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COMENTÁRIO BÍBLICO DO

MUNDO Comentário Bíblico

Matthew Henry Obra Completa – Novo Testamento

Publicado há cerca de trezentos anos, este comentário tornou-se referência obrigatória para os estudiosos da Palavra de Deus ao revelar os mais preciosos tesouros escondidos nos textos dos profetas e apóstolos de nosso Senhor. Após o sucesso da versão condensada, focada nos comentários devocionais de Matthew Henry, a CPAD lançará a obra completa deste clássico que resiste ao tempo. Inicialmente são lançados os dois volumes do Novo Testamento, um de Mateus a João e o outro de Atos a Apocalipse, de uma coleção transcrita dos originais, que conserva toda temática vibrante deste clássico.

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Ilustração de capa: Rubinho Pirola

SUMÁRIO

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PRIMEIRAS PALAVRAS

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CARTAS E MENSAGENS

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SOCIEDADE

Campanha contra legalização do aborto no país une católicos e evangélicos em torno de bandeira comum

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FRASES E PENSAMENTOS

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CH INFORMA

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EVANGELISMO

Projeto Minha Esperança, da Associação Billy Graham, quer levar milhões de brasileiros aos pés de Cristo

POLÊMICA

Investigação sobre megaministérios nos EUA reacende a discussão sobre liberdade religiosa

CAPA

Evangelistas descobrem o poder das novas tecnologias para levar a Palavra de Deus a toda criatura

MULHER Esther Carrenho

MISSÕES

Empresas geridas por crentes combinam a busca pelo lucro com vocação missionária e ação social

IGREJA Ed René Kivitz REFLEXÃO Ricardo Agreste SOLIDARIEDADE

Navios levam socorro médico e esperança a populações carentes do Terceiro Mundo

PAVAZINE CH DIGITAL CINECULT SONS DO CORAÇÃO ENTREVISTA

O teólogo René Padilla afirma que perspectiva cristã é a única viável para diminuir desigualdades na América Latina

LIVROS E RESENHAS OS OUTROS SEIS DIAS ÚLTIMAS PALAVRAS

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40 42 44 48 50 52 54 56 60 63 64

Perguntas sobre CH Como posso contatar a redação da revista? Envie um e-mail para redacao@cristianismohoje.com.br ou escreva para o endereço postal: Caixa Postal 107.006, Niterói (RJ) – CEP 24.360-970. Inclua seu nome e endereço completos

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Posso reimprimir ou publicar algum artigo da revista? Autorizamos para as publicações não-comerciais, desde que citada a fonte: Copyright © 2007 por Cristianismo Hoje. Para o caso de publicações comerciais, entrar em contato com a redação pelo e-mail redacao@cristianismohoje.com.br ou escreva para o endereço já mencionado

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PRIMEIRAS PALAVRAS Revista Cristianismo Hoje A verdade com conteúdo evangélico www.cristianismohoje.com.br

Tempo de mudanças

A

As novas tecnologias chegaram para revolucionar o mundo – e a fé cristã, evidentemente, não poderia ficar de fora. Se, em tempos passados, o computador chegou a ser visto como instrumento do mal por muitos crentes, hoje essa máquina é ferramenta para edificação do povo de Deus. E mais: através dele, evangélicos antenados estão descobrindo variadas e eficientes formas de evangelização. Será que algo novo relativo à grande comissão da Igreja está surgindo no cenário virtual? Nesta edição, o repórter especial Cláudio Neves fez uma ampla pesquisa sobre como as modernas tecnologias da informação podem ser utilizadas para trazer almas aos pés de Cristo. Já há evangelistas virtuais que dão até expediente diário na frente do computador em busca dos perdidos. O número 3 de CRISTIANISMO HOJE mostra também como dois grupos cristãos com posturas teológicas bem diferentes em algumas áreas uniram-se para levantar uma mesma bandeira. Católicos e evangélicos se mobilizaram para barrar a legalização do aborto no Brasil, fazendo coro ao posicionamento contrário da maioria da população brasileira. Valter Gonçalves Jr, nosso repórter em Brasília, mostra como isso aconteceu e traça um panorama dos diversos aspectos políticos, éticos e religiosos envolvidos no tema. Na reportagem Ministérios em alerta, a revista trata da investigação que um senador está movendo em face de grandes ministérios evangélicos dos Estados Unidos. A intenção alegada pelo parlamentar é descobrir eventuais irregularidades financeiras e administrativas, mas há quem enxergue na iniciativa um atentado à liberdade religiosa. Aqui no Brasil, a questão também ferve, envolvendo o jogador de futebol Kaká. O Ministério Público de São Paulo está inquirindo o jogador acerca de suas relações com a Igreja Renascer em Cristo e quer saber até mesmo quanto o atleta doou à denominação nos últimos anos. Ciente de seu papel na informação do povo de Deus e da liderança evangélica, CRISTIANISMO HOJE abre espaço para esta discussão: quais os limites entre o poder temporal e a religião? Esta edição traz também uma entrevista com um dos mais respeitados teólogos de nosso tempo. René Padilla, participante do célebre Congresso de Lausanne de 1974 e um dos fundadores da Fraternidade Teológica Latino-americana, falou com exclusividade sobre o Cristianismo contemporâneo e os desafios de se desenvolver, aqui em nosso continente, um pensamento teológico condizente com a noção do Evangelho integral. Para ele, a fé só faz sentido se for professada em favor do próximo. “E esta nobre causa está avançando”, entusiasma-se o veterano intelectual cristão. Nós, os editores, esperamos que o leitor seja edificado e desafiado por mais este número de CRISTIANISMO HOJE. Marcos Simas Editor

Quem somos Cristianismo Hoje é uma publicação evangélica, nacional e independente, que tem como objetivo informar, encorajar, unir e edificar a Igreja brasileira, comunicando com verdade, isenção e profundidade os fatos ligados ao segmento cristão, bem como o poder transformador do Evangelho a todos os seus leitores

A revista tem uma parceria com o grupo Christianity Today International, um dos mais importantes grupos de mídia cristã do mundo, com 11 revistas e 28 sites de conteúdo Conselho Editorial Carlo Carrenho, Carlos Buczynski, Eleny Vassão, Eude Martins da Silva, Marcelo Augusto Souto, Mário Ikeda, Mark Carpenter, Nelson Bomilcar, Richard Werner, Ronaldo Lidório, Volney Faustini e William Douglas Editor Marcos Simas Diretor de redação e jornalista responsável Carlos Fernandes – MTb 17336 Jornalistas desta edição Cláudio Neves, Deann Alford, Joe Maxwell e Valter Gonçalves Jr Colunistas Carlo Carrenho, Luciano Vergara, Nataniel Gomes, Nelson Bomilcar, Rubinho Pirola, Sérgio Pavarini e Whaner Endo Tradutores Pedro Bianco e Karen Bomilcar Revisores Alzeli Simas e Paulo Pancote Colaboradores desta edição Carlinhos Veiga, Carlos Queiroz, Ed René Kivitz, Esther Carrenho e Ricardo Agreste Projeto gráfico oliverartelucas Publicidade publicidade@cristianismohoje.com.br Assinaturas 0800 644 4010 assinatura@cristianismohoje.com.br Caixa postal 2351 Brasília, DF CEP 70842-970 Informações e permissões para republicação de artigos faleconosco@cristianismohoje.com.br Distribuição MR Werner Distribuidora de livros Ltda. CLN 201 - Bloco C Subsolo - Asa Norte Brasília - DF - CEP 70832-530 CNPJ 06.013.240/0001-07 – IE 07.450.716/001-45 Impressão Gráfica Ediouro Tiragem - 20.000 exemplares Endereço editorial Caixa Postal 107.006 Niterói - RJ - CEP 24360-970 Cristianismo Hoje é uma publicação da Msimas Editora Ltda. CNPJ 02.120.865/0001-17 ISSN 1982-3614


Cartas e mensagens

A revista CRISTIANISMO HOJE está dentro de uma tradição de jornalismo cristão sério, dedicado à reflexão teológica sobre temas atuais, características de Christianity Today. Seu público-alvo são pessoas que adotam a fé cristã e têm liderança em várias frentes do multifacetado trabalho da Igreja. A revista nunca perdeu o foco na evangelização e no desenvolvimento de uma fé engajada nos assuntos desta vida e nos da eternidade. Por isso, saudamos com alegria a chegada da versão brasileira deste veículo de comunicação. Sem dúvidas, há espaço para este tipo de publicação no mercado editorial. Desejamos êxito ao projeto, fazendo votos de que alcance os seus propósitos na saudável linha editorial proposta. Erní Walter Seibert, pastor e presidente da Associação dos Editores Cristãos São Paulo (SP)

deiros descendentes da Igreja reformada; “eles”, porém, têm a teologia torta e envergonham o Evangelho puro e o nome de Jesus (...) Com a reportagem Brasil e o artigo Igreja [edição 1], CRISTIANISMO HOJE se iguala às demais revistas evangélicas que dão voz àquele dualismo. Entendo que o irmão Max Lucado tem razão quando diz que precisamos de um Evangelho simples [em entrevista na mesma edição]. Peço ao Pai que os abençoe nesta tarefa de fazer uma revista séria. Felipe Henrique Via internet

Primeiramente, quero parabenizá-los pela excelente revista lançada. Ela tem qualidade não só no conteúdo, mas na edição gráfica e no material utilizado. Entendo que a reflexão teológica é algo importante e que o debate faz parte da construção do pensamento (...), mas o que tenho visto é um dualismo entre o que se poderia chamar de “nós” e “eles” – “Nós”, os evangelicais, e “eles”, os fundamentalistas. Com esta forma de analisar a história, a situação atual e a teologia da Igreja brasileira, declara-se que “nós” temos a melhor teologia e somos os verda-

Fiquei feliz ao conhecer a revista CRISTIANISMO HOJE. Li e reli algumas matérias da edição atual [número 1], e através delas me emocionei e fui desafiada, principalmente através da reportagem Inocentes sob risco. Espero que os leitores sejam desafiados pela razão, emoção e sobretudo, pelo espírito do cristianismo verdadeiro. Que o Deus Trino continue a abençoá-los! Angela Tangerino Via internet

CRISTIANISMO HOJE é maravilhosa! Seus colaboradores são especiais e ela tem tudo para ser bem aceita nos grandes centros e também no interior do nosso país. Continuem assim, sendo sempre criteriosos nos artigos da revista. Francisca Rosa Oliveira Via internet

Costumamos valorizar o livro cristão porque ele é capaz de tratar assuntos teo-

lógicos complexos de maneira profunda e sistemática. A revista cristã, porém, tem a vantagem da agilidade e da contextualização imediata das grandes questões que atingem nossa sociedade pós-moderna. Portanto, parabenizo os editores de CRISTIANISMO HOJE, pois o público brasileiro precisa de abordagens sérias e atuais, elaboradas a partir de uma cosmovisão verdadeiramente bíblica. Curtis Alan Kregness, vice-presidente de Edições Vida Nova São Paulo (SP) Recebi a primeira edição de CRISTIANISMO HOJE [Outubro/novembro]. Gostei muito, pois pareceu-me que sua preocupação não é com projetos políticos ou simplesmente com faturamento, mas com oferecer um conteúdo sério. Ela preenche uma lacuna que faltava. Espero que continue assim. Isaltino Gomes Coelho Filho, pastor e escritor Via internet Por necessidade de clareza e em função do espaço disponível, CRISTIANISMO HOJE reserva-se o direito de editar as cartas que recebe, adaptando sua linguagem ou suprimindo texto.

Erramos • A tradução do artigo publicado na edição 2, A maldição da culpa, de autoria de John Piper foi feita por Claudia Ziller Faria.

Humor

Rubinho Pirola

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SOCIEDADE

José Cruz/ABr

Posição ma Mobilização de católicos e evangélicos colabora para rejeição ao aborto, mas tema deve permanecer na agenda nacional

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Católicos e evangélicos em manifestação contra o aborto: condenação à legalização uniu diferentes grupos religiosos em Brasília

Valter Gonçalves Jr

Em 2007, uma mobilização raramente vista no Brasil uniu católicos e evangélicos, que, contando com o apoio da maioria da população, conseguiram barrar a tentativa do Ministério da Saúde de descriminalizar o aborto no país. Uma passeata chegou a unir milhares de fiéis da Igreja Católica e de várias denominações evangélicas na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, para protestar contra a inten-

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ção demonstrada pelo ministro da Saúde, José Gomes Temporão. E, ao final da 13ª Conferência Nacional de Saúde, em novembro, 70% dos cerca de 5 mil delegados, representando conselhos de saúde de todo país, decidiram rejeitar a proposta de legalizar totalmente a prática do aborto – hoje, a interrupção forçada da gravidez só é legalmente admitida em situações muito específicas (ver quadro na pág. 12).


A conferência, que acontece a cada quatro anos, traça as diretrizes da saúde pública, o que demonstra a dificuldade do governo de seguir em frente com a agenda próaborto. O próprio Temporão havia colocado o assunto na berlinda ao longo do ano. Suas declarações sobre o assunto – “Quem não reconhece que aborto é questão de saúde pública está delirando” e “não se pode prescrever dogmas de uma religião para a sociedade inteira” – causaram intensa reação de entidades como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a CNBB. A pressão de setores do governo em favor de uma nova legislação sobre o tema intensificou-se depois da visita do papa Bento XVI ao país, em maio. O líder católico fez questão de defender o que chamou de “direito à vida” e expressar a condenação do Vaticano à prática do abortamento. E, apesar da vitória dos opositores, verificada na 13ª Conferência Nacional de Saúde, a polêmica, em relação à qual evangélicos e católicos levantaram a mesma bandeira, continua. O projeto de lei 176/95, do deputado federal José Genoino (PT-SP), que legaliza o aborto no Brasil, ainda tramita na Câmara dos Deputados, junto a outra proposta semelhante, o PLC 1135/91, dos ex-deputados Eduardo Jorge e Sandra Starling, do PT. O relator da Comissão de Seguridade Social e Família, deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), é contra o projeto, que obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) e toda a rede conveniada a interromper a gravidez da mulher que reivindicar esse tipo de intervenção, desde que o faça durante os primeiros três meses de gestação. Para reforçar sua posição, a CNBB deu à Campanha da Fraternidade de 2008 o tema “Fraternidade e defesa da vida”. O secretário-geral do órgão, Dom Odilo Scherer, considera o aborto uma opção “cruel e imoral” e lembra que o feto precisa de proteção. “Proteger, defender e promover a vida é tarefa primordial do Estado, sobretudo a vida indefesa e frágil, como a dos seres humanos ainda não nascidos”, declara Scherer, que também enviou carta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva nos mesmos termos. A campanha católica, baseada no versículo bíblico “Escolhe, pois, a vida” (Deuteronômio 30.19), tem a simpatia da maioria da população. De acordo com pesquisa do instituto Datafolha, divulgada no ano passado, a ampla maioria dos brasileiros se posiciona contra a legaliza-

Massa contrária – No site de relacionamento Orkut, na internet, cerca de mil comunidades virtuais tratam do assunto. Quase todas contrárias ao aborto. A maior delas, chamada “Aborto, não!”, reúne 71 mil membros. Em seguida vem a comunidade “Amo a vida”, com 46 mil participantes. Dentre as dez maiores comunidades que discutem o tema, apenas uma – a “Aborto não deve ser crime”, com 10 mil integrantes – apóia a eventual mudança na lei brasileira. Em muitos sites circula o relato do médico americano Bernard Nathanson, que foi dono de uma clínica que teria sido responsável por 75 mil abortos. Autor do livro The hand of God (“A mão de Deus”), ele mudou de idéia no final dos anos 70, quando técnicas de ultrassonografia começaram a mostrar o que antes não se via – a face do feto no ventre da mãe. Como resultado, o médico converteu-se ao Cristianismo. “A Bíblia reconhece que já há ser humano no momento da concepção, da união do óvulo com o espermatozóide”, observa o pastor luterano Flávio Hörlle , do Paraná, em reflexão sobre o mandamento bíblico “Não matarás”. Ele cita diversos trechos das Escrituras que demonstram

Fabio Pozzebom/ABr

rcada

ção do aborto, que é visto como “moralmente errado” por 87% dos entrevistados. Todas as faixas da população, de diferentes classes sociais e níveis de escolaridade, se mostraram contrárias à prática. O maior apoio à legalização é observado nas famílias com renda superior a 20 salários mínimos por mês – mesmo entre elas, contudo, 69% desaprovam a autorização ao abortamento.

O presidente Lula e o papa no Brasil: em sua visita, o líder católico fez questão de defender o “direito à vida”

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Fabio Pozzebom/ABr

SOCIEDADE

a singularidade do ser em gestação. Como este, no livro do profeta Isaías (49.1): “Eu ainda estava na barriga da minha mãe quando o Senhor Deus me escolheu; eu nem havia nascido, quando ele me chamou pelo nome”. De fato, a imensa maioria das igrejas evangélicas brasileiras, que, ao contrário dos católicos, não se opõem ao planejamento familiar, firmam posição contra a prática do aborto, ato visto como pecado diante de Deus. A Igreja Presbiteriana do Brasil se manifesta publicamente contra a legalização, com exceção do abortamento feito quando há grave risco para a vida da mulher, conforme estabelece a lei brasileira. Batistas vão pelo mesmo caminho, e classificam o aborto simplesmente como crime. Entre metodistas, assembleianos e evangélicos em geral, tradicionais ou pentecostais, a opinião costuma ser a mesma, seguindo uma tradição que remonta aos primórdios do Cristianismo, quando os Pais da Igreja já proibiam matar a criança no útero. Clandestinidade – Grupos feministas, que clamam pelo suposto direito da mulher de decidir pelo desenvolvimento ou não da gravidez, reconhecem que estaria havendo “uma nova onda conservadora”, antiaborto. Em entrevista à Agência Carta Maior, Carla Batista, secretária executiva da Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), credita o fortalecimento da oposição ao aborto à suposta agressividade do discurso dos opositores. “A mídia tem um papel posicionado nesta história, o que faz com que a questão seja encarada a partir de uma visão religiosa e o debate não seja levado para o campo laico”, reclama, sem levar em conta que os

O bispo e o aborto

D

estoando da grande maioria dos líderes evangélicos brasileiros, o bispo Edir Macedo, fundador da Igreja Universal do Reino de Deus, causou surpresa ao Macedo: posição polêmica defender o aborto. No livro O bispo, que conta sua trajetória, Macedo se diz favorável à legalização do aborto. Ele diz basear-se num trecho do livro de Eclesiastes (6.3): “Se alguém viver cem anos e não se fartar do bem, um aborto é mais feliz do que ele”. A Rede Record, controlada por Macedo, foi ainda mais longe. A emissora colocou no ar uma propaganda institucional a favor do direito de as gestantes interromperem uma gravidez indesejada. Ao fim, a vinheta Record – Aborto, responsabilidade social soou para muitos como mais uma provocação do grupo Universal a suas arqui-rivais, a Rede Globo e a Igreja Católica.

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Durante a 13ª Conferência Nacional de Saúde, delegados firmaram posição contrária à proposta do governo

maiores veículos de comunicação do país adotam visão secular, desvinculando-se de qualquer perspectiva cristã. Os argumentos mais fortes dos abortistas, mencionados pelo ministro Temporão, se referem à quantidade de abortos clandestinos e de mulheres que acabam vitimadas por procedimentos precários para a interrupção da gravidez. Segundo o Ministério da Saúde, o abortamento é um dos mais graves problemas de saúde pública do Brasil. Em 2006, mais de 230 mil internações para curetagens relacionadas a abortos espontâneos – normalmente, de causas naturais – e inseguros (feitos de forma clandestina) foram realizadas pelo SUS, ao custo de R$ 33 milhões. Os casos de abortamentos legais foram responsáveis por duas mil internações. Uma polêmica envolve o número de óbitos de mulheres vítimas de procedimento precário para interromper a gravidez. O ministro mencionou “milhares de mortes por ano”. A Pastoral da Família da CNBB refuta o número, apesar de reconhecer, mesmo assim, a gravidade da situação. De fato, em 2005, o DataSUS contabiliza 1,6 mil óbitos de mulheres, mas eles se referem a todas as vítimas de complicações vinculadas à gestação, ao parto, ao abortamento e ao período pós-parto. E, para muitos especialistas, dada a precariedade do sistema de saúde, a legalização do aborto não mudaria esse quadro. A deputada gaúcha Luciana Genro (PSol), que apresentou na Câmara dos Deputados um projeto de lei para permitir o aborto no caso de fetos anencéfalos – tipo de malformação caracterizado pela ausência de cérebro, o que causa a morte do bebê logo após o parto –, reconhece que interromper uma gravidez não é nada trivial. “Independentemente de conceitos religiosos, é indiscutível que o aborto provocado é uma agressão. Ninguém, em sã consciência, poderia ser a favor”, opina. Para o pastor e teólogo batista Lourenço Stelio Rega, considerado referência evangélica na área da ética cristã, as tentativas de legalização do abortamento é fruto de



SOCIEDADE

uma visão equivocada da vida humana. “A questão gira em torno da busca por direitos, sem se considerar deveres. Fala-se muito, por exemplo, nos supostos direitos da mulher sobre seu corpo, mas isso deixa de levar em conta que o feto não pediu para ser gerado”, argumenta. “Assim, o nascituro, que é a parte mais fraca, acaba sendo eliminado.” Stelio lembra ainda que a prática do aborto tem servido, em grande parte, para resolver o problema da paternidade irresponsável. Embora admita a interrupção da gravidez para preservar a vida da gestante, – “É o caso da gravidez ectópica ou tubária, por exemplo” –, o religioso defende que mesmo em casos de estupro, a família deve considerar a possibilidade de permitir o nascimento da criança. “Caso a situação seja insuportável para a mãe, ainda sobra a possibilidade de adoção”, sugere.

