Corrente n.º 27, setembro de 2019

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Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019

Corrente d’Escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil

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185anos anos 185

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Neste Número

SOPHIA DE MELLO BREYNER E JORGE DE SERNA 100 ANOS DE POESIA


Corrente d’Escrita

Editorial Corrente d’escrita lança uma pergunta e um desafio especialmente dirigido

aos escritores catarinenses: Porque não temos uma Festa Literária do AUTOR Catarinense? As várias, e louváveis, feiras do livro que se realizam em algumas cidades objetivam, essencialmente, não a divulgação da literatura, mas o livro visto como uma mercadoria, necessária, mas não como essencial, à cultura e à formação do homem novo. A maioria dos livros em oferta são de autores estrangeiros, tratando de questões que pouco terão a ver com a nossa cultura, a nossa história. Sem desprimor para casos raros, muitas das vezes os “convidados” são vedetas do show bisness, pagos e bem pagos, enquanto que o principal ator—o escritor local, estadual ou mesmo nacional, fica ausente desses eventos ou não recebe o relevo que deveria ter, tratando-se de um evento que se apresenta como “evento cultural ou literário”. Santa Catarina e os seus escritores teem direito a muito mais. Os escritores precisam de escrever mais (e talvez melhor) e as suas obras devem ser publicitadas, promovidas e absorvidas pelos consumidores do saber e da cultura—os leitores. E o Estado e os Municípios não se podem omitir deste processo. Antes, devem, em conjugação com os escritores e respetivas agremiações, tudo fazer para levar ao cidadão a cultura tão necessária para alavancar o crescimento e o desenvolvimento do próprio país. Proposta feita...

Afonso Rocha—diretor Página 2


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Aproveitando uns dias de ferias em que viajei pelo imenso Brasil, fiz-me acompanhar com um dos melhores amigos: o livro. Como sou apaixonado pela historia, embora nao seja um historiador no rigoroso sentido da palavra, e a area onde me sinto melhor e mais gratificado. Nestes dias de “fare niente” alem de rodar pelas rodovias do país de moto e “escrever” paisagens com a lente da minha camara fotografica, delicieime passeando pela historia da nossa linda e apaixonante Santa Catarina atraves das 480 paginas magistralmente escritas pela escritora Urda Alice Klueger, vertidas e concentradas no seu CRUZEIROS DO SUL, que ela, na entrevista que nos deu e que publicamos hoje no Corrente d’escrita, reconhece ter sido o romance historico que maior prazer e trabalho lhe deu a escrever. De pe mansinho, quase pela calada Urda nos introduz no emaranhado da formaçao da naçao catarinense, família apos família, ano apos ano, geraçao apos geraçao, vilarejo apos vilarejo, vilarejos que despejam em vilas, depois cidades, depois territorios imensos que invadem nossos anos pelo sertao, pelo litoral, pelos planaltos e vargens que emolduram nosso territorio de norte a sul, de oeste a leste. Sao quatrocentos (400) anos de historia viva, num encadear de avos, filhos e netos que se encontram e reencontram em dimensoes e planícies diversas, muitas das vezes cruzados com outras origens, culturas e vivenciando outos CRUZEIROS DO SUL. Tudo começa com um cruzamento entre um portugues e uma nativa índia nos primordios dos “primeiros anos do brasil” e vai por aí fora, sangue que se caldeia, se enriquece um com o outro, e o que seria acobreado e pardo, amanha aparece preto de olhos azuis, loiro de cabelos encaracolados, bonitao de orelha furada, menina sardenta e nariz empinado… num intrincado emaranhado do origens e raças. De tudo nos fala Urda, com seu olhar de lince gaiteiro, dando-nos uma profunda liçao do que e ser, hoje, CATARINENSE. Romance historico que eu recomendo a todos que procuram conhecer as origens do povo catarinense e se aventurarem por uma epopeia de mais de quinhentos anos desde a chegada dos portugueses a este cone sul das americas. O livro e uma ediçao da Editora Lunardelli de 1992 e possivelmente nao se encontrara a venda nas livrarias. Mas com certeza encontrarao num bom Sebo, ou em uma das inumeras bibliotecas espalhadas pelo Estado. Eu encontrei num brechó onde habitualmente me abasteço de perolas literarias.

Literatura

Notas de leitura do diretor

Afonso Rocha

Um livro para ler, refletir e divulgar. Página 3


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URDA ALICE KLUEGER É a convidada de hoje do Senadinho Literário, um espaço onde os escritores nos falam de sua própria vivência, e sobretudo, de suas obras literárias.

Trouxemos para o Senadinho Literário de hoje uma das três mulheres escritoras que integram a centenária Academia Catarinense de Letras (ACL): Urda Alice Klueger.

P. Faça de conta que acabamos de nos conhecer. Como você se apresentaria como cidadão e como escritor? Fale-nos um pouco da sua vida e de sua pessoa.

