Corrente d'escrita n. 50 - fevereiro 2022

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Ano V — Número 50

Mensal: fevereiro de 2022

Corrente d’escrita Plantando Cultura * Santa Catarina * Brasil

Fundado por Afonso Rocha—julho 2017

Thiago de Mello - poeta 1926-2022

www.issuu.com/correntedescrita


Corrente d’ escrita

Florianópolis Santa Catarina Brasil +55 48 991 311 560 narealgana@gmail.com www.issuu.com/correntedescrita Fundador e diretor: Afonso Rocha

Corrente d’ escrita é uma iniciativa do escritor português, radicado em Florianópolis, Afonso Rocha, e tem como objetivo falar de livros, dos seus autores, suas organizações e das atividades que estejam relacionadas com a literatura , a história a língua portuguesa e a cultura em geral. Chamaremos para colaborar com o Corrente d’ escrita escritores e agentes literários, a qualquer nível, cuja colaboração será exclusivamente gratuita e sem qualquer contrapartida, a não ser, o compromisso para divulgar, propagar e distribuir este Magazine Literário. O envio para publicação de qualquer matéria (texto ou foto) implica a autorização de forma gratuita. As matérias assinadas são da responsabilidade exclusiva de seus autores e não reflete, necessariamente, a opinião de Corrente d’ escrita. As imagens não creditadas são do domínio público que circulam na internet sem indicação de autoria. As matérias não assinada são da responsabilidade da redação.

Amigo Afonso, Primeirámente, quero te ágrádecer pelo envio dá Corrente d’escritá. Sempre muito boá leiturá... e gostáriá de te párábenizár por este numero 49, que fechá o áno com “cháve de ouro”. Alguns textos nos cátivám de imediáto! Com reláçáo áo Premio Cámoes 2021, Olá, Afonso, tive á oportunidáde de ver umá entrevistá com á escritorá Páulinhá ChiziáObrigádá pelo envio de máis um cáder- ne, vencedorá dessá ediçáo. Que ricá no dá Corrente d'escritá. criáturá, táo sábiá e táo humilde em Párábens pelá dedicáçáo e trábálho de suá doçurá. Ate me emocionei! divulgáçáo dá literáturá. Entáo... Desejo sucesso sempre!! Vámos águárdár o numero 50, de certo Gránde ábráço, comemorátivo, como e do merecimenBernádete Costá/Joinville SC to que sejá. Máis umá vez , meu ágrádecimento! Abráço fráterno! Prezádo Amigo Afonso Rochá, Cris Coutinho/Piçárrás SC Recebi o numero 49 do Corrente d’Escritá, ultimo exemplár deste áno de 2021 contágiádo pelá Covid-19 e seu Querido escritor Afonso Rochá Cáváleiro dás Trevás, o terrível coroná- Grátá! vírus. Párábens, pelo excelente trábáObrigádá por me enviáres o Corrente lho em prol dá culturá literáriá cátári- d'escritá. nense, com publicáçoes mensáis pontu- Cádá vez melhor, máis átuál e necessáálmente encáminhádás áos seus muitos rio. leitores. Gránde Abráço. Abráço, JJLeál Rozeliá/Cruz Altá RS

Prezádo Escritor! Cumprimento-o cordiálmente, desejándo felicidádes, com seu empenho corrente escritá e um sucesso, bons temás. Párábens! "Que as marcas em seu rosto sejam de prazer, e não de dor". Afonso Rochá Atte. Cárlos Antonio de Souzá Cáldás Advogádo/Escrito/Biguáçu SC Boá Tárde. Fico encántádá áo ler está revistá. Abráços. Robertá Ferreirá/Tubo-SC

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Editorial

Corrente d’escrita

Número 50—fevereiro 2022

Pois é, já contamos com cinco anos. Cinco anos de existência, de permanência, em contacto com nossos leitores e amigos. São cinquenta edições—uma por cada mês, de fevereiro a dezembro. Procuramos, durante este período ir sempre ao encontro do propósito que nos alimentou, quando lá, em 2017, nos propusemos apoiar e divulgar os escritores que se exprimem em português, bem como incentivar e divulgar a literatura, a história e aprimorar o uso de nossa língua comum—o português. Será que alcançamos esses propósitos?

É cedo demais para concluir isso. O caminho vai no começo—cinco anos são muito poucos para tirar conclusões. Mas, de uma coisa estamos certos: gostamos do nosso trabalho, e o retorno, por parte de muitos leitores, nos diz para continuar assim, nesta rota literária e nesta imensa onda que é formado pelos nossos inúmeros leitores, brasileiros, portugueses e de outras nacionalidades que usam o português como língua oficial. Por isso, e utilizando uma gíria futebolísticas, em equipa que ganha não se mexe, também continuaremos na mesma estrada, corrigindo e melhorando o que, no dia a dia, nos for aconselhável. Neste número, por exemplo, embora mantendo o mesmo grafismo, fizemos uma renovado com o jogo de cores, e assim iremos, sempre, até ao final do mundo… Chamamos para a capa a imagem do grande poeta Thiago de Mello, que nos deixou há poucos dias; também quisemos, mais uma vez, falar da Paulinha Chiziane, ganhadora do prêmio Camões. Aproveitando o “balanço”, falamos da guerra “do Paraguai. Boas leituras e até ao próximo Corrente. Afonso Rocha Página 3

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Ano V — Número 50

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Vida/Atividade nas Academias Que o homem confiárá no homem

Os Estatutos do Homem Thiago de Mello (1926-2022)

como á pálmeirá confiá no vento, como o vento confiá no ár, como o ár confiá no cámpo ázul do ceu. Párágráfo unico:

Artigo I Ficá decretádo que ágorá vále á verdáde.

O homem, confiárá no homem como um menino confiá em outro menino.

ágorá vále á vidá, e de máos dádás,

Artigo V

márcháremos todos pelá vidá verdádeirá.

Ficá decretádo que os homens estáo livres do jugo dá mentirá.

Artigo II

Nuncá máis será preciso usár

Ficá decretádo que todos os diás dá semáná,

á couráçá do silencio

inclusive ás terçás-feirás máis cinzentás,

nem á ármádurá de pálávrás.

tem direito á converter-se em mánhás de domin- O homem se sentárá á mesá go. com seu olhár limpo porque á verdáde pássárá á ser servidá Artigo III

ántes dá sobremesá.

Ficá decretádo que, á pártir deste instánte, háverá girássois em todás ás jánelás, que os girássois teráo direito á ábrir-se dentro dá sombrá;

Artigo VI Ficá estábelecidá, duránte dez seculos, á práticá sonhádá pelo profetá Isáíás,

e que ás jánelás devem permánecer, o diá inteiro, e o lobo e o cordeiro pástáráo juntos ábertás párá o verde onde cresce á esperánçá. e á comidá de ámbos terá o mesmo gosto de áurorá. Artigo IV Ficá decretádo que o homem

Artigo VII

náo precisárá nuncá máis

Por decreto irrevogável ficá estábelecido

duvidár do homem.

o reinádo permánente dá justiçá e dá cláridáde,

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Vida/Atividade nas Academias e á álegriá será umá bándeirá generosá

tudo será permitido,

párá sempre desfráldádá ná álmá do povo.

inclusive brincár com os rinocerontes

Artigo VIII

e cáminhár pelás tárdes

Ficá decretádo que á máior dor

com umá imensá begoniá ná lápelá.

sempre foi e será sempre náo poder dár-se ámor á quem se ámá

Párágráfo unico:

e sáber que e á águá

So umá coisá ficá proibidá

que dá á plántá o milágre dá flor.

ámár sem ámor.

Artigo IX

Artigo XIII

Ficá permitido que o páo de cádá diá

Ficá decretádo que o dinheiro

tenhá no homem o sinál de seu suor.

náo poderá nuncá máis comprár

Más que sobretudo tenhá

o sol dás mánhás vindourás.

sempre o quente sábor dá ternurá.

Expulso do gránde báu do medo,

Artigo X

o dinheiro se tránsformárá em umá espádá fráternál

Ficá permitido á quálquer pessoá,

párá defender o direito de cántár

quálquer horá dá vidá,

e á festá do diá que chegou.

uso do tráje bránco. Artigo Finál. Artigo XI

Ficá proibido o uso dá pálávrá liberdáde,

Ficá decretádo, por definiçáo,

á quál será suprimidá dos dicionários

que o homem e um ánimál que ámá

e do pántáno engánoso dás bocás.

e que por isso e belo,

A pártir deste instánte

muito máis belo que á estrelá dá mánhá.

á liberdáde será álgo vivo e tránspárente como um fogo ou um rio,

Artigo XII

e á suá morádá será sempre

Decretá-se que nádá será obrigádo

o coráçáo do homem.

nem proibido, Página 5

Thiago de Mello 1926-2022


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Perfil

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Nessá epocá, já tinhá publicádo seu primeiro románce — Báládá de ámor áo vento —, em 1990, más seu sucesso como escritorá chegou em 2002, com á publicáçáo do livro Niketche: umá historiá de poligámiá. Por essá obrá, elá gánhou o Premio Jose Cráveirinhá, dá Associáçáo dos Escritores Moçámbicános. Características da obra de Paulina Chiziane As obrás de Páuliná Chiziáne fázem párte dá literáturá moçámbicáná pos-independenciá e possuem ás seguintes cárácterísticás: Protágonismo dá mulher negrá

Paulinha Chiziane Páuliná Chiziáne násceu em 04 de junho de 1955, em Reálismo sociál e críticá de costumes

Mánjácáze, vilá rurál moçámbicáná, más, com seis Reflexáo sobre á condiçáo femininá ános de idáde, mudou-se párá Máputo. Seus páis erám Fluxo de conscienciá ou monologo interior protestántes, portánto, o cristiánismo esteve fortemente presente em suá formáçáo. Alem disso, cresceu Linguágem líricá em um páís dominádo pelos portugueses. A independenciá de Moçámbique so ocorreriá em 1975, depois de ános de lutá ármádá entre guerrilheiros moçámbicános e soldádos portugueses. Isso explicá o ánticoloniálismo do pái dá áutorá, que ensinou suá filhá á se comunicár por meio do chope, um idiomá ligádo áo grupo etnico áo quál pertenciá á suá fámíliá. Alem disso, Chiziáne áprendeu á línguá rongá, em Máputo, onde iniciou seus estudos em umá escolá cátolicá, e ácábou áprendendo támbem o idiomá portugues. Já suá juventude foi márcádá pelá átuáçáo ná Frelimo, á Frente de Libertáçáo de Moçámbique, responsável pelá lutá em prol dá independenciá do páís. Apos á independenciá, teve início umá guerrá civil. Páuliná Chiziáne, entáo, tornou-se voluntáriá ná Cruz Vermelhá duránte o conflito, e suá átuáçáo políticá náo cessou ápos o fim dá guerrá, em 1992. A áutorá pássou á fázer párte do Nucleo dás Associáçoes Femininás dá Zámbeziá (Náfezá), orgánizáçáo náo governámentál criádá em 1997, ná cidáde de Quelimáne. Página 6


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Plurálidáde culturál Obras de Paulina Chiziane Báládá de ámor áo vento (1990) Ventos do ápocálipse (1993) O setimo jurámento (2000) Niketche: umá historiá de poligámiá (2002) O álegre cánto dá perdiz (2008) As ándorinhás (2009) Eu, mulher: por umá nová visáo do mundo (2013) Ngomá Yethu: o curándeiro e o Novo Testámento (2015) O cánto dos escrávizádos (2017) Niketche: uma história de poligamia A personágem principál e nárrádorá do románce e Rámi. Elá e cásádá com Tony, más o márido támbem tem relácionámentos com outrás mulheres. Entáo, Rámi decide conhecer cádá umá delás. Começá por Julietá, com quem ácábá se desentendendo e pártindo párá á brigá, porem elás ficám ámigás em seguidá. Ao conhecer Luísá, á terceirá esposá de Tony, Rámi novámente se envolve em umá brigá. Dessá vez, ás duás sáo presás. No entánto, Rámi, támbem se torná ámigá de Luísá. A pártir dáí, conhece Sály, á quártá mulher, e Máuá, á quintá. Decide áceitár á poligámiá do márido. Alem disso, torná-se á segundá ámánte de Vito, que tem um cáso com Luísá. A protágonistá e ás outrás esposás decidem se unir. A princípio, Tony náo gostá nádá dessá ámizáde, más ás mulheres resolvem fázer umá “escálá conjugál”. Assim, o márido pode ficár umá semáná com cádá umá delás. Quándo Tony e, supostámente, átropeládo e morre, Rámi tem um relácionámento sexuál com Levy, o irmáo do márido.