Divulgação

Divulgação

Planejamento – Para muita gente, contudo, não basta condenar o aborto: é preciso oferecer alternativas para que ele não se concretize. No Brasil, 20% das mães são adolescentes, na maioria das vezes vivendo a indesejada experiência de ter filhos. Em 2005, segundo o DataSUS, dos três milhões de partos realizados na rede pública, 661 mil foram de mães entre 10 e 14 anos. A Igreja Evangélica Exército da Salvação mantém um programa dedicado a informar adolescentes, por meio de palestras em escolas, templos e comunidades, sobre como evitar a gravidez precoce. E, desde 1938, a entidade conta com um abrigo para receber meninas e jovens grávidas em situação de abandono e pobreza. Elas são encaminhadas pelas Varas de Infância, pe-

Barak Obama e Hillary Clinton: democratas usam o tema em suas campanhas

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Dentro e fora da lei

O

Código Penal brasileiro estabelece pena de um a três anos de detenção à gestante que provocar aborto em si mesma ou consentir que alguém o provoque. Já quem pratica o abortamento em outra pessoa tem prevista a pena de reclusão de um a três anos se há consentimento da gestante; e de três a dez anos se fizer o aborto à revelia da mãe. A lei brasileira permite o aborto nos casos em que não há outro meio de salvar a vida da mãe e também nos casos de gravidez provocada por estupro.

los Conselhos Tutelares e pelos Centros de Referência para Crianças e Adolescentes de São Paulo, onde fica a casa. “As adolescentes chegam confusas por terem engravidado sem nenhum planejamento”, explica a coordenadora do projeto, a psicóloga Lilian Silva dos Santos. O albergamento pode se estender por até dois anos, período em que o bebê recebe atenção especializada e a mãe pode se preparar para tocar a vida, aprendendo uma profissão. O projeto, chamado Rancho do Senhor, recebe apoio do governo da Holanda e está sendo ampliado. “As moças descobrem aqui que podem planejar sua família, que têm o poder de escolha. As que não sabem disso acabam tomando decisões incentivadas pelos grupos nos quais estão inseridas ou pelos padrões que a sociedade impõe”, declara Lilian, observando que, mesmo com as dificuldades que enfrentam, as jovens atendidas pelo Exército da Salvação não manifestam o desejo de abortar.

Polêmica que rende votos

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os Estados Unidos, a questão do aborto se transformou em um divisor de águas entre conservadores e liberais. Passada a onda feminista, que ainda nos anos 1960 teve força suficiente para dar à mulher o direito de escolha de prosseguir ou não com a gravidez, o país tem assistido a uma longa e apaixonada disputa entre os ativistas contrários e os favoráveis ao aborto. Enquanto as clínicas especializadas e os poderosos laboratórios farmacêuticos que comercializam fetos são apontados como vilões por ativistas em defesa da vida, os liberais carimbam como fundamentalistas religiosos os que se manifestam contra a prática do aborto. Os cristãos conservadores se engajaram politicamente, tentam reverter as leis próaborto e têm rejeitado os candidatos favorá-

veis à manutenção dessa prática. Agora em 2008, ano de eleição presidencial nos EUA, o assunto promete ferver na América. Este ano, mais uma vez o Partido Democrata – que deve escolher seu candidato entre os senadores Hillary Clinton e Barack Obama – empunha a bandeira a favor de se dar às gestantes o direito de decidir entre fazer ou não o abortamento. Detalhe é que tanto Hillary quanto Obama se confessam protestantes, sendo que ele vai com sua família à igreja evangélica regularmente. Do lado do Partido Republicano, o ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani , é católico, mas no quesito aborto destoa entre os pré-candidatos à Casa Branca: declara-se favorável, mas prometeu que, uma vez eleito, vai nomear para a Suprema Corte juízes contrários, o que provavelmente aumentaria as restrições à prática. Os demais candidatos – o general John McCain, o milionário mórmon Mitt Romney e o ex-pastor batista e ex-governador do Arkansas Mike Huckabee – seguem a cartilha republicana à risca e se apresentam aos eleitores combatendo o aborto.



Frases e pensamentos

Milagres e o sobrenatural Cada milagre escreve para nós em letras miúdas aquilo que Deus já escreveu, ou escreverá, em letras quase grandes demais para serem notadas, através de toda a tela da natureza. C. S. Lewis, em Milagres Noto que a Bíblia está repleta de gente comum que foi a lugares impossíveis e fez coisas prodigiosas simplesmente porque decidiu obedecer a Deus, mesmo quando os outros diziam: “Você não pode fazer isso”. Irmão André, em Desafiando os limites da fé

natural, ele pode crer em qualquer milagre, em qualquer tempo. G. K. Chesterton, em Ortodoxia Na busca por Deus, muitas pessoas tendem a procurar pelo miraculoso e o sobrenatural. Em vez disso, deveríamos prestar atenção no comum: despertar, dormir e, acima de tudo, sonhar; aquilo que lembramos e esquecemos, o que nos faz sorrir e chorar, o que nos alegra e o que nos deprime. Philip Yancey, em Alma sobrevivente

Há no cosmos, vivo e que respira, algo misterioso, maravilhoso e tremendo, acima da compreensão de todas as mentes. O crente não alega entender tudo. Ele cai de joelhos e sussurra: “Deus!” A. W. Tozer, em À procura de Deus

Um milagre é o sinal do amor de Jesus, que anseia por curar a cada um de nós. Para que possamos nos tornar verdadeiramente vivos e crescer em amor. Jean Vanier, em Drawn Into the Mystery of Jesus Through the Gospel of John (Tragado para o mistério de Jesus através do Evangelho de João)

Se um homem crê numa inalterável lei natural, ele não pode crer em nenhum milagre em nenhuma época. Se um homem crê em uma vontade por trás da lei

Um milagre de cura não é apenas um espetáculo mágico, nem um rompimento na ordem de Criação ou algo sobrenatural. Ao invés disto, curar exemplifica a redenção

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da Criação caída, a restauração de sua ordem; o retorno ao comum, ao normal, ao natural. William Stringfellow, em A Simplicity of Faith: My Experience in Mourning (Uma simplicidade de fé: Minha experiência com o luto) É minha opinião que o milagre é um elemento essencial da fé bíblica... Milagre, no entanto, não deve ser entendido nos termos do século 19, como argumento entre a ciência e a fé, mas nos termos da doutrina bíblica da Criação. A partir desta perspectiva, o milagre é estranho e ofensivo não só ao homem moderno, mas também ao homem de antigamente. Millard C. Lind, em Kingdom, Cross, and Community (Reino, cruz e comunidade) O racionalismo pretendeu cindir as diferentes “partes” da alma: a razão, a emoção e a vontade. Uma vez cometida essa divisão brutal, pretendeu que era possível obter o conhecimento por meio da razão pura. Ernesto Sabato, em O escritor e seus fantasmas



CH INFORMA

Uma gigante entre dois caminhos

Batalha judicial

Igreja Batista, maior denominação dos EUA, assiste ao avanço da doutrina calvinista Arminianismo ou calvinismo? A questão, que divide os evangélicos há séculos, está no centro de uma polêmica que envolve a Igreja Batista, maior confissão protestante dos Estados Unidos. O embate entre aqueles que defendem o papel fundamental do crente na sua própria salvação e os que acreditam numa eleição por Deus chegou aos seminários batistas dos EUA. Líderes influentes da nova geração têm defendido a doutrina da predestinação firmada por Calvino e seus seguidores, o que tem deixado de cabelo em pé setores batistas que entendem ser o arminianismo uma verdade que deve continuar sendo pregada pela Igreja. A poderosa Convenção Batista do Sul (SBC, na sigla em inglês) tem assistido a um avanço do calvinismo em diversas escolas ligadas à instituição. Embora apenas dez por cento dos pastores da SBC se digam calvinistas, cerca de 30% dos que se formam em teologia também identificam-se assim. Um dos motivos é o sucesso, nos semi-

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nários, das doutrinas da graça e da eleição difundidas por pregadores populares no país, como John Piper, R. C. Sproul e John MacArthur. “Tem havido um crescente interesse na teologia reformada”, diz Timothy George, deão do Beenson Divinity School, da Universidade Samford. Recentemente, o Seminário Teológico Batista do Sudoeste, na Carolina do Norte, organizou uma conferência intitulada “Construindo pontes: Igrejas batistas do Sul e o calvinismo”, reunindo 550 participantes. Alguns dos pensadores reformados da denominação são oriundos do Seminário Teológico Batista do Sul, de Louisville, Kentucky – incluindo seu presidente, Al Mohler. Frank Page, presidente da SBC, pensa que o calvinismo irá tornar-se uma fonte crescente de disputa no seio batista: “O que vemos em nossa nação é que o assunto não tem sido suficientemente discutido. Igrejas estão se aproximando e imediatamente fica claro que existe uma questão séria de discórdia”. Fonte: Christianity Today

A Justiça paulista determinou que o Google Brasil, que controla o site de relacionamentos Orkut, retire do ar as comunidades consideradas ofen­sivas ao bispo Edir Macedo e à Igreja Universal do Reino de Deus. A decisão, proferida pela 34ª Vara Cível, deu provimento a ação movida pelos advogados do líder evangélico e prevê multa diária de R$ 1 mil por página em caso de descumprimento. Em sua sentença, o juiz Leandro Martins Costant menciona “o inegável caráter ofensivo” dos nomes das comunidades. Entre elas, estão as intituladas Eu mataria Edir Macedo e A farsa de Edir Macedo. O magistrado, no entanto, negou provimento ao pedido do autor de que os dados dos criadores das comunidades fossem revelados. Em sua contestação, o Google Brasil inicialmente argumentou que a medida caberia ao Google Inc – apontado como o verdadeiro dono do Orkut –, alegação refutada pela Justiça. Até o fechamento desta edição, a corporação aguardava a apreciação de nova contestação, na qual se defende dizendo que a autoria das agressões verbais não pode ser confundida com o veículo de divulgação utilizado. “Seria o mesmo que condenar uma


companhia telefônica pelos trotes aplicados por seus clientes”, afirma trecho da petição. Fonte: Agência FSP

Arquivo

Intolerância em rede nacional

de grande sucesso popular, tem exibido episódios que degradam o Cristianismo. Em uma das cenas, um personagem diz que os cristãos devem ser expulsos como o foram os cruzados, inclusive à força de armas. Em outro capítulo, um adolescente é aliciado por um grupo nacionalista a executar

um cristão. Além disso, o conteúdo de Vale dos Lobos incita calúnias, como a sugestão de que missionários cristãos são ligados a redes internacionais de prostituição. Igrejas turcas têm se mobilizado contra o tom anti-cristão adotado pelo programa. Fonte: Portas Abertas

CRISTIANISMO HOJE no Chicago Tribune

Apesar dos esforços do governo da Turquia para mostrar ao mundo que os direitos individuais são respeitados no país – uma das condições para o sonhado ingresso na União Européia –, a liberdade religiosa ainda parece um sonho distante. Desde o assassinato brutal de três cristãos, que tiveram suas gargantas cortadas em abril de 2007 na cidade de Malataya, o número de ataques contra não-muçulmanos e seus locais de culto tem crescido. A intolerância recrudesceu em diversas regiões do país e o próprio Ministério para Assuntos Nacionais da Turquia admite o fato, a ponto de solicitar aos governadores das províncias que adotem medidas de precaução. A pressão contra as minorias religiosas se manifesta de diversas maneiras, inclusive através da indústria cultural. A série de TV Vale dos Lobos,

Em sua edição de 25 de janeiro, um dos principais jornais americanos, o Chicago Tribune, abriu espaço para destacar o grupo Christianity Today International (CT) – ao qual CRISTIANISMO HOJE é ligada. Em reportagem intitulada Revista enxerga seu chamado em cobertura mundial, o jornal destaca o fato de que a revista Christianity Today, fundada há 51 anos pelo evangelista Billy Graham, tem aumentado seu interesse pelos assuntos internacionais. Segundo a matéria, que é aberta com uma foto de editores da Christianity Today com um exemplar da segunda edição de CRISTIANISMO HOJE em mãos, o lançamento da edição brasileira, em outubro passado, bem como a da versão sul-coreana da publicação, que deve começar a circular agora em maio, é uma “expansão de seu empenho internacional”. Com essas iniciativas, o grupo CT espera estender seu chamado

para espalhar o Cristianismo pelo mundo. Entrevistado pelo repórter Russell Working, o editor de CRISTIANISMO HOJE, Marcos Simas, disse que uma publicação independente era necessária no Brasil, pois a maioria das revistas cristãs está vinculada a denominações. “Publicar uma revista para auxiliar a Igreja Cristã a desenvolver sua fé é uma missão muito difícil, ainda mais quando se olha apenas para os erros dessa Igreja”, disse Simas ao Chicago Tribune. O editor informou que a tiragem da revista é de 20 mil exemplares por edição e lembrou que, em média, 70% do material editorial é produzido no Brasil, por jornalistas e articulistas locais. Outra fonte da reportagem, David Heim – diretorexecutivo da revista teológica Christian Century –, destacou a importância das edições estrangeiras de Christianity Today: “Isso faz sentido na época em que o centro de gravidade da fé moveu-se para o Sul e o Leste. Eles estão fazendo algo de ampla visão”.

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CH INFORMA

Imposto religioso

a família, e não achincalhar seus fundamentos”, devolveu o cardeal Agustín Garcia-Gasco. Fonte: Folha de São Paulo

Ignorância bíblica 50%

78%

87%

27%

O governo da Espanha resolveu reajustar uma espécie de imposto religioso que é pago por todo cidadão, independentemente de sua profissão de fé. A alíquota, de 3,5% sobre a renda, começa a vigorar este ano. Toda a arrecadação com o tributo é repassada pelo Tesouro à Igreja Católica espanhola. O aumento é fruto de um acordo do Gabinete do presidente de Governo da Espanha, José Luis Zapatero, com o clero. Apesar da histórica presença do catolicismo, o número de ateus declarados na Espanha é dos mais altos da União Européia. Mesmo com essa benesse, as relações institucionais entre a Igreja e o governo não vão nada bem. Os bispos espanhóis se opõem a uma série de reformas implementadas depois que Zapatero chegou ao poder – inclusive o reconhecimento ao casamento entre homossexuais e a ampliação dos casos em que é permitido o aborto legal. De olho nas eleições legislativas marcadas para 9 de março, a Igreja tem convocado passeatas de protesto que atraem milhares de manifestantes. “Se os bispos querem fazer política, que se candidatem”, criticou José Blanco, dirigente do Partido Socialista Operário Espanhol (PSOE), governista. “O poder público deveria defender

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Para uma nação com forte tradição cristã, o Reino Unido surpreende – negativamente – quando o assunto é o conhecimento religioso de seus habitantes. Uma pesquisa realizada junto a 1.015 britânicos pelo instituto teológico Theos mostrou que 27% dos entrevistados não sabem que Jesus nasceu em Belém. Metade das pessoas disse que não sabiam que João Batista era primo de Cristo e 78% não tinham a menor idéia de que ele foi levado escondido por seus pais para o Egito, fugindo de Herodes. Pior é que praticamente um em cada três entrevistados disse não entender exatamente o significado da vinda do Filho de Deus ao mundo. A ignorância bíblica é maior entre os jovens. “Isso reflete a diminuição do ensino das passagens da Bíblia nas escolas”, preocupa-se o diretor do Theos, Paul Woolley. “Se levamos a sério a coesão social, não podemos nos dar ao luxo de ignorar as histórias que nos mantiveram unidos

culturalmente durante mais de mil anos”, conclui Woolley. Fonte: Agência EFE

Tragédia em números O número de baixas entre civis no conflito do Iraque, que agora em março completa cinco anos, não pára de subir. Mas a dimensão exata da tragédia humanitária é incerta. O número mais recente foi divulgado pela Organização Mundial de Saúde, agência ligada às Nações Unidas. Levantamento realizado com a colaboração do Ministério da Saúde do Iraque apontou 151 mil baixas nos primeiros três anos da ocupação do país pelas forças internacionais comandadas pelos Estados Unidos. A pesquisa, divulgada originalmente pelo New England Journal of Medicine, é considerada a mais rigorosa até agora publicada. Há muita confusão em torno do número de mortos entre a população iraquiana na Segunda Guerra do Golfo. Isso porque as estatísticas incluem tanto as vítimas de confrontos quanto as baixas nos atos terroristas que pipocam pelo país – assim, não é possível saber quantos teriam envolvimento com grupos extremistas. Pesquisa da Universidade John Hopkins, dos EUA, aponta o assombroso número de 600 mil vítimas fatais. Já o instituto Iraq Body Count, com base em informações da mídia, calcula os mortos em cerca de 80 mil. Na Guerra do Vietnã, entre as décadas de 1960-70, os mortos civis naquele país foram cerca de 1 milhão. Fonte: UOL


Notas Mais sexo que educação Segundo o anuário Pay TV 2008, o sistema brasileiro de televisão por assinatura tem mais canais eróticos do que educativos. Atualmente, há seis canais de conteúdo dedicados ao sexo – como Sexy hot e For man –, contra três que promovem exclusivamente cultura e educação, caso do Futura. Segundo a publicação, a TV paga brasileira dispõe de 106 canais ao todo, dos quais 27 (ou 25%) são programados no Brasil. Fonte: Folha de São Paulo

Camisinhas self-service O governo federal anunciou que, a partir de 2008, máquinas para fornecer preservativos serão instaladas em escolas de ensino médio da rede pública. O equipamento, desenvolvido por alunos do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina, ainda está em fase de testes, mas a idéia é instalá-lo em 100 estabelecimentos de todo o país. Com ele, qualquer aluno regularmente matriculado pode obter camisinhas mediante a digitação de uma senha. A intenção dos idealizadores do projeto é ampliar o acesso ao preservativo de jovens que já têm iniciação sexual. Fonte: Folha de São Paulo

Microtorá Cientistas do Instituto Tecnológico da Universidade de Haifa, em Israel, criaram uma “nano Bíblia” tão compacta que cabe num chip

do tamanho de um grão de açúcar. A versão utilizada é a Bíblia hebraica, que tem cerca de 300 mil palavras. O chip tem uma superfície de 0,5mm e é composto por silício recoberto de ouro. Só que quem quiser ler a “nano Bíblia” terá que usar um poderoso microscópio de escaneamento de elétrons. Fonte: BBC

Igreja Anglicana – que, no Brasil, recebe o nome de Episcopal – e representantes de seus cerca de 60 milhões de fiéis em todo o mundo. Fonte: http://www.gafcon.org/

Obituário

“Jesus” engarrafado Que Jesus é a água da vida, todo crente sabe. Mas agora, qualquer pessoa que tomar água da marca Spiritual Water, independente de sua religião, vai dar de cara com Cristo – pelo menos, com sua imagem, estampada no rótulo das garrafas de plástico produzidas pela empresa. “Com nossa água, qualquer pessoa poderá ver Jesus todos os dias, e não apenas nos fins de semana”, brinca o diretor da Spiritual Water, Elicko Taieb. Além da figura, há uma oração impressa. A expectativa de faturamento anual é da ordem de US$ 11 milhões. Fonte: Blog Coquetel

Anglicanos discutem seu futuro O local não poderia ser melhor. Israel vai receber os principais líderes anglicanos do mundo entre os dias 15 e 22 de junho. A Terra Santa será o palco da Conferência Global sobre o futuro do Anglicanismo, evento que deve traçar as próximas diretrizes da denominação. O encontro vai reunir diferentes correntes da

Antônio Elias, veterano ministro presbiteriano, morreu no dia 21 de dezembro de 2007, aos 97 anos de idade. Paulista de Catanduva, Elias, convertido nos anos 1930, tornou-se semeador da Palavra de Deus em regiões do Brasil que não tinham sequer uma igreja evangélica. Também atuou como missionário e pregador em diversos países da América do Sul e Europa, além dos Estados Unidos. Jubilado desde 1981, Antônio Elias era pastor emérito da Igreja Presbiteriana Betânia, em Niterói (RJ). Responsável pelo discipulado e ordenação de diversos pastores, ele era considerado referência de fé para as novas gerações. Embora debilitado nos últimos anos, manteve uma rotina intensa de pregações e aconselhamento. O pastor deixou a viúva, Maria José, quatro filhos e seis netos. Zenilda de Souza Brito, fundadora e pastora emérita da Igreja Missionária Evangélica Maranata, do Rio de Janeiro. Ela faleceu no dia 11 de janeiro de 2008, aos 86 anos, de complicações decorrentes do câncer.

