Salão de Artes Grupos artísticos promovem salão de artes na FSA Página 11
Entrevista
TEMPO DE VIOLÊNCIA Em entrevista com Vera Lúcia Vieira (foto), professora na PUC-SP, o Jornal de Ciências Sociais discute a ascensão de embates entre movimentos sociais e autoridades. Página 6
Sociais
Jornal de
Curso de Ciências Sociais - Centro Universitário Fundação Santo André - Ano II - N° 3
Ciências
Informação que não se vende
Racismo em debate Leia sobre a ideologia do racismo e o combate à discriminação nos artigos “Holocaustos Invisíveis: Imperialismo, Racismo e Eugenia”, “A África na Sala de Aula” e “O Mundo que o Mulato Criou”. Página 8
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Lançamento
Confira a resenha do livro Fabricalização da cidade e ideologia da circulação, de Terezinha Ferrari Página 3
A caminho da justiça? Justiça, igualdade e liberdade na sociedade capitalista Página 4
Lutas no campo
Para compreender o assim chamado “agronegócio” brasileiro é necessário retomar a história das lutas no campo ao longo da segunda metade do século XX. Página 12
Pesquisa na FSA
Imagem reproduzida da capa do livro de Clóvis Moura, Rebeliões na Senzala (Ed. Zumbi, 1959)
Notícias de pesquisas de estudantes de graduação e pós-graduação em Ciências Sociais
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Jornal de Ciências Sociais - nº 3 agosto de 2012
Editorial
Jornal de Ciências Sociais com mais páginas e colaboradores contra a discriminação. Outro destaque é a entrevista com a profª. Vera Lúcia Vieira, da PUC-SP, na qual ela aborda a violência exercida pelo Estado brasileiro contra os movimentos sociais, expondo suas raízes históricas. Em parceria com outras entidades, o Curso de Ciências Sociais apoiou a realização, no pátio da FAFIL, do Salão Coletivo de Artes Plásticas do ABCD. Esta iniciativa inédita contou com exposição de telas e palestras, estimulando, assim, o debate sobre a produção artística atual. Outros artigos abordam as lutas no campo, o problema da justiça e a estrutura urbana atual; o JCS traz também resumos de pesquisas de estudantes de graduação e pós-graduação em Ciências Sociais. Por fim, ressaltamos que a Fundação Santo André está completando 50 anos, período durante o qual vem formando, com reconhecida qualidade, pesquisadores, docentes e outros profissionais em diversos campos, cumprindo, assim, um importante papel na região.
O Jornal de Ciências Sociais chega à terceira edição ampliado, crescimento resultante de sua boa aceitação pelos leitores e da expansão das colaborações de alunos, ex-alunos e professores. Um dos destaques desta edição é o debate sobre o racismo, abordado em três artigos. O prof. Juarez Ambires ressalta as convergências históricas entre Brasil e Cabo Verde. Roksyvan de Paiva Silva, aluno de Ciências Sociais, em “Holocaustos Invisíveis”, resenha a palestra realizada, a convite deste curso, pelo historiador egresso da FSA Weber Lopes Goes. Nela foram tratados o domínio imperialista sobre o continente africano, a consolidação da ideologia do racismo e a pseudociência eugênica. Deivison Nkosi, sociólogo também formado pela FSA, resume sua exposição, na mesma atividade, sobre o peso dos povos africanos para a história da humanidade e a introdução dessa temática na educação básica. Além dos estudantes de diversos cursos da Fundação Santo André, compareceram a esses debates militantes inseridos nas lutas Jornal de
Sociais Ciências
Jornalista Responsável Eduardo Kaze - MTB: 62857
Colaboraram nesta edição Leandro Cândido de Souza Juarez Donizete Ambires Roksyvan de Paiva Silva Luiz Fernando Rezende Luiz Felipe de Farias Deivison Nkosi Fábio Ribeiro Felipe Saluti
