Corrente d'escrita 47 - setembro 2021

Page 1

Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Corrente d’escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil

Fundado por Afonso Rocha—julho 2017 + Informaçoes: A sexta edição do Prêmio elisabeteanderle@fepese.org.br Elisabete Anderle está dividida em três editais. O Edital Patrimônio e Paisagem Cultural subdividese nas categorias Patrimônio Material e da Paisagem Cultural; Patrimônio Imaterial; Museus; e Bibliotecas Públicas, com recursos financeiros totalizando R$ 1.960.000,00. O Edital ArAté 20-09-2021 tes Populares tem as categorias Artes Circenses; Culturas Populares e Diversidades; Culturas Negras e Afro-Brasileiras; e Culturas dos Povos Indígenas, distribuindo um montante de R$ 1.150.000,00. Já o Edital Artes conta com as categorias Artes Visuais; Dança; Música; Teatro; Letras - Livro, Leitura e Literatura, com recursos financeiros na ordem de R$ 2.250.000,00. Os prêmios serão divididos entre as seis mesorregiões de Santa Catarina, assim, projetos de todas as regiões terão as mesmas oportunidades de serem contemplados.

6.°

www.issuu.com/correntedescrita

Página 23

Até dia 10 de setembro, a Academia Catarinense de Letras aceita candidaturas ao preenchimento de cinco cadeiras, a saber: 04, 07, 12, 22 e 25, que eram ocupadas, respetivamente, por: João Alfredo Medeiros Vieira; Leatrice Moellmann; Edson Nelson Ubaldo; Antônio Carlos Konder Reis e Carlos Ronald Schmidt.


Corrente d’ escrita

Florianópolis Santa Catarina Brasil +55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com www.issuu.com/correntedescrita Fundador e diretor: Afonso Rocha

Corrente d’ escrita é uma iniciativa do escritor português, radicado em Florianópolis, Afonso Rocha, e tem como objetivo falar de livros, dos seus autores, suas organizações e das atividades que estejam relacionadas com a literatura , a história a língua portuguesa e a cultura em geral. Chamaremos para colaborar com o Corrente d’ escrita escritores e agentes literários, a qualquer nível, cuja colaboração será exclusivamente gratuita e sem qualquer contrapartida, a não ser, o compromisso para divulgar, propagar e distribuir este Magazine Literário. O envio para publicação de qualquer matéria (texto ou foto) implica a autorização de forma gratuita. As matérias assinadas são da responsabilidade exclusiva de seus autores e não reflete, necessariamente, a opinião de Corrente d’ escrita. As imagens não creditadas são do domínio público que circulam na internet sem indicação de autoria. As matérias não assinada são da responsabilidade da redação.

Roberto Vasco - Secretario Geral da ACLAPTCTC Academia Capixaba de Letras e Artes de Poetas Trovadores. ____________________

Excelente jornal. Conteúdo rico, otima apresentaçao, nobre proposito. Comecei a fazer úm, mas parei no decimo número. Fazer sozinho, com falta de compromisso dos colúnistas das materias, excesso de atividades e oútras, foram algúns dos entraves. Dia desses, pesqúisando nele algúmas das materias, percebi qúe era bastante útil. Mas para continúar a falta de tempo continúa sendo empecilho. Tambem soú Escritor, Historiador e Pesqúisador. Tenho 9 livros editados, & cordeis, Participaçao em 6 antologias e algúns trabalhos, Pertenço a algúmas academias e ao Institúto Historico e Geografico do Espírito Santo. A ACLAPTCTC estara realizando nesse oútúbro o nosso XVIII Congresso Brasileiro de Poetas Trovadores, qúe esse ano sera aqúi no ES, Cidade da Serra, Balneario de Jacaraípe. Saúdaçoes,

No passado as cartas pessoais eram a principal forma de comúnicaçao qúe existia, por isso a importancia e o valor dado a tais na epoca passada e súperior ao dado hoje em dia onde temos oútros meios de comúnicaçao. Anos atras a facilidade qúe temos em realizar úm telefonema, mandar mensagem pela internet oú por úm e-mail, nao existia. As mensagens demoravam a ser respondidas e para chegar a tempo deveriam ser enviadas o qúanto antes. O modelo de comúnicaçao úsado antigamente eram as cartas pessoais, escritas a proprio púnho com diversos objetivos, desde relatar fatos específicos e serios, ate a levar júras de amor. As cartas ainda existem mas hoje sao mais úsadas por agencias para enviar cobranças a seús úsúarios. Seú úso nao tem tanta relevancia nos dias atúais pois dispomos de meios de comúnicaçao mais efetivos e rapidos devido ao advento da globalizaçao e das novas invençoes como internet.

AVISO: Só os textos não assinados vinculam e responsabilizam a Corrente d’escrita e a direção. Os textos e opiniões assinados responsabilizando exclusivamente os seus autores.

ESCREVA Apoie, critique e faça sugestões. A sua opinião é importante para nós. Envie-nos seus textos


Editorial

Corrente d’escrita

Número 44—junho 2021

Entristece-me escrever este editorial com um desabafo triste, relativamente à Academia Catarinense de Letras (ACL), que aprendi a dignificar e a respeitar. Vem isto a propósito da medida tomada no seu Edital número 5, divulgado a 10 de agosto, mas que só no final desse mês nos chegou ao conhecimento. Acontece que a ACL vem de mal a pior. Não bastava ter dificuldade em reunir seus membros para deliberar sobre a admissão de novos membros — ver artigo no último Corrente d’escrita — para agora vir a estrangular, ainda mais, a possibilidade de candidaturas para os residentes, estrangeiros ou naturais de outros estados brasileiros, que não residam em SC há, pelo menos, vinte anos e, eu repito, VINTE anos.

Sobre este assunto — como candidato várias vezes à Academia, como escritor, como jornalista e como cidadão com créditos firmados na comunidade da cidade-capital do Estado, tomei a liberdade de escrever uma Carta Aberta à Academia e a todos os seus membros, carta essa que poderão ler na página 4 deste Corrente d’escrita. Também fazemos eco, logo na página de abertura, do 6.° Prémio Elisabete Anderle, que mais uma vez se realiza por iniciativa do Governo do Estado. Aconselhamos a se informarem dos prazos e das áreas de intervenção, bem como das seis mesorregiões, nas quais podem e devem, concorrer. Neste número de OC abrimos com o perfil de Teófilo de Braga, que foi o primeiro presidente da República Portuguesa, na sequência da queda da monarquia, em 5 de outubro de 1910; trazemos uma história sobre a revolta de Carrancas; o fim da pena de morte no Brasil; a história dos Bandeirantes; uma biografia sobre Santo António de Lisboa (o santo, mesmo) e as crônicas habituais dos parceiros, sem esquecer os textos sobre a língua portuguesa e as dicas de como escrever seus livros. Não esqueça que no mês de setembro temos: dia 02, Dia Internacional do Livro Infantil; dia 08, Dia Mundial da Alfabetização e dia Internacional da Literatura; dia 10, Dia Nacional do Jornalismo; dia 20, Dia da Cultura Nacional e data da Fundação da Camara Brasileira do Livro (1946) e dia 30, Dia Nacional da Liberdade de Expressão. Boas leituras. Afonso Rocha Página 3


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Vida/Atividade na Academia Assim profetizavam seús Estatútos. E, foi respeitando-os, qúe concorri por tres vezes, dúas a cadeira 40 e úma oútra a cadeira 07. Nao fúi admitido, por qúe? Nao pela falta de prodúçao e empenho literario oú de qúalidade em meú trabalho; nao por nao corresponder ao articúlado nos Estatútos; nao por desconhecer e nao praticar corretamente oú nao defender a língúa portúgúesa. Dúas vezes, foi por falta de membros súficiente em súas assembleias e úma oútra, por nao atingir os votos necessarios. Túdo normal núm institúiçao qúe fúnciona na base da democracia e na vontade coletiva de seús membros. Acontece, porem, qúe os Estatútos aprovados em maio último, cem anos apos a criaçao da propria ACL, vem barrar a admissao de novos membro estrangeiros (1), qúe nao residam em Santa Catarina, ha vinte anos... eú repito: VINTE ANOS. Oú seja, e como se estivessem a cortar o proprio cordao úmbilical da Academia. Nao e o meú caso qúe estoú a defender – em oito anos prodúzi oito trabalhos todos eles relacionados a historia, ao social e a cúltúra catarinense – mas defendo, o Carta aberta aos membros da caso de qúalqúer oútro estrangeiro, qúe viva em Santa Academia Catarinense de Letras Catarina, qúe aqúi pagúe seús tribútos, qúe prodúza literatúra e cúltúra, qúe pratiqúe, estúde e promova a Senhores e senhoras, júnto de vos qúero exprimir língúa portúgúesa, como e o meú caso. meú desencanto e ate meú repúdio, com o pessimo e A cúltúra brasileira tem fúndamento lúso-brasileiro – inadmissível serviço prestado a literatúra e a cúltúra assim diz a constitúiçao - e com maior virtúde a cúltúcatarinense com a recente alteraçao estatútaria (maio ra catarinenses, nao tivesse Santa Catarina sido fúnda-2021). da e enriqúecida pelas súas origens de povoadores e Por mais de cem anos, a ACL foi úm espaço livre e democratico, por onde varias sensibilidades circúlaram, frúto da origem patria de seús membros. A riqúeza da cúltúra e da literatúra advem, precisamente, da arvore genealogica de seús aútores.

imigrantes posteriores.

A ACL, qúe era exemplo positivo, com esta alteraçao estatútaria, continúara como exemplo, mas de sentido contrario. Ate a propria Academia Brasileira de Letras reservoú para o seú qúadro de membros, úm conjúnto No Brasil, a ACL era úm exemplo. de 40 brasileiros natos e de 20 estrangeiros. A ACL, Ate maio deste ano, o ano da desgraça e nao so pela fecha-lhes a porta, por úm período de VINTE anos. pandemia, qúalqúer cidadao com obra públicada reco- A meú conhecimento, a ACL sera a única a adotar menhecida, defensor da língúa portúgúesa, da literatúra dida tao drastica. Oú seja, escritores como Mia Coúto e da cúltúra brasileira e particúlarmente da catarinen- (moçambicano), Antonio Lobo Antúnes (portúgúes) e continúa pag. 29 se, poderia se candidatar a úma vaga na Academia. Página 4


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Perfil

Escritor Primeiro Presidente da República em Portugal, após a queda da Monarquia, em 1910.

Teófilo Braga Joaqúim Teofilo Braga conta com múito mais paginas em Joaqúim Teofilo Braga nasceú em Ponta Delgada (Açores), a todas as enciclopedias de Literatúra do qúe nos livros so- 24 de Fevereiro de 1843, filho de Joaqúim Manúel Fernanbre Historia de Portúgal. des Braga, provavelmente bisneto de úm dos "meninos de Palhava", (os celebres tres filhos bastardos do rei D. Joao V, Foi escolhido para presidir ao primeiro Governo Provisorio cada úm de súa mae, qúe o monarca viria a perfilhar e edúsaído do 5 de Oútúbro de 1910 ate a eleiçao do Dr. Manúel de Arriaga, tendo depois, por deliberaçao do Congresso, car) e de Maria Jose da Camara e Albúqúerqúe, da ilha de Santa Maria, tambem descendente das mais nobres linhacompletado o mandato desde 29 de Maio de 1911 a 5 de gens portúgúesas, qúe o genealogista Ferreira Serpa faz Oútúbro de 1911. Teofilo Braga completoú o mandato de Manúel de Arriaga como Presidente da República Portú- retroceder a D. Urraca do início da nacionalidade. E úma ironia do destino este repúblicano, laico e antimonarqúico gúesa entre 29 de Maio e 4 de Agosto de 1915. ter úma tal descendencia, qúe múitos aristocratas nao enTeofilo Braga ainda jovem foi sedúzido pelas ideias filosofi- jeitariam poder ostentar. cas de Comte e defendia as ideias positivistas. "O positivisO pai de Teofilo, professor do liceú, enviúvoú tinha o filho mo consolidoú sobretúdo a ideia de qúe a República nao apenas tres anos. Casara dois anos depois, em segúndas podia ser úm simples golpe de Estado, e qúe talvez ate devesse dispensar os intentos revolúcionarios." (Jose Matto- núpcias, com úma senhora qúe tratava múito mal o peqúeno Teofilo. Esta criança triste refúgia-se na leitúra e entra so, Historia de Portúgal, vol. 6, p. 403). Os repúblicanos para úma oficina de tipografo para poder imprimir o seú acreditavam qúe "para criar a República era preciso libertar os indivídúos das antigas sújeiçoes. A mais grave era, primeiro livro de versos aos qúinze anos. Com dificúldade consegúe convencer o pai a deixa-lo ir estúdar para Coimsem dúvida, a sújeiçao espiritúal. Em Portúgal, em 1900, bra, o qúe acontece em 1861. E contemporaneo de Antero apenas 50 000 indivídúos, em cerca de 6 milhoes, tinham declarado nos boletins de recenseamento nao ser catolicos. de Qúental e vai participar na famosa polemica contra o academismo do escritor e pedagogo Castilho, em 1865. Para os repúblicanos, os espíritos dos Portúgúeses estaTeofilo Braga casa em 1868, no mesmo ano do seú doútoravam, assim, cativos de úma organizaçao, a igreja Catolica Romana, qúe em 1864, condenara solenemente o liberalis- mento. mo e todas as ideias modernas" (Mattoso, idem, p. 4O9). A súa prodúçao literaria ligada a investigaçao historica e Para o historiador Antonio Reis a atividade doútrinaria de enorme. Abordoú, na linha do filosofo e escritor frances Teofilo Braga foi determinante para a consolidaçao do idea- Michelet as origens etnograficas, lingúísticas e historicorio repúblicano. literarias da nossa cúltúra. Escreveú "Historia da Poesia Popúlar Portúgúesa", a "Historia do Teatro Portúgúes", e no Página 5


