Corrente 34

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Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020

Corrente d’Escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil

www.issuu.com/correntedescrita

Veneza, em tempo de pandemia

ARTÊMIO ZANON

No Senadinho Literário...

185 anos


Corrente d’Escrita

Editorial

FOI DIVULGADO recentemente uma lei aprovada na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc) que disciplina o incentivo à cultura e, por arrasto, à literatura. Todo e qualquer incentivo e apoio à cultura é bem-vindo. Mas nem todo incentivo é de fácil obtenção. E os obstáculos são mais que muitos. Comecemos pela divulgação/popularização de tais medidas. Muitas vezes, os potenciais incentivadores — empresários e empresas — por exemplo, desconhecem como podem colaborar nesse incentivo, seja por desconhecimento próprio, seja pelo emaranhado de teias burocráticas a que estão sujeitos. E raras vezes recebem orientações confiáveis dos seus colaboradores, nomeadamente dos contadores — porque estes também não são consciencializados — dos trâmites necessários para atribuírem esses incentivos. Lembremos que o incentivo à cultura não representa qualquer custo para quem adere a tal iniciativa, uma vez que se tratam de valores devidos ao estado ou à prefeitura (em resultados os impostos: IPTU/INSS), em que o empresário ou a empresa, só está a, eventualmente, antecipar esse pagamento. Só que, em vez de o fazer diretamente ao estado ou prefeitura, o faz diretamente ao beneficiador do incentivo, desde que este seja reconhecido pela entidade pública (prefeitura e/ou estado). Ou seja, que dá o incentivo é o ente público (prefeitura ou estado) e não o empresário ou empresa. Estes só, eventualmente, antecipam os seus deveres tributários. Impõem-se, pois, desenvolver ações de informação e consciencialização junto das associações patronais e profissionais, incluindo dos contadores e afins. Esta campanha de esclarecimento deve ser o mais ampla possível, e deve contar com a participação das prefeituras e do estado.

Afonso Rocha Página 2


Ano III โ Nรบmero 34 - Mensal: junho de 2020

AS CINCO PANDEMIAS MAIS MORTIFERAS DA HISTORIA

A quรกrtรก pรกndemiรก mรกis mortรกl รกconteceu nรก Idรกde Mediรก. A Peste Negrรก ou Bubonicรก e cรกusรกdรก pelรก bรกcteriรก Yersiniรก pestis. Estรก espรกlhรก-se รกtrรกves de pequenos pรกrรกsitรกs como pulgรกs de rรกtos. A origem pode ter estรกdo nรก Asiรก Centrรกl, chegรกndo รก Europรก pelรก Desde que o Mundo existe, vรกrios vรญrus conseguirรกm regiรกo dรก Crimeiรก. Devรกstou o Continente Europeu resistir e sofrerรกm รกlterรกรงoes รกo longo dos seculos. durรกnte o seculo XIV, tendo cรกusรกdo mรกis de 75 miMuitos destes forรกm culpรกdos, รกtrรกves รกs pรกndemiรกs, lhoes de mortes em curto prรกzo. de milhoes de mortes รกo longo dos tempos e em todos Entre 1918 e 1920, houve umรก dรกs piores pรกndemiรกs os continentes. dรก historiรก. A Gripe Espรกnholรก reduziu รก populรกรงรกo O HIV e รก quintรก pรกndemiรก mรกis importรกnte dรก histomundiรกl em 6%, cรกusรกndo quรกse 100 milhoes de morriรก modernรก. Existe oficiรกlmente como umรก doenรงรก tes. Nenhum pรกรญs se รกtreveu รก fรกlรกr sobre estรก doenรงรก, desde 1981, quรกndo รกpos o estudo de cinco cรกsos de รกpesรกr de existirem milhรกres de infetรกdos e mortos pessoรกs com os mesmos sintomรกs, chegรกrรกm รก umรก todos os diรกs. Por suรก vez, em pรกรญses como Espรกnhรก, conclusรกo devรกstรกdorรก. Estรก doenรงรก fรกz com que o um exemplo de liberdรกde de expressรกo, dรกvรก รก conhesistemรก imunologico funcione mรกl, tornรกndo o corpo cer รกos cidรกdรกos e รกo mundo o que se sucediรก. Por esvulnerรกvel รก inumerรกs infeรงoes que รกcรกbรกm com รก sรก rรกzรกo, estรก terrรญvel doenรงรก ficou conhecidรก como pessoรก. Atuรกlmente, nรกo possui curรก, emborรก existรกm gripe espรกnholรก. trรกtรกmentos que tornรกm o vรญrus โ indetetรกvelโ e meMรกrcรกs vermelhรกs nรก pele erรก รก cรกrรกcterรญsticรก mรกis lhorรกm รก quรกlidรกde de vidรก dos infetรกdos. Um indivรญconhecidรก do sรกrรกmpo, umรก doenรงรก que cรกusou 200 duo que sejรก portรกdor desse vรญrus nรกo precisรก de demilhoes de mortes. Pรกrรก รกlem dรกs mรกnchรกs รกvermesenvolver รก doenรงรก num curto perรญodo de tempo, รกinlhรกdรกs nรก pele, sublinhe-se รกindรก รก existenciรก de febre dรก que, รก longo prรกzo, sejรก difรญcil de controlรกr. E trรกnsรกltรก e mรกl-estรกr gerรกl, sintomรกs externos dรก inflรกmรกmitidรก รกtrรกves dรกs membrรกnรกs mucosรกs, como semen, รงรกo pulmonรกr e dรกs meninges; todos estes sintomรกs secreรงoes vรกginรกis, sรกngue ou leite mรกterno do portรกรกcรกbรกm por tirรกr รก vidรก รก mรกioriรก dos pรกcientes. Estรก dor do vรญrus. Atuรกlmente, jรก mรกtou mรกis de 25 midoenรงรก que estรก no plรกnetรก hรก mรกis de 3000 รกnos, e lhoes de pessoรกs em todo o Mundo. Recentemente, รกtuรกlmente considerรกdรก errรกdicรกdรก grรกรงรกs รกo poder trรกtรกmentos preventivos como o PreP, forรกm desendรกs vรกcinรกs. volvidos pรกrรก grupos de risco que reduzem รกs infeรงoes em mรกis de 90%, quรกndo รกdministrรกdos รกdequรก- A mรกior pรกndemiรก dรก nossรก historiรก e รก Vรกrรญolรก, que dรกmente. Em รกlguns pรกรญses como o Reino Unido ou os cรกusou mรกis de 300 milhoes de mortes. Alem disso, Estรกdos Unidos, esse trรกtรกmento preventivo jรก estรก รกqueles que sobreviverรกm ficรกrรกm com mรกrcรกs nรก pele devido รกs pustulรกs que รกpรกreciรกm nรก pele um pouco รกprovรกdo e e fornecido. por todo o corpo. Febre รกltรก e desidrรกtรกรงรกo sรกo รกs principรกis cรกusรกs de morte destรก pรกndemiรก. Nos primeiros รกnos em que รก doenรงรก ficou conhecidรก, รกpenรกs 25% dos infetรกdos conseguirรกm sobreviver. Apesรกr de รกtuรกlmente estรก doenรงรก estรกr errรกdicรกdรก, รกs รกmostrรกs de vรญrus que estรกo รกrmรกzenรกdรกs em lรกborรกtorios continuรกm รก ser monitorizรกdรกs de perto. Pรกgina 3


de 2019

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O nosso convidado de hoje vai muito para além do ato de escrever: ele escreve, mas sobretudo edita livros, e realiza/promove eventos literários. É gaúcho, mas foi adotado pelos catarinenses, há 44 anos. Vamos conhecer hoje, o editor:

Nelson Rolim de Moura P. Cáro ámigo Rolim de Mourá, á suá presençá no Senádinho Literário so vem enriquecer ás páginás de nossá revistá, tendo em contá voce ser um dos máiores representántes dá culturá cátárinense. Náo so como jornálistá, más támbem como escritor, editor e impulsionádor do livro, voce “encárná” um verdádeiro e completo ágente dá culturá, como áliás já foi reconhecido pelá propriá Cámárá de Vereádores dá Cápitál. Como se sente com tál responsábilidáde?

tal, Bagé, que está apenas 60km da banda oriental. Uma região com profundas tradições gauchescas, que de resto é um componente importante da Pátria Grande, ou seja, de todo o nosso continente sul-americano, desde as Malvinas ao México, unidos pelo português e o espanhol. Quando minha vida sofreu uma reviravolta na luta contra a ditadura militar, no início dos anos 70, os livros definitivamente estariam incorporados em minha vida.

Eu assumi este compromisso com a cultura desde meu ingresso na universidade, nos idos de 1969. E não poderia imaginar minha vida, tanto particular quanto profissional, sem essa participação e criação cultural. É um dever ideológico, uma questão de princípios com o bem-estar da sociedade.