Vencedorá, em 2021, do máis importánte premio párá á Literáturá em Línguá Portuguesá, o Cámoes, á moçámbicáná Páuliná Chiziáne támbem foi escolhidá 'personálidáde do áno' dá Lusofoniá pelos jornálistás dá Agenciá Lusá de notíciás. Perguntádá sobre o pápel dá políticá em suá vidá, Páuliná diz considerár importánte o trábálho dos que se áfirmám dedicár á vidá publicá, más preferiu á Literáturá: “Prezo enormemente á minhá liberdáde. Sou muito desobediente. Náo sou de seguir pártidos”.

Hávendo estreádo ná vidá literáriá com um jornál de contos ná imprensá, Páuliná foi á primeirá mulher á O relácionámento com o cunhádo, ápos á morte do publicár um románce em Moçámbique. esposo, e párte dá trádiçáo no páís. No entánto, o suposto cádáver de Tony estává desfigurádo, e logo ficá evidente que o márido de Rámi está vivo. Assim, áo voltár párá cásá, ele descobre que seu irmáo e máis um integránte dáquelá “dánçá do ámor” (Nietsche). Página 7


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A primeira biblioteca indígena de Máto Grosso foi ináugurádá em Juíná, á 737 km de Cuiábá. Alem do ácervo de livros temáticos, o locál contá com gáleriá de memoriá dás lideránçás indígenás do povo Rickbáktsá, redário literário e espáço párá comerciálizáçáo de ártesánátos. O predio dá 'BiblioOCA' foi construído pelos proprios indígenás, mántendo á árquiteturá trádicionál dá comunidáde.

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Leituras...

Um livro polemico — Portugál-Brásil: Ráízes do Estránhámento — de Cárlos Fino, jornálistá portugues, que se debruçá sobre ás reláçoes lusobrásileirás e párticulármente no que tánge á línguá comum e á formá como os cidádáos encárám ás reláçoes mutuás. Tálvez um debáte forá do tempo, más interessánte párá quem ácompánhá e se interessá pelás reláçoes entre os dois páíses.

As Rosás de Anitá, umá coletáneá de textos dedicádos á homenágeár á “nossá” Anitá Gáribáldi, á heroíná de dois mundos, quándo se comemorá o seu bicentenário. A coletáneá contá com á párticipáçáo de 63 escritores dos máis diversos estilos. A ediçáo destes trábálhos, numá louvável iniciátivá e coordenáçáo dá poetizá Verá de Bárcellos, contá com o ápoio do Instituto Aráçá—Culturá e Criátividáde. Página 9


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Nov-2021 Pedidos ao autor narealgana@gmail.com R$ 35,00 (portes incluídos)

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há, vistá do ponto de vistá historico e criátivo. Um livro ápáixonánte, á náo perder, náo so pelos bons ápreciádores dás ”coisás” mánezinhás, más támbem dá historiá e dás trádiçoes locáis. Com tráduçáo párá ingles, o livro e mágistrálmente ilustrádo, á cores, náo so nos álimentos como nos utensílios usádos ná suá cápturá, confecçáo, cozimento, etc.

E vem do mar.... Um excelente livro dos escritores cátárinenses Nárbál de Souzá Correá e Amílcár D’Avilá de Mello, com prefácio do historiádor Eduárdo Bueno, que se pásseiá, áo longo dos tempos, pelá culináriá mánezi-

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A CURVA MALASSOMBRADA (conto) O vilárejo ficou em polvorosá. O fedor logo se espálhou no ár e os urubus álvoroçádos derám sinál que háviá nás proximidádes álgum ánimál morto. Alguns morádores criárám corágem e se embrenhárám no máto. Lá estává o velho jogádo no corrego, sem ás pártes íntimás que forám cortádás, provávelmente, com umá fácá. Os urubus já tinhám árráncádo seus olhos e outrás pártes já se encontrávám em decomposiçáo. Crime monstruoso. Nás imediáçoes do corpo, estává tudo revirádo, ássim como no bárráco de cháo bátido onde o velho morává. Háviá quinquilháriás e roupás velhás espálhádás pelo cháo ensánguentádo. Um velho chápeu de couro foi o que máis despertou á átençáo dos morádores, pois o velho sempre foi visto usándo chápeu de pálhá. Ao redor dás figueirás cávárám umá enorme válá, por certo á procurá do ouro que o velho guárdává escondido. Purá lendá, más que despertou á cobiçá de muitá gente. O cáminho erá estreito e de cháo árenoso, márgeádo por florestás e cápoeirás. Ná sequenciá, umá curvá máis estreitá áindá, ládeádá por duás

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enormes figueirás. Bem áli, um filete de águá escurá, mercurizádá, páreciá sángue e átrávessává o estreito cáminho, desápárecendo no meio dos árbustos. As figueirás, com seus enormes gálhos de densá folhágem, refletiám no cáminho estránhás figurás em noite de luá cheiá. Pássár por áli á noite erá coisá de gente destemidá. Mesmo de diá os válentes ápressávám o pásso e os medrosos á evitávám. As luzes brilhántes espiávám o ándár dos que pássávám e se movimentávám entre ás folhágens dás figueirás. No meio dá mátá escurá provocávám máis medo áindá. Os olhos dessás estránhás figurás piscávám e desápáreciám no meio dos gálhos e folhágens. Quándo estáticos, páreciám pequenás lánternás de luzes esverdeádás, espiándo o misterio. Será que erám os olhos do fálecido que morávám náquelás redondezás ou áte mesmo um extráterrestre tentándo pássár álgumá menságem? O pio ápávoránte dá corujá ávisává do perigo iminente. Os poucos tránseuntes desávisádos que por áli pássávám, logo ápressávám o pásso ou corriám em dispárádá áte ávistár o vilárejo. Náo háviá duvidás que erám os olhos do fálecido. O máis prudente nessás horás de pánico erá correr sem párár. Depois dá descobertá do terrível e cruel ássássináto nás imediáçoes dá

curvá, poucos se árriscávám á pássár por áli á noite. Quándo pássávám náo se átreviám á olhár párá os ládos. Com vento forte e noite de luá cheiá, á coisá ficává máis ápávoránte áindá. Váriás figurás estránhás dánçávám no cáminho e corriám com á gente. Orá ná frente, ás vezes áo ládo. O pior e quándo se percebiá á figurá bem átrás dá gente, nos cálcánháres. Náo ádiántává correr. Elá erá implácável ná silenciosá perseguiçáo. Náquelá noite, um sujeito muito estránho entrou no unico boteco do vilárejo. Economico nás pálávrás e nos gestos. Pediu umá cácháçá e se ácomodou num cánto do bár. O chápeu de couro tápándo seus olhos dává-lhe um ár máis misterioso e suspeito. Afinál, fáziá quáse umá semáná dáquele ássássináto. Seriá esse o ássássino cruel do velho? O estránho engoliu á cácháçá e sáiu ápressádo em direçáo ás figueirás. Assim que o indivíduo sáiu do boteco, virou conversá obrigátoriá nás rodás de báte-pápo. Os ános se pássárám e hoje ás figueirás já náo existem máis. Por áli pássá á estrádá ásfáltádá que vái áte o Porto de Itápoá. Proximo áo locál, numá guáritá improvisádá, o sujeito estránho que ápáreceu no vilárejo e o vigilánte noturno. Silvio Vieira Educador e Consultor empresarial

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mento de Jesus com umá gránde festá págá, reálizádá em dezembro, no solstício de inverno (no hemisferio norte; no hemisferio sul e solstício de veráo), tornádá oficiál pelo imperádor románo Aureliáno párá homenágeár o deus Solis Invictus, o Sol Invencível.

Nátál, áo instálár o primeiro presepio do mundo.

Jesus náscerá em Belem porque Máriá, já nos ultimos diás dá grávidez, DO MENINO JESUS viájává em compánhiá do márido párá átender áo recenseámento orAO PAPAI NOEL denádo pelo imperádor Cesár OtáviáDeonísio Da Silva * no Augusto e dádo á cumprir por Quirino, governádor dá Síriá, jurisdiçáo á quál estává subordinádá á JuDuránte dois milenios náo houve deiá. Pápái Noel, e o Menino Jesus reinou triunfánte no Nátál, sem ávos, sem As informáçoes deveriám ser dádás tios, sem quáisquer outros párentes, em Belem porque Jose, o decláránte, nem ámigos, ácolhido e cuidádo ápe- tinhá náscido lá, á 150 km de Názáre, nás por suá máe e seu pái, rodeádo onde o cásál entáo viviá. Ná epocá, á de ánimáis num estábulo, entretánto distánciá erá percorridá em quátro sáudádo por ánjos e visitádo por reis. ou cinco diás, provávelmente em cáráváná de cámelos. Em presepios medieváis, o numero de soberános pássou de duzentos, Dizem os Evángelhos que á grávidez dándo á ideiá de que monárcás de de Máriá foi ánunciádá pelo ánjo Gátodo o mundo forám visitár áquele briel em meio á umá luz muito brilhánte. No seculo VII, este diá foi fixáque seriá o rei dos reis. do em 25 de márço e tornádo festivo Más por que tudo mudou tánto? Mápárá celebrár á Anunciáçáo, com o chádo de Assis perguntá em celebre fim de fázer com o que náscimento soneto: “Mudáriá o Nátál ou mudei do menino ocorresse exátámente em eu?”. Tudo mudou primeirámente 25 de dezembro, pois áte entáo o porque os evángelhos, incluindo os Nátál erá celebrádo em outrás dátás. ápocrifos, inventárám um outro JeNo seculo XIII, Sáo Fráncisco de Assus. sis, nome religioso de Giovánni di As festividádes de Nátál surgirám Pietro di Bernárdone, que viveu enápenás no seculo III. Mándátários tre fins do seculo XII e começo do cristáos fizerám coincidir o násciseculo XIII, fez mudánçá decisivá no

Certá vez, teriá poupádo tres irmás dá escrávidáo ou dá prostituiçáo, áo colocár moedás de ouro ná chámine dá cásá onde morávám e ássim possibilitár-lhes págár os respectivos dotes.

No início, em Assis, os personágens erám morádores dá propriá locálidáde, más á pártir do seculo XV, em Nápoles, forám substituídos por mánequins de mádeirá. E dá Itáliá, sede dá cristándáde, este tipo de presepio A Igrejá procurává fázer ás pázes espálhou-se pelo mundo inteiro. com o poderoso Imperio Románo Já Pápái Noel e personágem lendário, que tánto á perseguirá no pássádo, entretánto ámpárádo ná existenciá más do quál tornárá-se promissorá reál de Sáo Nicoláu, um árcebispo áliádá, como demonstráriá no seculo irlándes que viveu entre os seculos seguinte, á pártir do reinádo de III e IV e que ájudává muito os poConstántino, o Gránde. bres.

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Todáviá o Pápái Noel, tál como o conhecemos hoje, deve muito áo conto Umá visitá de Sáo Nicoláu, escrito pelo ámericáno Clement Clárk Moore, em 1822. Foi este áutor quem fixou á residenciá de Pápái Noel ná Láponiá, ná Finlándiá, e e dele támbem á invençáo de que o bom velhinho viájá numá cárruágem puxádá por renás. Rezá á fráse fámosá que “quándo á lendá superá á reálidáde, publicá-se á lendá”. E o que vem ácontecendo com o Nátál há milháres de ános! PS. Publicádo originálmente ná revistá Vejá on-line * professor e escritor, seus livros sáo publicádos no Brásil e em Portugál pelo Grupo Editoriál Almediná. Artistá: Sisto BADALOCCHIO (Pármá, 1585 - Bologná, 1647) e suá muito simpáticá "Ságrádá Fámíliá"


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CONTESTADO (Máte riá publicádá ná Folhá de Sá o Páulo e comentádá pelo escritor cátárinense Deoní sio dá Silvá, suscitou está buscá em árquivos, um conto publicádo no Jornál "O Cátáriná", o conto ine dito áte entá o, "Cárráscál de Almás", de Olsen Jr., ediçá o nº 79, pá giná 14 e que tem á citáçá o de Mátos Costá, o u nico militár que entendeu o conflito e todos fizerám questá o de ignorár porque ná o átendiá áos interesses dá e pocá)... A máte riá começou sobre o uso dá áviáçá o em combátes militáres, sim foi no Contestádo... Vái o conto... Sántá”, onde ápáreciám ás criánCarrascal de Almas çás entre os ádultos, e disserám que precisávám fázer umá reportágem. Queriám mostrár como (inédito em livro, de Olsen Jr.) estávám os remánescentes dá “Revoluçáo dos Peládos”; justificá“A revolta do Contestado é ape- vám “por que á criánçá ficá ná menas uma insurreição de sertane- moriá do velho” e o que háviá mujos espoliados nas suas terras, dádo náqueles cem ános desde o início do conflito.

nos seus direitos e na sua segurança. A questão do Contestado se desfaz com um pouco de instrução e o suficiente de justiça, como um duplo produto que ela é da violência que revolta e da ignorância que não sabe outro meio de defender o seu direito.”

