M O V E FASHION
COURO 200 milhões de hectares já foram desmatados na Amazônia para criação de gado
FASHION REVOLUTION Movimento Mundial que resgata a conscientização sobre o consumo sustentável
LUISA BRESSER Arquiteta e designer,criadora da marca Deli Jewels conta sobre carreira, produção e fiolofia de vida
A
A
A
2
Carta ao Leitor Durante anos a indústria da moda tem sido questionada sobre a sua necessidade de mudança para um universo sustentável, capaz de impulsionar um avanço para tal. Porém a forte relutância de grifes e grandes marcas do mercado impede essa transformação. A MOVE tem o propósito de mostrar que estilo e beleza podem sim ser sinônimos para sustentabilidade, apresentando de forma leve e informativa grandes marcas, movimentos e tendências para essa revolução. Sabemos que este universo, repleto e envolto de glamour, na maior parte das vezes transmite beleza e sofisticação, mas nossa função como uma revista jornalística é divulgar a realidade, afim de sempre conscientizar nossos leitores de que ser fashion é estar bem consigo e com o mundo a sua volta. Esperamos que desfrutem dessa edição e que a MOVE mova sua vida
A
A
Expediente
M O V E
FASHION Gabriela Lira, 20 anos, engajada em movimentos sociais.
Revista produzida por alunos do 6º semestre do curso de Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo da Universidade Anhembi Morumbi
Reitor Coordenador do curso de Jornalismo Prof. Nivaldo Ferraz
Diogo Domingos, 22 anos, apaixonado por cinema e teatro.
Coordenador Adjunto do curso de Jornalismo Prof. Alexandre Possendoro Porjeto Gráfico Prof. Ms. Ricardo Senise Redação e diagramação Diogo Domingos Gabriela Lira Gabriela Zakatei Giovanna Mendes Thamiris Gomes Data desta edição Novembro 2016
Gabriela Zakatei, 24 anos, gosta de viajar e ama práticar esportes.
Giovanna Mendes,20 anos, ama moda e entretenimento.
Thamiris Moura, 20 anos, gosta de fotografia e viagens.
ÍNDICE
6
Bate-papo Conheça o Fashion Revolution, movimento forte mundialmente e que hoje ganha força no Brasil com ajuda de nova represantante
10 As mudanças do mercado têxtil para este novo momento da moda e as novas marcas que estão a surgir no cenário nacional.
16
Capa Os malefícios causados pelo couro no meio ambiente começam a ser questionados pela indústria têxtil
24
Perfil Luísa Bresser, fundadora da Deli Jewels
A
MOVE FASHION Novembro 2016
Bate-Papo
A
PING 0- PONG
Conscientizar e Revolucionar A Fashion Revolution é um movimento que vai além da questão da beleza. Respeito, criatividade, inovação e meio-ambiente são seus propositos Por: Gabriela Zakatei Fotos: Thamiris Gomes
Livre, espontânea e alto astral, assim que se pode qualificar a Paulistana de cabelos longos e pulso firme Fernanda Simon, coordenadora do movimento no Brasil, trabalha com moda há 12 anos. Sete anos atrás, ela que morava na Inglaterra, trabalhou com uma das fundadoras do Fashion Revolution Day de lá. Voltando ao seu pais de origem ela trouxe consigo a questão dos impactos ambientais e sociais que a moda causa e decidiu então criar o movimento aqui, já que estava muito forte na Europa e não tinha nenhum representante em nosso país. Na entrevista a seguir, ela explica a essência do movimento, o engajamento das pessoas e marcas, e também se um dia o mundo da moda poderá ser 100% sustentável. Confira: O que é a Fashion Revolution ? É um movimento global que acredita em uma indústria da moda que valoriza e respeita as pessoas, preserva o meio-ambiente, promove criatividade e inovação. A missão é sensibilizar a sociedade para tornar esta crença em realidade. Como tudo começou? No dia 24 de abril de 2013, uma tragédia em Bangladesh abalou o mundo: o edifício Rana Plaza, que abrigava diversas confecções de roupas (muitas produziam em larga escala para renomadas marcas globais) desabou, causando a morte de mais de 1.130 trabalhadores, além de deixar outros 2.500 gravemente feridos. Esse foi o ponto de partida para que duas ativistas e designers pioneiras em moda sustentável, Carry Somers e Orsola de Castro, fizessem da data um marco. E assim surgiu o movimento e o dia da revolução, o Fashion Revolution Day. De Londres, se espalhou para o mundo, com o objetivo de sensibilizar e conscientizar a sociedade quanto ao verdadeiro custo das roupas e ao impacto socioambiental de seus processos, desde a extração da matéria-prima até o consumo, uma vez que catástrofes sociais nas cadeias de fornecimento da indústria têxtil persistem em várias partes do mundo, inclusive no Brasil.
E no Brasil, funciona na mesma proporção que nos outros países? A repercussão é bem forte, está nas maiores mídias, revistas e jornais do mundo. Ele está presente em 92 países, é bem forte. Principalmente no mês de Abril, quando comemoramos o Fashion Revolution Day. Neste ano de 2016 aconteceu a celebração com quase 80 países que se uniram para perguntar: “Quem fez minhas roupas?” e para exigirem transparência nos modelos produtivos. Qual é o feedback do público? E o resultado das ações? Todas as ações tem um feedback bem positivo, o movimento cresce a cada dia. Aqui no Brasil esse ano tivemos 54 eventos. O Fashion Revolution Day é um exemplo dessas ações, no Brasil ele logo mais será uma ONG. Funciona como um movimento de conscientização, em Abril acontece a semana da Revolução da Moda e em diversas cidades acontecem vários eventos. No total foram 54 eventos em 29 cidades. Trabalhamos também com ações de conscientização, como foi o Fashion Experience, nosso eixo educacional é bem forte, vamos em faculdades dar palestras. Na campanha deste ano de 2016 tivemos 30 faculdades e escolas de modas que
Fernanda Simon é a idealizadora do movimento no Brasil. Na foto, ela segura placa utilizada ao redor do mundo
A
Bate-Papo
MOVE FASHION Novembro 2016
de cada país acontece de uma maneira um pouco diferente. No Brasil o movimento é bem representativo e forte, já na Europa ele está bem mais concentrado, porem ele acontece em diversas partes do mundo e cada um com a sua particularidade.