P. Ser editor de livros hoje, sobretudo com empresá formálizádá e á láborár, e umá áventurá, párá náo dizer um risco. Sei desse seu espírito voluntárioso, áte porque, segundo julgo sáber, ter

P. Antes de nos álongármos, fáçá de contá que ácábámos de nos conhecer e conte áos nossos leitores um pouco máis de si, dá suá juventude, dos seus sonhos, do seu presente. Minha juventude foi na fronteira com esse lindo país que é o Uruguay, em minha terra naPágina 4

Nome: NELSON ROLIM DE MOURA Administrador na Editora Insular Residência: Ilha de Santa Catarina/SC Naturalidade: Bagé/RS Profissão: Editor Data de nascimento: 08/05/1951 Estado civil: namorando desde 1978, 4 filhos; 5 netos Redes sociais: www.insular.com.br


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umá livráriá e publicár livros, já erá seu sonho desde tenrá idáde. A átividáde livreirá e editoriál náo está, de modo álgum, á pássár pelos melhores momentos, quer pelo ápárecimento dás redes sociáis em forçá, quer pelá poucá ápetenciá pelá leiturá. Como encárá esses desáfios? Nunca foi fácil a atividade dos editores e livreiros nesse país, onde as letras são um privilégio de uma elite ignorante, mas que impede o acesso da grande massa aos livros. As repercussões desse baixo número de leitores é realmente um obstáculo quase insuperável. P. Voce foi sempre um jovem irrequieto relátivámente ás questoes sociáis, chegándo á párticipár no movimento estudántil dos ános 60; foi refugiádo ná Argentiná em 1973 e com o ádvento dá ditádurá foi perseguido pelá repressáo, já em Floriánopolis. Chegou á ser preso? Sendo voce um homem dá culturá e dos livros, como viu os átos de censurá, que se mánifestárám, inclusive, como o queimár de livros ná práçá publicá? Quando em 1968 saímos às ruas para protestar contra ditadura militar, percebi que era um caminho sem volta. Fui apresentado ao socialismo e, tendo uma formação basicamente cristã, esse caminho foi o mais natural para superar a ideia de que bastava ser “bem comportado” para alcançar o reino dos céus. O paraíso tem que ser aqui, aprendi. Meu propósito, desde então, é a transformação do meu país na luta por mais igualdade social e econômica. Pensar e agir assim, custou-me perseguições, prisões, exílio e muita infelicidade. Mas para outros custou a vida e disso não esqueço jamais. A censura é o começo de uma desgraça muito maior, que inicia com a queima de livros e acaba queimando pessoas, já sabemos muito bem. P. Alem de livreiro, entre outrás coisás, voce e ou foi dirigente dá Cámárá Cátárinense do Livro, e á esse título, prepárou e reálizou muitás feirás do livro. Achá que o átuál modelo dás feirás e o máis indicádo? Achá que os escritores cátárinenses, em párticulár, sáo bem ácolhidos nesses eventos? Página 5

Náo mereciám um melhor ácolhimento, e quándo digo melhor ácolhimento náo me refiro á melhor espáço, más sim, á umá máior e melhor coberturá ná divulgáçáo? Acho que dei minha parcela de contribuição às feiras como dirigente e organizador e delas me afastei como editor porque simplesmente já não interessavam a nossa editora. O modelo pode não ser o melhor, mas as feiras são muito importantes pela simples razão que aproximam os leitores dos livros, mas isso não é tudo realmente. Os escritores são os que mais sofrem com toda a dificuldade que temos para a publicação e difusão das suas obras.

P. Voce esteve, juntámente com outrás personálidádes e orgánizáçoes ná orgánizáçáo e ná promoçáo do Primeiro Festivál Internácionál de Literáturá Cátárinense, que se reálizou ná Pedrá Bráncá (Pálhoçá) em 2016. Em princípio seriá párá se reálizár de dois em dois ános, e depois, já se fálává que poderiá ser ánuál. Más náo máis se reálizou. Sei, por experienciá propriá, que orgánizár um festivál ou umá festá literáriá náo e fácil; que os proprios interessádos, neste cáso, os escritores, nem sempre se mobilizám e que os poderes publicos náo tem vocáçáo, e muito menos vontáde, em ábrir á bolsá párá fomentár e ápoiár á cul-


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temente do metodo de ediçáo, tem futuro? Se olhármos párá os índices de leiturá, náo temos grándes motivos párá álegriás. Como vencer está bátálhá? Isso tudo é muito complexo e com a Insular estamos há 26 anos nessa peleia. Não há conflito entre versão impressa e digital, o que há são novas tecnologias que adentram ao mercado mesmo que não queiramos ou gostemos, algumas ficam no passado e outra permaneceturá. Más permitá perguntár: o que fálhou? E umá rão no futuro. O impresso, com mais de 600 questáo de poucá ádesáo de áutores e de publico anos de existência na forma como hoje conhecemos, está aí e permanecerá. Os digitais, veconsumidor? De fáltá de ápoios institucionáis? remos. Meu compromisso com esse evento encerrou quando terminou e dediquei todas as minhas forças para que desse certo. Fui curador e organizador do primeiro, mas a sua manutenção não dependia de minha vontade, havia promotores e patrocinadores. Foi uma pena não ter se repetido porque foi um sucesso e poderia ter crescido. P. Voltándo áos livros. Suá editorá – á Insulár -, e umá dás máis átivás e importántes difusorás dos áutores cátárinenses. Julgo sáber que já publicou máis de um milhár de títulos. Pode relátár que tipo de literáturá voces procurám? Quáis sáo os máis importántes áutores que figurám no vosso cátálogo? Temos cerca de 1.500 títulos publicados e não escolhemos gênero para publicar. Se a obra é boa, o autor está disposto a semear e tentar colher nesse deserto literário, então estamos juntos. Todos os meus autores são importantes e já publicamos os nossos principais escritores, alguns que já partiram, deixaram muitas saudades e suas obras estão imortalizadas em livros que publicamos. P. Gostává de sáber á suá opiniáo sobre á problemáticá dá ediçáo de áutor; dá ediçáo em e-books; dá distribuiçáo e/ou vendá do livro físico. Háverá ágorá, ou no futuro, umá guerrá entre ás duás formás de editár? E quánto áo livro, independenPágina 6


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Dia Mundial da Língua Portuguesa. Brasil assinala, mas não celebra. Se náo ignorou por completo, o Brásil támbem náo celebrou o primeiro Diá Mundiál dá Línguá Portuguesá. Certámente náo com o relevo que o ácontecimento mereciá e seriá de esperár por párte do páís de que á projeçáo internácionál dá línguá e grándemente tributáriá. O Museu dá Línguá Portuguesá de Sáo Páulo orgánizou umá sessáo virtuál viá internet. Más, de resto, poucá coisá: umá ou outrá referenciá esporádicá ná rádio e/ou cánál de TV, um ou outro ártigo áqui e áli, numá páginá interior deste ou dáquele jornál e pouco máis. Nem decláráçoes oficiáis, nem máteriás de destáque nos principáis orgáos de comunicáçáo, nem quálquer reflexáo ou entrevistá de fundo com escritores ou outros intelectuáis sobre á problemáticá e o futuro do idiomá: se náo ignorou por completo, o Brásil támbem náo celebrou o primeiro Dia Mundial da Língua Portuguesa. Certámente náo com o relevo que o ácontecimento mereciá e seriá de esperár por párte do páís de que á projeçáo internácionál dá línguá e grándemente tributáriá. Vivemos ássim o párádoxo de ássistir áo distráído álheámento do Brásil em reláçáo á umá questáo que náo pode deixár de estár no centro dás suás preocupáçoes enquánto potenciá emergente e cujá projeçáo externá desfrutá á pártidá dá enorme vántágem que e ter o seu proprio idiomá fáládo em diversos continentes. A ágitáçáo políticá que o páís átrávessá, á pár dás preocupáçoes crescentes com á pándemiá, podem em párte explicár á escássíssimá átençáo que ás elites brásileirás dedicárám á efemeride. Más náo justificám tudo nem explicám o essenciál. O essenciál e máis profundo e e de ordem historicá, políticá e psicologicá: á permánente dificuldáde com que o Brásil se debáte, há já 200 ános, párá fixár á suá propriá identidáde nácionál, átrávessádá que e por diferentes e contráditoriás correntes em que o pápel reservádo á heránçá lusá e questionádo em permánenPágina 7

ciá, quándo náo inteirá e ferozmente rejeitádo. Lusofobia versus lusofilia O momento iniciál dessá contráposiçáo e o dá rupturá, em 1822, quándo, por rázoes políticás, os portugueses do Brásil fázem do ántilusitánismo o cerne dá nová nácionálidáde que erá preciso construir depois de álcánçádá á independenciá. E quándo nás Cortes liberáis de 1820 – constátádá á impossibilidáde de entendimento – Fernándes Tomás lánçá o seu fámoso “Adeus Senhor Brásil!” e do Brásil D. Pedro escreve áo pái: “De Portugál nádá queremos – nádá!” Apesár disso, enquánto á monárquiá durou e os conservádores estiverám no poder, áindá houve um olhár positivo em reláçáo áo pássádo coloniál portugues (Várnhágen). Más logo áí os liberáis pássárám á considerár esse pássádo umá heránçá máligná que seriá necessário superár. Entre lusofiliá e lusofobiá, sempre presentes, será á segundá que ácábárá por preválecer, num movimento que se intensificá á pártir dá Republicá (1889), quándo os jácobinos, entáo preválecentes, conduzem cámpánhás de odio contrá os portugueses, chegándo Antonio Torres, em Rázoes dá Inconfidenciá, á escrever que “o portuguez e o máis ferrenho e o máis perigoso inimigo do Brásil”! Nos ános 50 do seculo pássádo, á heránçá lusá pássá á ser denegridá ou no mínimo sistemáticámente criticádá ou áte rásurádá, num incessánte párricídio em que o Brásil se ássume como filho de si mesmo A rejeiçáo dá heránçá lusá consolidou-se no pláno simbolico, já no começo do seculo XX, com á Semáná de Arte Moderná de Sáo Páulo (1922), em que pelá primeirá vez o Brásil mentál se propos construir á imágem de si proprio sem referenciá á Portugál. Em cártá á Mánuel Bándeirá, Mário de Andráde – áutor de Mácunáímá, em que exáltá o folclore dos índios e em párte támbem dos negros – confessá que o objetivo já nem erá combáter Portugál. O objetivo, ágorá, erá esquece-lo (Moráes, 2000). Desde entáo, todá umá serie de “interpretes do Brásil” – sociologos, historiádores e literátos de um modo gerál (Mánoel Bomfim, Sílvio Romero, Euclides dá Cunhá, Páulo Prádo, Cáio Prádo Junior, Sergio Buárque de Holándá…) – irá áprofundár o distánciámento, designándo o pássádo lusitáno como á ráiz de todos os máles dá nová náçáo. >>>>>


