Õ Natal de Bolachinha, de Rosa Maria Santos

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Criação do Presépio

Emília Godinho

Rosa Maria Santos



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Ficha Técnica Título:

O NATAL DE BOLACHINHA Autor

Rosa Maria Santos Capa:

Composição de José Sepúlveda Presépios

Emília Godinho Imagens de Bolachinha e Luizinho

Glória Costa Coordenação Editorial

José Sepúlveda Rosa Maria Santos Edição

Rosa Maria Santos Formatação

José Sepúlveda

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Índice

Ficha técnica

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Rosa Maria Santos

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O Presépio

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Viagem a Belém

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O Quarto Rei

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O Menino Jesus

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Regresso a Belém

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Rosa Maria Santos

Naturalidade Dume,Braga

S.

Martinho

de

Residência – Braga Muito pequena, foi viver para Braga, freguesia de Maximinos. A base do seu equilíbrio emocional está no seio familiar. É na família que encontra a alegria de viver. Viveu na Costa Litoral Alentejana, em Sines, trinta e um anos, tendo regressado em 2017, à cidade que a viu nascer, Braga. Participou em diversas coletâneas: Poesia concorso Artemozioni, Cantico dei Cantici In Valle d’Itria. 2º Prémio de Poeti Internazionali. É Colunista no site Divulga Escritor, possuindo também uma rubrica na Revista com o mesmo nome. Foi Assistente de produção e recolha na coletânea de postais do Solar de Poetas Poeta Sou…Viva a Poesia; participou nas coletâneas de postais de Natal do mesmo grupo: Era uma vez… um Menino; Nasceu, É Natal; Não Havia Lugar; Belém Efrata, todas editadas em e-Book. É Administradora dos grupos: Solar de Poetas, onde coordena a equipa de Comentadores; Solarte – a Arte no Solar; SoLar-Si-Dó, a música no Solar; Canal de Divulgação do Solar, Casa do Poeta; SolarTV Online e Poetas; Poveiros e Amigos da Póvoa.

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Rosa Maria Santos A escrita é uma das suas paixões… Não se considera escritora nem

poetisa, mas uma alma poética a vaguear pelo mundo... Se um dia deixar de sonhar, diz, deixa de existir. Livros editados: Rosa jasmim (poesia), Capa do Mestre Adelino Ângelo – Julho 2018 E-Books: Cantam os Anjos (poesia de Natal) – Capa de Adias Machado -Dezº 2017 Ucanha terra de encanto Capa: Glória Costa – Maio de 2018 Bolachinha em Tarouca (prosa e poesia) – Capa: Glória Costa – Maio 2018 Bolachinha vai à hora de poesia – Outubro 2018 Bolachinha vai à Casa Museu Mestre Adelino Ângelo – Novembro 2018 Sinos de Natal, Natal de 2018 O Natal de Bolachinha, Natal de 2018 A editar: Histórias da Bolachinha – Capa e ilustrações de Glória Costa – Em breve

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O Presépio

PINTADO À MÃO POR EMÍLIA GODINHO


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Quinze dias de azáfama nas compras. Como era bom sentir o espírito natalício. Bolachinha e Luizinho gostavam daquele ambiente, de correr nos corredores dos centros comerciais, de ver belas árvores cheias de cores e luzes, presépios. Toda essa ambiência os encantava. Sempre que podia, Bolachinha arrastava Mãezinha para que pudesse apreciar um pouco mais todas aquelas figuras cheias de magia. Estava fascinada, cada um, o mais belo. Faltava uma semana para o grande dia. Bolachinha e Luizinho estavam impacientes, o momento de preparar o presépio parecia nunca mais chegar. - Mãezinha, quando fazemos o nosso presépio? Já faltam tão poucos dias! As lojas e as ruas já estão todas enfeitadas. Tão lindas! Temos que preparar a nossa casa, não é? Mãezinha olhou Bolachinha e Luizinho e respondeu:

- Estamos à espera que o Paizinho chegue, deve chegar hoje ou amanhã. Houve atrasos nos voos, os aviões nesta época do ano estão quase sempre atrasados. Vamos aguardar, sim, meus queridos? - Está bem – concordou Bolachinha – O que vamos fazer hoje? - Que tal um bolo? - Um bolo? Que bom, nós vamos ajudar. - Nós ajudamos, Mãezinha, Vem comigo, Luizinho, Traz açúcar e farinha… - Muito bem mas juizinho!

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- Sem ter desarrumação - Temos cuidado, Mãezinha. - Traz baunilha, massapão, Não entornes, Bolachinha. Há cacau na prateleira Precisamos de fermento; Põe na mesa a batedeira E os ovos, nesse momento - Nada falta? Que canseira! - Balança, garfo, colher, Tijela e sem asneira Vamos a massa bater O chocolate, a baunilha, Estão no forno a cozer Como crescem, maravilha, Quase pronto p’ra comer Neste entretanto, a porta de entrada abriu-se. Era o Paizinho, mesmo na hora de provar uma bela fatia de bolo. - Hum, que delícia! Mãezinha colocou o bolo num prato e complementou com pedacinhos de queijo, leite, chá e algumas bolachas que antes tinha preparado. Paizinho aproveitou para contar algumas peripécias que tinha vivido nesse dia, quando ainda distante da família.

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Mãezinha perguntou:

- Queres mais bolo, princesa? - Obrigada, Mãezinha, agora não. Embora me apeteça (o bolo está delicioso), prefiro ir fazer o presépio. Agora que chegou o Paizinho, já pode ajudar, não podes, Paizinho? - Que impaciência, querida. Bem, vamos lá ao presépio. Espera um pouco só. - Luizinho, queres mais bolo, querido? – Obrigado, Mãezinha, está mesmo uma delícia mas, como diz Bolachinha, vamos lá ao presépio. Vamos a isso, Paizinho? O pai sorriu e apressou-se a ajudar. Afinal, era isso que os seus filhinhos tanto queriam. Além disso, o tempo para partilhar da sua companhia era já tão pouco, não queria dececioná-los. Mãezinha foi à arrecadação. Luizinho e Bolachinha correram para a ajudar a trazer as pequenas caixas guardadas com tanto cuidado desde o último Natal. Tão belas, coloridas, em madeira que tinham passado de geração em geração. - Bolachinha, segura esta caixa, querida. Cuidado, não deixes cair. Mas, num ápice, a caixinha estatelou-se no chão e Bolachinha gritou: - Desculpa, Mãezinha, não sei como aconteceu, Estava com tanto cuidado

