Jornal de ciências sociais 7 online

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TOMA POSSE NOVO REITOR DA FSA

Tomou posse, em 1° de abril, o novo reitor da Fundação Santo André (FSA), José Amilton, e sua vice, Leila Mondanez. Eles ocuparão o cargo até 2018 e foram eleitos com quase 70% dos votos da comunidade acadêmica. Página 4

A poesia de Cabo-Verde

Vera Duarte proferiu palestra na qual falou sobre sua obra e processo criativo, mas também sobre Cabo Verde, país do qual procede. No seio da jovem nação africana, ela seriamente trabalhou e trabalha para firmar a indepedência, construindo por meio de legislação moderna e adequada os direitos esenciais do seu povo. Página 3

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Curso de Ciências Sociais - Centro Universitário Fundação Santo André - Ano III - N° 7

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Informação que não se vende

COPA PRA QUEM?

Arte proibida

Em pleno século XXI, o senso comum ainda prega que se você não é um trabalhador com carteira assinada, então você Diversas discussões e problemas vão tomar as ruas nos períodos de jogos. As enormes quantias que poderiam estar sendo utilizadas em é um desocupado. Página 7 assuntos muito mais importantes, estão sendo investidas para a construção dos estádios e também para reformas nas cidades, para adaptá-las ao evento. O Jornal de Ciências Sociais abriu espaço para o debate. Páginas 6 e 7

Olho por olho...

Os reflexos do desenvolvimento do capital nas cidades através de sua urbanização é um processo histórico e cada vez mais notável. Página 8

Arte e urbanismo

Há 90 anos nascia, em Santo André, o artista plástico Luiz Sacilotto (1924-2003). Filho de imigrantes italianos, desenhista de esquadrias e, depois, artista concretista de reconhecimento internacional, Sacilotto se tornou, pouco a pouco, o artista oficial do município onde nasceu. Página 9

Ditadura no cinema

Ditadura militar conduziu uma feroz repressão aos setores dissidentes. Tortura, assassinatos e desrespeito aos direitos humanos foram perpetrados pelos que se apossaram do poder. Página 10


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Jornal de Ciências Sociais - nº 7 abril de 2014

Editorial

Lançamento

A edição 7 do Jornal de Ciências Sociais não poderia deixar de abordar um dos temas mais em voga no momento: a realização da Copa do Mundo de Futebol no Brasil. “Diversas discussões e problemas vão tomar as ruas nos períodos de jogos. Mas como também sabemos, as decisões tomadas por nossa presidenta Dilma de que ‘todo ato de protesto será tratado e punido como terrorismo’ não nos deixa dúvidas de que nunca foi de interesse dos governantes promover melhores condições de vida para seu povo”, afirma Fernanda Jeane Leonel em seu artigo (p. 6). Euller Felix da Silva, em matéria paralela, complementa: “as enormes quantias que poderiam estar sendo utilizadas em assuntos muito mais importantes, estão sendo investidas para a construção dos estádios e também para reformas nas cidades, para adaptá-las ao evento burguês” (p. 7). E se as manifestações são um reflexo de uma sociedade definida em classes sociais, de um lado dominantes, de outro dominadas, o JCS apresenta também nesta edição outro aspecto contundente deste antagonismo: a condição da mulher. O tema é abordado com base em evento realizado na Fundação Santo André (FSA), para o lançamento da reedição do livro A Mulher na Sociedade de Classes - mito e realidade, de Heleieth Saffioti, uma das mais importantes pesqui-

sadoras feministas do país. O encontro buscou, sobretudo, “fazer uma análise do trabalho feminino dentro de uma sociedade capitalista atada por um nó constituído pela contradição entre gênero, raça/etnia e classe social”. As jornadas de junho, caracterizadas pela imensa adesão popular às manifestações foram abordadas por Tiago Candeias Braga (p. 5), que analisou o conjunto de ações de levante pelo País, levando em consideração que as “contradições afloraram ainda mais com as duras investidas do neoliberalismo em seu espaço urbano, privilegiando, de forma que salta à vista, a acumulação e a circulação do capital em detrimento do valor de uso destas cidades” A análise perpassa o ano de 2013, elucidando “a intensificação dessas contradições no cenário brasileiro e sua influência nas manifestações de 2013, das jornadas de junho até os ‘rolezinhos’”. Estes são apenas alguns dos temas contemplados na sétima edição do JCS, e adiantaremos somente isso para que o leitor tenha, folheando nossas páginas, surpresas agradáveis ao se deparar com ferramentas de debate que julgamos de suma importância revolucionária - assim como esperamos que tal surpresa seja inversamente agradável aos exploradores da sociedade que aqui atacamos. Boa leitura!

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O Jornal de Ciências Sociais é uma publicação do Colegiado de Ciências Sociais da Fundação Santo André, distribuído gratuitamente.

A Mulher na Sociedade de Classes – Mito e Realidade Mábia Oliveira e Mônica Silva Dias

Estudantes de Ciências Sociais da Fundação Santo André

N

o dia 29 de novembro de 2013, aconteceu aqui no Centro Universitário Fundação Santo André (CUFSA) o lançamento da reedição do livro A Mulher na Sociedade de Classes - mito e realidade, de Heleieth Saffioti, uma das mais importantes pesquisadoras feministas do país; a primeira edição da obra é de 1969, e a última datava de 1976. De lá pra cá muita coisa aconteceu no universo feminino e outras reivindicações entraram como pautas importantes, direcionando o debate de gênero para caminhos mais individuais e subjetivos. Nesse contexto, lamentamos que só em 2013 a proposta de reedição de uma obra tão importante tenha ganhado corpo e finalmente sido acolhida por uma editora, a Expressão Popular. As convidadas Sônia Coelho (Marcha Mundial das Mulheres), Elaine Campos (Consulta Popular, mestre e doutoranda em Ciências Sociais pela Unicamp), Thaís Lapa (Docente da FSA, pesquisadora na temática trabalho e gênero e mestranda pela USP) sob mediação da docente da FSA Lívia Cotrim, enfatizaram o pioneirismo da obra de Saffioti e a importância dessa reedição não somente para o feminismo, mas para o pensamento social brasileiro. Com A Mulher na Sociedade de Classes – mito e realidade, Saffioti buscou analisar a situação das mulheres como um “efeito da sociedade de classes”

e, sobretudo, fazer uma análise do trabalho feminino dentro de uma sociedade capitalista atada por um nó constituído pela contradição entre gênero, raça/etnia e classe social. Assim, não reiterou o reformismo do movimento feminista pequeno-burguês, que se contenta meramente com as conquistas de direitos formais para as mulheres. A obra é o resultado de intensas pesquisas e estudos sobre a condição feminina no Brasil, tendo como referencial teórico a dialética marxista. Cabe destacar, como contribuição do marxismo ao feminismo, o enfoque histórico e material que permitiu a desnaturalização da subordinação da mulher, situando sua gênese num processo gerado nas e pelas relações sociais, em contextos socioeconômicos determinados; a interpretação da economia política em relação ao processo de

trabalho capitalista e ao lugar do trabalho doméstico; e a análise sobre a ideologia, que oferece elementos para pensar outras dimensões das relações e dos conflitos sociais, para além dos vinculados à base material, mesmo quando mediados por esta. Feminismo e marxismo ocupam o centro da obra de Saffioti, que abrange múltiplos aspectos, tanto no que se refere à contribuição teórica que forneceu para ambos, como no que diz respeito à grande importância que suas ideias tiveram para a implementação de políticas de combate à violência contra a mulher. Tanto no marxismo como no feminismo existe a preocupação por questionar relações desiguais, socialmente construídas e reconstruídas em embates de poder. Faz-se necessário examinar este elo, que passa por analisar como a dominação capitalista de classe se efetiva produzindo e reproduzindo “diferenças” que reforçam desigualdades, inclusive de gênero. Saffioti foi orientanda de Florestan Fernandes e este livro é resultado de sua tese de livre-docência, sendo redigido entre o final de 1966 e início de 1967, em apenas 60 dias. Por fim, compartilhamos o desejo muitas vezes explanado por Saffioti: “O que faço (…) é sugerir a todos os jovens – moças e rapazes – um novo caminho, conducente a uma sociedade menos injusta, menos iníqua, menos castradora”.