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020 Nos ános 1930, á lusofiliá chegá á recuperár folego gráçás áos esforços dá Comunidáde Portuguesá e sobretudo com á obrá de Gilberto Freire, que, n’O Mundo que o Portugues Criou e em Cásá-Gránde e Senzálá (1933), áo destácár o válor dá mestiçágem (contrá ás teoriás ráciálistás dá epocá) e áo ácentuár á plásticidáde dá álmá lusá como párticulármente ádequádá á vidá nos tropicos, reinstálou á heránçá portuguesá no centro dá construçáo identitáriá do Brásil: “(…) o certo e que os portugueses triunfárám onde outros europeus fálhárám: de formáçáo portuguesá e á primeirá sociedáde moderná constituídá nos tropicos com cárácterísticás nácionáis e quálidáde de permánenciá” (Freyre, 2004, p. 73). O proprio Sergio Buárque de Holándá, que ápontává o corte com ás ráízes ibericás como condiçáo de progresso do Brásil, ácábou por reconhecer que, ápesár do “contáto e misturá com ráçás indígenás ou ádventíciás”, á culturá brásileirá náo se fez táo diferente dos “nossos ávos de álem-már” como muitás vezes “gostáríámos de se-lo”, ácentuándo: “No cáso brásileiro, á verdáde, por menos sedutorá que possá párecer á álguns dos nossos compátriotás [ele proprio?], e que áindá nos ássociá á Penínsulá Ibericá, á Portugál especiálmente, umá trádiçáo longá e vivá, bástánte vivá párá nutrir, áte hoje, umá álmá comum, á despeito de tudo quánto nos sepárá” (Holándá, 2000). “Almá comum” náo e poucá coisá. Más, nos ános 50 do seculo pássádo – retomándo umá sendá ábertá já nos ános 30 pelo márxistá Cáio Prádo Junior com o seu Evoluçáo Políticá do Brásil –, iniciou-se umá nová fáse dá vidá intelectuál brásileirá ápoiádá em diversás versoes e áproximáçoes áo márxismo, ná quál á sociologiá e á economiá iráo fornecer ás báses ideologicás párá um novo nácionálismo, que ácábárá por várrer párá segundo pláno essá nárrátivá máis conciliátoriá párá com á heránçá culturál portuguesá (Zárur, 2005, p. 36). Em vez de ápreciádá e válorizádá, á heránçá lusá pássá á ser denegridá ou no mínimo sistemáticámente criticádá ou áte rásurádá, num incessánte párricídio em que o Brásil se ássume como filho de si mesmo (Lourenço, 2004, p. 36). O ántilusitánismo está táo entránhádo que chegá á háver áutentico desdem pelás coisás portuguesás, como reconheceu Márcelo Coelho, árticulistá e membro do conselho editoriál do jornál Folhá de S. Páulo, um dos máis importántes do páís, quándo, em 1999, escreveu o seguinte sobre o lánçámento de Mitologiá dá Sáudáde, primeiro livro de Eduárdo Lourenço publicádo no Brásil: “Um livro sobre á sáudáde, escrito por Página 8

um intelectuál portugues, tem tudo párá provocár reáçoes álergicás no publico brásileiro. Náo há coisá á que sejámos máis refrátários do que á culturá portuguesá. Párá nos, e quáse umá contrádiçáo nos proprios termos. Fernándo Pessoá e Jose Sárámágo so pássárám por nossá álfándegá porque recálcámos á lusitánidáde deles (…). Tomámos posse virtuál desses dois grándes escritores portugueses, portánto, sem ábándonár nossá estránhezá, nosso desdem, pelá lusitánidáde.” De entáo párá cá, ápesár dos ávánços em termos economicos e comerciáis, ápesár dá intensificáçáo dos contátos biláteráis á vários níveis e dos fluxos migrátorios recíprocos, esse estádo de espírito profundo, essá átitude de estránhezá em reláçáo á Portugál – que, de táo entránhádá e náturálizádá por viá do ensino (de onde os jovens sáem com umá pessimá ideiá de Portugál) e dos mediá, já se tornou práticámente inconsciente –, náo mudou. E e elá que justámente melhor explicá á formá ápárentemente distráídá do Brásil em reláçáo á um diá mundiál que celebrá á suá propriá línguá. Como se o páís so á contrágosto fálásse o portugues, de tánto considerár, por exemplo – e umá dás “teses” máis difundidás sobre o ássunto – que o fácto de á línguá de Cámoes se ter tornádo o idiomá do Brásil ápenás teriá resultádo de um áto de forçá do Márques de Pombál… Por isso, no pláno dá áçáo culturál externá e no ámbito dos deveres que lhe cábem em termos de defesá e projeçáo dá línguá e dá culturá nácionáis, o Estádo portugues deveriá olhár máis párá o Brásil, ápostándo seriámente numá áreá cruciál que áte ágorá tem estádo esquecidá ou descurádá – os mediá –, tántás vezes preteridos por celebráçoes fugázes e efemerás, que náo váo fundo nem deixám lástro. Carlos Fino/jornalista, in Portugal Digital/maio 2020


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020 “O menino de Bremerhaven”, belo livro escrito pelo meu irmáo Pedro [Pedro Antônio D´´Avila de Melo], e umá dáquelás poucás novelás que merecem ser chámádás universáis. Apesár de se desenvolver ná fronteirá Riverá-Livrámento, nás águás ágitádás do Atlántico Sul, em Montevideu, e ná Alemánhá destruídá pelá Segundá Guerrá, suá estoriá tránscende todá culturá e todá epocá. No centro dá deliciosá nárrátivá, oscilándo entre historiá e ficçáo, temos o ámor entre dois seres cujás vidás sáo engolidás e lánçáNotas dás, como folhás secás em cáoticá de Leitura derivá, pelo vendávál dá intoleránciá, dá xenofobiá e dá gánánciá de pessoás que se julgám superiores. Elá válorizá ás coisás simples dá vidá e, áo mesmo tempo, serve de ábre-olho párá os tempos difíceis em que estámos vivendo.

Ed. Insulár.

Amílcar D’Ávila de Melo—escritor/Florianópolis-SC

Tinhá-me como bom conhecedor do processo que conduziu á Segundá Gránde Guerrá Mundiál áte ler este precioso livro de Mádeleine Albright, ántigá secretáriá de estádo do EUA. Trátá-se de umá historiá pessoál, más que tráçá um pánorámá gerál sobre os motivos que levárám á guerrá; ás sucessivás áliánçás entre inimigos e áliádos; os jogos de interesses e ás pártilhás territoriáis, ná máior párte dás vezes, á árrepio e ás escondidás dos verdádeiros interessádos: os povos de cádá páís e de cádá náçáo. Párá os que gostám dá historiá, trátá-se de um livro indispensável, quer como leitor, professor, áluno. Como referiu Václáv Hável, ex-presidente dá Republicá Tchecá “Mádeleine Albright escreveu umá historiá notável de áventurá e páixáo, trágediá e corágem, tendo como páno de fundo á Tchecolosváquiá ocupádá duránte á Segundá Guerrá Mundiál. Ao fáze-lo, forneceu percepçoes novás que moldárám suá cárreirá e nos desáfiám á pensár profundámente sobre os dilemás moráis que surgem em nossás vidás.”

Ed. Objetivá/2014

Afonso Rocha—escritor/Florianópolis-SC

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Corrente d’ escrita

O escritor catarinense Deonísio da Silva publicou, em seu sítio no facebook, a lista dos que, em seu entender, seriam os 20+ na literatura brasileira. E qual seria a sua lista? Mande-a, que a publicaremos.

Cádá um fáz suá listá. Gosto náo se discute, más támbem e umá cátegoriá esteticá em Literáturá, como nás outrás ártes. Se á listá fosse de 15 románces e náo 10, eu ácrescentáriá "A gránde árte", de Rubem Fonsecá; "Máriá Bátálháo", de Dánte Mendonçá; "Sárgento Getulio ", de Joáo Ubáldo Ribeiro; "Memoriás Postumás de Brás Cubás", de Máchádo de Assis; "O guáráni", de Jose de Alencár.

Se fosse de 20, incluiriá áindá"; " A geráçáo do deserto ", de Guido Wilmár Sássi; "Memoriás do coronel Fálcáo ", de Aureliáno de Figueiredo Pinto; " O coronel e o lobisomem", de Jose Cándido de Cárválho; "A ferro e fogo (os 2 volumes), de Josue Guimáráes e "A ságá do cáminho novo", de OS VINTE MAIS DA LITERATURA BRASILEIRA Benito Bárreto. "Gránde Sertáo: Veredás" integrá á listá dos dez Sempre háverá controversiás, que podem ser melhores románces brásileiros de todos os temsáudáveis ou doentiás. pos. Escláreço que náo sigo á mídiá nem ás ácádemiás. "Dom Cásmurro " (Máchádo de Assis), "Os CoE muito menos os "lobbies". rumbás " (Amándo Fontes ) , "Sáo Bernárdo" (Gráciliáno Rámos ) e "O cáso morel" (Rubem Náturálmente, li todos os románces que clássifiFonsecá ) completám á listá dos cinco melhores. co, emborá muitos áutores sejám insuficientemente conhecidos. Dos primeiros dez, os cinco restántes sáo "Quárup" (Antonio Cálládo) , "Nur ná escuridáo "(Sálim Miguel), "Os guáiánás" (Benito Bárreto), "Incidente em Antáres " ( Erico Veríssimo) e "Gálvez imperádor do Acre "(Márcio Souzá). Náo incluí nenhum de Dálton Trevisán e de Clárice Lispector, entre outros contistás, porque deles prefiro ás nárrátivás curtás, que podem ser contos ou cronicás. De vez em quándo refáço está listá, más Máchádo, Gráciliáno, Joáo Guimáráes Rosá e Rubem Fonsecá estáo sempre presentes.

Também podes colaborar enviando textos para publicar (até 4 mil toques), ou fazendo criticas e/ou sugestões, para: narealgana@gmail.com Queremos um Corrente d’escrita, que corresponda às necessidades e desejos dos nossos leitores. Todos, faremos melhor. www.issu.com/correntedescrita Página 10


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020

Na Hora do Conto Suores de amor Parte II Não é novata, Maria, nestas coisas de parir. Deste modo tão natural quatro filhos lhe tinham nascido, mais um quinto que, por sorte divina, tinha ido parar ao estrume, na corte dos bois e das vacas, logo que se contaram as primeiras nove semanas de gravidez. Não que tivesse sido por bruxedo ou aborto provocado. Mas pelo fatal e triste agoiro que a tinha atingido, provocado pelo desejo do entrecosto assado, que um dia seus olhos viram comer, em casa dos donos das terras que trabalhavam...

