Corrente d'escrita 42

Page 1

Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Corrente d’escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil

www.issuu.com/correntedescrita

Aniversário de fundação: 23 de março de 1673, com o nome de NS de Desterro


Corrente d’ escrita

Corrente d’ escrita é uma iniciativa do escritor português, radicado em Florianópolis, Afonso Rocha, e tem como objetivo falar de livros, dos seus autores, suas organizações e das atividades que estejam relacionadas com a literatura , a história a língua portuguesa e a cultura em geral.

Florianópolis Santa Catarina Brasil +55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com www.issuu.com/correntedescrita Fundador e diretor: Afonso Rocha

Chamaremos para colaborar com o Corrente d’ escrita escritores e agentes literários, a qualquer nível, cuja colaboração será exclusivamente gratuita e sem qualquer contrapartida, a não ser, o compromisso para divulgar, propagar e distribuir este Magazine Literário.

O envio para publicação de qualquer matéria (texto ou foto) implica a autorização de forma gratuita. As matérias assinadas são da responsabilidade exclusiva de seus autores e não reflete, necessariamente, a opinião de Corrente d’ escrita. As imagens não creditadas são do domínio público que circulam na internet sem indicação de autoria. As matérias não assinada são da responsabilidade da redação.

Principais assuntos nesta edição:

Academia Catarinense de Letras Entrevista com Moacir Pereira

5

Geração de renda Deputada ALESC Luciane Carminatti.

12

Batalha dos Guararapes e capitão Mathias Fernandes

22

Júlia Lopes Almeida A imortal recusada pela Academia Brasileira de Letras

25

História Os Judeus

27

Documentos.com—Pandemia Gripe “espanhola”

29

Colonização portuguesa Parte II

33


Corrente d’ escrita catarinense.

atropelado mortalmente todos os dias, JJLeal - Da Academia Catarinense de mas como tem muita energia sacodese, poe-se de pe e continua,, Hilton GorLetras resen, de Joinville, isso sim, e fantastico. Prezadíssimo Afonso Rocha, editor do "Corrente d'Escrita E o teu artigo: para que quero eu a li-

Ufa... acabei de ler o Corrente d’escrita de março. Quanta leitura boa e informativa...textos ricos e divergentes.

Confirmo o recebimento e cumprimen- berdade se nao posso escolher o meu caminho e mais esta dura realidade. to-o pelo nº 41 do seu brilhante menEstamos vivendo sem liberdade de ir e sario. E otimo. Gostei da homenagem a escri- vir !!! tora Dalvina Jesus Siqueira. E merecedora.

“Sou o fundo do que nao presta; do que Ela fez parte na academia a que perten- esta imundo; do que esta podre; daquiMuito bom saber mais sobre o homos- ço: ASAJOL - Academia Sao Jose de Le- lo que os humanos nao se servem mais, sexualismo na antiguidade...o texto nos tras outra triste realidade da ignorancia mostra que realmente conhecemos humana terrestre”. A ignoracia despeja Suas observaçoes gramaticais tambem nos rios que vao para os oceanos e la muito pouco sobre isso quando falamos ou ouvimos fizer que "isso e cousa me ajudam. ficam depositados os detritos da humamoderna". Ainda mais agora que estou redigindo nidade. o meu 11º livro. Aplausos a grande Mestre DalviE um artigo que sempre gosto de ler e na...inspiradora!!! Neste nº 41, destaque para as "Dicas de o do ítalo/gaucho Garibaldi, grande portugues" de Stephen King. Como ele genio. Eu nao sabia que ele fora o autor Maria da Luz – Florianópolis do sufragio universal, sabia sim, que define: por vezes a gramatica empoencostou a espada no peito do Papa brece o teor. para aboliçao eclesiastica da proprieRecebi e agradeço o Corrente d’escrita Ja lhe enviei um exemplar da minha dade terrena, mandando que cuidasse de março/2021. Parabens, como sem- ultima publicaçao: "Imbatíveis Corado Espírito ... pre muito bom, inclusive, pela eficien- çoes. Muito grato, cia editorial, ja que publicado no ultiCordialmente—Rudney Otto Pfutzenmo dia de fevereiro. Pansera - Chapecó reuter - Florianópolis Gostei da tua cronica sobre este tenebroso tempo de pandemia causada por Advogado e Escritor esse vírus que teima em continuar nos Ola meu caríssimo confrade d'escrita. ameaçando de doença e morte. Sou partidario do uso de mascara. Entendo que o direito individual pode, sim, ser restringido em favor do coletivo. Mas, concordo que uma regra, uma lei, enfim, o direito so e legítimo quando vale para todos. Quando abre exceçoes para privilegiar alguns, a lei ou o direito acabam perdendo a sua legitimidade. Isso, fica evidente quando o presidente Bolsonaro afronta a lei, o bom senso e se comporta de forma irresponsavel diante da Covid. Na verdade, Bolsonaro tem sido uma novela de desacertos, a cada dia um capítulo desastroso. Lamentavelmente, a naçao e um barco a deriva, navegando em aguas tempestuosas, nas maos de um capitao despreparado para o ofício. Um abraço e continue editando a tua Corrente de promoçao da Literatura

A revista esta cada vez melhor, mais instrutiva, mais envolvente e gratificante, Muito grato por compartilhar. Desta feita nao posso furtar-me de falar sobre a iluminada Estrela Dalvina, etc. Dalvina trabalhou 40 anos, amor e longevidade, e estar sempre de bem com a vida. o mais impressionante e escreve desde os dez anos, depois de haver lido todos os livros de tres bibliotecas que existiam em Biguaçu. Conheço duas meninas em Chapeco, a Luísa Bortesi e a sobrinha da nossa Confreira Eliane Huning, do Instituto Historico, que leem mais de um livro por semana, enquanto, um ex presidente BR, declarou "eu nao tenho saco para ficar lendo". Por isso chegamos ao fundo do poço e esta ficando difícil sair !!! Tambem: O portugues mal falado, e

ESCREVA Conte-nos o que pensa do Corrente d’escrita e do nosso trabalho. Participe, enviando-nos os seus textos.


Editorial

Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

Neste número exageramos... Elevamos o número de páginas até à meia centena… claro que as matérias justificaram esse aumento. Também iniciamos duas novas secções que justificam esse aumento: entrevistas relacionadas com a vivência das Academias e outras Instituições relacionadas com as letras, as artes e as ciências, e documentos.com, uma secção que terá, em geral, o tratamento de um assunto de forma mais alongada e aprofundada.

Assim, neste número espelhamos a Academia Catarinense de Letras, uma das mais antigas do Estado (100 anos), através do seu atual presidente, o escritor e jornalista Moacir Pereira. Em documentos.com aprofundamos o tema da chamada gripe espanhola, tendo vistas, o atual período de pandemia. Como já anunciado no número anterior voltamos a trazer mais um posicionamento sobre a colonização portuguesa, posição que, como já afirmado, só obriga os seus autores. No próximo número voltaremos ao assunto. Também é de realçar uma posição autobiográfica do escritor joinvilense, membro da Academia local e ainda da Academia Catarinense de Letras, Apolinário Ternes. Mesmo na pandemia, como é nosso timbre, continuamos a trabalhar. E vocês também, pelo menos tiveram tempo de nos “ler” e parabenizar pelo nosso trabalho. Embora a data já tenha passado queremos parabenizar todos os Florianopolitanos, nativos ou aqui residentes, pela passagem do 348° aniversário da capital. Em sua homenagem reservamos a nossa primeira página com a foto do fundador, Francisco Dias Velho, em 23 de março de 1673. Lembramos que o dia 23 de março é data declarada oficialmente, uma vez que não há conhecimento específico da data em que Francisco Dias Velho teria chegado a Nossa Senhora do Desterro (nome primitivo). Com nossas saudações literárias, aguardamos vossas considerações. Afonso Rocha Página 4


de 2019

Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Mantendo a intenção primeira na divulgação dos escritores e de suas obras, alargamos levamos o tema até às suas Academias. Existem milhares de Academias em Santa Catarina e no mundo que se expressa na nossa língua comum — o português. Vamos acarinhalas em nossas páginas. Hoje, começamos por uma das mais antiga: Academia Catarinense de Letras (ACL).

ACADEMIA CATARINENSE DE LETRAS QUESTIONÁRIO

gime militar, depois a Associaçao Catarinense de ImNome oficial da Academia: Academia Catarinense de prensa em plena Democracia. Tenho 55 livros publicados sobre jornalismo, comunicaçao, turismo, fatos Letras historicos e biografias. Escrevo livros para democraCidade: Florianópolis tizar as informaçoes de fatos e personagens que testeNome de atual presidente: Moacir Pereira munhei como jornalista. Como estas oportunidades me foram dadas pelo publico que me prestigiou na Numero de cadeiras: 40 * audiencia, entendo de meu dever compartilhar. Alem, Data de fundaçao: 30 de outubro de 1920 claro, da grande satisfaçao de resgatar, em testemuEndereço: facebook.com/academiacatarinensedeletras nhos jornalísticos, personalidades marcantes da historia recente de Santa Catarina. Corrente – Embora o nosso principal objetivo seja falar e divulgar a Academia, e importante que o seu principal, e atual, responsavel, nos fale um pouco de si, quer como presidente desta insigne instituiçao, seus eventuais trabalhos ligados as letras, as artes e a cultura, quer sobre a sua atividade ocupacional e cívica. Moacir Pereira – Completei este ano 57 anos de jornalismo, atividade a que me dediquei desde a juventude. Por incentivo do saudoso editor Odilon Lunardelli, publiquei os primeiros livros sobre jornalismo e comunicaçao. Exerci a presidencia do Sindicato dos Jornalistas durante o período duro de censura no rePágina 5


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Tomada de posse da nova diretoria (25/03/2021) Dalvina de Jesus com suas filhas: Safira, Lélia GildaNunes e Iracema Celestino Sachet, Pinheiro Neto, Moacir Pereira, Maria Esmeralda, Tereza Piacentini, Pereira e Laerte Tavares.

Corrente – Entao passemos agora a Academia. Quando foi fundada? Com quantos fundadores? Ha alguem, desse grupo inicial, que queira relevar? E atualmente, quantas cadeiras tem a Academia? Estao todas ocupadas? Qual e a forma de ocupaçao? Nesse processo de escolha, digamos assim, quais sao os criterios de seleçao? Do ponto de vista de genero, quantas mulheres e quantos homens fazem parte da Academia? E em termos de idade: quantos ate 40 anos? Quantos entre 41 e 70 anos e, finalmente, com idade superior ou igual a 71 anos?

obras publicadas, examinados por uma comissao especial e depois submetidos a voto dos academicos. Mulheres que integraram ou participam da Academia: Delminda Silveira de Souza, Leatrice Moelmann, Lelia Pereira Nunes, Maria Tereza de Queiroz Piacentini, Maura de Senna Pereira, Sylvia Amelia Carneiro da Cunha e Urda Alice Klueger. A idade e variavel, com a maioria acima de 60 anos. Corrente – Entre os atuais componentes da Academia, quantos se dedicam ao romance/conto, a historia, a poesia, a assuntos científicos/sociais?

Moacir Pereira – A Academia Catarinense de Letras seguiu o modelo da Academia Brasileira, que por sua vez, copiou o paradigma da Academia Francesa, com Moacir Pereira – O genero literario dos academicos e 40 membros. Cada cadeira tem um patrono, um fun- muito variado, com escritores que se dedicaram e dedador e os titulares que a ocuparam nestes 100 anos. dicam a escrever romances, contos, cronicas e poesias, outros mais vinculados a cronicas e alguns exclusiO preenchimento das cadeiras se da atraves da inscrivamente de poesias. çao dos interessados, que apresentam currículos e Página 6


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 envolvam com os leitores/consumidores de vossos Corrente – Entre as atividades periodicas da Acade- trabalhos e o publico em geral? mia, quais as que gostaria de destacar? A Academia tem publicaçoes periodicas definidas? Moacir Pereira –A Academia Catarinense de Letras, por varias razoes, tem uma rica historia de promoçao Moacir Pereira – A atividade permanente da Acade- literaria e cultural mais vinculada a Florianopolis. Mas mia e zelar pela preservaçao da língua, manter a imor- costuma realizar eventos com fatos do interior cataritalidade dos classicos da literatura catarinense com nense, promover autores de outros municípios e disediçao ou reediçao de obras, promover eventos litera- tinguir as revelaçoes de todo o Estado. rios e culturais, manter relaçoes institucionais com Uma das metas da nova Diretoria é justamente a outros orgaos culturais do Estado e do Brasil e incen- de interiorizar mais a Academia, seja pelas parcetivar a literatura e a cultura catarinense. Importante rias com congêneres de vários municípios, seja salientar o Prêmio Academia, entregue anualmente com eventos literários e culturais. Pretende-se as melhores obras nos diversos generos literarios, também levar a Academia as Universidades ou alem do Prêmio Othon Gama d’Eça, pelo conjunto da trazê-las para dentro da Casa de José Boiteux. obra. Corrente – Quer deixar alguma mensagem para os Corrente – Gostaria que me respondesse a uma ulti- nossos leitores? ma pergunta: o ambito de vossa atividade abrange Moacir Pereira - Nestes duros tempos de pandemia, todo o Estado? O Município? Ou e mais localizado? nosso proposito de promover eventos virtuais, enQue tipo de açoes costumam desenvolver que mais se quanto nao forem recomendaveis os encontros pre-

Moacir Pereira, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, reconhecendo-se, na bancada, o professor Augusto Zeferino, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de SC. Página 7


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Academia Catarinense de Letras

Diretoria: Biénio 2020/2022 Presidente: Moacir Pereira Vice-presidente: Maria Tereza de Queiroz Piacentini Secretária: Lélia Pereira da Silva Nunes Tesoureiro: Laerte Silvio Tavares Conselho Fiscal: Celestino Sachet João Nicolau Carvalho Pinheiro Neto * Lista completa dos acadêmicos na Corrente d’escrita n° 38 de out-20.

NOTA DE PESAR Moacir Pereira, na tribuna da ACL

senciais. Enfatizar a importancia da Academia Catarinense de Letras nestes 100 anos de atuaçao, preservando a literatura, a cultura e os escritores que projetaram Santa Catarina no Brasil e no mundo. O inestimável patrimônio legado por personagens tão ilustres precisa ser mais valorizado e divulgado no Estado e no Brasil. Destacar, finalmente, a importancia do “Corrente d’escrita”, ampliando pontes entre catarinenses e portugueses, com atividades que enriquecem a cultura geral e promovem ainda mais a literatura de Santa Catarina em varios continentes. *Nota da Redaçao: das 40 cadeiras referidas, de destacar que se encontram vagas as cadeiras 07, 09, 12, 22, 25 e 33, estando a decorrer o processo de preenchimento de duas delas, a n° 07 e a 22.

Página 8

Já após a conclusão desta matéria sobre a ACL, temos a lamentar a morte, em resultado da covid-19, de dois acadêmicos da ACL: João Silveira de Souza (cadeira 33) - Florianópolis 1933-2021; João Nicolau Carvalho (cadeira 09) - Jaguaruna 1943-2021. As nossas condolências.