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EVANGELISMO

Com Cristo, em casa Começa no Brasil o projeto Minha Esperança, campanha evangelística baseada em programas de TV e discipulado pessoal

O próximo mês de março marca o início de uma grandiosa campanha evangelística que será realizada em todo o Brasil, de forma simultânea. E ela leva a chancela daquele que é considerado o maior ganhador de almas para Jesus do mundo contemporâneo – ninguém menos que o célebre pregador norte-americano Billy Graham. Pois é a entidade internacional fundada por ele, a Associação Evangelística Billy Graham (AEBG), que está à frente do projeto Minha Esperança, que já percorreu várias nações do mundo e 16 países da América Latina, sempre com imenso retorno espiritual. Segundo dados da organização, a campanha levou aos pés de Cristo, por exemplo, 500 mil pessoas no México, aproximadamente o mesmo número de decididos nas Filipinas. Isso só foi possível porque o veículo escolhido para a propagação da mensagem da fé é a televisão. Aqui no Brasil, a expectativa da AEBG é ainda maior, já que cerca de 80% dos lares do país têm ao menos um aparelho de TV. A estratégia adotada, apesar da grandiosidade do projeto, é simples: cada crente será estimulado a reunir, em sua casa,

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O prestígio internacional do evangelista Billy Graham é um dos trunfos da campanha mundial desenvolvida pela AEBG que agora chega ao Brasil

Billy Graham Evangelistic Association

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Henri Nowen conseguiu nutrir a fé das pessoas porque escreveu abertamente sobre suas dificuldades (Philip Yancey)

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Fruto da experiência de um líder que dedicou integralmente a sua vida a Deus, esta obra é um guia espiritual ressonante para cada homem e cada mulher que almeja ser útil no Reino de Deus. Ministério Criativo

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EVANGELISMO

A participação das igrejas locais e o envolvimento dos “Mateus”, crentes que receberão pessoas em suas casas nas noites de exibição dos programas, são fundamentais para o sucesso espiritual do evento

amigos, parentes e vizinhos que não conhecem o Evangelho para assistir a uma série de três programas, exibidos em dias consecutivos, em rede nacional e no horário nobre. A idéia foi inspirada na atitude de Mateus, o discípulo de Jesus que reuniu outras pessoas em sua casa para ouvir as palavras de salvação do Mestre. Além de pregações de Billy Graham e de seu filho e herdeiro ministerial, Franklin, serão exibidos um filme evangelístico, música cristã e testemunhos. Ao final de cada programa, é claro, haverá apelo para conversão. A partir daí, o trabalho será dos “Mateus”. Em cada lar participante, haverá muita conversa e orações, e quem aceitar a mensagem será encaminhado às igrejas locais.

bado –, serão exibidos os programas, todos produzidos com profissionalismo e forte conteúdo espiritual. A próxima etapa já começa no dia seguinte, quando todos os espectadores serão convidados pelos “Mateus” a visitar uma igreja. É o chamado Domingo da Colheita, visando à apresentação e ao acolhimento dos novos crentes. A partir daí, entra em cena o bom e velho discipulado cristão. A campanha é como se o próprio Senhor Jesus visitasse no mesmo dia milhões de lares brasileiros e repetisse a cada espectador o bendito apelo: “Eis que estou à porta e bato”.

Mobilização – Lançado no país em outubro passado, o projeto consiste de diversas fases, algumas já em pleno andamento. Além de encontros com lideranças evangélicas, a AEBG vai promover reuniões de treinamento em todo o país, visando obter o apoio das igrejas e recrutar participantes. A partir de agosto, a mobilização se intensifica com o envolvimento de milhares de pastores, que receberão material de apoio e orientações para capacitar seus membros. Ao mesmo tempo, será desencadeada uma grande campanha promocional na mídia, con inserções em revistas, jornais e na TV. Finalmente, em data a ser divulgada – sabe-se apenas que as transmissões acontecerão de quinta-feira a sá-

Serviço

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Q

uem quiser mais informações sobre o projeto Minha Esperança e tiver interesse em participar da campanha pode fazer contato com o escritório de Coordenação Nacional, que fica na Avenida Adolfo Pinheiro, 2.360, no bairro de Santo Amaro, em São Paulo (SP), CEP 04734-004. Os telefones são (11) 3429-5100 e 3429-5103, e o e-mail é secretaria@minhaesperanca.com.br Para quem quiser ver o vídeo promocional: http://www.youtube.com/watch?v=z17haR8tt1o



Arquivo

POLÊMICA

Investigação movida pelo senador Chuck Grassley quer saber detalhes da administração dos ministérios e do patrimônio de seus líderes

Ministérios em alerta Investigação movida por senador americano causa desconforto entre grupos evangélicos, mas há quem apóie a medida

A

A autonomia de igrejas e ministérios cristãos para gerir seus próprios recursos financeiros tem sido cada vez mais questionada. Autoridades públicas, imprensa, Justiça e outros setores da sociedade volta e meia dirigem sua atenção para organizações evangélicas que se destacam não apenas por sua pregação, mas pelo patrimônio que ostentam ou devido ao estilo de vida de seus líderes. Embora em muitos casos tais episódios não passem de mera especulação, por vezes a coisa ganha ares de escândalo – ou de caça às bruxas, dependendo do ponto de vista. Agora mesmo, nos Estados Unidos, país com ampla liberdade religiosa e grande participação protestante na política e na vida civil, seis importantes grupos de orientação pentecostal estão na mira do Comitê Financeiro do Senado. Trata-se de um poderoso órgão com prerrogativas de promover investigações, cobrar responsabilidades e propor mudanças legislativas.

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O mais recente lance neste tabuleiro que envolve poder, dinheiro e fé foi dado pelo senador republicano Chuck Grassley, de Iowa. Em novembro passado, o parlamentar, que é crente batista, encaminhou aos ministérios um vasto pedido de explicações por escrito. O gabinete de Grassley – combativo membro do Comitê que já inquiriu entidades respeitadíssimas como a Cruz Vermelha e o Instituto Smithsoniano – tem recebido informações dando conta de supostas irregularidades no comando de instituições de grande influência. Algumas das questões levantadas são bastante inusitadas, como o pedido de informações acerca da compra, por parte do Ministério Joyce Meyer, um simples móvel que teria custado US$ 23 mil. Outras envolvem vultosas movimentações. Caso da solicitação ao pastor Benny Hinn, chefe da Healing Center Church World, provas da origem dos US$ 3 milhões gastos na compra de uma mansão em Dana Point, na Califórnia.


Denúncias – Os formulários elaborados pela equipe do senador são, como diria aquele nada saudoso ex-presidente brasileiro, “nitroglicerina pura”. O parlamentar quer checar notas fiscais, relatórios das reuniões de diretorias, provas contábeis feitas por empresas de auditoria, recibos de viagens e hospedagens, balancetes e outros documentos. O senador chega a pedir as faturas dos cartões de crédito dos líderes das seis megaigrejas. A iniciativa de cobrar satisfações teria surgido a partir do crescimento de denúncias, sobretudo na mídia, acerca de abusos financeiros cometidos em nome de Deus contra a boa fé alheia. Como pano de fundo da investigação, a movimentação de milhões de dólares isentos de impostos – e que poderiam seguir descaminhos longe dos olhos dos mantenedores. Há suspeitas sobre salários astronômicos pagos a diretores, desvio de verbas, uso pessoal de bens pertencentes aos ministérios e transferências ilegais de valores, entre outras transgressões. Na prática, a investigação equivale a uma abertura de sigilo contábil. Nos Estados Unidos, assim como ocorre no Brasil, igrejas e organizações religiosas gozam de isenções tributárias. Desde que atendam a alguns requisitos de ordem burocrática, elas são desobrigadas, por exemplo, de entregar o formulário 990/IRS, um dos principais instrumentos de arrecadação do Imposto de Renda americano. Além disso, os americanos que fazem doações a igrejas, sinagogas, mesquitas e quaisquer outras instituições religiosas e sem fins lucrativos podem deduzir pelo menos parte disto em suas declarações de renda. Motivo mais do que suficiente, diga-se de passagem, para que as autoridades do país se preocupem com a destinação desse dinhei-

ro. Atuamente, se quiser a dedução do fisco – e quem não vai querer? – o doador precisa informar à Receita Federal, de modo bem detalhado, quanto deu para sua igreja ou para a caridade. Embora ainda esteja longe de chegar a algum resultado conclusivo – até agora, apenas duas das entidades contatadas enviaram respostas ao Comitê –, a investigação do senador Grassley pode ensejar um maior controle fiscal sobre as igrejas. Kenneth Behr, presidente do Conselho Evangélico de Contabilidade e Finanças, uma agência independente que atua junto aos ministérios, expressou sua preocupação. “Acho que o senador está comprando uma briga”, declarou, em entrevista a Christianity Today. Behr diz que nunca viu nada tão extenso em investigações do gênero. “Se eles não responderem, suspeito que Grassley pedirá ajuda à Receita Federal”, admite. “Uma auditoria da Receita não é nada agradável”, disse um ex-executivo da Ford Motor. “Não desejo isto ao meu pior inimigo”. “Organizações religiosas estão sujeitas a todo tipo de norma do governo”, lembra Ayesha N. Khan, diretora legal da Americans United for separation of Church and State (“União Americana pela separação da Igreja e Estado”). “Se as igrejas se calarem ou não responderem completamente, Grassley pode insistir em uma explicação perante o Comitê Financeiro do Senado”, avalia, por sua vez, Olé Anthony, Divulgação

Além das duas entidades, estão na mira do senador o Ministério Paula White, liderado por Randy e Paula White; Ministério Kenneth Copeland, sediado em Newark, no Texas, e dirigido por Kenneth e Gloria Copeland; Igreja Batista New Birth e seu bispo Eddie Long; e Igreja Internacional World Changers, comandada pelo casal Creflo e Taffi Dollar, de College Park (Maryland). Em comum, o fato de que todos movimentam fortunas e são potências midiáticas, com programas de TV de grande audiência nos EUA e em outros países. Envolvidas em um semnúmero de atividades – como comercialização de livros, CDs, DVDs e outros produtos, promoção de eventos, negócios imobiliários e empreendimentos como gravadoras e editoras, além de projetos sociais e filantrópicos. Isso sem falar nos recursos arrecadados na forma de dízimos e ofertas doados pelos fiéis. Algumas igrejas ligadas a esses ministérios têm mais de 30 mil membros.

O Ministério Joyce Meyer, liderado pela famosa pregadora e conferencista, enviou as informações solicitadas e afirma que investigação vai confirmar sua probidade

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POLÊMICA

fundador da Trinity Foundation, organização evangelística com sede em Dallas. Na sua opinião, já era hora de as organizações religiosas americanas passarem por um choque de legalidade. “Alguns cometem graves fraudes”, reclama, “e isso só está piorando conforme o tempo passa”.

Benny Hinn Minsitries

“Estranho” e “inusitado” – Já entre os ministérios investigados, o desconforto é evidente. O fato tem elevado o nível de desconfiança do público em relação à atuação das organizações eclesiásticas. Embora assegure que a entidade que preside é um “livro aberto”, o pregador e conferencista Creflo Dollar alertou que a investigação de Grassley possivelmente afetará “a privacidade de cada comunidade e igreja nos EUA” e pediu respeito às igrejas que crêem no “Evangelho da prosperidade” . Depois do pedido de investigação do Senado, ele aceitou o convite para dar explicações no programa de entrevistas de Larry King, e permitiu que a equipe de TV mostrasse sua mansão e seus automóveis de luxo. Diante de tanta opulência, Creflo Dollar declarou que o patrimônio é “sinal de bênção divina”. Por sua vez, os responsáveis pelo Ministério Paula White declararam à imprensa que consideraram o pedido do senador “inusitado”. No entender de Randy e Paula White, que recentemente anunciaram seu divórcio, a solicitação de relatórios sobre áreas que não possuem relação com a igreja é “estranha”. Ao mesmo tempo, eles questionam por que o parlamentar republicano, e não a Receita Federal, desencadeou o processo. Tal inquietação encontra eco em outros setores. “É uma causa alarmante que um comitê do Senado queira supervisionar diretamente o exercício financeiro de

Benny Hinn terá que explicar origem de dinheiro usado na compra de mansão na Califórnia

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ministérios religiosos”, opina Richard Neuhaus, editor do jornal conservador First Things. Um dos grupos questionados, o Ministério Joyce Meyer, respondeu ao senador Grassley antes do prazo pedido – 6 de dezembro – e veio a público reiterar o que chama de “comprometimento com a excelência e a integridade”. A entidade lembra que, recentemente, obteve certidão da Receita Federal garantindo que está dentro dos padrões legais e que continua preenchendo os requisitos exigidos para isenção do Imposto de Renda. “Nossos relatórios financeiros são submetidos a auditorias independentes e estão à disposição de qualquer interessado pela internet”, diz comunicado oficial, assinado por Delanie Trusty, chefe do Departamento Financeiro da organização. Sobre as ilações acerca do estilo de vida de Joyce e de seu marido, Dave, o documento diz: “Aqueles familiarizados com Joyce Meyer, que assistem a seu programa televisivo, lêem seus livros e ouvem suas mensagens de esperança e força, reconhecem pessoalmente que Joyce e Dave são profundamente compromissados com um alto padrão de mordomia tanto em sua vida pessoal quanto nas operações diárias do ministério”. Finalmente, o grupo se diz confiante de que as informações prestadas farão com que “a verdade seja revelada”: “Acima e além de qualquer obrigação legal, temos profundo compromisso com nossos parceiros de ministério e amigos”, frisa a nota. Em 2005, a Wall Watchers (“vigilantes” ou “atalaias”, em português), uma organização evangélica que declara ter como missão fazer auditorias, organizar as finanças e fomentar a transparência de igrejas e ministérios, já tinha pedido investigação da Receita Federal nas contas de Joyce Meyer. Na ocasião, a conferencista disse que não se preocupava em ser investigada. “Se sua casa está em ordem, você não tem nada a temer e muito a ganhar neste processo”, recita, categórico, Joel Hunter, pastor sênior da Igreja Northland, próxima a Orlando, na Flórida, com 12 mil membros. Ele é membro do comitê executivo da Associação Nacional de Evangélicos, órgão que tem sido cauteloso diante da situação. Para muitos, o que está em jogo, numa análise mais ampla, é um vespeiro chamado liberdade religiosa e o antigo princípio, basilar na democracia, da separação entre a Igreja e o Estado. Mas o jornalista J. Lee Grady, editor de Charisma, publicação conceituada no meio pentecostal americano, prefere ver a mão de Deus por trás de tudo: “Isso acontece porque o povo não está pedindo de seus líderes prestação de contas do dinheiro arrecadado. Creio que o Senhor está apontando seu dedo para a Igreja, exigindo que andemos por suas veredas”. (Tradução: Karen Bomilcar. Adaptação e redação: Carlos Fernandes. Colaborou Valter Gonçalves Jr)


internet

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s doações do jogador de futebol Kaká à Igreja Apostólica Renascer em Cristo viraram objeto de um intenso bate-boca de conseqüências ainda imprevisíveis. A iniciativa do promotor de Justiça Marcelo Mendroni, do Ministério Público (MP) de São Paulo, de encaminhar à Justiça italiana um pedido para que o craque – atualmente jogando no clube Milan –, dê esclarecimentos sobre sua relação com a denominação, gerou polêmica. No documento, o promotor indaga, entre outras coisas, quanto Kaká doou à O craque Kaká: lealdade e Renascer, se suas oferdonativos que faz à Renascer tas foram em dinheiro estão na mira de promotor ou em outro tipo de bens e se o atleta tem conhecimento do destino dos donativos. Pergunta ainda sobre o grau de amizade dele com o casal Estevam e Sônia Hernandes, líderes da Renascer. A Renascer e seus dirigentes estão enfrentando uma série de processos no Brasil e nos Estados Unidos devido a suspeitas de irregularidades financeiras. No momento, a bispa Sônia está detida em um presídio na Flórida, enquanto seu marido cumpre prisão domiciliar. Os dois foram condenados por entrar no país portando dinheiro não declarado (o caso foi tema de reportagem na edição nº 1 de CRISTIANISMO HOJE). Desde o início da crise, Kaká evitou falar à imprensa sobre o imbróglio envolvendo os dirigentes da igreja em que congrega. Porém, demonstrou solidariedade a Estevam e Sônia, inclusive gravando mensagens de apoio que foram exibidas durante cultos na igreja. Após a divulgação da investigação movida por Mendroni, a Renascer expediu nota defendendo seu integrante mais ilustre. Para a igreja, a atitude do integrante do MP constitui “ameaça contra a liberdade individual e religiosa”, lembrando que o jogador do Milan ganha seu dinheiro honestamente “e pode fazer dele o que quiser”.

“Palco” – Controvérsia é o que não falta no caso. Para o jurista Martonio Mont’Alverne Barreto, especialista em Direito Constitucional, o episódio não encerra violação alguma contra a liberdade religiosa do jogador. Para ele, o assunto só ganhou aspectos judiciais porque há acusações de desvio de recursos e de sonegação fiscal contra a cúpula da Renascer. “A investigação sobre o atleta parece ser apenas um elemento de instrução processual. O MP quer saber se a igreja declara o correspondente ao que recebe, se seus gastos são compatíveis ou não”, explica. O especialista vai além – “Fosse eu o magistrado, deferiria o requerimento para que se investigasse os doadores, a fim de ter a certeza de que tudo que foi formalizado por quem recebeu”, opina. Barreto ressalta que desconhece detalhes do processo, que, apesar de toda publicidade, corre em segredo de Justiça. Por fim, o jurista destaca que em nenhum instante avalia-se se está certa a doação ou não. “Nem há como se fazer isso, já que a privacidade e a intimidade são garantias constitucionais.” Já o advogado da Renascer, Luiz Flávio D’Urso, acusa Mendroni de buscar alarde na mídia e usar o caso como “palco”. Ele entende que o promotor extrapolou suas funções ao levantar suspeitas indevidas. “Arrastar o craque Kaká, por ser fiel da igreja, da forma como realizada, expondo-o como foi feito, é precedente perigoso que atenta contra a liberdade religiosa”, argumenta. O colunista do jornal O Globo Ancelmo Góis também estranhou a forma como o nome de Kaká entrou no noticiário e publicou uma nota questionando as intenções de Mendroni, que estaria “tirando uma casquinha do sucesso” do craque. “Eu não acredito, mas o Kaká acredita na boa fé dessa tal de Renascer. Qual o problema?”, disse Ancelmo. Desde que surgiu no cenário esportivo, atuando pelo São Paulo Futebol Clube, Kaká deixou bem clara sua opção de fé. Seu talento com a bola logo levou-o à seleção brasileira, com a qual conquistou a Copa do Mundo de 2002. O atleta atraiu a atenção – e muitos comentários irônicos na imprensa secular – ao declarar que chegou virgem ao casamento. Em campo, além de habilidade, o atleta, de 25 anos, esbanja simpatia e cordialidade. Fora dele, ganhou respeito pela vida regrada, simples e sem ostentações, apesar dos milhões que recebe. No fim do ano passado, foi escolhido pela Fifa o melhor jogador do mundo. Como forma de gratidão à igreja na qual conheceu Jesus, o craque deixou o troféu em exposição na sede da Renascer, em São Paulo. A atitude teve grande repercussão na imprensa, assim como a revelação de seu sonho de, após pendurar as chuteiras, tornar-se um pastor. Até o fechamento desta edição, o jogador e seus advogados ainda não haviam respondido aos questionamentos do promotor. (C.F. e V.G.J.)

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Rubinho Pirola

CAPA

O 茅MaUNDO VIRTUAL minha par贸quia Novas ferramentas tecnol贸gicas s茫o usadas por crentes e igrejas para ganhar almas na era do high-tech 28 | CRISTIANISMO HOJE


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Cláudio Neves

Durante dois mil anos, desde a fundação do Cristianismo, a evangelização foi feita olho no olho. Ao longo dos séculos, os seguidores de Jesus cumpriram o “Ide” do Mestre anunciando a Palavra com os meios de que dispunham – ou seja, a força das cordas vocais e uma boa dose de disposição física. Os evangelistas primitivos palmilharam os quatro cantos do globo a pé e em lombo de animais. Mais tarde vieram as longas jornadas a bordo de navios, trens fumegantes e deslocamentos rodoviários, tudo para levar as boas novas do Evangelho aos perdidos. Novos tempos, novas oportunidades. Hoje em dia, a boa e velha evangelização é praticada através de métodos inimagináveis até duas gerações de crentes atrás. A revolução provocada pelas novas tecnologias no cotidiano dos seres humanos a partir da década de 1970 – comparável, nas transformações sociais que promoveu, a outra grande Revolução, a Industrial, ocorrida 200 anos antes –, mudou definitivamente o mundo. E a divulgação da fé cristã, evidentemente, não ficou imune a tantas mudanças. O evangelista do século 21 tem à disposição ferramentas como notebook, conexão de internet em banda larga e aplicativos de comunicação on-line. Hoje, como ontem, vale lançar mão de tudo para tornar o nome de Jesus Cristo conhecido a toda criatura. Nesta era high-tech, dá até para fazer uma releitura da célebre frase do evangelista britânico John Wesley: “O mundo virtual é minha paróquia”. Famoso ou anônimo, qualquer um que se disponha a cumprir a Grande Comissão pode fazê-lo sem sair de casa – e, mesmo assim, conquistar ouvintes em várias partes do planeta. É o caso do contador e administrador Cezar Marques de Azevedo, 46 anos, crente batista. Quando não está trabalhando, ele, que vive em Campo Belo de Parecis (MT) fica de frente para o computador, pregando a Palavra de Deus via internet. Como “púlpito”, o evangelista da rede, que em seu currículo tem uma pós-graduação em tecnologia da informação e um curso de teologia, usa o Paltalk para se comunicar. Trata-se de um software que permite conversas pela internet, ao vivo, através de texto, voz ou vídeo com várias pessoas ao mesmo tempo. No ambiente, que é internacional, encontra-se de tudo: desde cursos gratuitos para aprendizado de idiomas como vietnamita, árabe ou chinês até comunidades tratando de espiritismo e negócios de exportação. “Desde que a pessoa se disponha a ouvir, o meio de comunicação é irrelevante”, pontifica Azevedo. Ninguém pense que Cezar Azevedo é daqueles tipos nerds, que afogam o ócio na telinha. Ele é um evangelista para lá de organizado, que tem hora e dia certo para pregar on-line. Tanto que estabeleceu uma espécie de ex-

pediente – de segunda a sexta-feira, das 15h às 22h; e aos sábados e domingos, entre 13h e 22h. Isso, claro, fora de seu horário de trabalho secular. Tanta dedicação tem lhe valido frutos para o Reino de Deus. Um deles é uma jovem de 14 anos, de Teresina (PI). Por uma questão de privacidade, Azevedo a trata apenas pela inicial R. “Quando comecei a fazer contato com ela, descobri que era viciada em maconha. Era uma dessas pessoas drogadas, mas sem consciência do vício. Então eu expus-lhe os versículos de Romanos 7.15-17 e de João 1.29”, conta, referindo-se a passagens que enfatizam a libertação que há em Jesus. R. entregou-se a Cristo. “Posteriormente, conversei com a mãe daquela moça. Ela levou a filha ao médico para que a ajudasse a sair do vício. Hoje, a jovem está liberta”, comemora o evangelista virtual, que graças a R. teve acesso a cerca de 50 outros jovens de seu convívio. Entre os inúmeros testemunhos relatados por Azevedo, CRISTIANISMO HOJE teve a oportunidade de conversar com S., jovem que foi apresentada por R. ao evangelista. S. tem 16 anos e, assim como a amiga, também caiu no pesadelo das drogas. “Sou dependente química e comecei a usar drogas aos 12 anos de idade”, relata. “Nas primeiras vezes foi muito bom, mas depois não conseguia parar. Quando conheci o Cezar, no Paltalk, eu já estava doente.” A moça diz que precisava muito “conversar com alguém”. “Foi só por isso que aceitei ouvir o que ele tinha a dizer”, admite. Apesar da pouca idade, S. colecionava problemas. Além de ter contraído o HPS, vírus sexualmente transmissível, ela não tinha apoio familiar. “Minha mãe é muito ausente, trabalha muito e quase não fala comigo quando está em casa”, queixa-se. Ao ter contato com as mensagens virtuais, no entanto, S. ganhou uma nova esperança. “Eu cheguei a conclusão de que precisava me libertar de tudo aquilo. Recebi a Cristo na minha vida e hoje sinto-me bem com isso”, revela. “Desde então, saí de perto dos amigos que me levaram para as drogas, parei de tomar pico e até aquela enfermidade, que me incomodava tanto, parou de doer.” Estratégias – Segundo Azevedo, a internet proporciona um diferencial que contribui muito para que as pessoas abram seu coração: “Uma vez que o meio não o expõe, o interlocutor tem liberdade para dizer o que quiser”. Mas ele ressalva: “O aconselhamento pela internet exige que as pessoas envolvidas estabeleçam um alto grau de confiança mútua”. Azevedo se empenha, segundo diz, para ser um divulgador da palavra de Deus. “Na internet, meu foco é fazer o Evangelho conhecido.” Existem muitas comunidades virtuais cujo foco de interesse é o evangelismo.