Prazer! Sou a Urda, cidada da America dita Latina, que transita entre a Literatura, a Historia, a Geografia, a Geologia, a Arqueologia e o que mais se fizer necessario para aprender. Vivo numa casinha um pouco encantada, com meus cachorros, meus gatos, meus livros, minhas plantas. Neste momento, trabalho em duas pesquisas: a formaçao geologica do sul do contiP. Entre as suas obras, quais ou qual, a que consi- nente americano e a violencia na Colombia. Tive uma dera ser a sua “melhor obra”, ou seja, aquela que vida muito cheia de luz, de produçao e de acontecimentos, intensa e bela, mas infelizmente os ultimos considera ser a sua “marca” pública? Porquê? Nao sei. Gosto muito de “Cruzeiros do Sul” (ver pagina tempos teem sido muito difíceis, devido as barbaridades políticas/economicas/culturais que arrasam com 3), “Sambaqui”, “No tempo da magia”... nosso país nos ultimos cinco anos. Tenho uma posiçao Sao momentos diferentes da minha vida, muito intenmarcadamente a esquerda, e a minha formaçao em sos. Tambem “No tempo da Ana Bugra”, tambem vinHistoria tem me permitido acompanhar com clareza e do de um momento de grande intensidade – era muito frio e eu estava em pleno doutorado e nao podia esNome: URDA ALECE KLUEGER crever por falta de tempo. Lembro-me como, de reNome literário: Urda Klueger pente, larguei tudo e passei aquelas noites frias com Membro da Academia Catarinense de Letras (ACL) um lap-top na cama, revivendo profundamente aqueResidência: Enseada de Brito, Palhoça/SC las memorias da minha infancia. O livro acaba no dia em que vou para a escola, e ele, dentre tantas, deu-me Naturalidade: América dita Latina Profissão: Escritora, historiadora e doutora em geografia. uma específica alegria profunda, que foi saber que havia sido lido pelo Presidente Lula na prisao – foi um Data de nascimento: 16/02/1952 dos 21 primeiros livros que Lula leu na prisao, naque- Estado civil: Solteira le primeiro mes la. Nunca irei esquecer daquilo. Redes sociais: www.facebook.com/urdaalice.krueger Contato: urdaaliceklueger@gmail.com

Escritora e historiadora consagrada, autora de uma infindável relação de trabalhos (ver relação nas páginas seguintes), recolhida no paraíso histórico que é Enseada de Brito, Palhoça/ SC, falou-nos de suas obras e propósitos de vida. Passemos-lhe pois a palavra.

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Urda Klueger, no seu refugio da Enseada de Brito/SC Página 5


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 gumas outras coisas, como alguns livros de viagens, um infantil, etc. Continuo me perguntando se a vida imita a arte ou se e a arte que imita a vida. P. Como “nasceu” em si esse desejo de escrever? Que idade tinha quando publicou a primeira obra? Acho que ele nasceu comigo. Minhas lembranças mais remotas sao de quando eu tinha tres anos, e nesse tempo eu ja era uma criança que vivia para imaginar historias. Passei a escreve-las quando fui alfabetizada. assombro este mergulho que boa parte do mundo Publiquei o primeiro livro (Verde Vale) aos 27 anos, vem fazendo em direçao ao fascismo, o que tem me mas se dou uma espiada na minha vida anterior, entornado muito difícil a vida – acho que so a cultura contro textos no jornal do colegio, etc. Ha que se dizer, pode nos salvar de tal barbaridade que nos envolve, e aí no meio, que li muitas centenas de livros enquanto entao me mantenho profundamente mergulhada na as coisas aconteciam – na verdade, alguns milhares, e criaçao de um novo romance. Apego-me ao conceito continuo a le-los. de que luz e sombra se alternam – faz tanto tempo, agora, que a sombra começou, que quero crer que ja e P. Qual a obra, e o porque, que lhe deu mais tempo, de novo, de vermos a luz. Ha muitos dias em “trabalho” escrever? que penso que estou na Alemanha de 1933. Acho que foi “Sambaqui”, pela necessidade intensa que havia de nao falhar no que era historico, e o que P. É sabido que a cultura em geral, e particularera historico vinha alicerçado na Arqueologia. E um mente a literatura, é tida como a “parente” pobre romance pre-historico passado no litoral de Santa >> das preocupações dos gestores e dirigentes públicos. Em seu entender como está a ser tratada a literatura em Santa Catarina? Que precisa, eventualmente, de ser feito? E no tocante à vida associativa ou académica dos escritores, como estamos? Tenho a sensaçao de que vivemos um tempo de emburrecimento, de que, culturalmente, ja estivemos melhores. Ha como que um “congelamento” de cerebros, almas e coraçoes, acho. Nao sei o que deve ser feito, nao consigo vislumbrar nem imaginar. Temos mais egos do que talentos. Ao mesmo tempo, toda uma nova safra de pessoas se direcionam a cultura, mas com as mesmas características: alguns talentos, muitos egos. Como nao sei resolver coisas assim, continuo a fazer o que sempre fiz: trabalho, trabalho, trabalho. P. Entremos agora nas questões da sua escrita. Qual a área em que você se sente melhor: no conto; no romance ficcional; no romance histórico; na poesia; noutras áreas (indique quais)… Sou romancista-historica e cronista. Ate ja escrevi alPágina 6


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 Catarina, um romance diferenciado, com notas de rodape, extensa bibliografia, orientadora, etc. Fiz muito trabalho de campo, principalmente no Projeto Camacho (Sambaqui Jabuticabeira II), junto a grandes nomes da arqueologia brasileira e francesa, como Madu Gaspar, da UFRJ, por exemplo – alem de ter acampado um ano inteirinho (uma vez a cada semana) na area onde o romance passaria, ao sul da Ilha de SC, para saber como eram as noites de lua ou as noites escuras, como era o frio dentro de uma pequena barraca, como gemia o vento sul – enfim, foram dez anos desde que a pesquisa começou ate que o livro foi para a grafica.

e Chile), dos altiplanos bolivianos e da maravilhosa Grand Savana da Venezuela. Acabou ficando uma palestra muito legal. Pude aquilatar tal coisa quando os alunos (adolescentes) foram se interessando e se entusiasmando sempre mais. Pensando melhor, acho que tudo na minha vida e relacionado as diversas ciencias e a cultura. P. É sabido que “viver” da escrita não é uma oportunidade acessível à grande maioria dos autores. Para si essa questão está “resolvida”? Dá para viver da escrita?