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E correu para a sala aos soluços. Paizinho, quando a viu, abraçou-a e perguntou: - Que aconteceu, princesinha? - Fiz asneira, Paizinho, segurei mal a caixinha e deixei-a cair, se calhar parti o que tinha dentro. E lá vai o nosso presépio. - Não chores, querida, se partiu alguma peça, eu arranjo, sim? Não te quero ver triste. Vem daí, vamos ajudar a Mãezinha e o Luizinho. - Querida, vai ser aqui Que o presépio vamos ter Eis o espaço que escolhi E é bem bom, podes crer

O Luizinho e Mãezinha Vão gostar e aprovar. Vem ajudar, Bolachinha, E vamos tudo arrumar Não estejas preocupada Pois tudo tem solução Se quebrou, vai ser colada Ao chegar a ocasião. Conformada com as palavras do pai, Bolachinha foi ajudar. Mãezinha, que ouviu toda a conversa entre os dois, preferiu não interferir. Voltou à arrecadação e minutos depois regressou, trazendo várias caixinhas, ajudada por Luizinho.

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- Aonde vamos fazer o presépio, perguntou Luizinho.

Paizinho?

- Coloquem aqui as caixas por ordem. E vamos começar lá o trabalho, o nosso presépio vai nascer. Bolachinha acomodou-se ainda Mãezinha aproximou-se e segredou-lhe:

cabisbaixa.

- Está tudo bem minha, querida, o Paizinho arranja a peça, se for necessário. - Vamos todos trabalhar Nosso presépio querido Pois há muito que lhe dar Não é isso, meu marido?

- Um pouco de musgo aqui No chão vamos colocar O burrinho e a vaca ali Vamos lá desembrulhar - Retiradas uma a uma Começamos a enfeitar Espalhamos a caruma Para poderem passar A cabana é deste lado Maria do esquerdo O pastor com o seu cajado Olha atento mas sem medo

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A manjedoura, a palhinha E lá José e Maria Que esperam de manhãzinha Seu filho, com alegria Bolachinha interrompe ansiosa e pergunta: - Antes de ser dia? Não vamos colocar o Menino? Quando vamos colocar o Menino Jesus, Paizinho! Um presépio sem o menino, não tem graça! Tanto tempo ainda que falta para o Natal! - Acalma-te, pequena – pede a mãe. - Não sei, não gosto de ver o presépio sem o Menino Jesus… Todos sorriem… - Passo a passo, Presépio vai surgindo. Tantas figuras, bolas, peças de madeira, quanta cor! Na verdade, um belo presépio. Terminado o trabalho, Bolachinha pulava de contente, embora ainda não convencida com a ausência do Menino Jesus nas palhinhas.

Um a um, os dias foram passando até que, finalmente, nesse dia mágico, Bolachinha acordou. Correu ao presépio e, surpresa, Lá estava o Menino Jesus, lindo, como estava sereno a dormir sobre a pequena manjedoura. Lançava um olhar radiante para o sorriso de felicidade dos pais, Maria e José. - Bom dia, Bolachinha, já nasceu Jesus! Podes darlhe um beijinho.

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Bolachinha baixou-se e reparou no seu narizito.

-

Que aconteceu ao nariz do Menino Jesus? - A caixinha que caiu Das tuas mãos, Bolachinha, Seu narizinho partiu - Foi minha culpa, Mãezinha - Desculpa, lindo Menino, Acidente, podes crer, Será que dói? Coitadinho Talvez esteja a doer! - Nada disso, Bolachinha Está feliz e contente - Talvez, querida Mãezinha, Parece tão sorridente!

- Luizinho, vem ver, maninho, o Menino já nasceu. Temos o presépio mais belo do mundo. Vá lá, acorda, dorminhoco, é Natal. Feliz dia de Natal, Mãezinha, feliz dia, Paizinho. Comovida, abraça-os com carinho e murmura: - Quem sabe se o Menino este ano traz a paz ao mundo e faça com que todos os meninos sintam amor no coração. Luizinho, esfregando os olhos, junta-se à festa e abraça os pais e a mana e, virando os olhos para cima, diz:

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- Obrigado, Jesus, porque nos trouxeste o Paizinho para podermos todos juntos viver a alegria do Natal. É Natal, Paz na Terra aos homens de boa vontade. Glória a Deus nas Alturas. É Natal, haja alegria Porque um Menino nasceu Foi gerado por Maria Mas foi o Pai que o deu Haja paz, felicidade, Neste dia de Natal Haja fraternidade Neste dia especial

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Viagem a Belém

PINTADO À MÃO POR EMÍLIA GODINHO


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- Mãezinha - gritava Bolachinha - Onde estás? Não ouves a campainha da porta tocar? Posso abrir? Diz que sim, deve ser o Paizinho. - Não, Bolachinha, és muito pequena, não podes abrir a porta, hoje em dia todo o cuidado é pouco. - Oh, não se pode fazer nada nesta casa!

- E não pode ser o Paizinho, ainda faltam dois dias para ele voltar. - Que coisa, minha Mãezinha, Já nada posso fazer Vamos lá, vem p’rá cozinha, Não te vais arrepender - Pensei que fosse o paizinho Que estivesse a chegar - Está lá fora, pobrezinho, Poucos dias vai ficar Mãezinha, vem aqui ver, Afinal, é o carteiro Será que vou poder ler Se for carta do estrangeiro? 21


Pode ser do meu paizinho, Se calhar, não poder vir ‘Stá tanto tempo sozinho, Que saudades vou sentir - Todos nós temos saudade Do paizinho, filha minha, Saudades, sim, na verdade, Falta pouco princesinha - Paizinho vou abraçar Ter a sua companhia Meus segredos contar E senti-lo noite e dia Emocionou-se e uma lágrima peregrina desceulhe pela face. Mas logo pensa que o tempo voa e o reencontro não vai tardar. Volta a chamar Mãezinha que não desanca da cozinha. - Já vou Bolachinha, é só limpar as mãos e vou abrir. - Bolachinha, o que se passa, princesa, estás a chorar? -Não é nada, Mãezinha, saudades do Paizinho, apenas. 22


Mãezinha abriu a porta. Era de facto o carteiro. Trazia consigo um grande embrulho que de pronto entregou à Mãezinha que esboçou um sorriso de contente. Bolachinha, perguntou.

curiosa,

com

olhar

arguto,

- O que tem esse embrulho enorme? - Ná, ná, menina, segredinho.