Fundação Santo André Av. Príncipe de Gales, 821, bairro Príncipe de Gales Santo André - SP - CEP: 09060-870 Tel.: (11) 4979-3406 colegiado.sociais@fsa.br
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Cidade, urbano e território em tempos do just in time por: Felipe Saluti
O
s processos de re e s t r u t u r a ç ã o p ro d u t i v a e a mundialização do capital, principiados nos países centrais em meados dos anos de 1970, permearam todas as esferas da vida social. Terezinha Ferrari em seu livro Fabricalização da cidade e ideologia da circulação discute essas transformações revelando as determinações da sociabilidade e da reprodução do capital em consonância com o urbano. Retoma a transição da produção taylor-fordista para a forma da produção contemporânea que impôs os rearranjos temporais, espaciais e institucionais redefinidores dos limites da indústria. As unidades fabris vinculadas aos conglomerados transnacionais tornaram-se enxutas ao introduzir a automação informatizada eliminando postos de trabalho, expulsando partes do processo de trabalho para a rede de fornecedores e para a cidade como um todo. A fábrica tomou as cidades expondo-as às metas empresariais, tornando-as vias de circulação de estoques em trânsito ou correias de transmissão de mercadorias transportadas pelos poros produtivos e intercaladas por portos secos do urbano expandido. O fluxo de valor formatou uma territorialidade subsumida à aceleração dos ritmos de rotação do capital. O rearranjo da produção patrocinado pelo capital na direção da automação microeletrônica, contrário
às teses do fim do trabalho, intensificou os ritmos do trabalho de um proletariado urbano e rural que se expande mundialmente. O trabalho pulverizado pelos territórios econômicos mundiais, fragmentou-se fragilizando as lutas dos trabalhadores, reduzindo-as à dimensão da sociedade civil. O rearranjo produtivo veio acompanhado do rearranjo institucional com a construção de uma rede burocrática mundial de organizações neogovernamentais que se tornaram os meios institucionais de encaminhamento das reivindicações das classes trabalhadoras no Brasil e no mundo. O Estado, cumprindo seu papel de comitê executivo do capital, agencia megaprojetos para reorganizar as cidades de modo a atender à circulação just in time (na hora certa). No caso específico do estado de São Paulo projetos viários como o Rodoanel cumprem a função de interligação das zonas metropolitanas e suas respectivas cidades e indús-
trias de acordo com as novas necessidades de circulação rápida das mercadorias, evitando a dissipação do valor e incrementando o discurso da circulação ser o momento crucial da acumulação. Neste movimento o trabalho, elemento central da produção social, é escamoteado pelo processo de circulação. Fabricalização das cidades e ideologia da circulação, por contribuir para o estudo e análise do urbano, para além de sua forma fenomênica, é cabedal de reflexão para pesquisadores de várias áreas acadêmicas. Contudo, a análise permite, também, ser debatida por trabalhadores, militantes, utilizada nas salas de aula do ensino médio em disciplinas diversas no campo das ciências humanas. Em suma, o debate é válido e deve ganhar profundidade a partir de práticas direcionadas por uma teoria que vê as transformações do urbano como um momento do desenvolvimento histórico e geográfico que não se fecha em si, ou seja, o urbano e as cidades são espaços construídos e constituintes de uma sociabilidade que se reproduz e pode criar condições para uma sociabilidade futura.