Colaboraram nesta edição:

Mábia Oliveira / Mônica Silva Dias / Fernanda Jeane Leonel / Eduardo Kazé / Geraldo de Souza Pereira / Tiago Candeias Braga / Euller Félix da Silva / Guilherme Amaro / Danilo Milev / Rafael Churai Feijes / Cícero Aparecido dos Santos / Ismara Izepe de Souza / Leandro Cândido de Souza / Juarez Ambires / Carlos César Almendra / Diretório Acadêmico Honestino Guimarães. Jornalista Responsável Eduardo Kaze - MTB: 62857

Fundação Santo André Av. Príncipe de Gales, 821, bairro Príncipe de Gales Santo André - SP - CEP: 09060-870 Tel.: (11) 4979-3406 colegiado.sociais@fsa.br


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Entrevista

A poesia de Cabo-Verde, no Brasil A

Juarez D. Ambires

Professor da Fundação Santo André

rápida entrevista que abaixo se expressa foi concedida por Vera Duarte a Juarez D. Ambires, professor do CUFSA. O encontro entre ambos deu-se na Casa das Rosas, em São Paulo, ocasião na qual foram entregues à poetisa, escritora e jurista seis perguntas. No episódio (18 de março de 2014), Vera proferiu palestra na qual falou sobre sua obra e processo criativo, mas também sobre Cabo Verde , país do qual procede e ao qual representa com carinho e desvelo por onde passa. No seio da jovem nação africana, ela seriamente trabalhou e trabalha para firmar a indepedência, construindo por meio de legislação moderna e adequada os direitos esenciais do seu povo. Entre os cabo-verdianos receberam sua atenção especial as mulheres e as crianças. Atualmente, ainda se liga a grupo que luta para que o crioulo seja alçado à condição de língua nacional, vindo a receber para isto um definitivo código de escrita. Sua atividade mais recente é a de membro da, há pouco criada, Academia Cabo-verdiana de Letras, na qual quer trabalhar para o resgate de vários escritores ilhéus, com a publicação e divulgação de suas obras. Em maio próximo, Vera regressa ao nosso país, acompanhada de outros escritores de seu arquipélago. Atendendo a convite, sua incumbência é ainda falar de sua literatura, mas, na extensão, falar sempre de seu país, marcado de rica expressão humana e cultural, sempre irmã da expressão brasileira. Jornal de Ciências Sociais: Cabo Verde é geografia classificada como sociedade crioula. O que isto significa? Vera Duarte: Sociedade crioula é designação da sociologia histórica para caraterizar aquelas sociedades cuja origem humana vem de fora, de longe, de outras geografias. E isto é exatamente o caso de Cabo Verde que era terra desabitada à data do seu achamento pelos portugueses. O arquipélago foi povoado por portugueses, genoveses, judeus, africanos (jolofos, sereres, lebus e outras etnias), todos gente vinda de fora. Uma vez estes diferentes povos postos em contacto, e de forma duradoura, desenvolveu-se entre eles uma dinâmica de interação cultural de acordo com o ecossistema que os cercava, e o fato ocasionou dinâmicas novas. Assim é que africanos e europeus (que chegaram a Cabo Verde a partir de 1460) trouxeram cada um o seu próprio sistema cultural – língua, gastronomia, música; a breve trecho, criaram uma língua nova (crioulo ou língua cabo-verdiana), uma nova gastronomia (que tem por prato principal a cachupa) e novos ritmos musicais (morna, coladeira, batuque, funaná, tabanca). Também em vários outros setores se verifica esta dinânica de criatividade e inovação. Isto para além do novo fenótipo a que deram origem, caraterizado pela mestiçagem, resultante do encontro físico entre os mesmos africanos e europeus.

se desenvolveu primeiramente em Cabo Verde. Nas ilhas, juntaram-se em convívio prolongado africanos e europeus, dando origem aos crioulos. Também não se perca de vista que, durante todo o processo colonial, o Brasil foi muito importante para Cabo Verde em detrimento de Portugal. Com a independência brasileira, para exemplo, é que Portugal passou a nos dar mais atenção, uma vez que, em 1822, quisemos nos anexar ao império nascente, propósito que foi vetado pela administração colonial lusa. Depois da independência de Cabo Verde em 1975, o Brasil foi um dos países fundamentais para as nossas relações exteriores. JCS: Quem é Amílcar Cabral para Cabo Verde e para você? VD: Amílcar Cabral é considerado de forma unânime como o herói nacional da luta de libertação da Guiné Bissau e de Cabo Verde; ele é cultuado como o pai da nossa nacionalidade. Para mim, tem sido desde sempre uma das principais referências intelectuais em vários domínios, sobretudo nos da cultura, da emancipação da mulher e da unidade africana. A ele dedico parte substancial da minha intervenção pública. JCS: Quais são os títulos que compõem sua obra literária? Por favor, apresente-os em ordem cronológica crescente. VD: Os títulos que compõem a minha obra são seis: Amanhã Amadrugada, Arquipélago da Paixão, A Candidata, Construindo a Utopia, Preces e Súplicas, A Palavra e Os Dias. JCS: Em sua criação, qual livro lhe é o mais caro? Por quê?

JCS: Brasil e Cabo Verde são países, cuja convivência vem de longa data. Fale-nos um pouco sobre este fato. VD: Antes de mais nada, o Brasil é geografia com o qual Cabo Verde mantém um relacionamento muito antigo. Desde os momentos iniciais do arquipélago, as viagens dos portugueses para o Brasil fizeram-se escalando-se em Cabo Verde. E mais: de Cabo Verde foram para o Brasil animais domésticos, plantas adaptadas e homens que contribuíram para a construção da mais ocidental das colônias portuguesas. Cabras, vacas, inhames e, sobretudo, homens passaram por nós antes de chegarem ao Brasil. Foi em Cabo Verde (que então funcionava como placa giratória para o comércio de escravos no Oceano Atlântico) que foi ladinizada parte substancial dos africanos que seriam trazidos do continente para a América Portuguesa, na condição de escravizados. Para além disso, o modelo de sociedade mestiça

Brasil é geografia com o qual Cabo Verde mantém um relacionamento muito antigo

VD: Talvez Amanhã Amadrugada, por ser o primeiro livro, aquele a que fui apenas com a cara e a coragem, servindo-me ele como espécie de porta-bandeira para a minha escrita futura. JCS: Em sua escrita, o cotidiano da jurista está presente? Por gentileza, discorra sobre o fato. VD: Plenamente. Tanto a minha escrita poética quanto a minha escrita em prosa são muito tributáveis da minha profissão, primeiro porque foi muito através do exercício da carreira que adquiri a profundidade e a densidade do meu olhar sobre o ser humano que necessariamente enforma a minha escrita, quer em termos de forma, quer em forma de conteúdo.


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Quem tem o Direito à Cidade? Toma posse novo As batalhas no Espaço Urbano reitor da FSA Geraldo de Souza Pereira

Eduardo Kaze

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

Ex-estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

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s reflexos do desenvolvimento do capital nas cidades através de sua urbanização é um processo histórico e cada vez mais notável com o avanço deste em seu processo de obtenção de lucro e as contradições postas por tal processo. Sendo a cidade o reflexo da sociedade, essa traz consigo todas as suas segregações e desigualdades, num aglomerado onde o papel do Estado (burguês) entra em cena junto ao investimento privado, fomentando ainda mais a segregação, trazendo à tona a seguinte lógica: quem controla o sistema econômico controla o processo de urbanização. Nessa lógica, os grandes centros são tomados pela especulação imobiliária e obras de infraestrutura de caráter público-privado que resultam em uma elitização desse espaço, que, por conseguinte resulta na evasão das massas populares que não conseguem subsistir nesse meio onde a condição financeira é o fator determinante, fadados ao distanciamento dos centros, tendo poucas opções a não ser os loteamentos periféricos e as favelas, onde resistem e se manifestam principalmente através das artes de rua,coletivos independentes,etc. Nesse contexto, a cidade de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, sofre processo semelhante, onde o avanço do capital no centro da cidade se manifesta exatamente na lógica descrita acima, com crescente número de construções (apartamentos, hotéis),que tomam lugar nas imediações da futura Linha 18 do Metrô-SP; porém, na contramão a tais projetos, chama a atenção um movimento que talvez sem muita pretensão de criticar

Amilton e Leila posam junto de faixa do DAHG

Quem controla o sistema econômico controla o processo de urbanização

esse avanço, traz consigo elementos de contestação ou pelo menos de ocupação de lugares públicos, fornecendo meios de pensar a questão da utilização dos espaços urbanos. A Batalha da Matrix, que desde o ano passado acontece todas as terças-feiras, na Praça da Matriz (importante ponto do centro da cidade), através do Rap, entra em cena como alternativa de entretenimento à juventude e admiradores do estilo musical, na forma de batalhas de MC´s. Movimentos sociais como esse, podem trazer consigo um meio de reflexão acerca da real importância da cidade, se fazendo presentes na contraposição da lógica capitalista, construindo as bases para uma nova realidade, na necessidade de união para o entendimento da urgente

necessidade de democratização dos espaços urbanos, de forma plena, o Direito à Cidade, e nesse contexto não podemos deixar de citar um dos principais analistas dessas condições, o geógrafo marxista David Harvey, em seu célebre artigo “O Direito à Cidade” onde diz: “A liberdade de fazer e refazer as nossas cidades,e a nós mesmos,é, a meu ver,um dos nossos direitos humanos mais preciosos e ao mesmo tempo mais negligenciados.”