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 o início e o desenvolvimento da cidade tal como a encontramos hoje. Portanto, que esta parte da historia sirva de desafio para que outras pessoas relatem seus feitos, suas aventuras e seus acontecimentos a fim de que possa continuar a escrever a historia”. Marcos Antônio Hall

APRESENTAÇÃO “E com imensa satisfaçao que apresentamos esta obra realizada em conjunto com o Coronel Flavio Luiz Pansera e o Coronel Aldo Jose Franz. E uma parte da historia desta “pequena grande” cidade. Pequena no tamanho, mas grande nos eventos que nela aconteceram e acontecem. O início destes relatos foi transmitido pelo meu avo Francisco Joao Julio Hall quando ainda era um adolescente, solicitando que a historia fosse escrita. Depois de muito trabalho foram transcritos os manuscritos e com o auxílio do senhor Gersi Alfredo Bays foi elaborado o primeiro esboço do livro. O destino conspirou com a realizaçao deste objetivo com a aproximaçao e contato entre Flavio Luiz Pansera, Aldo Jose Franz. Foi reacesa a chama para a publicaçao do livro. A partir disto, os autores realizaram varias palestras com meu pai Jayme Jose Emílio Hall, falecido em 25 de agosto de 2019, pouco depois de transmitir uma parte da historia que conseguimos resgatar antes da sua partida. Alem de fatos importantes relatados pelo meu pai, foram realizadas diversas entrevistas com outros moradores da cidade que relataram parte de suas aventuras que constam do livro. Nao conseguimos contemplar todas as famílias que contribuíram e que ainda continuam a contribuir com

Quer divulgar seus livros? Envie-nos um exemplar ou cópia em PDF, com uma breve apresentação.

www.issuu.com/correntedescrita Página 9


Corrente d’ escrita

Leituras...

te a leitura deste “velho” livro (e de 1979, mas encontra em um sebo ou na biblioteca).

Luís Norton veio ao Brasil como diplomata, cujas funçoes desempenhou com extrema distinçao. Apaixonou -se pela natureza do Rio, mas tambem pelos tesouros arquivísticos da historia portuguesa, que jazem nos Para quem quer entender, sem preconceito, a presen- arquivos brasileiros. ça da Corte de Portugal no Brasil, aconselho vivamen- O autor passeia-se pela vida na corte, divulga documentos ineditos e em particular os documentos que relatam a negociaçao acerca do casamento do futuro imperador D. Pedro I, bem como divulga a correspondencia de Dona Leopoldina com seu pai e familiares, o que nos mostra, do interior, as grandes opçoes do Reino e do reinado. Tao importante como a figura de D. Joao VI, sao as figuras de Dona Leopoldina e de D. Pedro. De fato o livro nao aborda so o período de 1808-1821 — datas de vinda e volta da corte para Portugal, mas vai ate 1831, data da abdicaçao de D. Pedro ao trono brasileiro e a sua volta as terras portuguesas para lutar pelos direitos de sua filha ao trono daquele país, usurpado pelo tio D. Miguel. Em anexo a correspondencia diplomatica do marques de Marialva, grande parte dela inedita, relativa as tratativas para o casamento da arquiduquesa Dona Leopoldina com o príncipe D. Pedro.


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 mente do substrato sobre o qual se situa, coloca-se como tarefa oferecer distintas perspectivas para se elaborar o relato sobre a formaçao do Brasil. Suely Moraes

Este livro oferece ao leitor um conjunto significativo de textos elaborados por diferentes letrados brasileiros para a compreensao dos desenvolvimentos, influxos, desvios e mesmo rupturas ocorridas na historia da historiografia nacional. Se o contexto setecentista, no ambito das suas academias literarias, semeou o germen da erudiçao historica no mundo luso-americano, colocando como problema intelectual os modos pelos quais uma historia da America portuguesa poderia ser escrita; se as primeiras decadas do seculo XIX foram marcadas por uma relativamente intensa produçao estrangeira sobre o Brasil e sua historia, alem dos acalorados debates internos sobre o tema da autonomia política e da definiçao de um novo Estado e suas relaçoes com a antiga metropole, o que implicava, por sua vez, a definiçao de uma outra historia; e se, finalmente, desde a decada de1830 o imperio brasileiro se viu na contingencia de elaborar para si mesmo uma historia, estabelecendo a simbiose entre a formaçao danaçao e os desenvolvimentos do Estado e, com isso, organizando um tempo proprio para esta historia; o ambiente intelectual que se abre a partir do ultimo quartel do seculo, sem abdicar totalDivulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 11


Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

Geração de renda

Fazenda e da Administraçao. Fizemos todo tramite em conjunto com a Controladoria Geral do Estado, eu acredito que vamos colocar um ponto final nesta situSetor Cultural açao, ate porque o governador esta cobrando”, garanEm reuniao virtual no passado dia 09/03, a deputada tiu. Luciane Carminatti (PT) tratou da geraçao de renda emergencial e outras pautas prioritarias ao setor cul- A deputada tambem questionou a FCC sobre a expectural com a presidente da Fundaçao Catarinense de tativa de criaçao de: uma chamada publica unificada das empresas estatais catarinenses (Celesc, Casan, Cultura (FCC), Ana Lucia Coutinho. SCGAS) para seleçao de projetos culturais aprovados A parlamentar, que preside a Comissao de Educaçao, pela Lei de Incentivo a Cultura federal; um programa Cultura e Desporto da Alesc, iniciou o encontro destade continuidade para grandes eventos culturais; e da cando a urgencia da segunda ediçao do edital Lei do ICMS do Patrimonio Cultural, a exemplo do que #SCulturaEmSuaCasa. “Eu acreditava que nos ja iríaja ocorre em Minas Gerais. Para esta ultima, Luciane mos começar 2021 contando com isso, porque ja teanunciou apoio do parlamento. mos a expertise do ano passado, mas estamos em março e nem sinal. O edital e emergencial, como o no- Ana Lucia respondeu que desde 2019 recomenda ao governador a adoçao de mecanismos para qualificar me ja diz”. as chamadas publicas mas esclareceu que nao tem Luciane tambem convocou a FCC a mobilizaçao coningerencia sobre as estatais; acatou a sugestao sobre a junta para colocar os recursos da Lei Aldir Blanc nas legislaçao que visa a valorizar o patrimonio catarinenmaos do setor cultural. Santa Catarina tem uma sobra se; e informou que neste momento de pandemia a FCC de R$26 milhoes dos repasses federais de 2020 — e nao tem condiçoes de avançar nos estudos para um críticas a baixa distribuiçao. Agora, depende de autoprograma que atenda exclusivamente os grandes rizaçao definitiva de Brasília para reaplicar em 2021. eventos. “A saída, por enquanto, e a Lei do Mecenato”, “Precisamos de mais transparencia e participaçao do concluiu. setor cultural no planejamento da distribuiçao do recurso remanescente, para evitar problemas como no ano passado”, completou. _______________________ Sobre a segunda ediçao do edital emergencial, Ana Lucia Coutinho nao deu previsao de data para o lançamento. “Precisamos fazer ajustes para corrigir o que nao deu certo na primeira ediçao, alem de plataformas para operacionalizar os editais”. Um termo de referencia para contrataçao deve ser assinado nos proximos dias com o Ciasc. Ela ainda alegou incertezas jurídicas para aplicaçao da Lei Aldir Blanc e pediu o engajamento da deputada na força-tarefa para manter os recursos em Santa Catarina. Ja os tradicionais Premio Catarinense de Cinema e Elisabete Anderle devem ser lançados ate maio.

Luciane Carminatti Filha de Domingos Carminatti e Luiza Ana Carminatti. Natural de Chapeco, no oeste de Santa Catarina, nasceu em 1970. E mae de tres filhos: Paula, Julia e Guilherme, e casada com Alceu Werlang. Formada em Pedagogia e especialista na area de Educaçao Especial e em Orientaçao Educacional. Antes de ocupar cargos publicos eletivos, atuou como professora e coordenadora pedagogica em escolas publicas de Chapeco.

E professora e presidente da Comissao de Educaçao, Luciane Carminatti cobrou ainda a regulamentaçao da Cultura e Desporto da Assembleia Legislativa de Santa Lei do Mecenato, aprovada em 2019. Ana Lucia infor- Catarina. mou que desde entao vem construindo as regras com uma equipe de tecnicos e procuradoria jurídica e prometeu um desfecho proximo. “Ainda nesta semana teremos uma reuniao com as secretarias estaduais da Página 12


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 Vem de ser publicado o livro que contempla o Premio de Literatura e Curta-Metragem FILOLISBOA 2020. Com o poema VOU PARTIR, (ver Corrente n° 37 de set-20) - o qual deu origem a uma CurtaMetragem -, Afonso Rocha foi contemplado pelo juri com a Menção Honrosa na categoria senior. O poema VOU PARTIR foi magistralmente declamado pelo encenador, ator e poeta Antônio Cunha, presidente da Academia Catarinense de Letras e Artes, acompanhado musicalmente por Brian Eno—Stars.

Divulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 13


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 a dificuldade de Reprobo, nome original de Sao Cristovao, atravessa-lo com o Menino Jesus as costas.

O hino era outro

O Hino Nacional que cantamos nao e a cançao que venceu o concurso publico para escolha deste importante símbolo nacional. O povo nao aprovou a musica de Leopoldo Miguez e a letra de Medeiros e Albuquerque, embora tivessem obtido em concurso publico o primeiro lugar, entre 36 candidatos. Tambem nao tinha aprovado a letra anterior, de Americo Moura: “Gravai com buril nos patrios anais o vosso poder/ Eia! Avante, brasileiros! Sempre avante”. Entao, o marechal Deodoro da Fonseca, monarquista que proclamara a Republica, determinou que o Hino Nacional continuava a ser aquele dos tempos do Imperio, letra do professor de portugues do Colegio Pedro II, Joaquim Osorio Duque Estrada, e musica de Francisco Manuel da Silva.

Aquarela do Brasil nao e hino nacional, mas talvez seja mais coerente com a Historia do Brasil: “Ah! Abre a cortina do passado/ Tira a mae preta do cerrado.” A menos que os atuais censores de Monteiro Lobato vejam racismo nesse autor tambem. Ary Barroso, orfao desde os oito anos, que “teria um desgosto profundo se faltasse o Flamengo no mundo”, venceu todas na vida, mas perderia para os censores. Porque "a burrice, no Brasil, tem um passado glorioso e um futuro promissor", como disse o ex seminarista Roberto Campos. Enquanto nao mudarmos a letra do Hino Nacional ou nao a aprendermos, continuaremos dando o vexame de nao saber canta-la ou nao saber o que cantamos. Poucos entendem versos tao rebuscados, compostos de palavras estranhas, algumas ja fora de circulaçao! A prova dos nove de que todos sabem o Hino Nacional dar-se-a quando ate os jogadores da seleçao brasileira, este “impavido colosso”, cantarem seus versos “em brado retumbante", saudando o "Brasil, florao da America", devidamente perfilados diante do “labaro estrelado”, iluminados pelos "raios fulgidos" do patriotismo e protegidos pelo “formoso ceu risonho e límpido”, onde “a imagem do Cruzeiro resplandece.” E sem “o heroico brado”.

A letra classificada em primeiro lugar e bonita, mas falsa! Diz: “Nos nem cremos que escravos outrora/ Tenha havido em tao nobre País..." Outrora era 1888! Fazia pouco mais de um ano que nao havia mais escravos no Brasil, por força da Lei Aurea, assim chamada por ter sido assinada pela princesa Isabel com uma “Heroi cobrado?”. Cada um deles e um heroi pago! Os caneta de ouro! mais famosos nao sao mais pagos em cruzeiros, veTal como na letra que hoje cantamos, o riacho Ipiran- lhos ou novos, nem em reais, e, sim, em dolares, euros, ga tambem esta la, parecendo o Amazonas, pelo estilo dinares etc. pomposo: "Do Ipiranga e preciso que o brado/ Seja um grito soberbo de fe!". Igual decepçao tiveram os Entao, que pelo menos saibam cantar o Hino. cruzados quando chegaram a Terra Santa. Acostuma- * publicado em O Globo dos a ver rios europeus grandiosos, como o Danubio e Deonísio da Silva o Reno, achavam que o Jordao fosse ainda maior! E Academia Catarinense de Letras encontraram um riacho! Portanto nao era tao grande

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no

Corrente d’Escrita Envie-nos seus textos (maximo: 4 mil toques para cronica, conto ou ensaio). Página 14


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Memória de um tempo estranho

Apolinário Ternes * Recorri a carteira profissional para conferir a data de ingresso no jornalismo: 1º de março de 1968, na Radio Nereu Ramos, de Blumenau, entao sob o comando de Evelasio Vieira, o Lazinho, ex-jogador de futebol, que seria deputado e senador da Republica. Nos tempos em que a Republica dormia sob o sono da ditadura. O Ato Institucional nº 5, que fechou o Congresso e impos a censura, seria assinado no dia 13 de dezembro de 1968. Naquele mes dezembro, por ironia da vida e paradoxos do tempo, me transferia com armas e bagagens para A Notícia, para “redatoriar” o jornal “Cidade de Blumenau”. O ano de 1968 se mantem como o grande símbolo e ícone da historica “decada de 1960”, que, adiante, a Veja traduziria como “o ano em que tudo mudou”. Foi, de fato, um ano para nunca esquecer. Alem do “fechamento” do regime militar, os jovens se tomaram em indignaçao e produziram “barbaras” revoltas nas principais praças do mundo. Um ano invencível, da pílula anticoncepcional, dos Beatles, dos assassinatos de Martin Luther King e Bob Kennedy. E no ano seguinte, teríamos a “conquista” da Lua e o primeiro transplante de coraçao no Brasil, de autoria de Euriclides de Jesus Zerbini. 1969 seria o ano da trombose em Costa e Silva, da Junta Militar e, depois, Garrastazu Medici. A decada de 1970 seria inaugurada com o TRI, no Mexico; a ponte Rio-Niteroi e Itaipu. Nascia o Brasil Grande.

reu simultaneamente com os muitos medos da naçao. Quase nada podia e quase tudo se temia. A censura chegava atraves de breves comunicaçoes telefonicas, a partir do Exercito, indicando que “tal assunto” ou “tal materia” estava cancelada. Nada de publicaçao. A censura ocorria em torno do noticiario nacional, ou mesmo internacional. Nos assuntos locais, valiam o medo e a autocensura. Que os mais antigos chamavam de prudencia e precauçao. Aqui se podia tudo, ou quase. Falar mal de delegado de polícia, dava cana. E deu. Da polícia militar, menos ainda. Dava cana. E deu. Com direito a espancamento em rua publica, nas proximidades do quartel. Fui uma das vítimas da truculencia policial que se servia da ditadura para controlar reporteres atrevidos. Fui preso e espancado dias antes da chegada da Miss Brasil – Vera Fischer – para abrir a “Festa das Flores”. Foi um rebuliço elegante na Sociedade Harmonia-Lyra, quando colegas denunciaram o caso ao governador, pouco antes de um banquete. O governador mandou prender o policial, que foi expulso da corporaçao e, depois, queria se vingar do jornalista. Foram semanas de esconde-esconde, como gato e rato, dorme aqui e acola, ate que o meliante recebesse “recomendaçao” (da propria polícia) para desistir de me “apagar”.