Serviço:
Livro: Fabricalização da Cidade e ideologia da circulação Autora: Terezinha Ferrari Editora: Outras Expressões Preço: R$ 15,00 Contato: colegiado.sociais@ fsa.br
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Artigo
A CAMINHO DA JUSTIÇA? por: Luis Fernando Silva Rezende
É
muito comum encontrar nos debates acerca dos problemas da vida social a ideia vulgar de desigualdade e sua decorrente noção de injustiça que, quase sempre, deixa subentendido um justo universal, eterno e, assim sendo, necessariamente exterior aos indivíduos. Dificilmente há um aprofundamento da discussão no sentido de uma explicação minimamente rigorosa dos termos, isto é, de uma demonstração do que se entende por igualdade e por justiça. Do que resulta, amiúde, a assimilação implícita de algumas das formações ideais – inclusive normativas – que conferem expressão e inteligibilidade às relações necessárias à reprodução das condições sociais que vigoram. Espalha-se, então, a ideia de que a luta pela emancipação do homem é uma questão de justiça e de realização da igualdade, o que coloca no horizonte um modelo de sociedade ideal em que apenas seriam postas plenamente em prática categorias abstratas que, em última análise, são produtos, em sua peculiaridade, de uma dada forma de sociabilidade. Porque, conforme constatou Marx, “[...] não só se trata, pois, de que a liberdade e a igualdade são respeitadas no intercâmbio baseado em valores de troca, mas que o intercâmbio de valores de troca é a base produtiva, real de toda igualdade e liberdade”. Como conceitos puros, portanto, igualdade e liberdade são apenas fórmulas idealizadas daquilo que ocorre nas relações reais da vida concreta dos indivíduos, isto é, nas relações de troca modernas, pelas quais igualdade e liberdade
se instituem, embora de forma contraditória, validando suas formas ideais. Então, cabe-nos a pergunta: será mesmo este o tom da luta pelo rompimento com os laços sociais que ainda prendem o homem? Na Crítica ao programa de Gotha, texto em que o problema da justiça é analisado mais a fundo, Marx trata o equitativo da modernidade em termos do valor da força de trabalho, ou seja, da possibilidade histórica inaugurada de se medir o valor da força
uma limitação burguesa. O direito dos produtores é proporcional ao trabalho que prestou; a igualdade aqui consiste na utilização do trabalho como unidade de medida comum”. No fundo, persiste a máxima “a cada um segundo seu mérito”, cuja medida do que cabe a cada um é dada pelo tempo de trabalho. Isto, segundo a professora do departamento de filosofia da PUC-Minas, Ana Selva Castelo Branco Albinati, num estudo intitulado A ideia de justiça em Marx, além de
seus modelos abstratos a que chamam comunismo, socialismo etc. Ora, se a ideia moderna de justiça – aquela segundo a qual a justiça depende de uma relação de troca numa situação social de igualdade – está associada à generalização da troca como meio dominante da relação entre os indivíduos, o que só passa a ocorrer no mundo moderno, assim, também, a superação da sociedade capitalista exige igualmente a superação da contraditoriedade dos
de trabalho como uma mercadoria qualquer: pelo tempo de trabalho. No modelo ideal de sociedade justa e igualitária à qual, aqui, proponho uma crítica, por exemplo, sobreviveria esse princípio de justiça distributiva, mas com a diferença de que, nele, todo o tempo de trabalho passaria a ser “pago”. Isto significa que, apesar da superação da contradição capitalista entre a equivalência na compra da força de trabalho e a não-equivalência no seu emprego como valor de uso gerador de mais-valor, seria conservado o critério limitado da igualdade burguesa. Nas palavras de Marx, “[...] este direito igual continua trazendo implícita
premiar o individualismo da sociedade mercantil, significa “[...] considerar as diferenças nas capacidades individuais, sejam elas naturais ou sociais, como desigualdades que justificam um usufruto maior ou menor da riqueza social”. Além dos limites da utilização de um único critério de avaliação para a distribuição da riqueza social entre os indivíduos, tal ideia ainda considera o indivíduo em sua forma atomizada, isolada, como indivíduo não social. Não deixa de ser curioso, por isso, o fato de aqueles que se vangloriam por criticar a meritocracia e o egoísmo da modernidade serem os mesmos a defendê-los, inconscientemente ou não, em
nexos sociais de indiferença e equivalência que a caracterizam, de modo a instaurar a possibilidade – porque a superação em si não é condição suficiente – de rumar para uma nova noção de justiça completamente desvinculada de um critério exclusivo que iguale a todos, algo impraticável sob o regime do capital. O justo, portanto, não é um ideal além-mundo a ser almejado por nós humanos; a filosofia marxiana não tem esse cariz utópico. Suas formulações a respeito, ao contrário, só se sustentam como expressão universal de uma nova possibilidade social, e não como um modelo abstrato a ser concretizado. As formas concretas em que
um novo princípio de justiça se realizaria, bem como os critérios que estabeleceriam a distribuição da riqueza social dependeriam, portanto, das peculiaridades de cada caso. Não se trata, por isso, de uma tentativa especulativa de estabelecer previa e idealmente as medidas pelas quais os homens repartirão a riqueza global, mas da constatação da necessidade de superação da definição do justo a partir de uma dada medida, o tempo de trabalho, sobre a qual se ergue a tão propalada meritocracia no âmbito da justiça. E novos critérios e novas medidas serão inaugurados de acordo com novas condições sociais que desenvolvam novas capacidades e necessidades nos indivíduos. Mais do que a caminho da justiça, portanto, o drama da emancipação humana indica a necessidade da construção de um justo para além da indiferenciação abstrata da sociedade dos equivalentes, o que supõe a superação de toda a base que sustenta a interatividade alienante do regime do capital.