- Mãezinha, diz por favor Porque não posso saber? Lindo embrulho, tanta cor Abre lá, deixa-me ver! Curiosa, Bolachinha Corre a chamar o Luizinho Enquanto vou à cozinha Preparar o almocinho Vou sim, querida Mãezinha, Esse embrulho esconde bem Quem sabe se é uma prendinha Que esse pacote tem?

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Bolachinha correu apressada a chamar Luizinho e logo lhe conta que o carteiro trouxe um grande pacote. Que seria que lá vinha? - Maninho, vem à cozinha, Ajudar-me a encontrar O embrulho que Mãezinha Me disse que vai mostrar Vamos abrir o pacote Para ver o que contém, Mas depressa, rapazote Enquanto ela não vem!

- Com certeza, coisa pouca, Não penses nisso, anda lá Certamente, alguma roupa. Só mais tarde se verá! - Luizinho, Bolachinha, chama Mãezinha, desçam, tenho uma surpresa para os dois. - Uma surpresa? - grita Bolachinha - e sai disparada do quarto do Luizinho que quase tropeça nas escadas. 24


- Cuidado, Bolachinha, ainda te estatelas por aí fora.

Mãezinha sorria ao ver tanto entusiasmo. - Venham comigo à cozinha e vão ver… - O embrulho? Abriste o pacote? Mãezinha sorri e responde: -Esquece o embrulho, Bolachinha, temos algo mais importante que isso. - Mais importante? Mas o que é mais importante que um enorme embrulho com uma prenda? - Diz, por favor, O que é mais importante Quanta surpresa, que horror – Lhe dizia radiante. - Ai que tu, Bolachinha, nem pareces minha filha!

- Pois não que não sou! O Paizinho está sempre a dizer: Tal mãe, tal filha. Porque será que ele diz isso, Mãezinha? - Está bem, espertinha, tens sempre resposta para tudo! Menina espertalhona é o que tu és! 25


Mãezinha aproxima-se da porta da cozinha e Bolachinha empurra com tal ímpeto que quase a partia, estatelando-se no chão. Depara-se então com uns enormes sapatos pretos. Olha de soslaio e dispara: - Paizinho! És tu, Paizinho? Ao ouvi-la, Luizinho dispara a correr por ali fora. Nem se deu ao cuidado de ajudar Bolachinha a levantar-se. E ela ali atónita, a assistir à cena. - Mãezinha estende-lhe a mão, Paizinho e Luizinho ajudam. E ei-los todos de mãos dadas, sorrindo cheios de alegria.

- Que bom, Paizinho, quanta saudade – disselhe, envolvendo o seu pescoço com um forte abraço. - Então, meus pequenos, como estão? - Ainda não refeito, deixa que saboreemos este momento de tanta felicidade. É tão bom sentir-te connosco aqui em casa! - É tão bom ver-te chegar, Nosso Paizinho querido Vais connosco aqui ficar Ou fugir espavorido?

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- Há minutos a Mãezinha Do carteiro recebeu Um embrulho som fitinha E na cozinha o escondeu - Vamos buscá-lo, Paizinho, Ai, como estou curiosa, Vem ajudar-nos, Luizinho, E ver a prenda famosa! Mãezinha, enquanto sorria, desabafou: - Meninos, e se nos fossemos sentar um pouco e deixarmos o Paizinho respirar? Deve estar cansado da viagem. - Vamos sim, Mãezinha, vem daí, Paizinho, vamo-nos sentar um pouco. Conta-nos o porquê de teres voltado hoje! A Mãezinha tinha-nos dito que faltavam dois dias. - Deixa-me olhar-te, pequena, estás cada dia mais linda, uma verdadeira princesinha. Olhou depois Luizinho e disse-lhe: - Estás um homenzinho! Vejo que tens sabido assumir bem o teu lugar na minha ausência, cuidando das nossas princesas! 27


- Esposa querida, que saudades tenho sentido de todos vós. É tão bom quando vejo chegar a hora de regresso ao lar! Enfim, lar, doce lar! - Que bom, Paizinho voltou Está na nossa companhia E desde que cá chegou Vive com mais alegria Ai, meu querido paizinho, Quanta falta nos fizeste, Noutro país, tão sozinho, Quando a surpresa apetece! E tão bom ter-te connosco No sofá, juntinho a nós, Poder olhar o teu rosto E ouvir a tua voz - Não te espantes, Princesinha, Vives no meu coração E a Luizinho e Bolachinha Abraça com afeição Mãezinha, emocionada, Lhes diz: - Vamos conversar Mas Bolachinha, aprumada, Só do embrulho quer falar

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- Esquece o embrulho, pequena, Algo queremos dizer, - Se é do embrulho, vale a pena! Nada mais quero saber! Paizinho interrompe e diz: - Vamos lá conversar um pouquinho a sério. Vou-vos falar do meu dia-a-dia nestes meses de ausência. E disparou uma panóplia de aventuras por que tinha passado. - Ena Paizinho, tantas aventuras essa do teu quotidiano!

- Mas há mais - acrescentou Mãezinha - temos algo de muito bom para vos falar. O Paizinho veio mais cedo para vos proporcionar uma bela e agradável surpresa! - Outra? Venha ela – disseram os pequenos a uma só voz.