Apesar do cinza-chumbo do cenario nacional, por aqui, excetuando política e polícia, se podia escrever sobre quase tudo. E escrevi, com medo e raiva, sob a indomavel furia de jovem e romantico. Mantive, em A Notícia, nos primeiros anos da decada de 1970, a coluna “Teclados Sem Censura” e, em cerca de 1500 cronicas tentei interpretar o Brasil do meu tempo. De anos pesados e de jornalismo leve, mas apaixonado. Nao sabíamos, mas repetíamos Nelson Rodrigues, sem o talento daquele, mas certamente com a mesma empafia. As cronicas ficaram como sucesso ululante, e registro de um tempo paranoico e de ditadura pesada, que foi abrandando com Ernesto Geisel, a partir de março de 1974. Os nomes da epoca, Delfim Neto, Golbery do Couto e Silva, Orestes Quercia e Luiz Inacio, o metalurgico. Falou-se, em Minha estada no jornal “Cidade” acabaria ja em dezembro mídia turva e nas entrelinhas, tambem de Vladimir Herzog, de 1969. O jornal acabou desativado por decisao da Manuel Fiel Filho e de Armando Falcao. “matriz”, o jornal A Notícia, de Joinville, que mantinha o Nos anos 70, em A Notícia, se compunha o título de cada diario de Blumenau. E por aí, acabei em Joinville, para de- pagina a mao, letra a letra. Tecnologia grafica dos anos sempenhar as nobres funçoes de “reporter” geral de A Notí- 1930. Nas coleçoes de fontes – incompletas – com decadas cia. Nos tempos do Brasil Grande, o jornalismo na trepidan- de uso. Coleçoes de fontes que vinham desde os tempos de te Joinville ainda se fazia na base do chumbo quente, da Aurino Soares, o fundador do jornal, em 1923. Mas tínhalinotipo e do telefone fixo, preto e improvavel. Naquelas mos linotipo, radio-escuta (com o intrepido telegrafista Pio) maquinas de escrever pesadas como o passado, ou superle- e, nas horas de apuro, “giletepress”, a inocente utilizaçao da ves, anunciando o design da modernidade. Tínhamos as gilete para recortar textos publicados em outros jornais (de duas na redaçao. Sao Paulo). A “frota” da empresa se resumia a um fusca e Tempos delirantes de entusiasmo muito e pouca tecnica. uma kombi, em pessimas condiçoes de uso. O reporter de Jovem em quase tudo, minha imersao no jornalismo ocor- “Cidade” – eu – fazia a “cobertura” da Camara, prefeitura e Página 15


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 delegacia de polícia em rapidas caminhadas no quadrilatero do poder no ainda modesto “centro” urbano da cidade. Jornalismo de improviso, mas de paixao. E havia a concorrencia irresoluta do “outro” jornal, o nao menos tradicional “Jornal de Joinville”, que pertencia aos Diarios Associados. “Brigava-se” muito para nao sermos “furados” pelo concorrente. Nas tres principais areas: esporte, política e polícia. De 31 de janeiro de 1980 em diante, contudo, a modernidade, enfim, chegaria ao “nosso” jornal. Em novos tempos, com Moacir Thomazi na presidencia da empresa e Luís Meneghim na direçao de redaçao, iniciamos, com algum atraso, a recuperaçao dos tempos perdidos. Foram anos de investimentos tanto em tecnologia, quanto em qualificaçao de pessoal. A redaçao foi se ampliando, ano a ano. Novos produtos. Novos cadernos. Mais profissionais. Ainda no começo dos anos 70 o “corpo de redatores” nao chegava a 10, nenhum com o curso respectivo, ou profissional formado em curso superior. Os tempos mudaram, inclusive com a regulamentaçao da profissao, que exige diploma. Os jornalistas eram escassos, mas multiplicavam-se os talentos, que se descobriam “nascidos” para a missao. E, assim, explica-se como o jornalismo, num Brasil recente, foi praticado com garra e notavel paixao. Nao se trata de nostalgia ingenua, mas a “globalizaçao” matou determinado tipo de jornalismo e introduziu novos valores, e novos “modos de fazer”. Com Internet e celular. Computador e Google. O jornalismo, dos anos 90 em diante, tem se transformado numa imponderavel corrida de obstaculos, em que a tecnologia e a globalizaçao acabam por exibir produtos diferenciados, multiplos

e, acima de tudo, improvaveis. Quase tudo o que existe hoje, pode desaparecer amanha. Nao ha duvida, o “sistema” antigo enfrenta uma dura crise. O maior de todo os desafios diz respeito a criatividade e inovaçao. De qualquer forma, os novos tempos estao a produzir, perigosamente, jornais “bonitos e banais”. Bem editados, cheios de cores e infos, explicaçoes e “acompanhamentos”, mas os jornais de hoje interessam a publicos cada vez menores. A reinvençao do jornalismo esta para ser feita. O que temos em curso, sao experiencias e movimentos especulativos em busca de leitores que estao sumindo. Daí “embalagens” cuidadas, conteudos-interativos, inovaçoes constrangedoras, tudo em busca de leitores que, a rigor, estao obtendo a mesma informaçao antes e em outros lugares. O jornal-papel, se nao se reinventar – e com talento – pode virar, de fato, papeljornal para embalar peixe. Nos mercados do interior, porque nos centros mais desenvolvidos, nem para isto servira. E a crise da modernidade, criando um desafio espetacular para as empresas de comunicaçao. Os jornalistas, contudo, sempre terao mais trabalho e menos emprego. A profissao esta em alta, como revelam os índices de procura de vagas na Academia. O mercado (ainda) nao esta saturado, as opçoes sao muitas e inesperadas, ate. Os talentosos, geralmente esforçados, tambem, terao espaço. O jornalismo sobrevivera aos tempos indolentes e indiferentes de hoje, onde, infelizmente, se multiplicam os jornais “bonitos, baratos e banais”.

Apolinário Ternes, tomando posse na Academia Catarinense de Letras

(*) Apolinario Ternes. Formado em Historia e Direito, e mestre em Educaçao e Cultura pela Udesc e tem 25 livros publicados, abordando a historia de Joinville, de empresas e instituiçoes do Norte catarinense, alem de obras de ficçao. E membro da Academia Catarinense de Letras.

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no

Corrente d’Escrita Envie-nos seus textos (maximo: 4 mil toques para cronica, conto ou ensaio). Página 16


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

O TEMPO SUJO Há dias que eu odeio Como insultos a que não posso responder Sem o perigo duma cruel intimidade Com a mão que lança o pus Que trabalha ao serviço da infecção São dias que nunca deviam ter saído Do mau tempo fixo Que nos desafia da parede Dias que nos insultam que nos lançam As pedras do medo os vidros da mentira As pequenas moedas da humilhação Dias ou janelas sobre o charco Que se espelha no céu Dias do dia-a-dia Comboios que trazem o sono a resmungar para o trabalho O sono centenário Mal vestido mal alimentado Para o trabalho A martelada na cabeça A pequena morte maliciosa Que na espiral das sirenes Se esconde e assobia Dias que passei no esgoto dos sonhos Onde o sórdido dá as mãos ao sublime Onde vi o necessário onde aprendi Que só entre os homens e por eles Vale a pena sonhar. Alexandre O’Neill (poeta português)

Divulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 17


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Afonso Rocha *

Uma das condicionantes primeiras para integrar uma academia, deveria ser a obrigaçao de apresentar obra publicada. Mas, infelizmente, tambem nao e assim.

Sei, por experiencia propria, que este nao e o retrato de algumas academias nem dos academicos catarinenses. Mas, por poucos que sejam, sempre e bom ter princípios. Ter em conta que uma tese de curso, de mestrado, de graduaçao a qualquer nível e especialiVocê é imortal? dade nao sera materia qualificada para adesao as academias de letras. Os engenheiros, os medicos, os advogados, os juízes e todas as restantes profissoes libeChamam de imortal aqueles e aquelas que fazem parte rais terao as suas respectivas Ordens ou Concelhos, o de uma Academia de Letras. que nao invalida o fato de haver bons escritores que Mas por que carga d'agua eles sao imortais? E meu militam, e bem, nas Academias de Letras. entendimento que imortal quer dizer que nao morre; Instituiçoes desta natureza (de letras, artes e ciencias) que perdura nos tempos presentes e futuros. E o cernao se devem transformar em patios de acolhimento to, e que muitos academicos - aqueles que sao memou de asilo de personalidades (da política, do desporbros das academias de letras - acreditam mesmo nisto, da economia, do social), por muito meritorias que so. possam ser, mas sim, lugar de criaçao literaria, artístiE aí fica tudo estragado. ca e científica. A vaidade sobe-lhes a cabeça e a carapuça tem dificul- Como diz o bom senso, o homem passa, mas a obra dade em se segurar. fica e com ela a imortalidade. Assim e que “e direito”. Por isso aparecem academias como cogumelos. Por vezes louvadamente, com grande merito dos fundadores e continuadores, mas tambem, muitas das vezes, pelo simples fato de "arranjar" um título para apresentar nas relaçoes publicas. Muitos nao tem, tampouco, obra publicada.

* Escritor, jornalista, editor Academia de Letras de Biguaçu/SC Academia Artes, Letras e Ciências de Cruz Alta/RS

E aqui voltamos a minha questao inicial: pelo simples fato de integrarem uma academia de letras serao imortais?

Nao. Francamente nao. Imortal nao e o homem, mas a sua obra: o livro, a pintura, a musica, a pesquisa. Essas sim, se tiverem o condao da qualidade e do interesse publico, integram, de fato, a imortalidade.

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no

Corrente d’Escrita Envie-nos seus textos (maximo: 4 mil toques para cronica, conto ou ensaio). Página 18


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

amou, mas poderia leva-la para mais longe de toda a dor.

Se fosse mais do que Um olhar?

Nao, Don Juan, nao, mas, se tivesse dele o encantamento e de Heitor a bondade e a sede de justiça, talvez nem precisasse da força e da determinaçao de Hercules para carrega-la nos braços e soprar felicidade em seus cabelos.

No início, ela riria, mas depois, cairia de amores Esbarram-se. No susto, olham-se. Nos olhos. E por sua pureza se ele fosse Don Quixote e, por ela, seguem seus caminhos. Ele ainda se vira em bus- desistisse de Dulcineia e a ensinasse a enfrentar ca de uma razao, nao do olhar, mas de algo que gigantes disfarçados de moinhos. explicasse a impressao que ficou. “Bonito”, pensa Sendo Alexandre, ela o ensinaria a amar em cada ela. Seguem seus caminhos. encosta conquistada. E se ela fosse Diana, guerreira, pronta a lutar todas as batalhas e vence-las por ele? Seguiriam por ceus em busca da suprema luta, a que para sempre sublima os coraçoes?

E se Sherlock, sagaz e observador, trocaria seu cachimbo por beijos, interrompendo suas investigaçoes somente para pedi-los e saborea-los.

Poderiam ser tantos, ligados por um encontro, Quem sabe os olhos de ressaca, igual aos de Capi- colados por um esbarrao, mas continuam assim, tu, eternamente vítima do ciume e dos julgamen- ela simplesmente Maria, ele simplesmente Joao, tos decorrentes, o embriagassem tambem e an- em olhares que se perderam no eter sem nunca dassem bebados, rindo do mundo. mais se encontrarem. Ou seria ela a “Reina” de Neruda, com sua coroa de cristal, pisando em tapetes imaginarios, e ouviriam juntos o hino que enche o mundo, mas reservado apenas aos ouvidos dos dois? Poderia haver mel em seus labios, como nos de Iracema, desenhados somente para adoçar os dias de acordarem como se fossem um para ouvir o amanhecer. Ou Julieta, perdida de amor e perdendo-se por ele, virando lenda, melhor que Helena, a de Troia, que tambem virou lenda e causou guerra. Mais forte, seria Ursula, pilar de Macondo, a solitaria cidade, ou a mulher sem nome a guiar cegos. Como faria com ele, homem, em sua cegueira, que e dos homens? Poderia ele ser Romeu, jurando e cumprindo para sempre ama-la. Capitao Rodrigo, que, depois de morto, ainda Página 19

Donald Malschitzky Escritor, cronista


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 se contentam em pular em cima do tapete aqui em frente da minha cama...”

Oldemar Olsen Jr. *

AS MULHERES AO REDOR Estou na cama. As dores provocadas por uma crise de gota nao se justificam, uma vez que sequer estou bebendo, mas o medico me ira esclarecer. O que importa agora e a constataçao de que os meus atos passaram a ser pautados pela presença invisível de varias mulheres...

O Valdir continua sorrindo e esperando para ver onde aquela conversa iria dar. Como nao diz nada, continuo: “Aí vem a Domitila, caseira, prefere ficar la na cozinha, nao sai da frente do fogao, tudo bem se gosta disso, penso; mas a mais terrível e a Claudia Castaneda, nao precisa rir, porque parece que ela esta sempre “chapada”, demorei em entender que aquele era o “seu jeito”, e com todo o respeito, ha muito deixei de pretender reformar o mundo, mas o “duro” sao as amigas, a trupe quando resolve reunir-se em frente da televisao. Abstraindo a Dulcineia que prefere a permanencia ao lado da escultura do Dom Quixote na sala, as outras tartamudeiam todas ao mesmo tempo sem o menor decoro; a Angelica prefere o espaldar do sofa, esbaforida e barulhenta, a Genoveva, aristocratica so no nome, foi reprimida em outros tempos, mas ali se esbalda e parece que se multiplica; A Christininha, uma incognita porque a chamo no diminutivo, parece tres e açambarcar toda a mesa de centro quando resolve se manifestar. Quer saber? Parece um bando de peruas planejando um assalto...”