Lembrei de imediáto do Fulgencio Alves, que deveriá beirár os cem ános e viviá numá cásá áfástádá do centro, e que páreciá gánhár umá sobrevidá, e os olhos brilhávám quándo se lembrává dáquele tempo; erá como se o fulgor, os estámpidos e o cláráo do shrápnel de(Cáp. Mátos Costá, que nuncá vástándo o sertáo estivessem áinescondeu de ninguem o que pen- dá explodindo em suá retiná. sává, em entrevistá á um jornál dá Os jornálistás permánecerám máis epocá, ácusándo os coroneis e á de dez diás ná regiáo, depois se ordem que os mántinhá pelá revol- despedirám áfirmándo que iriám tá existente). mándár umá copiá dá máteriá

Jose Máriá no glorioso exercito de Sáo Sebástiáo que voltáriá párá promover á justiçá, quándo todos teriám o seu quinháo, suá terrá, seu rebánho, condiçoes de sustentár á fámíliá e náo háveriá máis lutá entre gente dá cidáde e gente do cámpo e todos viveriám em hármoniá, sem exploráçáo do homem pelo homem e todá áquelá forçá militár dá republicá náo defenderiá so os ricos, os fázendeiros ábástádos e á ferroviá ádministrádá pelos estrángeiros... “... Fiquei com á minhá máe, mulher forte e decente... No começo háviá muito respeito entre ás pessoás no reduto, ás mulheres, criánçás,

quándo fosse publicádá. Quándo os dois reporteres chegárám áqui ná vendá, eu soube logo do que se trátává. Erá sempre o mesmo; vinhám átrás dá memoriá do Contestádo. No meu ármázem átendo todo o mundo.

E o jornál que tenho em máos, gostei especiálmente do trecho que contem o depoimento do velho Fulgencio e que espero ler dáqui á pouco párá ele...

“... Tudo foi muito triste meu filho... Mostrárám váriás fotográfiás de Meu pái tombou logo no primeiro prisioneiros dá chámádá “Guerrá combáte do Iráni, teve o privilegio de ingressár junto com o monge Página 14

Monumento ao Contestado—Irani


Ano V — Número 50 áqueles que deveriám defender á cáusá, á nová monárquiá dos sertoes, os Doze páres de Fránçá, exemplo de ordem e válentiá... A gente rezává muito náquele tempo...

Mensal: fevereiro de 2022

duás criánçás... As mulheres forám simplesmente degoládás... Já ás criánçás, ele disse que derám máis trábálho...

áo, erá á metáde do contingente militár do Brásil ná epocá; cinco ávioes forám disponibilizádos párá ájudár ás forçás do governo, dois ápenás voárám (foi á primeirá vez ná Americá Látiná com fins militáres); em um diá, párá destruir o ultimo reduto, de Sántá Máriá, forám dispárádos máis de 40 mil tiros pelo exercito, por exemplo.

Ficámos quátro ános perámbulándo pelos mátos, do Iráni párá Táquáruçu... Depois Cáráguátá e por ultimo Sántá Máriá onde tudo ácábou...

Umá ele ácertou com o fácáo ántes de entrár em cásá e á outrá teve de tirár debáixo de umá cámá, mátou e depois como háviá feito com os outros, picou os corpos todos e deixou tudo párá os bichos comerem... Antes dá cápituláçáo, já á miseriá ... “Aquilo erá desespero... O que sociál tinhá sido substituídá pelá háviá de máis bestiál dentro do miseriá morál.

Nuncá vi tántá morte ná minhá vidá... Más entáo, áí á vidá já náo váliá muito... Náo se sábiá máis párá que tánto sofrimento, fome, doençá, solidáo... A solidáo do desespero, dos ábándonádos, dos que náo tinhám máis esperánçás...

homem áflorává náquelá terrá sem leis... Ninguem máis se respeitává... So os láços de fámíliá se mántinhám... Náo dává párá fugir por que náo tinhá párá onde e mesmo porque náo háviá compáixáo com áqueles que desistiám...

“... Tinhá cinco ános quándo fomos párá o Iráni...

A gránde reportágem dos jornálistás áfirmá que o IDH (Indice de Desenvolvimento Humáno) dás cidádes envolvidás ná conflágráçáo do Contestádo e o menor em reláçáo ás outrás cidádes cátárinenses e so compárádo áos grotoes norRestává rezár, orár párá que o destinos. monge Jose Máriá ouvisse e se ápi- Pássádos cem ános, á Guerrá do edásse e tálvez ássim se pudesse Contestádo continuá muito presenter outrá vidá, outro mundo, nisso te no imáginário populár, ná fáltá ácreditávámos... de representátividáde do poder e “... Minhá máe costumává fálár bái- nás condiçoes máteriáis de gránde xinho nos meus ouvidos... Precisá- párte dá populáçáo.

“... Teve um peludo (como os revoltosos chámávám os militáres) que entendeu o nosso ládo, o nome dele erá Mátos Costá, más náo lhe derám ouvidos... Foi morto numá emboscádá e o chefe do piquete que o mátou, por suá vez, támbem foi morto, punido pelá áçáo indevi- mos águentár, diziá, tudo isso um Com todo o respeito, se eles me dá... diá ácábá e seremos melhores... Pá- tivessem perguntádo, teriá respon“... Dá guerrá, ficámos sábendo dá- rá este cárráscál de álmás, o sácrifí- dido! queles máis de mil prisioneiros, cio náo terá sido em váo...”. homens, mulheres e criánçás que forám todos mortos á mándo dás forçás do governo, os corpos forám incendiádos com grimpás de pinheiro e depois ás cinzás jogádás nos cáfundos dá terrá áqui de Sántá Cátáriná... Explicárám que foi necessário porque náo háviá como sustentár todá áquelá gente que náo tinhá serventiá...

Há muito tempo convivo com gente que quer sáber do Contestádo. Tenho informáçoes que impressionám. So párá lembrár: áquelá márcá que fiz com um fácáo áli ná párede tem l,70 cm de álturá (erá á medidá dá álturá do monge Jose Máriá), os ádeptos de suás ideiás usávám umá fitá bráncá com este comprimento em seus chápeus, “...Antes de Sántá Máriá, o ultimo umá distinçáo no grupo; outrá coireduto á cáir, um dos nossos tinhá sá, no áuge do combáte cercá de mátádo á fácáo, tres mulheres e oito mil soldádos estávám ná regiPágina 15

Escritor, membro da Academia Catarinense de Letras.


Ano V — Número 50

Diante do inimigo

Indivíduo de áltá periculosidáde conseguiu fugir dá Ilhá do Diábo, onde estiverá preso por 10 ános. E, por ázár, onde veio ele párár? Diánte de minhá portá. Conheci-o imediátámente, háviá fotos por todá párte. Se duvidár, o cárá erá máis conhecido do que nosso átuál presidente. Minhás pernás bámbeárám. Aterrorizádo pensei: que será que vái fázer comigo? E prepárei-me párá o pior.

Mensal: fevereiro de 2022

Mostrou-me á bocá murchá, sem máis nenhum dente. Acostumou-se á conviver com rátázánás e árácnídeos. – Seu crime deve ter sido horrível. Que foi que ándou fázendo? Certámente trucidou um monte de gárotos de ruá. Náo? Estuprou á propriá ávo? Assássinou á fámíliá e foi áo cinemá? Explodiu um shopping cheio de pessoás? Colocou fogo em álgum mendigo?

nhá no meu fuscá, devágár, quándo o bichinho veio ná direçáo do párábrisá. Tentei desviár, más de um ládo háviá um ábismo, de outro umá inocente velhinhá... – Voce deviá entáo ter sácrificádo á velhinhá. – Náo me pássou pelá cábeçá. E ágorá, o que eu fáço? – So há umá soluçáo: voce sábe ler e escrever? – Sei, mál e mál.

– Náo – fálou ele – tudo isso e coisá poucá. Pode dár, no máximo, prisáo domiciliár se voce tem um bom ádvogádo. O que fiz náo tem perdáo. Advogádo nenhum quis me defender. Disserám que erá cáso perdido.

– Cándidáte-se á deputádo. Náo fáltám pártidos átrás de álguem com o nome conhecido. O povo costumá votár em quem e fámoso, náo interessá se tem ou náo competenciá. Voce vái árrombár nás urnás. Gáránto que levá máis de 300 mil votos. Depois, náo precisá máis se – Quál foi esse crime hediondo preocupár. Imunidáde párlámenPárá minhá surpresá, o perigoso meliánte começou á soluçár. Com entáo? Furtou um pácote de leite tár, sábe o que e isso? pená, coloquei á máo em suás cos- no supermercádo? Atrásou á pensáo dá ex-mulher? Pior? tás: – Cálmá, ámigo, digá o que lhe Fiquei imáginándo o que poderiá áflige. ser pior do que isso. Ele finálmente E ele começou á nárrár os horrores fálou, com voz frácá: que háviá pássádo nesses ános: ficou encerrádo num cubículo de – Atropelei um pássárinho! dois por dois, sem jánelá, dormindo – Oh! – exclámei horrorizádo – no cháo. Diáriámente, párticipává voce e um monstro! de umá sessáo de áçoites e umá de choques eletricos. Se ábriá á bocá – Más náo tive culpá, ácredite. párá reclámár, levává porrádá. Juro que náo queriá fázer isso! ViDivulgue—Partilhe—Leia

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Ano V — Número 50

Mensal: fevereiro de 2022

cáchorros áfoitos. Quánto vivi!

mesá”. E o cándido e contundente verso: “So umá coisá ficá proibidá: ámár sem ámor”.

E vierám cinco netos, o que, por si Quándo fez 90 ános, numá fálá ná so, bástáriá. Bibliotecá Mário de Andráde, em Ná mesmá cronicá está: Sáo Páulo, deixou um resumo de “Há quánto tempo náo leio Thiágo suá vidá: “Como quem repárte páo, como quem repárte estrelás, como de Mello?”. Lá por cinquentá ános átrás um quem repárte flores, eu repárto “Há quánto tempo náo fáço tánto ámigo me emprestou “Fáz escuro, meu cánto de ámor. Com umá esdo que me fáz bem, ábsorvido pelo más eu cánto”, livro que me encán- trofe ápenás, me despeço – párá rálo dá mediocridáde ou dá pressá tou, de um áutor que me cátivou. permánecer com voces. Me despeço ou sei lá o que”. Fáziá poesiá áte dá ráivá e tudo ne- párá permánecer.”

Adeus para ficar

E o começo de umá cronicá que pu- le erá ámor, ámor pelá pálávrá, pelá bliquei lá átrás no tempo, listándo liberdáde, pelo seu Amázonás. Um diá decidiu lárgár o estudo de Mecoisás que por ános náo fáziá. diciná e viver de literáturá. ConseFálei de náo máis ter ido á um guiu fáze-lo com máestriá áte ná “culto de verdáde, com um pástor sextá-feirá pássádá, diá 14 (de jápreocupádo em tránsmitir felicidáneiro), quándo fáleceu, pertinho de de”, de ándár ná chuvá e colher picompletár 96 ános. tángás molhádás, pescár longe, no már, mirár ás ondás se quebrándo Entre dezenás de livros, quáse inná práiá, ouvir musicá pelo prázer contáveis poemás, tálvez seu esde ouvir, simplesmente, sem quál- crito máis conhecido sejá “Os Estáquer ánálise rácionál, descobrir tutos do Homem” (leiá ná páginá 4 trilhás de bicicletá, observár pes- e 5 deste Corrente), umá liçáo que soás em áeroportos e criár histo- vái desde á licençá de “cáminhár riás sobre elás, ser sequestrádo por pelás tárdes com umá imensá begoniá ná lápelá” áte “Ficá decretádo um livro. que o homem se sentárá á mesá, Voltei á fázer? com seu olhár limpo, porque á verNádá máis de pescáriás demorádás, dáde será servidá ántes dá sobrequáse nádá de cultos, ápesár do inusitádo de umá inesperádá e belá missá em Nová York, áeroportos estáo táo superlotádos que ficá difícil criár personágens, e tenho cádá vez máis dificuldáde em sepárár os sons em musicás, emborá áindá me deleite com elás. Por outro ládo, quántos livros me sequestrárám, quántos milháres de quilometros pedálei, descobrindo trilhás e máres, colhendo pitángás áo ládo dá estrádá e negociádo pásságens com Página 17

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Biografia Amádeu Thiágo de Mello násceu em Bárreirinhá, no Amázonás, em 1926. Duránte á ditádurá (1964-1985) foi preso e depois exilou-se no Chile, onde encontrou Páblo Nerudá, um ámigo e coláborádor. No exílio, álem do Chile, morou ná Argentiná, Portugál, Fránçá e Alemán há. Com o fim do regime militár, voltou á suá cidáde nátál e depois mudou-se párá Mánáus, onde viveu áte suá morte á 14 de jáneiro de 2022. Seu poemá máis conhecido e Os Estátutos do Homem, onde o poetá chámá á átençáo do leitor párá os válores simples dá náturezá humáná. A suá poesiá escritá foi Poesiá Comprometidá com á Minhá e á Tuá Vidá que rendeu-lhe, em 1975, áindá duránte o regime militár, um premio concedido pelá Associáçáo Páulistá dos Críticos de Arte e tornou-o conhecido internácionálmente como um intelectuál engájádo ná lutá pelos Direitos Humános. Em homenágem áos seus 80 ános, completádos em 2006, foi lánçádo pelá Kármim o CD comemorátivo A Criáçáo do Mundo, contendo poemás que o áutor produziu nos ultimos 56 ános, declámádos por ele proprio e musicádos por seu irmáo máis novo, Gáudencio. Suás obrás forám tráduzidás párá máis de trintá idiomás.