- Sim, uma bela surpresa. - Desembucha, Mãezinha, qual é a surpresa? Vais abrir aquele pacote enorme? - Que obstinação, Bolachinha, só pensas no pacote, esquece o embrulho 29


Mais tarde vão saber o que ele vos reserva. Agora sim, vamos lá à surpresa. Daqui a poucos dias chega o Natal e o Paizinho, preparou-nos uma coisa muito especial. Querem saber o que é? - Que surpresa Mãezinha! Diz là! - Já ouviram falar de Belém Efrata? - Belém Efrata? O que é isso? Um novo restaurante que Paizinho descobriu! - Não, Bolachinha, mas já agora, sabes o que quer dizer Belém? Casa do Pão. - Vamos a uma padaria, é essa a surpresa? - Tontinha! Ouve: Era uma vez…

E pôs-se a desenrolar uma história cheia de encanto. As crianças não arredavam pé de tanto entusiasmo. - Atenção – acrescentou - esta é uma história verdadeira! Agora, há que prepararmos as malas, vamos deixar o Paizinho tomar um bom banho e descansar um pouquinho. Amanhã bem cedo vamos de viagem até Belém. - Que bom, visitar A cidade de Belém Toca lá a despachar Bolachinha, vem também 30


- Temos malas p’ra fazer, Tanta coisa p’ra arrumar Não podemos esquecer O que temos que levar - Trata do teu, Bolachinha Do que precisar levar Trato sim, minha Mãezinha, Eu cá me vou despachar Malas feitas e tudo bem arrumadinho, Bolachinha e Luizinho sentaram-se ao lado de Paizinho e Mãezinha. - Que história mais linda! Conta-nos mais histórias assim. - Ora vamos lá a ver. Já vos contei a história do gato malhado? - Não, essa não contaste. - Pois bem… Era uma vez um gato malhado…

Cansados, Luizinho e Bolachinha acabaram de adormecer e sonhar com a fantástica viagem que no dia seguinte iam empreender…

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O Quarto Rei

PINTADO À MÃO POR EMÍLIA GODINHO


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Chegada a Belém, Bolachinha preparava-se para se lançar numa correria desalmada pelas ruas da cidade - Nem penses – admoestou Mãezinha - nesta cidade o perigo espreita em cada esquina. Bolachinha olhou Mãezinha, arregalou os olhos e deu dois passos atrás. E reclamou: - Perigosa como, Mãezinha? Não é esta a terra onde Jesus nasceu? Naquela cabaninha, lembras-te? Já não percebo nada. Se Jesus nasceu aqui, este devia ser um lugar sagrado, onde não pode existir perigo. Está sob a sua proteção. - Como, assim, ó mãe querida, Não pode ser perigosa, Cidade com tanta vida, Tão ampla e tão airosa Aqui mesmo Ele nasceu, Pela história que contaste E o nascimento se deu Para que tudo mudasse Conta, querida Mãezinha, Quero saber a verdade - Luizinho e Bolachinha, Havia muita maldade

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Havia muita incerteza, E ambição sem pudor, Essa gente, a realeza, Não seguia o Seu Senhor Deus o Pai seu filho amado Nesta terra o fez nascer Para livrar do pecado Quem o quisesse atender Um dia, uma linda menina chamada Maria ficou sabendo pelo anjo Gabriel que irá ter um filho chamado Jesus. Quando ela perguntou como seria possível, dado que era ainda jovem e não tinha ainda conhecido homem. E o Anjo lhe disse que essa criança seria concebida pelo Espírito Santo. Confusa, mesmo assim, disse ao Anjo: - Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra. Em seguida, foi para casa e não disse nada a José. Ela era muito obediente e crente em Deus. E, segundo a tradição do seu povo, acabou por casar com José, um homem piedoso e respeitado. - Mãezinha, mas se ela ainda era muito jovem, como pode ter casado?

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Já nada entendo, Mãezinha Como podia casar Se era ainda tão novinha, Com idade p’ra brincar É verdade, Bolachinha, Naquele tempo, essa vida Não era assim, princesinha, Era bem dura, querida - Bolachinha, deixa ouvir O que mãezinha explica Disse o Paizinho a sorrir Deixa que conte - suplica - Não aceito que assim seja Todos precisam de brincar, E não falo por inveja, Que gosto de trabalhar Luizinho replicou: - Bolachinha, és teimosa! Mas ela barafustou E se sentiu mais nervosa Paizinho pega-lhe a mão E falou-lhe com carinho: - Não havia outra opção, Trabalhar era o destino

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E logo uma lagrimita Caiu. Olhou seu irmão E disse: - Minha alma grita Com tamanha confusão Já não sei se quero ouvir Da tua história o final Pois me rouba o meu sorrir Um mundo tão desigual Mãezinha continua a contar a história do Menino Jesus: - Quando Maria está perto de dar à luz, ela e o marido viajam de Nazaré para Belém, a terra ancestral de José, a fim de se registarem no Censo de Quirino. Quando ali chegaram, numa tarde de muito calor, cansados de tão longa viagem, bateram numa e noutra porta, à procura de um lugar onde pudessem repousar. Maria sentia já as primeiras dores e não havia modo de encontrarem um lugar, por mais modesto que fosse, onde se pudessem hospedar. Foi então que alguém, ao ver o estado frágil de Maria, lhes indicou um curral de animais onde poderiam repousar e, sabe-se lá, ver nascer o seu menino. Era na verdade muito humilde o lugar mas mesmo assim, sempre melhor que ficarem ao relento, com Maria já tão prestes de dar à luz.

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E foi assim que Jesus nasceu, no silêncio do lugar, deitado na manjedoura dos aninais que ali se refugiavam. - Não, não pode ser verdade, Como foi acontecer? Não havia na cidade Lugar aonde nascer? Tamanha a sua aflição! Para José e Maria O seu filhinho que então Entre os animais nascia Tristeza, desilusão, Que maldade lhes fizeram Pessoas sem coração Que nem um quarto lhe deram? Não havia, Bolachinha, Quem podia adivinhar Que o burrinho e a vaquinha O iriam afagar E foi assim, pobrezinho, Que José e a pobre mãe Viu nascer o seu filhinho Na choupana de Belém

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- Como é triste, Mãezinha. Povo miserável, deixarem uma mulher tão inexperiente ainda dar à luz um filhinho sem qualquer conforto? - Sim, Bolachinha, essa é a verdade nua e crua - acrescenta Paizinho enquanto, com carinho, limpa a lágrima que desliza pelo rosto da filha. Como era possível que Jesus, aquele menino que ela se habituou a ver nas palhinhas do presépio, tivesse um nascimento tão humilde. Era verdade, certamente, a Mãezinha não sabe mentir. - Vem daí, vamos repousar um pouquinho da viagem e depois daremos uma volta por aí. Bolachinha cabisbaixa recolheu-se no quarto. Mãezinha, ao vê-la triste, perguntou: - Bolachinha, não tens fome? Olhou com ternura para os olhos de Mãezinha e disse: - Obrigada, Mãezinha, estou sem fome. Mãezinha ficou uns momentos a fazer – lhe companhia até que, cansada, acabou por adormecer. Mãezinha afagou seus caracóis, deu-lhe um beijinho e segredou:

- Descansa um pouquinho princesa, eu sei que foi um choque saberes a verdadeira história do Menino Jesus. A maldade humana e a inveja é muita, Princesinha.