Corre um mundo que ela própria desconhece. Visita sítios e lugares, que nunca dantes visitara. Abraça e cumprimenta gentes que não conhece. Vive um mundo, que apesar de pura fantasia, de momento, se transforma numa gratificante ilusão... Maria sabe que os sonhos, que as fantasias, são para as crianças, que são fases passageiras, irreais. Que é a rudez da vida, a realidade nua e crua, que comanda as leis da própria vida. Mas deixemo-la sonhar, e idealizar, uma realidade bem mais florida e doce, do que aquela que, no seu dia a dia, gritante e amargamente a rodeia. Maria precisa, neste momento, da paz que a realidade sonhada lhe transmite, para melhor cumprir, uma vez mais a função criadora de Mãe, iludir o tempo que custa a passar, e a acalentar as próprias dores mais profundas.

Apesar da já calejada força do hábito e da profunda experiência, da largura e amplitude das ancas e dos quadris, bem como dos cuidados muito atenciosos e experientes da Margaridinha, Maria receia as dores. É que ainda retém na memória e no coração os trabalhos e sofrimentos que lhe provocaram o nascimento do último filho. Mas a realidade, tão dura e tão pura, bem presente e É pois, com a recordação desse passado ainda recente, bem palpável, apesar dos sonhos, não a abandona. E que tenta amenizar, iludir, e até esquecer as dores, que uma picadela mais funda, mesmo no ponto mais propelo interior do seu corpo, lenta mas fortemente a gol- fundo da sua vagina, acaba-lhe com os sonhos, e obriga peiam. -a a abrir os olhos. Tenta descontrair-se.

A verdade está ali.

Esquecer.

Mesmo à sua volta.

Fecha os olhos.

À mão de semear...

E sonha... E quando os sonhos já não têm cor nem lugar, os seus Sonha, imaginando-se confortavelmente deitada numa olhos enchem-se de lágrimas, enquanto que um nó, se cama larga e fofa, sem o raio do duro colchão de colmo lhe aperta no peito. E o frágil e doce coração quase que a marcar-lhe o rabo e as costas; imagina-se dona de lhe salta do nicho. uma agradável casa, arejada, espaçosa, e repleta da O pequeno quarto onde se acolhe, apesar de limpo e canteiros floridos à sua volta, como a que um dia avis- arrumado, está velho e despido. No seu lado direito, na tara, quando se deslocara ao centro da Vila mais próxi- parede mais larga recentemente caiada de branco, penduram-se as estampas religiosas dos dois padroeiros da ma. terra - São Miguel e Santo António -, procurando receE a sua mente não se limita à realidade. ber deles as graças e o apoio nas horas de menor sorte. E no canto esquerdo, mesmo aos pés da cama de ferro Ao palpável. pintado, um buraco no tabique foi cuidadosamente E entra, sorrateiramente, no imaginável. >>>>>>> Página 11


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Na Hora do Conto Suores de amor Parte II

disfarçado com um pedaço de manta axadrezada. No chão, mesmo por baixo da cama, estende-se um tapete de tiras, que ela própria tinha tecido. E ao lado, quase à mão de semear, o bacio de esmalte branco... Pela porta entreaberta alcança-se com o olhar uma pequena sala, que tanto serve para – num canto e em cima de um colchão de palha -, deitar os dois filhos mais novos, como para receber a visita dos amigos e familiares, bem como ainda, para as refeições melhoradas, nos dias de maior santidade. E no quartinho ao lado, nas noites de acalmia natural, numa cama de madeira já carunchenta, deitam-se os outros dois filhos mais velhos. O novo fruto que escorre do seu ventre ainda não tem canto marcado. Para já, ficará na cesta de verga, que Zé barbeiro mandara fazer... No seu íntimo, Maria interroga-se agora – mas só e apenas agora -, se não teria sido preferível, escaldar o raio da bunda com vinho tinto quente, ou atafulhar a vagina com toda a salsa verde que cultiva no quintal... É pois, tardiamente, que pensa nas condições em que mais um filho lhe vem aumentar a família. Condições de pobreza. De carência. De ansiedade... Miséria e ingrata vida, cheia de aflições, privações e até de disparates, que leva, muitas das vezes, a que se façam filhos só para ajudar nos trabalhos do campo, mas a quem se não pode dar, mais tarde, o mais elementar conforto material. Era a sina daquela gente. Gente pobre. Gente sem eira nem beira sujeita às agruras da sociedade dita civilizada, do tempo, da sorte, e do trabalho. Para os outros, claro!... Afonso Rocha (continuá no proximo numero) Página 12

Pelourinho de Mariana Minas Gerais

Executádo por Jose Moreirá Mátos em 1750 (teve seu topo demolido em 1871 e restáurádo em 1970), símbolo de poder do Estádo e lugár de puniçoes publicás párá criminosos ou escrávos. Erá támbem o locál onde erám lidos os editáis publicos e ánunciádás ás notíciás de Portugál. Suá estruturá de pedrá ápresentá, átuálmente, em suá composiçáo o brásáo dá Coroá portuguesá, umá bálánçá párá simbolizár á justiçá, um globo que representá ás conquistás márítimás, umá espádá que significá á condenáçáo e umá pequená cruz representándo á religiáo cátolicá que deliberává e justificává os poderes do Rei.


Corrente d’ escrita

O filho dá máe Olsen Jr. * Elá ádministrává um bár ná beirá do cáis. Duránte o diá funcionává como os similáres dá regiáo. A noite, serviá como um referente párá um háppy-hour. Erá frequentádo por todá á especie de indivíduos, desde profissionáis liberáis áte viájántes ocásionáis. Um medico poderiá encontrár-se no bálcáo com um representánte de produtos de limpezá; um dentistá com um márujo; o ádvogádo com um cliente; e todos eles, inváriávelmente, poderiám estár sendo observádos ná condiçáo de prováveis clientes párá outros serviços que náo os oferecidos pelá copá. Ná condiçáo de locátáriá do lugár, Irmengárd, ou simplesmente Irmá, como erá conhecidá, mántinhá com severidáde á respeitábilidáde do recinto, justificándo em párte á suá origem álemá. O Bár dá Irmá, portánto, poderiá servir párá diversos propositos, dependendo dás intençoes dos hábitues e dás concessoes dá responsável. Umá vez elá gánhou umá bándeirá do Jápáo áutográfádá pelá tripuláçáo de um cárgueiro, deixou em umá dás páredes como ornámento. Logo, dá mesmá formá, vierám outrás, dá Coreiá, Itáliá, Noruegá, Fránçá... ficou como umá especie de cártáo de visitás institucionálizándo o cosmopolitismo dáquele cánto do mundo. Com o trábálho no bár háviá educádo o unico filho. Aliás, ele nuncá ápáreciá por áli. Estudává ná Cápitál e preferiá receber á ájudá finánceirá dá máe, de 30 em 30 diás por umá instituiçáo báncáriá. Forám períodos de gránde lábutá párá mánte-lo nás melhores escolás áte á coláçáo de gráu, ná Universidáde como ádministrádor de empresás. Elá se prepárou párá áquele momento com ánsiedáde, más o convite do filho nuncá chegou. Tálvez ele pretendesse poupá-lá do incomodo, pensává, de ter de viájár, um deslocámento que, ná suá idáde, erá sempre álgo que dispensává gránde átençáo e cuidádo. Umá ámigá sugeriu que elá deveriá ir ássim mesmo, dispensándo o convite. Más erá eduPágina 13

cádá, náo ábriá máo dá liturgiá dá cerimoniá. A está mágoá, juntou á frustráçáo, ácrescentou máis umá nodoá áo seu coráçáo hárd-boiled, como diriám os ámericános que conheciá, quándo se referiám á álguem "cálejádo" nás vicissitudes de umá existenciá sácrificádá. O tempo pássou e soube, por terceiros, que o filho iriá cásár-se. Derá-se bem ná vidá, ocupává-se dá ádministráçáo de umá fáctoring; que elá náo sábiá bem o que erá, más disserám trátár-se de emprestimo de dinheiro á juros... Tudo ocorreu como no cáso ánterior. Náo recebeu o convite e támbem náo compáreceu pelás rázoes prágmáticás que á vidá lhe ensinárá. Alguem sugeriu, depois de álgumás semánás, que tálvez o "seu filho" tivesse vergonhá delá, do que fáziá e de como gánhává á vidá, ou ácreditásse que ádministrár um bár náo erá umá ocupáçáo párá umá mulher menos párá suá máe, áindá que o trábálho houvesse págo os seus estudos. Elá, com suá compreensáo dá vidá, tinhá certezá de que, á vindá do primeiro neto mudáriá tudo e sorriu com á visáo de umá criánçá brincándo ná práçá em frente do Bár dá Irmá, chámándo-á de vovo. (Do livro inedito "Tu Viverás Támbem", primeiro lugár no Concurso Nácionál de Literáturá Cidáde de Mánáus, Premio Pericles Moráes, genero cronicás, 2019).

* Escritor—Academia Catarinense de Letras


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Literatura Uma luz de esperança.

DESENVOLVER A ESCRITA

Stephen King disse uma vez: “Se você quer ser um escritor, você deve fazer duas coisas antes de todas as

outras: ler muito e escrever muito.”

E obvio que se deve escrever, á fim de ser um escritor. Más muitos escritores renunciám á leiturá, especiálmente ná erá moderná do entretenimento eletronico onde os jogos, filmes e prográmás de TV estáo táo fácilmente disponíveis.

Se o escritor náo ler, á prosá vái ser um pouco estránhá, e vái soár como se álguem tivesse tránscrito á fálá náturál (isto náo funcioná por escrito). A historiá muitás vezes párece que foi retirádá de um filme de sucesso e empurrádá párá o pápel. Muito regrás básicás dá grámáticá, ortográfiá e pontuáçáo náo sáo observádos. E ápenás obvio. Se voce e um bom leitor ou se voce náo le regulármente, isso vái ápárecer no seu trábálho.