Para Ler:

Lobato Correa, Roberto. O Espaço Urbano. Série Princípios. São Paulo: Ática, 1995. Harvey, David. O Direito à Cidade. Disponível em: http://blogdaboitempo.com. br/category/colaboracoes-especiais/david-harvey/

Tomou posse, na terça-feira (1° de abril), o novo reitor da Fundação Santo André (FSA), José Amilton, e sua vice, Leila Mondanez. Eles ocuparão o cargo até 2018 e foram eleitos com quase 70% dos votos da comunidade acadêmica. A solenidade, ocorrida no Salão Burle Marx, do prédio do Executivo municipal, contou com a presença do prefeito Carlos Grana e da vice-prefeita e secretária de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Trabalho, Oswana Fameli. Amilton substitui Oduvaldo Cacalano que, segundo ele, manteve-se “fechado em si mesmo”. O novo reitor pretende fazer o inverso. “Quero ampliar o diálogo interno e com a comunidade do nosso entorno”, afirma. A credibilidade da instituição, atualmente em baixa, também foi lembrada por Amilton, que pretende reverter essa situação. O primeiro ato conjunto da reitoria foi uma redução de 15% dos próprios salários. A economia anual deve chegar a um milhão de reais. Dinheiro este, que Amilton

garante: “será investido em reformas estruturais, começando pela biblioteca”. Questionado sobre seu plano de gestão, ele afirma que “em 90 dias será apresentado um planejamento estratégico”. Diretório Acadêmico Representantes do Diretório Acadêmico Honestino Guimarães (DAHG) compareceram à solenidade para reivindicar a devolução de sua antiga sede, fechada durante a gestão Cacalano. A rematrcula dos inadimplentes também foi exigida. Amilton posou para foto frente à faixa trazida pelos estudantes, afirmando que dentro do prazo de quatro meses a antiga sede (bem maior que a atual) será restituída ao diretório, e será utilizada “por todas as instituições estudantis da FSA”. Em relação à rematricula dos inadimplentes, o reitor garante que será rematriculado somente quem realizar um acordo com a faculdade. As cobranças, segundo ele, serão realizadas de maneira “rigorosa, porém sem perder a ternura”, diz.

Nota Diretório Acadêmico Honestino Guimarães (DAHG) O ato realizado na prefeitura durante a posse do novo reitor da Fundação Santo André, teve como objetivo levar o debate sobre temas urgentes relacionados aos alunos desta instituição como a rematrícula dos alunos inadimplentes que, através da política de cobrança instituída pelo antigo reitor, foram impedidos de efetuar sua matrícula sem antes pagar acordos que em nada facilitam a renegociação da dívida. Outra demanda foi a devolução do nosso espaço original, que desde o início de 2012 foi arrancado das mãos dos estudantes através da construção de um muro que separou estes estudantes de seu espaço histórico de organização e luta.


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O neoliberalismo e as manifestações de 2013: das jornadas de junho aos rolezinhos Tiago Candeias Braga

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

A

situação das cidades no Brasil e no mundo tem sido tema de diversos debates; suas contradições afloraram ainda mais com as duras investidas do neoliberalismo em seu espaço urbano, privilegiando, de forma que salta à vista, a acumulação e a circulação do capital em detrimento do valor de uso destas cidades. Este artigo tem como escopo, então, a tarefa de elucidar a intensificação dessas contradições no cenário brasileiro e sua influência nas manifestações de 2013, das jornadas de junho até os “rolezinhos”. Nas palavras do professor Carlos Veiner, da UFRJ, a cidade neoliberal pode ser categorizada como uma cidade de exceções, cidade de negócios na qual vivemos sob uma democracia direta do capital, em que, com o arrimo do Consenso de Washington, passam a ser compreendidas como empresas em concorrência direta em uma luta pela atração de capitais, entregando-se a capitais cada vez mais móveis. Esta disputa se caracteriza pela entrega de recursos públicos destas cidades ao capital advindo do mercado global, por meio de isenções fiscais, subsídios e, até mesmo, o fornecimento de terras ou do direito à ex-

O consumo passa a ser caracterizado até mesmo como uma forma de ascender socialmente

ploração de terras por capitais nacionais e estrangeiros. Soma-se a isso a diminuição expressiva de políticas públicas, nas décadas de 1980 e 1990, que também faz parte do receituário neoliberal. Essa tomada de assalto do espaço urbano para o bel-prazer capitalista acaba por delimitar e redesenhar esses espaços, e neste cenário quem paga a conta é o trabalhador; marginalizado nas distantes periferias da cidade, sofre com o capital móvel e as altas taxas de desemprego. Alia-se a isso o boom imobiliário e o incentivo brutal ao veículo particular,

empurra este trabalhador para as periferias dos grandes centros urbanos, desprovidas de recursos, e o impede de obter acesso a um transporte público de qualidade, forçando-o a gastar horas no trajeto entre sua casa e o trabalho. Outro fator determinante para o nosso próximo ponto de análise, as manifestações de 2013, foi a indicação do Brasil, em 2007, como país-sede da Copa do Mundo, o que trouxe uma intensificação ainda maior das contradições urbanas. As cidades viram aí uma oportunidade única de atração de capital, e para tanto se desencadeou a truculência

da reintegração de posse de diversos terrenos, o monopólio de serviços nas cidades, a higienização social, etc.; tudo isso só agudiza os problemas vividos pelas cidades. O descontentamento com esse quadro, aqui traçado brevemente, objetiva-se na forma de manifestação em junho contra o aumento da passagem dos transportes públicos, objetiva-se sob a forma de crítica a um aumento dado à base de um setor onde impera a coalizão de empresas que impõem custos elevados a um produto que não corresponde a eles. Empresas que através deste cartel acabam por segregar as camadas mais pobres da sociedade, cerceando seu direito de ir-e-vir, excluindo-os dos grandes centros urbanos, aos quais só têm acesso sob a veste de empregado. Concomitante a isso, no sentido de que é também influenciado pelas ações do capitalismo neoliberal, ocorreu a partir de dezembro de 2013 aquilo que ficou conhecido na grande mídia pelos “rolezinhos”. Estes ocorrem sob ascendência de dois pontos neoliberais: a intensificação do consumo como forma elementar do ser capitalista e o aumento exponencial dos shopping-centers,

ou os não-lugares capitalistas. O consumo passa a ser caracterizado até mesmo como uma forma de ascender socialmente, ter determinado celular ou marca de tênis passa a ser estereotipado como algo proveniente de uma classe social ou outra. O aumento do poder aquisitivo do brasileiro, influenciado seja pelas políticas de distribuição de renda, seja principalmente pelo aumento do crédito, fez com que diferentes classes sociais convergissem na esfera do consumo, e isso se materializa dentro dos não-lugares capitalistas, os shopping-centers. Os participantes dos “rolezinhos” são, em sua maioria, trabalhadores ou filho de trabalhadores que vivem essa ampliação de poder aquisitivo e ao mesmo tempo são bombardeados com a ideologia do consumo; ao irem aos shoppings buscam a inserção nesta realidade do consumo. Não obstante, receberam de volta a resposta classista e segregacionista das classes dominantes. Sendo expulsos e marginalizados como invasores do templo sagrado do neoliberalismo, evidenciando a higienização social, econômica e racial imposta por esses não-lugares capitalistas.

Pós-Graduação: Ciências Sociais Economia-mundo, Arte e Sociedade

Voltado ao aprimoramento da formação de cientistas sociais e profissionais vinculados a áreas correlatas, o curso visa a atender demandas relativas às atividades de pesquisa, docência e outras formas de atuação social e política, aprofundando o conhecimento dos dilemas contemporâneos da existência humano-societária e ampliando a capacidade de discernir alternativas. O curso conta com professores doutores em diferentes campos (sociologia, política, antropologia, história, filosofia, letras), oriundos tanto do Centro Universitário Fundação Santo André quanto de outras universidades. Mais informações em www.fsa.br


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Copa Pão e Circo: Reflexões sobre o mundial de futebol e suas implicações sociais Fernanda Jeane Leonel