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Bolachinha, a dormitar, abriu os olhitos e respondeu: - Que desilusão Mãezinha, o filho de Deus Pai ter nascido tão pobrezinho.

- Descansa um pouquinho. Depois conto mais histórias do Menino Jesus. – Obrigado, Mãezinha, irei descansar, sim. - Até já, minha doçura, Vai lá dormir, princesinha. - Sim, vou dormir à procura Do burrinho, da vaquinha - Hei-de encontrar o Menino E saber como ele está: Se ainda é tão pobrezinho, Eu vos direi amanhã. - Não é hora de dormir, Estás triste, Bolachinha? Quero ver o teu sorrir - Não posso, minha Mãezinha - Um bom descanso, princesa, até já. Paizinho foi inteirar-se de como estava Bolachinha e Luizinho. Este ficara preocupado com a maninha, nunca a vira assim tão triste.

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- Mãezinha, o que vamos fazer se Bolachinha ficar doente? Ela é tão frágil!

a

– Tem calma, não te preocupes, mais logo ela já se levanta e sai por aí a fazer as tropelices do costume. As crianças são assim. - Pois que seja assim, Mãezinha, Deus te ouça, por favor A minha linda maninha Esta triste, sente a dor - Luizinho fica com ela Até quando adormecer E que a sua linda estrela Venha para a proteger A estrela do entardecer Vai vir ao raiar da aurora E só quando alvorecer, O sol desce e vai-se embora Luizinho dirige-se ao quarto da mana e ali fica em silêncio a ouvir a sua agitada respiração. Parece suspirar, até que adormece e acalma, mergulhando num sonho cheio de magia. - Onde estou? Que frio, estou tão mal agasalhada! Esta escuridão causa-me arrepios.

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Ei-la a mergulhar num mundo novo, um mundo que não conhece. - Ena, tanta gente! Que roupas estranhas. Olha para o seu vestidinho de rendas e brocados e compara com os trajes daquela gente, negros e rudes. Parecem assustados. Correm de um lado para o outro, desenfreados. - Fujam – ouve gritar - vem aí o Centurião de Herodes.

Ao perceber-se do perigo, Bolachinha esconde-se e, com destreza, afasta-se, quase sendo atropelada por um cavaleiro. Antes que conseguisse reagir, umas fortes mãos agarram-na e seguram-na com firmeza. Olha de soslaio e depara com um homem de pele queimada pelo sol. - Quem és tu? – pergunta assustada. - Vamos, vamos sair daqui. A tua vida corre perigo. Pensa para consigo: - Desculpa, Mãezinha, não o fiz de propósito. - Não temas, Bolachinha. Deves temer, isso sim, Herodes e os seus sequazes, estão a matar todas as crianças de Belém. Mas dizme, quem és?

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O meu nome é Bolachinha, Uma menina engraçada De chocolate e farinha Pela mãezinha criada. - Mas que grande confusão! O que estás tu a dizer? - Preciso de um coração Que algum dia eu hei-de ter. - Confesso, não acredito Seres Bolacha, de verdade - De um coração eu preciso, Ganhá-lo é minha vontade - Porque estás neste lugar? Quem procuras, Bolachinha? Quero um Menino encontrar Que nasceu numas palhinhas - É um menino especial Vim aqui p’ra o conhecer Tudo fala do Natal Que me custa a entender

- E tu quem és? Algum príncipe das Arábias? - Não, sou o Quarto Rei e também eu procuro esse Menino.

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- Quarto Rei? Como assim? Mãezinha nunca me falou num quarto Rei, ou em algum homem à procura do Deus Menino. Falou sim três Reis Magos, o Belchior, o Baltazar e o Gaspar, conheces os Três Reis Magos? - Preciso de os encontrar. Devia viajar com eles para irmos à procura do Menino. Mas atrasei-me e quando cheguei, já tinham partido. Queres juntar-te a mim e ir comigo à procura do Menino? Salta para aqui, vamos lá à procura do Menino Jesus. - Vamos sim, lá vamos nós Montados no dromedário Que caminha tão veloz Para além do calendário A caminho de Belém E depressa, sem demora Ver Jesus, o nosso bem Deitado na manjedoura - Eu levo-lhe um presentinho Para ao Menino ofertar Ele vai ficar quentinho No conforto do seu lar - Nada tenho, Quarto Rei E me sinto envergonhada - Não faz mal eu te darei Um pão doce e marmelada

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O menino dorme, dorme Num lugar abençoado Talvez tenha frio ou fome Esse Menino sagrado - Que noite mais escura, noite de breu. Nada se consegue ver, como podemos viajar assim? - Acredita, Quarto Rei, Mãezinha contou que uma enorme estrela nos vai indicar o caminho até onde encontrar esse Menino. - E grande a tua fé. Falas com tanta certeza, até parece que sabes tudo o que vai acontecer. Ou já terá acontecido? Diz-me, saberás tu alguma coisa que eu não saiba? Falas com tanto entusiasmo desses Reis Magos e eu que os persigo há tantos dias, ainda não os encontrei.