A
Depois que o projeto foi lançado, como foi o engajamento das pessoas? Foi e está sendo bem interessante. Cada vez mais pessoas querem saber, conhecer, muitas das iniciativas surgiram nesse meio tempo, muitas marcas surgiram também nesse tempo, então o movimento se tornou bem significante aqui no Brasil. Ele inspira demais as pessoas, tem gente até mesmo da nossa equipe que trabalhava em uma grande cooperativa e largou participaram da campanha. Então temos um bom engajamento com a área educacional. Vocês se inspiraram em algum projeto para começar? Eu sou a coordenadora do Brasil, eu já trabalhava com moda e sustentabilidade alguns anos na Inglaterra. Eu morei lá 7 anos, e trabalhava com uma das fundadoras do Fashion Revolution Day de lá, então a minha inspiração é a própria situação do mundo e todos esses impactos ambientais e sociais que a cadeia da moda causa. Eu como fui estudante de moda, deis que saí da faculdade eu não queria pactuar com esses impactos e com a moda convencional. Deis de que fui para Londres, comecei a conhecer esse cenário da sustentabilidade da moda e fui me encantando, estudando e trabalhando com isso. Já estava pensando em vir para o Brasil, o movimento já estava acontecendo na Europa e não tinha nenhum representante no Brasil. Acabou que eu trouxe o movimento pra cá, então a ideia não foi só minha, aconteceu naturalmente. Eu conhecia as pessoas que fundaram e surgiu essa oportunidade. No Brasil funciona na mesma proporção do que em outros países? Por mais que exista uma centralização do movimento, tudo que produzimos passa pela aprovação deles. Existem diretrizes que seguimos, mas devido a cultura local
Na sua opinião, hoje as pessoas consomem de forma mais consciente e procuram saber o processo de produção daquele produto ou continuam comprando somente pela? Existem pessoas que consomem um produto sem querer saber de sua procedência, costumamos falar que elas estão alienadas, é alienação cultural. Muitas vezes a pessoa foi tão seduzida pela ideia da marca ou do produto, para muitas vezes pertencer a um determinado grupo social, e isso pode se tornar tão forte para ela que nada mais interessa. Nem se você mostrar o processo daquela roupa, ela não quer saber, ela quer comprar, quer continuar consumindo. As vezes fazemos ações de conscientização. Tem
Placas são utilizadas como forma de questionamento à produção de roupas
gente que entra e vê todas aquelas cenas, e chora, se emociona, quer saber mais. E tem outras pessoas que olham e falam: O que é aquilo? Eu quero comprar a bolsa que está na vitrine. Tem gente que não se importa e não vai se importar. Mas acreditamos que é uma sementinha que é plantada no coração de alguém que vai brotar outras ideias, inspirar outras pessoas. O processo é lento mesmo, e por mais que não conseguimos conscientizar todo mundo, aqueles que conseguimos já serão grandes influenciadores. Como funciona a participação de marcas famosas com o movimento? As marcas participam do movimento, porque incentivamos as marcas a responderem. Dizendo quem fez as roupas, contando sobre suas cadeias produtivas. Incentivamos o consumidor a questionar sobre esses processos produtivos. Exige ética e transparência, então muitas marcas participam desta campanha. Nesse ano de 2016 mais de 100 marcas participaram. Elas não apoiam diretamente o movimento, porque somos um movimento neutro, então nem podemos receber esse tipo de apoio de marca. Mas muitas marcas apoiaram e participam. Vocês acreditam na possibilidade do mundo da moda ser 100% sustentável? Talvez sim, daqui muitos anos. 100 % é
difícil dizer, até mesmo que existe porque sustentável na verdade é roupa que já existe e que não vai ter nenhuma pegada ambiental para produzir. Porque por mais que você produza uma roupa com impacto reduzido, por mais que você pense em redução dos impactos, ele sempre irá causar algum dano. É um processo que está sendo construído, é muito recente para ser 100%. Espero que chegue lá. Costumamos dizer que todas as roupas um dia terão que ser sustentáveis, e a que não for será a diferente. Mais vamos lá, pensar positivo no futuro, vamos imaginar um futuro lindo.
v
A
MOVE FASHION Novembro 2016
A
Isabel, uma das idealizadoras da COMAS no Brasil, em seu ateliĂŞ de costura e local de trabalho.