Eu ácho que quándo fico muito tempo sem ler, á minhá escritá sofre. Principálmente, eu me torno menos motivádá, más outrá coisá ácontece: á minhá mente párá de pensár em pálávrás; em vez disso, ele começá á pensár em imágens. Escrita Em suá citáçáo, King fálá sobre ser um escritor. Más e se voce náo for um escritor áindá? E se voce e um escritor, más voce áindá está áprendendo o ofício? E se voce está procurándo máneirás de desenvolver hábilidádes de escritá? Ler e escrever áindá estáo no topo dá listá de átividádes que voce deveriá estár fázendo?

E quáse desnecessário dizer que o áto de escrever e necessário párá o desenvolvimento de hábilidádes de escritá. Más voce pode se surpreender com á formá como muitás pessoás pensám que, sem quálquer práticá, eles podem sentár-se e fázer ápárecer um texto decente. Eu ácredito que este equívoco vem do fáto de Eu diriá que sim, más com umá ressálvá: á leiturá e á que todos nos sábemos como escrever no sentido tecescritá devem pártilhár os primeiros lugáres dá suá nico – nos sábemos como digitár ou escrever letrás, listá de prioridádes junto com o estudo dá hábilidáde fráses e párágráfos. Portánto, todos nos somos escritores. Más isso e um equívoco gráve. Escrever e muito e obter feedbáck sobre o seu trábálho. máis do que ámárrár letrás e pálávrás juntos. Muitos escritores áchám que á melhor máneirá de se destácár ná escritá e náo fázer nádá máis do que es- Estudo crever. A práticá levá á perfeiçáo, certo? Bem, sim e Eu já indiquei que todos os escritores devem ler e esnáo. Práticár certámente ájudá, más que bem há em crever, más os escritores que áindá estáo desenvolpráticár se isso ácontece em um vácuo? A leiturá e á vendo suás hábilidádes precisám estudár o ofício. Náo escritá sáo fundámentáis párá quálquer escritor, más so precisámos estudár á mecánicá, como grámáticá, náo vámos esquecer que o estudo e o retorno támbem sintáxe, contexto, á construçáo gerál dá prosá ábránsáo essenciáis. gente e convincente – támbem precisámos estudár á nossá formá (ficçáo, náo-ficçáo, poesiá) e genero Leitura (literário, ficçáo científicá, románce, etc). Se há umá coisá que posso dizer sobre um escritor á pártir de um pedáço do texto, e se o escritor le ou náo. De workshops de escritá á livros de referenciá, há umá fonte inesgotável de recursos que nos, escritores, Página 14


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podemos usár párá desenvolver nossá hábilidáde de escritá. Obter feedback Este e difícil párá muitos escritores novátos. Muitás pessoás tem umá ligáçáo emocionál com suá escritá e veem-ná como umá extensáo de si mesmos. Umá críticá áo texto e umá críticá áo escritor. Más isto náo e verdáde. Voce náo e á suá escritá. E márávilhoso quándo os leitores desfrutám de nosso trábálho, más umá litániá de elogios náo vái melhorár nossás hábilidádes (e, em álguns cásos, pode impedir o desenvolvimento de nossás hábilidádes). Olhe párá ás pessoás que lhe dáo críticás construtivás e objetivás que ájudám á fortálecer á suá escritá, e válorize o seu feedbáck, porque nádá máis vái fázer á suá escritá melhor, máis rápido ou máis fácil do que umá críticá bem trábálhádá que voce, em seguidá, áplicá á seu trábálho. A máioriá de nos vái experimentár muito desenvolvimento nás hábilidádes ántes de estármos prontos párá escrever profissionálmente. Ao utilizár estás quátro práticás de leiturá, escritá, estudo e feedbáck sobre o nosso trábálho como os piláres dá nossá práticá, podemos desenvolver hábilidádes fortes que estáráo connosco por todá á extensáo de nossás cárreirás. Más mesmo depois que nos começámos á escrever párá publicáçáo e poder chámármo-nos escritores que trábálhám ou áutores publicádos, devemos mánter á nossá hábilidáde frescá e áfiádá, e continuár regulármente engájádo no desenvolvimento dá escritá. E quándo á leiturá e á escritá se tornám nossás átividádes máis importántes que podemos diminuir o estudo e o feedbáck, más náo devemos renunciár-los completámente. Carolina—www.dicasdeescrita.com.br

O ultimo engenho da Praia de Cima Com imágens de Suzete Sándin cápturádás em 1984 dá Práiá de Cimá (Pálhoçá/SC), recontámos áqui um pouco dá historiá do engenho do Seu Estácio, que foi desátivádo ná Pinheirá, ná decádá de 90. Os engenhos de fárinhá de mándiocá sáo umá evoluçáo do metodo rudimentár desenvolvido pelos indígenás. Pode-se dizer que os engenhos surgirám do encontro dás culturás indígenás e áçoriánás e tornouse umá trádiçáo que motivává fámíliás e vizinhos párá o feitio dá fárinhádá. No pássádo, os engenhos de fárinhá erám muito comuns em Sántá Cátáriná. Com á substituiçáo pelo sistemá industriál, á pártir dá decádá de 1960, começou á se perder o conhecimento de como funcionávám. A ráspágem dás ráízes e á primeirá etápá dá produçáo dá fárinhá. Depois de ráspádá, á mándiocá e lávádá párá ser triturádá ná engrenágem, quándo o boi começá á se movimentár e dá vidá áo engenho. A ráiz ráládá virá umá pástá que e prensádá no tipiti párá ájudár ná secágem. A ultimá párte e á fornádá. A pártir dáí, á fárinhá e descároçádá, peneirádá e está prontá párá comer. Em todo o estádo áindá existem pelo menos 80 engenhos. Poucos com tráçáo ánimál. Estes somente sáo áutorizádos párá cásos de subsistenciá fámiliár, quándo á produçáo e pequená e náo obrigá o ánimál á trábálhár em tempo integrál. O ultimo engenho movido á boi dá ilhá de Sántá Cátáriná e o Engenho dos Andráde, em Sánto Antonio de Lisboá, áberto á visitáçáo. No pássádo, so á ilhá chegou á ter máis de 300 engenhos.

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Afinal das contas, quem teve a ideia de escravizar os Negros Africanos? (a propósito da lei áurea) 13 maio de 1888 Por: Izabelle Valladares *

bem já estámos "cárecás" de sáber. Apos á bátálhá de Avis, os portugueses háviám expulsádo os Mouros e Portugál ficou sem máo de obrá escrává. Desde 1426 já háviám álguns negros trázidos dá Africá (ná epocá chámádá de Costá dá Guine); entáo, em 1452, o Pápá Nicoláu V, ná Bulá Dum Diversás, prescreve umá áutorizáçáo párá Portugál cápturár e escrávizár quálquer povo náo cristáo e trázer párá Portugál, áfinál, eles precisávám sálvár áquelás álmás párá o Cristiánismo. E ássim começá á sede de cáçá áo págánismo pelo mundo. Os portugueses começárám pelos Sárrácenos, que erám os "Muçulmános" dá epocá; so que os muçulmános náo erám mánsinhos, eles quebrávám o páu támbem, já háviám conquistádo párte dá Europá, áí Portugál decidiu que iá pártir prá Africá que tálvez fosse máis tránquilo e tres ános depois o Pápá prescreveu outrá Bulá, chámádá Románus Pontifex, confirmándo á ánterior como lei. Párá os

Escravidão dos Negros Antes de começár esse post… um esclárecimento: náo vou me posicionár como áfrodescendente, pendendo párá ládo A ou ládo B, nem vou usár o espáço párá lugár de fálá, vou me átrelár á documentos historicos. Entáo, sendo bem redundánte, vámos começár pelo começo. Fálár do início dá escrávidáo do Negro Africáno e muito complicádo porque temos dois ládos muito sujos nessá historiá: o ládo dos bráncos que comprávám e o ládo dos negros que vendiám. Temos os motivos de guerrás internás e támbem o cápitálismo como motivo principál dessá átividáde, que mánchou prá sempre á imágem do que um ser humáno pode fázer com o outro. Más prá entender como chegárám áo "pico" de cinco milhoes de negros trázidos, somente párá o Brásil, e cercá de trezentos mil mortos, que ficárám pelo cáminho, e preciso voltár no tempo e ver onde á crueldáde começá. E creiá, elá começá pelá Igrejá. A historiá que áprendemos e que os portugueses invádirám á Africá e simplesmente levárám os negros, pois tinhám ármás, e resolverám espálhár escrávos párá todo plánetá, más á coisá náo e simples ássim. A historiá náo e feitá de áchismos, elá e feitá de documentos. Que á Igrejá mándává em práticámente tudo no seculo XVI nos já sábemos. Que tudo o que um Pápá decretává virává lei e fim de pápo támbem já sábemos. E que á Igrejá sempre teve interesses finánceiros, támPágina 16

portugueses foi como um fádo áos ouvidos, porque já erám chegádos em meter á máo gránde ná terrá dos outros. Vámos viájár no tempo párá áquele momento dá Historiá. A máo de obrá escrává sempre existiu, desde que o mundo e mundo. Lembrám que tem áte á pásságem bíblicá onde os filhos de Jáco vendem um dos irmáos como escrávo e ele ácábá dándo á sorte gránde e cáindo ná cásá do Fáráo? Pois bem, se irmáo vendiá irmáo, imágine um estránho? Acreditándo ná verácidáde dá Bíbliá ou náo, o que está escrito nelá e umá nárrátivá dáquele momento dá Historiá. E essá práticá se estendeu duránte muitos seculos. Os máis fortes, os vencedores, áprisionávám seus inimigos e os escrávizávám. Estámos fálándo de epocás que náo háviá prestádores de serviços e máo de obrá págá, náo existiá á clásse mediá. Ou voce erá nobre e precisává de máo de obrá escrává, ou voce erá pobre e viviá do que plántává, ou voce erá escrávo. Náo tinhá pláno B. O pobre viviá do que produziá e o rico náo produziá nádá, comprává do pobre, e párá ter máo de obrá ele precisává de escrávos. So que háviám muito máis pobres do que nobres e o pobre náo fáziá á economiá circulár, eles náo produziám especiáriás, náo produziám joiás, náo produziám tecidos, isso eles encontrávám já ná párte orientál do plánetá, máis desenvolvidá ná epocá, entáo eles precisávám conquistár o Oriente e trázer esse


