (DCM/ UFV)
A cidade é passada pelo rio como uma rua é passada por um cachorro; uma fruta por uma espada. O rio ora lembrava a língua mansa de um cão ora o ventre triste de um cão, ora o outro rio de aquoso pano sujo dos olhos de um cão. Aquele rio era como um cão sem plumas. Nada sabia da chuva azul, da fonte cor-de-rosa, da água do copo de água, da água de cântaro, dos peixes de água, da brisa na água.
A
crise hídrica convoca nossa reflexão para a realidade da seca que vivemos e se analisarmos suas causas, e agirmos, podemos avançar para patamares mais elevados de qualidade de vida. Esta é a única vantagem de qualquer crise, daí o repetido mantra de que o caos gera oportunidades. A antiga Escola Superior de Agricultura e Veterinária (ESAV) foi constituída, no século XX, a partir da aquisição de terras pertencentes a fazendeiros viçosenses. O Ribeirão São Bartolomeu, situado à jusante da cidade, veio “de brinde” e não constou nos documentos de posse da terra como a universidade deveria zelar pela água que também abastecia o município. A Universidade desviou o curso d’água, formando represas para captar a quantidade de água que julgasse adequada ao funciona-
26
PH Rolfs
(“Cão sem plumas”, João Cabral de Melo Neto)
mento de suas atividades. Os anos se passaram e o esgoto despejado in natura tornou temerário o uso recreativo da lagoa – e a população carente foi ficando sem o único local de lazer aquático. (Um incômodo: a UFV utiliza o São Bartolomeu mas não oferece sequer um bebedouro para a comunidade que faz caminhadas ou corre pela reta principal do Campus). Ressalte-se que, nos últimos anos, a instituição tem se esforçado para diminuir seu consumo, despejar menos esgoto e auxiliar o município na defesa ambiental, como a proibição da passagem de um mineroduto pelo Campus. Para outras medidas é necessário ampliar as relações políticas com o poder público municipal, como o desassoreamento das lagoas, obra de altíssimo custo e que requer estudos urgentes para pesquisar sua viabilidade técnica.
A causa da crise hídrica não é apenas a falta de chuvas. É também a poluição dos rios, em especial o São Bartolomeu, a falta de planejamento, o crescimento desordenado da cidade, a leniência da Prefeitura com as agressões ao meio ambiente e a passividade da população. Assim como no caso da crise hídrica, temos outros problemas graves que envolvem a Cidade e a Universidade: transporte público, atendimento à saúde, absoluta inexistência de lazer para a população carente, poluição sonora e ambiental e a criminalidade. Neste momento, nos parece que a UFV tem mais condições, inclusive por desapego a questões políticas e eleitorais, para caminhar a jusante do Ribeirão São Bartolomeu, descer a avenida PH Rolfs, subir decididamente os degraus do Paço Municipal e agir em conjunto com a Prefeitura.
Lucas Kato
www.com.ufv.br