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Contudo, para se lograr êxito na disseminação de seja lá o que for, o uso profícuo e sistemático de novas mídias também se tornou requisito obrigatório. Algo nesse sentido é o que vem realizando, por exemplo, a Igreja Adventista. A agência de notícias da denominação divulgou recentemente a iniciativa de um grupo de adolescentes, entre 12 e 15 anos, ligados à denominação. A garotada resolveu postar no YouTube (site para divulgação de imagens pessoais) um vídeo sobre uma viagem de acampamento da igreja. Seria uma banalidade se não fosse o fato da iniciativa ter sido apoiada e incentivada pelos líderes da igreja, e de os adolescentes terem interagido com seus amigos não-cristãos, que ficaram surpresos de ver como é possível ser religioso e normal ao mesmo tempo. “Isso é, de fato, evangelismo”, declarou o pastor Victor Hulbert, diretor de Comunicação para a Igreja Adventista do Sétimo Dia no Reino Unido. Essas declarações foram prestadas originalmente durante o 4° Fórum de Evangelismo Internético Global no Newbold College, em Berkshire, Grã-Bretanha, de 28 de junho a 10 de julho do ano passado. O evento reuniu 100 líderes daquela organização religiosa, profissionais de comunicação e especialistas em tecnologia de todo o mundo. Durante o encontro, o pastor Rajmund Dabrowski não economizou palavras para defender o uso de tecnologia no anúncio do Evangelho. “Alguns ainda estão presos aos métodos previsíveis de evangelismo. Aqueles que ainda não estão conosco precisam saber que há uma metodologia deliberada de internet na igreja”, enfatizou o religioso.

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É claro que ninguém advoga a abolição das tradicionais estratégias para propagar o Evangelho, que afinal de contas independem de recursos técnicos e podem ser praticadas por qualquer crente, a qualquer hora e em qualquer lugar – ou “a tempo e fora de tempo”, como recomendou o apóstolo Paulo, um dos grandes evangelistas da Bíblia. Contudo, o tradicionalismo excessivo pode ser um dos motivos pelos quais milhões de pessoas, que trocam a noite pelo dia diante de seus computadores, passem despercebidas pela maioria dos ministérios evangélicos. O anseio por conforto espiritual para insones aflitos também não fica atrás. Apesar de soar como um paradoxo, muitos utilizam o Paltalk com o propósito de buscar comunhão com outros cristãos, que na maioria das vezes, estão em outros estados ou países. Envolvimento que, segundo vários deles reclamaram, não encontram nas igrejas das quais fazem parte, com a intensidade e profundidade de que gostariam. “Salvatore” (nome fictício) é um mexicano que foi alcançado para Cristo no ciberespaço. Ele vive no Condado de Nassua, em Nova Iorque (EUA), e congrega em um culto on-line. Recém-chegado à fé cristã – ele contou, em bom espanhol, que se converteu na semana anterior à apuração desta reportagem –, Salvatore vem de um passado nebuloso: “Sofria de la depre [depressão] e cheguei a tentar o suicídio”, confessa, “mas o Senhor é grande e me estendeu sua mão”. Diz que já até visitou uma igreja perto de sua casa. “Estou acessando o chat de voz e tenho conhecido mais coisas sobre Cristo através das pessoas que entram aqui”, explica. O testemunho dele foi confirmado por outra participante do grupo, uma internauta que é membro do Ministério Pão da Vida, na Costa Rica. A moça, chamada Fiorella, que participa ativamente do esforço de evangelismo na rede mundial de computadores, não escondeu sua satisfação de ter presenciado a conversão on-line do hermano mexicano, mesmo estando ele a mais de 3 mil quilômetros de seu país. “Salvatore é recémconvertido e damos graças a Deus por sua vida”, alegra-se Fiorella, uma crente para lá de plugada que também faz questão de participar dos fóruns do site de sua igreja. O Ministério Pão da Vida, cuja sede fica na Cidade do México e conta com filiais em outros países da América Latina, nos Estados Unidos e na Europa, investe sistematicamente em evangelismo através da internet. No site Window Lives Spaces (da Microsoft), o evangelista Enrique Patiño estabelece seu centro de operações na rede, de onde capitaneia sua estratégia para alcançar almas on-line. “O Senhor tem me dado uma visão de crescimento do Reino de Deus, a qual tenho compartilhado no México e no exterior”, diz o ministro em sua página da internet.


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Igreja no metaverso – Como a tecnologia não pára de se desenvolver – o que é ultramoderno hoje já pode ser visto como obsoleto amanhã –, é certo que os evangelistas hightechs terão cada vez mais novas ferramentas de trabalho. Em abril de 2007, mês em que o número de celulares no Brasil atingiu a casa dos 103 milhões, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações, a Anatel, as Sociedades Bíblicas de diversos países – Estados Unidos, Austrália, Nova Zelândia, Inglaterra, Rússia, África do Sul e Brasil – lançaram um site para celular através do qual os usuários podem fazer o download da Bíblia toda, ali mesmo na telinha de cristal líquido. O serviço, que em breve estará disponível nos telefones móveis dos brasileiros, é provido pela empresa sul-africana Christian Mobile. De acordo com informações divulgadas pela multinacional, esse ministério existe para “permitir que todos os usuários de celulares ouçam o Evangelho de Jesus Cristo, para que cada um deles possa crer, invocar seu nome e por ele serem salvos”. Fato é que não há mesmo limites para a criatividade humana. No universo do Second Life (Segunda Vida) essa premissa pode ser elevada ao cubo. Trata-se, como chamam os criadores do jogo, de um “metaverso”. O sistema permite entrar num ambiente virtual onde o jogador

O evangelista Enrique Patiño comanda o Ministério Pão da Vida, que montou um eficiente sistema de pregações on-line

pode adquirir poderes, transformar-se e fazer quase tudo o que quiser, inclusive voar. O jogo simula a vida real e tornou-se uma espécie de sociedade em 3D. Ela tem cerca de oito milhões de residentes de várias nacionalidades, possui economia e até moeda própria, chamada Linden Dollar (L$). Para se ter noção da influência, atração e importância do Second Life, seletas corporações multinacionais criaram representações nele, tais como Microsoft, Nokia, Reuters, General Motors, IBM e até instituições


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Igreja virtual, a LifeChurch marca presença no espaço Second Life, oferecendo cultos evangelísticos, oração, louvor, comunhão e até aconselhamento no ciberespaço. A congregação montou até um templo virtual

brasileiras como Fecomércio, e Universidade Mackenzie, ligada à Igreja Presbiteriana. Sabendo do franco crescimento de oportunidades para a semeadura espiritual no Second Life, as igrejas evangélicas estão começando a migrar para lá. A primeira a chegar foi a inovadora LifeChurch.tv. A igreja administra vários campus por todos os EUA e resolveu construir uma de suas sedes no jogo. A LifeChurch comprou uma ilha de 6,5 hectares virtuais e trabalhou com programadores para construir uma propriedade no metaverso. Interessante notar que essa compra é tão real quanto virtual. Para se obter qualquer coisa no ambiente do metaverso, o habitante precisa adquirir a moeda local, e isso só é possível mediante pagamento em valores monetários da vida real. Nos Estados Unidos, troca-se dólares convencionais pelos Lindens. Já por aqui, o interessado precisa desembolsar reais de verdade junto à Kaizen Games (a representante brasileira da Lindens Labs) para cambiar a moeda virtual. A quem se interessar em visitar a LifeChurch.tv, sentar-se em seus bancos e participar de seus cultos, basta criar um usuário gratuitamente, colocar login e senha e se teletransportar para a Experience Island. Lá, além de ouvir as canções, o fiel encontrará vídeos, camisetas da igreja e a famosa Casa de Vidro MySecret.tv – um lugar com sala de aconselhamento onde o usuário pode se abrir, confessar os pecados e pedir perdão a Deus. Pornô e evangélico – Neste quesito de abandonar o pecado com uma ajudazinha da tecnologia, a propósito,

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ninguém supera a XXXChurch.com. A igreja faz questão de ostentar que tem o 1° site pornográfico cristão. Isso mesmo – mas calma, o objetivo é para lá de santo. O ministério, formado por ex-produtores da indústria pornográfica, atua no aconselhamento e libertação de homens e mulheres que têm compulsões sexuais. No Second Life, a prostituição (entre avatares) virou quase uma outra moeda corrente, numa troca de favores por Lindens. Daí, a XXXChurch.com não ter hesitado em se estabelecer por lá também. JR Mahon, pastor da XXXChurch, justifica os métodos heterodoxos da igreja dizendo que segue o Evangelho de Mateus, procurando “fazer discípulos em todas as nações”: “Temos de encontrar as pessoas onde elas estão; é essa a nossa tarefa principal. Penso que Deus usa os irmãos que trabalham na XXXChurch para levar a sua mensagem e executar seu plano”, diz, convicto. Para levar essa busca por almas ao pé da letra, a igreja montou um estande na Adult Expo, grandiosa convenção de pornografia que reuniu, ano passado, milhares de pessoas em Las Vegas, cidade americana conhecida por seus cassinos e intensa vida noturna. No local, abrigado por dois pavilhões enormes, era possível encontrar desde filmes hardcore até os mais avançados acessórios de sex­shop. Foi exatamente nesse lugar profano que o pastor Mahon escolheu ficar – e bem próximo à entrada da seção gay masculina, distribuindo Bíblias com a inscrição Jesus loves porn stars (“Jesus ama as estrelas pornôs”). “Se o negócio da Igreja é salvar almas, precisamos procurar as que têm de ser salvas, e não as que já o foram”, justifica.



MULHER | Esther Carrenho

A “beleza” das plásticas

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Foi-se o tempo em que a cirurgia plástica estética era um privilégio de poucas pessoas endinheiradas. Hoje em dia, submeter-se a uma intervenção do gênero para corrigir imperfeições físicas ou simplesmente fazer concessões à vaidade é coisa cada vez mais comum. E o uso desse tipo de recurso tem ajudado muita gente a obter uma aparência mais bonita, com os conseqüentes ganhos na auto-estima e progressos no convívio social, profissional e até familiar do indivíduo. Temos ainda as inúmeras aplicações da cirurgia plástica corretiva ou preventiva, que em muitos casos é indispensável à manutenção ou recuperação da saúde, sobretudo no caso de acidentes com seqüelas. A verdade é que há muitas razões para se cuidar da beleza física. Uma delas é que a vida humana acontece

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através do corpo. Além disso, as Sagradas Escrituras afirmam que esse corpo é o templo do Santo Espírito. Portanto, nada melhor do que cuidar bem de um patrimônio tão precioso, que acima de tudo é a morada de Deus. Por outro lado, a cirurgia plástica tem sido vista como uma espécie de recurso capaz de resolver problemas externos e internos. Na busca desenfreada pelo corpo perfeito, muitos exageros têm sido cometidos, na ilusão de que uma mudança externa possa resolver todos os possíveis problemas, inclusive os emocionais e existenciais tão comuns a nós, seres humanos. A preocupação começa quando se observa os abusos praticados tanto pelas pessoas que se submetem a estas intervenções, quanto por alguns profissionais de saúde que


as executam. Aquelas, porque muitas vezes deixam de lado tantas outras coisas fundamentais para a própria vida; e estes porque, interessados no ganho financeiro – e muitas dessas cirurgias custam dezenas de milhares de reais –, fazem de sua prática um verdadeiro comércio da estética. Em muitos consultórios e clínicas, não é mais o médico que aponta a necessidade e importância da cirurgia, deixando a critério do paciente a opção de realizá-la ou não – é o cliente que vem e determina, numa boa parte dos casos, o que o cirurgião deve fazer. Os resultados, por vezes, são modificações tão grandes na fisionomia que até as pessoas mais próximas têm dificuldade em reconhecer o paciente depois. Essa busca obsessiva é um indicador de que a mudança mais necessária deve ocorrer no interior de cada um. Jocelyne Rosemberg, renomada psiquiatra, aponta a preo­ cupação insistente com algum possível defeito do corpo, o chamado transtorno dismórfico corporal (TDC), como causa de sofrimento que pode acontecer em qualquer idade. Se o TDC for reforçado por uma percepção distorcida da imagem corporal, isto é, quando essa imagem não corresponde àquela refletida no espelho, pode ocorrer uma busca por modificações externas – na verdade, apenas uma tentativa de encontrar alívio para o desconforto angustiante de não se ver como realmente se é. Neste caso, o “corta e recorta” dos bisturis estéticos será apenas o ponto de partida de uma procura sem fim por mais e mais mudanças de aparência. Outra causa da busca frenética pelas cirurgias plásticas é a dificuldade em aceitar o avanço da idade. Envelhecer é um processo por vezes dolorido. Para aproveitar as aquisições que só o passar dos anos podem dar, é preciso despedir-se do vigor e da beleza natural da juventude e assumir as limitações físicas da velhice. Para muitos, tanto homens como mulheres, isso é desesperador. Todavia, as modificações artificiais do corpo não só mascaram o sofrimento do processo de envelhecimento como também podem alimentar a ilusão de que os anos ficaram estagnados. Só a beleza interior é capaz de vencer a corrida contra o tempo. O apóstolo Pedro tinha consciência disto. Quando escreveu uma carta a um grupo de cristãos, destinou parte dela às mulheres, alertando-as de que o foco da beleza deveria “ser a interior, que não perece, beleza demonstrada num espírito dócil e tranqüilo, que é de grande valor para Deus” (1 Pedro 3.3-4). Podemos fazer uso de todos os recursos possíveis para a preservação e beleza do corpo, mas não podemos esquecer que as leis da vida são mais fortes; os anos passam, por mais que disfarcemos seus efeitos. As plásticas podem eliminar as rugas, mas não diminuem a idade.

Só a beleza interior é capaz de vencer a corrida contra o tempo. Seus resultados são muito mais que apenas estéticos – eles são consolidados em nosso ser e podem se tornar cada vez mais belos, sobrepujando a mera aparência.

Salomão, um rei que ficou conhecido pela sua sabedoria, viveu regiamente e relacionou-se com muitas mulheres. Tanta experiência fê-lo concluir que a beleza era enganosa e a formosura, passageira. “Mas a mulher que teme ao Senhor será elogiada”, ressalvou (Provérbios 31.30). O temor ao Senhor só será legitimado se resultar numa maturidade perceptível nos relacionamentos pessoais. O crescimento espiritual genuíno manifesta uma beleza que será reconhecida por aqueles que vivem à nossa volta. Mas cultivar a beleza interna implica conhecer as próprias sombras e ter disposição para suportar muitas vezes a vergonha e a dor de descobrir que não somos aquilo que aparentamos. É preciso encarar a realidade de que construímos muitos disfarces no anseio de sermos aceitos e amados. Na busca da beleza interior, precisamos desconstruir nossas fachadas, uma a uma – e nesses desmanches, perdemos a falsa identidade e experimentamos a sensação desesperadora da perda de nós mesmos. Viver com a imagem verdadeira que se inicia ainda é estranho e desconfortável para muitos de nós; mas adaptar-se a ela é um caminhar lento e por muitas vezes solitário, porque os amigos, conhecidos e até parentes que gostavam só da aparência que os agradava também se vão. Sim, este processo é um tipo de cirurgia, e sem anestesia. Porém, os resultados são muito mais que apenas estéticos – eles são consolidados em nosso ser e ficam cada vez mais belos, atraindo para junto de nós aqueles que apreciam e se deleitam com a beleza de caráter, que é perene e sobrepuja a mera aparência. Esther Carrenho, teóloga e psicóloga clínica. Palestrante, ministra cursos de treinamento em aconselhamento, relacionamento interpessoal e orientação familiar

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MISSÕES (First published in Christianity Today, copyright © 2008. Used by permission, Christianity Today International)

Benditos negócios Empresas geridas por cristãos combinam a busca pelo lucro com vocação missionária e empreendedorismo social

Ken Crowell, empresário de setenta e cinco anos de idade, caminha em meio às linhas de montagem de sua indústria, a Galtronics, situada na Galiléia, norte de Israel. Especializada na fabricação de componentes eletrônicos, a fábrica produz antenas para equipamentos sem fio e é fornecedora de gigantes como a Motorola e a Samsung, tendo já batido a marca de um bilhão de unidades vendidas. Satisfeito, Crowell passeia pelas instalações da empresa conversando com os sorridentes trabalhadores, todos vestidos de azul escuro. Um visitante desavisado que os visse assim, uniformizados, poderia ter a impressão de que se trata de um grupo homogêneo, composto por trabalhadores com origem e estilo de vida semelhantes. Engano. Ali, mais de 300 operários árabes, judeus e cristãos trabalham juntos e em paz, alheios às desavenças que fazem seus conterrâneos se digladiarem lá fora. Alguns desses empregados já estão na indústria há mais de vinte anos. Eles desfrutam de ótimos salários e benefícios trabalhistas – inclusive, bufê a custo subsidiado no almoço, do tipo “coma tudo o que puder”. Um letreiro na entrada do prédio da Galtronics com os dizeres “Entrega o teu caminho ao Senhor, confia nele, e o mais ele fará”, o texto do Salmo 37.5, revela a fé de seu proprietário. Crente em Jesus, Ken Crowell é um dos pioneiros em um tipo de visão empresarial que tem ganhado corpo ultimamente: é o chamado modelo BAM, sigla em inglês para Business as Mission (Negócios como missão). Combinar negócios com obra de Deus é uma idéia geralmente vista com desconfiança, mas atualmente, empreendimentos de orientação evangélica como a Galtronics estão se expandindo rapidamente por todo o mundo, como parte de um movimento em ascensão que visa gerar riquezas tanto temporais quanto espirituais. O dono descreve sua visão quando implantou a empresa, em 1978: “O chamado era primeiramente para ir a uma área onde houvesse pouco ou nenhum testemunho cristão, para dar emprego a crentes e a não-crentes em um ambiente seguro de trabalho – e, dessa maneira fornecer o apoio necessário para a edificação de uma igreja local”. A coisa deu tão certo que a Galtronics já viu nascer de suas fileiras uma igreja que hoje tem 400 membros. Ao

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mesmo tempo, os negócios vão muito bem, obrigado. O grupo já inaugurou unidades na China e na Coréia do Sul, além de cinco outras fábricas de menor porte em outros pontos da Galiléia. “Elas são gerenciadas por crentes que conhecem a visão da empresa”, afirma Crowell. O fenômeno tem vários nomes: “Negócios do Reino”, “empresas do Reino”, “missões a favor do lucro” ou “empresas da grande comissão”, para citar apenas alguns. Os observadores concordam que o movimento já é imenso e está crescendo em ritmo acelerado. “Esta é a grande tendência do momento e todos estão querendo participar”, afirma Steve Rundle, professor associado de economia da Biola University e au-

Genesis Photo Agency

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Joe Maxwell

O empresário Ken Crowell na linha de montagem da Galtronics: empreendimento de caráter cristão