De jeito nenhum. Vivo do meu salario de aposentada P. Desenvolve algum trabalho relacionado à litecomo bancaria. ratura / cultura, não obrigatoriamente a escrever P. Gostava de saber a sua opinião sobre a problelivros? mática da distribuição e/ou venda do livro. O livro Sim. Trabalho muito em pesquisa, estou continuaimpresso continuará, apesar dos e-books e de oumente estudando, tenho viajado um bocado, dou pa- tras plataformas digitais? lestras para os mais diferentes publicos, tanto na area Faz mais de vinte anos que venho observando como de Literatura quanto na de Historia e Geografia. Ja me se processa essa transiçao. Acho que agora esta cheaconteceram coisas assim, por exemplo: “Voce faria gando o momento em que as novas plataformas digiuma palestra sobre meio ambiente para os nossos tais estao tomando um corpo maior, embora o livro alunos?” Pensei rapidamente e vi a possibilidade de em papel ainda devera continuar existindo. Acabei de comparar alguns meio ambientes muito diferentes, e encomendar um na livraria, na semana que passou – sugeri falar de assentamentos do MST/Via Campesina se as livrarias continuam existindo, e porque ha leitodo Parana (Brasil), do Deserto do Atacama (Argentina res para elas. P. Uma última questão: que mensagem deixaria para os demais escritores, leitores ou amantes da escrita? Ler. Ler muito, ler sempre. Em tempos de redes sociais, ha muita gente deixando de ler o que tem mais que 3 linhas, o que e um desastre para a pessoa e para a sociedade, que fica em falta de cerebros bem desenvolvidos. Desconheço o que possa substituir a leitura. Mesmo o cinema, por melhor que seja, nao traz a reflexao que a leitura traz.

PRÓXIMO CONVIDADO

DEONÍSIO DA SILVA Página 7


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 nica de viagens feitas pela America nao inglesa. O povo das conchas – paradidático pré-histórico sobre o povo Sambaquiano – Editora Hemisferio Sul Ltda. – Blumenau – 2004 - em 2ª ediçao. Histórias d´além mar – cronicas – Editora Hemisferio Sul Ltda. – 2005

Obras de Urda Klueger

Viagem ao Umbigo do Mundo – relato de uma viagem de moto a 5 países da America do Sul – Editora Hemisferio Sul Ltda. – Blumenau – 2006 – em segunda ediçao.

Verde Vale – romance-historico – 1979 – Editora LuEncontro com a Infância – cronicas – Editora Hemisfenardelli – Florianopolis/SC – (13ª ediçao), sendo esta rio Sul Ltda. – Blumenau – SC – 2007 – em segunda ultima em Braille. ediçao. As brumas dançam sobre o espelho do rio – romance Crônicas de Natal e Histórias da minha Avó – 5ª ediçao historico – 1981 – Editora Lunardelli – Florianopolis/ revista e ampliada – Editora Hemisferio Sul – BlumeSC (3ª ediçao). nau - SC. No tempo das tangerinas – romance-historico – 1983 Sambaqui – romance pre-historico – Editora Hemisfe– Editora Lunardelli – Florianopolis/SC – (12ª edirio Sul Ltda. - Blumenau – SC – 2008. çao). Trinados para o meu Passarinho – Editora Hemisferio Vem, vamos remar – relato da enchente de 1983, em Sul Ltda. – Blumenau – SC – 2009. Blumenau – 1986 – Editora Lunardelli – FlorianopoMeu cachorro Atahualpa – Editora Hemisferio Sul lis/SC—(5ª ediçao). Ltda. – Blumenau – SC - 2010. Te levanta e voa – romance – 1989 – Editora LunarA questão ecológica em rede: Atalanta, Estado de Santa delli – Florianopolis – SC Catarina, um microcosmo no caminho das OrganizaBlumenau, a loira cidade no sul – livro turístico - 1989 ções Não Governamentais – Banco de teses da UFPR – – Editora da Livraria Alema – Blumenau – SC – em 4ª tese de doutorado – 2014. ediçao Nossa família aumentou – Editora Hemisferio Sul Cruzeiros do Sul – romance-historico – 1991 – Editora Ltda. – Blumenau – SC – 2014. Lunardelli – Florianopolis – SC (em 2ª ediçao pela No tempo da Ana Bugra – Editora Hemisferio Sul Ltda. Editora Hemisferio Sul Ltda.) – Blumenau – SC – 2016. Recordações de Amar em Cuba II – 1995 – Relato de uma viagem a Cuba – Editora Lunardelli - Florianopo- No tempo da magia – Editora Hemisferio Sul – Palhoça/SC – 2018. lis – SC A vitória de Vitória – 1998 – romance infantil – Editora Hemisferio Sul - Blumenau/SC (em 2º ediçao) Entre condores e lhamas – 1999 – relato de uma viagem a Bolívia e Peru – Editora Hemisferio Sul Ltda. – Blumenau – SC Crônicas de Natal e Histórias da Minha Avó – Editora Hemisferio Sul – Livro de Natal – 2001 – em 5º ediçao No tempo da Bolacha Maria – Editora Hemisferio Sul Ltda. – Cronicas Memorialistas - 2002 - em 4ª ediçao. Amada América – Editora Hemisferio Sul Ltda. - CroPágina 8


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FEIRAS DO LIVRO SÃO ESPAÇOS DA DIVERSIDADE DE PENSAMENTO E NÃO DE CENSURA. Sérgio Abranches, jornalista *