Loja da Insecta Shoes, localizada em Pinheiros, SĂŁo Paulo
O fashion é sustentável As mudanças do mercado têxtil para este novo momento da moda e as novas marcas que estão a surgir no cenário nacional. Por: Diogo Domingos
Fotos: Thamiris Gomes e Giovanna Mendes
Calças boca de sino, cintos spike, cachecóis de penas e até mesmo a famosa pochete já foram peças irrecusáveis de se usar, mas hoje são consideradas por muitos quase um crime para o vestuário. A cada ano tendências são lançadas e logo saem correndo para o guarda-roupa. Se vestir bem sempre foi uma preocupação constante para o ser humano, mas será que a inovação constante não seria um risco para o meio ambiente? Pra onde vai esse tanto de roupa que entra e sai de coleção? A moda é um processo constante de reinvenção. E para isso, estilistas de todo o mundo têm se preocupado a todo instante em manter a criatividade o mais próximo possível da sustentabilidade. A discussão sobre reciclagem, reuso e reaproveitamento de roupas é intensa na indústria do vestuário. Resultado disso é a própria criação de novas coleções, reestruturação da linha de confecção e nascimento de marcas especializadas no cenário eco fashion, termo pela qual a moda sustentável é conhecida internacionalmente. “Pouco a pouco o mercado vem percebendo que mais importante do que criar e o cuidado com o produzir. Grandes marcas perce-
“A discussão sobre reciclagem, reuso e reaproveitamento de roupas é intensa na indústria do vestuário”
bendo sua influência no ramo, têm se policiado mais com isso, mudando assim suas matérias primas, priorizando a durabilidade do produto e fiscalizando a mão-de-obra”, diz o estilista e consultor Robson Monteiro. O consumo desmoderado tem sido um dos grandes agravantes na crise ecológica de nosso planeta. Mas este não é o único responsável. Fatores como o uso de pele e couro animal em peças, inadvertência quanto ao nível de agrotóxicos utilizados no plantio de matéria-prima e estimulo ao trabalho escravo são outros extremamente críticos em relação ao assunto. Para Robson Monteiro a moda tem compreendido que mudanças precisam acontecer para que o mercado avance. De acordo com ele os desafios são grandes, mas a necessidade de conscientização também é. “Quando moda e sustentabilidade se unem, aspectos sociais, ambientais, econômicos e culturais devem ser analisados para que o conceito seja estabelecido de forma sólida” diz o profissional. Por todo o mundo eventos voltados para o seguimento surgem com grande força, trazendo conceitos inovadores para as passarelas e projetos de conservação de matérias-primas e recursos naturais na confecção de novas peças. Um dos maiores episódios ao tratar o assunto é a Eco Fashion Week que acontece em Vancouver todos os anos, já no Brasil temos o Prêmio ECOERA, que enaltece o nome de grandes empresas ligadas ao mercado têxtil. O Brasil já tem sido contemplado por este marco. A cada dia estilistas destemidos ar-
A
MOVE FASHION Novembro 2016
A
A matéria prima de toda a coleção da COMAS são camisas masculinas, principalmente as brancas, pois de acordo com Isabel, são mais versáteis.
Todos os sapatos desenvolvidos pela Insecta são veganos, ou seja, não levam nada de origem animal.
regaçam suas mangas, tiram projetos do papel e os levam para vitrines. Um dos exemplos que temos na cidade de São Paulo é a Comas, grife especializada em confecção de peças através do upcycling, transformando peças descartadas por fábricas de camisaria masculina em peças de moda feminina. “Sempre acontecem desafios no meio da produção, por isso vamos primeiro nas fábricas de camisaria masculina. Ao chegarmos separamos peças descartadas que não serão vendidas e fazemos uma triagem. Só então entra a parte da criação, onde vemos qual dos nossos projetos se adapta melhor as peças presentes” explica Aline, uma das organizadoras da marca. Aline também explica que o foco principal da Comas é trazer um conceito de moda consciente aos seus consumidores, mostrando assim que o que pode ser considerado descartável para uns pode ser arte para outros. A preocupação também está presente em toda a linha de fabricação, defendendo a necessidade de se repensar a forma como se confeccionam as peças hoje em dia. Com o avanço da moda sustentável no Brasil os ideais desse movimento se propagam, despertando na população um interesse maior sobre o assunto. Um estado de vigilância é originado em uma parte significativa da população que começa a exercer espontaneamente uma analise critica à performance de grandes empresas da indústria têxtil. Tal ação resulta uma onda que provoca um novo comportamento em tais empresas, levando elas a se adaptem a estrutura eco fashion. Outro exemplo de uma grande marca ecológica criada em território brasileiro é a Insecta Shoes, que desenvolve sapatos veganos, ecológicos e feitos à mão, produzidos a partir de roupas vintage e tecidos de garrafas pet recicladas. A empresa visa a todo o momento externar a ideia de reaproveitamento, aumentando a vida útil dos produtos que já existem pelo mundo. A confecção dos produtos é feita a partir de um processo artesanal, reciclando materiais e transformando roupas antigas em sapatos Oxford e botas veganas. Dessa forma os sapatos adquirem um aspecto único, não só em estilo como em diferencial, pois através desse processo os mesmo não apre-
“Com o avanço da moda sustentável no Brasil os ideais desse movimento se propagam, despertando na população um interesse maior sobre o assunto.” sentam nenhuma matéria-prima animal. Assim como a Comas, a linha de produção dos sapatos e botas da Insecta está totalmente presente no Brasil, estimulando assim a mão de obra local e garantindo a todos os trabalhadores condições dignas de trabalho. “Na Insecta, temos o objetivo de criar uma comunidade de pessoas que trabalham juntas, e nós acreditamos que é o nosso papel incentivar pequenas revoluções em cada um de nós” defende Estella Santini , representante da Insecta, ao questionarmos qual o objetivo futuro da empresa no país. Um dos grandes questionamentos feito atualmente é se um dia de fato será possível se estabelecer uma indústria têxtil cem por cento sustentável. Com as novas tendências, ideais e avanços na parte de confecção de produtos tudo indicaria que sim, porém a realidade é que muitos especialistas discordam do assunto. “É um ponto a se alcançar, mas não somos totalmente sustentáveis. Estamos tentando melhorar sempre certa parte da indústria, fazer uma moda mais consciente, tentando valorizar peças descartadas, repensando a forma de fabricar as peças. Pensamos de uma forma diferente, não somos o exemplo, mas tentamos fazer nossa a parte” diz Aline, refletindo sobre o próprio projeto Comas. A moda durante séculos se constituiu como o maior símbolo de transformação e revolução de uma sociedade. Porém desta vez a moda sustentável representará muito mais que isso, ela representará um recomeço baseado em esperança.
v
A
MOVE FASHION Novembro 2016
GALERIA
A
O verde do bem Um espaço de convivência e economia solidária. O Instituto Chão conta com uma feira, uma mercearia e um café com produtos orgânicos e artesanais dentro do mesmo estabelecimento. Prioriza pequenos produtores, o consumo de produtos mais sustentáveis e a coletividade.