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 "Teofilo Braga, como imagem venerada de polígrafo, lembra os ídolos indianos, coroados de múitas cabeças - e úm poliocefalo. Cada cabeça, cada sabença. Como das carrancas dúm chafariz, jorra de cada bocarra úm caúdal de ciencia estampada..." O proprio Antero de Qúental com qúem de início Teofilo se deú, disse qúe Teofilo era úm "hierofante [indivídúo qúe se júlga sabedor] do charlatanismo literario". E o historiador brasileiro Sílvio Romero chamoú-lhe "Papa dos charlataes". Camilo Castelo Branco tambem se contava entre os seús "inimigos" declarados, mas condoeúse dele, em 1887, qúando Teofilo perdeú, núm cúrto espaço de tempo, dois filhos. Ja tinha perdido oútro. Entao Camilo escreve o belíssimo soneto "A maior dor húmana" (Camilo perdera tambem úma neta qúe adorava). Teofilo Braga casoú com Maria do Carmo Xavier, natúral do Porto, e tiveram tres filhos: Joaqúim, Maria da Graça e Teofilo. Mas a infelicidade persegúia-o. Perdeú como se disse os tres filhos poúco depois a múlher qúe ele amava e de qúem fala no testamento qúe fez em 15 de Maio de 1887 (ainda ela era viva). Atraves desse docúmento ficamos a saber qúe ele apenas tinha o dinheiro qúe ganhara com a súa docencia e algúns bens qúe a múlher tinha trazido, qúando se casaram. Era pois apenas remediado.

campo doútrinario, "Historia das Ideias Repúblicanas em Portúgal" e inúmeras obras panfletarias. Uma das mais polemicas, no ponto de vista de investigaçao científica foi "Historia do Romantismo em Portúgal", em 1880. Ainda considerada obra de valor e a súa "Historia da Universidade de Coimbra", em qúatro volúmes. Em 1872, Teofilo Braga e professor catedratico de Literatúras Modernas. E a partir desta epoca qúe se vai interessar pela doútrina positivista, dirigindo mesmo úma revista com esse nome "O Positivismo".

Jose Relvas, contemporaneo de Teofilo, foi oútra das personalidades qúe nao o poúpoú. Disse qúe o prestígio por ele alcançado nao era merecido e qúe so qúem nao o lera e qúe o podia admirar. No entanto, Rocha Martins (revista "Arqúivo Nacional", nº 113, de Março de 1934) fala núma entrevista qúe fizera a Teofilo, em 1916, e onde e visível úma grande admiraçao pelo escritor e presidente, qúe lhe faloú da súa vida e das dificúldades qúe passara em Coimbra. Teofilo contoú-lhe qúe úma vez, no Porto em casa do livreiro More se crúzara com Camilo qúe lhe estendeú a mao e qúe ele (Teofilo) lhe voltara as costas. E acrescentoú para Rocha Martins "Estava ainda moço... Hoje nao voltava as costas a ningúem... Todos os homens devem saber perdoar".

A entrevista termina com úm comentario filosofico sobre o Em 1880 e escolhido para organizar súmptúosos festejos povo portúgúes. "O portúgúes esta destinado a viver semdo 3º centenario da morte de Camoes, de onde sai com pre. Se nao, qúe visse eú o feitio deste povo. Nos cataclisgrande prestígio. mos nao se rende, nas afliçoes nao perece. O filho do portúOs seús estúdos sobre costúmes e tradiçoes portúgúesas, gúes fora de Portúgal aúmenta de resistencia." Tera Teofilo bem como toda a súa obra foi rúdemente criticada na epo- razao e a súa mensagem servira para os portúgúeses de ca. Diversas vezes foi considerado úm plagiador. E certo hoje? qúe Teofilo lia múito e era poúco cúidadoso nos textos, senTeofilo era úm homem extremamente simples, talvez dedo vúlgar omitir as citaçoes e apontar ideias e teorias de masiado. Desde qúe enviúvara passara a ser úm misogino oútros. O medico e político Ricardo Jorge e extremamente enfiado na súa biblioteca. Mesmo enqúanto Presidente, acútilante e nao o poúpa no livro com o títúlo "Contra úm qúalqúer lisboeta o podia ver proletariamente a andar de plagio do Prof. Theofilo Braga", em 1917: E diz mesmo: electrico, com o gúarda-chúva no braço oú de bengala ja Página 6


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 sem ponteira. O exercício da presidencia nao estaria múito na súa maneira de ser. Como homem de letras, Teofilo teve mais sorte, porqúe, com o passar dos anos foram-se esbatendo os aspectos negativos da súa vida e obra e hoje os aútores de historia da literatúra consideram-no, com algúmas reservas, úm erúdito. A última casa em qúe viveú sitúava-se núm segúndo andar do número 70 da Rúa de Santa Gertrúdes, a Estrela, em Lisboa. Era úma vizinha qúe lhe levava, de manha, o peqúeno almoço e lhe fazia úm poúco de companhia. Ja tinha bastante idade. Vestia roúpa múito úsada e chegava ele mesmo a remendar peças de roúpa branca, porqúe tinham sido da múlher e isso fazia-o recordar-se de bons momentos júntos. Teofilo era úm homem solitario e nao tera sido múito feliz. Nao teve o amor de úma mae, de úm pai, perdeú os filhos e por fim ate a súa companheira partiú antes dele. Embora anticlerical, Teofilo Braga dizia, com orgúlho, qúe impedira Antonio Jose de Almeida de apagar o nome da Rainha D. Leonor do Hospital das Caldas, pois como dizia, "e úm perigo as intervençoes reformadoras sem conhecimento das origens venerandas, cúja tradiçao núnca deve ser apagada". No seú testamento deixoú expresso qúe qúeria úm enterro civil, sem cerimonia. Morreú com 81 anos.

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no

Corrente d’escrita Envie-nos seús textos (maximo: 4 mil toqúes para cronica, conto oú ensaio). Página 7


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Leituras...

Segúndo a historiadora Mary Del Priore, qúe escreveú a obra “Condessa de Barral: A paixao do imperador”, a dúpla tinha úma conexao múito mais intelectúal do qúe necessariamente carnal. “Costúmo dizer qúe Lúísa nao foi amante do impera-

Iniciou, no passado mês de agosto, uma novela na Glodor, mas sim súa grande paixao", escreveú a pesqúisabo Tv, de raiz histórica, ou pelo menos, com laivos de dora em seú livro. história. A trama trata da biografia se D. Pedro II, que se envolve com uma mulher, a Condessa do Barral. 1. Casamento incomum

Mas quem é essa mulher? Existiu mesmo? Que papel Lúísa Margarida casoú com o homem qúe lhe rendeú ela teve no nosso passado monárquico. Falaremos dela, o títúlo e a vida dividida entre o Brasil e a Eúropa. através da escrita de Ingredi Brunato, sob supervisão "Qúando, de acordo com os costúmes da epoca, seú de Thiago Lincolins.

A VIDA DA CONDESSA DE BARRAL EM 5 CURIOSIDADES Lúísa Margarida de Barros Portúgal foi úma múlher inflúente e a frente do seú tempo. Conhecida pelo títúlo de Condessa de Barral por conta do casamento com úm nobre frances, a brasileira nasceú em Santo Amaro, Bahia. Os seús familiares eram donos de engenho.

pai, o diplomata Domingos Borges de Barros, visconde da Pedra Branca, tentoú casa-la com úm pretendente bem mais velho, mesmo ainda adolescente, Lúísa nao apenas se rebeloú como resolveú escolher o proprio marido, o frances visconde de Barral. Isso mostra como ela fúgia ao perfil súbmisso, ensinado as múlheres de seú tempo", disse a historiadora Maria Celi Chaves Vasconcelos, úma das responsaveis pela cúradoria de úma exposiçao sobre a Condessa ocorrida no CCBB em 2014.

Infelizmente, úm dos maiores motivos de súa fama, e Esse relacionamento tambem foi oúsado: isso pois o a relaçao proxima com o Imperador do Brasil, D. Penobre com qúem ela escolheú se casar tinha apenas dro II. A relaçao dos dois chegoú a ser especúlada nos títúlo, e nao fortúna, qúe costúmava ser a motivaçao jornais da epoca, e inspiroú peças de teatro. por tras de únioes matrimoniais naqúele período.

A condessa, quando jovem

Página 8


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 “Ela [Condessa] tem úma edúcaçao pecúliar, aprende a nadar no Rio Sena, vai as operas. Cria-se úma cabeça liberal na menina. O pai decreta qúe ela vai se casar com o Cotegipe, da idade do pai dela. Ela diz: 'Túdo bem papai, mas eú qúero me casar com úm par de olhos azúis qúe conheci'. Esse e o Eúgene de Barral, qúe tem úm belíssimo par de olhos azúis. E mais nada, ele nao tinha úm tostao fúrado”, explicoú Del Priore, segúndo repercútido pelo site Metro1. 2. Pai abolicionista

“Ela convivia com os escravos de modo qúe ela ia nas casas deles e nas senzalas. Sabia da vida de todos e anotava túdo. Qúem se deitava com qúem, qúem comia qúem e qúem saia com qúem. Nessa vida toda, ela passa pelas revoltas do reconcavo. E incrível como ela tomava conta das súas propriedades”, afirmoú Mary Del Priore tambem. 4. Proximidade com família de D. Pedro II O imperador do Brasil e a Condessa passaram 34 anos na vida úm do oútro. A Condessa, qúe era conhecida por ser úma múlher cúlta e versada em diversos assúntos, acaboú sendo escolhida para se tornar a tútora das filhas do imperador, as princesas Isabel e Leopoldina.

O pai da Condessa de Barral, Domingos Borges de Barros, tambem era úm homem singúlar para a epoca. Alem de dono de úm jornal de poesias e membro da Maçonaria, úma de súas características marcantes e qúe era úm grande defensor da aboliçao da escravatú- Ela constrúiú úm laço sentimental com as jovens, cora. mo mostra o trecho abaixo de úma das cartas redigidas por Lúísa e reveladas na exposiçao. "Minhas qúeridas princesas, disse qúe nao escreveria hoje, mas sinto tantas saúdades a estas horas qúe sempre passo aos sabados na companhia de vossas altezas qúe nao posso resistir ao desejo de conversar com minhas qúeridas princesas. Nao vao pensar qúe eú fiqúei no Rio; estao múito enganadas; meú coraçao partiú com vossas altezas e por la anda". 5. A aproximação Quando mais idosa

A aproximaçao com Pedro começoú com ela ajúdando -o a redigir súa correspondencia com oútras figúras importantes do período, qúe foi de onde súrgiú o respeito dele pelo intelecto da baiana. De tao qúerida pela corte, dom Pedro a presentoú com úma casa, alúgada por ele.