Quem escreve tem dois prazeres. Escrever, mesmo quando e penoso, e falar sobre livros, inclusive os seus. Escrever e sempre o exercício de um dialogo. O escritor escreve dialogando com o narrador e com um leitor virtual. O primeiro a quem conta sua historia, seja ela ficçao ou nao. E sempre uma alegria ser convidado para uma feira ou um festival literario. Porque o escritor gosta de falar de livros e porque o crescimento dessas festas do livro no Brasil tem contribuído para formar leitores, novos autores e propagar cultura, diversidade de visoes de mundo, indagaçoes sobre o passado, inquietaçoes sobre o presente e o futuro.

vite. As ameaças e a rejeiçao eram principalmente contra Miriam, por ser uma jornalista de opiniao de grande visibilidade e espírito crítico. Secundariamente, a mim, por minhas analises, tambem críticas, da política e do governo. Eram apoiadores de Bolsonaro. Mas, nos comentarios a notícia, surgiram varias vozes intolerantes a esquerda. Preferiram nos atacar a examinar impessoalmente um caso de lesao a liberdade de expressao.

E sempre uma surpresa ser censurado, quando se esta em um regime constitucional que assegura as liberdades. Atos incidentais de censura nao sao incomuns nas democracias. A questao fundamental e saber se sao caso isolado e se os mecanismos de preservaçao das liberdades funcionaram. Quando um fato se torna um sinal de algo maior? Quando nao e incidental, mas resultado de uma mudança no ambiente social e político. Ja nao foi isolado. Na Flip 2019, houve uma tentativa de calar a mesa com Glenn Greenwald.

Acabava de voltar do Festival Literario de Araxa, do As festas do livro qual fui um dos curadores. sao um espaço saUm evento amistoso, vigrado da diversidabrante e sem censura. Code de pensamento e mo devem ser os eventos da criatividade. culturais. A democracia, Quando a censura eu disse numa mesa com o ou outras formas de escritor Jose Eduardo interdiçao invadem Agualusa e a historiadora esse espaço, quebra Heloísa Starling, tem um -se um precioso elo paradoxo. Para ser plena, de sustentaçao da ela deve abrigar seus inidemocracia. E o elo migos e, para combate-los, mais central do sisso pode usar legitimidade tema de liberdades os mecanismos institucionais e pacíficos de dissuasao. e o mais vulneravel. Por isso e o primeiro alvo do obs- Se censurar os que a combatem ou se capitularmos a curantismo. eles, deixa de ser democracia. Foi o que aconteceu na Feira do Livro de Jaragua do Esses fatos sao sinais de alerta de uma ameaça grave a Sul. Eu e Miriam Leitao fomos gentilmente convidados liberdade de expressao. A tirania nunca tem lado. por Carlos Henrique Schroeder para falarmos de nos- Quando a nuvem do obscurantismo cobre o espaço do sa formaçao como leitores e escritores e dos livros dialogo de ideias, nenhum cidadao tem mais seus dique marcaram nossa trajetoria na mesa Biblioteca reitos assegurados. Mas nao perdi a esperança. Fico Afetiva. Aceitamos com satisfaçao, pelo prazer de falar com a historia. O livro sempre venceu no final. E o lisobre livros e nossa adesao entusiasmada as festas da vro o que e? E o dialogo expressando o pensar que literatura. Uma reaçao hostil, cheia de ameaças e igno- nos faz humanos. rancia, levou a coordenaçao do evento a retirar o con* in epoca.globo.com 17/7/2019

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Centenário de Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena celebrado em setembro no Rio de Janeiro A cidade brasileira do Rio de Janeiro acolhe, em setembro, as celebraçoes do centenario do nascimento dos escritores portugueses Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena, num coloquio que contara com cerca de 100 apresentaçoes. Organizado e sediado pelo Real Gabinete Portugues de Leitura e pela Catedra Jorge de Sena, da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o congresso internacional “Sena & Sophia: centenarios” decorrera entre os dias 02 e 05 de setembro, e ira abranger toda a obra de ambos os poetas.

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“Ha cerca de um ano que preparamos esta parceria. (...) Sera um coloquio que ira abranger toda a obra de ambos os escritores. Abrimos amplamente o leque nas chamadas de trabalhos, portanto, no caso de Sena, sera contemplado o ficcionista, o poeta, o dramaturgo, o ensaísta. E no caso da Sophia, tanto a poesia quanto a prosa, inclusive a parte dedicada a literatura juvenil”, afirmou a professora Gilda Santos, da organizaçao do evento, em declaraçoes a agencia Lusa. O congresso internacional visa promover o dialogo entre cerca de 100 especialistas e estudantes de Sena e Sophia, provenientes de varios países, como Portugal, Italia e EUA, e de varios estados do Brasil, em torno dessas duas figuras da cultura portuguesa. “Evocar a amizade entre Sena e Sophia e, para nos, professores brasileiros e amantes da poesia, mais que um simples gesto de resgatar dois grandes nomes da literatura portuguesa. E o nosso modo de aprender com eles a revisitar o tempo -- que tambem e nosso -- construído a duras penas, para garantir uma liberdade sempre ameaçada”, escreveu a organizaçao do congresso no seu ‘site’. Questionada acerca da presença de Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena na atualidade cultural brasileira, Gilda Santos assegurou que ha um “empate no mundo academico entre os dois portugueses”.