Batem a porta. Vou manquitolando atender pensando que o medico chegou cedo. Para surpresa minha, recebo a visita do jornalista, Valdir Alves. Chega com duas garrafas de vinho. Um dos meus poucos amigos, o Valdir “e da casa” como se diz, explico a situaçao e volto para o quarto. Ele aparece em seguida, puxa uma cadeira e senta-se ao lado da cama. Vai bebendo o seu “Cassillero Del Diablo” enquanto relato o que me atorNesse ínterim, a chuva recrudesce, ouvimos um estalo mentava antes dele chegar: as mulheres! seco ao lado da cama. O Valdir indaga: “o que foi isEle escuta com um sorriso malicioso e certo brilho no so?”. Digo que e apenas o espraiar guloso de uma gota olhar, percebo que esta interessado e exponho o tal de agua estatelando-se num pote de sorvete que ele assedio. “Veja o caso da Dolores, por exemplo, vem nao pode ver e concluo: “esta e a Dolores, de quem ja aqui em casa, e metodica, fica ali no pe da cama, a mi- falei, e que acaba de chegar”. nha direita, quase imperceptível, preciso me esforçar Ele começa a rir... Digo que todas as goteiras aqui em por dar por ela; depois tem as gemeas, Janice e Janete, casa tem nome de mulheres... sao tímidas, me lembra a minha infancia, quando chegavam pessoas estranhas, a gente corria para se es- Esta rindo e? A coisa e seria. Dia desses uma amiga conder, pois bem, elas ficam ali atras daquela porta de esteve aqui com o filho, e quando soube disso, pediu vidro, espiam, fazem algum ruído e creem que me di- para ser homenageada. Pensei na goteira na sala que virto com isso, nao digo que nao, mas e curioso; tem a cai em cima de uma cadeira de couro e faz um som Gioconda, mais pretensiosa, metida a intelectual, ela diferente. Disse a ela e que seria a primeira batizada prefere aquele nicho entre o balcao e a escrivaninha, com o nome de alguem conhecida: Georgia! Que bom ja a surpreendi bisbilhotando os meus escritos, faço afirma, assim voce pode pensar em mim, lembrei do que nao sei, mas sei. Nao gosto quando vem acompa- Ray Charles, e tasquei, claro, sempre: “Georgia on my nhada das tres filhas, que ja apelidei de Lala, Lele e Mind”! Lili, uma alusao as sobrinhas do Pato Donald, porque * Escritor, sao enxeridas, ficam bulindo os tabuleiros de xadrez, membro da Academia Catarinense de Letras aquele de vidro (que ganhei do Horacio Braun) e aquele artesanal (presente do artista Telomar Florencio), preciso intervir, quando entao “as queridinhas” Página 20


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Agora eu curto saudades das coisas daqui.

E da Baía Afonso Wippel que ja nao possui apenas os barquinhos de cores açorianas que habitavam meu inconsciente coletivo, mas e agora palco das modernidades edificadas a ceu aberto.

E de correr o corso de bicicleta ate o interior do interior, como fazia na adolescencia com primos e amigos, Da gatinha Amy que deixei para tras. todos tao inocentes, papel em branco, esperando por Da minha mae que foi meu porto seguro e que agora historias a serem contadas quando os cabelos comese ampara no meu cais. çassem a branquear. Dos amigos de escola que antes tao presentes, hoje E curo ainda saudades de colher pitanga, goiaba e floestao recolhidos a se protegerem deste vírus pande- res na vizinhança mais recente, da rua onde agora hamico. bito temporariamente "chez ma mere". Eu curo saudades da Praia Brava onde tantas vezes E tempo de cura. sonhei com novos horizontes perdida no horizonte a Mas tambem e tempo de alimentar outras saudades. minha frente. Do filho unico que me aguarda no Porto. E do Morro da Cruz onde em silencio admiro a lindeDo calor seco do verao portugues. za sinuosa dos contornos litoraneos da bela Itajaí. E da vizinhança da rua Navita que mudou de nome, De caminhadas por lugares a se desbravar. E sao tanporque com o tempo, tudo muda, os moradores tam- tos. bem se mudam. Uns para o ceu. Outros para outra ca- De amores nao vividos. sa, outra cidade, outra rua. E do Mercado de Peixes com o zum zum zum de pessoas e o colorido das multiplas especimes de frutos marinhos.

Página 21

Simoni Casimiro

Do novo eu que mora em mim. Porque saudades tambem movem uma vida plena.


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Terço.

Lugares com História Páginas do passado

Seus meritos foram recompensados pelo rei de Portugal, que lhe concedeu a patente de Capitao do Terço dos Indígenas, com as bençaos de Camarao. O "Terço" era uma formaçao Militar Iberica, constituída em 10 companhias de 100 homens cada, chefiadas por um Capitao cada uma delas, sendo o terço liderado por um Mestre de Campo. Mathias Fernandes era portanto, o comandante de uma das companhias do Terço.

Capitão Mathias Fernandes Em 1672, o indígena Fontes: Imagem: "A Batalha dos Guararapes" de Victor Meirelles. Carta-Patente ao paraibano Mathias Fernandes recebia Capitão Mathias Carta-Patente de caFernandes, pitao do Terço dos 1672. Indios a partir de merce concedida pelo rei de Portugal, D. Pedro II, sob pedido do Capitao-Mor dos índios, Felipe Camarao. Nas chamadas "Guerras Holandesas", ocorridas no seculo XVII, varios indígenas tomaram parte dos combates e sao principalmente lembrados atraves da figura de Felipe Camarao, o indígena Potiguar que se aliou aos portugueses, recebendo inclusive patente de Capitao-mor. Porem muitas vezes se esquece que a atuaçao indígena nestes eventos e extremamente diversificada. Nem todos os indígenas estavam aliados aos portugueses. Muitos se aliaram a WIC (Companhia das Indias Ocidentais) holandesas, muitos deles de origem Tapuia. No entanto, no caso aqui exposto, falamos dos que estavam aliados aos portugueses, caso de Mathias Fernandes, natural da Paraíba, que lutou com as tropas de Camarao na Batalha dos Guararapes, começando por Soldado, passando por Alferes e em seguida, Capitao do Página 22

A Batalha dos Guararapes aconteceu na antiga Capitania de Pernambuco, no Morro dos Guararapes. Lusoportugueses e neerlandeses, ou holandeses, lutavam pelo controle territorial da regiao Nordeste. O conflito foi dividido em dois momentos. O primeiro confronto aconteceu nos dias 18 e 19 de abril de 1648, com a vitoria lusoportuguesa. O segundo, quase um ano depois, no dia 19 de fevereiro de 1648, foi vencido novamente pelos defensores do imperio portugues.


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 A populaçao luso-portuguesa era formada por pessoas que tinham dupla nacionalidade, pertenciam a Portugal e ao Brasil simultaneamente. Boa parte do Brasil Colonia (período que corresponde aos seculos XVI a XIX) pertencia a Coroa Portuguesa, exceto a Capitania de Pernambuco e uma area consideravel do Nordeste, que era propriedade da Companhia Holandesa das Indias Ocidentais. Assim foi por cerca de 30 anos. O contexto em que a Batalha dos Guararapes se inseriu era de guerra por todos os lados. A Espanha, que tinha o domínio de Portugal e Holanda, estava em conflito com quase todos os outros países da Europa. Enquanto os espanhois exerciam o controle diante dos portugueses, havia um decreto que tornava proibido o comercio com os portos e companhias que nao estavam sob domínio espanhol. Isso afetou diretamente o comercio holandes, que dependia da comercializaçao do açucar produzido em Pernambuco.

derrotado pelos espanhois na batalha de Alcacer-Quibir. Um dos fatores que mais marcaram esse episodio foi o desaparecimento do corpo de Dom Sebastiao, rei de Portugal. A derrota gerou crise na sucessao do trono portugues. Temendo que a Espanha tivesse todo o controle portugues, a saída encontrada foi promover uma uniao dinastica. As duas coroas, assim como as colonias que a elas pertenciam, tornavam-se uma so, nascia a Uniao Iberica. Na teoria, as duas coroas compartilhariam as benesses, mas na pratica a historia foi outra. Portugal dependia completamente da Espanha. Na epoca os espanhois tinham o maior imperio do mundo, controlando inclusive a Holanda. Para nao ser sofrer com mais imposiçoes, Portugal iniciou uma revolta contra a Espanha, evento entre 1640 a 1668 e ficou conhecido como a “Guerra da Restauraçao”. Diante do apoio frances, a Coroa Portuguesa saiu vitoriosa do conflito. Com o fim do domínio espanhol sobre os portugueses, as colonias tambem pertenceriam somente a Portugal, acordo garantido pelo tratado de Lisboa. O problema e que os holandeses nao iam abrir mao facilmente da regiao pernambucana. O comercio do açucar era extremamente lucrativo e eles ja tinham investido muito capital naquela regiao.

Os impostos em cima da produçao do cafe e o crescimento das dívidas dos colonos portugueses aumentava a cada dia. A populaçao da Nova Holanda, nome dado a atual Recife, ja nao queria mais ser dependente dos neerlandeses. Portugueses, brasileiros, luso-brasileiros, negros e indígenas lutaram juntos para acabar de vez com o controle da Logo em seguida, os espanhois decretaram que nenhuma Espanha na regiao Nordeste. de suas colonias poderiam fazer comercio com países fora A diferença entre os dois exercitos era bem significativa, de seus domínios, ou seja, os portos portugueses se fecharinao so no aspecto quantitativo, mas qualitativo tambem. Do am para a produçao açucareira da Holanda. Os senhores de lado da Coroa Portuguesa estavam alguns soldados portu- engenho nao gostaram nem um pouco do decreto. gueses e cidadaos repletos de patriotismo. Ja o exercito Aquilo significava a perda de um grande mercado consumiholandes era constituído de mercenarios alemaes e polone- dor. Associado a isso, os impostos cobrados pelos holandeses. O que determinou a vitoria do grupo portugues na Ba- ses ficavam cada vez mais altos e os produtores de açucar talha dos Guararapes foi o conhecimento do territorio e saturados. Era uma questao de tempo para que holandeses uma tatica de guerra bem específica. e luso- brasileiros se desentendessem. Começava Cenário da época

a Insurreiçao Pernambucana.

Para entender a razao desse conflito e preciso voltar no tempo, mais precisamente em 1580, quando surgiu a Uniao Iberica. A Uniao Iberica constituiu uma unidade política que comandou toda a Península Iberica, ou seja, Portugal, Espanha, algumas regioes do territorio da França, Gibraltar e Andorra.

Insurreição Pernambucana

A Insurreiçao Pernambucana aconteceu no seculo XVII, entre 1645 e 1649. Luso-portugueses enfrentaram o exercito da Holanda na tentativa de expulsa-los do territorio brasileiro. Os impostos cobrados pelos holandeses estavam cada vez mais altos, associado a isso estavam fatores como a coDois anos antes, em 1578, o Imperio de Portugal tinha sido brança dos emprestimos concedidos pela Companhia das

Anime-se. Apoie e participe no

Corrente d’Escrita Faça-nos chegar seus contos, cronicas, poesias (maximo 4 mil toques) com ou sem foto. Página 23


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Indias Ocidentais e a diferença religiosa.

Os neerlandeses tambem pensaram em ocupar o povoado de Muribeca, porque ali estava a produçao de farinha de mandioca que alimentava os soldados. No entanto, Fernandes Vieira e Vidal de Negreiros, dois generais do exercito portugues, se anteciparam. Os holandeses nao conseguiram chegar na posiçao planejada. O confronto foi praticamente aberto: 7.400 soldados que representavam a Holanda contra 2.200 soldados que combateram pelo Brasil.

Grande parte dos holandeses era judeu e protestante, ja os portugueses professavam a fe no catolicismo. A luta pela libertaçao do Brasil uniu os indígenas do grupo potiguar e negros recem libertos aos luso-brasileiros. O principal enfrentamento aconteceu no Monte Tabocas, atual cidade de Vitoria de Santo Antao, em Pernambuco. Os luso-brasileiros saíram vitoriosos desse conflito, mas as disputas territoriais entre esses povos ainda nao tinham acabado. Desse conflito os luso-brasileiros saíram vitoriosos. Desse grupo, 84 pessoas morreram. Do lado holandes, 1.200 morPrimeiro conflito tes foram contabilizadas. Os soldados que lutavam pela A primeira parte da Batalha dos Guararapes aconteceu nos Companhia Holandesa das Indias ganhavam em numero, dias 18 e 19 de abril, quando a Holanda ainda estava sob o mas nao em agilidade. Alem de conhecer melhor o territocontrole da Uniao Iberica, assim como Portugal. Os holanrio, os defensores luso-brasileiros utilizavam taticas indígedeses ora apoiavam os portugueses, devido ao domínio nas e emboscavam os inimigos nas matas. espanhol, ora ocupavam os territorios das colonias portuEles tambem faziam com que boa parte dos soldados holanguesas no Brasil e na Africa. deses se afogassem nos alagadiços. As armaduras, roupas Em 1648, Holanda e Espanha entraram em um acordo. Nesde proteçao muito comuns nas guerras europeias, atrapase tratado a Espanha pedia de volta as terras tomadas dulhavam ainda mais o exercito da Holanda. rante a Insurreiçao Pernambucana. Por causa disso, começaram os conflitos entre portugueses e holandeses. A pri- Segunda parte da Batalha dos Guararapes meira fase da Batalha dos Guararapes aconteceu no Morro O segundo conflito da Batalha dos Guararapes aconteceu no dos Guararapes, uma capitania de Pernambuco. dia 19 de fevereiro de 1649. Recuperados da primeira derOs holandeses se preparavam para reconquistar o Porto de rota, o exercito holandes mandou novas tropas ao territorio Nazare. Esse ponto era estrategico porque permitia o abas- brasileiro, mas o resultado foi o mesmo. Os luso-brasileiros tecimento de armas e muniçoes que chegava de Arraial Ve- saíram vitoriosos da Batalha dos Guararapes, agora, de uma vez por todas, os holandeses deixavam o Brasil. lho do Bom Jesus para os portugueses.

Página 24


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Gente com História O homem vai, mas a abra fica

Criada por uma família liberal, a jovem mudou-se para Lisboa, em 1886, onde publicou a obra Contos infantis, junto de sua irma, a tambem escritora Adelina Lopes Vieira. Ainda segundo o site, em Portugal, a escritora conheceu o poeta Filinto de Almeida, com quem acabou se cansando pouco tempo depois. Aos 24 anos, ela publicou a primeira obra para adultos, intitulada Traços e iluminuras. Ao retornar para o Brasil, em 1888, ela escreveu al-

Júlia Lopes de Almeida A INJUSTA E ESQUECIDA SAGA DA ESCRITORA BRASILEIRA

guns romances, contos, cronicas, ensaios e peças teatrais. Considerada uma mulher revolucionaria e alem do seu tempo, Julia defendia, ainda, a aboliçao da escravatura, a proclamaçao da Republica e a emancipaçao dos corpos femininos.

A autora abolicionista foi impedida de assumir o seu lugar na Academia Brasileira de Letras, contu- Segundo o site da Editora Darkside, a abolicionista do, a história teve novos desdobramentos recen- realizou inumeras palestras ao longo de sua vida, a fim de conscientizar as mulheres sobre seus papeis de temente. emancipaçao perante a sociedade misogina da epoca. Fundada em 1897, sob os moldes franceses, a Academia Brasileira de Letras (ABL) contou com a A brasileira tornou-se uma das escritoras mais publiilustre colaboraçao da escritora e abolicionista Julia cadas durante o período da Primeira Republica (1889 Lopes de Almeida. Contudo, embora a memora- -1930). Tal sucesso lhe rendeu visibilidade e a publivel autora tenha participado de reunioes e contribuí- caçao de diversos artigos e materias que abordavam do ativamente para a criaçao da instituiçao, ela foi direitos iguais entre os generos. esquecida. Injustiça e a reparação Renegando o protagonismo e a emancipaçao feminina, a ABL concedeu um lugar no grupo ao marido da escritora, chamado Filinto de Almeida. Portanto, a cadeira de numero 3 passou a ser ocupada pelo seu companheiro, uma vez que a academia nao aceitava a participaçao de mulheres.