Fotos: Thamiris Gomes e Diogo Perez
4O Instituto Chão é uma associação sem fins lucrativos. O que financia o local é os próprios freqüentadores com autonomia, cooperativismo, comércio justo e consumo consciente. 4Tudo que está nas prateleiras do Instituo Chão é vendido pelo preço inicial do fornecedor, sem acréscimo. O cliente é convidado a pagar algo a mais, se quiser – e puder
4Tudo que é servido ou vendido
é repassado ao consumidor diretamente pelo preço de compra. Os custos são expostos, incluindo frete dos produtos, salários, taxas de cartão e perdas.
4O Instituto acredita em uma forma
diferente de comercialização. Não há exploração do produtor nem de funcionários, mesmo contribuindo para a manutenção do projeto.
4O Instituto Chão está localizado na
Rua Harmonia, 123 – Vila Madalena, São Paulo/SP. Abre de terça a sexta, das 8h às 15h.
v
A
A
CAPA MATERIA PRINCIPAL
INIMIGO OU
Movimentos
de
defesa animal se posicionam contr cerca de 200 milhões de hectares da Amazôn
Texto: Gabriela Lira Fotos: Thamiris Gomes Modelos: Amandlah Fernandes e Pétala Leite
U ALIADO ?
ra o uso do couro. De acordo nia já foram desmatados para criação de gado.
com
pesquisas,
A
MOVE FASHION Novembro 2016
CAPA Espancamentos, ossos quebrados e horas sem comer. São quilômetros de viagens de trem em jornadas exaustivas. Ao final delas, de 900 vacas, 500 estão mortas. Durante o trajeto, os animais são proibidos de beber água e em casos extremos, pecuaristas esfregam tabaco em seus olhos. Essa é a vida do gado que vira couro e sustenta a indústria da moda ao redor do mundo. “O processo de produção do couro é extremamente tóxico, poluente e agressivo. Isso é assassinato”, declara Silvana Andrade, fundadora da Agência Nacional de Defesa Animal (ANDA), o primeiro e maior veículo jornalístico da área na América Latina. Vegana, ela conta que seu engajamento com a causa começou aos 17. Primeiro ela deixou de lado a carne vermelha, frango e peixe. Depois, os derivados. Silvana vive em prol da defesa dos animais há cerca de oito anos. O bezerro é retirado aos 3 meses da mãe, e da fazenda ele é transportado para o frigorífico. Lá, ele sofre por semanas antes de morrer. A tortura vai desde arrastar o animal no chão até derrubá-lo para marcar seu rosto com ferrete, uma espécie de brasa fervendo que identifica sua ordem de chegada. O pecuarista segura o bezerro deitado e encosta o bastão fervendo a mais de 150°. Os gritos parecem não sensibilizar mais. Além disso, eles são subordinados a um jejum de 24 horas antes de serem encaminhados aos corredores que antecedem o abate. Enfileirados e sem poder olhar para os lados, eles seguem um a um. É comum, para que andem rápido, serem chicoteados na região do quadril,
Foto: Gabriela Lira
Ricardo Michaelsen, coordenador da Lei do Couro no Brasil e membro do CICB
A
onde não há gordura que possa proteger. Em seguida, uma pistola anestésica no cérebro e um corte feito à navalha na garganta. A partir daí, existe um produto e nãos mais um ser vivo. A carne é separada do couro, que é depilado, para que fique uniforme. Depois ele passa por uma navalha circular separa a derme do resto. O que antes era feito nos países ricos, hoje passou a ser responsabilidade também de emergentes como a Índia e o próprio Brasil – atualmente fortíssimo na exportação do couro. O desperdício de água é um dos fatores mais alarmantes dentro dos frigoríficos. Em média, são gastos 15 mil litros de água para produzir 1kg de carne. Além disso, todo o lixo que sobre ao final da produção é descartado nos rios. Mesmo quando este é enterrado, existem impactos irreversíveis. Naquele local, nada mais poderá ser plantado, uma vez que na maioria das vezes o material está infectado pelo Cromo, elemento químico prejudicial à saúde e fortemente presente dentro deste seguimento. Silvana também alerta: todo o pesticida utilizado na hora de higienizar o animal acaba indo para a terra e contaminando os lençóis freáticos. De acordo com Sergio Schlesinger, economista e consultor na área socioambiental e de impactos do agronegócio da FASE, organização não governamental voltada para a promoção dos direitos humanos, gestão democrática e economia solidária, a soja é a maior cultura do Brasil, seguida pela produção da carne bovina. “A monocultura ocupa 33 milhões de hectares. Desse total, 95% é utilizado como ração de animais em confinamento. A carne, no caso, é a mesma coisa. São 200 milhões de hectares desmatados para criação do gado”. Sérgio é um dos responsáveis pela pesquisa sobre commodities, pecuária e grandes empresas, e impactos dela nos biomas Amazônia e Cerrado do “Atlas da Carne”, publicação lançada este ano pela Fundação Heinrich Böll, organização política alemã que faz parte da corrente política verde, e no informativo “Cadeia Industrial da Carne”, também de autoria da instituição. Ele aponta, também, que ao longo de seus dez anos de atuação, o que mais o surpreende é a
A
MOVE FASHION Novembro 2016
CAPA
A
falta de informação da população civil com relação ao assunto. “Quase ninguém sabe como a produção de soja está ligada à de carne e consequentemente ao couro. Grande parte da colheita é voltada para isso”, declara, além de reforçar que é necessário saber qual o nível de estrago que cada seguimento causa na natureza. “Isso tem que ser trabalhado. Você não pode obrigar as pessoas a não comerem carne e não consumirem produtor oriundos de pele animal, mas tem algumas coisas que você pode fazer, por exemplo, esse trabalho de mostrar a elas como isso causa problema, inclusive na questão do aquecimento global”.