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 “Eu acho que, em termos de grande publico, a Sophia goza de maior reconhecimento, porque ja houve varias açoes no sentido de a divulgar. Quando a propria cantora Maria Bethania grava poemas de Sophia, evidentemente que lhe da uma visibilidade muito grande”, frisou a professora universitaria. “Quanto a Sena, continua a ser estudado. A UFRJ, sobretudo, tem sido uma especie de um elemento difusor da obra de Sena. Apos a sua morte, nos anos 80, foi dada uma pos-graduaçao sobre Sena e aí começou o interesse de varias pessoas, inclusive o meu. Ele e bastante conhecido no ambito da literatura portuguesa aqui no Brasil. O grande publico conhecera mais a Sophia, e o mundo academico ligado a literatura conhecera mais Sena. Havera um empate no mundo academico entre os dois portugueses”, considerou Gilda Santos.

especial em que 100 convidados que gostam de Sena, 50 estrangeiros e 50 brasileiros, comentam 100 poemas da autoria do escritor. Deve ser lançado tambem no dia 03”, declarou a Lusa a professora brasileira. o congresso internacional “Sena & Sophia” conta com o apoio do Camoes - Instituto da Cooperaçao e da Língua, atraves do Centro Cultural Portugues em Brasília, do Consulado-Geral de Portugal no Rio de Janeiro e da Fundaçao Calouste Gulbenkian. Agência LUSA—20/09/2019

A minha vida é o mar o abril a rua O meu interior é uma atenção voltada para fora O meu viver escuta A frase que de coisa em coisa silabada Grava no espaço e no tempo a sua escrita Não trago Deus em mim mas no mundo o procuro Sabendo que o real o mostrará Não tenho explicações Olho e confronto E por método é nu meu pensamento A terra o sol o vento o mar São a minha biografia e são meu rosto

Por isso não me peçam cartão de identidade O congresso abre com a conferencia “Sena e Sophia: escre- Pois nenhum outro senão o mundo tenho Não me peçam opiniões nem entrevistas ver no princípio do mundo”, do poeta e ex-ministro portuNão me perguntem datas nem moradas gues Luís Filipe Castro Mendes, que sera, tambem, homena- De tudo quanto vejo me acrescento geado nesta ocasiao. Foram, tambem, programadas sessoes plenarias, a realizar ao longo da iniciativa, nas quais partici- E a hora da minha morte aflora lentamente pam destacados acadeCada dia preparada micos e estudiosos porSofia Breyner tugueses e brasileiros. O evento contara ainda com o lançamento de duas obras dedicadas a literatura portuguesa. “Vamos tambem fazer o lançamento de dois livros. Um e uma antologia comercial, da editora Bazar do Tempo, inaugurando uma colecçao de livros de poetas portugueses editados no Brasil(...). Teremos esse lançamento no dia 03 de setembro”, afirmou Gilda Santos. “Paralelamente, teremos o lançamento de um numero especial da revista da catedra Jorge Sena, que se chama ‘Metamorfoses’, que ja vai no 15.º numero. E uma ediçao Página 11

Um beijo em lábios é que se demora e tremem no de abrir-se a dentes línguas tão penetrantes quanto línguas podem. Mas beijo é mais. É boca aberta hiante para de encher-se ao que se mova nela. E dentes se apertando delicados. É língua que na boca se agitando irá de um corpo inteiro descobrir o gosto e sobretudo o que se oculta em sombras e nos recantos em cabelos vive. É beijo tudo o que de lábios seja quanto de lábios se deseja. Jorge de Sena


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Entrada GRATUÍTA

Assédio, abuso e violência sexual—exploração infantil.

APLICATIVO PARA ACOMPANHAR AS BELEZAS E A MAGIA DA CULTURA AÇORIANA EM SANTA CATARINA

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istória Não apaguemos esta luz

Há 109 anos nascia um ícone do feminismo Brasileiro

PATRÍCIA GALVÃO (PAGU) Pagu ja foi quase palavrao, sinonimo de confusao, antonimo de moça direita. Considerada por muitos como louca e devassa, o fato e que ela fez e viveu diferente das outras, desde o começo.

ce de Patrícia Galvão. O livro foi escrito por Pagu originalmente como uma longa carta aos seus filhos em 1940, quando, com apenas 30 anos, acabara de sair de sua 23ª passagem pela prisao.

Morreu cedo, aos 52 anos, mas o que aconteceu nesse tempo foi tudo intenso e precoce. "Ela sempre foi vista como muito louca, e e essa Pagu que precisa ser desmistificada", afirma a pesquisadora Lucia Maria Teixeira, autora de Pagu - Livre na Imaginação, no Espaço e no Tempo.

Aos 15, começa a carreira jornalística - que a sustentaria e a acompanharia ate o fim - colaborando com o Jornal do Bras enquanto ainda frequentava o curso de normalista.

Jornalista, militante política, escritora, tradutora, desenhista e diretora de teatro, Patrícia Rehder Galvao nasceu em uma família de classe media alta de Sao Joao da Boa Vista, interior de Sao Paulo, em 1910. Mudou-se para a capital aos 2 anos. Morou na Liberdade, Bras, Aclimaçao, Bela Vista e em uma chacara no entao município de Santo Amaro. Aquela Sao Paulo pulsante do começo do seculo 20 foi o cenario perfeito para as estripulias de quem se autodeclarava uma "moleca impossível". Impossível tambem para os valores de hoje. Aos 12 anos, no 1922 em que acontece a Semana de Arte Moderna, inicia sua vida sexual com Olympio Guilherme, diretor do primeiro filme neorrealista brasileiro. Aos 14, engravida e faz um aborto. O que seria entao um choque destruidor para a maioria das moças, para ela foi uma fase.