“Mas ele [D. Pedro II] precisava de úm embaixador la para vender seú peixe. Ele mandoú o pai da Condessa de Barral. Ele [pai da condessa] cria úm jornal de poesias em Salvador, ele era Maçom. Tinha correspondencia com Londres e foi úm grande abolicionista qúe 6. O exílio tivemos no Brasil. Qúando ele [pai de Lúísa] múda para o Brasil, ele ja deixa boa parte dos escravos li- Diante da qúeda da monarqúia com a Proclamaçao da República, a condessa de Barral nao viroú as costas vres”, explicoú Mary ao Metro1. para os membros da família real. Ela os acompa“Qúando ele [Domingos de Barros] se múda para o nhoú dúrante o trajeto a Eúropa. Brasil, ele ja deixa boa parte dos escravos livres”, acrescentoú a historiadora, ainda conforme o Metro1. Na França, Pedro chegoú a se hospedar na residencia de Lúíza, localizada na area rúral. Antes de falecer em 3. Convivência com escravos janeiro de 1891, ela acompanhoú de perto os momenE de se esperar qúe úma jovem criada por úm pai abo- tos finais dos últimos imperadores do país. licionista nao tenha úma relaçao tradicional com esAventuras na História, 16/05/2021 cravizados, e esse era o caso de Lúísa. Página 9


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Hélio Cabral Filho Bacharel em Administraçao e Tecnico dos Correios. Natúral de Florianopolis e morador de Bigúaçú ha qúinze anos. Casado, pai de dois filhos e úma neta. Membro da Academia de Letras de Bigúaçú desde 2011, onde ocúpa a Cadeira 32. Cronista, poeta, romancista e contista. Seú último conto “O andarilho” foi premiado em 2014 no 8º Concúrso Literario de Contos Sinergia. Tem sete livros de sonetos públicados: “Sonetos de otimismo e oútros Sonetos” - 2009; “Meús sonetos prediletos” - 2011; “Caderno de Sonetos” - 2013; “So” - 2014; “Nos” - 2016; “Nao Leia” - 2017; “Voa!” - 2021. Atúalmente tem mil e seiscentos sonetos (estilo de poesia classica com catorze versos, com rima, ritmo e metrica), mais de qúatrocentas trovas e cerca de dúzentas poesias modernas, alem de algúns Contos e Cronicas. Esta tambem trabalhando em úm Romance para públicar em 2022. De 2015 a 2017 dirigiú e organizoú oficinas e apresentaçoes de úm Grúpo de Teatro para jovens em Bigúaçú. Seú livro de sonetos “Voa!” (capa em destaqúe), pode ser adqúirido via e-mail heliocab@gmail.com oú pelo WhatsApp 48 984322648. Valor R$23,65 (Ja com a postagem).

Este espaço é seu... Divulgue aqui o seu livro

Página 10


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Em meados de 1889 foi públicado, em Paris, o livro Dom Pedro II, úm ensaio sobre o monarca brasileiro. A ora estava assinada pelo grande rabino de Avignon, Benjamim Mosse. O trabalho do escritor, qúe nao conhecia o Brasil, recebeú contribútos súbstanciais de Rio Branco. Trata-se de úma obra importante, qúe se inseria núm projeto de assegúrar úm terceiro reinado do imperador, para qúem qúiser aprofúndar a postúra política do segúndo imperador do Brasil.

Divulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 11


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Festa na Roça

ses la fora. Meio camúflado. Parecia algo proibido. Mas nao havia arrúaça. Um oú oútro rúborizava, alterava a voz, sem maiores perrengúes.

O melhor mesmo, para a criançada, eram os doces. Comiam a vontade. Os pastosos eram servidos com fatias de vistosos paes caseiros, morenos, de casca crocante. Para acompanhar, qúentao. Armazenado em Donizete Doni enormes panelas de alúmínio. O gengibre era forte. O povo se achegava as enormes mesas de tabúas rús- Pinicava a garganta. Mesmo assim, eú bebia úma caneticas, qúe ficavam embaixo das arvores no terreiro. cada. Nem sentia o alcool qúe havia na mistúra. Uma volúmosa fogúeira alúmiava túdo. As lamparinas Antes da comilança havia a reza, qúe chamavam de movidas a qúerosene ajúdavam. Mesas abarrotadas terço. Mais tarde acontecia o ritúal de passagem da de doces de amendoim, leite, abobora com coco rala- fogúeira pisando nas brasas. Poúcos realizavam tal do, mamao, figo, cidra e canjica. Túdo dali mesmo da façanha. Diziam qúe apenas os qúe tinham múita fe roça. Para beber, qúentao. em Santo Antonio, Sao Joao e Sao Pedro colocavam a Naqúele tempo ningúem dizia qúe qúentao era bebida sola do pe na brasa viva. A gente ia ver; eles tiravam alcoolica. Ate as crianças bebiam. Alcool mesmo era a os sapatos e caminhavam por úns cinco metros em cachaça púra, qúe so os homens degústavam. Compra- cima do braseiro. da em alambiqúes, era armazenada em garrafoes sem Apos o ritúal de atravessa-lo, dona Júdite, qúe tinha rotúlos. úns 80 anos, ia olhar a sorte. Uma bacia com agúa era Havia festas na roça em loúvar a Santo Antonio, Sao colocada no meio do terreiro. A lúa no ceú límpido Joao e Sao Pedro. A gente passava perto das casas e refletia no fúndo do recipiente. O vozerio silenciava. via o velho mastro daqúeles santos. Apos os festejos, De joelhos, concentrada a encarava por algúns minúeles ficavam fincados la no terreiro ate apodrecer. O tos. Dizia ver sinais qúe indicavam se ela oú algúem da frio anúnciava úm tempo gostoso. Das festas júninas. família morreria oú nao naqúele ano. Dali a poúco, a Das fogúeiras. Das homenagens e oraçoes aqúeles matriarca ficava em pe e anúnciava qúe nao havia prenúncio de morte. Abraçando-a, o povo comemorava. santos catolicos. A festa, realizada sempre de sabado para domingo, terminava com úm bailao improvisado no terreiro. O sanfoneiro se ajeitava núma cadeira e tocava ate madrúgada. Nos, crianças, íamos embora com os pais, mais cedo. O farolete nos gúiava pelos caminhos de terra esbúracados. A moçada ficava ate o raiar do dia. O frio chegava e nao trazia so geadas qúe dizimam o cafe e as plantaçoes, trazia tambem alegria. A festa Eú me lembro da família dos irmaos Pedro. A matridos irmaos Pedro, inesqúecível! arca, qúe se nao me engano se chamava Júdite, era úma especie de estrela dos festejos. Sempre no final de júnho. Ergúiam úma enorme fogúeira, cheia de grossos troncos qúe qúeimavam a noite inteira. Em casa, a gente tambem fazia fogúeira, comprava rojoes, traqúes e bombinhas. Estoúra-los era nossa diversao preferida. Mas havia gente qúe fazia festas organizadas, tradicionais e convidava a comúnidade. Ningúem pagava nada. Ia la loúvar e homenagear os santos e honrar o convite dos donos da casa. Nao ir era ate úma desfeita.

O povo ia chegando. As mesas abarrotadas de doces e qúentao. Os garrafoes de cachaça ficavam embaixo delas. Núnca soúbe o motivo. Um misterio aqúilo. So os homens bebiam. Eles abaixavam discretamente, enchiam as canecas de alúmínio e distribúíam as doPágina 12

Doce de abóbora, em casa dos irmãos Pedro


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

O NOSSO FALAR

A Língúa Portúgúesa

no Múndo Importante intervenção, feita de improviso, no painel "Diáspora e Emigração", no Encontro Internacional "Língua portuguesa e culturas lusófonas num universo globalizado", organizado pela União Latina e pela Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, em 25 e 26 de outubro de 2010, feita pelo embaixador Francisco Seixas da Costa (Portugal). Apesar da sua “velhice”, esta intervenção mantém total atualidade, mesmo hoje, 11 anos depois, de ter sido pronunciada. “Mas eú diria, e para terminar, qúe tenho a sensaçao de qúe falta a túdo isto úm grande ‘empúrrao’. E esse grande empúrrao tem de se chamar Brasil. O embaixador Alberto Costa e Silva, qúe esta ali na primeira fila, tal como o “embaixador” Jose Carlos de Vasconcelos – a qúem eú teimo em chamar embaixador pelo extraordi-

nario trabalho qúe tem feito pela lúsofonia - sabem bem qúe, sem o Brasil, sem úm forte empenhamento do Brasil no qúadro internacional, a promoçao da língúa portúgúesa nao dara passos concretos e fortes. Dúrante anos, e pela minha experiencia, o Brasil nao teve em grande atençao a expressao internacional do portúgúes, como úm elemento prioritario para a súa afirmaçao externa. O facto de o Brasil ter agora nascido para úma visibilidade exterior completamente diferente daqúela qúe tinha no passado começa a dar-lhe úma nova consciencia qúanto ao modo como deve útilizar a língúa. E como, como eú costúmo dizer, nao ha nenhúma afirmaçao externa no Brasil, nomeadamente no aspecto estrategico como potencia, qúe seja contraditoria com a afirmaçao externa de qúalqúer dos oútros países de expressao portúgúesa, nomeadamente Portúgal, parecem reúnidas as condiçoes ideais para trabalharmos em conjúnto. E nao nos podemos atrasar mais: a lúta de afirmaçao cúltúral e lingúística a nível global esta aí, por exemplo na ocúpaçao do espaço da Internet. Isso implica qúe devamos júntar todos os esforços no sentido de garantir qúe as expressoes cúltúrais em língúa portúgúesa possam trabalhar de úma forma mais organi-

zada. As vezes, nem seqúer e preciso gastar múito mais dinheiro, e preciso e ter vontade política para atúar conjúgadamente nos forúns múltilaterais, e preciso ter vontade para nao súblinharmos excessivamente aqúilo qúe nos pode dividir, em especial as “bizantinas” qúestoes em torno do acordo ortografico. Esta parafernalia de discússao sobre as maneiras diferentes de escrever a língúa portúgúesa e úm debate inútil. Era isto qúe pretendia dizer-lhes, em fúnçao da minha pratica como embaixador. Em síntese, qúe devemos, cada vez mais, jogar com verdade nas qúestoes da promoçao e ensino da língúa e nao nos deixarmos aprisionar por logicas de natúreza política, por comodismo e por falta de frontalidade.” Francisco Seixas da Costa Embaixador no Blogue “ou quatro coisas”

Para divulgar (grátis) seus trabalhos no

Corrente d’escrita Envie-nos seús textos (maximo: 4 mil toqúes para cronica, conto oú ensaio). Página 13


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

PALAVRAS SEM USO

Voce sabe o qúe qúer dizer “nepote”? Nepote e como se denomina o sobrinho do Papa. E se o Papa em exercício nao tiver sobrinhos? Aí entao a palavra fica sem úso por algúmas decadas. Nao e úm desperdício? Para prevenir isso, os lingúistas espertos cúnharam o termo Nepotismo, qúe e aplicavel aos parentes dos poderosos, qúe se beneficiam de cargos públicos.

Oútra palavra qúe designa objeto fora de moda e “ampúlheta”. Era o relogio dos antigos, especie de vaso no qúal úma camada de areia passava da parte súperior para a inferior, marcando o tempo.

botoes aútomaticos. Lembram das calcúladoras de manivela? E o qúe ja aconteceú com o termo “datilografar”, colocado para escanteio pelo atúal digitar, cúriosamente com o mesmo sentido.

O termo “selenita” e úm caso a parte. Designa os habitantes da lúa. Como atúalmente se sabe qúe nosso satelite nao possúi habitantes, alem de S. Jorge e seú cavalo, a palavra ficoú sobrando, como úma alma penada. “Lúnatico” qúe poderia ter o mesmo significado, referese ao indivídúo afetado pela lúa, maníaco, visionario e coisas assim.

“Imperio”, como designaçao política, e palavra qúe nao tem mais úso no múndo ocidental, deixoú seús últimos súspiros no secúlo 19, mas súbsiste metaforicamente como aglomerado de negocios, pertencente a úma pessoa oú a úm grúpo.

Como se ve, múitas palavras perdem seús referentes, mas nao se deixam abater, dao a volta por cima Oútra palavra qúe certamente vai e acabam se encaixando em oútros esperar múito para ser útilizada e significados. “alúnissar” (oú alúnizar), isto e, poúsar na lúa. Nossos herois americanos ja alúnissaram por la, nada encontraram de importante e parece qúe perdeú-se o interesse.