imais, diz que a medida não visa o bem do consumidor, e sim do próprio comércio. “Eles alegam que é em defesa do consumidor, mas a gente sabe que é em defesa da indústria, assim eles criam mecanismos para dificultar a venda de produtos alternativos”, afirma. Outro ponto que gera polêmica e desperta o debate entre os movimentos veganos é o cuidado animal. O Ministério da Agricultura lançou, há oito anos, uma cartilha que ilustra como devem ser tratados os animais dentro dos frigoríficos. Existe uma legislação, também, que rege esse tipo de tratamento. São proibidos choques, ataques com varas e surras.
Não é só o gado que é utilizado na produção de roupas, sapatos e outros adereços. De acordo com Ricardo Michaelsen, do Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB), o produto pode ser originário de outros animais. “A maioria é bovina, mas tem pele de carneiro, cavalo, ovelha e até peixe. Na Oscar Freire, muitas lojas vendem bolsas feitas com a pele do Pirarucu, que é um peixe grande. São caríssimas, por sinal. O abate de cavalos é mais voltado para a exportação. Tem o couro de cobra Piton, considerado artigo nobre, vem da Malásia. Aqui nós não abatemos cobra pois é proibido por lei”. O CICB é responsável pela Lei Do Couro, a 4888-4/65. Vigente há 50 anos, ela diz que só pode ser chamado de couro o produto que for feito de pele. Para garantir que os estabelecimentos cumpram a norma, as chamadas Blitz do Couro rondam todo o território nacional buscando informar os comerciantes. Ao todo, mais de 18 mil lojas já foram fiscalizadas. Em São Paulo, foram mais de 30. A Hering, varejista famosa no meio da moda, foi uma das marcas advertidas pela lei. “A primeira coisa que eles recebem é um alerta, material de apoio e em seguida, caso nada mude, uma notificação extrajudicial. Havendo a insistência, nós passamos a tomar medidas mais fortes como busca e apreensão junto à Polícia Civil. Em alguns casos nós tentamos acionar o PROCON, mas ele nem sempre tem agido”, explica Ricardo.
Uma reportagem feita pela Repórter Brasil, organização que investiga casos de trabalho escravo, aponta que a JBS, grupo responsável pela Friboi, é pioneira na violação destas regras. Inúmeras são quebradas diariamente nas fazendas que fornecem produto para a companhia. Essa não foi a primeira denúncia e mais uma vez, a empresa procurou se retratar publicamente e assim, ganhou a confiança de ONGs com quem antes tinham uma relação turbulenta. O Greenpeace, por exemplo, é uma delas. Em 2012, após a companhia de frigoríficos estabelecer o compromisso de zelar pela preservação ambiental, a organização e os ativistas reataram laços. A decisão foi divulgada no site brasileiro da instituição. Quando procurado pela MOVEFasion, o Greenpeace se recusou a dar entrevistas. A JBS declarou não ser responsável pelo manejo interno das fazendas, e sim, somente, dos que trabalham diretamente para eles.
Douglas Ribeiro, publicitário e idealizador da CAMALEÃO - Ativismo pelos Direitos An-
Silvana, da ANDA, revela que a militância das ONGs mundialmente conhecidas não passa de propaganda. “Eu não tenho o mínimo de respeito pelo Greenpeace. Eles deixaram de lutar a muito tempo e hoje não se preocupam com nada além da captação de recursos”. Douglas reafirma a fala da colega de militância. “Hoje elas se tornaram corporações. Ocultam informações porque é muito mais fácil não incomodar as pessoas. Trazer reflexões e propor mudanças que sejam realmente verdadeiras é complicado. Só que agindo desse jeito, você não causa nenhum tipo de desconforto ou transformação
A
Novembro MOVE FASHION MOVE Novembro 2016 2016
CAPA
A
Todo o tecido utilizado no ensaio é sintético, ou seja, não é feito de pele animal
maior”. Além disso, revela que, em sua opinião, é impossível existir um bem-estar animal quando se trata de produção de carne e couro. “Seja uma fazenda pequena, familiar ou industrial que cumpra ou não a legislação, isso em nada respeita os direitos animais. Em todos os casos, ele será considerado escravo. Por mais que você possa ter leis severas com relação a como eles são tratados desde quando nascem até quando são mortos, ainda assim, eles estarão em desvantagens”. Não é difícil ver, na internet, vídeos que mostram bois e vacas visivelmente abalados antes do abate. Alguns chegam até a chorar. Esse tipo de imagem causa dúvida nos internautas que ficam se perguntando: é real, ou não? A veterinária formada pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Maria Carolina Lepiane, afirma que sim, é verdade. “Os animais entendem o que está acontecendo ao redor, por isso ficam tão agitados. Eles sabem que vão morrer. Inclusive, o estresse que eles passam pode afetar o consumidor que come essa carne”, explica.