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

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ste ano, como sabemos, vamos presenciar mais um ato de descaso do governo com a população: a Copa 2014. Diversas discussões e problemas vão tomar as ruas nos períodos de jogos. Mas como também sabemos, as decisões tomadas por nossa presidenta Dilma de que “todo ato de protesto será tratado e punido como terrorismo” não nos deixa dúvidas de que nunca foi de interesse dos governantes promover melhores condições de vida para seu povo. Desta forma como poderemos lutar e protestar contra milhares de coisas erradas que estão ocorrendo e vão ocorrer neste período de Copa? Claro que isso não vem impedindo as pessoas e movimentos que protestam contra o descaso em torno do evento. Para melhor ilustrar os problemas que a Copa vem nos trazendo, trago alguns acontecimentos, como as remoções em Itaquera, mesmo lugar onde está sendo construído o Arena Corinthians, o “Itaquerão”. De acordo com a Ancop (Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa), “cerca de 250 mil famílias serão removidas de suas casas para dar espaço às construções de tudo que envolve a copa e as olimpíadas. E, em caso de resistência, os servições públicos serão retirados e haverá remoção violenta”. Até as Nações Unidas questionaram essas atitudes em 2012, o que gerou alguns resultados para as comunidades, freando o processo de despejo das famílias próximas ao Estádio. Em 2011, uma resposta foi dada pela administração municipal refente às Favelas de Itaquera, onde, de acordo com a União dos Movimentos de Moradia de São Paulo, exis-

MTST ocupa terreno em Itaquera, proximo a rena Corinthians

tem cerca de cinco mil famílias ameaçadas de perderem suas casas. Nesta resposta, houve uma afirmação/confirmação de que nenhuma das cinco favelas ameaçadas seria despejada e que haveria, neste caso, um investimento para melhorias na região com criação de posto policial, Fatec, Parque Linear, remodelações das principais avenidas que dão acesso ao estádio e ao aeroporto de Guarulhos e um Terminal Rodoviário. Agora, em 2014, estas obras estão atrasadas e um caos maior se instaurou na região com o estreitamento de avenidas, desvios e um aumento no fluxo de veículos no mesmo corredor de ônibus, gerando filas de congestionamentos próximos ao Terminal de Itaquera. Cerca de R$ 70 milhões foram destinados inicialmente

pelo governo para aluguel de arquibancadas extras – colocadas nas laterais do Estádio – para que completasse o número de assentos mínimos exigidos pela FIFA caso este quisesse participar dos jogos de abertura da Copa. Cerca de R$ 480 milhões foi o total previsto para a construção do Estádio, mas sabemos que este valor hoje já está o dobro. Mas os habitantes destas favelas não estão sozinhos. Após as mobilizações contra as remoções e a apresentação de alternativas, caso haja remoções se unirão ao movimento grupos culturais como o Dolores Boca Aberta e o Grupo Teatral Parlendas, que oferecem, além do apoio participativo na luta, oficinas de teatro e música. Existem vários problemas sobre o Itaquerão além dos

suficiente nem para evitar o crescimento da exploração sexual e muito menos para impedir que aconteça, visto que o Brasil é internacionalmente conhecido como destino de turismo sexual, o que é incentivado por empresas privadas, por exemplo com a produção de camisetas e cartazes com mulheres seminuas ligadas à imagem do Brasil e da Copa. O descaso com os serviços públicos é incalculável. Ainda na região de Itaquera, por exemplo, os hospitais centrais estão lotados e há falta de leitos e até de médicos. Fora o acesso que é péssimo. Enquanto o governo investe em armamento para a polícia controlar as manifestações que ocorrem e ocorrerão durante e depois da Copa (já foram gastos mais de R$ 49,5 milhões), e as empresas ligadas à FIFA, como a Odebrecht e OAS, terão isenção de impostos, economizando citados acima, como a explo- até 1 bilhão, a educação e a ração sexual. O Brasil é um saúde são deixados de lado. Existe muito mais para dos maiores fornecedores de ser discutido e analisado, exploração sexual do mundo, até porque muitas coisas só e no período do megaevento aparecerão após esse períoo aumento da prostituição nos do de megaeventos – além entornos do estádio afetará da Copa, haverá também as até crianças de 11 a 14 anos Olimpíadas em 2016. de idade. No geral, estima-se Para saber mais, acesse o site um crescimento de cerca de de uma das organizações contra 500 mil casos de prostituição, a Copa: comitepopularsp.worentre adultos e crianças. dpress.com/; direitoamoradia. Durante a construção da org/pt/noticias/blog/megaeArena Corinthians foram confirmados vários casos de abu- ventos/; direitoamoradia.org/ so sexual contra crianças. A pt/noticias/blog/megaeventos/ investigação policial coletou depoimentos de várias crianPara Ler: ças da região, o que gerou uma Lefebvre, Henri. O Direito à atenção maior para essa área Cidade. São Paulo: Centauro, de imensa vulnerabilidade, 2013. incentivando a denúncia por Carlos, Ana Fani. Espaço e telefone e criações de ati- Indústria. São Paulo: Contexvidades nos poucos centros to, 1992. culturais existentes na região, D a v i s , M i k e . C i d a d e d e como os Céus e Bibliotecas Quartzo. São Paulo: BoitemMunicipais. Mas isso não será po, 2009.


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A Copa do Mundo e suas A arte proibida formas de repressão Rafael Churai Feijes

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

Em pleno século XXI, o senso comum ainda prega que se você não é um trabalhador com carteira assinada e que além disso gaste pelo menos três horas no trânsito diariamente, então você é um desocupado, um vagabundo, um anarquista. Com base nessa lógica absurda a prefeitura de São Paulo restringe novamente os artistas de rua, impedindo-os de expor, apresentar suas obras de arte e mesmo de se manifestarem com música, dança ou qualquer outra arte que venham a produzir pelas ruas da metrópole. Como vimos o ano passado, artistas foram presos de forma injusta e violenta como se fossem terríveis assassinos e a retomada dessa repressão comprova que o artista de

Euller Felix da Silva

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

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á se disse que o grande urbanista da metrópole é o capital. Os gastos com a copa do mundo evidenciam isso. As enormes quantias que poderiam estar sendo utilizadas em assuntos muito mais importantes, estão sendo investidas para a construção dos estádios e também para reformas nas cidades, para adaptá-las ao evento burguês. Estas reformas não beneficiam o conjunto da população, mas somente a classe alta da cidade. E com isto ocorrendo o que não vai faltar durante a Copa do mundo são protestos. E junto com estes protestos, também ouviremos muito falar dos abusos cometidos pelas autoridades policiais. Todos os estados do país já estão se modernizando no quesito “oprimir mais ainda o seu povo”, como se uma péssima saúde pública, uma educação sucateada pelo estado já não bastasse. Agora os governos estão indo atrás de novas tecnologias para os armamentos “não letais”. Coloco desta forma, entre aspas, pois obviamente todos os aparatos que a policia utiliza para conter as manifestações são letais, visto o estrago que tais armas, que o estado garante que não são letais, fizeram com os manifestantes em junho de 2013. Não apenas com os manifestantes, mas com alguns jornalistas que estavam nas ruas apenas a trabalho e, mesmo se identificando como tais, acabaram sendo agredidos pelas autoridades. Sem falar também nos novos 10 mil contratados para a tropa de choque. E tudo isso para impedir que façamos manifestações contra tudo de errado que está acontecendo ao nosso redor. Porém, os aparatos de repressão não se atêm somente aos aparatos “não letais”, ou seja, físicos. Agora, está tramitando no congresso uma nova lei, segundo a qual os protestos serão

Jornalistas se manifestam contra a violência policial

considerados atos terroristas. Tal projeto é visto por bons olhos por todos os governadores de todos os estados. O que chama nossa atenção é que o texto da lei é muito vago, podendo enquadrar qualquer tipo de manifestação como terrorismo, e não apenas, como dizem os que a defendem, os protestos com grandes atos de violência. Analisando bem a lei, fica evidente que todos os tipos de manifestações, sejam nas ruas, sejam estudantis, ou quaisquer outras, poderão ser enquadrados como terrorismo, sujeitando os manifestantes a penas de 15 a 30 anos de prisão. Esta legislação é tão abrangente que coloca como favorecimento do terrorismo “dar abrigo ou guarida a pessoa de quem se saiba tenha praticado ou esteja por praticar crime de terrorismo. Pena de três a oito anos de reclusão”. Ou seja, com esta nova legislação, donos de bares e outros estabelecimentos

que esconderem manifestantes das repressões policiais – uma cena que vimos com freqüência nas manifestações de junho – irão pegar uma pena de três a oito anos de reclusão. Com tudo isso, a burguesia, com o aval dos governos federal e estaduais, está colocando todas as suas armas contra a classe trabalhadora. Ao protestar, os trabalhadores serão taxados pela burguesia, por meio de seu aparato estatal, como criminosos e terroristas. Sendo assim, o que realmente a copa do mundo irá trazer para o Brasil é apenas gastos exorbitantes e uma grande onda de repressão aos cidadãos, vinda das autoridades que representam os interesses do estado.