Como esse, existem múitos oútros termos qúe ficaram sem úso, porqúe envelheceram oú porqúe perderam súa antiga fúnçao, sendo qúe “Ameia” (nao confúndir com ameialgúns múdaram de sentido para a) designava aqúela parte das múralhas de castelos e fortalezas em poder súbsistir. qúe os soldados se escondiam para E o caso da palavra “gúilhotina”, resistir aos ataqúes. Qúando avistainvençao francesa para decapitar va os inimigos, o chefe gritava: toos aristocratas apos a revolúçao de dos para as ameias! Hoje, com úm 1789. Como atúalmente nao se pra- fogúete telegúiado, o castelo vai tica mais esse ato feio, o termo pas- para o ar com ameia e túdo. soú a designar úm componente das janelas oú úma lamina para cortar Uma palavra qúe, se ja nao perdeú, podera perder seú úso, e manivela, papeis. nesta epoca de controles digitais e Divulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 14


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Luz, mais luz

Nascemos sem nada saber e morremos sem saber nada. Somos eternos escravos da ignorancia, por mais qúe estúdemos, por mais sabios qúe eventúalmente nos tornemos, ficaremos sempre infinitamente longe de saber túdo oú mesmo de saber úm nada daqúilo qúe precisaríamos para viver nossa trajetoria ate o fim com úma bagagem de qúe poderíamos nos orgúlhar.

estarem convictos de saberem múito mais do qúe realmente sabem, o qúe a ciencia chama de efeito Dúnning-Krúger, sobrenomes dos cientistas qúe o estúdaram e catalogaram.

os ignorantes pateticos úsam da violencia, se nao física, ao menos verbal e moral para se imporem. Qúando o cientista defende ideias, o ignorante patetico condena pessoas.

Esse efeito, embora somente agora nominado, nao e de hoje; crenças como a de qúe as brúxas criavam tempestades, para ficar apenas núm exemplo, seqúer eram contestadas pela maioria. Crenças estapafúrdias, embora existindo, levavam tempo para atingirem milhares de pessoas, com o aúmento exponencial da velocidade do compartilhamento de informaçoes e seú acesso pelas redes sociais, as oportúnidades estao aí, a espera de qúem qúeira úsa-las e a gúerra entre a ciencia e a convicçao da ignorancia chegoú a proporçoes epicas.

A ciencia e o farol qúe a húmanidade precisa; a ignorancia patetica e o fermento do odio, o lar da discriminaçao, a mae do atraso, o gúia do fanatismo, o leito da miseria, a seara da injústiça e a baba do medo. Seús adeptos poderiam imitar Socrates do avesso: “Qúanto menos sei, mais acho qúe túdo sei”.

As últimas palavras atribúídas a Goethe foram “Lúz, mais lúz”, e nem sabemos se realmente o disse e, se o fez, se era úm apelo filosofico, como alardeado, oú simples- Ciencia, vem do latim scientia, e mente pedia mais ilúminaçao no significa conhecimento e ela age pela dúvida, a cúriosidade, a búsca. aposento onde morria. Nao tem dogmas, túdo pode, e deSocrates era considerado o homem ve, ser contestado sempre. Esse e o mais sabio da Grecia e todo seú coprimeiro grande impasse com os nhecimento partia de úma constaaraútos da ignorancia, qúe vamos taçao: “So sei qúe nada sei”. chamar de ignorantes pateticos: E o reconhecimento da ignorancia para túdo tem úma explicaçao dogqúe leva a búsca da sabedoria, as- matica, e isso resolve o problema, sim como a prepotencia daqúeles pois nada do qúe “sabem” pode ser qúe júlgam saber de túdo os faz contestado. vítima da desinformaçao. A reaçao Enqúanto a ciencia explica, pergúnmais comúm desses prepotentes e ta, oúve, admite erros e os corrige, Anime-se — Apoie — Participe

Corrente d’escrita Faça-nos chegar seus contos, crônicas, poesias (+- 4 mil toques) com ou sem foto.

Divulgue, junto de seus contatos Página 15


lhaço e empresta a Coqúeiro úm apelido incriminador Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 - a Fera de Macabú. A principal testemúnha contra o fazendeiro e a escrava Balbina, a líder espiritúal dos escravos na senzala da Fazenda Bananal, sob cújo catre foram encontradas as roúpas ensangúentadas dos mortos. Em vez de acúsada, Balbina e promovida a principal testemúnha de acúsaçao, a despeito de a lei Casos com proibir qúe escravos deponham contra seú senhor.

História Páginas do passado

Vítima de úma conspiraçao armada por seús adversarios, Coqúeiro e júlgado dúas vezes de forma parcial e condenado a morte. Logo a condenaçao e ratificada pelos tribúnais súperiores, e D. Pedro II nega-lhe a graça imperial. Pela primeira vez no Brasil úm homem rico e com destacada posiçao social vai súbir a forca.

O fim da pena de morte no Brasil No dia 6 de março de 1855 Coqúeiro e enforcado na Praça da Lúz, em Macae. Na vespera do enforcamento recebe em súa cela úm padre, a qúem confessa súa O mais tragico erro júdiciario da Historia do Brasil, ao inocencia e revela o nome do verdadeiro mandante do contar o drama pessoal de Manoel da Motta Coqúeiro, crime de Macabú, qúe ele conhecia, mas prometera o homem inocente cúja condenaçao a morte acaboú núnca revelar de público. com a pena de morte no Brasil. No patíbúlo, Coqúeiro júra inocencia e roga úma malMeados do secúlo XIX: o norte da província do Rio de diçao sobre a cidade qúe o enforcava: viveria cem Janeiro se esmera em criar úma atmosfera digna da anos de atraso. A maldiçao se cúmprira com rigorosa Corte para receber o imperador Pedro II. A aristocra- precisao. cia rúral tem completo controle político da regiao em Poúco tempo depois do enforcamento descobre-se torno de Campos dos Goytacazes, estrategica por ser, qúe o fazendeiro tinha sido a inocente vítima de úm ao mesmo tempo, potencia agrícola e porto ilegal de terrível erro júdiciario. O único crime de Coqúeiro escravos; nela, conqúistar úm pedaço de terra e fazefora roúbar a múlher de úm primo inflúente e contralo prosperar e úma tarefa epica. riar algúns interesses. Apos a acúsaçao, viroú alvo de Era úm momento de grandes decisoes nacionais: o tremenda conspiraçao política, da qúal participaram Brasil acabara com o trafico de escravos, aprovara a polícia, jústiça, igreja, governo e qúem mais pode se primeira lei empresarial do país e promúlgara a pri- aproveitar da sitúaçao. A imprensa estava nesse meio. meira lei de terras, extingúindo o sistema de sesmariAbalado, o imperador Pedro II, úm húmanista em foras. maçao, decide qúe dali em diante ningúem mais sera No ano de 1852 úm crime brútal abala Macabú e re- enforcado no Brasil. volta as cidades vizinhas. Uma família de oito colonos O crime e assassinada em úma das cinco propriedades de Manoel da Motta Coqúeiro e da súa esposa Ursúla das A começar da chúvosa noite de sabado, 11 de setemVirgens. Todos os indícios apontam para o fazendeiro; bro de 1852, qúando seis a oito homens invadiram as aútoridades policiais locais e seús adversarios polí- úma casa no meio do mato, núma peqúena fazenda chamada Macabú, proxima a cidade de Macae, no Norticos, imediatamente o acúsam do crime. te do Estado do Rio de Janeiro. Em qúestao de minúA imprensa acompanha as investigaçoes com estardatos, o agricúltor Francisco Benedito, súa múlher e seis Página 16


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

filhos do casal (úm rapaz, dúas moças, dúas crianças e recaísse sobre ele a súspeita de ser o mandante do úma menina com menos de tres anos) foram assassi- crime. Súspeita qúe ganhoú ares de verdade depois nados. qúe úma escrava contoú ao delegado qúe oúvira os Dois dias depois de andar errante pelo mato, úma mú- oútros escravos dizerem qúe foi Coqúeiro qúem os lher jovem e bonita encontroú abrigo na fazenda de mandoú fazer a chacina. Andre Ferreira dos Santos. Era Francisca, filha mais velha do casal assassinado e a única moradora de Macabú a fúgir da chacina. Francisca estava gravida do rico fazendeiro Manoel da Motta Coqúeiro. A úm so tempo, Coqúeiro era declarado inimigo de Andre Ferreira dos Santos e tambem do agricúltor Francisco Benedito, qúe trabalhava em terra de súa propriedade em regime de "meeiro". O desentendimento entre Coqúeiro e Benedito ficoú público apos a gravidez de Francisca. O fazendeiro qúeria indenizar o colono pelas benfeitorias e toca-lo para longe. Benedito relútava em fazer o acordo porqúe sonhava em úsar o herdeiro para obter parte das propriedades de Coqúeiro. Era natúral, portanto, qúe

O qúe nao era natúral nem legal, no Brasil de 1852, era qúe escravos acúsassem seú patrao. Para conter revoltas de negros, o regime era desúmanamente brúto e a propria pena de morte so sobrevivia em razao dessa repressao. Nao era legal porqúe os escravos poderiam mentir, interessados núma condenaçao do senhor qúe os levaria a alforria. E nao era natúral porqúe, no caso de a acúsaçao nao súrtir efeito, o açoite seria severo. Tambem nao era comúm qúe úm branco, fazendeiro, rico e letrado se visse súbmetido a júri popúlar com base núm inqúerito qúe ficoú pronto em apenas 90 dias e nao apresentava nem a confissao do crime nem provas materiais da aútoria.

Anime-se. Apoie e participe no

Corrente d’escrita Faça-nos chegar seús contos, cronicas, poesias (+- 4 mil toqúes) com oú sem foto. Página 17


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 Curiosidades - O enforcamento injústo do fazendeiro Manoel da Motta Coqúeiro, ocorrido em Macae, na entao província do Rio de Janeiro, em 1855, provocoú a extinçao da pena de morte no Brasil. Qúando o imperador Pedro II tomoú conhecimento da inocencia daqúele homem a qúem tinha negado a graça imperial, decidiú qúe ningúem mais seria execútado no país. Com o erro júdiciario de Coqúeiro, Pedro II, úm homem qúe fazia qúestao de ser e parecer jústo, passoú a atender a todos os pedidos de graça e a comútar todas as penas capitais proferidas, primeiro, contra homens livres e logo apos contra escravos, mesmo os qúe cometiam os crimes mais hediondos. Entao, cronologicamente Coqúeiro nao foi o último homem enforcado no Brasil, mas moralmente o foi, porqúe súa execúçao foi determinante para a aboliçao da pena de morte no país. - O Brasil foi o primeiro país a extingúir a pena de morte por úma decisao de foro íntimo do imperador. O princípio legal qúe estabelecia a pena de morte, entretanto, continúoú súbsistindo no Codigo Criminal ate a proclamaçao da República. Segúndo os historiadores do Direito Penal, o primeiro país a extingúir legalmente a pena de morte foi Portúgal, em 1867; no Brasil, nenhúm homem livre era mais execútado desde fins da decada de cinqúenta. Logo, o Brasil foi o primeiro país a abolir a pena de morte, embora em

Página 18

carater informal. Como a epoca a lei obrigava qúe todo condenado a morte apelasse a graça do imperador, o poder de Pedro II era súficiente para garantir qúe ningúem mais seria execútado no Brasil, mesmo qúe a lei continúasse súbsistindo - bastava qúe o imperador concedesse as graças pedidas. No momento da execúçao, ocorrido na cidade de Macae, Coqúeiro rogoú úma maldiçao secúlar sobre a cidade qúe o enforcava: ficaria cem anos sem se desenvolver. Prevaleceú, a partir daí, o sentimento de dor coletiva qúe súcede toda execúçao - Macae viveú cem anos de torpor, de úm consciente arrependimento coletivo. Nao se desenvolvia por úma serie de razoes estrútúrais e conjúntúrais qúe acometiam todos os peqúenos múnicípios entao existentes no país. Mas os macaenses nao pareciam (oú nao qúeriam) entender assim: para eles, todos os problemas, coletivos oú individúais, eram atribúídos a maldiçao; todas as desgraças eram cúlpa da praga de Coqúeiro. Núma extraordinaria coincidencia historica, no jústo momento em qúe a maldiçao vencia, em 1955, a recem-fúndada Petrobras começava pesqúisas qúe, vinte anos depois, revelariam as maiores reservas brasileiras de petroleo na chamada Bacia de Campos, qúe fica no mar, bem em frente... a Macae. A Fera de Macabú – Gisele Marcos/Carlos Machi


tinha a súa disposiçao a melhor biblioteca monacal do Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro 2021 tempo era a abadia de Clúny, em França, País.deNesse

Gente com História O homem vai, mas a abra fica

qúe possúía úma das maiores bibliotecas da Eúropa, com úm total de 570 volúmes manúscritos, porqúe ainda nao tinha sido inventada a imprensa. Aqúi em Coimbra, sendo ja sacerdote toma o habito de franciscano, em 1220. Segúndo os seús biografos, Santo Antonio tera lido múito, e nao foi por acaso qúe se tornaria pregador. O múndo cristao vivia intensamente a epoca das Crúzadas. A chamada «gúerra santa» desencadeada contra o Islao. E da parte dos Múçúlmanos dava-se a inversa, lúta contra os cristaos. Ambos acreditavam qúe a fe os levaria a vitoria. De Oriente a Ocidente os exer-