• Você sabia? O uso do termo “direitos DOS animais” está errado. Quando se usa esse tipo de expressão, passa-se a ideia de que são direitos de terceiros, de um grupo no qual não estamos inclusos. Porém, é importante lembrar, que as pessoas também fazem parte do reino animal de acordo com a definição biológica. “É importante reconhecer que somos uma espécie dentre várias outras. O reino humano não é superior”, explica Douglas, da CAMALEÃO.
v
Douglas Ribeiro, vegano, fundador e ativista da "Camaleão", organização que luta pelos direitos animais
Foto: Gabriela Lira
Quando questionados sobre o porque as pessoas ainda usam tanto couro no Brasil, a resposta dos entrevistados foi unânime: estética. Para todos eles, o material, assim como o consumo da carne em si, passa uma ideia de poder e riqueza. “Antigamente usava-se a pele do animal e os dentes dele ao redor do pescoço para mostrar poder. Curiosamente esse hábito se manteve até hoje. Com algumas modificações, é claro, mas a essência é a mesma. Existe também, é claro, um marketing por trás dessas indústrias que incentivam o consumo cada vez mais. Não é à toa que hoje o Brasil é referência na área”, expôs Sérgio, da FASE. Uma das alternativas mais procuradas é o sintético que imita couro feito a partir da seringueira, árvore usada como matéria prima para o látex. Ricardo, do CICB, revela que na etiqueta de todo produto têxtil, é obrigatório ter a sua composição. “Existe a lei 11.211 de 2005, que ainda anão entrou em vigor por problemas de governo e do IMETRO não ter verba para fiscalizar. Essa é uma lei que exige que em qualquer peça tenha a composição do vestuário”.
Como reverter o dano ambiental e as violações dos direitos animais causados pela indústria? A resposta é simples: buscando informações, estudando, e reduzindo o consumo. “É inegável que um mundo mais vegano traz inúmeros benefícios. Eu sempre digo que nós deveríamos comer livros. Não existe mudança sem motivação sólida”, diz o ativista Douglas.
A
A
CAPA
PERFIL
Luisa Bresser, criadora da Deli em seu ateliê na pequena sala dentro da Galetia TATO em São Paulo.
Minha joia, meu mantra Dona da marca de joias Deli Jewels, Luisa Bresser é apaixonada pela arte e pelo mundo sustentável.suas joias são como almas.
Por: Giovanna Mendes Fotos: Thamiris Gomes Um belo dia de sol, 11h30 da manhã no pequeno Coffe Lab, no movimentado bairro da Vila Madalena, uma calmaria em meio a uma terça-feira comum pairava. Ali sentada em uma aconchegante e agradável mesa, sentou-se tomando um café coado parecido com os que tomamos em casa, uma moça de cabelos loiros e olhos claros que chamava atenção por suas inúmeras tatuagens e seus delicados colares e anéis. Não se tratava de uma mulher qualquer, mas de Luisa Bresser, uma das designs com o trabalho mais diferente no ramo das joias. Ela preza pela produção de joias sustentáveis e o consumo de forma consciente. “Só desenho peças que eu uso, às vezes eu faço a peça, produzo, se eu não for usar, eu tiro ela do mercado” diz. Arquiteta e amante de desenho, fez sua pós em design marketing, e estudou Styling em Londres. Apaixonada por artes, ela se juntou a um amigo de faculdade François Skaf, que já fazia parte do ramo da criação, e iniciou sua história com as joias. Ao ser questionada sobre o segmento do projeto, Luisa conta que começou a perceber que a ideia inicial não era a sua cara. Muito direta e clara ela se expressa dizendo: “Ele trabalhava com pedra de valor e eu ten-
tava buscar um significado e sentidos para as joias, gostava da estética delas. Começamos a desenhar coisas muito diferentes. Foi quando nos separamos e eu montei a Deli” Recomeçando, assim nasceu a marca de joias Deli Jewels. “Acredito que o mundo está precisando dessa consciência. São joias com alma”. O nome é por conta do “Delicatessen”, termo conhecido nos EUA para escolhas do que comer no dia a dia, uma fruta ou um sorvete. Esse é o conceito da marca, de poder escolher uma joia para o dia a dia: “eu não troco de joia, tomo banho e durmo com elas” diz a Designer. Isso explica uma parte da matéria prima ser o ouro, o latão ou outro material estragaria quanto a durabilidade. “Precisa ser uma coisa douradora que você consiga usar no dia a dia.” Com suavidade e descontração ela administra o escritório e ateliê da marca, na galeria Tato também localizada na Vila Madalena, praticamente ao lado do café onde se iniciou a conversa. Em um ambiente cercado de paredes claras, moveis e prateleiras abrigam peças e matérias primas de suas joias. Em pouco tempo ali presente já é possível perceber a forte ligação que Luiza tem com suas duas amigas e sócias. Carmen Marie, que atua como consultora de branding e tem foco no desenvolvimento da construção da marca, e Cecilia Domingues, consultora de
A
A
Todas as peças são feitas de maneira artesanal e criadas pensando no conforto e praticidade dos clientes
reeducação financeira, que cuida de tudo que envolve a realidade financeira da marca. Enquanto se preparava para algumas fotos, Luiza conta que na próxima semana mudara para uma sala maior, por conta da grande demanda de clientes. Apesar de ser uma marca de produtos online, ela recebe alguns clientes específicos em seu escritório. A demanda estava tão alta que do lado de fora da Galeria, já estava presente uma nova candidata a possível contratação. Ela precisava de mais alguém para auxiliar na assistência da sua loja. “A proposta é ser democrática. Vi o universo das bijoux se desenvolver e a alta-joalheria ficar distante. Quero ocupar essa lacuna”. A marca segue uma linha orgânica com foco nos detalhes. A repórter olhou para suas mãos e perguntou se eles tinham algum significado. “Todas as peças tem um significado que vão de encontro com as buscas de seus ideais. Cada joia se remete a um nome: equilíbrio, remember (um anel com um fio amarado, com a intenção de lembrar de algo ou alguém) o anel now (ligado a medição e yoga)”. Todos os designs e desenhos das peças são ligado a vida da arquiteta. De uma forma bem delicada ela se explicou: “A produção é em série, para que as elas sejam sempre mais acessíveis para o meu público. Meu foco é que a pessoa compre uma joia ao invés de uma bijuteria cara. Então eu produzo em série. Não consigo viabilizar uma peça só.”