Para Ler:
MARX, Karl: Crítica ao programa de Gotha. SP: Boitempo, 2012. MARX, Karl e ENGELS, Friedrich: A Ideologia Alemã. SP: Boitempo, 2012. ALBINATI, Ana Selva Castelo Branco A ideia de Justiça em Marx, in: www. ifch.unicamp.br/formulario_cemarx/selecao/2009/ trabalhos/a-ideia-de-justica-em-marx.pdf).
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Economia Política
“Agronegócio” e luta de classes
por: Luiz Felipe de Farias
P
ara compreender o assim chamado “agronegócio” brasileiro é necessário retomar a história das lutas no campo ao longo da segunda metade do século XX. Entre as décadas de 1950 e 1960 ocorreram fortes lutas entre trabalhadores rurais e grandes proprietários de terras no Brasil. Ao controlar enorme parte das terras brasileiras e ao bloquear a extensão de direitos bá-
sicos à população do campo, grandes proprietários rurais limitavam a participação econômica e política que a massa de trabalhadores poderia alcançar na construção do país. Em resposta, trabalhadores das grandes plantações de cacau e cana na Bahia e em Pernambuco e de café em São Paulo realizaram inúmeras greves reivindicando melhores salários e direitos trabalhistas, enquanto por
todo o país diversos grupos de trabalhadores lutavam pela conquista ou pela manutenção de seu pedaço de terra. Neste cenário de ascensão da luta dos trabalhadores, diferentes intelectuais e forças políticas construíram projetos de transformação da sociedade brasileira nos quais a reforma agrária era central. De acordo com estes projetos, a distribuição de terras e a extensão de direitos
básicos ao povo trabalhador rural deveriam romper barreiras econômicas e políticas que então bloqueavam o desenvolvimento brasileiro. Estes projetos e lutas foram derrotados em 1 de abril de 1964, quando a ditadura do capital sob tutela militar iniciou uma contra-reforma agrária no Brasil. Em primeiro lugar, a ditadura ofereceu um enorme volume de crédito para os grandes
proprietários de terras, com o objetivo de “modernizar” o campo brasileiro: eles deveriam utilizar mais máquinas, fertilizantes e defensivos para produzir especialmente culturas destinadas às agroindústrias e à exportação. Em segundo lugar, a ditadura garantiu aos grandes proprietários o aumento de seu controle sobre a terra no Brasil, enquanto milhões de trabalhadores
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rurais eram expulsos de seus sítios: ao longo da década de 1970 cerca de 75 milhões de hectares foram incorporados à fronteira agrícola no país, enquanto quase 16 milhões de pessoas foram expulsas do campo à cidade. O resultado deste conjunto de políticas da ditadura foi a modernização conservadora do campo brasileiro. Por um lado, aumentaram os nexos entre a agricultura, a indústria de insumos (fertilizantes, defensivos, combustíveis, rações, sementes, mudas, etc.) e a agroindústria processadora de matérias primas (especialmente de cana de açúcar, laranja, soja, eucalipto). Por outro lado, manteve-se intacto o monopólio de riqueza e poder das classes dominantes rurais brasileiras. Entre as décadas de 1970 e 1980 o povo trabalhador respondeu a estas transformações e multiplicaram-se novamente as lutas no campo brasileiro. Houve gigantescas greves de assalariados rurais da cana de açúcar em Pernambuco entre 1980 e 1984 e da cana de açúcar e da laranja em diversas cidades de São Paulo entre 1984 e 1989. Houve também lutas de trabalhadores expulsos de suas terras ou ameaçados de expulsão, dentre os quais se destacam aqueles organizados a partir de 1984 no Movimento dos