Na escola, ainda Patrícia - Zaza para a família e Patsy no jornal -, conhece o poeta Raul Bopp, que a enturma com os modernistas, especialmente com o entao casal Oswald de Andrade e Tarsila do Amaral. Eles se encantam com a colegial de batom escuro e atitude desbocada. Aos 19, começa a colaborar com a revista Antropofagia, fundada por eles, que publica seus desenhos. "Fazia as vezes de mascote do modernismo paulista e de 'boneca' do casal Tarsila e Oswald de Andrade", afirma a antropologa Heloisa Pontes, pesquisadora do Nucleo de Estudos de Genero da Unicamp - nucleo que leva o nome de Pagu, alias - no artigo Vida e Obra de uma Menina Nada Comportada.

O apelido Pagu tambem foi ideia de Bopp, segundo o escritor e biografo Augusto de Campos, autor de Pagu, Vida e Obra. A epoca, o poeta sugeriu que ela usasse um nome literario com as primeiras sílabas de seu nome e sobrenome. Mas houve um engano: ele pensou que o sobrenome fosse Goulart. Ja era tarde: o poema O Coco de Pagu ja estava pronto. "Pagu tem os "Ela procurava pessoas e causas autenticas", afirma o olhos moles / uns olhos de fazer doer", sao os primeiprofessor K. David Jackson, da Universidade de Yale, ros versos da homenagem a menina, rebatizada assim especialista em literatura de língua portuguesa no por ele. A "boneca" acabaria por trair a dona. prefacio do livro Paixão Pagu - A Autobiografia PrecoPágina 13


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 lheu o corpo agonizante do estivador negro Herculano de Sousa, enfrentando a cavalaria. E presa pela primeira vez, como agitadora. O episodio lhe rendeu o título de primeira presa política no Brasil depois da independencia.

Em 1930, num imenso escandalo, casa-se com Oswald de Andrade. Provavelmente, ja eram amantes. Num gesto memoravelmente excentrico, o casamento foi no Cemiterio da Consolaçao, em Sao Paulo, diante do jazigo da família do escritor. Em 1930, a ate entao prospera Sao Paulo estremece sob o impacto do crash da bolsa de valores de Nova York. O preço do cafe desaba, a imigraçao do interior para a capital acirra a disputa por emprego na recemindustrializada cidade. As condiçoes de vida dos trabalhadores pioram, a tensao aumenta. "A (causa) que a encontrou primeiro, inesperadamente, foi a questao social e o ativismo político, mas demorou para sentir um interesse vital. Tampouco achava interessante no começo a política radical", conta K. David Jackson.

Por conta do incidente, o proprio Partido Comunista, receoso de ser responsabilizado, chamou-a de "agitadora individual, sensacionalista e inexperiente". Filiada ao PCB, tanto ela como Oswald eram malvistos pelos militantes do partido. Em março do mesmo ano, lançaram o tabloide O Homem do Povo, pasquim político que circulou por apenas dois meses. A polícia o proibiu. Depois da prisao e da publicaçao de Parque industrial, Patrícia vai embora para dar uma volta ao mundo, enviando, como correspondente, reportagens para jornais do Rio de Janeiro e de Sao Paulo, como Correio da Manha, Diario de Notícias e A Noite. Seu primeiro filho, Ruda de Andrade, fica aos cuidados do pai.

Visitou os Estados Unidos, Japao e Manchuria, regiao que hoje e territorio chines, entao um protetorado japones. La, fez a cobertura da coroaçao do imperador A mudança de opiniao veio apos uns dias com o líder Pu-Yi, ultimo imperador legítimo da China, deposto comunista Luís Carlos Prestes. O encontro aconteceu em 1912, e agora posto de volta como um fantoche em 1931, em Montevideu, no Uruguai, e a ligaçao com dos japoneses. No navio, entrevistou Sigmund Freud. o Partido Comunista (PCB) durou sete anos. Pagu tambem e considerada uma das responsaveis "A pureza do caminho de Patrícia logo se mostrou in- por trazer a soja para o Brasil. Nessa viagem, como compatível com a açao partidaria que escolhera", ex- conta Raul Bopp na biografia de Augusto de Campos, plica Jackson, em Paixao Pagu. "Ia acabar sendo expul- Patrícia fez amizade com a madame Takahashi, esposa em 1938, mas nao antes de tentar provar a sua pro- sa do diretor da South Manchurian Railway. Com a letarizaçao, inclusive com o romance Parque Industri- influencia da amiga, Pagu tinha bom acesso ao palaal, de 1933. Ninguem ainda havia feito literatura nes- cio, onde conversava informalmente com o imperase genero." A obra e considerada um dos pontos altos dor. da trajetoria de Pagu e, por exigencia do Partido Co"Quando Pagu me narrou o ambiente de familiaridamunista, saiu sob o pseudonimo de Mara Lobo. de, pedi que procurasse arranjar algumas sementes O pseudonimo se juntou a muitos outros, como Pat, selecionadas de soja", contou Bopp a Campos. Logo o Pt, Ariel, Gim e Solange Sohl. Como King Shelter, es- amigo poeta receberia 19 saquinhos de semente. creveu historias policiais para a revista Detetive, do Pagu nao parava. Apos a aventura oriental, entrou na dramaturgo Nelson Rodrigues, identidade descoberta Europa de trem pela Transiberiana, passou por Mosapenas 36 anos depois de sua morte. Traduziu Franz cou e chegou a Paris. Na França, passou a frequentar Kafka e Eugene Ionesco quando ninguem ainda os alguns cursos na Sorbonne e filiou-se ao Partido Coconhecia por aqui. munista Frances. A falta de pudor se transforma tambem em coragem. Foi pega pela polícia com documentos falsos, o que Ainda em 1931, no porto de Santos, durante um cholhe garantiu mais uma prisao. Acabou liberada apos a que entre trabalhadores e a polícia, foi ela quem recoPágina 14