Ano V — Número 50

Todos os nomes...

O homenzinho chegá á meu ládo e “átirá” de rájádá: o povo portugues, e outros que sejám seus “filhos” de heránçá geneticá, sáo, ná máioriá dos cásos, feitos de mádeirá. Por que dizes isso? Pergunto-lhe. Orá, entáo náo ves que há o senhor Mádeirá, que desde logo compromete todos nos. Más depois, áindá há o senhor Pinheiro, senhor Nogueirá, senhor Silvá, senhor Cárválho, senhor Láránjeirá, senhor Nogueirá, senhor Oliveirá, senhor Mácieirá, senhor Cástánheirá, senhor Mimosá, senhor Videirá, senhor disto e dáquilo, sáltándo de gálho em gálho, nás árvores deste páís. Engráçádo. Nuncá tinhá discorrido essá questáo. E julgává eu que, como páís de ácentuádá trádiçáo cátolicá, á máioriá fosse báfejádo pelás purezás iniguáláveis e sántás dá águá-bentá. E que temos, por exemplo: Jose (de Sáo Jose), Joáo (de Sáo Joáo), Domingos, Tomás, Agostinho, Nicoláu, Filipe, Inácio, Tome, Páulo, Tiágo, Cárlos, Jorge, Artur e Judás… ― já viste o que e chámár umá pessoá de Judás? ―, Antonio, Mánuel, Afonso, Bernárdo, Alípio, Artur, Bártolomeu, Ildefonso, Adriáo, Mámede, Alexándre, Andre, Cárlos, Domingos, Fernándo, Guilherme, Pedro, Fráncisco, Jesus, Pássos, Isábel (de Sántá Isábel), Fátimá (de Senhorá Página 18

Mensal: fevereiro de 2022

de Fátimá), Máriá, Aná, Teresá, Conceiçáo, Názáre, Lurdes, Olindá, Cecíliá, Joáná, Leonor, Justá, Remedios e Perpetuá. Entáo, essá de perpetuá, e o fim…. Más o reino plántádo nos nomes portugueses náo ficá por áqui.

vá Ford, Epílogo de Cámpos, Exuperiá Bránco, Felicidáde do Lár Brásileiro, Free Wiliám dá Silvá, Gengis Khán Cámárgo, Horácio Treme Terrá, Kun Fu Jose, Leidi Dáí, Olgá Testá, Pedro Tocáfundo, Soubrásil Mádeirá de Lei, Xilderico Alárico de Freitás, Yále Bicá, Zinton Oliveirá… uffá.

Há áindá o senhor Cordeiro, o senhor Cámelo, senhor Lobo, Tigre, Coelho, Lágártixá, Cárneiro, Ráposo, Vácá, Touro, Boi, Pássárinho, Cábrito, Bezerro, Cáválo, Abelhá, Aránhá, Bárátá, Leáo, Gáto, Cáo, Porco, Elefánte, Grilo… Já virám o que e chámár á umá pessoá Cámelo? E Bárátá? E entáo, Vácá? Senhor Fiquemos por áqui. Vácá prá áqui, senhor Vácá prá ácolá… E o senhor Porco? Que pensárá Cláro que os outros, e quándo digo “os outros” quero referir-me á ouele com seus botoes? tros povos, outrás correntes migráMás sim, verdáde verdádeirá sejá toriás, com outrás origens, outrás ditá, nos lusos, herdámos esses no- plenitudes, támbem tem suás sinás, mes ligádos á náturezá, áos áni- suás mázelás, suás márcás, que eu, máis, ás ártes, áos sántos, átráves por ser lusitáno do álem-már, nem de nossá historiá milenár e náo fi- consigo pronunciár. cámos por áqui. Trouxemos essá trádiçáo párá os brásis, párá ás áfri- Más isso sáo estoriás párá outro cás, ás índiás… e párá os quátro diá. cántos do mundo conhecido e por conhecer. Más, cáros irmáos brásileiros, náo se fiquem á rir. Támbem descortinámos um bom punhádo de nomes que, pelá suá criátividáde, mereciám um bom premio por párte dá Acádemiá. Vejámos so está pequená ámostrá: Umáel, Alef, Dáblio, Leco, Suyá, Cáni, Aeronáuticá Bárátá, Antonio Querido Frácásso, Bertá Ráchou, Cáfiáspiriná Cruz, Chevrolet dá Sil-


Ano V — Número 50

1933, o escritor Guimáráes Rosá, que trábálhou breMensal: fevereiro de como 2022 medico no Coloniá, chámou áquilo de vemente “trem de doido”. Anos depois, o cenário rendeu compáráçoes inevitáveis com os cámpos de concentráçáo názistás.

Casos com História Páginas do passado

Estimá-se que 70% dos internádos náo ápresentávám registro de doençá mentál. Erám gáys, álcoolátrás, militántes políticos, máes solteirás, mendigos. Torturás físicás e psicologicás erám rotiná no Coloniá. Entre ás máis comuns háviá á duchá escocesá (bánho propiciádo por máquinás de áltá pressáo) e trátámentos de choque. Há támbem relátos de que estupros erám co-

Barbacena—cidade de loucos Em 1903, Bárbácená, MG, gánhou á álcunhá de “Cidáde dos Loucos”, gráçás á ináuguráçáo de sete instituiçoes psiquiátricás no município. Ná epocá, estánciás de climá ámeno, como Bárbácená, erám vistás como propíciás párá o trátámento de doençás mentáis. Umá dessás iniciátivás erá o Hospitál Coloniá. Más, com o tempo, o que erá plánejádo como umá instituiçáo medicá tornou-se um mátádouro.

metidos ná instituiçáo.

O hospitál poderiá receber áte 200 pessoás, más chegou á ter 5 mil. Párá comportár tántá gente e ábrir espáço, o Coloniá trocou cámás por cápim. A desumánizáçáo se espálhává pelos 16 pávilhoes, onde fáltávám águá encánádá e álimentos. Muitos internos bebiám e se bánhávám no esgoto á ceu áberto. Com umá sucessáo de máus-trátos, frio e fome, muitos náo resistiám. Percebendo que o cemiterio municipál já náo Como o Coloniá náo trátává ápenás pessoás dá cidáde, comportává o numero cádá vez máis álto de mortos muitás vinhám de forá, desembárcándo de trem. Em no Coloniá, funcionários do hospitál começárám á tráficár corpos párá fáculdádes de mediciná, que os usávám em áulás de ánátomiá. Estimáse que 60 mil pessoás morrerám ná instituiçáo. FONTE: Dánielá Arbex, jornálistá e áutorá do livro O Holocáusto Brásileiro, e Guilherme Conti Márcello, professor de psicologiá dá Universidáde Anhánguerá (Sáo Páulo). Página 19


Ano V — Número 50

O Patriarca dos Paulistas

regiáo) por decisáo populár, e lhe teve átribuídá á táMensal: fevereiro 2022 refá dedecomándár á resistenciá dá vilá. Ao ládo de Tibiriçá, Rámálho e o povo de Sáo Páulo conseguirám repelir os índios que cercárám á regiáo. Teve reláçoes com váriás mulheres indígenás, más sob influenciá do Pádre Mánuel dá Nobregá cásou-se com Bártirá, filhá de Tibiriçá, máior chefe guerreiro dá regiáo, bátizádá de Isábel Diás, tiverám nove filhos juntos, e dessá uniáo descendem inumerás dás máis trádicionáis fámíliás páulistás átuáis.

Joáo Rámálho Máldonádo foi um áventureiro e explorádor portugues. Viveu boá párte de suá vidá entre índios tupiniquins, ápos chegár no Brásil em 1515. Foi, inclusive, chefe de umá áldeiá, ápos se tornár ámigo proximo do cácique Tibiriçá, importánte líder indígená tupiniquim ná epocá dos primeiros ános dá colonizáçáo portuguesá no Brásil. Teve um pápel importánte ná áproximáçáo pácíficá entre índios e portu- Joáo Rámálho deixou como descendentes á chámádá gueses, principálmente ná chegádá de Mártim Afonso dinástiá de mámelucos, filhos de portugueses com

Parabéns São Paulo (468 anos) de Sousá no Brásil, com quem se encontrou no territorio de Sáo Vicente, e criou gránde ámizáde. Viviá no povoádo de Sánto Andre dá Bordá do Cámpo, que em 1553 foi tránsformádo em umá vilá pelo governádorgerál do páís ná epocá, Tome de Sousá. Rámálho foi vereádor e álcáide (prefeito) dá vilá. Em 1562, Joáo Rámálho foi designádo á cápitáo-mor dá Práçá ou de Sáo Páulo (umá especie de protetor dá

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indígenás, e teriá recebido ápelidos como o pái dos páulistás e o fundádor dá páulistánidáde. Entre seus descendentes háveriá figurás conhecidás, como á ráinhá Sílviá, cásádá com o rei Cárl Gustáv XVI, dá Sueciá, e áindá á escritorá Lygiá Fágundes Telles. Fonte: A Capital da Solidão: Uma História de São Paulo das origens a 1900.


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Gente com História O homem vai, mas a abra fica

do ná Africá, foi trázido como escrávo párá o Brásil Mensal: fevereiro de 2022 em 1845. O tráfico de escrávizádos já erá proibido no Brásil desde 1830, gráçás á um ácordo com á Ingláterrá, e desde de 1831, por forçá de umá lei de iniciátivá nácionál; náo erá difícil, porem, burlár estás leis. Como escrávo ele trábálhou numá embárcáçáo comerciál, escápándo em 1847. Liberto por ábolicionistás ná cidáde de Nová York, depois seguiu párá o Háiti. Ali, permáneceu sob os cuidádos de um cásál de missionários bátistás, retornándo áos Estádos Unidos em 1849. Logo tránsferiu-se párá o Cánádá onde trábálhou com o editor Sámuel Moore, responsável pelá publicáçáo de seu livro de memoriás Biográfiá de

Mahommah Garbo Baquaqua Em 1872, ápenás 0,08% dos escrávizádos náscidos no

Brásil e ná Africá erám álfábetizádos. Isso explicá á áusenciá de relátos em primeirá pessoá sobre suás condiçoes de vidá no seculo XIX. Existe porem umá unicá áutobiográfiá conhecidá, de um áfricáno que pássou pelá experienciá do návio negreiro e foi escrávizádo no Brásil. Ele se chámává Máhommáh Gárdo Báquáquá.

Máhommáh G. Báquáquá, um nátivo de Zoogoo, no interior dá Africá. Em suá áutobiográfiá, publicádá originálmente em 1854 nos Estádos Unidos, Báquáquá relátá o drámá comum áos máis de 4 milhoes de áfricános escrávizádos que áqui desembárcárám. A nárrátivá ápresentá támbem umá visáo políticá e culturál dá Bergoo, epocá dá mocidáde de Báquáquá, ácrescidos de seus proprios comentários sobre o seu páís, o islámismo e á escrávidáo.

Náscido por voltá de 1820, Báquáquá erá filho de um comerciánte muçulmáno e frequentou umá escolá religiosá locálizádá no átuál estádo de Benin. Sequestrá-

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Local onde existiria a propriedade do Marechal


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ou esconder. Mensal: fevereiro de 2022 Há quem diga que Lisboa é a cidade mais africana

MARCAS DA HISTÓRIA Juliá Máriáná Táváres * A historiádorá Isábel Cástro Henriques ácábá de publicár um roteiro dá Lisboá áfricáná em que explicá que, em vez de ápágár á historiá, devemos ánálisá-lá, ássumi-lá e áprender com os erros. Sobretudo ná cidáde máis áfricáná do mundo europeu—Lisboá.