um pote de pipoca, até um porta caneta”, diz. Ter uma vida tranquila, um consumo consciente, não produzir em massa, não gerar desperdício. Todos são conceitos que a Design usa no seu dia a dia. “Difícil ser 100% sustentável, os materiais precisam ser muito desenvolvidos. Tem uma escassez grande de material sustentável. Acho que é uma tendência que está melhorando muito, desde o tempo que eu trabalhava com arquitetura, tem muito chão ainda”. E por fim, no seu dizer ela define: “Disciplina é liberdade. Fazer o que deve ser feito, para então, poder fazer melhores escolhas em nossas vidas”.
v 6Luisa em seu escritório, mexendo nos colares que
são considerados terços. “É só fazer um pedido e mentalizar coisas boas” diz.
A sustentabilidade é um conceito embutido na marca e em sua vida. A dúvida era: A marca é totalmente sustentável? Ela se explica dizendo “A marca não pode ser considerada totalmente sustentável, até porque a sua matéria prima é extraída da natureza, o ouro”. E são nas pequenas atitudes que conseguimos enxergar que o projeto anda lado a lado com a as mudanças. Luiza explica que tudo começa por sua embalagem, ele vem de um material parecido com papel, e pode ser reutilizado. “Queria que a minha embalagem tivesse um reaproveitamento. Foi assim que desenvolvemos uma sacola que pode virar desde
A
MOVE FASHION Novembro 2016
coluna
Por: Susana Sarmiento
A indústria da moda já esteve envolvida com trabalho escravo por diversas vezes. Grandes marcas já tiveram seu nome exposto na mídia e foram parar na justiça por explorar seus funcionários. Em maio de 2014, por exemplo, grife espanhola Zara admitiu manter seus colaboradores em regime de servidão. Inspirada em experiências internacionais e com o objetivo de trazer à tona esse tipo de informação para o consumidor de uma maneira rápida e fácil, uma das maiores fontes sobre trabalho escravo no país, a ONG Repórter Brasil, criou em 2013 o aplicativo Moda Livre. A plataforma é a primeira com o desenvolvimento no Brasil que traz avaliações das principais empresas do setor da moda, com o objetivo de evitar que suas peças sejam produzidas por mão de obra escrava, além de avaliá-las e publicar notícias sobre as marcas envolvidas. O aplicativo conta com 77 grifes varejistas. O público-alvo central são os jovens que se interessam por moda e estão entrelados a comunicação por meio de telefones celulares. Mas essa não é a única camada que os desenvolvedores do projeto querem atingir. Qualquer pessoa que queira consumir de maneira consciente pode baixar o programa e navegar por ele. Em 2014, a Walk Free Foundation, organização sem fins lucrativos, divulgou uma pesquisa que apontou 36 milhões de pessoas vivendo sob regime escravo ao redor do mundo. No Brasil, de acordo com o Índice Global de Escravidão deste mesmo ano, há 155.300 pessoas nestas condições. Entre 2009 e 2015, 20 grandes marcas foram
denunciadas. Entre elas estão renomados varejistas como a Renner, que só no segundo trimestre desse ano teve um lucro líquido de R$ 174,8 milhões, e a M. Officer. A questão é: por que as pessoas ainda consomem marcas que já foram indiciadas? Essa é uma pergunta difícil de ser respondida. Por isso é importante o consumidor fazer uma pesquisa sobre as marcas antes de comprar e evitar aquelas que já tem passagem por trabalho escravo ou qualquer tipo de assédio. Apesar de acontecer bastante, a Repórter Brasil não recebe denúncias, e sim divulga pesquisas sobre o assunto até por ser um canal de comunicação. No Brasil, O órgão fiscalizador das questões trabalhistas de uma forma geral é o Ministério do Trabalho. O MT tem grupos específicos que lidam com esse tipo de situação, e é o principal receptor de denúncias do país. Em alguns casos, procuradores do trabalho também entram em atuação.
v
Foto: Gabriela Zakatei
A
Do outro lado da moda
Artigo
Do lixo ao reciclado Por: Jonas Lessa nas condições de uso, muitas vezes ainda novas, retiramos cada logo presente nos uniformes e substituímos por um retalho. As peças descaracterizadas são então encaminhadas para reutilização. Tendo os uniformes como matéria-prima fundamental, desenvolvemos brindes corporativos sob demanda, os quais já possuem a identidade visual do cliente e podem ser produzidos para uso interno ou para distribuição em campanhas específicas. Após todo esse processo, destinamos os produtos às empresas. São nossas parceiras instituições como a Sem Parar, por exemplo. Procuramos estabelecer contato com o maior número possível de organizações que nos procuram para desenvolver ideias ou dar sugestões. Até agora o feedback tem sido positivo e nosso objetivo é expandir a iniciativa para todo território nacional.