Courtesy: Bill Yeager

Bill Yeager montou uma empresa agrícola que treina produtores rurais no Quênia

tor do livro Great Commission Companies (“Empresas da grande comissão”), lançado em 2003. Ele já tem outra obra do gênero no prelo, a ser lançada com o título An Overview of Business as Mission, algo como “Uma visão geral dos negócios como forma de se fazer missões”, escrito em co-autoria com Neal Johnson, especialista em BAM. Lucros e bênçãos – Os empresários do movimento utilizam os empreendimentos comerciais não apenas como forma de obter retorno financeiro, mas a fim de gerar empregos, prestar serviços à sociedade e servir de veículo para a disseminação do Evangelho. O negócio em si é um meio de divulgar a fé em Cristo e plantar igrejas. E cada vez mais, empresas do gênero adquirem um tom de globalidade, gerando empregos em países em desenvolvimento – o que as faz diferir diametralmente da visão missionária tradicional, quando o máximo que se fazia era o assistencialismo. Além disso, fazem discípulos que levam a Palavra a uma comunidade maior e mais difícil de ser alcançada: o mundo corporativo. No ano passado, o jovem Bill Yeager, 28 anos, de Montrose, cidade do estado norte-americano do Colorado, investiu o equivalente a R$ 80 mil de suas economias, obtidas com o sucesso de sua empresa de software, em uma idéia radical. Filho de ex-missionários no Quênia, Yeager começou identificando e treinando mais de 1.200 fazendeiros naquele país africano para que cultivassem cebola orgânica. Nascia o Yeager Kenya Group, cujo objetivo é a exportação para o crescente mercado de comida natural na Europa e nos Estados Unidos. “Compreendi que podia abrir um negócio com o objetivo de melhorar a vida daquele povo”, declara o engajado Yeager. Com outros R$ 140 mil de investidores externos, ele está completando o caro treinamento do seu primeiro grupo de produtores agrícolas, todos membros de igrejas evangélicas quenianas. Ao fim do processo, a renda de cada um poderá saltar de irrisórios R$ 1 mil por ano para R$ 20 mil no mesmo

período. “É arriscado, mas acredito de todo o coração que esse negócio irá decolar”, sonha o empreendedor. É difícil estimar o número atual de empresários ligados a esse modelo para lá de original de gestão de negócios. “Não somos os grandes idealizadores”, reconhece Johnny Combs, dirigente da Paradigm Engineering, empresa sediada no Texas, EUA. “Somos fazedores”, explica ele, que se tornou uma espécie de consultor do ramo. Nos últimos anos, mais de 2 mil livros e 800 organizações sem fins lucrativos vêm estimulando a combinação de trabalho e fé no ambiente profissional. Eles dedicam todos os seus esforços a uma tendência ainda mais abrangente, o empreendedorismo social, que advoga o uso do capitalismo no lugar do assistencialismo a fim de resolver dramas como o da pobreza. Profissional do Reino – Os “bamers”, como são chamados, identificam um nicho, elaboram um plano de negócios com seriedade e então partem para a ação. Em geral eles acumulam capital ao invés de angariar fundos, pois sabem que só ideais não são suficientes para alcançar os objetivos do movimento. É preciso gerar dinheiro. Tudo começou no início da década de 1980, quando um grupo de executivos americanos formou a Intent, organização que teve papel inicial importante na eclosão do movimento das empresas espiritualmente responsáveis. Seus membros incluíam Clem Schultz, que em 1989 adquiriu o controle da AMI, uma fábrica do setor de tecnologia ins-

Fé e trabalho

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m 1999, Randy Russ era o presidente e o CEO da Community Coffee, uma das maiores empresas cafeeiras dos Estados Unidos. Motivado por sua fé cristã e pela descoberta de um tipo de café de excelente qualidade em uma região da Colômbia arruinada pela guerrilha, Russ e sua empresa iniciaram um relacionamento com 500 famílias de fazendeiros naquele país sul-americano. Eles formaram uma cooperativa de ex-concorrentes para garantir a excelência e a distribuição do produto. Preços comerciais justos elevaram o padrão de vida local, e um bônus anual por desempenho é investido em projetos de desenvolvimento social. Com o apoio de órgãos do governo, os fazendeiros construíram uma escola técnica de agricultura de nível médio, investiram em equipamento e melhoraram sua alimentação com o desenvolvimento da piscicultura. “Basicamente, a expectativa é de que milhares de outros empresários resolvam utilizar seus talentos e habilidades para negócios no compartilhar das boas novas do Evangelho através de suas atividades comerciais”, declara Russ.

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MISSÕES

Arquivo

talada na Ásia. Desde a juventude, Schultz, agora na casa dos 50 anos, sentia-se chamado para missões no Oriente. Só não imaginava de que maneira que cumpriria o “Ide” de Jesus. Atualmente, as vendas da AMI variam de 30 a 50 milhões de dólares anuais e sua atuação diversificou-se. O grupo, que inclui uma editora de livros baseados em princípios e valores do cristianismo, opera 10 unidades na Ásia, empregando em torno de mil pessoas. Os elevados investimentos da holding e sua ficha de bons serviços prestados lhe renderam o favor de governos locais e nacionais asiáticos. “Recebemos enormes incentivos ao nos estabelecermos em novas áreas”, declara Schultz. Ao contrário do que se poderia imaginar, a fé não é fator determinante para a contratação – tanto que os cristãos estrangeiros na força de trabalho da AMI totalizam apenas 5% do efetivo, representando oito diferentes nacionalidades. Mas o testemunho que dão é marcante, mesmo em um continente de pouca tradição cristã. “Quando as pessoas vêem gente oriunda da África do Sul, dos Estados Unidos ou da Inglaterra compartilhando o mesmo local e a mesma crença em Jesus, nossa fé se apresenta muito mais robusta”, declara o executivo. A Intent está otimista em relação às possibilidades de negócios como forma de se fazer a obra de Deus. “O dia do profissional do Reino nas missões mundiais é chegado”, anuncia a literatura distribuída pela organização. “As pessoas que ainda não ouviram o Evangelho de Jesus Cristo serão alcançadas, de forma mais relevante, por profissionais do Reino que utilizarem suas habilidades, recebidas de Deus e talhadas pelo mercado, como seu passaporte legítimo para as nações”.

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“Retornos eternos” – “Serviços bem feitos podem mudar vidas, melhorar a sociedade e glorificar a Deus”, diz Thomas Sudyk, diretor do EC Group International, que atua no ramo de terceirização de mão de obra. A força de trabalho, no caso, é daquelas que nem sempre encontra vagas no mercado. A empresa recruta funcionários entre deficientes físicos na Índia, oferecendo-lhes treinamento na área de tecnologia da informação. “Esperamos que nossos esforços sejam vistos como bênção de Deus, através do fornecimento de empregos, de um lugar decente para se trabalhar e de um salário justo”, enfatiza Sudyk. Ele começou identificando um nicho praticamente inexplorado: transcrições de registros médicos. Contratou um gerente cristão em Chennai, na Índia, e montou o negócio fazendo um investimento de capital da ordem de R$ 300 mil. Hoje, com mais de 60 funcionários, o EC Group presta serviços para um só cliente, uma empresa médica americana que terceirizaria o trabalho da equipe indiana de Sudyk. “O nosso negócio não é para aqueles que só estão em busca de lucro”, ressalta Ken Crowell, o proprietário da Galtronics, de Israel. “Mas se o que o empresário procura é gerar retornos eternos, em uma empresa onde pode abrir uma Bíblia no escritório ou se sentir confortável evangelizando os colegas de trabalho – conquistando frutos que as missões tradicionais talvez nunca alcancem –, este é o caminho”, ensina. (Tradução: Pedro Bianco; adaptação e redação: Carlos Fernandes)

Fazedores de tendas

urgida em 2001, a Associação Brasileira de Fazedores de Tendas (AFTB) é uma entidade que congrega profissionais de diversas áreas em torno de um objetivo: fazer de sua atividade um vetor para a propagação do Evangelho de Cristo. Inspirados no exemplo do apóstolo Paulo – que, segundo o livro bíblico de Atos dos Apóstolos, exercia o ofício de fazedor de tendas como meio de sustento Moderno conceito e aceitação social para poder pregar o de missões envolve cristianismo –, professores, engenheiiniciativas de ros, advogados, médicos e agrônomos, geração de renda entre pessoas de outros perfis profissionais, usam sua capacitação para viabilizar o trabalho missionário em nações ou regiões onde o evangelismo tradicional é restrito e até proibido. Segundo a Interserve, agência que envolve cerca de 750 profissionais missionários espalhados 38 | CRISTIANISMO HOJE

Esta visão contemporânea da obra missionária encontra entusiastas também aqui no Brasil. (ver quadro abaixo)

pela chamada Janela 10/40, região onde estão a maioria dos povos não-alcançados pelo Evangelho no mundo, “fazedores de tendas são discípulos de Jesus Cristo que, chamados por Deus e comissionados pela Igreja, usam seus dons, talentos e habilidades profissionais para servir ao Senhor em um contexto transcultural”. A idéia básica é obter autorização legal para trabalhar em determinado país e, assim, poder testemunhar acerca de Cristo. Por isso mesmo, quem se envolve neste tipo de ministério é também conhecido como missionário bivocacionado. “O envio de profissionais para o campo é uma tendência das missões modernas”, afirma David Botelho, dirigente da Missão Horizontes na América Latina. “Lá, eles atuam em suas áreas de atividade secular e, paralelamente, anunciam o Evangelho de acordo com as oportunidades que ajudam a criar.” Ligada à Aliança Bíblica Universitária do Brasil (ABUB), a ABFT atua em parceria com outras organizações, como o Centro Evangélico de Missões (CEM), na capacitação missionária de profissionais. (C.F.)



IGREJA | Ed René Kivitz

Michal Zacharzewski

As casas e as verdades

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Era uma manhã ensolarada e a caminhada já se estendia. A cidade estava logo ali. Antes da chegada, a fome. E depois da fome, uma figueira. Jesus se aproxima da planta esperando colher algum fruto. Mas encontrou apenas folhas. Não teve dó nem piedade – amaldiçoou a figueira, e deixou seus discípulos assombrados. Depois deu uma bronca em todo mundo e vaticinou: quem tiver fé, ainda que do tamanho de um grão de mostarda, vai mandar esse monte sair do lugar e ele vai obedecer. No meio dessa coisa toda, Jesus ainda encontra tempo para, literalmente, chutar o balde dos comerciantes do templo, que haviam transformado a casa do Pai em covil de ladrões. O que uma cidade, uma figueira, um monte, um templo e a fé estão fazendo juntos nesta cena? Aliás, observe. Caso não tenha percebido, eles estão juntos. Não são episódios estanques, separados: o da figueira, o do templo e o aforismo sobre a fé. São peças de um quebra-cabeças que, montadas, deixam claro como o sol do meio-dia o que Jesus estava querendo dizer. Já, já, a gente chega lá. Mas quero contar outra história. Certa ocasião, Cristo se deparou com

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um homem dominado por espíritos malignos. “Legião”, disseram, ao responder qual era seu nome. Diante do Filho do Deus Altíssimo, os demônios pediram que Jesus os deixasse entrar nos porcos, perto de dois mil. Jesus consentiu. Em seguida, os porcos se lançaram ao lago de Genezaré e se afogaram. O pessoal da região ficou louco da vida com Jesus e pediu que ele fosse embora daquele lugar. Não tenho dúvidas de que você já ouviu e leu centenas de meditações baseadas nestes dois episódios da caminhada de Jesus com seus discípulos. Provavelmente, alguém já disse que seus problemas são como aquele monte citado pelo Mestre, e que podem ser superados pela fé. Não importam quais sejam seus embaraços, seus problemas, suas angústias e as razões do seu sofrimento; basta ter fé. Afinal, a fé remove montanhas, isto é, com fé a gente vence qualquer dificuldade. Também deve ter ouvido a respeito da autoridade de Jesus sobre os espíritos malignos, o que é absolutamente verdadeiro. E não é pouca autoridade, não. O Senhor deu conta de expulsar dois mil demônios de um homem de uma vez só. Eles fizeram fila e saíram um de cada vez.


Então, imagine o que Cristo não é capaz de fazer com um demoniozinho tupiniquim! Principalmente, no palco de uma igreja evangélica. Com base na história do gadareno e sob a intercessão das mãos estendidas dos fiéis, os pastores se enchem de coragem e repetem sua fórmula infalível: “Sai desse corpo que não te pertence”. Será que estes episódios se prestam apenas a ensinar a respeito do poder da fé para vencer dificuldades na vida e acerca da autoridade de Jesus sobre o diabo e seus asseclas? Ou haveria algo mais nas entrelinhas das narrativas? Fico com a segunda alternativa: os Evangelhos – decerto, a Bíblia toda – contêm linguagem cifrada, códigos secretos que comunicam verdades profundas, perfeitamente percebidas pelos circunstantes, porém raramente alcançadas pelos leitores contemporâneos. Mas, e a figueira, a cidade, o templo? O que fazer com essas figuras? Vamos lá. Primeiro, o caso da figueira. Sabemos que essa árvore é um símbolo que identifica a nação de Israel. Assim também a cidade, o templo, e o monte. A cidade é Jerusalém, onde está o Templo de Salomão, no monte Sião. Jesus faz a limpa, cumprindo a profecia de Malaquias – “Logo virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais” – e a de Zacarias: “E, naquele dia, não haverá mais mercadores na casa do Senhor dos exércitos”. Jesus deixa claro que Israel é uma figueira estéril, sem frutos, o que é demonstrado pela profanação do Templo e deturpação de sua religião. A nação é amaldiçoada; Sião deixará de ser o centro da revelação de Deus e Israel será preterida por um povo com quem Deus celebrará uma nova aliança – em Jesus, e não mais em Moisés: “É evidente que pela lei ninguém será justificado diante de Deus, porque o justo viverá da fé”. A fé que remove montanha não é a fé individual, aquela porção de fé de cada crente, mas coletiva, do povo da nova

“Assim como uma casa se faz com tijolos, mas uma pilha de tijolos não é uma casa, também uma verdade cristã se faz com versículos – mas um amontoado de versículos não equivale necessariamente a uma verdade bíblica”

aliança: “Mas a Escritura encerrou tudo debaixo do pecado, para que a promessa pela fé em Jesus Cristo fosse dada aos crentes. Mas, antes que a fé viesse, estávamos guardados debaixo da lei, e encerrados para aquela fé que se havia de manifestar. De maneira que a lei nos serviu de aio, para nos conduzir a Cristo, para que pela fé fôssemos justificados. Mas, depois que veio a fé, já não estamos debaixo de aio. Porque todos sois filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus. Sabei, pois, que os que são da fé são filhos de Abraão”. O monte removido pela fé não é a dificuldade particular de cada crente, mas Sião, o monte santo, que não se abala – ou melhor, não se abalava, até que Israel rejeitou o Messias, que conforme a Escritura, veio para os seus, mas não foi recebido por eles. Em Cristo, a Igreja – o povo da fé – recebe todos os títulos que pertenciam a Israel: “Geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo adquirido”. A fé remove o Monte Sião. Portanto, da próxima vez que alguém lhe disser que a fé remove montanhas, diga que já removeu. Sião não é mais o que era. A figueira secou. E nasceu a Igreja, povo de Deus, povo da fé. A mesma coisa acontece com a história do endemoninhado gadareno. Os espíritos imundos chamam a si mesmos de Legião, numa clara e explícita referência ao poderio militar romano. Assim como os opressores egípcios se afogaram no Mar Vermelho, quando com mão forte Yahweh libertou Israel pelas mãos de Moisés, também os opressores romanos estavam se afogando no Mar da Galiléia, sob as ordens daquele que ousou pronunciar “ouvistes o que foi dito por Moisés; eu, o Messias, porém, vos digo”. Da próxima vez que alguém lhe disser que Jesus é maior que os demônios, concorde. Mas acrescente – ele é também maior que Moisés. E maior que o Egito, a Babilônia, a Pérsia. É também maior que Roma. Maior que os espíritos malignos que agem nas entranhas do mundo, que jaz no maligno. E, porque maior que tudo e todos, é Senhor e libertador, aqui e agora, ali e além; Rei de um reino que não terá fim. Assim como uma casa se faz com tijolos, mas uma pilha de tijolos não é uma casa, também uma verdade cristã se faz com versículos – mas um amontoado de versículos não equivale necessariamente a uma verdade bíblica. Uma casa é resultado de um processo inteligente de ordenação harmoniosa de tijolos, todos agrupados conforme determinado projeto. Assim também, a verdade do Evangelho possui sua lógica. Fora dessa lógica intrínseca, versículos não passam de tijolos. Ed René Kivitz é escritor, conferencista e pastor da Igreja Batista da Água Branca, em São Paulo

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REFLEXÃO | Ricardo Agreste

Tempo de quietude

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de nossos tempos ou com o anseio insaciável de nossas almas por sermos tidos como pessoas relevantes diante do mundo. Para gente assim, o mover de Deus sempre as convida para um tempo de ir, correr e vencer. Não existe a possibilidade de o Senhor chamá-las a um tempo de ficar, aquietar-se e renovar-se. Por isso mesmo, querendo conquistar o mundo, acabam, infelizmente, perdendo a própria alma. Em meio às muitas oportunidades, demandas e desafios, confundem a ação do Senhor com as expectativas do meio ou com os anseios de seus próprios corações. Na vida do rei Davi, os desertos se tornaram o convite de Deus para um tempo de contemplação e reflexão. Ele era um homem movido por desafios e com constante ímpeto para a ação – por isso, parece que somente em meio às adversidades ele encontrava tempo para redimensionar seu próprio coração. Assim, quando lemos as orações de Davi no livro de Salmos, percebemos um homem sondando sua própria alma e procurando perceber a ação de Deus em sua vida. Em situações de adversidades, dores e aflições, Davi se convencia de que seu Deus não o convidava constantemente a ir, correr e vencer; mas, em al-

Cortesia: Ricardo Agreste

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Eu estava de saída para uma viagem a Santiago do Chile, a fim de participar de uma conferência com pastores e líderes locais. Ainda no aeroporto, aguardando o vôo, conversava com Deus sobre o meu momento de vida. Dentre muitas coisas, pedia ao Senhor sabedoria e orientação diante do cenário que me envolvia. Semanalmente, novas oportunidades surgiam diante de mim; novas demandas emergiam em minha agenda e novas conversas aqueciam meu coração para projetos aparentemente fascinantes. Estava preocupado diante de tudo aquilo que acontecia. Sei que uma das razões que fazem com que homens e mulheres de Deus acabem por se perder, mesmo que bem intencionados em suas motivações iniciais, é a falta de uma clara percepção acerca do mover de Deus em suas vidas. Muitos passam a entender que toda oportunidade que surge é uma porta aberta pelo Senhor, ou que toda demanda que emerge é um desafio lançado pelo Espírito Santo. Há também aqueles para quem qualquer conversa que lhes aqueça o coração é uma visão de Deus que precisa ser assumida. Para os que enxergam a vida nesta perspectiva, o mover de Deus acaba se confundindo com o empreendedorismo


gumas ocasiões, o impelia a ficar onde estava, aquietar o coração e renovar sua alma. Maria, irmã da superativa e dinâmica Marta, viveu uma situação diferente. Em sua vida, o tempo de ficar, aquietar-se e renovar-se não é fruto de uma situação criada por Deus, mas de opções que precisava fazer. Cercada por gente constantemente voltada para a ação, que enxergava cada oportunidade como porta aberta pelo Senhor, cada demanda como um desafio do Espírito e cada conversa como visão de Deus, torna-se normalmente mais difícil encontrar espaço para aquela reflexão espiritual. Mas Maria rompe com seu ambiente, resiste às expectativas que as pessoas à sua volta tinham acerca de si e resolve sentar-se aos pés de Jesus para ouvi-lo. Jesus, por sua vez, encoraja a opção feita por Maria, demonstrando que na caminhada cristã há, sim, tempo de simplesmente ficar, aquietar-se e renovar-se. Mas o maior exemplo de que Deus nos convida a esses momentos encontra-se na própria vida de Jesus. Em seu curto ministério terreno, Cristo tinha um enorme desafio diante de si. As demandas eram inúmeras; as necessidades, infindas, e as frentes de trabalho, imensas. No entanto, vemos nos Evangelhos episódios em que o Filho de Deus sobe montes ou procura lugares desertos a fim de simplesmente ficar, aquietar-se e renovar-se na presença do Pai. Apesar da pressão das multidões, ele afastava-se em submissão ao mover de Deus para um tempo de silêncio e descanso. No entanto, este não era um tempo de contraponto à sua missão – mas sim, um espaço integrante e essencial na mesma. Durante uma manhã livre naquela viagem a Santiago, um querido e antigo amigo me levou para subir as cordilheiras até um lugar chamado Vale Nevado. Fomos e voltamos conversando sobre muitas coisas. Há muito tempo não tinhamos oportunidade de nos falar. No entanto, em meio às muitas palavras e diante de paisagens fantásticas, deparei-me com uma cena que me chamou a atenção. Do local, podiamos contemplar um enorme e fantástico monte coberto de neve. Seu aspecto era imponente e fascinante. Era impossível passar por ali sem admirá-lo. Mas ainda no mesmo foco de visão, bem mais próximo de nós,

na margem da estrada, inúmeras árvores com seus galhos completamente secos contrastavam a imponência e fascínio da montanha branca. Minha atenção ficou dividida entre as duas cenas contrastantes. Foi então que meu amigo, olhando para aquelas árvores, disse: “Interessante, não? Elas parecem mortas. Quem olha pensa que não resistiram ao inverno. No entanto, estão assim porque, percebendo o rigor da estação fria, concentram suas forças e energias no caule. As folhas caíram e os galhos secaram, mas toda a sua vitalidade encontra-se concentrada no caule. Para elas, agora não é o tempo de florescer, mas de resguardar-se para, no tempo certo, voltar a produzir folhas, flores e frutos. Este é o ciclo da vida.” Ouvindo aquelas palavras e tendo os meus olhos fixos naquelas árvores, ouvi a resposta de Deus para a oração que havia feito antes de partir do Brasil. Nem sempre é hora de ir, correr e vencer. Existem tempos em que o Senhor nos convida a ficar em sua presença, e ali aquietar nossa mente e renovar nossa alma. Em meio a tantas coisas e situações que nos envolvem, precisamos ter a sensibilidade para perceber que o Senhor, por vezes, não deseja que façamos tudo ou aceitemos todos os desafios. Existe também o tempo em que seu mover nos convida a concentrarmos nossas forças e energias no que é essencial e imprescindível: a nossa relação com ele. Às vezes, como acontecia na vida de Davi, Deus precisa criar desertos em nossa história para nos convencer desta verdade. Noutras situações, assim como o fez Maria, podemos exercitar nosso poder de decisão contra o meio que nos impele a constante atividade, optando por simplesmente quedar-nos aos pés de Cristo. Mas também podemos olhar para Jesus e perceber o convite para vivermos em maturidade, integrando este tempo como parte essencial e imprescindível da missão de Deus para as nossas vidas.