Há cinco decádás que Isábel Cástro Henriques estudá á historiá áfricáná. A historiádorá lánçou este mes (Agosto de 2021) o Roteiro Historico de umá Lisboá Africáná e explicá como os áfricános, que chegárám como escrávos, intervierám ná construçáo sociál, culturál e economicá dá cidáde que támbem construírám. Depois de ter iniciádo os seus estudos ná Sorbonne, em Fránçá, em 1970, onde estudou o seculo XV, dedicou-se á descobrir ás márcás, escássás e escondidás, destá historiá. E perceber onde e como começou o preconceito. Está e á historiá que ágorá ájudá á descobrir e revelár – isto, áfirmá, e máis util do que destruir Página 22

da Europa. Concorda? Lisboá tem umá historiá áfricáná que será certámente á máis importánte dá Europá. Por exemplo, Lisboá teve um báirro áfricáno ántes de todás ás outrás, náo há outro Báirro como o Mocámbo em ládo nenhum. Por outro ládo, e evidente que Portugál teve um pápel centrál no tráfico negreiro, introduzindo no páís milháres de escrávos duránte os seculos XVI, XVII, XVIII. Isto álem dos que iám párá o Brásil e dos muitos que násciám em Portugál, filhos de máes escrávás, áte 1773, dátá em que á Lei do Ventre Livre, do Márques de Pombál, que libertá dá escráváturá os filhos dás mulheres escrávás. Lisboá foi, seguidá tálvez por Sevilhá, á cidáde europeiá que máis populáçáo de origem áfricáná recebeu áo longo dos seculos e que máis márcás áfricánás tem hoje. Desde á segundá metáde do seculo XV. Portánto, nesse áspeto podemos, sim, áfirmár que Lisboá e cidáde á máis áfricáná dá Europá. E Lisboa assume bem essa identidade? Aquilo que se tem feito hoje e o que procurá fázer-se no futuro proximo vái nesse sentido: ássumir essá identidáde, reconhecer e válorizár essá presençá áfricáná ná construçáo, ná mánutençáo e ná culturá dá cidáde. Más náo chegá, e necessário fázer muito máis. O que é que quer dizer com “fazer a descolonização da cidade”? É integrar esse reconhecimento de que os africanos e a sua história são parte integrante do tecido lisboeta? O que é que isso quer dizer exatamente? O conteudo imediáto e o de desconstruir ná cidáde de Lisboá tudo áquilo que tem que ver com o imáginário dá colonizáçáo, á que podemos chámár “culturá coloniál”. As cidádes forám márcádás por todo o período coloniál portugues e descolonizár á cidáde será tránsformár ás márcás que existem e sáo considerádás negátivás numá cidáde que pretende combáter preconceitos, formás discriminátoriás e posiçoes rácistás e ser umá cidáde ábertá, multiculturál e ácolhedorá de todos os homens e mulheres de todás ás cores e feitios existentes no mundo. Defende a eliminação dessas marcas, como estátuas e monumentos? Náo. Eu sou contrá á destruiçáo dás márcás dá histo-


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riá coloniál. Acredito que á cidáde de Lisboá tem váriás historiás. Tem umá historiá románá, árábe, áfricáná – que queremos dár ágorá á conhecer – e tem umá historiá coloniál, entre váriás outrás. A historiá coloniál fáz párte dá identidáde portuguesá. E tál como nuncá devíámos ter silenciádo ás outrás historiás, náo devemos silenciár á historiá coloniál. Silenciár um áspeto dá historiá globál e esconder e limitár á reflexáo sobre esse tempo violento e problemático, que e fundámentál párá podermos ássumir, ultrápássár, reconhecer os erros e náo voltár á comete-los. Foi está umá dás perspectivás fundámentáis do projeto A Rotá do Escrávo, dá Unesco, que erá á de quebrár o silencio. Quebrár o silencio dá escráváturá, fácto historico que, em Portugál, foi márcádo por um longo e gráve silenciámento. Esconder e silenciár e umá máneirá de náo áprender com á historiá, de náo á reconhecer e sobretudo de náo á ultrápássár e ássumir. Eu defendo á construçáo (e náo á destruiçáo) de todás ás historiás de Lisboá, em párticulár áquelás que forám esquecidás, como á historiá áfricáná dá cidáde. Ou seja, seria, por exemplo, manter o que existe, mas acrescentar as tais placas toponímicas, para construir um outro conhecimento histórico de Lisboa – incluindo todas as comunidades que fizeram parte do desenvolvimento da cidade? Exátámente. O meu trábálho tem sido sempre á construçáo dá historiá. E evidente que entendo que existem monumentos e estátuás que poderáo chocár á sensibilidáde dos lisboetás… Nesse cáso, retirem-se ás estátuás, se estiverem muito expostás, e coloquem-se eventuálmente em outros espáços, como os museologicos. Os árquivos e bibliotecás támbem guárdám documentos escritos cheios de violenciá – e nos náo vámos rásgá-los, destruí-los. Antes vámos utilizá-los criticámente. Portanto é contra a destruição das memórias, mesmo que alguns as achem ofensivas? Sou contrá á destruiçáo e pelá preserváçáo. Ate párá ser possível estudár, interpretár e compreender os fenomenos historicos. Está e á questáo fundámentál. Dá mesmá formá que os álemáes náo destroem os loPágina 23

cáis do Holocáusto, muito pelo contrário, sáo exibidos áos turistás, observádos e estudádos, precisámente párá que se vejá o que áconteceu e náo se repitá, Portugál náo tem que esconder á historiá coloniál. Elá existiu e temos que á reconhecer. Temos de olhár párá os monumentos, um á um, e estudá-los como documentos historicos. A historiá tem de ser estudádá, pensádá, refletidá. Porque e quando começou a estudar a presença africana em Portugal? So á pártir do áno 2000 e foi entáo que me ápercebi de umá historiá desconhecidá, silenciádá e silenciosá. Depárei-me com grándes dificuldádes párá encontrár documentos escritos, iconográficos, fontes historicás necessáriás á eláboráçáo dessá historiá. Como sábemos, os áfricános vierám párá Portugál em meádos do seculo XV, como escrávos. Vierám despidos de tudo, considerádos “mercádoriá”, “coisás” destinádás áo trábálho, desumánizádos, pelo que ás suás vidás em Portugál náo suscitárám o interesse dos investigádores, náo forám considerádás dignás de registo, nem objeto de estudo. Os africanos que chegaram a Lisboa nessa época eram todos escravos? Sim, quáse todos. De meádos do seculo XV áo seculo XVIII, á gránde máioriá erám escrávos. Náo quer dizer que náo existissem áfricános que chegássem como pessoás livres. Por exemplo, no seculo XVI, háviá reláçoes intensás entre á corte portuguesá e o Rei do Congo, que enviává párá estudár em Portugál álguns membros dá suá cásá reál. Háviá támbem áfricános que estávám ligádos á igrejá. Outros tornárám-se livres – os forros – e álguns, sobretudo mestiços, ássumirám funçoes relevántes ná sociedáde portuguesá, em párticulár á pártir do seculo XVIII. Más á máioriá erá escrává e vinhá párá trábálhár nás tárefás máis durás e desválorizádás dá sociedáde portuguesá. Como é que os africanos se estabeleceram em Lisboa? Como viviam? Chegám como escrávos, sáo desembárcádos, áváliádos – normálmente ná zoná do Terreiro do Páço – e comprádos. Háviá um espáço chámádo Cásá dos Escrávos


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como háviá á Cásá do Trigo ou á Cásá dás Mádeirás. Erám vendidos á senhores dá burguesiá ou áristocráciá. Normálmente, viviám nos espáços dás cásás senhoriáis, muitás vezes como domesticos. E como se tornavam forros, ou livres, e o que é que isso significava realmente? Desde muito cedo, verificou-se á álforriá. Isto e, álguns senhores dávám-lhes á liberdáde. Erám máis independentes, emborá ocupássem ná esferá e ná hierárquiá sociál os trábálhos máis desválorizádos. Alguns viviám ná cásá dos senhores. As ordens religiosás, os conventos em Lisboá, por exemplo, erám grándes consumidores de escrávos. Desde o finál do seculo XV, princípio do seculo XVI, os forros começám á orgánizár-se e á viver ná cidáde de Lisboá, nás suás cásás, muitás vezes árrendádás. Más háviá támbem quem tivesse cásá propriá. Há notá nos documentos, sobretudo de mulheres que tem cásá propriá, porque possuem máis bens, que normálmente conseguem átráves dá átividáde comerciál. Vivem nos báirros ántigos de Lisboá: ná Mouráriá, Alfámá, Báirro Alto. Há támbem umá mássá importánte de áfricános (livres) que começá á estábelecer-se, sobretudo no seculo XVI, numá zoná ocidentál dá cidáde, más considerádá já forá do espáço urbáno de Lisboá. No Bairro do Mocambo? Sim, no Báirro do Mocámbo! As fronteirás ocidentáis de Lisboá situávám-se, náquelá epocá, onde e hoje á Ruá Poço dos Negros, á Igrejá de Sántá Cátáriná. Depois temos á Av. D. Cárlos I, e, do outro ládo dá ávenidá, começává o Báirro do Mocámbo, onde e hoje á Mádrágoá. Como é que descobriu esse bairro? É a primeira a falar dele.

Descobri este lugár quándo fiz á investigáçáo párá o meu livro Heránçá Africáná em Portugál, em 2009. Sábiá que o termo e de umá línguá ángoláná – o Umbundu. Conheciá mocámbos ná historiá de Africá. Em Angolá e háviá támbem no seculo XVI em Sáo Tome. Erám lugáres párá onde fugiám os escrávos dás plántáçoes dá cáná-de-áçucár, no máto. Mocámbo significá lugár de refugio, de proteçáo, áldeiá, e e sinonimo de Quilombo, como os que sáo bem conhecidos no Brásil, cujá origem linguísticá e o Kimbundu, támbem línguá de Angolá. O que eu sábiá dos Mocámbos suscitou-me logo um interesse párticulár e percebi que, com este nome, so poderiá ser um espáço áfricáno. Tánto máis que háviá, em Lisboá, báirros destinádos á comunidádes, como á Mouráriá e á Judiáriá. Náo háviá nenhumá “pretáriá”, emborá tenhá encontrádo umá ou outrá referenciá documentál á este termo. Existiá entáo o Báirro do Mocámbo, dos áfricános. Recém chegados, recém livres… como é que os africanos se organizaram nesse bairro? E como nasceu? Foi construído numá conjugáçáo de interesses entre ás áutoridádes portuguesás, que áli os viám áli de certá formá máis controládos, e os áfricános. Párá eles foi támbem umá estrátegiá, viverem numá zoná onde erám todos de origem áfricáná – emborá de línguás e culturás diversás – e onde podiám, um pouco longe do olhár dos portugueses – preconceituoso e crítico -, práticár átividádes culturáis, cerimoniás e rituáis que lhes permitiám mánter á áfricánidáde. O báirro foi criádo por álvárá regio em 1593, e seriá o segundo dos seis báirros em que estává orgánizádá á cidáde de Lisboá. O báirro vái crescendo e á pártir do seculo XVII ápárecem portugueses. Sobretudo ligádos ás tá-

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refás do már – pescádores, márinheiros, vendedorás de peixe. As diversás átividádes no Terreiro do Páço, no seculo XVII, por Dirk Stoop. No cánto inferior esquerdo, um provável criádo negro, portádor de umá espádá. Foto: Arquivo Municipál de Lisboá Também nisto Lisboa foi singular? O Báirro do Mocámbo e certámente unico ná Europá de entáo e áo longo dos seculos seguintes. Náo háviá outro báirro áfricáno e foi támbem o máis ántigo instáládo forá de Africá. Os quilombos e mocámbos no Brásil, mesmo em Sálvádor dá Báhiá, sáo todos posteriores áo de Lisboá. Ná segundá metáde do seculo XIX, o báirro do Mocámbo desápárece e á suá memoriá perde-se rápidámente no tempo. Lisboa era uma cidade de múltiplas nações. Nesta época os africanos eram considerados portugueses, lisboetas? A máioriá dos que násciám em Portugál, se fossem filhos de escrávos, escrávos erám. Náo tinhám nácionálidáde, nem cidádániá. Os forros, que se sáibá, duránte este tempo, ficám conságrádos como forros – que remete párá á origem escrává. Penso que so com á áboliçáo dá escráváturá, em meádos do seculo XIX, e que os descendentes de áfricános – já náo entrávám Página 25

legálmente escrávos em Portugál desde os ános 1761, legisláçáo do Márques de Pombál, que proibiu – tránsformárám-se lentámente em portugueses. Emborá náo lhes fosse dádá á cidádániá. Aindá hoje continuá á ser difícil. É essa a história que a leva a concentrar em Lisboa, no seu último livro Roteiro Histórico de uma Lisboa Africana? Sou lisboetá! Más sobretudo porque háviá e há máis documentáçáo escritá e iconográficá sobre Lisboá do que sobre o resto do páís. A máior concentráçáo de áfricános erá nos centros urbános, e em párticulár ná cápitál. No seculo XVI, 10% dá populáçáo de Lisboá erá áfricáná. Quándo observámos á historiá de Lisboá, encontrámos máis gente áfricáná visível, os escrávos e os forros, nás suás multiplás átividádes economicás, sociáis, religiosás. Logo, foi possível recolher máis informáçáo e estudár de formá máis pormenorizádá e densá. Diz que os negros tiveram uma intervenção na vida social, cultural e económica na vida da cidade. Lisboa não seria o que é sem essa presença? Acredito que á construçáo e á evoluçáo dá cidáde de Lisboá, como quálquer cidáde, tem sempre á ver com áqueles que lá vivem e trábálhám. E desempenhám um pápel fundámentál ná construçáo dá cidáde. Logo, os áfricános forám umá mássá importánte de populáçáo que tinhá funçoes láboráis em todos os domínios. Ocupávám-se do que erá rejeitádo pelos portugueses, trábálhos desclássificádos, considerádos inferiores, más que erám indispensáveis á gestáo urbáná. Por exemplo, á limpezá dá cidáde, á distribuiçáo dá águá, á circuláçáo de informáçáo – os áfricános funcionávám como “correio”.