v
Foto: Gabriela Lira
Somos quatro sócios. Nos conhecemos na faculdade, todos no curso de gestão ambiental da Escola de Ciências, Artes e Humanidades da USP Leste. No terceiro ano da graduação fomos fazer uma extensão em empreendedorismo no campus de economia da universidade, localizado na cidade universitária. Um dos pontos abordados durante o tempo de curso foi o quão prejudicial a indústria da moda é para a Amazônia. Para a nossa surpresa, uma área equivalente a um campo de futebol do tamanho do Maracanã é desmatada diariamente na região. Até hoje, perdemos mais de 200 milhões de hectares. Além disso, o Brasil quase campeão em produção de lixo. Perdemos somente para os Estados Unidos! Ficamos assustados e entendemos que deveríamos fazer algo para reduzir, mesmo que minimamente, esse impacto. Foi aí que surgiu a Retalhar, em 2012. Funcionamos de maneira simples e prática. O projeto consiste em um negócio social que dá transforma resíduos de tecidos, como uniformes usados, em matéria-prima para outros produtos em vez de deixar que sigam para aterros ou para a incineração. A manufatura reversa, realizada por mão de obra inclusiva, destinamos o tecido resultante à reciclagem, que envolve as seguintes etapas: trituração, desfibramento e reinserção no setor industrial para diversas finalidades, tais como construção civil, mantas acústicas e indústria automobilística. Um dos nossos pilares é a justiça social. Sendo assim, descaracterizamos os uniformes descartados para o posterior aproveitamento como matéria-prima para a produção de cobertores populares, destinados à campanha do agasalho da empresa contratante. Considerando o descarte de peças em ple-
Jonas tem 24 anos, fundador da Retalhar no ateliê em São Paulo
A
MOVE FASHION Novembro 2016
resenha
A
Beleza sustentável LUSH Fresh Handmade Cosmetics (LUSH Cosméticos Frescos feitos à mão) é uma empresa internacional de cosméticos sustentáveis com mais de 850 lojas em 51 países Por: Thamiris Gomes Fotos: Diogo Perez Muito conceituada no mundo da moda e beleza, arranca elogios não só pela qualidade dos produtos, mas pela política e visão da empresa, como não aprovar testes em animais (combate essa prática, é 100% vegana), todos os cosméticos são feitos a mão, usando pouco ou nada de conservante e embalagens que prejudiquem o meio ambiente. “Nós acreditamos que palavras como “Fresco” e “Orgânico” tem um significado sincero, que vai além do marketing”. Em sua página do facebook, a marca deixa claro sua visão sobre a moda e produtos sustentáveis. Desde agosto de 2014, quando a marca inaugurou no Brasil a sua maior loja da Lush no mundo todo, conta com um leque de novos produtos e um SPA multisensorial, criado com a ajuda de uma terapeuta ocupacional e hipnoterapeuta. Eles usam músicas, cores, aromas, texturas e sabores para estimular os cinco sentidos. Além disso, são usados no spa produtos que não vendem em loja alguma. A marca acredita na sustentabilidade e na fidelidade de quem consome a loja e os produtos. Cria diversos meios para que o consumidor se sinta a vontade para voltar. Como, por exemplo: quem retorna a loja com embalagens vazias é recompensado. (todas as embalagens são recicláveis); Dá segurança a quem consome, pois além do uso
de produtos vegetarianos, conta a você quando e como cada item é feito; Há 4 anos foi criado o Slush Fund, um fundo dedicado a projetos sociais em vários lugares do mundo. A Lush é cheia de criatividade, inovação e ativismo. A beleza está ligada a produtos caríssimos? A Lush prova que não. Além dos mais diversos produtos, cheiros, tratamentos para cabelo, corpo, rosto, possui uma linha de maquiagem e perfumes. São mais de 300 mercadorias à venda. Confira mais em: br.lush.com e facebook.com/ lushbrasil
Crítica
MOVE FASHION Novembro 2016
Aperta o play! “Traceable” (2014) Dirigido e produzido por Jennifer K. Sharpe, o documentário expõe a realidade da indústria movida pelo fast-fashion, onde o que vale é a velocidade em que as peças são confeccionadas. O longa mostra cenas que retratam a triste realidade, mostrando as comunidades afetadas por este fator e as condições em que as peças são produzidas.
“Moda Sustentável” (2015) Prático, dinâmico e fácil de ler. É assim que pode ser definido o livro lançado pela pesquisadora e professora de moda Alison Gwilt, que no decorrer de suas páginas traz um guia prático para a aplicação da sustentabilidade dentro da moda. Desde técnicas de criação a possíveis modelagens de peças, o livro foca a todo o momento em estratégias e tendências que designers e estilistas podem apostar para tornar suas peças sustentáveis.
“The Story of Stuff” (2007) Este talvez seja um dos melhores documentários para quem ainda possui grandes dúvidas sobre as consequências de um consumo abusivo. Narrado e conduzido por Annie Leonard O filme conta de forma didática de onde vêm e para onde vão muitas das coisas que consumimos no nosso dia a dia, e entre elas estão nossas roupas, calçados e acessórios.
A
A MOVE FASHION Novembro 2016
Fashion
MOVE Sustentabilidade e moda podem andar juntos. Os sintéticos estão em alta e se assemelham cada vez mais ao oriundo de pele animal. Qualidade e conforto são características das peças criadas a partir da seringueira.
Modelos: Caio Lobo e Pétala Leite
A
A
O modelo Caio Lobo veste jaqueta de material sintético, que apesar de ser esteticamente parecida com o couro, não degrada o meio ambiente e nem desperdiça água durante a produção.
PĂŠtala Leite veste um modelo clĂĄssico de jaqueta inspirada nas mais famosas grifes mundias.
A
A
A partir da seringueira, árvore que produz o látex, empresas passaram a produzir roupas, sapatos e bolsas que se assemelhem a couro como alternativa para o consumidor que não concorda com o modo que os animais são tratados dentro dos abatedouros.
A