Para Ler:

Lei antiterrorista, disponível no site http://www.senado. gov.br/noticias/agencia/quadros/qd_516.html

rua é tido como uma ameaça. Essa ameaça parece advir do fato de que o artista de rua seja o incomum na correria viciada da cidade, seja o elemento inesperado na rotina, alguém que desperta o diferente na visão de mundo dos transeuntes e os lembra de que o espaço público pertence à população e que é nesse espaço, apesar da tentativa de controle, que podemos começar a repensar nossos modos de vida. É, realmente em uma cidade onde muitas vezes o acesso à arte custa caro e é restrita aos espaços fechados, proibir a arte de rua é um crime, ainda mais quando lembramos que há questões de maior importância com as quais o Estado deveria ocupar o seu tempo já demasiado ocioso.


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A Sociologia, os direitos Aspectos da política humanos e a lei do olho por olho, dente por dente Guilherme Amaro

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

Danilo Milev

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

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xiste a ideia, entre as camadas mais conservadoras da população, de que os direitos humanos existem apenas para defender bandidos e que, para piorar, o simples fato de uma pessoa cometer um crime justifica que outra pessoa devolva na mesma medida. Desse modo, muitos, ao mesmo tempo que defendem uma punição rigorosa para certos tipos de crimes, para outros fazem vista cega. Isso se evidencia também nos casos de estupro, em que a mentalidade ainda machista de boa parte da população faz com que a culpa da violência recaia sobre a vítima, encontrando legitimidade entre as próprias mulheres, que adotam o discurso dominante de que a mulher deve não provocar um homem com roupas curtas, ignorando o caso dos países islâmicos, ou mesmo da Índia, onde elas andam cobertas e mesmo assim há altos índices de violência sexual. Ora, se vivemos em um Estado democrático de direito, nada justifica que um crime seja respondido com outro, afinal as leis existem para diminuir ao máximo os conflitos entre os cidadãos na sociedade. Além disso, entendo que esse suposto “direito” de responder a um crime cometendo outro não traria nada de benéfico para a sociedade, e acabaríamos entrando em um circulo vicioso, onde todos iriam querer se vingar de todos, causando uma explosão ainda maior de violência social. Outro ponto a considerarmos no discurso desses defensores do olho por olho e dente por dente é que nada dizem sobre a violência perpetuada pelo

Nada dizem sobre a violência perpetuada pelo agente do Estado

agente do Estado que deveria garantir a segurança da população, independente da sua classe social: a polícia. Independentemente das posturas individuais dos agentes policiais, há uma política de repressão muito forte, sobretudo em relação às camadas mais pobres da população, que estão expostas a medidas arbitrárias adotadas pelos agentes. Se os direitos humanos surgiram para evitar arbítrios por parte do Estado, não podemos entender que esses direitos humanos sejam válidos para uns e não para outros. É preciso ter em mente que a defesa dos direitos humanos não é defesa da impunidade, mas sim evitar que os policiais continuem agindo de maneira arbitrária contra sempre o mesmo grupo específico: negros e pobres.

Entretanto, a violência nunca estará ligada apenas a fatores psicológicos e dualismos bem x mal como o pensamento dominante gosta de colocar, mas sim, atrelados a inúmeros outros fatores , daí a necessidade de uma análise mais aprofundada do que diz respeito à segurança pública. A sociologia, como uma ciência crítica, deve problematizar essas questões da forma mais ampla possível, enxergando a violência como um problema sócio-econômico grave da sociedade contemporânea e muito complexo. Embora sejamos seres humanos sujeitos a erro em nossas análises, devemos ter em mente realizá-las da forma mais ampla possível, sem nos submeter à manipulação emocional do senso comum pregado pela mídia.

Em função dos 50 anos do golpe militar, vêm sendo realizadas, inclusive na Fundação Santo André, diversas atividades (palestras, mesas redondas, mostras de cinema) sobre esse período de nossa história e os desdobramentos dele, que alcançam, em vários âmbitos, o presente. Pela natureza mesma do tema, esses debates põem em evidência a política. A presente matéria convida o leitor a percorrer uma discussão sobre alguns elementos da natureza da política. Para tal viés torna-se necessário lançar alguns pressupostos. Sobre que base se assenta a política? Essa é uma pergunta complexa, respondê-la exige discorrer sobre a estrutura social. Ela se constitui, fundamentalmente, por meio da específica atividade humana, o trabalho; através dele o ser humano estabelece uma relação histórica com a natureza por meio da qual, por um lado, produz os objetos necessários para realizar as necessidades já existentes e as novas, que essa mesma atividade gera, e, por outro, simultaneamente, possibilita condições para o desenvolvimento subjetivo. Sendo assim, o trabalho é uma condição do gênero humano, isto é, produzindo a sua existência, os homens, dentro de certas condições históricas, relacionam-se dando forma a uma organização social, a um determinado modo de produção.

Ocorre que esse determinado modo de produção, como já vimos, é condicionado pelas condições históricas, por meio dele, o gênero humano estabelece um tipo específico de mediação entre o homem e a natureza. Essa mediação é resultado do surgimento da propriedade privada, da divisão social do trabalho, da alienação-estranhamento. Desse modo, baseada nessa “estrutura social” a política tem razão de ser. Sua finalidade permanece como uma “superestrutura”, ou seja, origina-se na sociedade uma atividade que, permanecendo nos limites de certo modo de produção, discute e delibera ações para essa mesma “estrutura social”. Portanto, por esse caminho, já se torna visível que permanecer meramente no campo político é limitar-se à própria “estrutura social” vigente, em outras palavras, é perspectivar mudanças na superfície e não na essência. Obviamente que acompanhar e pressionar o debate político se torna necessário, contudo, revolucionar é alcançar a raiz e a raiz do homem é o próprio homem. É libertar a específica atividade humana, o trabalho, do cárcere da propriedade privada, da divisão social do trabalho, da alienação-estranhamento. Sendo assim, o caminho se abre na denúncia e na prática corajosa, de novas formas, inéditas, de ataque ao capital e as suas personificações. Elas tornaram o cenário mais compreensível e possibilitam a visualização de novas organizações societárias.

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A Cidade Oficial: Arte e Urbanismo Leandro Candido de Souza

Sociólogo e professor do curso de pós-graduação em Ciências Sociais da FSA

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m dos pontos altos do urbanismo andreense é o encontro de temporalidades modernas que se dá no entorno da Praça do IV Centenário. Monumento de padrão e austeridade, o Colégio Américo Brasiliense (1962), de tipo positivista e arquitetura autoritária, faz face à associação comercial do outro lado da larga avenida (ACISA), sugerindo, juntos, a dialética de um futuro promissor: aos mais esforçados a redenção. Entre as edificações, como a ligá-las por uma lógica do mérito, o fio da navalha no horizonte de quem mira o paço municipal da parte baixa: um viaduto automobilístico. Quem estiver nesta passarela da metalurgia do Grande ABC, de costas para a prefeitura, avistará mais um conjunto elevado cortando o Tamanduateí e prometendo terras incautas. Escondidos, por debaixo do pontilhão, o terminal de ônibus e a estação de trens municipal (1867) por onde trafegam trabalhadores, cães e ratos. Até pouco tempo, a obra Concreção 0011 de Luiz Sacilotto coroava o nó urbano de que falamos. Ela foi, durante anos, alvo de protestos, sendo periodicamente indagada – à base de pedradas, chamuscadas e pichações – sobre a carga metafórica de sua forma “abstrata” (na verdade “concreta”). As intervenções desagradaram o espírito adamantino de nossas municipalidades que decidiram transferi-la para a entrada do Parque Central, a bons quilômetros dali e sob vigia permanente de forças da ordem (GCM). Aquele que atravessar a Praça do IV Centenário, passando pelo prédio do correio (de 1961) e manjando à distância o reduto burguês ironicamente nomeado Primeiro de Maio, deverá descer a Rua Dona Elisa Flaquer se quiser chegar ao extinto “triângulo das bermudas”, tríptico de bares localizados nas esquinas entre a rua que vira calçadão e a via detrás do mesmo clube (Rua Álvares de Azevedo), conhecido reduto de livrarias-sebo, lojas de música e boemia. O calçadão conduz a outro maior e coberto, o da Cel. Oliveira Lima,

cujo piso também foi projetado por Sacilotto, como a escultura que podemos encontrar alguns metros dali se seguirmos até a Igreja do Carmo (Concreção 0005, em aço carbono pintado, 4m, amarelo e vermelho). Passando pelo templo católico, toparemos rapidamente com a pinacoteca da cidade, chamada Casa do Olhar Luiz Sacilotto. Hoje, este imenso corredor cultural sacilotto, que se estende da Casa do Olhar à ACISA, é guardado a sete chaves por grupos de “cidadãos de bens” e suas tropas de seguranças, pirrius e skinheads neonazistas. Por isso, devemos notar que há uma ressignificação da obra na sua mudança de contexto (da escola para o parque), revelando que sua importância é inteiramente dependente de sua utilização como artefato cultural. Aquela alegoria da razão, que antes era normativa e indicava a autossujeição da personalidade artística para acatar a um estado de coisas presente, agora se torna a projeção possível (ainda normativa) de uma força vetoriada que tenta atribuir ordem ao entorno urbano em conturbação. Como vemos, as linhas tão próprias à Concreção 0011 não oferecem nada além de uma autoimolação gerenciadora que serviu, com igual desenvoltura, à utopia da conservação e depois à da transformação: uma obra aberta a transformações a partir dos usos e desusos da cidade, sempre indicando a onipresença de uma autoridade impalpável que provê sentido às coisas. Centenas de metros ao fundo do parque que falamos está o complexo pedagógico-científico Sabina Escola Parque do Conhecimento onde, mais uma vez, podemos