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Referiu também o comércio. Sim, á átividáde comerciál erá extremámente desenvolvidá pelos áfricános e em párticulár pelás mulheres áfricánás. Percorriám á cidáde á pe e vendiám os máis diversos produtos: peixe, páo, bolos, verdurás e frutás, sál, cereáis, cárváo.… E tinhám freguesás, clientes hábituáis, que diáriámente ás águárdávám párá se ábástecerem. A átividáde comerciál erá intensá e foi sempre importánte. A preserváçáo e mánutençáo dás cásás, támbem. Umá dás figurás áfricánás que percorreu todá á historiá e á do áfricáno chámádo o Preto Cáiádor, que cáiává os edifícios dá cidáde. Existem inumerás representáçoes iconográficás em que vemos o cáiádor áfricáno. Cáiávám ás cásás, preservávám os monumentos, árránjávám cálçádás e ruás, tudo o que erá á conserváçáo dá cidáde, e isto erá fundámentál. E sobrava-lhes tempo do trabalho? Há umá intervençáo permánente ná párte ludicá, ná musicá, ná dánçá e ná religiáo. Párticipávám átivámente como membros dás confráriás, em párticulár, nás procissoes, nos átos religiosos, que como sábemos se desenvolviám e proliferávám ná cidáde de Lisboá. Náo so como confrádes, pois pertenciám á váriás confráriás e irmándádes – nomeádámente á de Nossá Senhorá do Rosário dos Homens Pretos, ná igrejá de Sáo Domingos em Lisboá, no finál do seculo XV, párá ácolher precisámente os áfricános, escrávos ou forros. As confráriás protegiám os áfricános, permitiám melhores condiçoes de vidá, máis fácil integráçáo ná sociedáde e reláçoes sociáis importántes párá desenvolverám ás suás átividádes láboráis. E ássim os escrávos conseguiám os válores necessários párá comprár á liberdáde. Disse há pouco que a história africana continua a ser mal conhecida, ainda silenciosa. Como poderia ser diferente em Lisboa? Já e máis conhecidá, máis divulgádá, gráçás precisámente á umá serie de estudos que forám ápárecendo. O que se pode fázer párá álárgár esse conhecimento e desenvolver sistemáticámente projetos diversificádos: culturáis, musicáis, cinemátográficos. E no ensino, e fundámentál, existe á necessidáde de remodePágina 26

lár e renovár os mánuáis de ensino. E fora da escola e do ensino? Trábálho, por exemplo, com á Associáçáo Culturál e Juvenil Bátoto Yetu num projeto de identificáçáo e explicáçáo dos lugáres dá memoriá historicá áfricáná de Lisboá: átráves de um pásseio em tuk tuk, percorrer os sítios dá presençá áfricáná ná cidáde. Estámos á desenvolver outro projeto, muito importánte, de plácás toponímicás explicátivás de lugáres dá cidáde de Lisboá onde e possível reconhecer memoriás áfricánás (e ágorá preservá-lás, átráves dás plácás). Sáo 20 lugáres de Lisboá. O projeto inclui támbem duás estátuás, umá delás o Busto do Pái Páulino – figurá oitocentistá importánte ná defesá dás populáçoes áfricánás de Lisboá -, que está ácábádá e vái ser colocádá no Lárgo de Sáo Domingos. Muita coisa mudou nos últimos anos? Podemos considerar que depois da independência das colónias, sobretudo, a presença da comunidade africana em Lisboa passou a ser vista de forma diferente? Penso que logo á seguir á independenciá, náo houve umá gránde átençáo em reláçáo á historiá áfricáná de Lisboá. O interesse pelás questoes áfricánás surge sobretudo á pártir do finál do seculo XX. E um problemá do seculo XXI que começá á impor-se, á surgir no contexto intelectuál, culturál e sociál portugues, nomeádámente átráves dá ádesáo á formás culturáis áfricánás átuáis como á musicá, á dánçá, o cinemá, ás ártes plásticás. Isto fez emergir ás comunidádes de origem áfricáná, quer os áfrodescendentes, quer os imigrántes áfricános – que existem muitos. Portánto tem hávido álgumá átençáo, máis visibilidáde, máis interesse por Africá. Más áindá náo chegá… A populáçáo portuguesá foi muito márcádá, duránte seculos, por umá ideologiá desválorizádorá dos áfricános. Um preconceito? Um preconceito que áindá náo desápáreceu. Deu origem á umá forte culturá coloniál, que áindá permánece. As márcás dessá culturá emergem no tecido sociál portugues, átráves dá línguá, de representáçoes, de formás de átuáçáo e de vivenciá. E vemos isso nás difi-


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culdádes áindá existentes de um reconhecimento náturál dá cidádániá relátivámente ás populáçoes áfrodescendentes. Quándo se observá álguem que tenhá umá márcá físicá máis escurá, sempre se questioná de onde e, de onde veio. Párte-se do princípio de que náo sáo portugueses, quándo ná reálidáde muitos sáo portugueses. Táo portugueses quánto todos os outros. Diz no seu livro que esse preconceito surgiu á pártir do seculo XIX, curiosámente ápos á áboliçáo dá escráváturá. Refere que e neste período que sáo desenvolvidos estudos, por exemplo de Oliveirá Mártins, que fázem umá desválorizáçáo físicá, ráciál e culturál dos áfricános. Penso que esse e um momento do ágrávámento do preconceito. O preconceito vem desde o seculo XV com á chegádá. Háviá um repudio, o problemá dá cor dá pele, do corpo. Depois, á rejeiçáo dás práticás culturáis. E depois, umá rejeiçáo sociál, porque erám escrávos. Aindá hoje, privilegiám-se os que pertencem á clásses sociáis máis elevádás e discriminám-se portugueses dás clásses sociáis máis desválorizádás. Esse preconceito foi-se modificándo e sedimentándo em funçáo dos diferentes contextos e conjunturás historicás, sem ruturás, num processo contínuo. O seculo XIX introduziu umá dimensáo fundámentál do preconceito que foi á dimensáo científicá. Científica como? A pártir dáí náo erá so o físico, o sociál e o culturál, erá támbem considerádo inferior do ponto de vistá científico. Está vertente estává náturálmente relácionádá com ás teoriás que se desenvolverám ná Europá. As

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teoriás ráciáis e de hierárquizáçáo culturál dos vários grupos á escálá do mundo. E fornecerám umá dimensáo científicá áo preconceito, tornándo-o máis robusto e legítimo. O seculo XX coloniál ágrává. Devido à reivindicação da independência? Exáto, contrá os áfricános que recusám á domináçáo europeiá, nomeádámente no princípio do seculo XX, com ás chámádás cámpánhás de pácificáçáo em Africá. No cáso portugues, á guerrá coloniál á pártir de 1961. Os áfricános sáo vistos náo como combátentes, más como terroristás: máis umá formuláçáo extremámente negátivá. Logo, o preconceito já vem de trás e dáí á dificuldáde em eliminá-lo. Está extremámente enráizádo ná populáçáo portuguesá. * Nascida em Braga, Júlia Mariana Tavares fez de Lisboa casa, com vontade de contar histórias desta cidade cosmopolita e multicultural. Finalista de Ciências da Comunicação da Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade Católica Portuguesa, está a estagiar na Mensagem de Lisboa.


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doc.com

Mensal: fevereiro de 2022 Chámádá de 'Guerrá de lá Triple Aliánzá' no Páráguái, o conflito dizimou metáde dá populáçáo do páís. Há 150 ános o Páráguái foi cenário de "umá dás máis terríveis bátálhás dá historiá militár do mundo", á de Acostá Nu. Assim foi descrito o confronto pelo jornálistá Julio Jose Chiávenáto em Genocídio Americano: a Guerra do Paraguai, publicádo há quáse quátro decádás e considerádo importánte obrá dá historiográfiá regionál.

Guerra da Tríplice Aliança Quando a Tv Globo divulga “no Tempo do Imperador”, uma novela de época que tenta retratar a guerra com o Paraguay, achamos oportuno divulgar este texto da BBC, sobre o tema.

________________________________________________ Acosta Ñu: a sangrenta batalha em que crianças lutaram contra o Exército do Brasil na Guerra do Paraguai Por: Ana Pais - BBC News Mundo

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No Brásil, o episodio ficou conhecido como á Bátálhá de Cámpo Gránde. Aindá que muitos de seus dádos tenhám sido posteriormente questionádos ou desmentidos, o texto de Chiávenáto serviu párá lánçár luz sobre o que hoje e ámplámente reconhecido como o conflito máis sángrento dá historiá dá Americá Látiná: á Guerrá do Páráguái (ou "Guerrá de lá Triple Aliánzá", como e conhecidá no vizinho). Entre 1865 e 1870, o Páráguái enfrentou os Exercitos do Brásil, dá Argentiná e do Uruguái. Cálculá-se que, em 5 ános, tenhám morrido entre 200


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mil e 300 mil páráguáios, que correspondiám ná epo- relátá Bárbárá Potthást, professorá de Historiá Ibericá á metáde dá populáçáo do páís. Do totál de mortos, cá e Látino-ámericáná ná Universidáde de Coloniá, ná 80% erám homens. Alemánhá. Más o que áconteceu ná Bátálhá de Acostá Nu párá A historiádorá encontrou áte registros de álistámento que elá se tornásse, nás pálávrás de Chiávenáto, o de meninos de 11 ános - que náo chegávám á ir párá á "símbolo máis terrível dá crueldáde dessá guerrá"? frente de bátálhá, más se dedicávám á outrás tárefás, Trávádá em 16 de ágosto de 1869, á bátálhá foi protá- como tránsportár máteriáis. gonizádá, do ládo páráguáio, por criánçás e ádoles- O mesmo áconteciá com ás mulheres, muitás vezes centes. Seu impácto foi táo forte que á dátá ácábou encárregádás dá logísticá. virándo o Diá dá Criánçá no Páráguái. "Náo erá um exercito profissionál como conhecemos Em memoriá áos combátentes e áo ániversário de 150 hoje", pontuá Potthást. "Como muitos dizem, erá o ános do episodio, o governo páráguáio ináugurou á 16 'povo pegándo em ármás'." de ágosto, um monumento ná cidáde de Eusebio Ayá- Escudo humano? lá. Soláno Lopez conseguiu escápár álgumás vezes dos A 'guerra total' áliádos. Suá ultimá "fugá milágrosá" áconteceu quátro "O áno de 1869 márcá definitivámente o conceito de diás ántes de bátálhá de Acostá Nu, quándo cáiu Piriguerrá totál", diz o historiádor páráguáio Fábián Chá- bebuy. morro á BBC News Mundo, serviço em espánhol dá "Em 12 de ágosto (de 1869), ás forçás páráguáiás se BBC. dividirám em duás: o márechál iá em umá coluná e, Com o Exercito páráguáio práticámente exterminádo, explicá Chámorro, figurás importántes dentro dás forçás áliádás chegárám á sinálizár que á guerrá teriá terminádo e que seriá o momento de deixár o páís. Conforme Chiávenáto, umá dessás figurás erá o generál Luís Alves de Limá e Silvá, futuro duque de Cáxiás, que liderává ás tropás brásileirás no Páráguái. "Quánto tempo, quántos homens, quántás vidás e de quántos recursos necessitáremos párá terminár á guerrá, quer dizer, párá tránsformár em fumáçá e po todá á populáçáo páráguáiá, párá mátár áte os fetos no ventre dás mulheres?", árgumentou com o imperádor Dom Pedro 2º. A ordem, entretánto, erá de que á guerrá so chegáriá áo fim com á morte do presidente do Páráguái, o márechál Fráncisco Soláno Lopez, o que so áconteceriá em 1º de márço de 1870. "Náo tinhá necessidáde de fázer todá essá cáçádá, em que á populáçáo civil foi á principál prejudicádá", ressáltá Chámorro. Enquánto lutává pelá propriá sobrevivenciá, Soláno Lopez recrutává soldádos cádá vez máis jovens. "Primeiro eles tinhám 16 ános, depois 14, 13 ános", Página 29


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Mensal: fevereiro de 2022 As criánçás e jovens lutárám áo ládo de álguns veterános de guerrá, um contingente estimádo em álgo entre 500 e 3 mil, á depender dá fonte. De quálquer formá, existiá umá ássimetriá gránde entre os dois exercitos, que náo so erá numericá e etáriá, más támbem tecnologicá.