Ditadura ofereceu crédito para os grandes proprietários de terras“modernizar” o campo
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Na década de 1990 muitos desses impasses políticos do campo brasileiro permaneceram em aberto. Por um lado, algumas greves de trabalhadores assalariados rurais conseguiram paralisar a lavoura e a agroindústria, apontando para uma disputa com o capital sobre o controle do trabalho em toda a cadeia agroindustrial. Por outro, a luta pela terra manteve sua força, com ocupações do MST em todo o país exigindo o fim da concentração das terras brasileiras nas mãos de pouquíssimos grandes proprietários. Em resposta a estes impasses políticos, os grandes proprietários de terras e indústrias investiram novamente na modernização conservadora do campo bra-
sileiro. Mudanças técnico-organizacionais das lavouras passaram a ser planejadas a partir das unidades de processamento agroindustrial, enquanto estas se tornaram crescentemente capazes de beneficiar os múltiplos recursos oferecidos pelas lavouras. Em todos os seus traços, o avanço na incorporação de progresso técnico à agricultura teve por objetivo não apenas a redução de custos, mas também a criação de novos nexos de subordinação da terra e do trabalho ao capital. Ao reduzir em escala crescente a lavoura a um momento da produção industrial, o capital tornou-se capaz de impor novos desenhos e novas dinâmicas aos territórios agrícolas e de submeter os trabalhadores rurais a novos ritmos e novos
disciplinamentos que têm por parâmetro a dinâmica fabril. Em termos políticos e econômicos, os anos 2000 foram significativamente mais favoráveis ao capital agroindustrial no Brasil em comparação com os anos 1990. Em primeiro lugar, a “modernização” do campo impôs uma nova correlação de forças na luta com os trabalhadores rurais: apenas a título de exemplo, a mecanização crescente da colheita da cana, do café, do algodão, do milho, da soja diminuiu em muito o poder de barganha da massa de assalariados rurais manuais, que anteriormente havia enfrentado o capital em diversas greves. Em segundo lugar, a forte elevação dos preços internacionais dos produtos agrícolas e agroindustrializados aumentou muito o poder econômico e político dos grandes proprietários de terras e agroindústrias, permitindo-lhes fortalecer e multiplicar seus canais de pressão e barganha sobre o Estado brasileiro.
Para ver:
O veneno está na mesa Este documentário lançado neste ano e dirigido pelo premiado cineasta brasileiro Silvio Tendler alerta sobre o uso indiscriminado de agrotóxicos na agricultura brasileira, que atualmente
é a recordista mundial no uso desses agentes químicos fornecidos por empresas como BASF, Bayer, Dupont, Monsanto, entre outras. Migrantes O documentário retrata, por meio de depoimentos e imagens marcantes, os obstáculos que os trabalhadores que migram para trabalhar no corte de cana enfrentam. A ruptura com a família, condições precárias de vida, excesso de trabalho e falta de assistência à saúde são alguns dos problemas abordados.