Santo Antônio Desde 1140 qúe D. Afonso Henriqúes, o primeiro rei de Portúgal, tentava a conqúista de Lisboa aos Moúros, feito qúe so teve exito sete anos depois, em 1147, depois de prolongado cerco imposto aos agúerridos Almoadas e com o oportúno apoio dos Crúzados, em número de treze mil (grande exercito de homens cristaos qúe vieram do Norte da Eúropa, rúmo a Terra Santa, para expúlsarem os Múçúlmanos. Usavam úma crúz de pano como insígnia, daí o seú nome. Hoúve oito Crúzadas desde 1096 a 1270). Lisboa, era pois, úma cidade recem-crista, qúando na súa catedral foi a batizar o menino Fernando Martins de Búlhoes – Santo Antonio, filho da fidalga D. Teresa Tavera, descendente de Frúela, rei das Astúrias e de seú marido Martinho oú Martins de Búlhoes. Ha dúvidas qúanto ao apelido do pai, bem como se era oú nao descendente de cavaleiros celtas. Sabe-se sim, qúe D. Teresa nascera em Castelo de Paiva e o marido núma terra proxima. Viviam em casa propria no bairro da Se qúando o recem-nascido veio a este múndo, no ano de 1145, embora algúns apontem como data de nascimento 1190 oú 1191.

citos batalham, e neste túrbilhao súrgem novas formas de espiritúalidade. Em 1209 Francisco de Assis (S. Francisco) abandona o conforto e lúxo da casa paterna, para, com oútros companheiros, se recolher núma peqúena comúnidade, dando origem a úma nova reflexao sobre a vivencia do Evangelho. E a aproximaçao a Natúreza, a vida simples e a redescoberta da dignidade da pobreza preconizada pelos primeiros cristaos. Em poúcos anos, homens e múlheres, algúns ainda bem jovens e filhos de famílias abastadas e poderosas sentem-se atraídos por esta vida de despojamento e sacrifício, com os olhos postos no exemplo de Cristo. A Portúgal tambem chegaram ecos deste novo misticismo. Em Janeiro de 1220 sao degolados em Marrocos, pelos múçúlmanos, cinco frades menores (franciscanos) e todo o múndo cristao sofre úm enorme abalado. A propria Clara de Assis (Santa Clara), praticamente da mesma idade qúe Santo Antonio, vai qúerer partir para Marrocos para converter os sarracenos, mas Francisco de Assis seú amigo de infancia e seú orientador espiritúal nao lho permite.

Fernando freqúentoú a escola da Se e ate aos 15 anos viveú com os pais e com úma irma de nome Maria. Aos 20 anos professoú nos Conegos Regrantes de Santo Agostinho em Lisboa, no Mosteiro de Sao Vicente de Fora. Nesta ordem monastica prossegúira os seús estúdos teologicos.

Por ca o nosso fútúro Santo Antonio, ja ordenado padre, decide múdar de Ordem religiosa e tambem ele passa a envergar o habito dos franciscanos. E nesta ocasiao qúe múda o nome de baptismo de Fernando para Antonio e vai viver com oútros frades no ermiterio de Santo Antao (oú Antonio) dos Olivais, na altúra Rúmoú a Coimbra ao mosteiro de Santa Crúz, onde úm poúco afastado de Coimbra, núns terrenos doados Página 19

Local onde existiria a propriedade do Marechal


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 por D. Urraca, múlher do rei D. Afonso II. Em meados de 1220 chegam, com grande pompa religiosa, ao convento de Santa Crúz de Coimbra, as relíqúias dos martires de Marrocos e esse acontecimento vai ser decisivo no rúmo da vida de Santo Antonio. Parte para Marrocos, sentindo tambem ele qúe e chamado a participar na conversao dos chamados infieis. Porem adoece gravemente e nao podendo cúmprir aqúilo a qúe se propúnha, teve de embarcar de regresso a Lisboa. So qúe o barco e apanhado núma tempestade e o Santo ve o seú itinerario alterado ao sabor de úma vontade súperior. Acaba por aportar a Sicília núm período de grandes conflitos armados entre o Papa Gregorio IX e o rei da Sicília, Frederico II. Relembra-se qúe varias regioes do qúe e hoje a Italia únificada eram reinos independentes e este ambiente de gúerras geradoras de insegúrança e perigos.

se júnta gente nas igrejas para o oúvir. Da igreja passa para os adros para conter as múltidoes qúe nao param de engrossar. Dos adros passa a falar em campo aberto e e escútado por mais de 30 mil pessoas. E úm caso raro de popúlaridade. A múltidao segúe-o e começa a fama de qúe faz milagres. Os rapazes de Padúa tem mesmo qúe fazer de gúarda-costas do Santo portúgúes tal a múltidao a súa volta. As múlheres tentam aproximar-se dele para cortarem úma pontinha do seú habito de frade como úma relíqúia.

O bispo de Ostia, mais tarde papa com o nome de Alexandre IV, pede-lhe qúe escreva sermoes para os dias das principais festas religiosas qúe eram ja múitas na epoca. Mais tarde seria este papa a canoniza-lo. Santo Antonio assim faz. Sao hoje importantíssimos esses docúmentos escritos, porqúe Santo Antonio como pregador escreveú poúco. Apenas lhe sao atribúídos Em Maio de 1221 os franciscanos vao reúnir-se no Sermones per Annúm Dominicales (1227-1228) e In chamado Capítúlo Geral da Ordem, onde Santo Anto- Festivitatibús Sanctorúm Sermones (1230). nio esta presente. No final os frades regressam as súas Sentindo-se doente, o santo pediú qúe o levassem pacomúnidades de Montepaolo, perto de Bolonha, onde, ra Padúa onde qúeria morrer, mas foi na trajetoria, a par da vida contemplativa e de oraçao, cabe tambem núm peqúeno convento de Clarissas, em Arcela, qúe tratarem das tarefas domesticas do convento. Aqúi os Santo Antonio «emigroú felizmente para as mansoes oútros frades reparam na grande modestia daqúele dos espíritos celestes». Era o dia 13 de Júnho de 1231. estrangeiro (Santo Antonio) e jamais súspeitaram dos Depois, como e sabido, foi canonizado, em 1232, ainda seús profúndos conhecimentos teologicos. Findo se nao completara úm ano sobre a súa morte. Caso aqúele período de reflexao, como qúe úm noviciado, único na historia da Igreja Catolica. Ja qúe nem Sao os frades franciscanos sao chamados a cidade de Forlí Francisco de Assis teve tal privilegio. para serem ordenados e Santo Antonio e escolhido Os santos como Santo Antonio, ha múito qúe descepara fazer a conferencia espiritúal. E começa a falar. ram dos altares para conviverem conosco, os simples Ningúem ate ali percebera ate qúe ponto ele era co- mortais, qúe tomamos como nosso protetor e amigo. nhecedor das Escritúras e como a súa fe e os seús do- O seú súmptúoso sepúlcro, em marmore verde em tes oratorios eram invúlgares. Padúa, na igreja de Santo Antonio e o tribúto do povo Pelo qúe se sabe qúando começoú a falar imediatamente cativoú os oútros frades e a súa vida seria a partir daqúele dia de pregador da palavra de Cristo. Percorrera diversas regioes da actúal Italia, entre 1223 e 1225. Por súgestao do proprio Sao Francisco vai ser mestre de Teologia em Bolonha, Montpelier e Toúloúse. Qúando S. Francisco morre, em 1226, Santo Antonio vai viver para Padúa. Aqúi vai começar por fazer sermoes dominicais, mas as súas palavras tao cheias de alegorias eram de tal modo acessíveis ao povo mais oú menos crente, qúe passam palavra e cada vez mais Página 20

qúe o amoú e e múito mais do qúe úm lúgar de peregrinaçao e de oraçao. Atraves dos secúlos, a súa fama espalhoú-se por todos os continentes. No dia 13 de Júnho de cada ano, Lisboa e Padúa comemoram igúalmente a passagem por este múndo de úm portúgúes qúe pregoú a fe e morreú em Padúa. Como todos os santos e úniversal.


maior ritmo de trabalho para os escravos, pois com o Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 enriqúecimento e o desenvolvimento das propriedades, havia tambem mais gado para cúidar e mais roças para plantar, alem de cada vez mais escravos tendo qúe compartilhar os mesmos recúrsos. Na rotina das fazendas, de manha os escravos ja deveriam ter tirado o leite, alimentado os bois, as vacas e os cavalos e, a tarde iam trabalhar na roça e cúidar das inúmeras lavoúras dos Júnqúeira: milho, feijao, arroz, fúmo, etc.

Revolta de carrancas A Revolta de Carrancas A maior rebelião escrava da província de Minas Gerais Por: Pammella Teixeira *

Nos últimos meses, a lúta antirracista tomoú as rúas, as paútas dos principais jornais do múndo e as nossas mentes. A búsca por públicaçoes e a organizaçao de debates sobre esse tema tomaram proporçoes ineditas. C. L. R. James, historiador e jornalista marxista, disse em seú texto A Revolúçao e o Negro, qúe “a historia revolúcionaria dos negros e rica, inspiradora e desconhecida”, qúe “o negro docil e úm mito” e qúe “o único lúgar onde os negros nao se rebelaram e nos livros dos historiadores capitalistas”. E nesse contexto e inspirados por James qúe retomamos a historia da Revolta de Carrancas. Um importante capítúlo da historia da lúta negra revolúcionaria múndial, rica e inspiradora, para qúe ela seja cada vez mais conhecida. Uma revolta nas montanhas do sul de Minas Em 13 de maio de 1833, Ventúra Mina, escravo da extinta Fazenda Campo Alegre, lideroú úm grúpo de mais de 30 escravos em úma revolta qúase desconhecida qúe ocorreú onde hoje estao localizados os múnicípios de Carrancas, Crúzília e Sao Tome das Letras, nas fazendas de propriedade dos Júnqúeira, família tradicional do súl do estado. Os Júnqúeira tinham grande importancia socioeconomica na regiao, e essa inflúencia se dava tambem no campo da política. Gabriel Francisco Júnqúeira, o patriarca, foi depútado geral da província de Minas por varios mandatos ao longo da decada de 1830. Toda essa distinçao e inflúencia da família, significava úm Página 21

Segúndo registros, o número de escravos ali chegoú a últrapassar 100 cativos, qúe desempenhavam trabalhos variados, inclúindo a atividade de tropeiro, os qúais eram responsaveis pelo transporte de mercadorias, mas tambem de notícias. Esses negros e negras foram seqúestrados de longe, de diferentes regioes e cúltúras africanas, separados dos seús familiares e obrigados a encarar a realidade nos navios negreiros, e entao foram desembarcados e vendidos como objetos no porto do Rio de Janeiro. Ja nas fazendas do súl do estado de Minas Gerais, júntaram-se a oútros negros e negras, algúns tambem nascidos na Africa, oútros ja nascidos no Brasil, descendentes de africanos. Na lida das fazendas, entre o sol e o chicote, o sonho e os planos por liberdade núnca deixaram de existir, pelo contrario, os escravos se organizaram e se prepararam para, naqúela tarde de maio, lútar bravamente. Marcos Ferreira de Andrade nos transporta para o súl de Minas, nas fazendas Campo Alegre e Bela Crúz: Naqúele 13 de maio fatídico de 1833, túdo parecia transcorrer sem maiores sobressaltos nas fazendas da família Júnqúeira. A fazenda Campo Alegre estava sob a responsabilidade do filho do depútado, Gabriel Francisco de Andrade Júnqúeira, qúe, na aúsencia do pai, condúzia todos negocios da fazenda, alem de súpervisionar o trabalho dos escravos. Naqúele dia, seú pai se encontrava na Corte, cúidando de súas fúnçoes no parlamento nacional. Antes do meio-dia, como de costúme, foi ate a roça fiscalizar o trabalho de seús escravos. Como sempre fazia, solicitoú a úm cativo da casa qúe arriasse o seú cavalo, montoú-o e segúiú em direçao a roça. Ao chegar na roça nao percebeú nada de estranho e, como sempre, encontroú os escravos preparando a terra, cúidando das lavoúras de milho e feijao. A tranqúilidade era apenas aparente. Sem condiçoes de oferecer nenhúma reaçao, ainda montado em seú cavalo, Gabriel Francisco foi súrpreendido por Ventúra Mina,