encontrar respeitável repertório de obras do mesmo artista. E também as encontram quem visita o SESC Santo André (painéis da torre do elevador que liga o espaço do auditório à praça de alimentação) ou a Universidade Federal do ABC (entrada do bloco B). Suas obras, que andam em par de mãos com palmeiras imperiais, colarinhos brancos e concreto armado (na universidade, no clube, na escola, no parque, na galeria e na praça) denotam uma estética clara. A padronização visual da cidade é, invariavelmente, uma manipulação orgânica de nossa imaginação simbólica. Paisagística, tráfego de veículos, terminais, faixas e fachadas, placas e sinais, ruas, praças e avenidas, prédios, casas e galpões, igrejas, botecos e biqueiras, tudo isso padroniza ou hierarquiza a simbólica do espaço social coabitado. A arte pública urbana ataca a medula dessa manipulação (a linguagem), num enfrentamento corpo a corpo com a lógica dos processos espontâneos de semiotização das cidades que consubstanciam o tipo e os limites das experiências (memórias) que elas poderão nos propiciar. Na metrópole de Sacilotto triunfa a razão inequívoca, a fé no ir para frente, a confiança naquele salto no escuro do desenvolvimento capitalista, um “vamos que vamos” que a cibernética chamou de “entropia negativa”. Não indica contradições, não nos lembra de perigos remotos, apenas deixa rolar uma força maior que nos promete a redenção de todas as diferenças e futilidades prosaicas. Mesmo que no Sacilotto tardio de que falamos, o artista já não se proponha como

mestre do sentido da obra, persiste aquele traçado utópico que é próprio ao projeto concretista inicial, ainda envolvido por questões que se pretendiam norteadoras. A arte pós-moderna abandonou majoritariamente esse trabalho e dissolveu a aspiração à universalidade tão cara a todo modernismo: não existe mais distinção entre alta cultura e mercado, a universidade e o galpão industrial pouco se diferem. Na pós-modernidade, o alto modernismo se lança aos meios de comunicação de massas e o artista passa de mestre do sentido para guardião obliterado do aberto: o propiciador de vivências incertas. Eis porque é importante perceber que toda arte urbana age, consciente ou inconscientemente, com a finalidade de atribuir sentido à configuração espacial da malha social em suas múltiplas e profundas contradições. Contemporaneamente, as tendências da arte urbana que adquirem oficialidade sempre servem à racionalização, ao controle dos corpos e à gentrificação (muros, grades e catracas). Pouco importa se a arte de Sacilotto é boa ou ruim, importa o que ela representa do ponto de vista humano, na transformação das vidas cotidianas daqueles seres que as vivenciam; o que ela propõe e represa, apresenta e cala. A discussão sobre o que é bom ou ruim em arte revela, no máximo, a concepção de arte do crítico, quando não predileções duvidosas ou vícios de desinformação. Deduz-se, desse modo, que existe no artista andreense uma “consciência severa” dos afazeres concretistas que se mantém por praticamente toda sua obra, reve-

lando uma disciplina fabril de amor à ideia como substituta da expressão. Algo inerente ao vocabulário cromático elementar que recusa qualquer ato de desbordo sensual: a rigidez apesar de toda ambivalência perceptiva, como notou o crítico Mário Pedrosa (1900-1981). Por isso o traçado utópico de Sacilotto pode ser visto como o último suspiro de um tipo de arte que marcou o fim da experiência artística em termos propriamente estéticos, ou seja, o encerramento da arte como ação expressiva sobre o indivíduo que pretende referenciá-lo. Com o fim do projeto modernista, a crença burguesa no indivíduo ordenador das relações mundanas desapareceu: agora resta-nos a tecnocracia, a ciência e a máquina (entropia negativa). O sujeito centrado de tipo cartesiano ruiu e, assim, a arte modernista arquejou: a obra teve sua autonomia cassada e o artista foi lançado à atividade mais geral de formulador cultural, a meio caminho entre o curador, o publicitário e o cientista. No deserto da objetividade pós-moderna não existe mais espaço para projetos utópicos nem caminhos a serem seguidos, apenas o mercado e suas leis indiscutíveis. Sacilotto não trabalhou senão para essa capitulação. Para o concretismo, todas as narrativas já foram feitas, agora cabe calar os que querem falar em nome do atraso. “Do discurso só me interessa a linguagem” foi seu slogan jamais formulado. Sacilotto não refere senão a razão opressora e maquinal do burguês industrial branco e, em consequência disso, o conjunto de sua obra adquire uma feição espelhada que é etnocêntrica, classista e misógina.

Para Ver e Ler:

Obras de Luiz Sacilotto em Santo André: Casa do Olhar Luiz Sacilotto, Sabina Escola Parque do Conhecimento, SESC Santo André, Universidade Federal do ABC, além das obras públicas mencionadas na matéria. Mário Pedrosa, Acadêmicos e Modernos: textos escolhidos III (org. Otília Arantes). São Paulo: Edusp, 1998, 427p.


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A ditadura civil-militar Secundaristaspromovem ato no Primeiro de Maio revisitada pelo cinema Cícero Aparecido dos Santos

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

Ismara Izepe de Souza

Professora do curso de Relações Internacionais da UNIFESP e pesquisadora do grupo de pesquisa Conflitos armados, massacres e genocídios na era contemporânea

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ão parece haver dúvida, dentre os setores da sociedade brasileira comprometidos com a democracia, de que se faz necessário promover reflexões sobre o golpe militar que derrubou o Presidente João Goulart em 1º de abril de 1964, e sobre a ditadura que sobreveio. O aniversário de 50 anos do golpe tem suscitado manifestações, debates, atos públicos, eventos acadêmicos, enfim, uma variedade de ações cujo objetivo é promover uma reflexão que contribua para que os mais jovens e as gerações futuras se informem e conheçam uma parte crucial da nossa história. A ditadura militar conduziu uma feroz repressão aos setores dissidentes. Tortura, assassinatos e desrespeito aos direitos humanos foram perpetrados pelos que se apossaram do poder. O resgate da memória desse período se faz ainda mais necessário neste momento, em que teses revisionistas, sintetizadas na expressão “ditabranda”, são elaboradas não apenas por aqueles que compactuam com um modelo político e social excludente, mas também por parte, diminuta felizmente, da historiografia. Vários setores da grande imprensa também almejam o triunfo de uma história falaciosa, que minimize os aspectos autoritários do regime, e que incorpore na memória do país a ideia de que o “movimento militar” teve missão saneadora e se constituiu em um contra-golpe para livrar o país dos “perigos” do comunismo. Contra essa argumentação, que não tem respaldo nos fatos, e atende aos interesses de grupos que tem uma visão muito peculiar e volúvel da democracia, levantam-se políticas institucionais que estão combatendo o esquecimento ou apagamento da história de violência perpetrada pelos militares. Bom exemplo, que deve ser saudado como reflexo das discussões mais

Marechal Castelo Branco cumprimenta militares em cena do filme O Dia que durou 21 anos

profundas sobre a relação entre memória e história, é a constituição das diversas Comissões da Verdade, que confluem para o avanço do conhecimento e da reflexão sobre este período. Dentre as atividades organizadas por ocasião dos 50 anos do golpe, está a Mostra de Cinema e Seminário “50 anos do golpe: o regime militar no cinema brasileiro”, evento organizado pelo grupo de pesquisa “Conflitos armados, massacres e genocídios na era contemporânea” da UNIFESP, Comissão da Verdade Marcos Lindenberg (UNIFESP), Ministério Público Federal e CINUSP . De 26 de março a 13 de abril, foram apresentados 26 filmes e 11 debates (ver programação completa em: http://mariantonia.prceu.usp. br/?q=eventos/50-anos-do-golpe-o-regime-militar-no-cinema-brasileiro). Trata-se de uma iniciativa que procura, a partir de uma perspectiva fílmica, resgatar a memória dos 21 anos de ditadura, evidenciando seus aspectos de violência e repressão. Os filmes, documentais e ficcionais,

serão acompanhados de debates orientados por pesquisadores, ativistas e alguns de seus próprios personagens. Alguns filmes se constituem em obras raras, que não estiveram disponíveis no circuito comercial e que proporcionam o contato com uma versão da história contada pelos que vivenciaram e sofreram as consequências daquela experiência autoritária. Outros, como o recente “O dia que durou 21 anos” trazem informações inéditas, que aprofundam o conhecimento e a reflexão sobre o engajamento dos EUA no apoio ao golpe. A realização da Mostra cumpre tarefa importante ao dar visibilidade a esse período da história recente do país, e nesse sentido, constrói pontes entre o passado e o presente, resistindo às políticas de esquecimento que se projetam sobre o passado. Esquecimento esse que deve ser combatido não apenas em respeito à memória das vítimas, mas principalmente em nome do compromisso com a consolidação de um país mais justo e democrático.