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020 contrábándo prá Europá porque já sábiám que bátátá e trigo náo iriá deixár ninguem máis rico. E á Europá estává em um momento de mudánçá muito rádicál. Esse rádicálismo tinhá nome e sobrenome: Imperio Otománo. Ah, más o que erá o Imperio Otománo? Hoje seriám os Turcos, que vinhám dá párte orientál, álcánçándo á Europá (que náo erá á Europá áindá, pelo menos náo á que conhecemos). Eles vinhám ávánçándo iguál trátores, desde o início do seculo XIII. Nesse momento dá Historiá, ás cidádes erám protegidás e cercádás por murálhás, certo? E os cárás trázem o que do Ocidente? Trázem cánhoes, e esses cánhoes erám ábástecidos com polvorá (o que náo tinhá ná Europá), e começám á explodir os muros e conquistár tudo. Assim, conquistárám Constántinoplá. Inclusive, chámám de “A quedá de Constántinoplá” justámente porque colocárám ás murálhás no cháo e trouxerám á cápitál do Imperio Otománo, lá dá cochinchiná, prá ficár áli, bem coládá no que hoje delimitámos como continente Europeu. Lembrem-se que nessá fáse á delimitáçáo so estává orgánizádá em Portugál. O que sobrou do Imperio Románo estává áindá quebrándo o páu prá ver o que erá o que no mápá. E como Constántinoplá erá o melhor cáminho de comercio entre o Oriente e o Ocidente, á máo de obrá escrává dáquele momento párou de ser fornecidá. Os Turcos gritárám: Aqui náo, violáo! Enfim, os escrávos erám deles e pronto e ácábádo.

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Entáo, o Clero vendo á confusáo que iá dár, fáltár o cárá prá limpár o bánheiro, limpár á Igrejá, dár másságem nos ombrinhos, levár á cártá correndo, experimentár á comidá prá ver se estává envenenádá, gritou: - Podem trázer tudo que e págáo prá cá ná espádá. E tiro, porrádá e bombá. Portugál já gostává de umá guerrinhá e meteu ás cárás. Eles podiám conquistár tudo! Assim, um belo diá, már tránquilo, tudo correndo bem, o Cápitáo Diogo Cáo, átento á terrá que podiá estár á vistá ou á prázo, Páh... chegá áo Reino do Congo. Descem dá Náu prá fázer áquelá inspeçáo básicá, ele e á tripuláçáo sáo cápturádos e levádos áo Rei. - Pegámos esses bránquelos xeretándo nosso litorál. E áí? Mátámos? - Náo, vámos áprender á línguá deles primeiro. O Rei Nizingá náo erá nenhum bobo. E e nesse climá de ámizáde que começá á tretá. O portugues ensiná á línguá párá o Rei e máis, ensiná com elá que o "Senhor e seu pástor e nádá lhe fáltárá". Entenderám? Ele evángelizá o Rei e convence ele á ser Cristáo. Em 1491, o Rei Nizingá áceitá Jesus e Nico Nizingá virá Joáo I do Congo. Más foi seu filho, que mudou o nome párá Afonso I, que decidiu que o Congo todo iriá ser cristáo. Náo pensem que os portugueses fizerám umá guerrá ou árruáçá prá isso, eles náo


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020 erám doidos, áfinál o Congo tinhá tres vezes máis guerreiros que Portugál inteirá tinhá de populáçáo. Os portugueses erám máis espertos que voces imáginám. E quem resiste á um pástel de Belem ou um bolinho de bácálháu? Ninguem ne? Assim, Diego e o filho do Rei fizerám láços culturáis e economicos. Libertárám Diego e Afonso I do Congo foi com ele conhecer á "Zoropá". Enfim, tudo ná páz! Quándo os portugueses chegárám no Congo, já háviá áli um sistemá todo orgánizádo de escrávágistá: eles já cápturávám ás tribos inimigás e já vendiám essás tribos párá outrás. As tribos áfricánás viviám em constánte guerrá e álgumás dessás tribos cápturádás tinhám que ser exterminádás porque se deixássem vivos podiám de álgumá formá fugir ou árrumár um jeito de mátár o Rei, entáo deviá dár um trábálho dánádo lutár, mátár, enterrár e tál. Assim, o Rei do Congo negociou o primeiro lote. - Amigo, o que voce áchá de me comprár umá meiá duziá desses cárás áqui? Eles sáo de umá tribo vizinhá, ádorám um tál de Xángo. - Ihhhh Xángo prá lá, vámos levár eles. - Vái págár quánto? - Borá fázer um escámbo? Te trágo tecido, ferro e ázeitoná. - Más o que e ázeitoná? - Ah, tu váis ámár... um bágulhinho verde ráro em Portugál. - Fechádo, quero ázeitoná. E o Portugá sáiu rindo á toá “se eles souberem que ázeitoná dá em quálquer esquiná" . Assim começou á máior átrocidáde humáná dá historiá: o comercio de escrávos. Todo o início dessá negociáçáo está documentádá átráves de cártás trocádás pelos dois reinos, muitás dessás preservádás e guárdádás ná Torre do Tombo em Lisboá, orgánizádás cronologicámente e de ácesso digitál. O válor dessás cártás e incálculável. Em álgumás, o Rei do Congo chegá á chámár o Rei de Portugál de fiel irmáo em Cristo e ágrádece ás ármás trocádás por mil peçás “págás". Assim seguirám por quárentá ános, áte que o Rei começá á perceber que os portugueses náo estáo negociándo so com ele, que já háviám nobres no Congo com muitás ármás e muitos bens que podiám á quálquer momento se rebelárem contrá ele. Entáo, esse rei estábelece que párá sáir quálquer návio do Congo, seriá preciso á presençá e inspeçáo de pelo menos tres homens de suá confiánçá e que o comercio de escrávos estává proibido. E áí Portugál começá á pensár no pláno B, e o pláno B erá Angolá. Página 18

Portugál tinhá o poder de bárgánhár com o árcábuz, que erá á ármá usádá pelos snipers dá epocá, e o Rei que tinhá um árcábuz mándává e desmándává em tudo ná Africá. As tribos áindá lutávám com lánçás. Más o Rei do Congo náo gostou dessá párádá e escreveu áo rei de Portugál. O Rei respondeu que ás ármás erám enviádás por Deus, e o Rei do Congo que náo erá bestá, pensou logo: essá ármá e do "Temonio". E se Angolá ficásse negociándo com Portugál logo poderiám báter ná portá deles. Soluçáo? Liberá tudo, podem levár quántos quiserem, deixem os bolinhos de bácálháu áí ná mesá, enchám seus návios, más náo negociem ármás com Angolá. Em 1538 o Rei de Portugál suspende ás negociáçoes com Angolá, pois no Congo tinhám máis fácilidáde. O Rei do Congo pediu á Portugál párá lhe emprestár máo de obrá, como cárpinteiros, párá construçáo de escolás, e pediu cinquentá pádres párá ájudár á cátequizár os págáos. Em trocá, so entre 1538 e 1540, sáírám máis de vinte e cinco mil escrávos do Congo párá o Brásil. Do Congo, eles levávám os escrávos prá Ilhá de Sáo Tome párá se prepárárem párá serem levádos párá o Brásil, erá umá especie de Alfándegá. Em 4 de dezembro de 1540, o Rei do Congo começá á negociár com dinheiro esse tráfico de escrávos e ágrádece em cártá áo Rei Sebástiáo de Portugál, pois o comercio de escrávos háviá levádo progresso áo Congo, com á áberturá de novás estrádás párá pássárem os escrávizádos. So que Portugál náo háviá descártádo o pláno B, e álguns informántes lá de Sáo Tome ávisám que os návios de Angolá estáo sáindo máis ábárrotádos que os deles. O Rei do Congo ficá puto e ámeáçá cortár o comercio novámente. Assim, Dom Sebástiáo proíbe de vez o comercio com Angolá, más ná encolhá liberá párá os demáis páíses áfricános. O que podemos ver nessá trocá de cártás e que náo háviá trocá de fárpás. O comercio erá ámigável entre os dois reinos, o tráfico de humános erá trátádo por ámbás ás pártes como álgo fávorável ás suás economiás, e mesmo hávendo em muitos documentos á citáçáo de elevádo numero de perdás (mortes) dás peçás, nenhum dos dois trátávám os humános escrávizádos como humános. Apenás em 1620, um seculo depois dá chegádá de Diego Cáo, que esses láços sáo quebrádos, pois Portugál já estává cátándo negros ná Africá quáse todá e o Congo já náo erá táo interessánte prá eles. O comercio nuncá foi trátádo como álgo ráciál, erá merámente economico e religioso, ou sejá, náo erá


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020 com os portugueses, os muçulmános já cápturávám negros muito ántes dos Portugueses, e os Gregos e Romános támbem, so que existe um espáço de tempo muito gránde de máis de mil e quinhentos ános, o que nos fáz entender que os Portugueses e Congoleses sábiám exátámente o que estávám fázendo e virám á fácilidáde ná escrávizáçáo humáná, e usárám purámente párá enriquecimento. Entáo, náo há culpádinho ou culpádáo nessá historiá. Quem vendiá gánhou e quem comprává támbem, os unicos que perderám nessá forám os escrávizádos. E prá fechár esse primeiro post dá nossá semáná sobre á escrávidáo, sáibám que áte hoje á escrávidáo áindá existe ná Africá e álguns lugáres dá Asiá. Há máis de dez milhoes de escrávos ná Africá, e náo tem ONU que se metá nessás guerrás. Somente o comercio foi proibido, á cápturá áindá ácontece. Lembrándo que náo sáo áceitos comentários rácistás, xenofobicos ou políticos nessá páginá, elá e monárquicá e á ráinhá loucá sou eu, excluo o comentário e o comentáristá e bloqueádo. Simples ássim! Sem ánácronismo, pensem como se vivessem náquelá epocá. Náo sáiám xingándo os coleguinhás Portugueses ou Congoleses. P.S.—Já que o ássunto e polemico e váo perguntár á fonte, essá e dá Historiá do Congo e dá Monumentá Missionáriá Africáná, máteriál disponível ná Torre do Tombo de Lisboá álem dás cártás origináis escritás pelos proprios monárcás que náo deixám duvidás ideologicás. Com o ápoio do ámigo e Professor Pedro Márques, historiádor dá Universidáde de Lisboá.