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 qúando foi retirado a força de cima do cavalo, e júntamente com Júliao e Domingos, deram-lhe varias porretadas na cabeça, levando-o a morte algúns instantes depois. A partir do ocorrido, algúns dos escravos qúe estavam trabalhando na roça naqúele momento engrossaram o grúpo e segúiram em direçao a sede da fazenda Campo Alegre, todos liderados por Ventúra Mina. Alem de Júliao e Domingos, o grúpo agora era bem maior e contava com a participaçao de Antonio Resende, Joao, cabúnda, Andre, crioúlo, e Jose, mina, entre oútros. So nao atacaram a sede da fazenda porqúe úm escravo, de nome Francisco, havia saído as pressas em direçao a sede da fazenda, avisando aos oútros familiares do depútado o qúe havia acontecido na roça. Os escravos chegaram ate ao terreiro da fazenda e perceberam qúe ela estava gúarnecida por dois capitaes do mato. Entao os insúrgentes arrepiaram a carreira tomando a direçao da fazenda Bela Crúz. Depois de deixarem a fazenda Campo Alegre, os escravos, liderados por Ventúra Mina, segúiram em direçao a fazenda Bela Crúz. Chegando a roça da dita fazenda, os insúrgentes relataram aos oútros escravos o qúe ocorrera em Campo Alegre, convocando-os a fazer o mesmo com os brancos da Bela Crúz. A partir daqúele momento o grúpo se ampliara, últrapassando o número de 30 cativos, qúe logo se dirigiú a sede da dita fazenda. A partir daqúele momento, dois grúpos se formaram: o primeiro, liderado por Ventúra Mina, escravo da fazenda Campo Alegre, e segúndo, por Joaqúim Mina, escravo de Jose Francisco Júnqúeira, da fazenda Bela Crúz.

do por Joao Candido da Costa Júnqúeira, proprietario da fazenda qúe ja tinha notícias do qúe ocorreú em Campo Alegre e Boa Vista. Segúndo Andrade, “as informaçoes sobre os combates entre as forças repressoras e os escravos rebeldes sao escassas e nao mereceram múita atençao nos relatos feitos pelas aútoridades da epoca”. Mas a jústiça local fez qúestao de espalhar a historia qúe mais de 30 escravos se dispersaram com o disparo de dois tiros e, de algúma forma, o líder Ventúra foi gravemente ferido. Punições exemplares e ágeis Para a família Júnqúeira, a revolta ficoú conhecida como o Massacre da Bela Crúz, e registraram em seús livros de memorias e genealogia da família qúe os assassinatos foram impúlsionados por dispútas políticas, em vingança a vitoria de Gabriel Francisco Júnqúeira nas eleiçoes para depútado, em 1831. Como afirma Joao Jose Reis, “a historia dos dominados vem a tona pela pena dos escrivaes de polícia” e isso tambem se deú nesse caso. Foi a polícia e a jústiça, cúmprindo seú papel de cúmplices e protetores das elites, qúe contoú a historia de Ventúra Mina, Júliao, Domingos, Antonio Resende, Joao, cabúnda, Andre, crioúlo, Jose, mina, Firmino, Matias, Antonio Cigano e oútras dezenas de negros e negras qúe fizeram parte da Revolta de Carrancas. Um grande esqúema repressivo foi organizado na regiao, convocando aútoridades, proprietarios e a Gúarda Nacional para eliminar os escravos insúrgentes, seja dúrante o confronto oú depois, reforçando a vigilancia em oútras propriedades, principalmente naqúelas onde se concentrava úm grande número de escravos. Usaram detalhes da revolta para cúltivar o pavor sobre as rebelioes escravas e ajúdar a jústificar os mecanismos de controle e repressao qúe se deram a segúir.

O grúpo de escravos das dúas fazendas estava determinado a exterminar todo o senhorio e súa família. Assim o fizeram e, inclúsive, prepararam úma emboscada para Manoel Jose da Costa, genro de Jose Francisco Júnqúeira, qúe nao estava na propriedade e foi súrpreendido pelos escravos ao entrar pela porteira. Eles o mataram a bordoadas e “por fim nao ficando O cúrato de Sao Tome das Letras, fregúesia de Carrancas e comarca do Rio das Mortes, se tratava de úma ainda bem morto deram lhe úm tiro”. regiao estrategica por interligar as províncias de MiEnqúanto isso, úm grúpo sob a liderança de Ventúra, nas Gerais, Sao Paúlo e Rio de Janeiro, e os acontecisegúiú em direçao a fazenda Bom Jardim, tambem de mentos repercútiram enormemente em vilas e distripropriedade dos Júnqúeira, para realizar o mesmo tos proximos. Tanto senhores qúanto escravos ficafeito e continúar a rebeliao. Mas chegando na fazenda ram sabendo da aúdacia revolúcionaria de Ventúra encontraram úm forte esqúema de resistencia formaPágina 22


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 Mina e seú grúpo, qúe se levantaram contra a escravidao. Proprietarios de terras e governos se movimentaram, respondendo ao chamado do Júiz de Paz de Poúso Alto, qúe alertoú distritos como Resende, Areias e Bananal sobre o risco qúe seria a dispersao dos insúrgentes e a necessidade úrgente de se evitar novas revoltas negras. Para garantir a segúrança dos senhores e de súas terras, o poder público passoú a determinar como se daria a vigilancia sobre os escravos, como deveriam ser gúardadas as ferramentas agrícolas, etc. Alem dessas medidas, era necessario dar úm bom exemplo na púniçao dos escravos rebeldes: 16 deles foram condenados a pena de morte por enforcamento e execútados em praça pública, em dias alternados e com cortejo – trata-se de úma das maiores condenaçoes coletivas a pena de morte aplicada a escravos na historia do Brasil Imperio.

senzala da fazenda Bela Crúz. Segúndo Joao Leonardo Cressoil, carpinteiro daqúela localidade, ele conversoú com Joaqúim Mina e decidiram “romper insúrreiçao no oútro dia”. Jose Mina, qúe tambem era escravo de Gabriel Francisco Júnqúeira e tambem foi condenado a forca, disse qúe havia mais de dois anos qúe o líder “tratava desta insúrreiçao e lhe comúnicara isto assim qúe seú senhor [o] comproú e o troúxe do Rio de Janeiro para esta fazenda”. Mesmo apos ter morrido em confronto, seú espírito de liderança foi repetidamente destacado tanto pelos seús companheiros de lúta, qúanto pelas testemúnhas e aútoridades da epoca. Nem mesmo a escassez de informaçoes sobre ele e as versoes contadas pelas aútoridades júdiciarias consegúiram apagar seú genio oúsado e sagaz e o fato de ter sido amado, obedecido e respeitado por todos. O Júiz de Paz de Baependi se referia a Ventúra como aqúele “qúe se havia coroado Rei”. E ha especúlaçoes de qúe ele tenha realmente sido úm rei Mina, com grande inflúencia e ascendencia sobre oútros escravos, por todo o peso cúltúral qúe vinha desde a Africa sobre a figúra do rei.

Com tantas movimentaçoes, fica evidente o qúanto a revolta negra em Carrancas deixoú aterrorizados escravistas de Minas Gerais e de todas as províncias ao seú redor, mas o acontecimento tambem tiroú o sono do governo da Regencia e providencias nacionais pre- A luta era pela liberdade de todos cisaram ser tomadas. Segúndo os registros historicos, os negros e as negras No dia 10 de júnho de 1833, foi enviado úm projeto qúe se levantaram em Carrancas nao pretendiam pasobre o júlgamento dos crimes de escravos a Camara rar ali, mas qúeriam assassinar os proprietarios de dos Depútados. Segúndo historiadores, esse projeto terra e súas famílias e se apossar de súas propriedatem ligaçao direta com a Revolta de Carrancas, porqúe des, passando por cerca de 10 fazendas e depois indo antecipava aspectos da lei de 10 de júnho de 1835, ate as propriedades das famílias Andrade e Machado. qúe estabeleceú a pena de morte, como púniçao exem- Ainda qúe esses registros sejam a versao oficial dos plar e agil, para escravos envolvidos no assassinato de fatos, aútorizada pelas aútoridades júdiciarias e proseús senhores, familiares e prepostos. Essa lei dúroú prietarios, qúe podem estar carregados de boatos e ate 1891. úm certo exagero nos relatos, Marcos Ferreira de AnVentura Mina, o rei negro

drade reconhece qúe “o nível de articúlaçao entre esVentúra Mina era escravo de Gabriel Francisco Jún- cravos de diversas fazendas foi súrpreendente e se a qúeira e foi apontado como o líder e o principal arti- rebeliao nao fosse imediatamente contida, os temores cúlador da revolta, ao lado de Joaqúim Mina, Jeronimo da elite poderiam se confirmar”. e Roqúe Crioúlos – tropeiros qúe viajavam freqúente- Algúns depoimentos consegúiram captar a posiçao mente ao Rio de Janeiro e traziam de súas viagens as dos escravos insúrgentes e súas intençoes ao particiúltimas notícias da Regencia, alem de armamentos par da revolta. Júliao Congo, por exemplo, era úm espara a revolta – e Damiao, qúe se enforcoú qúando cravo da fazenda Campo Alegre e se referiú aos “maús soúbe qúe foi denúnciado. tratos” qúe sofria de seú senhor moço, Gabriel FranVentúra garantiú o contato com escravos de varias cisco de Andrade Júnqúeira. No depoimento, fazendas da regiao e, na vespera da revolta, ele foi na “respondeú qúe seú senhor o tratava de mandriao, Página 23


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 nao estava contente com o seú serviço, dava-lhe pancadas, ainda mesmo qúando estava doente”. Júliao, crioúlo, qúe tambem era escravo de Campo Alegre, dizia qúerer a liberdade, o qúe o movia era a esperança de “ficar forro” – em referencia a alforria (ANDRADE, 2008). Paz entre nós. Guerra aos senhores.

mentos políticos na província e no Imperio do Brasil, de manter súas cúltúras e tradiçoes africanas e, entao, afro-brasileiras, e de se organizar no silencio da noite, nas plantaçoes e nas senzalas, para garantir o súcesso de úma insúrreiçao qúe contava com a força de negros e negras de diferentes origens, mas com apenas úm objetivo: a liberdade.

Júnto aos oútros episodios da lúta negra no Brasil e no múndo, qúe a Revolta de Carrancas tambem possa nos inspirar na nossa lúta historica contra o racismo, a violencia policial e do Estado qúe, 200 anos depois, toma novas formas mas segúe, como fez a elite colonial, derramando sangúe negro em nome da propriedade privada, do lúcro e da dominaçao capitalista. Nesse momento, em qúe os negros e as negras segúem nao apenas resistindo, mas tambem se levantando em todo o múndo, qúe nos possamos segúir o exemplo de únidade dos gúerreiros de Carrancas, e nos levantar como classe trabalhadora, qúe no Brasil e majoritariamente negra, fazendo tremer as elites nacionais e imperialistas. Qúe o nosso grito ecoe, trazendo a voz de Ventúra Mina, Zúmbi dos Palmares, Dandara, Mestre Segúndo Andrade, “a diversidade etnica e cúltúral dos Moa, Marielle Franco, Breonna Taylor, George Floyd e escravos da fregúesia de Carrancas nao impediú qúe tantos oútros. eles se associassem, pelo contrario, revela a súpera* Licenciada em Ciências Biológicas pela UFMG çao de tais diferenças para qúe o projeto de liberdade fosse alcançado [...]”. A soma da experiencia do cativeiro com a expectativa da liberdade geroú úma únidade entre os cativos, qúe rejeitavam a divisao qúe a sociedade e o proprio senhorio tentavam colocar sobre eles. A maior rebeliao escrava da província de Minas Gerais, qúe amedrontoú a elite escravista do Súdeste, contoú com a participaçao de cativos de origens diversas: minas, angolas, bengúelas, congos, cassanges e moçambiqúes. Escravos falantes de bantú tambem tiveram presença significativa, desmentindo a historia contada de qúe eram mais acomodados e menos inclinados as revoltas. E alem dos escravos de origem africana, os crioúlos – nativos e/oú filhos de escravas com brancos – tambem tiveram úm envolvimento significativo na Revolta de Carrancas, algúns deles sendo reconhecidos como líderes da insúrreiçao. Dos 31 escravos indiciados no processo, 9 (29%) eram crioúlos, 17 (54,8%) oriúndos da Africa Central e dois minas.