Em 1889, logo apos a Proclamaçao da Republica, um grupo de intelectuais começou a planejar a Academia Brasileira de Letras, que foi fundada somente em 1897. De acordo com o Brasil Escola, Julia Lopes de Almeida foi a unica mulher que contribuiu para a criaçao da ABL.

Ideais revolucionários

No entanto, seguindo as regras da Academie Française de Lettres, os colegas da escritora votaram contra a sua participaçao no seleto grupo. Portanto, a cadeira de numero 3 foi entregue ao seu marido, Filinto de Almeida.

Nascida em 24 de setembro de 1862, no Rio de Janeiro, Julia Lopes de Almeida mudou-se para Campinas ainda criança. Provinda de uma família de portugueses ricos e cultos, aos 19 anos ja escrevia para A Gazeta de Campinas, segundo relatou o site Brasil Escola. Julia, por sua vez, veio a obito no dia 30 de maio de Página 25


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

1934, no Rio de Janeiro, vítima de malaria.

Assim como a carioca, diversas outras personagens A revolucionaria nunca viu a justiça ser feita, mas dei- femininas da historia nacional e internacional tiveram suas historias silenciadas e esquecidas ao longo da xou um grande legado para a Historia. Historia. De acordo com uma materia do Jornal da USP, a regra de nao permitir mulheres na instituiçao foi mantida Vítimas do machismo e patriarcado, muitas tiveram ate 1977, ate que Rachel de Queiroz foi aceita como a que lutar e dar suas vidas em prol de uma causa. Contudo, cada vez mais, a luta das mulheres tem ganhado primeira escritora feminina a integrar a academia. força e historias como a de Julia sao resgatadas e conConforme repercutido pela Editora Darkside, em templadas pelas geraçoes futuras. 2017 a ABL reconheceu a injustiça cometida contra Vitória Gearini/SP ela. Na epoca, a autora foi homenageada e incluída Repórter em Aventuras na História como cofundadora.

Página 26


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Apos a divisao das doze tribos de Israel, enormes crises sucederam no ano de 721 a. C. Os assírios submeteram o Reino de Israel ao seu domínio, fato que levou ao desaparecimento das dez tribos. No ano de 596 a. C., o rei babilonico Nabucodonosor conquistou o Reino de Juda, submetendo-o ao chamado ‘Cativeiro da Babilonia’ (judeus prisioneiros na cidade-estado da Babilonia).

Os Judeus Desde a Antiguidade ate a criaçao do Estado de Israel, no seculo XX, os judeus sempre percorreram e ocuparam diferentes regioes pelo mundo. Por onde passaram e se fixaram, acabaram exercendo grandes atividades intelectuais, comerciais ou foram perseguidos pelas populaçoes locais. Na Antiguidade Oriental (Oriente Medio), os hebreus, tambem chamados de judeus ou israelitas, habitavam Canaã (territorio do atual Estado de Israel). Essa civilizaçao deixou como herança para o mundo ocidental sua conduta moral e etica, que influenciou o surgimento de duas das principais religioes da atualidade: o judaísmo e o cristianismo. Os hebreus sao de origem semita (povos que surgiram na Asia, descendentes de Noe). Segundo a Bíblia, os hebreus, em razao da seca (fome), migraram para o Egito (ficando 400 anos), onde foram escravizados pelos egípcios. A civilizaçao hebraica, liderada por Moises, retornou a Canaa (Exodo). No ano de 935 a.C., com a morte do rei Salomao, filho de Davi, ocorreu a divisao entre as doze tribos de Israel, constituindo a formaçao de dois Estados: o Reino de Israel (dez tribos do norte) e o Reino de Judá (duas tribos do sul). Os habitantes do Reino de Israel ficaram conhecidos como israelitas; e os habitantes do Reino de Juda foram chamados de judeus. Página 27

Os judeus foram libertados da Babilonia no ano de 538 a. C., apos a conquista persa. Posteriormente, a civilizaçao judaica retornou a Canaa, regiao que passou a ser dominada, no ano de 332 a.C., por Alexandre, rei da Macedonia. Em 63 a.C., os macedonicos e Canaa foram conquistados pelos romanos; e os judeus organizaram revoltas duramente repreendidas por Roma. Sendo expulsos da Palestina, saíram em diaspora (dispersao) pelo mundo. Ocupando diferentes regioes pelo mundo, os judeus conviveram em pequenas comunidades. Apesar de nao possuírem um Estado (territorio), eram considerados uma naçao (povo) e procuravam conservar sua identidade cultural por meio da língua, religiao, costumes e habitos. Na Europa medieval, ocuparam principalmente a regiao da Península Iberica (Portugal e Espanha). Antes do ano 1000, tinham liberdade religiosa e influenciaram o desenvolvimento cultural e científico. No ano de 1095, começaram a ser perseguidos pelos cristaos, porque a Igreja Catolica julgou


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

os judeus como responsaveis pela morte de Jesus Cristo. A partir desse fato, a civilizaçao judaica sofreu constantes ataques nas cidades europeias; enclausurando-se nos guetos, milhares de judeus foram vítimas da Santa Inquisiçao (Tribunal da Igreja Catolica que julgava os hereges). A partir da Idade Moderna, os judeus foram expulsos da Península Iberica. A grande maioria das comunidades judaicas teve que se instalar em regioes protestantes (norte da Europa). Apos o advento dos Direitos Universais do Homem, durante a Revoluçao Francesa, os judeus passaram a gozar de certa liberdade religiosa e desenvolveram varias atividades no continente europeu, em diversos setores, tais como: bancos e industrias; alem de atividades intelectuais, como: ciencias, artes e filosofia (principalmente). Com grande ascensao economica e intelectual, no seculo XIX, varios países começaram a acusar a comunidade judaica de querer domina-los. Nesse contexto, começaram a surgir ideias de aversao e preconceito contra os judeus (o antissemitismo). Ainda no seculo XIX, surgiu entre a civilizaçao juPágina 28

daica o desejo de retornar ao seu territorio de origem, a Palestina, e criar um Estado Judaico nesse territorio. Era o ‘Sionismo’, milhares de judeus retornaram, fugindo do antissemitismo europeu. No seculo XX, a comunidade judaica foi vítima de uma das maiores atrocidades da historia, o chamado holocausto. Instituído pelo líder nazista Adolf Hitler, durante a II Guerra Mundial (19391945), seis milhoes de judeus foram submetidos aos campos de concentraçao, sendo torturados e mortos. Apos o termino da guerra, o movimento sionista reivindicou a Organizaçao das Naçoes Unidas (ONU) a criaçao do Estado de Israel na Palestina. No ano de 1948, foi criado o Estado Judeu – contrariando os palestinos e arabes que viviam na regiao, milhares de judeus retornaram. A partir da criaçao do Estado de Israel, varios conflitos etnicos e guerras passaram a ser constantes na regiao conhecida como faixa de Gaza. In www.mundoeducacao.com.br


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Gripe “espanhola” - Covid-19 avioes ingles e de seis torpedeiros americanos, que Os editores do jornal Gazeta de Notícias (1875-1942), abateram um dos submarinos e obrigaram o outro a do Rio de Janeiro, nao estavam exagerando quando bater em retirada. disseram, na ediçao do dia 16 de setembro de 1918, O jornalista e escritor Wagner G. Barreira explica que que o Demerara fez uma "pessima viagem". aquela nao foi a primeira vez que o navio ingles traQuando zarpou de Liverpool, no dia 15 de agosto de vou uma autentica batalha naval com submarinos ale1918, rumo a Buenos Aires, o comandante do navio maes.

DOCUMENTO.COM

O navio da morte, trouxe a gripe espanhola.

ingles, J.G.K. Cheret, nao fazia ideia dos percalços que enfrentaria pelo caminho. Ja no dia seguinte, 16 de agosto, levou o primeiro susto: por volta das oito da manha, o Demerara foi atacado por dois submarinos alemaes, em plena Primeira Guerra Mundial.

"O Demerara foi o primeiro navio da marinha mercante britanica a afundar um u-boat. O capitao foi condecorado, ganhou premio. Mas, o vapor virou alvo da marinha alema", O avo de Wagner, o galego Bernardo Gutierrez Barreira, chegou ao Brasil numa das muitas Um deles chegou a disparar um torpedo que, segun- viagens do Demerara e, quase um seculo depois, inspido jornais da epoca, passou "a um metro da proa". rou o neto a criar o protagonista de seu primeiro roOs passageiros entraram em panico e, temendo o mance historico, Demerara (Editora Instante, 2020). pior, saíram a procura de "cintas salva-vidas" - o Passado o susto inicial, o Demerara seguiu viagem. De correspondente da epoca aos nossos coletes salva- propriedade da Royal Mail, o serviço postal do Reino vidas.... Unido, o transatlantico fazia a rota Liverpool-Buenos Com 562 passageiros e 170 tripulantes a bordo, o Aires e transportava, alem de passageiros, mercadoriDemerara provavelmente teria afundado ali mesmo as (açucar, por exemplo) e correspondencias. Na vianao fosse a intervençao salvadora de um porta- gem de volta a Europa, levaria carne e cafe, entre ou-

Página 29


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

tras provisoes.

Janeiro, do litoral para o interior, atraves das ferrovi“O movimento dos vapores, pelo menos de acordo as". Do Recife, o Demerara seguiu para Salvador, onde com os registros da Autoridade Portuaria de Vigo, na chegou em 11 de setembro. Espanha, diminuiu muito durante a guerra. Em pri- No trajeto, o capitao resolveu limpar a embarcaçao meiro lugar por que era perigoso cruzar o Atlantico, com creolina. Pouco adiantou. Na capital da Bahia, o por causa dos submarinos alemaes. Depois, porque os descaso se repetiu: passageiros e tripulantes desceprincipais países da Europa estavam em guerra e os ram a terra firme sem serem inspecionados pelas aujovens - a massa de imigrantes - haviam sido convoca- toridades sanitarias. Duas semanas depois, o jornal A dos para as trincheiras" Tarde, fundado em 1912, contabilizava cerca de Depois de passar por Lisboa, o navio cruzou o Atlanti- "setecentos enfermos" espalhados por todos os lugaco rumo ao Brasil. A travessia durou 25 dias. Em 9 de res: de quarteis a hospitais, de escolas a igrejas. setembro, o Demerara atracou no Recife. Era a primeira das quatro escalas no litoral brasileiro: Recife, Salvador, Rio e Santos. "O Demerara era o navio que trazia e levava cartas do front. Em cada porto onde atracava, multidoes aguardavam ansiosas por notícias dos soldados que lutavam na Primeira Guerra Mundial "Com o porto do Recife em obras, os passageiros e suas bagagens, entre outras cargas, tiveram que desembarcar dentro de gigantescos cestos de pano içados por guindastes. "Nao se tem notícia de quando o vírus (da gripe espanhola) subiu a bordo: se na escala anterior, em Lisboa, ou se o navio ja zarpara infectado da Inglaterra "Seja como for, uma vez em solo brasileiro, espalhou-se facil e rapido, desde o Recife ao Rio de Página 30

“Tanto no Recife quanto em Salvador, os governadores negaram a existencia da gripe espanhola. Se o navio estivesse infectado, eles teriam que fechar os portos. “Para nao comprometer a economia local, preferiram deixar o Demerara partir, como se nada estivesse acontecendo", O proximo destino era o Rio de Janeiro. Na Baía de Guanabara, em frente a Ilha das Cobras, uma bandeira amarela - sinal de doença a bordo - ja tremulava no alto de um dos mastros. O inspetor de saude do porto, Jose Maria de Figueiredo Ramos, examinou alguns passageiros - dois deles em estado grave - e constatou que o navio estava infectado.


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 Mesmo assim, o Demerara foi autorizado a atracar. sepultar tantos cadaveres. Era 15 de setembro de 1918. So na capital da Republi- "De um dia para o outro, todo mundo começou a morca, desembarcaram 367 passageiros. rer. Os primeiros ainda foram chorados, velados e floUns se queixavam de leve resfriado. Outros reclama- ridos. vam de dores no corpo. Outros, ainda, com sintomas Mas, quando a cidade sentiu que era mesmo a peste, mais graves, como sangramento pelo nariz, boca e ou- ninguem chorou mais, nem velou, nem floriu. O velovidos, entre outros orifícios, tiveram que ser hospitali- rio seria um luxo insuportavel para os outros defunzados. Terminado o desembarque, o Demerara pros- tos. seguiu viagem. Embora grave, a doença nao era contaEra em 1918. giosa, garantiu o inspetor. Errado: era, na verdade, altamente contagiosa. Aquela altura, a gripe espanho- A morte estava no ar e repito: difusa, volatizada, atla ja ganhara os mais inusitados apelidos: "catarro mosferica; todos a respiravam... russo", "mal das trincheiras", "febre de tres dias"... No Rio, deram-lhe mais um: "limpa velhos", por acreditarem que o novo vírus atacava apenas a populaçao idosa.

"E la se foi o Demerara, rumo a Montevideu, onde aportou em 23 de setembro.

A bordo, a "bailarina" continuava a contabilizar vítimas. Em aguas portenhas, o saldo ja era de seis mor"Muitos a descreviam como uma gripe corriqueira", tos e 22 infectados. relata o infectologista Stefan Cunha Ujvari, autor do Os jornais brasileiros tentaram alertar as autoridades livro Historia das Epidemias (Editora Contexto, 2020). do Uruguai. "Jamais imaginavam a mortandade de todas as faixas Mas o diretor de Assistencia Publica daquele país, Hoetarias". racio Gonzalez del Solar, nao lhe deu ouvidos. "Que Muitas famílias colocavam seus mortos na calçada de exagero!", desdenhou. casa para serem recolhidos pelas funerarias. Faltavam Pág. Seg. >>> leitos para atender a tantos doentes e coveiros para

Para muitos, teria sido este navio, o Demerara, a transportar a gripe espanhola para o Brasil e Argentina Página 31


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021

Já considerado o holocausto dos nossos dias, o estupro continua a matar e a ficar impune. Urge uma mobilização geral contra este flagelo da sociedade. Leia o livro >>> Quando chegou a Buenos Aires, o Demerara finalmen- "Os numeros de doentes a bordo variam muito de te passou por uma inspeçao rigorosa. acordo com as fontes. Mas, se voce imaginar que a ter"As autoridades argentinas fizeram o que as brasilei- ceira classe costumava lotar e o navio e um ambiente ras nao tiveram coragem de fazer: segurar o navio e confinado, gerador de aglomeraçao, da para intuir que o vírus correu solto", observa Barreira. desinfeta-lo", afirma Heloísa Starling. Pelo menos cinco pessoas morreram durante o percurso: quatro passageiros, os portugueses Antonio Teixeira, Germana Moreira Valente, Gracinda Ferreira e Maria dos Anjos, e um tripulante, o espanhol Juan Cajal. Desses, so um recebeu o diagnostico de influenza. Página 32

"A primeira onda da gripe nao foi tao letal quanto a segunda. Derrubava, mas nao matava. A segunda foi a que se espalhou pelo mundo, e foi ela que embarcou no Demerara" Valério Marques


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 sa no Brasil, p. 27). E prosseguem: Afirmaçao completamente destituída de fundamento, contraria da realidade, ofensiva e irresponsavel, feita por ignorancia ou talvez ma fe, ela nao revela ao leitor que o “proprietario dos engenhos” era o Capitao Donatario (ou um ilustre rico-homem com fortuna e provas dadas) que, escolhido entre os mais ricos nobres portugueses, se desfazia de sua avultada fortuna para, em Portugal, embarcar para o Brasil, em naus fretadas e ou adquiridas, materiais e colonos, que desbravassem o sertao, plantassem as mudas de cana, edificas-

Portugal

Brasil

Colonização 2 Damos continuidade a divulgaçao de textos que se debruçam sobre a colonizaçao do Brasil, o que — repetimos — nao implica estarmos ou nao de acordo com seus teores. Como e sabido, ha muitos que questionam o merito dos portugueses na colonizaçao, dando a entender, que prefeririam ter sido colonizados por outras potencias.