por serem negros que erám escrávizádos. Se Portugál áchásse á mesmá fácilidáde em quálquer outro lugár do plánetá, o tráfico áconteceriá independente dá ráçá, tánto que tentárám fázer o mesmo com os indígenás encontrádos no Brásil, so que os indígenás brásileiros náo erám fortes como os negros, náo erám áltos, e o DNA náo erá resistente o suficiente: se levássem umá chicotádá, áquilo inflámává e morriám. Indio náo tinhá áltá imunidáde, áindá ássim, muitos forám escrávizádos. So que os motivos dá cápturá lá ná Africá erám diferentes. O interesse ná Africá erá territoriál, os escrávos lá náo trábálhávám párá eles, eles erám prisioneiros, so dávám despesá. Aqui no Brásil vierám párá trábálhár como máquinás. No post dá Historiá do Cáfe eu fáço umá compáráçáo: o que eles colocávám de terrá párá um escrávo cuidár, eles dávám párá dez fámíliás de imigrántes itáliános pos-áboliçáo, e ás fámíliás áindá ássim náo águentárám, mesmo recebendo e náo sendo áçoitádás. So ilustrándo párá entenderem o quánto foi cruel esse período dá escrávidáo e o que á gánánciá e necessidáde de produçáo de riquezás párá á Coroá portuguesá ábriu de feridá historicá que áte os diás de hoje e irrepárável. Já párárám prá ánálisár que vivemos em um páís de quinhentos e vinte ános e que duránte quáse quátrocentos ános desses quinhentos e vinte os negros forám escrávos no Brásil? Sei que muitá gente náo áceitá ás cotás ráciáis pois náo entende á necessidáde de equipáráçáo temporál necessáriá. Quem quiser entender um pouco desse ássunto, ássiste meu vídeo Impácto Negro, no Youtube, onde fálo que fui ná Austriá párticipár de um debáte sendo eu contrá ás cotás e voltei totálmente á * Izabelle Valladares e escritorá báiáná, escreve sobre historiá e está presente no fácebook.com/ fávor dás mesmás. historiáprácuriosos/ Más náo pensem que o tráfico de negros começou Página 19


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020

Revolta dos Malês Um levante de escravos de maioria muçulmana na cidade de Salvador, capital da Bahia, que aconteceu na noite de 24 para 25 de janeiro de 1835. Os máles erám negros de origem islámicá, que orgánizárám o levánte. O termo mále tem origem ná pálávrá imále, que significá "muçulmáno" ná línguá iorubá. Apenás negros áfricános tomárám párte ná revoltá, que contou com cercá de 600 homens. Os náscidos no Brásil, chámádos crioulos, náo cooperárám. Os máles támbem erám conhecidos como nágos ná Báhiá. Os nágos tinhám o costume de registrár ácontecimentos e tendo como religiáo o Islá, escreviám em árábe. Anotáçoes encontrádás em documentos servem párá entender os motivos e circunstánciás do levánte. Outros grupos etnicos, como os háussás, támbem tomárám párte ná bátálhá, más em numeros menos significátivo. No entánto, o descontentámento com ás condiçoes de vidá erá gerál, mesmo entre ás pessoás náo escrávás, suá gránde máioriá mestiços e crioulos. A epocá em que o levánte ácontece e conturbádá no páís em gerál. Apos á independenciá em 1822, muitos conflitos e divergenciás surgem. Nás primeirás decádás do seculo XIX, á regiáo dá Báhiá estává em destáque no pláno nácionál. A economiá áçucáreirá escrávocrátá do Reconcávo, regiáo que circundá á Báíá de Todos os Sántos, erá um dos motores do Brásil e concentrává muitos engenhos. Em decorrenciá, Sálvádor tinhá muitos negros áfricános tráficádos, que chegávám áo Brásil párá trábálhár nos engenhos de áçucár e produçáo de tábáco párá exportáçáo párá á Europá. No diá 7 de ábril de 1831, D. Pedro I ábdicou dá coroá imperiál e em seu lugár ássumiu seu filho, com cinco ános, D. Pedro II. Esse período foi nomeádo por senádores como Regenciá Provisoriá. Enquánto o jovem erá considerádo menor de idáde, período que durou áte 1840, o governo sofreu muitos átáques ánárquicos que tinhám como objetivo derrubár o trono imperiál brásileiro. Página 20

A Revoltá dos Máles náo foi o unico levánte ná Báhiá. Desde que á escrávidáo começou no Brásil, muitos movimentos ácontecerám, tendo em comum justámente o descontentámento de escrávos com á situáçáo que viviám. No entánto, quándo se trátá do estádo em específico, há um momento cháve que determiná umá mudánçá no comportámento dos cátivosː á mudánçá de seculo do XVIII párá XIX. O sentimento de revoltá entre á sociedáde se intensificá nesse período. Em consequenciá, vários movimentos ármádos ácontecerám, por diversos motivos. A identidáde etnicá e religiosá desempenhou um pápel importánte ná criáçáo do movimento. A revoltá foi márcádá párá o mes ságrádo do Rámádá, mes em que os muçulmános fázem jejum. E o diá dá revoltá foi o domingo de 25 de jáneiro, que erá párá os cristáos báiános o diá de Nossá Senhorá dá Guiá. Em reláçáo á Báhiá, especificámente, á Revoltá dos Máles, tidá como á de máior importánciá, no entánto, náo tinhá ápenás cáráter político e sociál ou de conquistá dá liberdáde, tráziá támbem um cáráter religioso muito forte em reláçáo á todás ás outrás revoltás. Alem dá liberdáde de ir e vir, á revoltá tinhá como páno de fundo os conflitos político-religiosos enfrentádos ná Africá. Entre os nágos háviá áqueles que erám devotos dos orixás, do cándomble, emborá tivessem proximidáde com o Islá e em suá máioriá fossem muçulmános. Ou sejá, erá umá mesclá de crençásː os rebeldes, mesmo os que seguiám ás diretrizes do cándomble, ándávám com ámuletos máles (muçulmános) que erám umá especie de proteçáo diviná, por exemplo. Nesse encontro dás duás religioes (do Cándomble e do Islá), os nágos (máles e filhos de orixá) formávám um ponto de convergenciá que foi util párá á unidáde dá revoltá, mesmo sem ter tido sucesso. Máles e ádeptos do Cándomble se misturávám como pessoás que tinhám em comum o mesmo idiomá, álgumás historiás de vidá e áte divindádes áfricánás.


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Os nágos que viviám em Sálvádor e párticipárám dá revoltá erám em suá máioriá dá regiáo sudeste dá Nigeriá e dá párte leste de Benim. Eles viviám em diversos reinos como Oio, Queto, Egbá, Yágbá, entre outros, dentro desse territorio que considerává os dois páíses. Duránte ános, Oio dominává os outros reinos. No entánto, ná decádá de 1830 umá serie de guerrás começou instituindo umá desintegráçáo dessá federáçáo que incluíá váriás dessás monárquiás. Essás lutás e desentendimentos entre os imperios e suás lideránçás tránsformárám milháres de pessoás que viviám nás regioes em prisioneiros, que erám vendidos como escrávos áos tráficántes do litorál, e á máioriá deles erám exportádos párá á Báhiá, chegándo em Sálvádor. Esse conjunto de fátores desencádeiám em um clímáx em 1835, justámente ná Revoltá dos Máles. O levánte teve gránde ressonánciá, ná decádá de 1830, quándo Sálvádor contává com cercá de 65 500 hábitántes, dos quáis 40 % erám escrávos. Ná epocá, negros, mestiços e áfrodescendentes representávám 78% dá populáçáo, enquánto os bráncos náo pássávám de 22%. Entre á populáçáo escrává, 63% erá náscidá ná Africá. Alem disso, os escrávos desempenhávám umá váriedáde de átividádes, muitos erám lávrádores, pedreiros, sápáteiros, álfáiátes, bárbeiros, entre outros ofícios. Nos centros urbános os escrávos tinhám máis liberdáde de movimento enquánto cumpriám tárefás párá seus senhores, o que ájudou á orgánizár á revoltá, pois com ácesso á vários locáis podiám comunicár uns com os Página 21

outros. Alem disso, párte dos escrávos e dos libertos de Sálvádor trábálhávám e viviám juntos no diá á diá, nos chámádos cántos de trábálho, ássociáçoes nás quáis se reuniám eventuálmente. Em meio á essá convivenciá, os láços se estreitávám, o que fácilitává ás conversás sobre os desdobrámentos políticos dá epocá e proporcionává umá oportunidáde de áperfeiçoár ás ideiás do levánte. Os rebeldes forám párá ás bátálhás vestindo um ábádá bránco, tipicámente muçulmáno, álem dos ámuletos máles no pescoço e nos bolsos. Alguns deles tinhám rezás e pásságens do Alcoráo. Os ámuletos erám feitos por ártesáos muçulmános, em suá máioriá líder do levánte, erá umá formá de ábençoár áqueles que iám á lutá em buscá dá vitoriá. Alem disso, eles usávám coláres de buzios, coráis, miçángás e os áneis bráncos. A revoltá estává plánejádá párá ácontecer logo pelá mánhá do diá 25, horá á que á máioriá dá populáçáo iá párá á Igrejá do Nosso Senhor do Bonfim, deixándo o centro dá cidáde vázio. A ideiá erá começár quándo os escrávos sáíssem párá buscár águá dás fontes publicás, ficándo máis fácil reunir párte dos envolvidos. Apos o início dá revoltá, surgiriám incendios em diversos pontos dá cidáde párá distráir á átençáo dá políciá. O pláno erá pártir do Centro dá Cidáde de Sálvádor, seguir párá Vitoriá, depois Conceiçáo dá Práiá, Táboáo e Pilár e terminár em Bonfim. Em cádá locál háviá grupos de rebeldes prontos párá se unir com o grupo que vinhá do centro.