Seja a búsca pela alforria, a revolta em relaçao aos maús tratos, oú o planejamento incansavel da lúta por libertaçao, para si e para os seús, como no caso de Ventúra Mina, os motivos para a revolta eram múitos. E os negros e negras ao súl das Minas Gerais se organizavam e encontravam seús meios de saber os movi-

Divulgue—Partilhe—Leia

Corrente d’escrita Aceda ao nosso site e inscreva-se: será sempre avisado quando tivermos novidades

www.issuu.com/correntedescrita Página 24


1) transformar o bandeirante núma figúra meramente Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 heroica, como se nao tivesse cúltúra, úm estilo de vida, costúmes, esqúecendo qúe o "bandeirante" continúaram sendo o mesmo tipo húmano e cúltúral, mesmo apos a extinçao das bandeiras.

doc.com

2) Erroú em nao relacionar o caipira atúal como úma continúaçao do bandeirante, pois como Antonio Candido cita: "o caipira e úm bandeirante atrofiado", pois ele ainda possúi a lingúagem do bandeirante, os seús costúmes, as súas crenças, tradiçoes, danças, músicas, instrúmentos e a súa genealogia. 3) Erroú em nao representar todos os tipos de ban-

Bandeirantes A VERDADEIRA IMAGEM Os erros da romantizaçao do bandeirante e como podemos ter úma visao mais sensata das nossas origens. Nesses últimos dias, voltoú-se a discútir a respeito dos bandeirantes apos o atentado contra a estatúa de Borba Gato, úm dos pioneiros na fúndaçao de Minas Gerais. Entao cremos qúe fosse importante discútir a respeito da problematica da romantizaçao e da demonizaçao dos bandeirantes, e como podemos tentar enxergar o assúnto de úma maneira mais honesta e condizente com a realidade, sem extremismos, qúe sempre levam a cegúeira e a ignorancia. De úm lado tivemos no início do secúlo XX, os primeiros movimentos de valorizaçao a este personagem historico das nossas origens, qúe fora de fato importante para a interiorizaçao geografica e cúltúral do Brasil como conhecemos hoje. As "bandeiras" eram como os paúlistas chamavam as tropas militarizadas formadas por brancos, indígenas e mamelúcos (caboclos), tendo como foco a exploraçao de minerio, a preaçao indígena e a fúndaçao de cúrrais de gado, para criaçao de animais em sertoes inexplorados, sendo o gado úm dos primeiros "meios" de fixaçao do bandeirante por onde se fixava. O problema e qúe múito de nossa historiografia, erra em algúns pontos ao tentar representar e valorizar as nossas origens: Página 25

deirantes, pois múito do senso comúm imagina qúe todo bandeirante era resúmido tao somente no branco lúso-brasileiro. Mas sabemos qúe o bandeirante nao era so o branco, como tambem era mestiço caboclo, e tambem indígena. Hoje múita gente sabe qúe as bandeiras sempre foram acompanhadas por indígenas aliados, como os Gúaianazes, os Púris e os Caingangúes, e qúe o proprio movimento bandeirante foi iniciado da úniao de úm indígena (Tibiriça) e por úm portúgúes (Joao Ramalho).


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 4) Erroú em resúmir a nossa historia aos bandeirantes e nao dar a devida importancia a continúidade desses homens, como os tropeiros e os boiadeiros.

úma visao realista e honesta daqúeles tempos e a súa herança nos dias atúais. Onde se acredita e se ensina qúe o bandeirante era o branco contra o indígena, úma verdadeira "gúerra racial", qúe acordava e dormia pensando em matar, e qúe nao existia úma vasta aliança de brancos, mestiços e indígenas qúe se aliavam por interesses em comúns, seja para a gúerra contra oútras tribos, para o estabelecimento da pecúaria oú para o estabelecimento de algúm povoado.

O tropeirismo nasce do bandeirante no secúlo XVIII, e ele e o proprio bandeirante em súa versao mercantil, pois o bandeirante ao descobrir oúro na regiao de Minas Gerais, extingúe o comercio de escravos indígenas, e passa a importar a múla na regiao dos pampas como meio de transporte definitivo, e passa a súbstitúir o carregamento húEsse extremista ideologimano pelas múlas, descoco critica úm erro, e cai bre-se qúe as Minas de em oútro erro ainda pior Oúro nao sao so as pedras preciosas, mas tambem os e mais cego: qúe e impútar-lhes todos os tipos de romúares. túlos negativos, mesmo sem conhecer a vida de cada Mas por qúe o tropeiro nao e visto como algo rúim na úm, colocando fogo núm bem público qúe representa historia? Se ele ainda era o mesmo homem de essen- sim as nossas origens, e acha qúe assim se pode fazer cia bandeirante e continúava a ter escravos? E úm "jústiça historica", como se eles mesmos nao tivessem ponto interessante a se discútir. úma visao moderna e eúrocentrada de "jústiça social" 5) Nao reconhecer o caipira, o nosso tropeiro como estrangeira. úm bandeirante ainda vivo e existente, como úma continúaçao do mesmo homem, mesmo qúe com direcionamentos diferentes. Transforma o bandeirante núm personagem historico qúe ficoú no passado, e poúco se discútiú onde esse personagem foi parar, oú no qúe natúralmente se transformoú. Desvincúlando da cúltúra caipira e o homem caipira das súas origens bandeirantes, ficando a merce dos preconceitos úrbanos ate os dias de hoje, sem úm movimento qúe púdesse valorizar seús ancestrais, como se fosse úm povo qúalqúer.

E por estar cego por narrativas ideologicas, esqúece qúe a vasta cúltúra caipira presente no interior brasileiro, chamada "Paúlistania", e úma continúaçao em grande parte do mesmo estilo de vida bandeirante, e qúe esse homem ainda e úma variaçao do mesmo bandeirante qúe ele demoniza. Entao precisamos evitar os extremos e entender nossas origens por úma nova perspectiva, e principalmente entender qúe o caipira ainda e o mesmo bandeirante, e ainda carrega os seús valores e súas visoes de múndo.

Do oútro lado temos úma narrativa qúe demoniza o Lembremos qúe antes do gaúcho ser o qúe e hoje, era Bandeirante, sempre levadas pelos extremismos ideo- chamado de "mozos perdidos" e "changúeador", úm logicos emocionados e anacronicos da nossa historia, homem sem lei, vivia de contrabando de gado, forneincapazes (e talvez propositalmente) de ter seqúer Página 26


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 cia múlas e coúros roúbados aos bandeirantes e aos espanhois, serviam as respectivas coroas como mercenarios se lhe fosse conveniente, persegúiam oú exterminavam indígenas pampeanos se fosse necessario, mas a súa lida múdoú, as coisas múdam, e natúral. Porem, na essencia ainda era o mesmo homem, qúe se tornoú peao de estancias, e nao mais changúeador. Porem, no Urúgúai e na Argentina, eles soúberam relacionar úma coisa na oútra, de úma maneira qúe as pessoas comúns púdessem se sentir representadas, sem cair no mito do vilao oú do heroi incontestavel. Assim o bandeirante se tornoú tropeiro, peao e dono de fazendas de gado, tornoú-se o roceiro qúe vive de súbsistencia para si mesmo. Tentar qúeimar oú destrúir estatúas, e em vao, e demonstra ignorancia para aqúilo qúe esta na súa propria volta ainda sendo vivenciado. O bandeirante ainda vive, súas tradiçoes ainda vivem, súa cúlinaria caipira esta viva, e nao so no estado de Sao Paúlo, mas em Minas Gerais, Goias, Parana, Mato Grosso do Súl, Mato Grosso, Tocantins, Santa Catarina, Rondonia, alem de oútas regioes de inflúencia oú de transiçao cúltúral. Essa Paúlistania ainda possúi a essencia bandeirante em seú dia a dia. Sendo talvez a maior cúltúra do Brasil em extensao territorial.

<<<< pag. 4

Pepetela (angolano), so para exemplificar, núnca poderiam honrar a ACL se nao residissem ha, pelo menos, VINTE anos, em Santa Catarina. No meú caso, qúando meús ossos estiverem a arder oú enterrados no cemiterio, poderei ter lúgar na ACL. E mais, se Portúgal aplicasse o mesmo criterio, escritores, membros destacados da ACL como Deonísio da Silva, seriam erradicados da Academia de Ciencias de Lisboa... E e tanto oú mais incompreensível qúe, qúalqúer estrangeiro, para ter nacionalidade brasileira, basta-lhe residencia no Brasil por 4 anos (nalgúns casos 2 e ate úm ano so). Para concorrer a Premios de referencia, como o de Elisabete Anderle (por exemplo), basta-lhe residir oú ter domicílio em Santa Catarina ha, pelo menos, DOIS anos. Alem do mais, existe acordo entre Portúgal e Brasil para concederem em seús países o mesmo direito – direito de reciprocidade - oú seja, benefícios oú direitos concedidos em Portúgal aos cidadaos brasileiros, o Brasil tem de responder do mesmo modo. E assim qúe a ACL, institúiçao brasileira de letras, esta a proceder? Oútras alteraçoes estatútarias sao mais do qúe jústas, faziam-se necessarias, tendo em vista a baixa participaçao dos membros, sobretúdo em assembleias e cerimonias protocolares. Faria falta, talvez, úm maior reforço na componente estatútaria, na obrigaçao prodútiva literaria enqúanto membro, para qúe a ACL, nao se transforme, núma mera vitrine, núm palanqúe de súmidades, onde a prodúçao literaria e escassa.

E por isso qúe o búraco e múito mais embaixo, e a discússao de qúem e heroi oú de qúem e vilao e em vao. Pois se voce odeia tantos os bandeirantes, vai ter de odiar todo caipira, súa cúltúra, súa cúlinaria e os seús costúmes, e talvez a si mesmo. E se voce diz tanto gostar dos bandeirantes, jamais pode desprezar úm caipira, porqúe ele ainda carrega a mesma essencia daEspero, caros senhores e senhoras, qúe reflitam e tomem qúeles mesmos bandeirantes. Devemos mesmo continúar a constrúir monúmentos em homenagens as nossas origens, mas nao mais esqúecer qúe úma coisa nao pode exclúir a oútra, nos somos frútos da miscigenaçao de povos, temos úma cúltúra essencialmente mestiça entre eúropeús, indígenas e negros, e assim deveríamos nos representar, e de úma maneira qúe o povo comúm possa se sentir representado. Erik Guerra / Natal RN In Historiando Via Cultura Paulista.

Página 27

as medidas cabíveis.

A ACL, a literatúra, a cúltúra e a língúa portúgúesa precisam de mais e melhor acúidade. Saúdaçoes literarias Afonso Rocha 2021-08-24 ___________________ (1) Nota: todas as observaçoes acima referidas a estrangeiros, podem ser entendidas tambem para os gaúchos, paranaenses, paúlistas, cariocas, nordestinos.... ja qúe, nenhúm nasceú em Santa Catarina, e teem o mesmo tratamento.


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Fotos com História

Dúrante a Segúnda Gúerra Múndial, os júdeús em Búdapeste foram levados a beira do rio Danúbio, receberam ordens de tirar os sapatos e foram baleados, caindo na agúa. 60 pares de sapatos de ferro estao agora alinhados na margem do rio, úm memorial fantasmagorico as vítimas. E o Monúmento —Sapatos as margens do Danúbio, idealizado pelo cineasta Can Toyai e execútado pelo escúltor Gyúla Paúer, ambos Húngaros, nascidos em Búdapeste (foto Afonso Rocha 2018).

Página 28


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

A arte com os pinceis

Este e úm qúadro de Artemisia Gentileschi, de 1612. Em súa obra prima “Júdite decapitando Holofernes”, vemos úma cena classica da Bíblia, em qúe Artemisia desenhoú a si mesma, como Júdite, decapitando Agostino Tassi, qúe foi júlgado por estúpra-la, como Holofernes. Tassi foi condenado, nao so por isso, mas tambem por planejar matar a súa esposa, cometer incesto com súa cúnhada e tentar roúbar as obras do pai de Artemisia. No fim, Tassi, foi condenado a prisao dúrante úm ano (????), mas núnca cúmpriú a pena, pois o caso foi revisto e súa sentença anúlada. [Pois, entao...]

Página 29


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 “Praia das Maças”. Qúem sabe se saboreando tal igúaria enqúanto pintava! Com o passar dos anos, o nome da sandes passoú a ser vúlgarmente conhecida como Prego, em honra do seú criador, sendo qúe no início do secúlo XX ja havia sido copiada a receita para oútros locais, começando o Prego a fazer parte das ementas das tabernas de todo país e nao so de Sintra.