Para Ler:
ALMEIDA, Alfredo Wagner (org.), Capitalismo globalizado e recursos territoriais: fronteiras de acumulação no Brasil contemporâneo, Rio de Janeiro: Lamparina, 2010. ALVES, Francisco José da Costa, Modernização da agricultura e sindicalismo: Lutas dos trabalhadores assalariados rurais da região canavieira de Ribeirão Preto, Tese de doutorado, Instituto de Economia da Unicamp, 1991. THOMAZ JR., Antônio, Por trás dos “nós” da cana: a relação capital x trabalho e o movimento sindical na agroindústria canavieira paulista, São Paulo: Annablume/Fapesp, 2002. GRAZIANO da SILVA, José, De bóias frias a empregados rurais, Maceió: EDUFAL, 1997. GRZYBOWSKI, Caminhos e descaminhos dos movimentos sociais no campo, Rio de Janeiro: FASE, 1987. MEDEIROS, Leonilde Sérvola de, História dos movimentos sociais no campo, Rio de Janeiro: FASE, 1989. MORAES SILVA, Maria Aparecida, Errantes do Fim de Século, São Paulo: Editora da Unesp, 1999. FERNANDES, Bernardo, A formação do MST no Brasil, Editora Vozes, 2000.
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Semana de Ciências Sociais e Geografia 2012: Geopolítica latino-americana: contradições e alternativas Palestras, debates, grupos de trabalho, exposições, comunicações de pesquisa, apresentações artísticas
Atividade aberta e gratuita.
De 24 a 29 de setembro – das 18h00 às 22h30, na Fundação Santo André, prédio da Fafil (Av. Príncipe de Galles, 821)
Confira a programação em www.colegiadosociais.com Informações: colegiado.sociais@fsa.br
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Entrevista
Tempo de violência Entrevista com a Prof ª. Vera Lúcia Vieira
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ecentemente, a violência do Estado contra movimentos e grupos sociais tem adquirido notoriedade em quase todos os espaços midiáticos. Do desalojamento beligerante de 1500 famílias na comunidade do Pinheirinho em São José dos Campos (para favorecer o megafraudador Naji Nahas) à instauração de um enorme aparato policial na principal universidade do país (a USP, que viu seus estudantes serem presos, funcionários demitidos, espaços como SINTUSP, DCE, C.A.’s e CRUSP sob intervenção policial), passando pela política de dor e sofrimento infligida aos dependentes de crack na região da “Nova Luz”, no centro de São Paulo, tudo conspira para o questionamento de nossas instituições democráticas. Para entender um pouco mais essa situação, o jornal de Ciências Sociais entrevistou a professora Dra. Vera Lúcia Vieira (PUC-SP), coordenadora do Centro de Estudos de História da América Latina (CEHAL/PUC-SP).
Jornal de Ciências Sociais: Professora Vera, diante de um quadro de “violência institucional” travestida de “política social”, faz algum sentido continuarmos falando na existência de “democracia” no Brasil ou existe uma terminologia que, do ponto de vista histórico e social, defina melhor nossa atual institucionalidade política?