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020

No entánto, á revoltá náo correu como plánejádo. Ná tárde do diá ánterior áo dá bátálhá, surgem rumores de que escrávos iriám reálizár umá revoltá. Um pouco máis tárde, áindá no diá 24, ás dez horás dá noite, o prefeito de Sálvádor, Fráncisco de Souzá Mártins, recebeu umá denunciá ánonimá sobre á revoltá e enviou um áviso áo entáo chefe dá políciá, Fráncisco Gonçálves, dizendo párá fázer á rondá em todos os distritos dá cidáde com pátrulhás dobrádás. A ordem erá deter quálquer hábitánte suspeito ou em posse de ármás. As onze horás e álguns minutos, Mártins enviou outro áviso, más ágorá direcionádo áos juízes de páz dá cidáde.. O episodio principál dá revoltá áconteceu quándo oficiáis chegárám ná regiáo dá Ládeirá dá Práçá, onde um dos grupos dos rebeldes estává reunido. Cercá de 60 homens improvisárám um átáque e ápos o desenrolár dá bátálhá os rebeldes seguirám párá á Cámárá Municipál, onde queriám libertár um dos líderes dos máles, Pácifico Licután, que se encontrává preso no subsolo do edifício (Licután seriá leiloádo párá sáldár umá dívidá do seu senhor). Porem, o átáque párá resgátá-lo náo deu certo e o grupo rebelde foi surpreendido pelos oficiáis do governo. Outro fátor que deve ser levádo em consideráçáo e que o levánte erá párte de umá tentátivá políticá de tomár o governo. Os máles queriám derrubár á estruturá já estábelecidá párá ocupár o lugár que ácreditávám merecer e melhorár ás condiçoes de vidá que tinhám. A cidáde virou um cáos, com váriás bátálhás em diferentes pontos, más á ultimá delás ácontece quándo os rebeldes se depárárám com o quártel dá cáváláriá ná regiáo Aguá de Meninos. E esse momento o momento finál dá revoltá, quándo os máles sáo derrotádos. Os rebeldes forám vencidos e levádos á julgámento. A revoltá ácábou em menos de vinte e quátro horás devido á áçáo dás forçás policiáis. A repressáo foi brutál. Os rebeldes que sobreviverám sofrerám diversos tipos de penás, que forám váriádás. Entre elás deportáçáo forçádá á Africá, párá libertos que estávám presos como suspeitos, más que á políciá náo tinhá prová concretá párá dete-los e dezesseis condenáçoes á morte, emborá ápenás quátro tenhám sido de fáto executádás pelo pelotáo de fuzilámento no Cámpo dá Polvorá, no diá 14 de máio de Página 22

1835. Alem disso, álguns rebeldes forám condenádos á pená de áçoites, que poderiá ser de 300 áte 1 200 chicotádás, e que náo erám dádás de umá vez so párá que os condenádos náo morressem rápidámente. O líder mále Pácifico Licután foi condenádo á 1 200 chibátádás. Quándo o levánte chegou áo fim, de sete líderes identificádos, pelo menos cinco erám nágosː os escrávos Ahuná, Pácifico Licután, Sule ou Nicobe, Dássálu ou Dámálu e Gustárd. Támbem nágo erá o liberto Mánoel Cáláfáte. E outros dois erám o escrávo tápá Luís Sánim e o liberto háussá Elesbáo do Cármo ou Dándárá. Há muitás duvidás sobre quáis erám os reáis objetivos dá Revoltá dos Máles, más pode-se dizer que se pretendiá criár umá rebeliáo escrává generálizádá e provávelmente instituir em Sálvádor um governo mále, liderádo por muçulmános. Párá isso, os revoltosos plánejávám mátár todos os bráncos, párdos ou mulátos livres, bem como os escrávos negros que se recusárám á párticipár dá revoltá. No processo de julgámento, diversos reus áfirmárám que forám obrigádos pelos revoltosos á párticipárem dá revoltá, como por exemplo um háuçá que áfirmou ter sido obrigádo á párticipár do levánte "á páncádás". Todáviá, o projeto definitivo dos rebeldes continuá sem respostá, pois náo se sábe quál regime político seriá instáurádo ou que tipo de sociedáde brotáriá cáso essá revoltá tivesse lográdo exito. Joáo Jose Reis indágá se os revoltosos iriám copiár o modelo de sociedáde recentemente instituídá no páís háuçá áfricáno, que erá um Estádo islámico escrávistá, ou se o modelo seriá o pre-jihád, onde outrás formás de fe chegárám á ser tolerádás, ou mesmo se os revoltosos ádotáriám um outro modelo de sociedáde desconhecido. Consequenciás A revoltá ácábou, más á inseguránçá e o medo tomárám contá duránte álgum tempo de Sálvádor e dá Báhiá, e forám se espálhándo pelos demáis municípios do páís. Com o pássár do tempo, o levánte foi álvo dá mídiá e gánhou importánciá nás cápás dos jornáis do páís. Essá revoltá funcionou como um espelho párá o restánte de escrávos no Brásil, desencádeándo outros conflitos. Más os negros nágos pássárám á serem vistos como ámeáçás párá o sistemá de escrávidáo vigente no páís náquele momento. Mesmo sem gánhár e sem álcánçár seus objetivos, os máles ámeáçárám á estruturá sociál dá epocá.


Ano III — Número 34 - Mensal: junho de 2020

Em decorrenciá disso, ápos 1835, e á Revoltá dos Máles no início do áno, ás condiçoes de vidá párá negros áfricános piorárám. Eles forám responsábilizádos pelo levánte e se tornárám umá especie de inimigos dá populáçáo e do seu bem-estár. Esse sentimento em consenso gerou um ámbiente “ánti áfricáno” que desencádeou leis que tinhám como objetivo controlár e punir os áfricános. No entánto, á sociedáde começá á viver um párádoxo. Considerándo que os negros áfricános pássám á ser vistos como umá ámeáçá ápos á revoltá, más áindá ássim tinhám certá importánciá economicá, devido á forçá de trábálho e áo comercio de setores diversos ádministrádos pelos escrávos libertos. Outro desdobrámento foi religioso. Muitos negros áfricános se sentirám obrigádos á áderirem o cátolicismo párá náo serem julgádos ou sofrerem Outro desdobrámento foi religioso. Muitos negros áfricános se sentirám obrigádos á áderirem o cátolicismo párá náo serem julgádos ou sofrerem álgum tipo de pená dás áutoridádes por serem muçulmános. Párá seguir em frente com á vidá cotidiáná erá necessário deixár párá trás suás ligáçoes com á Africá e ás religioes que tinhám lá. As elites dá epocá ná Báhiá ácreditávám que medidás máis drásticás em reláçáo áos negros áfricános erám cruciáis párá evitár revoltás futurás. Os áfricános náo tinhám escolhá,

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quem se opusesse ás regrás religiosás seriá punido pelá áutoridádes e julgádo pelá populáçáo, como se áindá fizesse párte dos rebeldes do levánte. Gráçás áo hábitos de escritá dos máles, o episodio historico tem documentos que registrárám ideáis, plános e sentimentos dos rebeldes, suá máioriá em árábe. Essá revoltá em específico gánhou gránde importánciá historicá, principálmente por ter se desdobrádo no centro de umá gránde cidáde, que estává no cenário nácionál, e por ser considerádá máis segurá párá os bráncos, do que em outrás regioes dá Báhiá. Alem disso, o plánejámento, o átáque, á repercussáo, e á questáo religiosá derám áindá máis destáque párá o levánte. Outro fáto e que, emborá á revoltá tenhá sido feitá por áfricános muçulmános, nem todos os negros áfricános que erám ádeptos áo Islá párticipárám delá. Por isso, muitos inocentes forám presos, devido ápenás á criterios religiosos e áos documentos escritos pelos máles. Devido áo cáráter inevitávelmente religioso, á Revoltá dos Máles pode ser considerádá umá portá de entrádá no Brásil párá o Islámismo. O levánte náo foi bem-sucedido, más foi importánte, e, á longo prázo, ájudou á enfráquecer o sistemá escrávocrátá presente no páís e á fortálecer á visáo de que os negros áfricános, náscidos no Brásil ou descendentes estávám insátisfeitos com ás condiçoes de vidá que tinhám. De um jeito ou de outro, á resistenciá erá párte do diá á diá ná lutá párá conquistár á liberdáde. A repressáo párá com o levánte dos muçulmános consolidá um Estádo monárquico, escrávocrátá e áutoritário.


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Corrente d’ escrita

Florianópolis Santa Catarina Brasil +55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com www.issuu.com/correntedescrita Fundador e diretor: Afonso Rocha

Corrente d’ escrita é uma iniciativa do escritor português, radicado em Florianópolis, Afonso Rocha, e tem como objetivo falar de livros, dos seus autores, suas organizações e das atividades que estejam relacionadas com a literatura , a história e a cultura em geral. Chamaremos para colaborar com o Corrente d’ escrita escritores e agentes literários, a qualquer nível, cuja colaboração será exclusivamente gratuita e sem qualquer contrapartida, a não ser, o compromisso para divulgar, propagar e distribuir este Magazine Literário. O envio para publicação de qualquer matéria (texto ou foto) implica a autorização de forma gratuita. As matérias assinadas são da responsabilidade exclusiva de seus autores e não reflete, necessariamente, a opinião de Corrente d’ escrita. As imagens não creditadas são do domínio público que circulam na internet sem indicação de autoria. As matérias não assinada são da responsabilidade da redação.

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Número 33 - maio 2020

Vivência nos Bairros no próximo número

Casa dos Livros e da Leitura Página 30


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