- Vamos encontra-los, tenho a certeza. O Menino deitadinho No colo da Virgem mãe A vaquinha e o burrinho Zelado por ele têm Com o seu bafo aqueciam O corpinho da criança E os seus pais lhes sorriam Com amor e confiança

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José, seu pai estimado, Zela por seu bem-estar Mesmo já tão cansado Seu filhinho há-de zelar Cada ruido, um alerta A todo os mal que os espreita É já madrugada aberta Quando nas palhas se deita

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O Menino Jesus

PINTADO À MÃO POR EMÍLIA GODINHO


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Bolachinha andava muito contente, sentia-se feliz ao lado do quarto rei. Olhava curiosa para o céu na esperança de ver a estrela divina brilhar e poder-lhes indicar o caminho até à gruta onde o Menino haveriam de encontrar, ali, numa manjedoura ao lado dos seus pais, da vaquinha e do burrinho. Que fascínio! - Bolachinha estamos a andar há muitas horas, o melhor mesmo é descansarmos um pouquinho. O dromedário esta muito cansado… e eu também. - Eu te ajudo Bolachinha - Obrigada, meu bom Rei, Mais logo, de manhãzinha Os teus passos seguirei

- Talvez a estrela divina Seja nossa companheira É forte a luz que ilumina O caminho a noite inteira Um pouco de carne seca E umas frutas pra comer - Cruzes, a carne não presta, Dá-me água, p’ra beber Não a quero, sabe mal, Vê se tens uma maçã - Olha, é bem especial, Que hás-de comer amanhã?

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Colocaram as suas esteiras no chão e deitaramse. Bolachinha estranhou, não estava habituada a dormir no chão… e muito menos ao relento. De cabeça virada ao céu, olhava as estrelas naquele espetro infinito que os seus olhos e do amigo podiam alcançar. - Meu Rei, estás a dormir? Estranho este duro chão, não há perigo? - Há sim, Bolachinha, mas Deus está connosco e nada de mal nos vai acontecer. Tenta dormir, daqui a poucas horas, no alvor da manhã, partimos de novo em viagem. - Espero mesmo que não, não gostava nada de ser mordida por algum animal, até fico arrepiada quando penso nisso. Voltas e mais voltas, de ouvidos sempre bem abertos, à espera de um sono que não chega. Bolachinha não conseguia pregar olhos, tinha medo, muito medo. O estranho é que o Rei dormia num sono e bem pesado. Ó Rei, estás a dormir? - Responde me por favor Ruídos estou a ouvir, Tenho medo, mas que horror. - Vou-me encostar mais a ti Talvez possa sossegar Que medo o estar aqui, Mãezinha, vem-me buscar

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Só posso estar a sonhar! Mãezinha, depressa, vem, Quero voltar para o lar, Onde ficará Belém? Não é sonho, é pesadelo, Tanta, tanta escuridão Eis-me envolta num novelo Que desfio em aflição. De repente, uma estrela refulge lá no céu, dentre todos aqueles pontinhos a brilhar, parecem tão pequeninos, como brilham ao luar. A estrela foi crescendo, cada vez mais brilhante. Era um convite para se levantarem. Tudo deserto, não havia vivalma no lugar. Agora, a estrela irradiava luz em todo o seu redor. Bolachinha levantou-se e exclamou: - Que luz magnífica. Sentiu um leve toque no ombro, deu um salto, uma voz suave murmurou: - Não te assustes, sou eu, estou aqui para te proteger. - Quem és tu? Não consigo ver-te! Que linda voz a tua! - Ó minha estrela divina Que irradias tanta luz O caminho nos ensina Pra chegarmos a Jesus

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- Vem e diz, menina linda, Porque dormes pela rua - O meu nome é Bolachinha, Agora, uma amiga tua Confesso que senti medo Quando o Rei adormeceu Este lugar é um degredo E a noite um denso breu - Vim fazer-te companhia P’ra não estares sozinha Não tarda e chega o dia, Dorme um pouco Bolachinha Mais um dia complicado Muito tens p’ra caminhar O dromedário, pesado, Necessita descansar Cansada, Bolachinha acabou por fechar os olhos e logo adormeceu, reconfortada agora pela companhia da sua estrela. E sonhou estar a brincar com um lindo menino, quase da sua cor, de olhos brilhantes, cor de avelã. Quão diferente do seu estimado maninho! - Como te chamas? – perguntou. -Sou o menino Jesus - disse a criança, esboçando o mais lindo sorriso. Não precisas dizer-me o teu nome, eu sei quem és e o que mais desejas na vida.

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Uma menina muito especial, não é, Bolachinha? Um dia, o meu Pai do céu dar-te-á aquilo que mais desejas, um coraçãozinho de verdade. Queres? - Como sabes o meu nome? - Lindo e querido menino Podes tu adivinhar Que quero um coraçãozinho Para por mim respirar? Ser menina de verdade Ter sangue em mim a correr, Como é grande essa vontade Molhar-me sem me perder - Qualquer dia, Bolachinha, Hás-de ser como o Luizinho Sê paciente, princesinha Espera mais um pouquinho Espero, menino lindo, Sou impetuosa, eu sei, Não olhes para mim, sorrindo, Responde ao que perguntei. - Eu disse-te quem sou. Penso que não tomaste muito a atenção ao meu nome, pois não, Bolachinha!

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- Desculpa mas parece tão estranho estar a falar com o Menino Jesus. Mas como? Na verdade, viemos aqui para te visitar. Que confusão, já nada sei do que digo ou penso. - Devo ter adormecido Vem ver, estrela divina, O Menino está comigo E um coração me destina Sabe bem do meu desejo, Mas como pode saber Que um coração almejo, Sentir o sangue correr - Bolachinha, acorda. Está na hora de partir, daqui a nada rompe o sol e é muito difícil caminhar com o calor. Bolachinha esbocejou e segredou algo ao rei que este não entendeu. Ela, sim, sabia do que estava a falar. No alto, a estrela surgia e acenava para Bolachinha que lhe lançou um enorme sorriso.