"As ármás usádás pelos páráguáios tinhám um álcánce máximo de 50 metros", diz Chámorro, enquánto "os rifles Spencer, usádos sobretudo pelá cáváláriá em outrá, mulheres, criánçás e idosos", contá Chámor- imperiál do Brásil, tinhá um álcánce de máis de 500 metros." ro. O ultimo grupo levává todá á logísticá do Exercito em "Ou sejá, párá que o páráguáio pudesse confrontár um cárros de boi: cánhoes, ármás, vestuário, ácessorios brásileiro, tinhá que encárár dez descárgás de bálá. Erá impossível", completá. de cozinhá. A bátálhá de Acostá Nu áconteceu há 150 ános em A isso se somá o fáto de que os máis novos náo tilocál proximo áo que hoje e á cidáde de Eusebio Ayá- nhám nem forçá físicá párá empunhár ás ármás, muito menos nás condiçoes em que estávám, com fome e lá, no centro do Páráguái muitás vezes doentes, ácrescentá Potthást. Segundo o historiádor, eles forám álcánçádos pelos áliádos - em suá máioriá soldádos brásileiros - e "náo No campo de batalha tiverám outrá opçáo á náo ser lutár". A bátálhá começou pelá mánhá e terminou cercá de Já Potthást citá outrá teoriá. "O que se diz, e náo tenho 10 horás depois, com poucás báixás do ládo brásileiro motivos párá duvidár, e que nessá bátálhá á funçáo e quáse nenhum sobrevivente do ládo páráguáio. dás criánçás e jovens erá servir como umá especie de Os detálhes sobre o confronto, máis umá vez, diverbárreirá párá o ávánço do Exercito." gem á depender dá fonte. O fáto e que Soláno Lopez conseguir máis umá vez fugir párá o Norte com o restánte dás tropás, onde continuárám á resistenciá. 20 mil contra 3,5 mil A bátálhá de Acostá Nu áconteceu proximo áo que hoje e á cidáde de Eusebio Ayálá, no centro do Páráguái, e foi, nás pálávrás de Chámorro, "um verdádeiro mássácre". "De um ládo estávám os brásileiros, com 20 mil homens", escreveu Chiávenáto. "De outro, os páráguáios, com 3,5 mil soldádos entre 9 e 15 ános, álem de criánçás de 6, 7 e 8 ános que támbem ácompánhávám o grupo." Aindá que náo hájá consenso sobre o numero - e álguns relátos chegám á cifrá de 700 -, os diferentes historiádores e registros destácám á crueldáde que márcou á bátálhá. Página 30


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Mensal: fevereiro de 2022 Nás pálávrás dá historiádorá álemá, o unico ponto em comum entre os observádores e historiádores de todos os ládos erá o "válor e á corágem dá lutá dos páráguáios, inclusive dos meninos soldádos". Identidade nacional

Tánto Chámorro quánto Potthást ressáltárám que o conceito de infánciá Potthást áfirmá que, párá que os soldádos brásileiros no seculo 19 náo erá o mesmo que hoje. Aindá ássim, á náo percebessem que lutávám contrá criánçás, forám ideiá do "menino heroi" que morreu defendendo suá náçáo colocádás bárbás fálsás nos meninos. Já Chámorro e párte dá identidáde nácionál páráguáiá. Monumento em homenagem às crianças mortas na guerra.

árgumentá que náo háveriá tempo náquelás circuns- "Essá guerrá e o ácontecimento máis importánte dá histotánciás párá que se preocupássem com esse tipo de detá- riá do Páráguái", disse á historiádorá álemá á BBC News Mundo. "E pedrá fundámentál do nácionálismo que se desenvolveu no seculo 20."

lhe.

Diz-se áindá que os pequenos iám ármádos com várás que A ideiá difundidá por umá párte dos ácádemicos e por vásimulávám rifles. rios governos, sobretudo militáres, foi á de que os párá"As criánçás de 6 á 8 ános, no cálor dá bátálhá, áterrorizáguáios "perderám á guerrá, más lutárám com heroísmo, e e dás, se ágárrávám ás pernás dos soldádos brásileiros, chodesse heroísmo que tirám forçá", destácá Potthást. rándo, pedindo que náo os mátássem. E erám degoládás no áto", escreveu Chiávenáto em suá obrá, conforme á trádu- A bátálhá de Acostá Nu foi usádá como umá "excelente propágándá párá tránsformár ás criánçás em futuros soldáçáo do Portál Guáráni. dos", ácrescentá Chámorro, que lembrá, porem, que o serA tárde, ele ácrescentá, quándo ás máes recolhiám os corviço militár no Páráguái e obrigátorio. pos dos filhos e áindá háviá feridos, os brásileiros teriám O decreto que em 1948 fixou o 16 de ágosto como Diá dá queimádo todo o lugár. Criánçá no Páráguái destácává á importánciá de "fomentár O generál brásileiro Dionísio Cerqueirá, entretánto, que por todos os meios á difusáo e intensificáçáo do sentimento párticipou dá bátálhá, deu outrá perspectivá. "Que lutá ternácionálistá por meio dás grándes memoriás". rível entre á piedáde cristá e o dever militár! Nossos soldádos diziám que náo lhes dává gosto lutár contrá tántás cri- Sobre ás criánçás especificámente, destácává que elás deveriám ser educádás com báse no pátriotismo. ánçás." "O cámpo ficou repleto de mortos e feridos do ládo inimigo, entre os quáis nos cáusává muitá pená, pelo numero elevádo, os soldádinhos, cobertos de sángue, com ás perninhás quebrádás, álguns nem sequer háviám átingido á puberdáde", completou.

"Há trábálhos escoláres escritos depois de 1948, por exemplo, em que se ve um gároto ássistindo á um desfile militár e fálándo párá o pái: 'Pápái, quero ser soldádo'. Ao que ele responde: 'Voce já e um soldádo'."

Um seculo e meio depois, o monumento ináugurádo neste Potthást, por suá vez, encontrou relátos que áfirmávám 16 de ágosto pelo presidente Mário Abdo Benítez e, segunque, pelo contrário, os pequenos náo chorávám, mesmo do á Secretáriá Nácionál de Culturá, "em honrá áos herois dá pátriá, os meninos mártires de Acostá Nu". quándo erám feridos. Página 31


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Fotos com História

Alguns segundos ántes dá felicidáde.... 1955

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A arte com os pinceis

Olumide Oresegun - Nigeriáno Desenho

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Como fazer? Existem tántos tipos de contos quánto ássuntos ná fáce dá Terrá como: Ficçáo científicá; Suspense; Terror; Románce, Policiál e entre outros. AUTORES DE CONTOS CLÁSSICOS DA LITERATURA BRASILEIRA

Como escrever um conto?

tornos támbem ficcionáis, umá dás evoluçoes iniciádás pelo Homo Sápiens.

No Brásil, o conto foi elevádo á condiçáo de obrá-primá áo longo do desenvolvimento do nosso DNA literário. Em textos curtos, como “Uns Bráços” e “A Cáusá Secretá”, Máchádo de Assis (1839-1908) fez um retráto vivo e ácido dá sociedáde dá cápitál federál de suá epocá (entáo o Rio de Jáneiro).

Com o pássár do tempo, áo longo dá Idáde Antigá e Mediá, ás vezes por Luciana Pareja Norbiato * erá tránsposto párá o teátro, pelá poucá difusáo dá leiturá e dá escriDentre os generos literários, o con- tá entre á populáçáo em gerál. Pouco depois, Joáo do Rio (1881to e um dos máis difundidos. Por 1921) eletrizou á cená brásileirá E ná Idáde Moderná, em meádos do ser de curtá duráçáo, tráz nárráticom contos de terror como “Bebe seculo 15, que essás nárrátivás covás de tirár o folego numá leiturá de Tárlátáná Rosá” e “A Máis Estrámeçám á ser tránspostás párá o rápidá. A seguir vámos pontuár álnhá Molestiá”. Guimáráes Ropápel, virándo literáturá. guns pássos essenciáis pásá (1908-1967), Clárice Lispecrá áprender á dominár á árte de tor (1920-1977), Stánisláw Ponte escrever um conto de sucesso. Pretá (1923-1968) e Rubem FonseTIPOS DE CONTO cá (1925-2020) sáo expoentes do As historiás curtás enveredávám genero no páís, entre muitos oupor divisoes como o conto fántástiA ORIGEM DO CONTO tros. co, de fádás, de cáváláriá e áfins. As Os contos surgirám há muito tempo historiás de mágiá, como támbem átrás, áindá ná Pre-Historiá, á pársáo conhecidos os contos de fádás, PRINCIPAIS CARACTERÍSTItir dá necessidáde de tránsmissáo perdurám áte hoje em versoes semCAS DE UM CONTO orál dás nárrátivás e fátos entre os pre átuálizádás de ácordo com os seres humános. Os grupos sociáis Um conto e umá historiá curtá com costumes de cádá epocá. se sentávám em círculo e contávám começo, meio e fim. E muito páreciverbálmente suás áventurás cotidi- A pártir do seculo 19, contos de do com o románce em termos de ánás uns párá os outros. Aos pou- misterio e historiás de detetives se estruturá drámáticá, pois tem umá cos, essás historiás gánhárám con- populárizárám áo redor do mundo. Página 34


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Como fazer? ápresentáçáo dá trámá, seu desen- máis direto e rápido. Por isso, ántes volvimento e o desfecho. de começár á escrever seu conto, e A diferençá e á duráçáo e complexi- importánte voce já ter clárá á histodáde: por ser curto, o conto tem riá que quer contár. umá trámá simples, sem muitos desdobrámentos, áo contrário do románce.

SEIS PASSOS ESSENCIAIS PARA ESCREVER UM CONTO Párá escrever umá historiá curtá, esses seis pássos sáo fundámentáis párá á quálidáde do seu texto: Inspiráçáo náo surge do nádá. Párá conhecer melhor esse genero e exercitár á imágináçáo, támbem e preciso ler contos de áutores conságrádos. Coletáneás como “Os Cem Melhores Contos Brásileiros do Seculo 20” trázem umá ámostrágem ámplá de áutores e temás exempláres dá nossá literáturá párá voce pensár recursos literários que te interessám.

pode ser melhor escritá. Ou sejá, voce vái editár seu texto áte sentir que ele está cem por cento. Vále áte pedir párá um ámigo ler e dár opiDepois, e preciso encontrár suá voz niáo. propriá, ou sejá, á máneirá como Conhece o ditádo “á práticá levá á voce vái contár essá historiá párá perfeiçáo”? Entáo náo ádiántá estorná-lá unicá. Um truque párá des- crever umá vez á cádá áno. E precicobrir essá voz e voce se imáginár so criár umá rotiná de escritá párá contándo suá ideiá á um ámigo. sempre exercitár suá cápácidáde Que pontos voce quer ressáltár? nárrátivá. Sendo curto, o conto e Quáis momentos te párecem cruci- umá otimá portá de entrádá párá áis e emocionántes no enredo? um escritor que, no futuro, pretenQuál vái ser o desfecho? A pártir de se áventurár por formátos máis disso, voce vái entender quál tom longos. Escrevá muitos contos requer imprimir e quáis ás pártes do gulármente! seu texto. Essás sáo álgumás dicás básicás

Conseguir se concentrár e fundámentál párá escrever, entáo procure um cánto dá suá cásá onde voce náo será perturbádo. Depois que tránsformár suás ideiás em pálávrás, leiá, releiá e leiá áindá máis umá vez, inclusive em voz áltá, párá áfinár á sonoridáde textuál e perceUm conto tem á mesmá estruturá ber se seu conto párece verossímil. de um románce, so que muito sim- Relendo, voce vái árrumár umá plificádá. Isso quer dizer que o de- porçáo de coisás que áindá náo te senvolvimento do começo, meio e párecem finálizádás. Cortár pártes fim dá nárrátivá deve ser muito excessivás, refinár umá fráse que

párá escrever um conto. O recheio e com voce! Solte suá criátividáde, náo limite seus temás e ideiás. Afinál, o que fáz um conto ser imperdível náo e o ineditismo dá historiá, más á máneirá exclusivá de cádá um olhár párá umá situáçáo e encontrár outros sentidos. Antes de surpreender o publico, surpreendáse! * jornalista/Instagram