MITO DA RUINDADE DA COLONIZAÇÃO DO BRASIL

sem e implantassem casas e engenhos, e criassem todas as condiçoes necessarias e suficientes ao fabrico e transporte da cana e do açucar, ou seja, primeiro havia que criar a riqueza no local, mediante vultuosos investimentos, grandes riscos e sobre-humanos sacrifícios. Por aqui vemos que apenas homens ricos, tinham condiçoes de trazer para o Brasil pessoas e bens, mudas e animais, desmatar a selva e plantar as mudas de cana, implantar os engenhos e produzir o açucar, investindo muito para, passados dois a tres anos, poder auferir os rendimentos do capital e do trabalho”. (idem).

Escreveu Koebel: “A certos aspectos, talvez, nenhuma naçao haja colonizado com tanto enthusiasmo como Por: Arthur Virmond Lacerda Portugal. Uma vez estabelecidos no país, os seus pioSite: História do Brasil neiros nunca encaravam a nova conquista como um lugar para residencia transitoria” (Manoel Bomfim, O Tambem Franklin de Oliveira propalou o mito que Brazil na America, 1929, p. 406). Bueno transmitiu. Redigiu bombastico prefacio em “A America Latina”, de Manoel Bomfim (editora Topbo- Bomfim, acrescenta, contudo, ressalva: De facto, era oks, 1993), eivado de frases de efeito e de declama- assim, nos primeiros tempos do Brazil, ate que aqui se çoes em que amesquinhou a colonizaçao portuguesa constituiu, pela lavoura, uma riqueza propria, capaz pela insistencia nos chavoes lusofobos. A proposito de ser explorada pelos mercantis. Depois, no tempo dos engenhos de cana de açucar, sentenciou que o seu de Fr. Vicente, ja os reinois eram mais transitorios do proprietario era um simples feitor; o seu objetivo era que definitivos. Pouco importa: a necessidade de cultienriquecer no Brasil e, ricaço, retornar a Portugal var a terra para ter riqueza fez o essencial, e deu a colonizaçao primeira do Brazil o carater que mais lhe (obra citada, p. 21). convinha; e e isto o essencial na verificaçao que nos Que falsidade !!! exclamam Jose Verdasca e Antonio interessa. (idem, p. 406). Prossegue, linhas adiante: Netto Guerreiro, a proposito (A Colonizaçao Portugue[...] os colonos portugueses iniciaram uma sociedade Página 33


Ano IV — Número 42 - Mensal: abril de 2021 estavel, agrícola, vinculada ao solo, orientada imedia- homens brancos com as mulheres nativas, devemos tamente a fazer do país uma patria [...] (idem, p. 407). concluir pela superioridade etica desse processo [...] “O portugues foi por toda a parte, mas sobretudo no (idem, p. 27 e 28). Brasil, esplendidamente criador nos seus esforços de E se o Brasil houvesse sido colonizado pelos holandecolonizaçao”. (Gilberto Freyre, O mundo que o portu- ses? Responde-o Gilberto Freyre (Alhos e bugalhos, gues criou, E realizaçoes, 2010, p. 25.). Nova Fronteira, 1978, p. 139-140): Carlos Lisboa Mendonça: Acrescentemos, ainda, ao contrario do que muitas vezes ouvimos dizer, que o Brasil foi colonizado por material humano de boa qualidade; o melhor que naquela epoca existia em Portugal. Os líderes eram homens que ja haviam demonstrado seu valor na India e pertenciam a camada mais representativa da vida política e social portuguesa [...]. Os colonos eram pessoas cuidadosamente escolhidas, com quem os Capitaes pudessem contar nos momentos de dificuldade [...]. (500 anos do descobrimento, editora Destaque, 2000, p. 242). Sergio Buarque de Holanda: “O trato das terras e coisas estranhas [ou seja, o convívio com povos e culturas orientais], se nao uma natural aquiescencia e, por isso, uma quase indiferença ao que discrepa do usual, parecem ter provocado certa apatia da imaginaçao, de sorte que para eles [portugueses dos quinhentos] ate o incomum parece fazer-se prontamente familiar, e os monstros exoticos logo entram na rotina diaria. Nao estaria aqui o segredo da facilidade extrema com que se adaptam a climas, países e raças diferentes?” (Visao do paraíso, Folha de Sao Paulo, 2000, p. 121.). A adaptabilidade do portugues constituiu lhe fator de superioridade, pelo entrosamento que lograva com climas, povos, culturas diversos do europeu e com que aceitava a diversidade cultural. Afeito a observar o diverso, aceitava a diversidade: no horizonte humano do portugues cabiam todos os humanos. Em relaçao a mestiçagem no Brasil, a ausencia de “antagonismos absolutos” na “separaçao dos homens em senhores e escravos” e da “mística da branquidade ou de fidalguia” (Gilberto Freyre, O mundo que o portugues criou, E realizaçoes, 2010, p. 26), diz Gilberto Freyre: se reconhecermos na mestiçagem a capacidade, que me parece justo atribuir-lhe, de ter, no Brasil e noutras areas de colonizaçao portuguesa, adoçado as durezas do sistema de trabalho escravo e as suas consequencias sociais e vencido ou, pelo menos, atenuado convençoes de raça e de classe nas relaçoes dos Página 34

Mas – ha eruditos que ainda hoje perguntam – nao teria sido melhor para os que hoje somos brasileiros que o Brasil tivesse tido nao um Pedro portugues mas um Adrian holandes [...] como seu descobridor oficial; e que, em vez de passar [...] a pertencer a um Portugal [...] tivesse passado a ser [...] colonia de uma Holanda [...] ? Provavelmente isto: em vez de um Brasil que, com todas essas suas dificuldades, os seus problemas os seus fracassos, e um Brasil onde ser negro nao e oprobrio, onde ser pobre nao e desonroso [...] seria uma Java americana, mais rica, mais progressista, mais produtora de cafe ou de cacau que o Brasil de hoje, porem dominada por alguns daqueles preconceitos que tantos dos norte-europeus [...] levaram para o Oriente: um Oriente onde ha um ranger de dentes, uns extremos de odios entre brancos e gentes de cor, entre ricos e pobres, entre europeus e nao-europeus [...]. O Brasil teria, pondera, mantido vantagem economica na produçao do açucar, do ouro, do cacau, dos diamantes, da borracha; e provavel que fosse “quase tao potencia quanto os Estados Unidos ou a Uniao Sovietica” e e quase certo que aqui brancos e gentes de cor nao seriam – tivessem os holandeses – se apoderado de parte do Brasil -,num so povo brasileiro, porem dois: uns brancos, outros de cor; uma casta tida por abençoada por Deus, como ensinou Calvino, por ser rica, e os pobres, por serem pobres, havidos, de acordo com o mesmo ensino, por sub-homens, por subgente, por enjeitados do proprio Deus; a pobreza tida por extrema vergonha [...] e nao como condiçao que nada tem de indigna. (Idem). Ruy Rebello Pinho: “[...] o direito aplicado pelos holandeses no Brasil nao difere substancialmente do direito portugues da epoca.

Todavia, a preocupaçao de manter os territorios conquistados, de dominar os portugueses e seus aliados,


Corrente d’escrita de obter os lucros exigidos pela Companhia das Indias Ocidentais, tudo isto da as leis flamengas e a sua aplicaçao maior crueldade e, nao raro, um cinismo chocante. [...] Verdade e que portugueses, índios e negros nao desejavam um Brasil holandes. E mesmo Nassau acabaria sendo obrigado , sem duvida, a admitir esta realidade, por bem ou por mal”. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 193). Na organizaçao judiciaria holandesa, no Brasil, havia os escoltetos, chefes administrativos dos municípios que exerciam, tambem, funçoes como exatores fiscais, promotores de justiça e chefes de polícia, remunerados com porcentagens ou comissoes sobre as multas que infligiam, com cujas falcatruas revoltava-se Manuel Calado, testemunha contemporanea da presença holandesa e a que dedica paginas a fio do seu livro “Valeroso Lucideno”. Diz ele: [...] saiam seus Escoltetos cada seis meses pelos campos, e matos, com outros ministros da Justiça; e chegavam as casas dos moradores, e nenhum havia que nao ficasse condenado em dinheiro, ainda que tivesse feito milagre no cumprimento de suas prematicas; e os Escoltetos todas as condenaçoes que faziam eram para si, e dali davam metade aos do Conselho [colegiado governante], segundo suas diabolicas mancomunaçoes [...]. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 144-145). O proprio conde de Nassau reconheceu a existencia do vício daninho das atribuiçoes dos escoltetos e ponderou que o remedio para isso sera abolirem-se as penas dos delitos leves e varias leis; apodou-os de sanguessugas, dotados de insaciavel cobiça. E acrescenta, acerca da moralidade dos ocupantes deste cargo: [...] conviria entregar estas funçoes somente aos mais conceituados, afastando-se delas os ladroes que, como Gueiroes, vao arrebatar o alheio com seis maos. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 145). Quanto a organizaçao judiciaria holandesa no Brasil, o holandes Gaspar Barleu, autor de livro encomiastico da obra dos seus patrícios no Brasil, elogia-a, com restriçoes; ja o conde de Nassau aponta seus defeitos. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 152). Por sua vez, Manuel Calado nao a perdoa. Admite qualidades Página 35

Corrente d’escrita no Príncipe [Maurício de Nassau], mas o inclui nas negociatas feitas entao. Aos do Supremo Conselho, aos do Conselho Político, ao Fiscal, aos escabinos [escabinos eram juízes; os conselhos funcionavam como tribunais de apelaçao] nega qualquer interesse em fazer justiça. A organizaçao judiciaria flamenga objetivava a dissipar e destruir a Província de Pernambuco, cujos moradores, constrangidos das muitas crueldades e traiçoes [praticadas contra eles, pelos holandeses] lhes entregassem todas suas fazendas, e havendo de ficar na terra fossem mais que cativos, e escravos trabalhando de dia, e de noite, nao para si, senao para seus inimigos. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 152). Sobre a ganancia holandesa, ajuizou Nassau que os seus compatriotas sao homens tais que preferem sofrer danos na vida a sofre-lo na fazenda: esta e para eles mais cara que a menina dos olhos. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 153). Na obtençao de provas para fins judiciarios, os holandeses valiam-se da fraude: aos condenados (catolicos) enviavam predicantes calvinistas, que se lhes apresentava como padres catolicos, a quem declaravam fatos, na ilusao de o fazerem por confissao e protegidos pelo sigilo respectivo. De posse das informaçoes, os embusteiros comunicavam-nas as autoridades que, com base nelas, sentenciavam os confitentes a morte. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 170). O governo holandes no Brasil proibiu aos moradores possuírem, domesticamente, qualquer tipo de arma, sob pena capital. Para o descobrimento das que porventura existissem, prometeu alforria aos escravos que denunciassem os seus senhores. Diz Manuel Calado que os holandeses, a proposito, usavam de uma maldade nunca vista, e era que davam de beber aos negros cativos, e lhes diziam que se queriam ser forros mexericassem a seus senhores que tinham em tal, e tal parte as armas escondidas, as quais os mesmos Flamengos haviam escondido nos mesmos lugares, em odios dos Portugueses, e com intençao de por esta via lhes roubarem as fazendas, e alguns foram destruídos e condenados com este estratagema, muitos moradores se foram esconder nos matos com temor (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 217). Ou seja, os holandeses embriagavam os escravos e prometiam


Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

-lhes a liberdade caso denunciassem os seus senhores, por possuírem armas que os proprios promitentes ocultavam, nas casas dos senhores, perfídia com que perderam a muitos; outros, refugiaram-se no sertao.

nhois, compara-os com os dos holandeses que "na Asia, na Africa, na Oceania, na America, usaram dos mesmos processos, cometeram os mesmos abusos, perpetraram os mesmos crimes, se e que nao excedeOutro metodo empregado pelos holandeses consistia ram quase sempre o sistema de rigor com que os desna tortura, que em Portugal e no Brasil portugues, co- cobridores excluíam a concorrencia de outros povos". mo na Europa em geral tambem se usava. Neste capí- (p. 281). tulo, os holandeses nao foram comparativamente "E a todos os abusos que eram censurados nos outros brandos, mas tao feros ou mais do que os outros po- [povos] entregaram-se depressa os holandeses quanvos. do se fizeram colonizadores" (p. 281). O governo holandes no Brasil publicou edital pelo qual se proibia aos moradores possuírem, em casa, armas de qualquer tipo, sob pena de morte, e premiava com liberdade os escravos que, a tal proposito, delatassem os seus senhores: a partir disto amiudaramse os depoimentos falsos e muitos flamengos se conluiaram com negros para extorquir dinheiro dos senhores portugueses, no dizer de Manoel Calado. (Historia do Direito Penal Brasileiro, p. 174).

Ataque holandes a Olinda: "O saque na vila desventurada tornou-se horrível. O desbragamento da soldadesca assumiu proporçoes de uma verdadeira insania de vandalos, destruidora e cruel" (p. 313).