“Existem tempos em que o Senhor nos convida a ficar em sua presença, e ali acalmar nossa mente e renovar nossa alma”

Ricardo Agreste da Silva é pastor na Comunidade Presbiteriana Chácara Primavera, em Campinas (SP), coordenador da área de Teologia Pastoral no Seminário Presbiteriano do Sul e membro do Projeto Timóteo e do Centro de Treinamento para Plantadores de Igreja

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First published in Christianity Today, copyright © 2008. Used by permission, Christianity Today International)

O navio África Mercy: hospital flutuante é utilizado para levar socorro médico a populações carentes do mundo

Os bons samaritanos dos mares Agência Mercy Ships usa navios-hospitais para levar socorro médico e o amor de Cristo a carentes de todo o mundo

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Deann Alford

Quando o navio Africa Mercy aportou em Monróvia, capital da Libéria, não chamou a atenção de quase ninguém. Afinal, aquele porto da costa ocidental africana é dos mais movimentados do planeta, graças às baixas tarifas de navegação cobradas pelo governo local. Empresas de transporte naval e armadores de diversas nacionalidades registram seus navios com a bandeira liberiana, o que proporciona enorme economia em taxas. Mas o Africa Mercy não foi até lá em busca de negócios. Sua missão é outra – resgatar a saúde e a auto-estima de gente que, de outra maneira, jamais teria acesso a serviços tão sofisticados quanto os oferecidos pelo navio-hospital. Ligado à organização evangélica Mercy Ships (“Navios de misericórdia”), o Africa é parte de um grandioso projeto humanitário que, ao longo dos últimos 25 anos, realizou mais de 30 mil cirurgias e outros 200 mil atendimentos clínicos em nada menos que 70 países. Para muitas dessas pessoas, sua presença representou a diferença entre a vida e a morte.

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O alvo da ação quase sempre são pessoas que vivem no limiar da miséria, vitimadas pela doença e pelo preconceito. Como Aminita, conhecida como “Bruxa de Freetown” devido ao seu terrível aspecto. Com a face desfigurada por uma lesão, ela teria destino semelhante ao de outra liberiana, Beatrice, 40 anos de idade, cuja aparição era tão chocante que nem os motoristas de táxi aceitavam transportá-la. Já Angelle, moradora da zona rural do país, era alvo de discriminação devido ao tumor de 3 quilos que carregava na face. Sem tratamento, o mal avançava, comprometendo a respiração e a alimentação, com risco para sua vida. Ela era até considerada amaldiçoada. A complexa cirurgia facial necessária para o tratamento de deformações como estas e a restauração da face de suas vítimas quase nunca está disponível na rede de saúde de nações pobres como a Libéria. Então, o jeito era conformar-se com o sofrimento atroz. Pois é justamente para salvar pessoas como Aminita, Angelle e Beatrice – que, operadas por missionários da

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SOLIDARIEDADE


Courtesy: Mercy Ships International

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Mercy Ships, hoje levam décadas atrás. De 1960 a vida normal – que o navio 1974, o SS Hope, da MaAfrica Mercy faz agora sua rinha americana, visitou viagem inaugural. Atual11 portos de países em mente, ele está na Libéria desenvolvimento, oferepara um programa que cendo cuidados médicos deve durar dez meses e a pessoas que não tinham prevê, além da realização qualquer acesso a serviços A liberiana Aminita, antes e depois da cirurgia: saúde e de cirurgias faciais para de saúde. auto-estima recuperadas extração de tumores e corO Projeto Hope (do inreção de fendas de palato glês Health opportunities e lábio leporino, uma série de atendimentos que incluem for people everywhere, ou “oportunidades de saúde para operações de hérnia, catarata e outras com grande possi- pessoas em todos os lugares”) logo tornou-se fonte de bilidade de cura se realizadas em tempo hábil. Mas para inspiração para Stephens e outros líderes da Jocum. Aspopulações inteiras de países africanos, asiáticos ou lati- sim como o Anastasis serviu ao redor do mundo, nos 25 no-americanos, uma simples consulta médica costuma anos seguintes Mercy Ships expandiu sua frota, adicioser luxo inacessível. “A situação mais difícil com a qual nando o Island Mercy, que atuou na Ásia, e o Caribbean nós lidamos é ver o sofrimento humano em situações Mercy, para atender os países da América Central e Capara as quais existe solução”, lamenta o cirurgião Gary ribe. Em 1999, Mercy Ships adquiriu a Dronning Ingrid, Par­ker, da equipe do Africa Mercy. Ele é parte de um gru- uma balsa dinamarquesa que, reformada ao custo de 62 po multinacional que envolve voluntários e funcionários milhões de dólares, transformou-se no Africa Mercy, o da missão. São médicos, enfermeiros, dentistas, auxilia- maior navio-hospital não-governamental do mundo. Ele res, técnicos e tripulantes que viajam de porto em por- tem 6 centros cirúrgicos e 484 leitos. Em 2003, Mercy to, de país em país, anunciando o Evangelho da maneira Ships desligou-se da Jocum e, atualmente trabalha de mais prática e eficiente que existe: o socorro ao próximo maneira independente. em nome de Jesus. Os integrantes da missão originam-se de mais de 40 nações, inclusive do Brasil (ver quadro na pág. 47). Eles Frota missionária – Tem sido assim desde 7 de julho de trabalham juntamente com centenas de voluntários que 1982, quando o Anastasis, navio italiano construído 30 servem durante qualquer período de tempo, variando de anos antes e restaurado pela Mercy Ships, foi lançado ao duas semanas a dois anos, de acordo com a disponibilidamar. Ligado à agência missionária internacional Jovens de de cada um. Parker, o cirurgião, diz que a rotina a borcom uma Missão (Jocum), a embarcação foi adaptada do do navio é um “estudo de vida simples”. Ele e a mulher, como hospital flutuante com a missão de levar os me- Susan, diretora de Desenvolvimento dos funcionários, lhores profissionais de saúde e tratamentos disponíveis, criaram seus dois filhos em uma cabine do Anastasis, onde gratuitamente, às áreas mais desassistidas do mundo. viveram por 11 anos até que a missão resolveu aposentar Era a realização do soa embarcação porque nho do missionário seus custos de manutenCriança operada pela equipe do navio: cirurgias Don Stephens, que junção ficaram altos deoftalmológicas são especialidade do Africa Mercy tamente com sua mumais. “Nós vivemos em lher, Deyon, e um grupo locações desafiadoras. da Jocum, trabalhava Como mulheres, nossa como voluntário nesta liberdade é muitas vezes área. “Mercy Ships tem cerceada”, conta Susan. como foco a população “Não é sempre fácil. O carente e suas necessimaior benefício é saber dades”, diz Stephens. Na que outras 400 pessoas verdade, a idéia original à sua volta têm os mesde um navio-hospital fimos objetivos. Por isso, é lantrópico data de cinco preciso investir nos rela-

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SOLIDARIEDADE

Ambiente de integração com os missionários colabora para a recuperação dos pacientes

cionamentos – nós comemos, nos divertimos, louvamos a Deus, vivemos, trabalhamos e enfrentamos os desafios e alegrias juntos.” O oftalmologista neozelandês Neil Murray conta que muitas vezes é preciso recorrer a intérpretes locais para poder consultar alguns pacientes. Em Gana, por exemplo, além do inglês, língua oficial, há outros 70 dialetos tribais. Ali, a ajuda de voluntários cristãos como Peter Bonney, pastor da United Church of God, uma congregação próxima à cidade de Nungua, é fundamental. Nas visitas do navio ao país, Bonney, que é fluente nos dialetos tanti, twi, ga e ashanti, é o elo entre médicos e os pacientes, que representam diversas etnias. Segundo Murray, cerca da metade dos deficientes visuais do mundo perderam a visão, ou parte dela, em decorrência de catarata, moléstia comum com o avanço da idade. “A cirurgia de catarata hoje é simples, mas as pessoas muitas vezes passam a vida toda sem ter uma chance”, conta Murray. Satisfeito, o médico conta que, nas jornadas a bordo do navio-hospital, já realizou cirurgias em pacientes acima dos 100 anos de idade.

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Chamado – O trabalho a bordo do navio-hospital é intenso e desgastante. Por isso mesmo, a equipe precisa ser relembrada freqüentemente de seu chamado especial. Nas horas livres, são realizados cultos e encontros de grupos para discipulado e estudos bíblicos. A enfermeira australiana Fiona Fraser usa o exemplo da vida de Davi para falar sobre a preparação que cada um precisa ter. “De pastor de ovelhas, ele chegou a rei de Israel. Quando a hora é certa e você está pronto, Deus envia”, enfatiza. “E ele sabe onde achar cada um.” Tertius Vener e sua mulher Trudi, sul-africanos, têm buscado seguir esse chamado à risca. Cirurgião plástico, Tertius conta que recebeu do Senhor a orientação para dirigir sua vocação profissional ao cuidado com pessoas pobres, gente que não lhe poderia pagar um centavo. Desde então, serviu por dez anos a bordo do Anastasis, onde realizou nada menos que 12 viagens internacionais. Quem se dispõe a este tipo de trabalho precisa estar disposto a envolver-se totalmente com a obra. Na opinião de Don Stephens, nos dias de hoje as pessoas precisam não apenas ouvir as boas novas, mas vê-las sendo anunciadas na prática. “O Evangelho tem dois componentes – fazer e, ao mesmo tempo, ensinar”, diz. Além do ministério realizado a bordo dos navios-hospitais, Mercy Ships também atua no desenvolvimento de outros projetos. Um dos mais recentes é o Operation New Steps (“Operação Novos Passos”), voltado à reabilitação de vítimas de minas terrestres. Países como Angola e Afeganistão, que recentemente estiveram envolvidos em sangrentas guerras, ainda possuem milhões de artefatos do gênero em seu subsolo. Estima-se que as minas mataram, feriram e mutilaram cerca de 30 mil crianças nas últimas décadas. Novos Passos começou como um contêiner equipado para produzir próteses de pés e pernas em até 24 horas. Hoje, a instituição tem uma sede central e também atende pacientes vítimas de poliomielite. De acordo com Stephens, os custos de Mercy Ships são mantidos no nível mínimo, uma vez que cada missionário levanta seu próprio sustento. Além disso, grandes corporações doam à entidade milhões de dólares em equipamentos e medicamentos, todos os anos. O resultado disso tudo, como se costuma dizer, é que não tem preço. Após a cirurgia de Angelle, a liberiana que tinha as feições desfiguradas, as pessoas com quem convivia tiveram até dificuldade em reconhecê-la. Ela até ganhou outra nova cédula de identidade, com foto de seu novo rosto. E a gratidão de quem é ajudado comove os voluntários. Um paciente, que tinha enormes cicatrizes no rosto e seqüelas de queimaduras por ácido, escreveu agradecendo ao


deu que não. Não foi possível salvar a visão do menino, que perdeu um dos olhos. Mas os médicos lhe deram de presente três próteses oculares, de diferentes tamanhos, para serem usadas conforme seu crescimento. Muito contente, o pai recebeu de bom grado o Novo Testamento que lhe foi oferecido e confessou a Stephens: “Não me tornei cristão. Mas estou lendo o Novo Testamento e orando no nome de Jesus, só para garantir.” E fez uma declaração que resume bem os efeitos do trabalho da missão Mercy Ships: “Eu nunca tinha ouvido sobre o amor de Deus”. (Tradução: Karen Bomilcar. Redação e adaptação: Carlos Fernandes) Divulgação

especialista que o operou: “Que Deus, o Todo-Poderoso, abençoe a você e sua família, pois você me devolveu a esperança que perdi após o acidente que sofri.” Embora a natureza do trabalho seja explicitamente missionária, nenhum paciente é constrangido a converter-se à fé cristã. Mas todos recebem literatura, Bíblias e são convidados a assistir filmes evangelísticos enquanto aguardam atendimento. Don Stephens gosta de contar a história de um juiz muçulmano que assistiu o filme Jesus enquanto os médicos do navio operavam seu filho Alcini. Antes da cirurgia, perguntou: “Eu preciso me tornar cristão para que vocês operem meu filho?” A equipe respon-

“Privilégio grande” E

ntre a tripulação multinacional do navio Africa Mercy, CRISTIANISMO HOJE encontrou o brasileiro Carlos Eduardo Ferrante do Amaral, 30 anos, paranaense de Telêmaco Borba. Evangélico, ele freqüenta a Igreja Irmãos Menonitas em Curitiba. Dono de sólida formação profissional – é engenheiro eletrônico e mestre em engenharia biomédica –, Amaral está prestes a concluir doutorado pela Universidade de Munique, na Alemanha. Do navio, fundeado no porto de Monróvia (Libéria), ele falou sobre seu trabalho e a rotina a bordo: CRISTIANISMO HOJE – Como tem sido a atual viagem à África? CARLOS AMARAL – Eu me identifico bastante com o povo daqui, que demonstra grande simpatia pelo Brasil – especialmente, pelo nosso futebol. Além disso, existem muitas similaridades com a nossa cultura. Estamos há seis meses ancorados em Monróvia. Trabalhamos em média oito horas por dia. Minha função é fazer a instalação e manutenção dos equipamentos médicos do navio. Parte do nosso tempo livre é gasto visitando os pacientes do navio, orfanatos, hospitais e lares de deficientes na cidade. A Libéria possui varias praias que nos ajudam a descontrair durante os fins de semana. Além disso, temos muitas atividades religiosas no navio, como grupos familiares, cultos e visitas a igrejas locais. Desde quando o senhor integra a equipe de Mercy Ships e como foi seu ingresso na organização? Estou trabalhando com Mercy Ships há oito meses como técnico biomédico. Ouvi falar sobre Mercy Ships durante meu curso na Escola de Treinamento e Discipulado da Jocum, há sete anos. Porém, meu primeiro contato com esta instituição

O engenheiro Amaral com uma criança liberiana: profissionalismo e ministério

foi em 2004, durante meus estudos na Alemanha, país onde o primeiro navio, o Anastasis, estava ancorado. Como representante de um país do Terceiro Mundo, o que significa para o senhor levar assistência médica a populações ainda mais pobres e desassistidas do que a brasileira? Trabalhei com assistência social também no Brasil. Apesar das grandes necessidades do nosso país, a Libéria encontrase em situação muito inferior. Aqui, o desemprego é de aproximadamente 80% e a renda per capita não passa de US$ 1 por dia. Não existe um sistema de saúde estruturado e o número limitado de médicos dificulta o tratamento de muitas doenças. Veja o exemplo dos tumores de face – mesmo benignos, tornam-se grandes deformidades faciais e podem levar à morte. Para mim, é um privilégio grande servir a este povo com as cirurgias oferecidas pelo nosso navio. (C.F.)

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PavaZine# | Sérgio Pavarini

Vaia com Deus

“Vamos aplaudir mais forte, povo de Deus! A gente bate palmas aqui nesta igreja porque a Bíblia diz: ‘Batam palmas todos os povos’” – inapto e inepto, o pastor tentava ingenuamente animar o povo a participar da reunião. Infelizmente, o formato de culto que predomina em boa parte das comunidades só permite a participação popular ao aplaudir, cantar e dizer “amém” ou expressões afins. A origem dos aplausos está relacionada ao aspecto religioso. Em vários ritos pagãos, o ruído provocado pelas palmas era uma forma de chamar a atenção dos deuses. Interessante notar que hoje o rebanho continua sendo pavlovniamente condicionado a repetir esse tipo de gesto. O sucesso no adestramento parece desmentir a proximidade genética apenas com os símios. Basta espiar a performance uniforme da fauna amestrada em muitos templos. Como acontece nos programas de auditório, a intensidade dos aplausos tornou-se referência para avaliar se o culto foi bom ou não. A adoção de um parâmetro equivocado abre espaço para toda sorte de expedientes para provocar as palmas da congregação. Por exemplo, chamar celebridades de terceira linha para testemunhar que Jesus deu novo rumo para sua carreira decadente. Com direito a promoção de opúsculos e CDs na tradicional xepa após o fim da reunião. Poucos se lembram de observar se a Palavra está produzindo transformação na vida dos ouvintes. Em certos modelos eclesiásticos vigentes essa tarefa realmente é impossível, já que a

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Igreja perdeu características neotestamentárias fundamentais. As pessoas apenas freqüentam reuniões nesses templos religiosos de consumo, sem nenhuma oportunidade de interação com os irmãos. Tornaram-se apenas consumidores incitados todo o tempo por pastores-vendedores (tanto faz a ordem, neste caso) a adquirir campanhas, comprar desafios e aceder a apelos lamurientos na hora da oferta.

“As pessoas apenas freqüentam reuniões nos templos religiosos de consumo. Tornaram-se apenas consumidores incitados todo o tempo por pastoresvendedores” Matéria publicada recentemente na revista Veja SP abordou a questão da obrigatoriedade dos aplausos ao final de qualquer espetáculo. Independentemente da qualidade da apresentada, a ovação agora faz parte do script. Segundo o crítico de música erudita Irineu Franco Perpétuo, “um público menos informado não é criterioso e bate palmas o tempo todo”. Será que a asserção também é válida no caso

das igrejas? Após desempenho medíocre no palco, aplausos automáticos deixam os atores aliviados. O efeito é similar quando as palmas irrompem no meio de uma mensagem sem conteúdo pregada com entusiasmo. Não faltam candidatos a “puxadores de palmas”, remetendo à estratégia usada pelo imperador Nero de sempre levar uma claque para garantir a repercussão de seus discursos. Se a contrapartida de reação fosse válida, também teríamos o direito de vaiar o que nos desagrada durante as reuniões. A banda não ensaiou e errou vários acordes? Vaias para os músicos. O pastor se desculpa antecipadamente dizendo que “Deus pediu” para ele mudar a mensagem e por isso não se preparou adequadamente? Nem é preciso esperar a pregação. Vaia nele. O preletor convidado testemunha que o Senhor “cegou” os guardas e eles não viram as várias infrações que cometeu no trânsito para chegar na igreja? Muuuitas vaias para o cara-de-pau. Para alívio de muita gente, os apupos devem continuar proibidos. Aos insatisfeitos com a condição de claque muda ou de meros provedores de megalômanos infecundos, restalhes a mesma reação que têm muitos consumidores ao serem ignorados ou tratados de forma inadequada numa loja: retirar-se silenciosamente, geralmente para nunca mais voltar. Sérgio Pavarini é jornalista, marqueteiro e editor da newsletter semanal Pavazine. Blog: pavablog.blogspot.com E-mail: pavarini@uol.com.br



CH DIGITAL | Whaner Endo

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O Oráculo de Bacon e as redes sociais

Você já ouviu falar no Oráculo de Bacon? E na teoria dos seis graus de separação? Não? Mas, se você tem um perfil no Orkut, no Facebook, no MySpace, possui um grupo de amigos em uma comunidade virtual ou blog ou, ainda, participa de algum Wiki, você deve agradecer a esses visionários dos anos 1990. A teoria dos seis graus foi desenvolvida nos Estados Unidos e afirmava que eram necessários seis laços de amizade para que duas pessoas quaisquer estivessem ligadas. Baseado nessa teoria, Brett Tjaden criou, em 1996, o Oráculo de Bacon, um jogo que determina o número de Bacon de qualquer artista, ou seja, como ele se relaciona com o ator Kevin Bacon. Por exemplo – a atriz e apresentadora brasileira Marília Gabriela tem um número Bacon 3, pois em 2002 ela contracenou com Giovanna Antonelli em Avassaladoras, que por sua vez contracenou com Stephen Tobolowsky no filme Bossa nova (2000); já Tobolowsky contracenou com Bacon no filme Assassinato em primeiro grau (1995). Até hoje, o maior número de Bacon foi 7. O endereço do Oráculo é http://oracleofbacon.org, onde você pode comprovar a teoria com outros artistas (mas cuidado, o jogo vicia...). Ok, mas o que isso tem a ver conosco? É que esse conceito é a pedra fundamental das redes sociais, a ferramenta mais atual e eficaz para a disseminação de idéias, valores e atitudes. Segundo a Wikipédia, “rede social é uma das formas de representação dos relacionamentos afetivos ou profissionais dos seres humanos entre si ou entre seus agrupamentos de interesses mútuos”. Ao criar um perfil no Orkut e se inscrever em diversas comunidades, você está criando vínculos com pessoas que têm o mesmo interesse que você. Montando o site da sua banda no MySpace, você passa a acessar uma grande rede de pessoas que gostam do

mesmo ritmo que você produz. Os blogs são perfeitos para agrupar pessoas que compartilham idéias, gostos ou interesses semelhantes, um grande passo para o tão desejado buzz marketing (marketing viral). Quantas vezes você precisou divulgar a programação de aniversário da sua igreja ou convidar pessoas para aquela conferência missionária? O melhor caminho são as Redes Sociais, pois você estará falando com “agrupamentos de interesses mútuos”. Das redes sociais surge um novo conceito: SMO – social media optimization, ou seja, técnicas para gerar publicidade por meio das mídias sociais – ferramentas e plataformas online utilizadas para compartilhar opiniões, insights etc. Trata-se de experiências e perspectivas. Agora, nunca se esqueça de que não se deve forçar o SMO, pois ele é um sistema de pull marketing (puxado pelo usuário) e não push (empurrado); sendo assim, não se deve “forçar a barra” para divulgar suas idéias. Boas estratégias de SMO conseguem trazer mais visitas ao seu site, aumentar a circulação de seus boletins digitais ou mesmo diminuir o número de desistências de compras em seu site de e-commerce. Como qualquer relacionamento, as redes sociais necessitam ser criadas e alimentadas; baseiam-se na confiança e identidade entre seus participantes e, talvez o mais importante, devem ser pensadas em termos coletivos e não individuais, possibilitando que sempre haja um relacionamento em que todos ganham.