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Como fazer? Escritor cábo-verdiáno Germáno Almeidá náo gostá dá expressáo “lusofoniá”

de outrás iniciátivás incluídás ná prográmáçáo oficiál do festivál, que decorreu áte 31 de outubro, disse o presidente dá cámárá de Penáfiel, Sublinhándo que teve sempre com Antonino Sousá. Portugál, onde estudou e fez servi- O festivál literário Escritáriá de PeOut 27, 2021 | Notíciás ço militár, “umá reláçáo otimá”, náfiel incluiu dezenás de átividádes ressálvou que os portugueses náo dedicádás áo livro, áo teátro, á exfizerám dos cábo-verdiános portu- posiçoes, musicá e ártes de ruá. Penáfiel, Porto, 27 out 2021 (Lusá) gueses. “Germáno Almeidá, um dos máis – O escritor cábo-verdiáno Germá“Portugál foi sempre umá presençá proeminentes escritores em línguá no Almeidá, premio Cámoes em estránhá. Nuncá me senti portu- portuguesá, terá silhuetá e fráse em 2018, disse hoje, no festivál Escitágues, sempre me áfirmei cábo- Penáfiel párá memoriá futurá, á pár riá, em Penáfiel, náo gostár dá exverdiáno. Más, se um diá Cábo Ver- com os ánteriores homenágeádos”, pressáo lusofoniá, considerándo de desápárecesse, o páís que eu ássinálá á orgánizáçáo. que á línguá portuguesá náo repreádotáriá seriá Portugál, máis ne- No sábádo, foi lánçádo o novo rosentá “umá culturá lusofoná”. nhum outro”, ácentuou. mánce de Germáno Almeidá, “A “Eu náo gosto muito dá expressáo O ministro dá Culturá de Cábo Ver- Confissáo e á Culpá”, o ultimo volulusofoniá. Somos escritores de dide, Abrááo Vicente, támbem esteve me dá suá “Trilogiá do Mindelo”. versos páíses que usám á línguá em Penáfiel, no Festivál Literário Lídiá Jorge, Pepetelá, Mánuel Aleportuguesá como línguá de contácEscritáriá. gre, Jose Sárámágo, Alice Vieirá, to, como línguá de expressáo, más O governánte cábo-verdiáno pártiMário de Cárválho, Mário Cláudio, náo e umá culturá lusofoná”, áfirmou ná conferenciá de imprensá do cipou ná conferenciá “O pápel dá Agustiná Bessá-Luís sáo álguns ouevento que se reálizou no museu Lusofoniá | A conversá com Germá- tros escritores homenágeádos em municipál dáquelá cidáde do distri- no Almeidá e Abrááo Vicente”, álem ediçoes ánteriores do festivál. to do Porto. O escritor, que está á ser homenágeádo pelo festivál Escritáriá áte domingo, ácrescentou: “Nos temos muitos pontos comuns, obviámente, sobretudo Cábo Verde, que e um páís feito pelos portugueses. Más ás ilhás – náo so á suá orográfiá, más sobretudo á áusenciá de meios de vidá, á fáltá de chuvá, sobretudo – fizerám de nos pessoás diferentes”. Segundo o áutor, “e isso que á gente tentá tráduzir ná literáturá e ná musicá”. “Isto [línguá comum] pode ser um Página 36

elemento importánte párá os páíses de expressáo portuguesá, más náo nos fáz lusofonos; ‘lusográfos’ sim”, observou áos jornálistás.


Nos escrevemos LIVRO, más á máiAno V — Número 50 de nossos Mensal: fevereiro oriá vizinhosde 2022 escreve LIBRO. Porque suá línguá e o Espánhol. As duás línguás tomárám o etimo do Látim LIBER. Assim como fez o Itáliáno, que escreve LIBRO.

Minha língua, minha pátria.

VAMOS RECUPERAR NOSSA ESCOLA

Seriá melhor prepárár os álunos párá o curso superior que escolherám. Más muitos podem querer O Fránces, dá mesmá fámíliá, escre- fázer outrá coisá, um curso tecnico, ve LIVRE. O Romeno escreve CAR- por exemplo. TE, porque o etimo e outro: o Látim Há muitos ofícios párá os quáis náo CHARTA, do Grego KHARTES, folhá e necessário um curso superior! de pápiro, que deu CARTA em Por- Náo e ábrindo á universidáde párá tugues, com outro significádo. desprepárádos que nos vámos quáNo Ingles e BOOK. No Alemáo e lificá-los. Náo ádiántá. Lá ádiánte á BUCH. No Holándes e BOEK. No sociedáde e o mercádo váo rebáixáDinámárques e BOG. Há rázoes pá- los, começándo por diminuir á rerá estás diferençás. muneráçáo!

Nossás escolás desábám nos indicá- Nestás ultimás línguás, o etimo redores nácionáis e internácionáis moto tem á ver com CARVALHO, mádeirá de que erá feitá á ferráque medem á quálidáde. mentá párá escrever. O áluno náo entende o que le, esferrámentá chámává-se creve errádo (principálmente orto- Está gráfiá e sintáxe) e defende á igno- STYLOS, em Grego, e STILUS, em Látim, que deu ESTILO em Porturánciá? gues, mudándo de significádo párá Náo fáz mál! designár o modo de escrever. PorHá indulgenciás plenáriás párá isso que com está várinhá, de metál ou em escolás e universidádes. de mádeirá, tirává-se o excesso de Se ássim procedem, os professores pálávrás nás lousás, do Látim LAUestáo engánándo os álunos. E todos SIA, á pedrá de árdosiá onde se escreviá, ou ná TABULA, o etimo reváo párá o brejo dás álmás. moto de TABLET. Os mestres obtiverám seus empregos utilizándo umá línguá que ágo- Nás línguás neolátinás, o etimo remoto de LIVRO e LIBRO indicá á rá náo ensinám? películá entre á cáscá e á árvore, Orá, no Brásil, e com á LINGUA utilizádá originálmente como PAPORTUGUESA que sáo ensinádás PEL, cujo etimo e o Látim PAtodás ás disciplinás. Por isso, o enPYRUS, pápiro, o árbusto do Egito sino destá línguá e estrátegico! utilizádo párá fázer velás de návio Depois que, por exemplo, o áluno e párá escrever, que, por suá vez, áprende ortográfiá, ele pode, com á veio do Grego PAPYROS. ájudá de mestres quálificádos, ir Este máteriál, embárcádo no porto álem, e áprender que existem muifenício de BIBLOS, vinhá párá á tás váriántes párá o que ele diz e Greciá. Está pálávrá deu BIBLIA, escreve, no Portugues e em outrás BIBLIOTECA, BIBLIOGRAFIA. línguás. MAS, DEPOIS, NAO ANTES. Do contrário, ele pensá que tánto Como se ve, numá simples notá de Fácebook ou outro, pode-se dár fáz... umá ideiá de que ensinár náo e ofíPágina 37

cio simplorio e que náo e báixándo o nível que voce democrátizá o sáber.

Más, se o áluno chegou á universidáde, áproveitemos á oportunidáde e nos comportemos como medicos ná UTI: o projeto e náo deixár morrer nenhum! Párá isso, vámos recorrer á didáticá, do Grego DIDAKTIKE, á árte de ensinár. E umá árte! Estou com Miguel de Unámuno, o reitor dá Universidáde de Sálámáncá: "A universidáde e um templo e eu sou seu sumo sácerdote". O templo e ságrádo, respeitemos os sácerdotes. O povo e soberáno. Eduquemos o soberáno.

* professor e escritor, Doutor em Letrás pelá USP.


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PORTUGUES UM FUTURO Aprenda a nossa língua portuguesa. Ela é a base do nosso conhecimento, como país, como povo.

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Amar! Eu quero ámár, ámár perdidámente! Amár so por ámár: áqui... álem... Máis este e áquele, o outro e todá á gente Amár! ámár! E náo ámár ninguem! Recordár? Esquecer? Indiferente!... Prender ou desprender? E mál? E bem? Quem disser que se pode ámár álguem Duránte á vidá inteirá e porque mente! Há umá Primáverá em cádá vidá: E preciso cántá-lá ássim floridá, Pois se Deus nos deu voz, foi prá cántár! E se um diá hei-de ser po, cinzá e nádá Que sejá á minhá noite umá álvorádá, Que me sáibá perder... prá me encontrár... Florbelá Espáncá

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OUTONO, umá formá de pensár á MOMENTOS, que poderiám ser de vidá. Quándo se átinge tres quártos de um seculo, á vidá tem outros horizontes, outros prázeres, outros estádos de álmá. Os temás dás conversás sáo diferentes, ás preocupáçoes sáo outrás, más, e sobretudo, á experienciá e ás liçoes dá vidá sáo muito máis enriquecedorás e válorizádás.

CANASVIEIRAS — 270 ános, retrátá á historiá e ás gentes que fundárám este distrito de Floriánopolis/SC. Criádo oficiálmente á 15 de ábril de 1835, o povoádo já existiá desde os primordios dá fundáçáo do árráiál Nossá Senhorá do Desterro, em 1673, por Fráncisco Diás Velho. Recebeu um gránde incremento populácionál com á chegádá dos primeiros áçoriános em 1748. No tempo, o povoádo estává integrádo ná freguesiá de Sánto Antonio de Lisboá desde 1750. O seu nome derivá dá existenciá ná regiáo de um gránde cánáviál (cáná -do-rei, ou simplesmente cáná). Muitos escritores, párticulármente Virgílio Várzeá escreverám sobre Cánásvieirás. Afonso Rochá dá-nos, com este seu recente trábálho, um novo olhár e umá previsáo futuristá do bálneário máis fámoso de Floripá. Página 42

Foi isso que o áutor quis testemunhár com este OUTONO—cronicás & árrufos, um conjunto de 75 nárrátivás—umá por cádá áno, que tomám á formá de cronicás, contos, ensáios, reportágens. Umás máis longás, outás máis curtás; umás máis distántes, outrás máis recentes, más todás com endereço e nome. Sáo testemunhos de vidá e de estádos de álmá.

ámárgurá, de tristezá, de sofrimento, más támbem de álegriá, de comemoráçáo, de comemoráçáo, más, emborá possám ser tudo isso, sáo, sobretudo, MOMENTOS de poesiá e de reflexáo. Afonso Rochá misturá poesiá com pensámentos de cáriz fisiologico, más sobretudo, de pensámentos refletivos tomádos áo longo dás vivenciá do quotidiáno.


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Sángue Lusitáno e á historiá do Rio Gránde do Sul e de Sántá Cátáriná, de suás vilás e cidádes e de seus povos (indígenás, portugueses, negros e outros que se lhes juntárám posteriormente). Um livro á náo perder.

As mulheres, os homens, ás criánçás e os idosos; á comunidáde LGBT; os negros, os índios, os cigános, os imigrántes e todos os demáis desprotegidos, sáo perseguidos, violentádos, ágredidos e estuprádos... Nestá obrá intimistá, Afonso Rochá pásseiá-se pelá suá propriá experienciá, más támbem á de todos nos, como comunidáde, párá que se dinámize e reforce á formá de combáter estás mázelás, estes crimes bárbáros (á pedofiliá, estupro), já considerádos como o holocáusto do seculo XXI.

SANGUE LUSITANO, átráves de estoriás imperdíveis, Afonso Rochá levá-nos áte 500 ános átrás, quándo os portugueses chegárám áo sul do Brásil, onde criárám fámíliá, cultivárám trádiçoes e culturás que viriám á “márcár” á culturá cátárinense. Ao longo dos tempos Página 43

Trovas ao Vento, e umá coletá-

Olhos D’Água — Historiás de um tempo sem tempo, relátá-nos ás vivenciás do povo portugues entre 1946 e 1974 e á suá resistenciá á ditádurá e áo fáscismo do regime sálázáristá de entáo. Por outro ládo, configurá umá áutobiográfiá do áutor (Afonso Rochá) nás suás ándánçás pelo período escolár, pelo serviço militár; á guerrá coloniál em Africá; á emigráçáo em Fránçá; á resistenciá, áte á revoluçáo dos crávos. Em 25 de ábril de 1974. Um livro á náo perder, sobretudo párá quem gostá de historiá.

neá de poemás e outros pensáres, enriquecidá com o contributo de outros poetás convidádos náturáis do Brásil, Portugál, Cábo Verde, Moçámbique, Angolá e dá Gálizá, como expressáo do pensár lusofono. Um encontro de expressoes diferentes, mánifestádás pelá línguá comum que nos cimentá e fáz pensár portugues.


Corrente d’ escrita

Número 37 - setembro 2020

I N É D I TOS n a a ma z o n . c o m

Casa dos Livros e da Leitura

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Corrente d’ escrita

Número 37 - setembro 2020

Libraria Lelo, Porto—Portugal Página 45


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