No dia 1° de maio (Dia Internacional do Trabalho), alunos da rede pública do ensino médio, com apoio dos professores de Sociologia Cícero Santos, graduando em Ciências Sociais na Fundação Santo André, Mayara Lopes, formada em Ciências Sociais pela FSA, e do professor de Filosofia Cristiano Coutinho da Cruz, inauguraram o primeiro ato com o grêmio estudantil (VERMELHOS) fundado este ano na E. E. Dom José Gaspar, em apoio aos trabalhadores, em particular aos professores, levando como pauta uma serie de reivindicações no tocante à educação. O movimento, divulgado nas redes sociais, contou com 200 simpatizantes, porém o ato em si concentrou 40 alunos que tiveram como ponto de partida a rua Isidoro Fontes, em Ribeirão Pires, em que se localiza a E. E. Dom José Gaspar, passando pela Av. Santo André e terminando no centro da cidade com uma assembleia para discutir uma nova organização e respectivas propostas, a fim de manter o movimento vivo e ativo. De acordo com a presidente do grêmio estudantil Paula Morais, 16, aluna do segundo ano do ensino médio, a luta que se inicia tem propósitos claros: “O ato tem a intenção de mostrar a cada aluno da rede pública que o Estado não tem como objetivo nos tornar seres pensantes e sim seres dominados. Com isso, nós alunos começamos a luta contra a educação alienante’’, diz. A mensagem que circulava na internet referente ao movimento esboçava alguns pontos: “Objetivo geral: interação com a comunidade e integração da mesma na escola. Escola pública de qualidade, educação como condição de libertação, emancipação. Escola como espaço acadêmico, cultural, científico, musical, como instituição social educacional de libertação e não de repressão ou alienação, etc.’’ A organização – desde a produção de cartazes, faixas, textos, passando pela arrecadação de recursos e divulgação, até o ato propriamente dito –, partiu dos alu-

nos que iniciam sua vida política, e teve êxito. A baixa adesão deveu-se a motivos exclusivos e próprios da realidade da escola pública brasileira que não incentiva, estimula e muito menos apóia esse tipo de mobilização, ao contrário, promove a alienação com uma educação de bases tecnicistas; houve também outras dificuldades como a falta de espaço, a burocracia cobrada por instituições do capital; mesmo assim, ressaltam os professores, o ato teve uma importância significativa e o sucesso esperado. Foi um ato simbólico realizado, dirigido e conduzido por adolescentes com idade, em media, entre 15 e 17 anos, expressão de uma nova geração que precisa de apoio e busca uma atuação política em nome de uma causa eminente, representando os elementos embrionários de uma revolução social. Como constata o aluno Rogério Júnior, 17, do terceiro ano do ensino médio: “A grande conquista do movimento foi propriamente sua existência, porém este foi apenas o marco inicial de uma luta, e sabemos agora de forma empírica que, para uma revolução, é necessário partir de pressupostos materialistas’’. Foi uma vitória o simples fato de estarem nas ruas cobrando um direito assegurado pela própria constituição, educação, e no sentido mais completo possível do termo, isto é, uma educação como condição de emancipação humana, educação libertadora que promova cientificidade, cultura e integridade social, como diziam próprias palavras de ordem levantadas pelos alunos em faixas e cartazes: “pelo fim da opressão educacional’’, “educação sem alienação’’, “educação padrão FIFA’’. O ato mostrou a importância de uma experiência política que difere do tradicionalismo, do academicismo, do giz, lousa e saliva. De maneira geral, é esse tipo de movimento que busca corpo e disseminação, que busca “práxis’’, movimento este que atende por Coletivo, que corre pelo coletivo e que luta em prol do coletivo.


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Recepção dos calouros

Diretório Acadêmico Honestino Guimarães recepciona alunos Diretório Acadêmico Honestino Guimarães (DAHG)

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recepção dos novos alunos organizada pelo Diretório Acadêmico Honestino Guimarães, entidade estudantil da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da FSA, foi composta por atividades acadêmicas, culturais e festivas. Com o objetivo de uma integração real dos novos alunos com os colegas, campus e vida universitária em sua totalidade e partindo da compreensão de que a FSA não é e não pode ser entendida como uma instituição alijada da sociedade, as palestras tiveram como tema a “História da FSA” e “O monopólio e a democratização das mídias no Brasil”. A primeira, em 11 de fevereiro, contou com a presença dos professores Odair de Sá Garcia e Maria Elena Gouvêa e os ex-alunos Roksyvan Silva e José Dalmo e explicitou a riqueza da história da FSA e da participação do movimento estudantil, desmistificando a confusão entre público e privado, de um lado, e gratuito ou pago, de outro e como as decisões de instâncias federais influenciaram na perda gradual de subsídios municipais, o que forjou o atual paradigma universitário no qual estamos inseridos: mensalidades cada vez mais altas numa instituição pública. Esta condição dúbia se desdobra numa situação em que, por ser público, o CUFSA não conta com subsídios como, por exemplo, o Prouni, embora também não conte com a gratuidade de outras instituições públicas, já que os governos estadual e federal não se dispuseram até o momento a arcar com seus custos. Problemas que não negamos, porém que muitas vezes são usados para justificar erros internos das administrações que passam pelo CUFSA e para as gestões do poder público que se abstiveram da responsabilidade com esta instituição de ensino.

Recepção dos novos alunos contou com atividades acadêmicas, culturais e festivas

Abstenção à qual o movimento estudantil não se rendeu ao longo da história da instituição, tendo participação fundamental como aglutinador de lutas tanto em momentos críticos, como a queda do reitor em 2007, quanto no cotidiano de aparente calmaria, mas permeado de problemas. A segunda atividade acadêmica, em 13 de fevereiro, teve a presença do câmera e militante Kria Finato e da jornalista militante Lúcia Rodrigues (também ex-professora da FSA), que trouxeram a contribuição de quem trabalha na área de comunicação com a consciência de seu teor político e da impossibilidade da cobertura imparcial. Foram abordados desde casos dos bastidores que evidenciam edições nada imparciais dos materiais colhidos pelos jornalistas, passando pela perseguição aos profissionais que fogem do controle editorial até a análise da cobertura da mídia tradicional e alternativa nas recentes manifestações nacionais e das discussões do “Não vai ter Copa” na internet. O Sarau e a oficina de Stencil, ambos realizados simultanea-

mente no pátio da Fafil, no dia 12 de fevereiro, pretenderam apresentar para os alunos formas de expressão muitas vezes marginalizadas ou esquecidas. O Sarau vem sendo cada vez mais reincorporado por coletivos e movimentos sociais, sobretudo nas periferias, como forma de expressão de sujeitos e pensamentos que não cabem na indústria de entretenimento. Assim como o Stencil, intervenção típica nas áreas urbanas de ideias que confrontam a ideologia dominante; não à toa, embora a oficina oferecesse cartolinas, muitos alunos preferiram colocar sua arte no vergonhoso muro levantado pela reitoria, como forma de repressão, na sede do DAHG. Por fim, na sexta-feira, dia 14 de fevereiro, aconteceu uma festa, com a contribuição das bandas Caim, Astrolabio, O Livro/Ata, Quovaiser e Obasquiat. Teve como objetivo receber os novos alunos com um momento menos formal do que as palestras, porém também é uma via de apropriação pelos estudantes calouros e veteranos do espaço da Fundação Santo André, ou seja, também é política, por

isso insistimos que a festa fosse realizada dentro do campus. É necessário deixar claro que não só nossas ações têm caráter político, mas a notificação da reitoria tentando coibir a realização da festa também. A “obrigação de zelar pela segurança” afirmada como justificativa pela atual administração do CUFSA parece o uivo do lobo debaixo da pele de cordeiro, pois esta é a mesma reitoria que nos últimos anos deixou a FSA numa situação econômica pior do que encontrou, perseguiu estudantes e funcionários e cerceou da convivência dos alunos e da comunidade diversos locais do campus e também fora dele, já que entregou sem resistência uma casa de pesquisa em Paranapiacaba à prefeitura. Enfim, nossa recepção, assim como várias outras ações do DAHG, faz parte da luta por uma FSA cada vez mais pública e democrática e o fortalecimento das instâncias que dão voz aos estudantes, reafirmando a não resignação ao processo de elitização e mercantilização da educação e aos clichês de uma “calourada” e de uma vida universitária superficial.