Em Pernambuco, "os coroneis [holandeses] Schkoppe e Artichofsky, devastaram por toda parte vidas e fazendas, sem piedade pelas míseras populaçoes indefesas. Sao incríveis os excessos de vandalismo e de instinto sanguinario" que infligiram as populaçoes. (p. Tambem praticaram genocídios: no Rio Grande, rece- 346). beram ordem de exterminar todos os moradores mais "Tem-se incontestavelmente exagerado muito as provelhos de dez anos de idade. (Historia do Direito Pe- porçoes da obra de Nassau no Brasil". (p. 370). nal Brasileiro, p. 78). "Viera, porem, o Conde de Nassau para a America reRocha Pombo, vol. I (ediçao Jackson): "Enquanto por- presentando uma empresa mercantil, que nao tinha tugueses e espanhois, donos das terras, cuidavam de outros intuitos senao os de apurar os maiores lucros, coloniza-las, os holandeses nada mais queriam do que e que a isso sacrificava todo e qualquer outro interesauferir os proveitos imediatos do trafico" (p. 281). se legítimo, como era o de colonizar país novo e instiEm relaçao aos metodos dos portugueses e dos espa- tuir nova sociedade. Infelizmente para o príncipe, foi Página 36


Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

este o seu erro fundamental". (p. 373).

crueldade de barbaro, de um obstinado desdem por "Eis aí o conjunto de circunstancias que tornam nula a todo o direito que se nao impunha pela força". (p. funçao historica do Conde de Nassau na America. Ele 395). era capaz de fazer muito, e pouco fez". (p. 374). "A sua gula monstruosa de ouro, a ferocidade com que "O que ele conseguiu fazer no Recife, de 1637 a 1644, por dinheiro sacrificava tudo, nao tinham limites". (p. foi trabalho executado no meio de afliçoes, feito aos 395); eram "essencialmente incapazes de colonipoucos, sem ordem, sem uniformidade, sem sistema; zar" (p. 397). transigindo agora, impondo amanha; alterando hoje o "A sua funçao historica, fora da Holanda, e, pois, insigque ontem decretara; volvendo hoje para tras do nificante, e na America foi, e nem podia ter deixado de avanço que dera na vespera [...]". (p. 375). ser, completamente nula". (p. 400). "Entre os flamengos, principalmente da capital, a cor- Edson Nery da Fonseca observa: Pertenço a uma gerarupçao era medonha." (p. 375). çao que aprendeu nas escolas duas lendas apresenta"[...] eram os holandeses menos liberais que as suas das como historicas: a do descobrimento do Brasil por leis; e por isso, quase sempre os seus atos nao corres- um acaso e a do mal que teria representado para nos a pondiam aos decretos pomposos que que promulga- colonizaçao portuguesa, simplisticamente comparada vam para lisonjear ou para iludir os vencidos." (p. a colonizaçoes de outras origens. Sao duas lendas inspiradas por um so sentimento: o de lusofobia. E base380). adas numa hipotese que esta longe de ser provada: a Em materia de religiao, as determinaçoes holandesas do atraso científico de Portugal. (Edson Nery da Fon"indicavam um espírito de intolerancia" (p. 381). seca. Uma cultura sempre ameaçada, in Uma cultura Ao ingressarem em Pernambuco, proclamaram a li- ameaçada, Gilberto Freyre, E realizaçoes, 2010, p. 91). berdade dos escravos; a seguir, restringiram-na aos Jose Verdasca e Antonio Netto Guerreiro: O Brasil, dudos senhores que se mostrassem refratarios ao seu rante o período colonial (1500 -1808), foi, sempre – domínio; por fim, derrogou-se tal liberdade e autorinos aspectos territorial, economico, cultural e social – zou-se a pega de negros. (p. 381). mais extenso, mais rico, mais instruído e mais desenQuanto aos índios, eram livres so de nome, mas de volvido, do que as 13 colonias inglesas, que fazem fato, eram escravos (p. 382). parte e deram origem aos Estados Unidos da America, Os holandeses "nunca puderam dar provas da sua ap- 04/07/1776. (A Colonizaçao Portuguesa no Brasil, de tidao para criar povos, nunca foram propriamente Jose Verdasca e Antonio Netto Guerreiro, 2015, p. 81). colonizadores; mas viveram sempre [...] como simples Carlos Lisboa Mendonça: [...] nao foram os holandeses agentes de empresas mercantis, a canalizar para a Ho- que levaram o progresso a Pernambuco: mesmo antes landa os proveitos diretos e imediatos das possessoes da sua invasao, aquela ja era provavelmente a mais que conseguem fazer. Os espanhois, como os portu- desenvolvida regiao do Brasil. (500 anos do descobrigueses, com todos os seus defeitos, souberam prepa- mento, editora Destaque, 2000, p. 197). rar as suas vastas colonias para a vida nacional". (p. Excetuando o período de Nassau, a dominaçao holan392). desa se constituiu, em seus vinte e cinco anos, em um Julga os holandeses: deixaram o trabalho em favor do dos mais negros períodos da historia do nordeste branegocio, do jogo, da aventura (p. 394); nao eram con- sileiro da era colonial. A conquista de cada vila ou poquistadores, mas corsarios (p. 395); fora da Holanda, voado foi marcada por atos de desnecessaria barbario povo holandes nao teve "outro papel senao o de dade, agravada pela intolerancia religiosa calvinista, opressor e parasita" (p. 395). com frequentes massacres. A populaçao dominada era "O flamengo que entrou em Pernambuco tinha as pai- submetida a mais dura exploraçao economica, alem xoes dominantes - do amor imoderado da riqueza, do de opressao política e religiosa. (Idem, p. 198). preconceito religioso, da aversao a Espanha, de uma [...] das conquistas e da colonizaçao holandesa em toPágina 37


Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

do o mundo, nao existe um so exemplo de prosperida- nos [...]; esquadras meramente transportadoras de de. (Idem, p. 200). colonos, foram as da Inglaterra. (Idem, p. 231). Sobre os franceses, o mesmo autor assere: “Seus po- [...] foram os americanos, depois da Independencia vos coloniais se conservaram atrasados, ignorantes e [dos E.U.A.], que promoveram o desenvolvimento do em grande estado de pobreza”. (Idem, p. 197). seu país e nao o sistema colonial ingles. Quanto ao A proposito dos ingleses: [...] alem dos Estados Uni- Brasil, ao contrario do que nos ensinam, a colonizaçao dos, inumeras outras terras espalhadas pelo mundo portuguesa nao possui aquela imagem negativa que foram colonizadas pela Inglaterra, sem que os seus pretendem emprestar-lhe, pois nosso país experimenpovos tivessem experimentado o menor progresso. tou progresso e crescimento que devem ser conside[...] Eles conservaram as populaçoes de suas colonias rados cultural e economicamente superiores ao das sob grande opressao política, exploraçao economica e 13 Colonias. [norte-americanas]. (Idem, p. 195). obscurantismo cultural. (Idem, p. 196). Vide a India e Em 14 de outubro de 1540, o cardeal Bembo pensava Uganda. dos feitos portugueses que “nao eram inferiores aos Quanto aos emigrantes do navio Mayflower (segundo realizados pelos Gregos e pelos Romanos e que a difegrupo de colonos ingleses que se radicaram nos atuais rença estava na capacidade dos historiadores” narraE.U.A., em 1621), “eram homens de difícil relaciona- los, como haviam narrado os daqueles, convicçao de mento, pelas suas intransigencias religiosas”, que comungava o siciliano Cataldo Parisino Seculo, “desterrados, perseguidos, recalcados, que pouco ti- que a exprimira ja quarenta anos antes ou mais, em nham de colonos”; Plymouth, vila por eles fundada, data anterior a 21 de fevereiro de 1500. (RAMALHO, Americo da Costa. O Humanismo e os Descobrimentos vegetou “ate desaparecer”. na Ciencia e nas Letras Portuguesas no Seculo XVI. Temos como principais diferenças entre o início da Recensao. In Para a historia do humanismo em Portucolonizaçao dos ingleses e portugueses, que estes fogal, Lisboa, 1994, Fundaçao Calouste Gulbenkian, vol. ram melhor selecionados para se adaptarem a condi2). çao de colonos e o orgao responsavel por sua localizaçao agiu com maior responsabilidade e melhor tecnica, procurando dota-los dos meios indispensaveis, nao so com que eles conseguissem prover sua subsistencia, com trigo, gado e arvores frutíferas, mas tambem conseguissem alcançar seu progresso economico, com a fabricaçao do açucar. Melhores tambem foram as providencias dos portugueses, dotando as colonias de estrutura mais condigna, nada semelhante as míseras cabanas de que nos fala Andre Maurois com referencia aos ingleses. Esquadra colonizadora foi a portuguesa, que permaneceu durante tres anos com os coloPágina 38


Corrente d’escrita

Corrente d’escrita

Fotos com História

Uma foto muito pouco comum, sobretudo no tempo em que foi tirada, um casal de noivos: ela brasileira negra e ele japonês.

Página 39


Corrente d’ escrita

Dicas sobre literatura

E muito comum encontrarmos certas dificuldades para diferenciar os generos conto e crônica. Entretanto, e bom saber que eles nao tem as mesmas características.

O conto

O conto, como ja dissemos, e uma narrativa curta e com um unico conflito em seu enredo. A crônica, por outro lado, e um genero discursivo que busca retratar ou descrever o cotidiano ou a etapa.

O conto e um dos mais tradicionais generos literarios e um dos mais lidos pelo publico na atualidade. Por ser curto, esse tipo de texto tem alcançado cada vez mais espaço, circulando em redes sociais e blogs pela internet.

A crônica

Normalmente, as cronicas encontradas periodicamente nas bancas tratam de assuntos “mais leves” da atualidade. O bom cronista e aquele que consegue contar o dia a dia de um modo específico e fascinante, com um ponto de vista singular. Alguns celebres escritores brasileiros – tais como Clarice Lispector ou Lima Barreto – foram, tambem, cronistas.

Resumo: O conto e um genero literario marcado pela concisao. Tais narrativas tem, em geral, poucos personagens, espaço e tempo restritos e um conflito unico.

Autores classicos da literatura brasileira, tais como Machado de Assis ou Mario de Andrade, ganharam notoriedade por serem excepcionais contistas. O genero tem, hoje, diversas subdivisoes, tais como “contos de ficçao científica”, “infantojuvenis”, “fantasticos”, “de fada”, entre tantas outros.

As principais características do conto sao a presença O campo de gelo, afirmou, esta agora "partido em dois dos elementos tradicionais da narrativa – personae, provavelmente, descobriremos novas rachaduras gens, tempo, espaço e enredo – em suas formas conciao sul". sas, conforme explicaremos a seguir. Dois icebergs se soltaram da Geleira Cinza, no sul do Características do gênero Parque Nacional Torres del Paine no Chile. Os cientis- O conto pode ser definido como uma narrativa curta e tas temem que essas rupturas possam se tornar mais com um unico conflito. frequentes. Isso significa que, nessas historias, ha poucos perso-


Corrente d’ escrita

Dicas sobre literatura nagens, o tempo e o espaço sao reduzidos ao essencial e, alem disso, o enredo (a sequencia de açoes pelas quais os personagens passam) e marcado pela existencia de um unico acontecimento relevante.

grinha era uma escrava de Dona Inacia.

O conflito unico que percorre todo o enredo e deflagrado, por sua vez, na frase “Otima, a dona Inacia. Mas nao admitia choro de criança”. Aqui, percebemos que Dessa forma, em geral, os contos apresentam apenas a questao central do conto e a relaçao abusiva que um clímax (aquele momento de maior tensao da nar- existia entre as duas personagens centrais. rativa). Tipos de conto Veja, a seguir, um trecho do conto Negrinha, de Mon- Existem diversos tipos de conto, e a categorizaçao teiro Lobato: dessas subdivisoes do genero devem-se a diversos Negrinha era uma pobre órfã de sete anos. Preta? Não; fatores, tais como o tipo de personagem, a epoca em fusca, mulatinha escura, de cabelos ruços e olhos assus- que o enredo ocorre, ou ainda o publico. Listamos, a tados. seguir, alguns tipos de conto: Nascera na senzala, de mãe escrava, e seus primeiros anos vivera-os pelos cantos escuros da cozinha, sobre velha esteira e trapos imundos. Sempre escondida, que a patroa não gostava de crianças.

Conto de ficção científica: caracterizado por ter, em seu enredo, elementos que nao existem em nossa realidade, mas que poderiam existir devido ao avanço científico e tecnologico.

Excelente senhora, a patroa. Gorda, rica, dona do mundo, amimada dos padres, com lugar certo na igreja e camarote de luxo reservado no céu. Entaladas as banhas no trono (uma cadeira de balanço na sala de jantar), ali bordava, recebia as amigas e o vigário, dando audiências, discutindo o tempo. Uma virtuosa senhora em suma — “dama de grandes virtudes apostólicas, esteio da religião e da moral”, dizia o reverendo.

Conto infantojuvenil: narrativas voltadas para jovens e crianças. Normalmente, a linguagem utilizada nesses contos e mais simples, e as tematicas sao relacionadas a conflitos comuns na vida de seus leitoresalvo.

Ótima, a dona Inácia. Mas não admitia choro de criança. [...] Note-se que, nesse trecho – parte inicial do conto de Monteiro Lobato – ja e possível perceber todos os elementos do conto: As poucas personagens – Negrinha e Dona Inacia – vivem um enredo que ocorre em uma fazenda alguns anos apos a libertaçao dos escravos. Isso e perceptível porque nos e dito que a mae de Ne-

Conto fantástico: com personagens e acontecimentos impossíveis na realidade e nao explicados na narrativa, esses contos tem conquistado cada vez mais leitores. Conto de fadas: velho conhecido de muitas pessoas, o conto de fadas e marcado pela existencia de fadas e outras criaturas magicas entre suas personagens. Esse subgenero de conto e especialmente lido por crianças, embora existam narrativas assim voltadas para o publico mais velho.

Apoie e participe no

Corrente d’Escrita Faça-nos chegar seus textos (maximo 4 mil toques) com ou sem foto. (para tamanhos maiores, consulte-nos)


Corrente d’ escrita

Dicas de como se inspirar para escrever? Numa parceria:

de poesia costuma mexer fundo no coraçao – mais especificamente na parte dele que mais importa, naquele ponto escondido de onde nascem todas as emoçoes. Faça, entao, o obvio: va a uma livraria ou confira Nao ha uma resposta magica, uma especie de receita os livros independentes publicados aqui no Clube. padronizada para isso: escrever sempre foi, e e sem- 2. Tenha sempre um caderno à mão – e use-o sem pre sera algo extremamente pessoal. Saramago, por economia. exemplo, lançava perguntas hipoteticas ao universo e Nao, nao e necessario ser exatamente um caderno: transformava suas respostas em enredos. Foi hipote- pode ser um tablet ou ate mesmo o seu celular. O imtizando sobre “o que aconteceria se a morte tirasse portante, mesmo, e que voce tenha o habito de regisferias”, por exemplo, que ele concebeu “As Intermi- trar imediatamente qualquer sinal de ideia que – tencias da Morte”, uma de suas obras primas. quem sabe? – tenha algum potencial de amadurecer

Corrente d’escrita/ Clube de autores

Khaled Husseini, autor do best-seller “O Caçador de Pipas”, diz se inspirar vendo o noticiario. Foi, alias, uma notícia na TV sobre competiçoes de pipas serem proibidas pelo Taliba que inspirou o seu livro mais famoso.

em forma de livro. Pode ser uma observaçao casual do cotidiano, o registro de um sonho, uma frase que achou bonita ou qualquer coisa. Simplesmente escreva, registre, anote. Nunca se sabe exatamente o que destranca ideias do

E, claro, entre lançar perguntas surreais ao cosmo e assistir ao Jornal Nacional certamente ha todo um abismo de ideias e inspiraçoes. Longe de querer sintetizar tudo em um compilado monotono, como se genialidades nascessem a torto e a direita, este post tem um objetivo que se situa entre a mera curiosidade e um empurraozinho aos que estiverem sofrendo de bloqueio criativo: uma lista com algumas das tecnicas mais utilizadas por autores de todo o mundo e atraves dos tempos para se destrancar a palavra escrita de dentro dos seus cerebros. Mas nao nos atenhamos unicamente a elas, claro. Uma cerebro. vez escrita, toda historia tem um caminho longo pela 3. Cace arte – e recrie a história por trás de cada frente, ate se transformar em livro. peça que achar. Vamos la? Olhe em volta. Onde quer que voce viva, sao imensas 1. Leia. Muito.

as chances de estar cercado por obras de arte. Sejam esculturas, telas, predios ou casaroes, grafites ou qualquer outra manifestaçao artística, e relativamente facil se deparar com algo capaz de te extrair do lugar-comum.