- Adeus, estrela brilhante, Contigo, fui descansar E sei que de hoje em diante Comigo hás-de contar Obrigada, minha amiga, Por ficares ao meu lado Já tinha dor de barriga E um pensar angustiado

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O quarto rei estendeu a Bolachinha algumas frutas que restavam na sacola de mantimentos e disse: - Temos que procurar mais mantimentos. Bolachinha perguntou:

reparou

nuns

embrulhos

e

- Que embrulhos são esses? - Prendas para o Menino. Sonhei que brinquei com ele, mas foi só um sonho. Um lindo sonho. Estranho foi ele saber o meu nome, mas nos sonhos tudo é possível. Vamos lá, precisamos mesmo de ir. - Vamos nós, lá vamos nós A caminho de Belém Viajamos dois e sós Num deserto sem ninguém Quarto rei, que vem a ser Esta nuvem lá no ar? Quase nem podemos ver E nem sequer caminhar - Não te assustes, Bolachinha É tempestade de areia Segura bem, pequeninha, A coisa vai ficar feia

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- Mas que foi que aconteceu Porque fui parar ao chão? O camelo endoideceu, Mas que grande trambolhão - Meu rei, não te vás embora Espera-me, por favor Que dor na perna, e agora? Ai, minha mãe, mas que dor! - Como posso eu ir embora Se não sei qual o caminho - Vem, estrela sem demora Ajuda-me, meu maninho - Quem vem aí? Mas que medo…Sinto passos, será algum animal feroz? Ai, Jesus querido, vem ajudar-me. - Mas que linda princesinha! Como te chamas? O que fazes neste deserto infindo sozinha? De onde vens? - Que roupa estranha tu tens. Quem sois vós? – pergunta, surpresa, Bolachinha. Estava mesmo assustada perante aquele homem corpulento que descia do dromedário para a socorrer. - Não me toques. Mãezinha sempre me disse: Bolachinha nunca fales com estranhos. Mãeeeee!

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- Não te assustes, Bolachinha, Se dizes chamar-te assim Eu te ajudo, pequeninha Vem aqui, chega-te a mim O meu nome é Belchior E tens ali Baltazar - Não te assustes, por favor, Sou o rei mago Gaspar Eis-nos aqui, princesinha, Prontos para te ajudar Estende a tua mãozinha P’ra poder te levantar - Há Reis Magos de verdade? Mãezinha falou-me de vós Que grande felicidade Só de ouvir a vossa voz - Vem lá, damos-te boleia Vamos já deste lugar - Já estou farta de areia Ajudem-me a sentar - Assim é que se fala princesa, toca a andar, temos muito caminho pela frente. - Belchior, que levas nesse alforge de couro, cheira muito bem.

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- Levo ouro para ofertar A Jesus que vai nascer - Eu levo Mirra para untar E o Menino proteger O rei Gaspar olha e ri Antes dela perguntar - Que presente que tenho aqui? É incenso para lhe dar - Três presentes tão distintos Para dar ao Deus Menino E que seguem os instintos Que vão ser nosso destino - Como Rei, ouro ofereço - Eu Mirra, por ser promessa, Ao Pai do céu eu agradeço Essa Luz que a nós regressa - Sabes, Bolachinha, é costume oferecer-se ouro a um Rei, incenso a um Sacerdote e mirra a um Profeta. Eu, Belchior, ofereço-Lhe ouro, reconheço a realeza do Menino Jesus - Eu Gaspar, vou-Lhe oferecer incenso, pois reconheço-Lhe o dom da Divindade - Eu Baltazar, vou-Lhe oferecer mirra que representa Imortalidade.

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- E eu, Bolachinha, sou a única que nada tenho para Lhe dar. Como vou arranjar um presente para esse Menino tão especial neste deserto? O que posso eu fazer Quando lá chegar sem nada Ai, não, vou desaparecer, Deixar esta caminhada

Alguma coisa se irá arranjar para ofereceres ao Menino Jesus. Quão feliz se vai sentir se lhe ofereceres a tua amizade, Bolachinha, o teu carinho. Olhem – interrompe Bolachinha – que luz mais fulgurante ali no céu. - A estrela-d’alva, vamos segui-la, é a luz Divina, a brilhante estrela do céu, que nos conduzirá até à gruta onde encontrar Jesus. - Vamos seguir essa estrela Que nos leva até Jesus Tão brilhante, como é bela, Como imana tanta luz

- Tudo diz que Deus Menino Nasceu para nosso bem Nas palhinhas deitadinho Entre os campos de Belém - Nasceu muito pobrezinho Para nos dar a entender O mesmo tão pequeninho É bom saber-se viver

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- Saber viver, na verdade, Viver com sabedoria, Procurar a felicidade, E sorrir dia-após-dia - Estamos quase a chegar, Eis a estrela ali pousada No cimo desse lugar E eis-me aqui sem ter nada Felizes por chegarem ao destino, ao lugar santo onde o Menino estava deitado naquela tão singela manjedoura. A mesma onde os animais comiam o pão nosso de cada dia. Deitado sobre a mesma palha o Deus Menino dormia. Num gesto de louvor e de respeito, espreitaram e sorriram. - Vamos entrar devagar Que o Menino está dormindo No conforto do seu lar Tão sossegado, sorrindo - Eu não sei que lhe hei-de dar, Cada qual tem seu presente E ele não vai gostar De me ver ali diferente - Olha bem, Menino lindo Não trago nada p’ra ti O Menino olhou-a sorrindo E disse: - É bom ter-te aqui

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Bolachinha estava muito feliz, observava tudo ao seu redor, queria levar essas memórias lindas para o seu amado Luizinho. Que aventura! O menino estava tão feliz, era na verdade especial, sorria como se a conversar com ela e Bolachinha parecia entender tudo o que lhe queria dizer. Ei-lo ali, vivo, sorridente, em tudo semelhante ao Menino que tinha no seu presépio, lá longe, no seu lar. Num impulso, aproximou-se e beijou o Menino. Viu então o arranhãozinho na pontinha do nariz. - Oh, desculpa! Lembrou-se que em casa tinha deixado cair a caixinha onde ele se encontrava e que o Paizinho, com muito esmero e tanta dedicação tinha o colado. - Desculpa, Jesus, se tivesse tido mais cuidado, não te tinha magoado. - Meu Jesus, foi sem querer, Que te lancei para o chão Com isso fiz-te sofrer Mas vou ter mais atenção Eu sou uma Bolachinha De chocolate e canela Amassada pela Mãezinha Duma manhã doce e bela! Todos querem o Deus Menino Que aqui nasceu em Belém Na choupana, deitadinho, Ao lado de Sua mãe

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Custou muito aqui chegar, Muitas horas de caminho, E preciso de descansar Foi bom ver-te, meu Menino Quase a adormecer em pé, Bolachinha deixouse cair num monte de palha que ali num canto. Belchior sorriu e disse baixinho a Baltazar e Gaspar: - Deixem-na descansar um pouco, está feliz mas muito cansada, afinal não é todos os dias que se se atravessa um deserto para vir visitar o Menino Jesus.