Este tal Honestino Guimarães! Mábia Oliveira

Estudante de Ciências Sociais da Fundação Santo André

O Ato Institucional nº 5, o AI-5, foi a expressão mais acabada da ditadura militar brasileira e como consequência produziu um conjunto de ações arbitrárias, definindo o momento mais duro do regime, dando poder de exceção aos governantes para punir arbitrariamente os que fossem inimigos ou como tal considerados. Nesse contexto desaparece em 1973 o militante e líder estudantil Honestino Guimarães, estudante da UNB, após ser preso no Rio de Janeiro por agentes do Centro de Informações da Marinha (Ceninar). O desaparecimento de Honestino é singular e controverso. Não há rastros, não há relatos, não há pistas, não há nada. Sabe-se apenas que ele era vigiado e perseguido por diversos órgãos da repressão. Por seu envolvimento com a militância estudantil e com a resistência ao regime militar, foi preso diversas vezes. Em 26 de setembro de 1968, foi expulso da universidade como punição por ter liderado um movimento pela expulsão de um falso professor da UnB, informante da ditadura. Honestino transformou-se em um símbolo contra a repressão no movimento estudantil. Em meados dos anos 1980 foi fundado o Diretório Acadêmico da FAFIL, batizado com o nome de Honestino Guimarães em homenagem ao estudante desaparecido. Este órgão de representação estudantil a partir de então passou a organizar diversas ações em defesa dos interesses dos estudantes e da comunidade acadêmica. Para resgatar a memória de Honestino Guimarães e coletar pistas sobre o seu desaparecimento, a filha do líder estudantil, Juliana Botelho, lançou a campanha “Trilhas de Honestino”. As informações são recebidas pelo email: memoriahonestino@gmail.com. Na FSA, uma das lutas travadas pelo DAHG é a retomada de sua sede, emparedada em 2012 pela gestão Cacalano e que hoje serve de abrigo para o “arquivo morto” da FSA.


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Expansão do PIBID de Sociologia na FSA Carlos Cesar Almendra

Coordenador do sub-projeto de Sociologia

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m 2010, a Fundação Santo André ingressou no Programa Institucional de Bolsa à Iniciação à Docência (PIBID), programa criado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), do governo federal, para que os alunos dos cursos de licenciatura possam atuar junto aos estudantes das Escolas de Educação Básica da Rede Pública, sob a supervisão de professores dessas escolas, promovendo a integração entre esses dois níveis de educação, a fim de qualificar o futuro professor a melhorar as condições educacionais e de relacionamento, que envolvem desde o entorno até o interior da própria escola. Para isso a CAPES oferece uma Bolsa de Estudos aos alunos, futuros professores, bem como aos Professores Supervisores. O Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) é um programa que oferece bolsa para estudantes de cursos de licenciatura plena (presencial), com objetivo de investir na valorização do magistério por meio do con-

tato com a prática escolar dos educadores, ainda no momento de sua formação. Na Fundação Santo André (FSA), a atividade ocorre desde 2010 e tem dado resultados. Sendo a Sociologia uma disciplina obrigatória “recém-chegada” ao ensino médio, foi necessário pensar propostas metodológicas para seu ensino, bem como a produção de materiais didáticos adequados e inovadores. Logo, ainda há uma carência – e esta deve ser suprida – de pesquisas no âmbito de conteúdos ministrados e bibliografia e materiais utilizados. De acordo com o sub-projeto de Sociologia do PIBID encaminhado e aprovado na CAPES, foram desenvolvidas cinco linhas de atuação, realizadas conforme o Projeto Político Pedagógico da Escola (PPP) em termos de objetivos gerais, e conforme o Programa da disciplina do professor supervisor: 1ª.) Conhecer a realidade da escola; 2º.) Observação e participação na organização e exercício da ação pedagógica em sala de aula; 3º.) Propor atividades

para serem desenvolvidas junto ao professor supervisor; 4º.) Desenvolvimento de pesquisa; 5º.) Atividades de extensão. O subprojeto de Sociologia iniciou o quadriênio 2010-2013 com um coordenador, dois professores supervisores e 20 estudantes bolsistas, terminando em 2013 com 2 coordenadores, 4 professores supervisores e 40 estudantes bolsistas. Para o quadriênio 2014-2017, mais uma vez teremos uma ampliação na oferta de bolsas em todos os níveis, iniciando este ano com 3 coordenadores, 6 professores supervisores e 60 estudantes bolsistas. Através deste programa, mais da metade dos alunos do curso de Ciências Sociais da FSA estão contemplados com as bolsas concedidas pela CAPES. Isto vale inclusive para os alunos ingressantes, desde que tenham obtido a classificação no processo seletivo interno. Para além da bolsa mensal de R$ 400,00, os participantes deste projeto poderão, a partir deste ano letivo, abater horas de estágio que são obrigatórias em todos os cursos de licenciatura.

Você conhece o ERECS e a ANECS?

O Encontro Regional de Estudantes de Ciências Sociais (ERECS) é o maior e mais abrangente evento da Articulação Nacional de Estudantes de Ciências Sociais (ANECS) a nível regional. Acontece em cada regional no 1º semestre de cada ano. É um espaço importante para discutir, principalmente, as demandas regionais. O ERECS – Sudeste de 2014 foi organizado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e aconteceu

entre os dias 1 e 4 de maio na Universidade Federal Fluminense (UFF) – Niterói, Rio de Janeiro, com o tema “Megaeventos e remoções”. O próximo ERECS será o da regional Sul, que acontecerá entre 19 e 22 de junho em Foz do Iguaçu, Paraná, com o tema “Basta de criminalizar a pobreza”. Mais informações nos links: http://erecssul2014.blogspot.com.br/ http://anecsnacional.wordpress.com/

www.colegiadosociais.com

NOTÍCIAS DE PESQUISA Alunos do curso de Ciências Sociais da Fundação Santo André estão desenvolvendo diversos trabalhos de Iniciação Científica. Além dos projetos de Iniciação Científica, também foram aprovados dois projetos de Extensão elaborados por estudantes do curso de Ciências Sociais: o projeto de remodelação e expansão do site do curso (que pode ser visitado em www.colegiadosociais. com), que passará a incluir áudios e vídeos de palestras, debates e cursos de extensão; a produção de alunos e professores dos cursos de graduação e pós-graduação, tais como trabalhos de iniciação científica, monografias, trabalhos

apresentados em congressos científicos, etc.; os resultados dos projetos e atividades que também tenham gerado produtos textuais ou iconográficos; links para sítios eletrônicos de núcleos, grupos e institutos de pesquisa, bibliotecas, portais de periódicos e de bancos públicos de dados, e outras instituições vinculadas à área das ciências sociais, tais como associações nacionais e latino-americanas de sociologia, ciência política e antropologia; e a versão on-line da revista Cadernos de Ciências Sociais. Este Jornal de Ciências Sociais também foi contemplado com a aprovação de um projeto de extensão para consolidá-lo e ampliar sua difusão

A Ocupação do Centreville pela Classe Trabalhadora: do Lugar Fora das Idéias à Luta por Moradia

Violência Contra a Mulher, Ninguém Mete a Colher? Um Estudo em Área de Manancial

Estudante: Eros Andrade Aliproti Orientador: Prof. Dr. Antônio Rago Filho Análise da bem-sucedida ocupação do Centreville, no contexto de crise econômica, política e social, caracterizada pela inflação, arrocho salarial, desemprego, demissões em massa, e aumento dos aluguéis. Burocracia na Obra de Mauricio Tragtenberg Estudante: Jaime Belmiro de Araujo Orientador: Prof. Ms. Carlos C. Almendra O projeto estudará a crítica à burocracia e ao poder burocrático realizada por Mauricio Tragtenberg, que a apresenta enquanto ideologia e poder de dominação.

Estudante: Monica Silva Dias Orientadora: Profa. Dra. Lívia Cotrim A pesquisa levantará informações qualitativas e quantitativas sobre a violência contra a mulher em área de manancial no município de Santo André, objetivando desvelar o contexto sociocultural relacionado a tais casos de violência. A legislação sindical e a resistência do sindicalismo (1934-1937) Estudante: Euller Felix Silva Orientadora: Profa. Dra. Lívia Cotrim O trabalho pretende expor a organização e as lutas da classe trabalhadora entre 1934 e 1937, enfatizando a análise da legislação sindical do período.

A Contribuição do Complexo Escravista Africano na Acumulação Primeira de Capitais segundo Eric Williams Estudante: Talita Moura Paulino Orientadora: Profa. Dra. Lívia Cotrim A pesquisa objetiva recuperar a análise de Williams acerca da escravidão moderna, em sua articulação ao processo de acumulação primitiva do capital.


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