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intervençao do embaixador brasileiro Souza Dantas e os verdugos se revezando para me vencerem ou me junto ao governo frances. enlouquecerem. Mas o cerco do governo Vargas aos comunistas estava mais apertado do que nunca. Na primeira metade da decada de 1930 o cenario político brasileiro e balançado por dois extremos opostos, a Açao Integralista, de inspiraçao nazifascista, e o Partido Comunista

Descansava no hospital e voltava para a tortura", conta a propria Pagu em texto reproduzido por Augusto de Campos. "Agildo Barata, o chefe dos verdugos, pregava entao os pregos na minha cabeça." Em entrevista ao escritor, sua irma Sideria Galvao confirma: "No Rio, 1935 seria um ano furioso. Apos varias crises de ciu- foi torturada, sim, inclusive aquela tortura estupida, de unha e tudo, ela apanhou bastante no Rio, sim. Fimes, separa-se de Oswald de Andrade. cou muito doente". Ao pai, Pagu escreveu da prisao: Enquanto isso, a Aliança Nacional Libertadora (ANL), "Continuo ainda um pouco esmagada, mas vai se venagrupando, numa "frente unica", elementos de esquercendo corajosamente". da, sindicatos e alguns tenentes, expandia-se sob a presidencia geral de Luís Carlos Prestes. Ao radicali- O período da prisao cobrou um alto preço de Patrícia, zar suas propostas, a ANL foi fechada pelo governo, que preferiu nao ser mais chamada de Pagu. Com apefragmentando-se. Os comunistas, em resposta, opta- nas 44 quilos e convivendo com sequelas físicas e emocionais, padecia de forte depressao e sobreviveria ram pela insurreiçao armada. a sua primeira tentativa de suicídio. Na saída, Pagu Otimista, Prestes esperava que a revolta militar desrompe com o Partido Comunista, de linha stalinista, pertasse uma adesao massiva. Mas veio o fracasso do afirmando-se trotskista. levante, em 1935, e todos os suspeitos foram caçados, presos, torturados e alguns, eliminados. Pagu esta en- O amigo Geraldo Ferraz e um importante apoio nesse tre eles, e vai de novo para a cadeia. Desta vez, por momento e eles acabam se casando. Aos poucos Patrídois períodos praticamente sem intervalo, que dariam cia se reergue, tem seu segundo filho, Geraldo Galvao Ferraz, e retoma o jornalismo. Trabalha como corresum total de cinco anos. pondente da agencia France-Presse no Brasil por dez Em muitas ocasioes, esteve sob tortura. "Passavam-se anos. as horas e os dias e as semanas e o sangue escorrendo Página 15


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 assume a coordenaçao do Teatro Universitario Santista (1956) e a presidencia da Uniao dos Teatros Amadores da cidade (1961). A partir de 1957 mantem a coluna Palcos e Atores, em A Tribuna, jornal local onde lutava pela dramaturgia experimental e pela liberdade de criaçao. Dirige Fando e Lis, de Fernando Arrabal, que recebeu varios premios. Mais tarde, encenaAssim como recuperou a saude, os ideais políticos ria tambem A Filha de Rapaccini, de Octavio Paz. tambem voltam para sua vida, agora pelo vies de um Trinta anos depois da aventura ao redor do mundo, e socialismo bem mais brando. hora de voltar a Paris. Desta vez, porem, para uma Entra para o pequeno Partido Socialista e se candidata, sem sucesso, a deputada estadual em 1950. Na campanha, publica o panfleto Verdade e Liberdade, expondo os motivos que a levaram a romper com o Partido Comunista. "Entao, quando recuperei a liberdade, o Partido me condenou: fizeram-me assinar um documento no qual se eximia de toda a responsabilidade. Aquilo tudo, o conflito e o sangue derramado, fora obra de uma "provocadora", de uma "agitadora individual, sensacionalista e inexperiente". Assinei." Um retorno as artes marca o que se tornaram seus ultimos anos. A impaciente Patrícia, em 1952, volta aos estudos e frequenta a Escola de Arte Dramatica de Sao Paulo, onde apresenta traduçao e estudo de A Cantora Careca, de Ionesco. Ja em Santos, no litoral paulista, para onde se muda,

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cirurgia que poderia cura-la de um cancer. Sem resultado. Ela tenta o suicídio novamente e volta ao Brasil. "Quando eu morrer, nao quero que chorem a minha morte. Deixarei o meu corpo pra voces", diz em uma de suas charges, da personagem Kabeluda. Seu corpo foi deixado ha 56 anos, em 12 de dezembro de 1962. Dimalice Nunes Portal de Jornalistas (06/19)