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Regresso ao Lar

PINTADO À MÃO POR EMÍLIA GODINHO


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Bolachinha estava cansada. Acomodou o seu frágil corpito nas fofas palhas da manjedoura. Entendia agora porque o Menino Jesus dormia descansado nas suas douradas palhas desse bercinho improvisado. - Ó, como te entendo agora, Ó meu menino adorado Quando frio está lá fora E tu aqui confortado Maria, a tua mãezinha, Olha p’ra ti com carinho, A vaquinha e o burrinho Dão-Te o seu bafo quentinho Menino tão procurado, Neste mundo indiferente, És visto por todo o lado Como Deus omnipresente Cansada que estava, acabou por adormecer de tão cansada que estava

O Menino olhou-a, sorrindo, e, mesmo tão pequenino, pareciam brincar à porfia. Com aquele olhar terno, parecia dizer-lhe: - Está na hora, amiguinha, precisas regressar. - Não, meu querido menino, deixa-me aqui ficar um pouco mais! – respondia mentalmente.

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Naquele lugar recôndito, algures nos subúrbios de Belém, parecia ouvir a voz suave de Mãezinha: - Bolachinha, está na hora, querida, precisas levantar-te. Ai, que dorminhoca me saíste! Mas Bolachinha resistia em acordar. Era tão grata aquela companhia, sentia-se tão bem ao lado do Menino! Embora sentisse saudades da Mãezinha, afinal, havia uma eternidade para poder fruir do seu aconchego, da sua companhia. Mas, agora percebia, mais uns instantes e ei-la de novo na companhia da família. - Vá lá, querida, acorda – repetia a mãe afagando o seu rosto. Mãezinha dirigia-se agora a Luizinho com palavras que não conseguia entender. - Marido – dizia a mãe, preocupada porque Bolachinha não respondia aos seus apelos porque será que Bolachinha não responde? Começo a ficar preocupada. Luizinho aproximou-se e tocou as suas mãozitas frias, dizendo: - Mãezinha, a Bolachinha está gelada. - Que se passa, Bolachinha? Fala comigo! – exclamava a pobre mãe.

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- Porque deixas, Bolachinha, O meu coração quebrado Acorda, vem, pequeninha, Queremos-te ao nosso lado Bolachinha, te imploramos Vem ouvir a nossa voz Porque de ti precisamos Para não ficarmos sós Minha querida menina, Desperta, vem, por favor Tu és a luz que ilumina Nosso cantinho de amor - Bolachinha, vem, mana – repetia Luizinho. O pai, inconformado, sabendo que era uma criança frágil, repetia: - Olha, filhinha, esqueceste o embrulhinho que Mãezinha escondeu na cozinha? Bolachinha pareceu reagir ao apelo e, virando-se para o Menino, disse: - Desculpa, meu Jesus, tens razão. Tenho que voltar ao meu mundo. Gosto muito de Ti e nunca te vou esquecer. És e serás sempre o meu Menino Especial. - Já Mãezinha se preparava-se para chamar um médico e ei-la de volta. Abriu os olhitos e, ainda surpresa, exclamou:

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- Mãezinha, Paizinho, Luizinho, aconteceu? Aonde estamos?

o

que

- Princesa - respondeu a Mãezinha - estamos aqui, em Belém Efrata, não te lembras que viemos passar aqui o Natal? - Lembro sim, Mãezinha – respondeu – Não sei o que aconteceu! Mas hoje encontrei-me com o Menino Jesus! Que criança mais linda! Agora, lamento o momento em que deixei cair ao chão o menino do nosso presépio. Magoei-o, com certeza. - Imaginação não falta, Minha linda princesinha, Vamos lá, da cama salta, Dá um abraço à Mãezinha! E lhe disse assim baixinho: Mãezinha, vi o Menino Nas palhinhas deitadinho E fui lá dar-lhe um beijinho Mas, o que mais me custou Foi seu nariz magoado Mas logo me sossegou E disse: - Já está curado Mãezinha abraçou Bolachinha com ternura.

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- Ele tem razão, princesinha, logo, logo ficará bom. Maria irá cuidar dele. O pai aproximou-se e disse:

- E se nos preparássemos para ir ver o famoso presépio de que tanto se fala por aí! - Vamos, sim, Paizinho – disseram a uma só voz. - Vamos lá, então. E logo se foram dali a caminho do centro da cidade para poderem apreciar o belo presépio que todos os dias está patente na cidade de Jesus. - Quanta beleza surpreendido

exclamava

Luizinho

Bolachinha pegou a sua mão e respondeu: - Vem, vou-te apresentar o Menino Jesus

- Apresentar? – disse surpreso - Mas como, Bolachinha? Bolachinha aproximou-se do presépio, tocou na mãozinha do Menino e disse: - Meu lindo Jesus, este é Luizinho, o meu maninho. Quero que o conheças, é um bom menino! No presépio, o Menino pareceu sorrir e dizer: Olá, Luizinho. Tens uma maninha maravilhosa. Um dia vou pedir a meu Pai que lhe dê um coração de verdade. Surpreso, parecendo entender o seu silêncio, Luizinho logo retorquiu:

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- Mas tu falas? - Sim, falo com todos os que me amam e me procuram. Falarei contigo sempre que o desejares. Gosto muito de crianças. - Obrigada, Amiguinho, és de facto muito especial. Natal, dia de união, Tempo de paz e amor De abraçar o nosso irmão Querer um mundo melhor Reconfortai-o na dor Dai-lhes alegria, um lar, E que o Seu eterno amor Possa em vós mesmos pousar Em cada dia da vida E toda a Sua vontade Que um dia foi prometida Nos encha de caridade Meu bom Jesus adorado Que na força desse Amor E contigo a nosso lado O mundo seja melhor E ei-los felizes, de regresso ao lar. Aquela viagem a Belém Efrata não seria mais esquecida no correr de toda a sua vida.

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É Natal! Glória a Deus nas Alturas, Paz na terra aos homens de boa vontade! E, ouvindo o mais suave cântico de Natal, Bolachinha despertou deste sonho lindo no seu lar, doce lar…

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