“As redes sociais são a ferramenta mais atual e eficaz para a disseminação de idéias, valores e atitudes”

Whaner Endo é publisher da W4 Editora e Diretor Executivo da Associação de Editores Cristãos. Formado em produção editorial, é mestrando em Comunicação Social pela Universidade Metodista de São Paulo. É membro da Wacc - World Association for Christian Communication. Contato: whaner@w4editora.com.br

Dicas de leitura O Oráculo de Bacon – http://oracleofbacon.org/ Revista Meio Digital – Edição Dezembro/Janeiro 2008 – http://www.meiodigital.com.br Portal Cristianismo Criativo – Rede social voltada aos artistas cristãos – http://www.cristianismocriativo.com.br Limão.com – Rede social do Grupo Estadão – http://www.limao.com.br

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CINECULT | Nataniel Gomes

A menina que virou rainha Conquista dos reis conta a história de Ester, a judia que conquistou um soberano persa e salvou Israel da destruição A vida de Ester, jovem judia que salva seu povo do extermínio e torna-se rainha, bem que daria um filme. E deu – Conquista dos reis é o título, ainda provisório em português, do épico dirigido por Michael Sajbel e com roteiro de Stephan Blinn. Ele adaptou para a tela o livro Hadassah: One night with the King (que também é o título original do longa), de Tommy Tenney. A história é aquela descrita no livro bíblico de Ester, cheia de aventura e com uma linda história de amor como pano de fundo. A protagonista, vivida por Tiffany Dupont (Doze é demais), conquista o coração do rei persa Xerxes (Luke Goss, de Blade II). O romance acaba livrando Israel da destruição por seus inimigos, dando assim continuidade aos planos de Deus através de seu povo eleito. O filme reúne ainda Peter O’Toole, como Samuel, e Omar Sharif, a dupla do inigualável Lawrence da Arábia. Conquista dos reis deve sair no Brasil direto em DVD.

Maestro atrapalhado O executivo Darrin Hill, vivido pelo impagável Cuba Gooding Jr, perde o emprego em uma empresa de publicidade de Nova Iorque. Ao mesmo tempo, descobre que uma tia morreu e deixou uma herança de US$ 150 mil para ele. O suficiente para tirar Hill do sufoco – e lá vai ele para o enterro, mais interessado em pegar a bolada, evidentemente. É aí que descobre que o testamento tem uma exigência: para receber o dinheiro, Hill deveria criar um coro evangélico, participar da competição anual da Gospel Explosion e conquistar a vitória. As primeiras dificuldades surgem para encontrar os cantores. Apesar de, no início, não ter qualquer envolvimento emocional ou espiritual com o projeto, o ex-publicitário encontra uma cantora de jazz que, com sua linda voz, o faz repensar suas motivações. Quem gosta de música e de boas risadas não pode dispensar Resistindo às tentações. (Comédia/ musical, EUA, 2003. Direção: Jonathan Lynn. Duração: 122 min)

De traficante a missionário Na América do Sul do século 18, ainda colonizada por espanhóis e portugueses, um traficante de escravos, interpretado por Robert de Niro, sente-se amargurado com a vida que leva e busca o arrependimento através da autopenitência. Acaba se tornando missionário jesuíta na região das Missões, palco das Guerras Guaraníticas. Hoje, o filme anda meio esquecido e pode ser encontrado por R$ 10 em lojas de departamentos. Mas convém lembrar que, além de uma bela história de fé, A Missão tem uma magnífica trilha sonora, reúne um elenco de peso – além de De Niro, Jeremy Irons e Lian Neeson –, faturou a Palma de Ouro em Cannes e ainda levou um Oscar de fotografia. (Drama, Inglaterra, 1986. Direção: Roland Joffé. Duração: 121 min) Nataniel Gomes é doutor em Lingüística, professor universitárioe editor da Thomas Nelson Brasil

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SONS DO CORAÇÃO | Nelson Bomilcar

Pacote completo

Novo trabalho de Guilherme Kerr reúne no mesmo CD poesia rica, teologia consistente e excelente musicalidade

T

Te vejo, poeta é o primeiro trabalho autoral totalmente interpretado por Guilherme Kerr, um dos maiores poetas e compositores da música cristã contemporânea. Com 33 anos de ministério no Brasil e agora radicado nos Estados Unidos – onde atua como pastor –, Kerr já produziu pérolas como as cantatas Vento livre e Eram doze. Pois agora o artista brinda o público com este trabalho que reúne rica poesia e teologia correta e profunda, um amálgama raríssimo de se encontrar e ouvir hoje no segmento evangélico. Por isso mesmo, Te vejo, poeta é mais que bem-vindo no cenário musical atual. Com canções novas (além da faixa-título, Coração quebrantado, Fruto de amor e Se meu povo) e algumas composições bem conhecidas – caso de Bendize ó minh´alma e Como sairemos –, o CD traz parcerias com João Alexandre, Gerson Borges e Jorge Rehder. Com produção de Cezar Elbert e gravado no estúdio Cia Alternativa, o álbum foi masterizado na COMEV e tem arte de João Filipe Carrenho. A produção executiva é da GKerr Produções e VPC Produções. Contato: www.vpc.com.br

Sons de gerações, entre o clássico e o moderno Poucos músicos conseguem fundir conceitos clássicos com recursos modernos. Pois Gerson Ortega conseguiu, e o fez com extremo talento e espiritualidade. Acaba de sair o DVD Intimidade, gravado ao vivo na bela Catedral Evangélica Presbiteriana Independente de São Paulo. Ortega, músico, arranjador e ministro de louvor, desenvolve um belo ministério dentro e fora do Brasil, onde atua também em missões na companhia do prestigiado Asaph Borba. Intimdade traz a adoração numa sonoridade enriquecida por instrumentos tradicionais, como órgão de tubos, piano e harpa, sem abrir mão da bateria, dos teclados

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e guitarras elétricas, e o resultado é uma bendita preservação de antigas e novas gerações nos cânticos e hinos. Contatos: (11) 5571 1116 ou www.gersonortega.com

Salmos na adoração contemporânea Toninho Zemunner e Rubem Amorese formam uma dupla das mais inspiradas na música cristã. Toninho, músico e arranjador com passagem pelo MILAD, e o conhecido escritor cristão Rubem Amorese, vivem em Brasília, onde são ligados à Comunicarte e Igreja Presbiteriana do Planalto. E foi lá, na capital federal, que eles produziram o inspirativo CD Tehillim 2 – A oração dos Salmos”. Todas as canções trazem a moldura de nosso ritmo, harmonia e jeito de fazer poesia. Toninho Zemuner assina produção musical, arranjos, programação, violão, baixos e interpreta a maioria das orações; já Amorese entra como autor e adaptador da maioria dos Salmos e melodias, cantando também e tocando gaita. Contato: (61) 3272 8860

Bons ventos do Ceará O Estado do Ceará é conhecido em todo o Brasil como terra com um povo caloroso e magníficas paisagens. E o Ceará também tem o Instituto Ser Adorador (ISA), ministério que atua com adoração, arte, cultura e ação social. Plantado no Nordeste, o ISA não abre mão de suas raízes regionais na adoração. Por isso mesmo, Eu quero ser adorador, primeiro trabalho de sua banda, traz ritmos como baião e frevo, ao lado de baladas, rock e valsa. A maioria das músicas do CD é de autoria do compositor e pastor Augusto Guedes e de Márcio Rocha, produtor, arranjador e guitarrista, os idealizadores do trabalho. Isso, sem falar nas participações especiais do excelente saxofonista Hilquias Alves e do compositor e cantor Jorge Camargo. Gravado por Daniel Alencar no Compasso Estúdio, lá mesmo em Fortaleza, o álbum foi masterizado em Chicago (EUA). Contato: www.seradorador.com.br. Nelson Bomilcar é músico, compositor, produtor, escritor e pastor. Trabalha com o Instituto Ser Adorador (www.seradorador.com.br) e apresenta o programa de música cristã Sons do coração pela rádio Transmundial e internet. Toca com a Confraria das Artes pelo Brasil. E-mail: nmbomilcar@uol.com.br


O NOVO SUCESSO DE STORMIE OMARTIAN

RECEBA OS PRESENTES DE DEUS DE BRAÇOS ABERTOS Todos os dias Deus nos oferece verdadeiros presentes. E alguns deles são cruciais para se manter a saúde emocional: o dom do amor, o da graça, o do poder e o do descanso. Este livro ensina a enfrentar as armadilhas que o mundo reserva e também o caminho do crescimento espiritual para uma vida repleta de realizações.

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Carlinhos Veiga

ENTREVISTA

Carlos Fernandes

O Evangelho do próximo

O

Entusiasta da missão integral da Igreja, René Padilla defende uma teologia ajustada à realidade latino-americana

Os teólogos contemporâneos são praticamente unânimes ao afirmar que o Congresso Internacional de Evangelização Mundial, realizado em Lausanne, na Suíça, em 1974, mudou os rumos do protestantismo mundial. Ali, em um ambiente de intenso debate e com a presença de representantes de mais de 120 países, foram traçados novos rumos para que a obra de Deus se adaptasse à modernidade sem perder de vista os pressupostos básicos da fé cristã. Mas sua maior contribuição à Igreja mundial foi a consolidação da teologia da missão integral – uma abordagem do Evangelho que leva em conta as necessidades humanas em sua plenitude. “Corpo, alma, emoções e mente não podem ser dissociados”, diz um dos pontos do Pacto de Lausanne. Até hoje, os participantes daquele histórico evento se confessam profundamente influenciados pelo que viram e ouviram ali. Um deles é o pastor batista René Padilla, 75 anos. Equatoriano de nascimento, pode-se dizer que ele é um cidadão da América Latina. Foi criado na Colômbia e vive há mais de 30 anos na Argentina, onde é o presidente emérito da Fundação Kairós. Conhecido como um dos mais destacados teólogos da atualidade, ele, que ajudou a criar a Fraternidade Teológica Latino-americana (FTL), tem trazido importantes contribuições para a reflexão

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cristã ao redor do mundo. “A nobre causa do Evangelho integral continua se estendendo”, entusiasma-se. Dono de um vasto currículo, que inclui obras traduzidas para cinco idiomas, mestrado em teologia e doutorado em ciências bíblicas e exegese pela Universidade de Manchester, na Inglaterra, Padilla, apesar da idade, mantém uma extensa agenda. Após exercer o pastorado em igrejas locais por 15 anos, o teólogo lançou-se a outras atividades ministeriais, que incluem produção literária, ensino e participação em congressos e eventos ao redor do mundo – como a Consulta Nacional realizada pela seção Brasil da FTL no fim do ano passado, em Brasília. Ali, René Padilla atendeu a reportagem de CRISTIANISMO HOJE com uma disponibilidade e simpatia nem sempre comuns a líderes de tamanha relevância. CRISTIANISMO HOJE – Passados quase 35 anos de Lausanne, o conceito de missão integral permanece o mesmo? RENÉ PADILLA – Antes mesmo de Lausanne, o conceito de missão integral já havia surgido no cenário da Fraternidade Teológica Latino-americana. Mas Lausanne nos deu a oportunidade de expor este conceito em uma plataforma mundial. Creio que tem havido avanços sig-


nificativos por parte de instituições e igrejas que hoje em dia promovem a missão integral. Cerca de 300 dessas entidades formaram a Micah Network [Rede Miquéias], cujo lema é o texto de Miquéias 6.8 – onde o Senhor diz que o que ele espera é a prática da justiça, o amor à misericórdia e a humildade. Esse é um lema que hoje em dia está fazendo mais e mais sentido ao redor do mundo. A nobre causa da missão integral está se estendendo, assim como a reflexão acerca dela. Como o senhor, pessoalmente, define o conceito de missão integral? Ela pode ser definida sob várias perspectivas. Uma delas diz que o homem é um ser não só espiritual, mas também possui as instâncias psicológica e física. Então, a missão integral tem a ver com a totalidade da vida humana e leva muito a sério as necessidades de cada uma dessas áreas – ora, ninguém pode viver sem alimento ou sem abrigo, mesmo que conheça a Deus. Falar de missão integral é falar do ser humano em todos os aspectos de sua vida individual e em sociedade. Outra perspectiva seria a de que o Deus da Criação tem interesse e soberania sobre cada aspecto de sua obra. A missão integral nos motiva a alcançar o homem na plenitude de suas necessidades, sem separar religioso ou profano, sacro ou secular. E em cada um desses aspectos da vida, somos chamados a dar glórias a Deus. Que correntes teológicas têm norteado a Igreja Evangélica na América Latina? Em termos gerais, a maior influência é exercida por uma teologia que tem dado muita ênfase à evangelização, com demasiada preocupação com o crescimento numérico – em detrimento da responsabilidade social, no campo da experiência da Igreja como uma comunidade alternativa frente à sociedade. Creio que a influência de uma teologia unilateral que valoriza a relação do crente com Deus – sem, contudo, levar em conta outros aspectos fundamentais da vida humana – tem sido muito forte no continente. Trata-se de uma teologia procedente do Norte, individualista, com muita ênfase na salvação da alma como algo para o futuro, para além da tumba. O neopentecostalismo se insere nesta definição? O neopentecostalismo é um fenômeno novo, com muita ênfase em doutrinas que deixam muito a desejar do ponto de vista dos ensinamentos da Palavra de Deus, como é o chamado Evangelho da prosperidade. Esse tipo de influência tem marcado muito a Igreja latino-americana. É preciso deixar claro que, quando falamos de missão

integral, não estamos rejeitando a ênfase na relação com Deus; ao contrário, cremos que isso é fundamental. Porém, estamos dizendo que não é tudo. Pelo que ensina a Palavra de Deus, há muito mais. A salvação tem a ver com a vida presente, com a relação com o próximo. Por isso, temos que buscar maneiras de entender o Evangelho em nosso próprio contexto, levando em conta as necessidades que afetam a vida humana em nossa situação. Pode-se falar que existe um pensamento teológico genuinamente latino-americano? Eu penso que sim. A FTL tem trazido uma contribuição para o desenvolvimento teológico na América Latina. Antes da existência da entidade, praticamente o único pensamento evangélico daqui era importado. Com a Fraternidade, surgiu todo um movimento com propósito de fomentar a reflexão teológica à luz da Palavra de Deus, mas enraizada na América Latina. Creio que isso foi alcançado. Todavia, estamos nós a caminho. Há muitos aspectos que ainda não foram considerados devidamente – um deles é a ecologia, que também é parte da responsabilidade cristã. Além disso, há igrejas que consideram que defender a causa dos pobres é identificar-se com a esquerda, o que é um absurdo, pois na Bíblia muito se diz sobre a justiça social. O que o senhor pensa sobre a Igreja Evangélica brasileira? Não conheço a fundo a Igreja no Brasil, mas minha impressão é que ela mantém muitas das mesmas ênfases observadas em outros países da América Latina: valorização do crescimento numérico, pouca importância à reflexão teológica e falta de visão quanto ao impacto que a Igreja pode produzir na sociedade. É uma Igreja que necessita de muitíssimo mais capacitação para que os crentes não só professem a fé cristã, mas a levem ao terreno da prática em todas as áreas da vida. Porém, isso não é uma característica somente do Brasil, mas de toda a América Latina.

“A salvação da alma não é apenas algo para o alémtumba; tem a ver com a vida presente, com a relação com o próximo” CRISTIANISMO HOJE | 57


ENTREVISTA

O surgimento de governos como o de Hugo Chávez, na Venezuela, Evo Morales, na Bolívia, e Rafael Correa, no Equador, sinaliza uma guinada na política sul-americana, de caráter populista e autoritário. Como o senhor vê a questão? Não estou seguro de que se possa classificar todos esses países mencionados dentro da mesma categoria. Chávez é um caso único. Creio que existe na América Latina um desejo de formar governos com um compromisso mais sério com o povo comum. Os governos em geral, em toda América Latina, têm sido dominados por uma elite – uma elite com muito poder econômico e político. Isso é o que vem acontecendo nos últimos anos, em vários países que mostram desejo de mudança. Não estou de acordo com algumas das posturas do senhor Chávez, que tem uma veia militar muito forte. Todavia, concordo com muitas das mudanças que ele tem feito na Venezuela, assim como as de Morales na Bolívia, porque entendo que são necessárias.

Carlinhos Veiga

Como assim? Pensemos o tema da propriedade dos recursos naturais. A América Latina tem uma história muito triste de exploração. Percentuais altíssimos das riquezas dos países da região saíram e continuam saindo sem contribuir com o desenvolvimento de instituições que beneficiam o povo em geral. Não é justo que, em um país tenha a riqueza que possui a Bolívia – petróleo, minerais, gás natural –, cerca de 80% da população vivam na pobreza. Lamentavelmente, o capitalismo globalizado continua seu trabalho de exploração dos países da América Latina, da África e da Ásia. Isso precisa mudar dentro de uma perspectiva cristã. Então, que haja mudanças, para que os povos latino-americanos se beneficiem de seus recursos naturais. Que esses recursos não sejam usados para benefícios de interesses particulares dos governantes corruptos ou das grandes multinacionais que predominam no campo econômico. Nos anos 1970-80, a América Latina, e sobretudo o Brasil, chegaram a ser apontados como “celeiro missionário” do século 21. Hoje, essa vocação parece arrefecida. Por que isso aconteceu? Durante minha juventude, falar de missões era falar de ações transculturais – porém, não a partir da América Latina, mas sempre encetadas por mis-

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sionários que vinham da Europa ou dos Estados Unidos. Acontece que, há cerca de 30 anos, houve mesmo um despertar missionário na América Latina. Foi um momento de entusiasmo; milhares de missionários foram aos campos. Contudo, boa parte deles sem a capacitação devida. Por outro lado, faltou responsabilidade por parte dos que os enviaram. Claro, não se pode ignorar a situação econômica difícil nos países de onde saíram os missionários. Com a catástrofe econômica que abateu a Argentina no início desta década, muitas igrejas não puderam cumprir os compromissos assumidos com os obreiros. Em algumas de minhas viagens, tenho conhecido missionários latinoamericanos praticamente esquecidos, que vivem em situação crítica porque as igrejas que os mandaram não se responsabilizaram devidamente.

“O capitalismo globalizado continua seu trabalho de exploração da América Latina. Isso precisa mudar dentro de uma perspectiva cristã” Em sua visita ao Brasil, ano passado, o papa Bento XVI foi enfático ao classificar as denominações evangélicas – particularmente as de linha pentecostal e neopentecostal – como “seitas”. Ratzinger segue a linha do antecessor, João Paulo II, que durante seu longo pontificado fez diversas visitas à América Latina, sempre combatendo a influência dessas igrejas na sangria de fiéis católicos. Na sua opinião, o enfraquecimento do catolicismo na região deve-se somente ao avanço evangélico? É evidente que a Igreja Católica tem perdido muito terreno na América Latina. E isso não se deve somente a crescimento do que o Vaticano considera como “seitas”, mas porque muita gente tem percebido uma falta de coerência no catolicismo. Veja seu casamento com o sistema, por exemplo, no apoio a governos corruptos. A falta de ética em setores do clero, situações escandalosas de homos-


sexualidade e de pedofilia têm desprestigiado a Igreja Romana. Além do mais, a Igreja Católica tem dificuldades no recrutamento de novos sacerdotes – em boa parte, por causa da imposição do celibato, cuja obrigatoriedade não tem base bíblica. Por outro lado, na América Latina as pessoas em geral são muito religiosas. Pouca gente diz que não crê em Deus – portanto, se o católico deixa sua igreja, é porque deve estar em busca de algo espiritual que não encontra ali. O que se pode esperar para o futuro da fé evangélica na América Latina? Eu creio que esse futuro vai depender da recuperação de certas ênfases centrais na Escritura, de quanto ensinamento bíblico se fará nas igrejas. Depende também da influência de uma reflexão religiosa enraizada na situação latino-americana, uma preocupação em responder aos problemas reais da região. Na medida em que isto suceder, creio que a Igreja Evangélica da América Latina terá uma oportunidade muito grande de crescimento e especialmente de impacto na sociedade. Nós, os cristãos, somos chamados a ser sal da terra e luz do mundo. Mas isso não vai se concretizar se a Igreja continua olhando para dentro de si, preocupada com seu crescimento numérico, com sua influência nas esferas políticas para amealhar benefícios. Além disso, as igrejas precisam adotar o poder compartilhado. A liderança cristã latino-americana ainda é dada ao caudilhismo. Onde há uma liderança piramidal, hierárquica, não se pode esperar muito do futuro. Qual tem sido a atuação da Fundação Kairós? A Fundação Kairós, em certo sentido, é uma filha da Fraternidade Teológica Latino-americana. Alguns dos fundadores da FTL foram também os fundadores da Kairós. Temos tratado de prover ferramentas para a ação evangélica. Também temos um departamento voltado ao assessoramento de igrejas locais, sempre encorajando-as a praticar a missão integral, além de um setor de ministérios comunitários. Além disso, desenvolvemos um programa de educação teológica baseado em quatro áreas: igreja, sociedade, trabalho e família. Dentro dessas áreas, tratamos de ajudar os estudantes a pensar teologicamente e a relacionar a teologia com a vida prática. Esse é um projeto que tem nos dado muitas satisfações. Começamos com um programa voltado para profissionais de áreas específicas, mas com o tempo, surgiu o que chamamos de Centro de Estudos Teológicos Interdisciplinares, em nível básico, com um material mais simplificado e voltado para gente que não tem preparação acadêmica.