Vera Lúcia: Em primeiro lugar, acho que é necessário recuperarmos alguns preceitos que norteiam as posições sobre a atuação do Estado. A maior parte dos autores entende que o Estado é uma instituição que tem por obrigação garantir a ordem e a segurança social e que, para tanto, tem o direito de agir com violência, sem o que não seria possível
a convivência humana de forma harmônica, etc... Tal preceito é muito arraigado, tanto porque é esta posição que respalda a ação do poder judiciário, quanto porque é defendida pela maior parte dos analistas de todas as áreas, e também pelo senso comum. Tais autores consideram que esta é uma função do Estado, o qual agiria como um demiurgo,
pairando acima da sociedade e, de forma neutra, fazendo cumprir as leis, as quais, por sua vez, seriam preceitos emanados de todos em comum acordo. Por exemplo, quando os noticiários informam à população que um policial matou um bandido, ou quando dizem que baderneiros depredaram o metrô após um corte de energia que impediu os
trens de operarem, está pregando tal preceito. E qual a razão? No primeiro caso, qual foi o tribunal que julgou a pessoa, a considerou um bandido e a condenou à morte? Deste resultam muitos outros problemas. Muitos consideram que o policial que matou a pessoa suspeita fez isto à revelia. Ou seja, a culpa seria do policial, indivíduo, e não o
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resultado de políticas públicas ou da própria forma de ser do Estado, tanto mais violento quanto mais excludente. Mesmo os que reconhecem isto como resultado de políticas públicas, acham que o Estado deve ser mais duro, as leis mais rígidas, pois só assim se diminuiria a violência. Voltamos à antiga lei de Talião – olho por olho. Ou ao código de Hamurabi, que mandava cortar as mãos de pessoas acusadas de roubo. JCS: Independentemente do nome que se dê ao modo de organização política brasileira, o que pode explicar o fracasso de nossas instituições no tratamento das classes subalternas e, especialmente, a repressão aos movimentos sociais organizados depois do fim da ditadura civil-militar (1964-1984)? VL: No caso brasileiro e no latino-americano em geral, a excludência que advinha do período colonial se acentua no período pós independência. O liberalismo, ao organizar a propriedade privada, exclui de todos os direitos milhares de indivíduos. Na América Latina, centenas de povos originários detinham terras e, mesmo sofrendo genocídios, não foram expulsos no período colonial. A coroa espanhola inclusive cobrava impostos sobre sua produção, muitas vezes pagos em ouro ou prata, portanto, os reconhecia como produtores. Quem promove sua excludência total são os estados liberais implantados após as independências em fins do século XIX e começo do XX, respaldados em códigos de leis de cunho liberal, em nome da democracia, da igualdade e da liberdade. Daí para a frente, quanto mais excludente, mais distante do acesso aos direitos de cidadania vão ficando as pessoas. E quanto mais isto se acentua, mais se organizam para protestar contra o que ameaça
sua própria existência. A resposta do Estado sempre tem sido a truculência, não reconhecendo o direito das pessoas protestarem, particularmente quando o protesto adquire dimensões proporcionais ao problema vigente. Ou seja, quanto maior o problema, maior (ou melhor) a organização. Em seu conservadorismo, mais truculenta é a forma de agir do Estado, cuja função acaba por ser apenas a de garantir os direitos de segmentos privilegiados que atuam de forma autocrata no domínio do poder político. Assim, volta-se à questão: tal violência é da natureza do Estado, de fato, mas não como direito, mas como poder e dominação de classe. Nas particularidades pós-ditaduras da segunda metade do século XX, que foram constantes também na maior parte dos países latino-americanos, a natureza do Estado não muda. Apenas os militares deixam a cena para que os segmentos dominantes da burguesia voltem ao comando direto do poder, através dos poderes constitucionalmente definidos. No caso das últimas ditaduras, os militares foram chamados para garantir o controle sobre os trabalhadores em geral, para que as renovações do capitalismo fossem feitas a ferro e fogo. Pois renovações do parque tecnológico, por exemplo, que foi o caso do Brasil, significavam aumentar a exploração, tirar direitos trabalhistas, fechar postos de trabalho, despedir centenas de pessoas. A truculência do Estado aumenta muito, mas o mais perverso disto tudo é que, ao término das ditaduras, tal violência se mantém no caso das lutas sociais. JCS: Como a senhora vê as respostas, por parte destes mesmos movimentos sociais e de outros setores da esquerda às ofensivas do braço armado da burguesia (polícia militar)? E a socie-