A maior fonte de inspiraçao para se escrever um livro costuma ser um outro livro. Um, nao: varios. Quanto mais intimidade voce tiver com obras primas de genios como Murakami, Rulfo, Guimaraes Rosa, Machado de Assis, Mia Couto, Clarice Lispector e outros tan- Aprenda a perceber a arte e, principalmente, a deixar tos, mais intimidade voce tera com o proprio conceito a curiosidade dominar seu olhar. Toda obra, afinal, tem uma historia por tras – e e nessa historia que rede narrativa. Deixar-se ser envolvido por estilos literarios que side a sua maior densidade. Foi a um museu e se entranscendem e transformam o proprio conceito cantou com uma peça específica? Pesquise-a, ainda


Corrente d’ escrita que com o proprio celular navegando na Wikipedia. do mundo. Mas tentar ser outra pessoa e uma garanQuem foi o autor? Em que período ela foi feita? Por tia de fracasso. que motivo? O que deveria representar? Quem enco- 7. Teste sua história mendou? O que ela deveria representar? Pensou em algo que pode ser um bom começo ou uma Para cada peça que olhar, brinque de engenheiro de boa base para um livro? Teste. obra pronta e tente imaginar toda a historia por tras Crie uma especie de sinopse mental e compartilhe-a dela, tanto emocional quanto cronologicamente. com algum amigo ou leitor em potencial. Perceba a Obras de arte mais plasticas (como quadros ou esculsua reaçao, esforçando-se para separar aprovaçoes turas) costumam ser uma especie de capítulo final de educadas de entusiasmos sinceros. Nem sempre o que um livro cujos capítulos iniciais podem ser criados nos parece uma boa ideia, afinal, tem potencial conpor cada espectador. E isso permite um tipo de exercícreto para se transformar em um bom livro, e testar a cio criativo fenomenal. capacidade de retençao de atençao e sempre um ca4. Aprenda a provocar emoções com as palavras. minho aconselhavel. Escritores sao, essencialmente, artesaos de palavras. Ou seja: absorva tudo o que puder dos feedbacks e Nesse sentido, cada frase pode ser pensada, esculpida cresça com eles! e retrabalhada de maneira a gerar mais impacto em 8. Não se veja como um gênio incompreendido seu ouvinte ou leitor. Aprenda a brincar com palavras, a substituir as monotonas colocaçoes do nosso cotidi- Depois de testar a sua historia uma, duas ou tres veano com termos buscados nos mais bem guardados zes e receber olhares mais reprovadores, e comum que o escritor busque refugio ou alívio no pensamenbaus do nosso belíssimo idioma. to de que seu texto esta perfeito, mas alem do alcance Livros, afinal, sao ideias traduzidas em um encadeadas pessoas. Esqueça isso. mento poetico de palavras. Quanto mais voce dominar o seu idioma, melhor conseguira destra- Claro: nem todo livro funcionara para todo mundo, mas se voce escolheu bem os “críticos” para quem var conceitos e deixar historias fluírem soltas. contou ou mostrou a sua tese (ou sinopse mental, co5. Decida o gênero que quer escrever. mo colocamos na dica acima), entao confie nas opiniDrama? Filosofia? Comedia? Terror? Ficçao científi- oes que ouvir. ca? Ate e possível mesclar pitadas de um genero com Em ultima instancia, force-se a acreditar que nao exisoutro mas, no geral, todo livro costuma se enquadrar tem genios incompreendidos: existem escritores que em um perfil mais geral. E isso nao e ruim. nao conseguiram concatenar suas ideias direito. Ao contrario: quanto mais claro estiver para si mesmo Quanto mais voce colocar a culpa nos outros, afinal, o genero que voce deseja escrever, mais facil sera menos conseguira mudar para evoluir. buscar referencias e escreve-lo. 9. Dedique-se a uma primeira frase 6. Não tente imitar alguns para agradar a todos “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu Um dos grandes erros que autores costumam cometer cadáver dedico como saudosa lembrança estas memóe tentar construir historias que agradem ao que eles rias póstumas.” Foi assim que Machado de Assis abriu entendem como “massa de leitores”. “Paulo Coelho é a sua obra prima, Memorias Postumas de Bras Cubas um best-seller? Então tentarei escrever igual a ele!”. – com uma primeira frase que praticamente cola o Poucas ideias podem ser piores que essa – ate porque olhar do leitor ao livro e o impele a devorar cada uma um livro e, por excelencia, um espelho do seu autor. de suas proximas paginas. Quanto mais rapido o autor entender que suas chan- Nao se costuma dizer que a primeira impressao e a ces de sucesso sao maiores na medida em que ele se que fica? Pois bem: em um livro, uma primeira frase entregar ao seu proprio estilo, melhor. Ser voce mes- bem elaborada tem o potencial de transformar a exmo e uma garantia de sucesso? Infelizmente, nao – o periencia do leitor – e de atiçar a imaginaçao do autor mercado literario e, possivelmente, o mais concorrido em níveis incríveis.


Corrente d’ escrita

Dicas de como se inspirar para escrever? 10. Deixe o texto ganhar vida própria; depois, dedique-se a podá-lo Em um determinado momento, suas maos parecerao ter vida propria e sairao escrevendo a uma velocidade maior que a do seu proprio cerebro. Nao se censure aqui: deixe o texto crescer por conta propria, tomar os caminhos que preferir, dominar o papel com toda a coragem de um adolescente descobrindo o mundo. Mas tenha claro para si que o que quer que resulte daí nao sera o seu trabalho final. Uma vez escrita essa primeira versao do livro, transforme-se em carrasco de si mesmo e dedique-se a ler e a reler, a cortar trechos desnecessarios, a organizar eventuais caos incompreensíveis e a ceifar capítulos inteiros com a frieza de um legista. O mexicano Juan Rulfo, alias, costumava dizer que escrever é a parte mais rápida de um livro: o trabalho mesmo estava no passo seguinte, quando ele começava a aparar as arestas de cada uma das suas proprias frases. Foi assim que ele deu ao mundo Pedro Paramo, um dos livros mais celebrados da historia.


Corrente d’ escrita — fevereiro de 2021

Dicas de português... Sobrenomes alemães

“Schafer” (“pastor”) e “Koch” (“cozinheiro), bem como “Bauer” (“campones”) e “Richter” (“juiz”).

O sobrenome “Schuster” (“sapateiro”) nao aparece A imigraçao alema no Brasil intensificou-se a partir da com tanta frequencia como deveria, porque a palavra segunda metade do seculo XIX, estimulada pelo gover- era escrita de varias maneiras: “Schumacher”; no brasileiro que pretendia industrializar sua econo- “Schubert” e ainda “Sauter”, a variante latina. mia. Outros sobrenomes comuns referem-se a qualidades O ano de 1824 e marcado pela vinda de famílias como ou características. Exemplos: "Klein” (“pequeno”), Brand, Boehnen, Schmitz e Gesser que desembarca- “Braun” (“moreno”) e “Jung” (“jovem”), entre outros. Alguns sobrenomes sao os nomes dos pais, como ram na regiao sul. “Werner” ou “Herrmann”. Hoje sao aproximadamente 5 milhoes de descendentes alemaes morando no Brasil. Pesquisa realizada no Quando os imigrantes alemaes chegaram ao Brasil, Rio Grande do Sul apontou os sobrenomes germani- muitos nomes e sobrenomes foram aportuguesados, cos mais comuns nesse estado: Schmidt, Becker, Wag- as vezes involuntariamente. ner, Muller, Schneider, Weber, Klein, Scherer, Hoffmann, Rech, Schmitz, Kuhn, Mallmann, Diehl, Ritter, Bohn, Ruschel, Stein, Braun, Ludwig, Hoff, Jung, Finkler e Sperb. Muitos desses nomes, como e comum tambem na Alemanha, estao ligados a profissoes. As terminaçoes “er” e “-mann” usualmente indicam a pessoa que faz determinada funçao – tal como o “-eiro” do portugues. Entre os mais frequentes esta o sobrenome “Muller”, que significa “moleiro”. Em segundo lugar, vem “Schmidt”, que provem da palavra “Schmied”, que significa “ferreiro”. Outros sobrenomes bem comuns sao “Weber” (tecelao) e “Becker”, que significa “padeiro”. Ainda se encontram com regularidade os sobrenomes

Este fato tambem ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial, quando o Brasil, por influencia dos Estados Unidos, tornou-se inimigo da Alemanha. De resto, alguns sobrenomes, por desconhecimento da língua alema por parte dos escrivaes, foram deturpados. Muitas vezes ao ouvir a pronuncia de um sobrenome, o escrivao o escrevia em seus livros de registro da maneira como o mesmo soava, e nao como ele realmente era escrito. Por este motivo, e importante saber como o sobrenome procurado e pronunciado no idioma ou dialeto original, pois talvez sera desta maneira que ele estara escrito no registro". Encontrei alhures. Apenas repasso, desconhecendo a autoria (Deonísio da Silva).


Corrente d’ escrita

Dicas de português... Deonísio da Silva colige a historia secreta das palavras e expressoes instruindo, entretendo e frequentemente divertindo seus leitores e ouvintes em colunas semanais ao comentar as frases aqui reunidas. Manda quem pode e obedece quem precisa, mas no Brasil nao se usa o imperativo para mandar. Este e usado para pedir. Para mandar, usa-se o subjuntivo, o indicativo ou qualquer inventado na hora, mas nao o imperativo. Nas oraçoes, a expressao rogai por nos pede ou manda? Publique-se e uma ordem? Mudando o verbo, poder-se-ia mandar ou pedir na lanchonete faça-se um sanduíche ? Era sinal de sorte nascer de re, apontando primeiramente o bumbum e ainda assim sobreviver, num tempo em que a mortalidade infantil era estratosferica. Este e o berço provavel da expressao que diz ser sortudo quem nasce com o bumbum virado para a lua. Ditos populares, expressoes e proverbios apresentam verdadeira obsessao pelo numero sete. Pintar o sete, bicho de sete cabeças, guardado a sete chaves, enterrado a sete palmos, as sete notas musicais, os sete pecados capitais, os sete sacramentos, as sete maravilhas do mundo antigo, as sete cores do arco-íris, os sete anoes, o gato de sete vidas, as sete virtudes (tres teologais e quatro cardeais) e ainda temos que perdoar setenta vezes sete, isto e, sempre. E saber de onde elas vieram.

UMA VÍRGULA MUDA TUDO *A vírgula pode ser uma pausa... ou não:* Nao, espere. Nao espere. *Ela pode sumir com seu dinheiro:*

R$ 23,4. R$ 2,34.

*Pode criar heróis:* Isso so, ele resolve! Isso, so ele resolve! *Ela pode ser a solução:* Vamos perder, nada foi resolvido! Vamos perder nada, foi resolvido! *A vírgula muda uma opinião:* Nao queremos saber! Nao, queremos saber! *A vírgula pode condenar ou salvar:* Nao tenha clemencia! Nao, tenha clemencia! *Uma vírgula muda tudo!* Se o homem soubesse o valor que tem, a mulher andaria de quatro a sua procura. Se o homem soubesse o valor que tem a mulher, andaria de quatro a sua procura. Associação Brasileira de Imprensa (ABI), fundada em 1908, fez esta curiosa homenagem à vírgula na celebração de seu centenário, em 2008.


Corrente d’ escrita

Livros à venda—impressos narealgana@gmail.com

As mulheres, os homens, as crianças e os idosos; a comunidade LGBT; os negros, os índios, os ciganos, os imigrantes e todos os demais desprotegidos, são perseguidos, violentados, agredidos e estuprados... Nesta obra intimista, Afonso Rocha passeia-se pela sua própria experiência, mas também a de todos nós, como comunidade, para que se dinamize e reforce a forma de combater estas mazelas, estes crimes bárbaros (a pedofilia, estupro), já considerados o holocausto do século XXI.

Através de estórias imperdíveis, Afonso Rocha leva-nos até 500 anos atrás, quando os portugueses chegaram ao sul do Brasil, onde criaram família, cultivaram tradições e culturas que viriam a “marcar” a cultura catarinense. Sangue Lusitano é a história do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, de suas vilas e cidades e de seus povos (indígenas, portugueses, negros e outros que se lhes juntaram posteriormente). Um livro a não perder.

Página 47


Corrente d’ escrita

Livros à venda—impressos narealgana@gmail.com Olhos D’Água—Histórias de um tempo sem tempo, relata-nos as vivências do povo português entre 1946 e 1974 e a sua resistência à ditadura e ao fascismo do regime de então. Por outro lado, configura uma autobiografia do autor (Afonso Rocha) nas suas andanças pelo período escolar, pelo serviço militar; a guerra colonial em África; a emigração em França; a resistência, até à revolução dos cravos... Um livro a não perder, sobretudo para quem gosta de história.

Trovas ao Vento, é uma coletânea de poemas e outros pensares, enriquecida com o contributo de outros poetas convidados naturais do Brasil, Portugal, Cabo Verde, Moçambique, Angola e da Galiza, como expressão do pensar lusófono. Um encontro de expressões diferentes, manifestadas pela língua comum que nos cimenta e faz pensar português. Um livro de cabeceira, não para ler, mas para pensar e refletir.

Página 48


Corrente d’ escrita

Livros à venda—impressos narealgana@gmail.com

Canasvieiras—270 anos, retrata a história e as gentes que fundaram este distrito de Florianópolis/SC. Criado oficialmente a 15 de abril de 1835, o povoado já existia desde os primórdios da fundação do arraial Nossa Senhora do Desterro, em 1673, por Francisco Dias Velho. Recebeu um grande incremento populacional com a chegada dos primeiros açorianos em 1748. No tempo, o povoado estava integrado na freguesia de Santo António de Lisboa desde 1750. O seu nome deriva da existência na região de um grande canavial (cana-do-rei, ou simplesmente cana). Muitos escritores, particularmente Virgílio Várzea escreveram sobre Canasvieiras. Afonso Rocha dá-nos, com este seu recente trabalho, um novo olhar e uma previsão futurista do balneário mais famoso de Floripa.

Página 49


Corrente d’ escrita

Número 37 - setembro 2020

I N É D I TO n a a m a z o n . c o m

Casa dos Livros e da Leitura

Página 50


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.