“A liderança latinoamericana ainda é muito dada ao caudilhismo. Onde há uma liderança piramidal, hierárquica, não há muito o que se esperar do futuro” O senhor tem exercido o pastorado ou dedica-se a outras atividades ministeriais? Por quinze anos, exerci o pastorado em igrejas locais – doze em uma, três em outra. Gosto do pastorado, mas não tenho podido seguir nisso porque minhas tarefas com a Kairós têm me absorvido. Tenho tido muitíssima responsabilidade administrativa, o que me rouba tempo para outras coisas. Venho me dedicando também ao ensino, através de cursos, seminários e oficinas, não apenas na América Latina, como nos Estados Unidos, Canadá e Europa. Mas um trabalho que me traz muita satisfação é a produção literária. Tenho conseguido desenvolver uma editora que hoje conta com mais de 100 títulos, e sintome satisfeito por haver ajudado muitos jovens que agora estão escrevendo e dedicando bastante tempo a isso. Passo muito tempo corrigindo manuscritos e tratando de assegurar que as pessoas compreendam o que lêem. E também estou trabalhando em um livro, cujo título provisório é Discipulado para toda a vida. Na verdade, tenho muitas notas, rascunhos e projetos que nunca consegui levar adiante por falta de tempo. Mas agora assumi compromisso formal com uma editora e pretendo concluir a obra ainda em 2008. E quais são os próximos projetos da Fraternidade Teológica Latino-americana? Há um evento grandioso e que tem requerido muito trabalho por parte dos líderes da FTL. É o 5º Congresso Latino-americano de Evangelização – o Clade V. O congresso vai coincidir com a celebração dos 100 anos da grande Conferência Missionária de Edimburgo, realizada na Escócia em 1910. Em vários países da América Latina, as pessoas já estão se preparando para assistir a este encontro, que vai acontecer em fins de junho e início de julho de 2010, na Costa Rica. Eu fui o responsável pelos programas do Clade III e do Clade IV, e sei por experiência que é preciso muita preparação e esforço. (Colaborou Carlinhos Veiga)

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LIVROS E RESENHAS | Luciano Vergara

Importante, consistente e... brasileira Teologia Sistemática – Uma análise histórica, bíblica e apologética para o contexto atual Franklin Ferreira e Alan Myatt 1.218 páginas Vida Nova, 2007

O sonho de uma teologia brasileira não morreu. Ao contrário, está mais vivo que nunca. E mesmo que Franklin Ferreira e Alan Myatt não julguem alcançá-lo, nem ao menos desejá-lo, a sua dogmática certamente fará espocar sinais de júbilo verde-e-amarelo. Olhado detidamente, o livro se mostra mais do que uma pesquisa teológica de volume respeitável e desafiador. A rigor, é uma investigação complexa do pensamento teológico de todas as épocas do cristianismo. Mas o público perceberá que, diferentemente de outros títulos disponíveis, cada tema teve a adição de estudos e abordagens que o relacionam a outras análises, dando-lhe maior interação com outros ambientes e ampliando as possibilidades de observação. No país, a teologia sistemática se resume, normalmente, à tradução de obras estrangeiras e manuais de apoio a seminaristas, enquanto Franklin e Alan propõem uma leitura da teologia e filosofia, a ser decodificada por intérpretes imersos na realidade cultural brasileira e que não estão dispostos a abdicar de sua cosmologia. Teologia sistemática pode representar uma esquina na pesquisa apologética e, talvez, na academia como um todo, pois tem o mérito de, até agora, ser a melhor dogmática feita no Brasil e

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para brasileiros. Destaque também para o idioma no qual Teologia sistemática foi escrito – o português. Nesta edição, CRISTIANISMO HOJE traz uma entrevista, concedida por um dos autores, para que o público possa acompanhar mais de perto o seu pensamento. Descortine então o escritor brasileiro Franklin Ferreira. CH: Como foi a experiência de escrever uma obra de fôlego como uma teologia sistemática? FF: Difícil resumir em poucas palavras um trabalho de quase dez anos. Originalmente, essa obra começou como uma apostila, preparada pelo Alan, para uso dos seus alunos de teologia sistemática, no Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil, no Rio de Janeiro, e foi usada de 1996 a 1999. Após esse período, a apostila foi revisada e expandida por mim, quando assu-


mi a disciplina, durante um período em que Alan esteve nos Estados Unidos. Depois, continuamos a fazer revisões, cada um contribuindo com matérias relevantes nos vários tópicos. O Alan assumiu a responsabilidade pelas seções relacionadas com as seitas e religiões, as exposições bíblicas do Antigo Testamento e do Novo Testamento e a parte apologética. Eu assumi as seções histórica, sistemática e pastoral. A obra toda não é apenas a união de dois trabalhos independentes, mas uma colaboração total. Em todo esse período, tanto eu como o Alan estivemos envolvidos com aulas, pregação, pastoreio, outras pesquisas, problemas de saúde, etc. CH: Que destaques no conteúdo, formato e abordagens você mesmo faria para especificar essa obra, escrita originalmente no Brasil, diante de outras obras já existentes? FF: Cada capítulo – sem contar os dois primeiros, que servem como introdução e seguem a divisão clássica dos temas das principais teologias sistemáticas – é dividido em cinco partes: após levantar as perguntas importantes feitas no Brasil, ligadas a cada tema teológico, como revelação, Deus, Cristo, salvação, ressurreição, igreja, reino, temse: 1) uma investigação sobre as respostas dadas a essas perguntas em outros tempos e lugares, com atenção especial sobre como as seitas, pensadores e documentos cristãos responderam a esses questionamentos; 2) um estudo exegético sobre as principais passagens bíblicas relacionadas ao tema; 3) um resumo sistemático do ensino bíblico; 4) uma defesa apologética do resumo bíblico frente a outros ensinos e 5) uma aplicação pastoral e devocional do ensino bíblico sistematizado. No conteúdo, essa teologia sistemática é de corte evangélico, reformada e batista. Dependemos bastante dos escritos dos Pais da Igreja, dos reformadores, dos puritanos, de Jonathan Edwards e de Abraham Kuyper. Também se evidencia nosso constante diálogo com as confissões de fé clássicas. E, no que se refere à abordagem, essa obra é marcada por uma forte interação com o ambiente multicultural brasileiro, especialmente com as principais expressões religiosas presentes em nossa cultura.

CH: Como você avalia a relevância de Teologia Sistemática num contexto pluriconfessional? Em nossa opinião, a Igreja brasileira, por uma série de razões vive uma época marcada por extremo anticonfessionalismo. Aliás, em alguns círculos – notadamente nos seminários – ser confessional se tornou motivo de piada e desprezo. Em parte, essa aversão à confessionalidade tem a ver com a rejeição de qualquer autoridade e com o isolamento histórico – e o resultado disso é a simples repetição de velhas heresias teológicas. Por exemplo, muito do liberalismo teológico presente nos seminários teológicos brasileiros lembra os postulados da heresia gnóstica, presente na Igreja antiga. Em outras palavras, a rejeição da confessionalidade acaba por levar a igreja a caminhar para trás! Por isso, não raro, a rejeição da confessionalidade caminha com a rejeição da própria teologia sistemática. Não é necessário gastar muito tempo para se perceber que a rejeição da teologia sistemática é uma tolice e parte, muitas vezes, da nítida má vontade em tornar claro o que se crê – logo e é, na verdade, uma capitulação ao subjetivismo e ao irracionalismo. A rejeição de formulações sistemáticas geralmente surge em setores que estão rompendo com a fé cristã tradicional. Vendo por outro ângulo, se valorizarmos a confessionalidade e apreciarmos o necessário diálogo com outras tradições cristãs, a teologia sistemática será vital. Será essa disciplina que irá nortear o debate, tornando-o claro, honesto e frutífero, ajudando, por exemplo, batistas, episcopais, luteranos, metodistas, pentecostais e presbiterianos a entenderem o que é central em suas tradições, para, a partir desse núcleo, travar debates proveitosos e construir agendas conjuntas para ações missionárias, éticas, políticas ou educacionais. Além disso, a compreensão da importância dessa disciplina remete-nos ao fato de que é nossa compreensão das doutrinas cristãs que irá nortear nosso culto, oração, pregação, aconselhamento, ensino, missões, etc. Por isso, Dietrich Bonhoeffer, pregando em 1933, afirmou que a Igreja só permanece igreja se é confessional. No fim, a teologia sistemática permanece, ainda hoje, como “a rainha das disciplinas teológicas”, justamente por seu caráter norteador da prática cristã.

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LIVROS E RESENHAS

Um padre e suas reflexões Tudo se fez novo: Um convite à vida espiritual Henri Nouwen 93 páginas Editora Palavra, 2007

O que dizer de um padre com leituras bíblicas de rara profundidade, que acredita na simplicidade e no serviço dos cristãos e ainda é mentor de líderes protestantes? Como, para Jesus, é pelos frutos que se conhece uma árvore, Henri Nouwen (1932-1996) foi um daqueles cristãos sinceros, cuja fé é testemunhada pela vida que levam. Holandês de nascimento, norte-americano por adoção e vocacionado, pelo sacerdócio, para cidadão do mundo, o pensador católico, neste livro, aborda a questão da ansiedade humana. Padre Nouwen se dirige às pessoas sobrecarregadas, propondo a prioridade do Reino sobre todo compromisso e estimula leitores das mais variadas confissões a exercitarem a espiritualidade, valorizando tanto a solitude quanto a comunhão. Na verdade, tudo se fez novo apresenta apenas um detalhe do complexo Nouwen. Profundo, desvendá-lo é lidar com a fé autêntica e o vínculo com a religião, é confrontar o serviço humanitário e o desconcertante pluralismo filosófico e religioso – ou então, expor-se à pressão da ortodoxia da conduta sobre uma sexualidade não tão ortodoxa.

A missão da paternidade Filhos: Da sobrevivência ao sucesso Charles R. Swindoll 255 páginas Thomas Nelson Brasil, 2007

Nenhuma tese que diga ser possível criar filhos sem cometer erros é honesta. Ponto para Charles “Chuck” Swindoll, que reconhece essa impossibilidade, mas não se esquece de que a maioria dos pais são verdadeiros heróis. Pastores e conselheiros, homens e mulheres de fé, pais e mãe cristãos, enfim, todos os envolvidos na missão de educar devem se informar ao máximo em

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prol da melhor criação desses seres complexos a que chamamos de filhos. À parte o Poema enjoadinho, de Vinícius de Moraes – “Filhos, melhor não tê-los; mas, se não tê-los, como sabê-lo?” –, criar filhos é de fato arriscado, mas pode também ser uma bênção quando se aplicam neste processo os valores da Palavra de Deus, com espírito manso e amor cristão. Isso fica claro através da trajetória do próprio Swindoll, um avô de dez netos que compartilha suas experiências pessoais e ministeriais condensadas em mais de 70 livros publicados ou nas mais de três décadas de mensagens radiofônicas. E a Thomas Nelson, convencional, permite isso em formato e ordem equilibrados.

Entre o talento e a fé Cristianismo criativo? Uma visão para o cristianismo e as artes Steve Turner W4 Editora, 2006 (1ª edição em 2007)

O “X” na capa de Cristianismo criativo? pode ser de empate ou embate. Nele, o jornalista inglês Steve Turner, que nas últimas três décadas vem escrevendo sobre música e cultura, deu a si mesmo uma dura missão. Descendente de músicos regionais, e, ultimamente, autor de artigos, poesias e literatura infantil, Turner tenta responder um antigo questionamento dos crentes: Pode uma pessoa cristã ser um profissional plenamente competente nas artes sem mirrar o seu ministério na igreja? E a arte cristã, pode ser mais que religiosa? Turner acha que a resposta é “sim” para ambas as perguntas. O autor comenta a baixa qualidade de boa parte da produção artística cristã, em certa medida porque a arte é tratada como tabu nos círculos religiosos. Há pouca literatura e a que existe trata o assunto de modo frio e acadêmico, não atingindo o cerne da questão. No livro Imagine! A vision for Christianity and the Arts (título em inglês da obra), o autor propõe formatos que desafiem as pessoas a apresentarem os valores centrais de sua fé por meio da arte, rompendo o estranhamento entre o discurso religioso e a manifestação artística. Audacioso, pode dar o que falar. Luciano Vergara é jornalista, professor do Seminário Teológico Betel, no Rio de Janeiro, e pastor metodista.


OS OUTROS SEIS DIAS | Carlo Carrenho

M

Leia por prazer e conheça a Estônia

Catedral da Igreja Ortodoxa de Tallinn, capital da Estônia

Cortesia: Carlo Carrenho

Minha leitura durante o recesso natalino foi Silmade avamise päev (algo como “A conspiração e outras histórias”), do escritor estoniano Jaan Kross. Para minha surpresa, descubro logo após o Ano Novo que Jaan Kross faleceu no dia 27 de dezembro. A idéia de que eu talvez estivesse lendo seu livro no momento de sua morte mexeu comigo. A obra de Kross também me fez lembrar de como é importante e prazerosa a leitura de ficção, atividade relegada a segundo plano pelos evangélicos brasileiros. Mesmo a tal de “ficção cristã” não emplaca no Brasil. Talvez isto aconteça porque, do alto do nosso pragmatismo protestante, não enxerguemos a utilidade deste estilo que, como qualquer arte, não possui ambições utilitaristas. Perguntas como “Qual a lição deste livro?”, ou “O que ele ensina?”, ganham poderes de censura na leitura dos evangélicos. Se for um livro “não-cristão”, pior ainda. Mas a grande verdade é que a literatura de ficção pode ensinar muito mais do que livros de auto-ajuda e de vida cristã – e o melhor: dando prazer ao leitor. Ao ler o livro de Jaan Kross, eu aprendi muito sobre a história da Estônia, onde o livro é ambientado. Também refleti muito sobre a índole humana, pois os contos se passam durante os períodos de dominação nazista e comunista naquele país báltico, e os relatos são repletos de perseguição e prisões. O próprio autor foi capturado tanto por nazistas como

pelos comunistas e passou oito anos preso na Sibéria. Mas o mais importante é que eu tive prazer em ler o livro. Foi gostoso, delicioso – aliás, foi por isso que eu escolhi esta leitura, por puro hedonismo literário. Sigo as palavras do grande escritor Jorge Luís Borges: “Só leio por prazer.” Outra razão para se ler ficção é conhecer melhor o mundo em que vivemos. “A leitura é a viagem dos que não podem pegar o trem”, disse o dramaturgo francês Francis de Croisset. E se queremos ser sal na terra, preci“Se o próprio Jesus era samos conhecer um ficcionista – basta esta terra, nos envolver com conferir suas parábolas –, ela e viajarmos Deus pode usar a ficção muito. Eu visitei para falar conosco” a Estônia duas vezes, mas só passei a conhecê-la de verdade depois de ler Jaan Kross. Finalmente, devemos ler ficção porque podemos encontrar Deus nesta forma de arte. Ora, se o próprio Jesus era um ficcionista – basta conferir suas parábolas –, Deus pode usar a ficção para falar conosco. Fui particularmente tocado pelo conto O cinzeiro, do livro de Kross. Na história, o personagem Peeter Mirk (na verdade um alter-ego do próprio autor, o que confere um sabor autobiográfico ao texto) está preso na Sibéria, marchando na neve e recitando poemas junto com um romeno. Em dado momento, Peeter diz: “Somos bitucas de cigarro no cinzeiro de Deus.” O romeno, apesar de cético, entende o que foi dito – isto é, que qualquer um que ainda possui uma única faísca acesa poderá receber de Deus o sopro da vida e voltar a queimar. No fim da história, Peeter, através de uma série de “coincidências”, conhece um engenheiro que fora amigo de seu pai. Com sua ajuda, a vida de Peeter na prisão melhora consideravelmente, levando-o a refletir nestes termos: “Existe uma esfera nesta Terra onde tais coincidências ocorrem, o que confirma a existência do Senhor do cinzeiro.” E, ao que se sabe, Jaan Kross não era convertido. Ou será que era? Carlo Carrenho já enfrentou 18 graus negativos em Tallinn, capital da Estônia. Para enfrentar um frio desses, recomenda o capuccino da livraria Rahva Raamat, onde comprou o livro de Jaan Kross

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ÚLTIMAS PALAVRAS Carlos Queiroz

A

Hidroteologia, contemporânea como a vida

A transposição das águas do Rio São Francisco é um dos indignação com a privação ou privatização da água, ela disse temas mais polêmicos da agenda brasileira. O projeto, em que não chorava porque não tinha mais água nos olhos. resumo, destina-se a desviar enormes trechos do Velho ChiO nosso problema não é apenas de seca, nem será resolco para áreas de seca – contribuindo, teoricamente, para a vido desviando-se bilhões de metros cúbicos de água. Temos solução do centenário drama nordestino da escassez de água um drama de acumulação de bens e concentração de terras –, e é bandeira prioritária do governo Lula. Os principais ar- e mananciais nas mãos de poucas pessoas, protegidas por gumentos a favor da obra giram em torno da possibilidade cercas de arame farpado intransponíveis. Acontece que, com de irrigar 300 mil hectares de terras e transformar o sertão menos investimento do que o planejado para a transposiem um pólo agrícola, sobretudo de fruticultura, gerando ção do Velho Chico, pode-se fazer uma reforma agrária mais empregos e renda para a região. Doze milhões de pessoas se- conseqüente, implementando a agricultura familiar sustenriam beneficiadas em 268 cidades, de centros urbanos como tável. Bastaria melhorar pequenos açudes já existentes, monCampina Grande (PB) e Caruaru (PE) a pequenas vilas en- tar barragens subterrâneas, continuar construindo cisternas cravadas no agreste. para uso familiar nas pequenas propriedades de Franciscos Recentemente, o bispo católico Luiz Cappio, com sua e Franciscas. greve de fome contra o projeto, chaAntes de se pensar em mudar o mou a atenção da opinião pública curso de um rio, precisamos de uma brasileira e internacional para o que mudança de paradigma: priorizar o “Nosso problema considera um equívoco. No entenque fazer em cooperação com o penão é apenas de seca. der do religioso, a transposição vai queno agricultor, para melhorar sua causar mais problemas que soluções. capacidade de produção. Seus projeTemos um drama de Minha história de vida, juntamente tos não agridem o meio ambiente e, acumulação de bens com o trabalho na Visão Mundial, se tecnicamente bem orientados, são me propiciam uma vocação pastoral potencialmente mais sustentáveis. e concentração de marcada pela poeira e pelo sol escalPrecisamos de uma reforma agrária e terras e mananciais, dante do meu querido sertão. Sinto o agrícola – e, na teologia, devemos enpó de argila impregnado aos dedos, tender que o tema em questão é sobre protegidas por cercas amolgados pelo atrito das pedras nas a nossa responsabilidade com tanta de arame farpado” sandálias de camponeses pobres. Nas água que Deus manda para os norépocas de estiagem, observo o vento destinos. Entre a nossa hidroteologia morno acariciando as resistentes foque estuda somente sobre a quantidalhas de carnaúba. A cor cinza da caatinga, formada por gra- de de água a ser usada para o batismo – se por imersão ou vetos secos, está sempre tatuada na minha memória. aspersão –, precisamos optar por uma teologia que equacione Ao contrário do que se diz, a natureza presenteou o nosso o problema da justiça quanto ao uso de água no planeta. Sem Semi-árido de paisagens verdes alimentadas por recursos hí- amor ao próximo, sem promoção de justiça e, conseqüentedricos. Deus concedeu ao Nordeste brasileiro precipitações mente, sem paz na sociedade, nossa teologia será árida, inférpluviométricas privilegiadas, um dos solos mais férteis do til e não sinalizará a utopia possível do Reino de Deus. planeta e uma excelente incidência solar. A combinação desQue os rios de justiça sejam transportados do coração tes fatores torna algumas áreas da região um centro atrativo de mulheres e homens de bem. Parafraseando a linguagem para grandes produtores. No Nordeste, é possível se extrair hidroteológica do profeta Amós, pedimos a Deus que “a retigrandes safras e manter rebanhos bem alimentados. Toda- dão corra como um rio, a justiça como um ribeiro perene”. via, ali mesmo, encontro multidões de sofredores. Caso de Carlos Queiroz é professor, escritor dona Francisca, que vive a seis quilômetros das margens do e diretor-executivo da Visão Mundial Brasil. São Francisco – mas não pode oferecer um litro de água à caPastoreia a Igreja de Cristo em Fortaleza (CE) bra, “mãe leiteira” dos seus 11 filhos. Num misto de humor e

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