Ano II — Número 27 - Mensal: setembro de 2019 mas esbarrou no juramento requerido para a formatura. Descendente de pastores protestantes, tentou, sem exito, excluir do texto os dizeres “Assim me ajudem Deus e o sacrossanto Evangelho”, assumindo a pena, pela perda do diploma. Casado, com uma filha, Fritz Muller elegeu o Brasil para viver dois anos apos a instalaçao da colonia que viria um dia a ser Blumenau. No reduto de alemaes no Vale do Itajaí, conciliava o extenuante trabalho, na lavoura, com as pesquisas que o tornariam conhecido como “O heroi da ciencia”, segundo o criador do termo Ecologia, Ernst Haeckel, e “Príncipe dos ObservaPode um livro mudar uma vida? dores”, na visao de Charles Darwin. Alem do espírito Delimitar um destino? investigador, com foco nos seres vivos, suas relaçoes Alavancar uma amizade? entre si e interaçoes com o meio ambiente, as trajetorias de Muller e Darwin tambem coincidiam em uma Por: Ana Lavratti * dor: a perda de tres dos 10 filhos, tendo o unico herdeiro homem de Fritz Muller falecido ape nas um dia Ao receber no Brasil, traduzida do ingles para o ale- apos o nascimento. mao, a bíblia da biologia “A origem das especies”, livro que projetou mundialmente as ideias revolucionarias de Charles Darwin sobre a “seleçao natural”, Johann Friedrich Theodor Muller ganhou muito mais do que letras, folhas ou papel. O cientista ganhou asas. O sopro que faltava para aprofundar as pesquisas que, na contramao do previsível, culminaram com o proprio Darwin abastecido pelas descobertas do estudioso alemao, naturalizado brasileiro, enraizado entre a exuberancia da fauna e flora catarinenses. Ainda que seu habitat fosse a mais fechada mata, era no escritorio, entre letras, cartas e desenhos, que Fritz Muller assegurava seu passaporte para a historia. Endereçadas a Darwin, as missivas sempre respondidas navegaram entre Brasil e Inglaterra estabelecendo um elo nao apenas científico, mas tambem literario e de amizade entre os geniais pesquisadores do seculo XIX. Durante 17 anos, nem a impossibilidade de ler, pela fragilidade imposta pela doença, impediu Charles Darwin de nutrir este vínculo, desencadeado pela obra que corrobora sua obra. “Para Darwin”, escrito por Fritz Muller quando ja vivia no Brasil, ganhou ediçoes em alemao e ingles muito antes da traduçao em portugues. Nascido na Alemanha, em 1822, Fritz Muller teve a oportunidade de estudar ciencias naturais, matematica e medicina em diferentes universidades antes de migrar para o Brasil. E assim como Darwin, apesar da incansavel curiosidade e privilegiado alcance intelectual, abdicou do status da graduaçao em Medicina. Enquanto o ingles deixou o curso, disperso por outros interesses, o estudioso alemao chegou a concluí-lo,

Personalidades

FRITZ MÜLLER

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Prostituição no Rio de Janeiro em 1975

<<< Fritz Müller... Para sustentar a numerosa família, o estudioso reconhecido como Doutor Honoris Causa por duas universidades da Alemanha, de Bonn e Tubingen, nem sempre pode honrar suas vontades. Sem qualquer predileçao pela rotina de docente, nao apenas passou a trabalhar como professor, como ainda se viu forçado a viver em Florianopolis (entao Desterro) e a naturalizar-se brasileiro, a fim de assumir a vaga disponível via concurso publico. Como precursor da ecologia, Fritz Muller percebia, com igual sensibilidade, da devastaçao da natureza as sutilezas da sua beleza. Reunidos no livro “Historia natural de sonhos”, 12 poemas de sua autoria versam sobre as plantas e os animais, das formigas sob a terra as gaivotas que planam no ceu. Página 18

Ao falecer em 1897, aos 75 anos, tendo vivido em Santa Catarina por 45 anos, o biologo mais expressivo do Brasil no seculo XIX deixa um legado de liçoes para muito alem do campo científico. Naturalista Viajante a serviço do Museu Nacional, compartilhava seus resultados, compilados em aproximadamente 250 artigos, com estudiosos do mundo afora, cultuando nas entrelinhas valores tao caros e necessarios na selva competitiva em que vivemos hoje: o trabalho em equipe e o espírito de cooperaçao. * Ana Lavratti, e jornalista, escritora e, desde julho de 2019, ocupa a cadeira numero 13 na Academia de Letras de Biguaçu, tendo como patrono Fritz Müller.


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Fotos com História

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Florianópolis Santa Catarina Brasil +55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com www.issuu.com/correntedescrita Fundador e diretor: Afonso Rocha

Corrente d’ escrita é uma iniciativa do escritor português, radicado em Florianópolis, Afonso Rocha, e tem como objetivo falar de livros, dos seus autores, suas organizações e das atividades que estejam relacionadas com a literatura , a história e a cultura em geral. Chamaremos para colaborar com o Corrente d’ escrita escritores e agentes literários, a qualquer nível, cuja colaboração será exclusivamente gratuita e sem qualquer contrapartida, a não ser, o compromisso para divulgar, propagar e distribuir este Magazine Literário. O envio para publicação de qualquer matéria (texto ou foto) implica a autorização de forma gratuita. As matérias assinadas são da responsabilidade exclusiva de seus autores e não reflete, necessariamente, a opinião de Corrente d’ escrita. As imagens não creditadas são do domínio público que circulam na internet sem indicação de autoria. As matérias não assinada são da responsabilidade da redação.

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Pecador, me confesso! é, antes de mais, um grito de revolta contra a impunidade dos criminosos que poluem a nossa civilização. Mulheres, homens, crianças, idosos; comunidade LGBT; negros, índios, ciganos, imigrantes e todos os demais desprotegidos são perseguidos, violentados, agredidos, estuprados e mesmo assassinados e, na maioria das vezes, quando descobertos, ficam impunes aos rigores da lei e da justiça. E a sociedade, nem sempre responde da melhor forma. A omissão, também é um crime. Afonso Rocha passeia-se pela sua própria experiência de vida, mas também pela de todos nós, como comunidade, para que se dinamize e reforce a forma de combater estas mazelas, estes crimes bárbaros, já considerados como o holocausto do século XXI.

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Número 25 - julho de 2019

Casa dos Livros e da Leitura Página 30


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