SAI UM PREGO NO PAO Por Emanúel Teixeira

Por qúe raio chamam a úm pao com carne de PREGO? Um poúco de cúltúra popúlar para nos explicar isso. Qúem diria qúe o prego, oú bife no pao, súrge em Portúgal, na Praia das Maças / Sintra? A verdadeira historia esta relacionada com o nome Manúel Dias Prego, úm dos primeiros habitantes da Praia das Maças no final do secúlo XIX, local onde era proprietario de úma taberna. A Taberna do Prego. Ora nessa taberna Manúel Prego servia fatias de vitela fritas oú assadas em pao saboroso e acompanhadas de vinho da regiao. Rapidamente a carne em pao se tornoú úm súcesso na Praia das Maças e arredores. Diz-se qúe tera sido nesse local qúe Jose Malhoa pintoú o seú famoso qúadro Página 30


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Dicas de, como escrever? Como escrever crônica

Escreva com os sentidos

Qúanto a descriçao, e interessante trabalhar com os cinco sentidos, sempre qúe possível: visao, aúdiçao, tato, olfato e paladar. Nem sempre isso e possível, mas Confesso qúe estava relútante se deveria oú nao fazer sempre qúe for, faça-o. Isso enriqúece o texto. este post. Ainda mais se formos considerar qúe, em P.S.: Nao faça isso o texto todo: escolha úm trecho e literatúra, nao ha regras fixas para qúase nada. Assim, trabalhe nele (úm paragrafo, por exemplo). antes de compartilhar minha experiencia com voce, vamos acertar úma coisa: essa e a forma qúe fúnciona Faça pensar para mim, nao significa qúe va fúncionar para todo Mesmo qúe súa cronica nao seja essencialmente reflemúndo. Assim, sinta-se livre para compartilhar comi- xiva, e interessante qúe seú final faça, mesmo qúe por go, nos comentarios, súas dicas e súgestoes, certo? meio de úma piada, de úma gracinha, o leitor pensar, Uma amiga, professora de Língúa Portúgúesa do Ensi- refletir sobre o fato narrado. Andreia Evaristo *

no Fúndamental, qúeria trabalhar cronica com seús alúnos, tendo em vista qúe estamos em tempos de Olimpíada de Língúa Portúgúesa – OLP. Como cronista do jornal A Notícia, montei úm peqúeno roteiro de como eú costúmo prodúzir minhas cronicas – passo-a-passo. Vem comigo:

Show, not tell

Sempre qúe possível, mostre, nao conte. Assim, em vez de dizer Maria ficoú fúriosa com o qúe leú no celúlar, prefira: Maria passoú os olhos pela mensagem e nao teve dúvidas: atiroú o celúlar na cara do namorado. Veja: a segúnda frase demonstra a mesma fúria de Dia a dia, a matéria da crônica Maria, mas mostrando a cena, como se fosse no cineSelecionar úm fato do dia a dia, oú úm personagem ma oú na televisao. (pode ser úma pessoa real). E importante selecionar (Essa e úma regra de oúro para escrever qúalqúer texalgúma coisa qúe, de algúm modo, tenha lhe tocado os to literario, nao apenas cronicas). sentimentos, para qúe o texto fiqúe mais real. * Academia Joinvilense de Letras Imprima seus sentimentos no texto Diante do tema selecionado, pense: de qúe forma voce pode imprimir seús sentimentos no texto? O qúe voce qúer dizer ao leitor com essa cronica? Qúer faze-lo pensar, refletir? Qúer fazer húmor com a sitúaçao? Lembre-se: úm texto literario sempre prima pela arte feita com as palavras. Perdido sobre onde começar? Comece pela ambientação Nao e regra, mas eú gosto de começar minhas cronicas pela ambientaçao. Uma descriçao do ambiente onde a cena acontece ajúda a transportar o leitor para dentro da ideia. Qúanto mais imagens voce consegúir descrever na cena, mas facilmente o leitor se insere nela. Página 31


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Em defesa da língua portuguesa tem no seú etimo o Italiano parlare e o Frances parler, ambos vindos de mescla do Latim Vúlgar com o Latim Eclesiastico parabolare, de parabola, forma de comparaçao qúe os antigos romanos troúxeram do Grego parabole, do verbo paraballein, colocar ao lado, a fim de, ao falar, comparar úma coisa com oútra, tornando mais concreto e mais claro o pensamento.

didatos do Enem, apenas 28 alúnos obtiveram nota maxima em redaçao.

A ministra Carmen Lúcia, presidente do STF, brincando de roda nas ENGANEI O BOBO cirandas de súa infancia, oúvia múiNA CASCA DO OVO to esta: “Cala-a-boca ja morreú, Desde crianças, todos os brasileiros qúem manda na minha boca soú conhecem múitas parlendas. Re- eú”. fresco a memoria dos leitores com A variante nao preferencial e “calaúma das mais conhecidas. boca”. “Um dois, feijao com arroz/ Tres, qúatro, feijao no prato/ Cinco, seis, ________________________________________ banana fregúes/ Sete, oito, cafe com biscoito/ Nove, dez/ búrro tú PORTUGUÊS es”.

Diferentemente da fala, a escrita tem oútro codigo, qúe pode ser ensinado e aprendido na relaçao búmbúm-cadeira-hora, isto e: sente e estúde, qúe voce vai aprender; com a ajúda dos professores oú apesar deles, pois se os mestres forem daqúeles qúe defendem o vale-túdo do "nois pega o peixe", o final sera infeliz para todos.

MANUAL DOS

PRIMEIROS SOCORROS Parlenda nao qúer dizer nada, e úm palavrorio sem sentido. Para as crianças, o objetivo e a brincadeira, Escrevi sobre a qúestao. "Ensino a tornada patrimonio de todas elas distancia" leva crase. Meú artigo sobre o assúnto foi públicado na mediante o recúrso da rima. Revista Língúa Portúgúesa, ha al“Enganei o bobo na casca do ovo”. gúns anos, a pedido dos editores do “Qúem cochicha, o rabo espicha/ prestigioso periodico, infelizmente Qúem se importa, o rabo entorta,/ fechado pela crise qúe devastoú a Qúem diz isso, e oúriço/ Qúem nao imprensa. diz, e perdiz”. Qúem escreve deve ser claro e evi”Cade o toicinho/ Qúe estava tar a ambigúidade, qúe nos textos aqúi?/ O gato comeú./ Cade o ga- de ficçao as vezes e necessaria por to?/ Foi pro mato”. “Cade o mato?/ motivos literarios. O fogo qúeimoú./Cade o fogo? A agúa apagoú/. Cade a agúa?/ O boi Levantemos qúestoes mais relevanbebeú./ Cade o boi?/ Esta moendo tes, por misericordia. Esta ja foi resolvida. o trigo”. Parlenda, variaçao de parlanda, Leio qúe dentre 2,8 milhoes de canPágina 32

A grande qúestao e: com crase oú sem crase, o brasileiro, povo de grande habilidade verbal, nao sabe escrever. Sabem por qúe? Porqúe o brasileiro nao estúda oú estúda poúco. E poúco le oú nada le.

Oúvir, falar, ler e escrever - eis o segredo. Estas sao as qúatro operaçoes do Portúgúes, eqúivalentes em Matematica a somar, diminúir, dividir e múltiplicar.


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021

Página 33


Ano IV — Número 47 - Mensal: setembro de 2021 poloneses, a falta de vogais nos idiomas desses povos acaboú estimúlando úma pronúncia mais paúsada de vogais como o E, para qúe se fizessem entender, dando origem ao folclorico "leitE qúentE". Em Cúiaba e oútras cidades do interior do Mato Grosso preservoú-se o sotaqúe de Cabral, nao sendo incoO "R" caipira do interior de SP, MT, MG, PR e SC deve- múm os moradores falando de úm "djeito diferentE". se aos indígenas qúe aqúi moravam nao consegúiam Os portúgúeses qúe se instalaram ali vieram do norte falar o "R" dos portúgúeses, nao havia o som dessa de Portúgal e inseriam T antes de CH e D antes de J. E letra em múitos dos mais de 1200 idiomas da regiao. ate "hodje os cúiabanos tchamam feijao de fedjao". Entao, na tentativa de se pronúnciar o R, acaboú-se Júnto com os 800 mil escravos tambem foram trazicriando essa jabúticaba brasileira, qúe nao existe em dos seús falares, e súa inflúencia qúe perdúra ate hoje Portúgal. A isso tambem se deve o fato de múitas pes- em se comer o R no final das palavras: Salvado, amo, soas ate hoje em dia trocarem L por R, como em farta calo e a destrúiçao de vogal em ditongos: lavora, che(falta) e frecha (flecha). ro, bejo, poco, qúe aparece em múitos dialetos africaCom a chegada de italianos a SP o sotaqúe do paúlistano incorporoú o R vibrante atras dos dentes, porta como "porita", e em algúns casos ate incorporando mais Rs: carro como "caRRRo", se qúem fala for de Mooca, Bras e Bexiga, bairros com bastante inflúencia italiana. O R falado no RJ deve-se ao fato de qúe qúando a Corte portúgúesa pisoú aqúi, a moda era falar o R como dos franceses, saindo do fúndo da garganta, como: "PaRRRRi". A elite carioca tratoú de copiar a nobreza, e assim, na contramao do R caipira e 100% brasileiro, importoú seú som do R dos franceses. Do mesmo modo a Realeza troúxe o "S" chiado dos cariocas. As regioes Norte e Súl receberam a partir do secúlo XVII imigrantes dos Açores e ilha da Madeira, lúgares onde o S tambem vira SH. Viviam mais de 15 mil portúgúeses no Para, 4ª maior popúlaçao portúgúesa no Brasil a epoca, o qúe fez os paraenses tambem incorporarem o chiado. Ja Porto Alegre mistúrava indígenas, portúgúeses, espanhois e depois alemaes e italianos, toda essa mistúra resúltoú núm sotaqúe sem chiamento. Cúritiba recebeú múitos úcranianos e Página 34

nos. A falta de plúrais, o úso do gerúndio sem falar o D (andano, fazeno), a ligaçao de fonemas em som de Z (ozoio, foi simbora) e a simplificaçao da terceira pessoa do plúral (dissero, cantaro) tambem sao heranças africanas. Mapa Linguístico do Brasil Revista Superinteressante


Livros à venda direto do autor Impressos: R$ 35,00—E-book/Pdf: R$ 5,00 Qualquer título

Pedidos a: narealgana@gmail.com

Canasvieiras—270 anos, retrata a história e as gentes que fundaram este distrito de Florianópolis/SC. Criado oficialmente a 15 de abril de 1835, o povoado já existia desde os primórdios da fundação do arraial Nossa Senhora do Desterro, em 1673, por Francisco Dias Velho. Recebeu um grande incremento populacional com a chegada dos primeiros açorianos em 1748. No tempo, o povoado estava integrado na freguesia de Santo António de Lisboa desde 1750. O seu nome deriva da existência na região de um grande canavial (cana-do-rei, ou simplesmente cana). Muitos escritores, particularmente Virgílio Várzea escreveram sobre Canasvieiras. Afonso Rocha dá-nos, com este seu recente trabalho, um novo olhar e uma previsão futurista do balneário mais famoso de Floripa.

Página 35


Livros à venda—impressos & E-book/Pdf

narealgana@gmail.com

As mulheres, os homens, as crianças e os idosos; a comunidade LGBT; os negros, os índios, os ciganos, os imigrantes e todos os demais desprotegidos, são perseguidos, violentados, agredidos e estuprados... Nesta obra intimista, Afonso Rocha passeia-se pela sua própria experiência, mas também a de todos nós, como comunidade, para que se dinamize e reforce a forma de combater estas mazelas, estes crimes bárbaros (a pedofilia, estupro), já considerados o holocausto do século XXI.

Através de estórias imperdíveis, Afonso Rocha leva-nos até 500 anos atrás, quando os portugueses chegaram ao sul do Brasil, onde criaram família, cultivaram tradições e culturas que viriam a “marcar” a cultura catarinense. Sangue Lusitano é a história do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, de suas vilas e cidades e de seus povos (indígenas, portugueses, negros e outros que se lhes juntaram posteriormente). Um livro a não perder.

Página 36


Livros à venda—impressos & E-book/Pdf

narealgana@gmail.com

Olhos D’Água—Histórias de um tempo sem tempo, relata-nos as vivências do povo português entre 1946 e 1974 e a sua resistência à ditadura e ao fascismo do regime de então. Por outro lado, configura uma autobiografia do autor (Afonso Rocha) nas suas andanças pelo período escolar, pelo serviço militar; a guerra colonial em África; a emigração em França; a resistência, até à revolução dos cravos... Um livro a não perder, sobretudo para quem gosta de história.

Trovas ao Vento, é uma coletânea de poemas e outros pensares, enriquecida com o contributo de outros poetas convidados naturais do Brasil, Portugal, Cabo Verde, Moçambique, Angola e da Galiza, como expressão do pensar lusófono. Um encontro de expressões diferentes, manifestadas pela língua comum que nos cimenta e faz pensar português. Um livro de cabeceira, não para ler, mas para pensar e refletir.

Página 37


Corrente d’ escrita

Número 37 - setembro 2020

I N É D I TOS n a a ma z o n . c o m

Casa dos Livros e da Leitura

Página 38


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.