dade civil, lato sensu, como tem se portado diante destes acontecimentos? VL: Deixando de lado o problema do que se considera esquerda, ou seja, os diferentes níveis de oposição a este estado de coisas, e as evidências de seus desmantelamentos nos períodos ditatoriais, observa-se o seguinte: O esgotamento das funções sociais dos militares no poder levou a sociedade civil a isolá-los para que saíssem de cena. Em tal movimento, unem-se forças sociais muito distintas e antagônicas em
“a corrupção é atávica ao sistema capitalista, não é um privilégio deste ou daquele governo, deste ou daquele país” torno de bandeiras comuns. No caso do Brasil, na década de 1980, uniram-se trabalhadores, classes médias, estudantes e a própria burguesia, em torno das bandeiras da democracia, liberdade e autonomia. O significado de cada uma destas palavras para cada segmento era distinto, mas naquele momento elas os uniram. Após isto, entrou-se na era do neoliberalismo, advindo de novas formas do capitalismo que resultaram em uma mudança radical do perfil do trabalhador. As antigas formas de lutas já
não respondiam às demandas, embora os processos excludentes se perpetuassem. Antigas formas de lutas que são as mobilizações por direitos de cidadania ganham maior relevância, enquanto as greves, as mobilizações de fábrica propriamente dita, recuam ante as alterações do sistema produtivo. Neste processo as “esquerdas” perdem o foco, e isto se revela também entre os intelectuais vinculados a um pensamento crítico. No interior disto tudo, e voltando ao problema da violência institucional, o principal problema é o não reconhecimento de sua continuidade, agora dirigida contra os pobres, os excluídos por etnicidade ou por sexualidade, entre outros. Os analistas, em geral, reconhecem (e estudam) a violência das perseguições políticas nos períodos ditatoriais. A continuidade e extensão desta violência truculenta contra os segmentos acima referidos são deixadas de lado, predominando o senso comum de que se trata de uma violência necessária, contra bandidos e baderneiros ou contra sujeitos desqualificados. Criticar a ação do Estado contra tais sujeitos significa, indiretamente, apoiá-los. Assim, a denúncia de tais arbitrariedades fica nas mãos de intelectuais que denunciam tal violência não enquanto uma crítica à natureza mesma do Estado, mas, ou como resultante de uma cultura policial, os quais, por advirem destes mesmos segmentos pobres, só conhecem tal forma de agir. Ou, pior, atribuem tal violência ao próprio povo, por sua condição de pobreza. JCS: Fazendo um pequeno exercício de prospecção, o que nos espera nestes próximos anos, com as sucessivas desregulamentações ocasionadas pela farra burguesa a pretexto de megaeventos como a Copa do Mundo (2014) e as Olimpíadas
(2016)? Quais medidas podem e devem ser adotadas pelos indivíduos e grupos que se contrapõem a essa nefasta lógica aniquilante? VL: Sinceramente, eu não saberia o que responder sobre isto, particularmente porque acho que com isso se entra em outro tema, o da corrupção. Acho que a corrupção é atávica ao sistema capitalista, não é um privilégio deste ou daquele governo, deste ou daquele país. O que não significa que não devamos lutar com unhas e dentes contra isto, pois é nossa força de trabalho que está sendo roubada mais uma vez. O que eu diria, no caso da violência do Estado é que precisamos aprofundar nossas reflexões sobre o que ocorre e analisar suas raízes históricas. Por exemplo, quantos de nós que temos nível universitário sabemos que a policia civil e a militar atuam de forma conjunta desde sua formação no Brasil e que suas funções foram “modernizadas” no período de JK (Juscelino Kubitschek), garantindo-se que os policiais da força pública (que são os policiais militares) ficassem diretamente subordinados ao exército? Quantos de nós sabemos que os dirigentes são escolhidos entre pessoas disponibilizadas do contingente das forças armadas? Quantos de nós sabemos que no período ditatorial isto só foi acentuado e que não mudou depois da ditadura? Por isto, quando os policiais atuam contra os movimentos sociais como se estivessem em um campo de guerra, sejam estes estudantes, sejam movimentos por moradia, ou nas lutas do campo, ou contra mobilizações de professores, ou contra pessoas que protestam porque estão há anos sofrendo enchentes nas cidades, isto é, para eles, de fato, uma guerra. Pois é assim que os segmentos dominantes vêem a situação e orientam a ação.
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Racismo em Debate
Holocaustos invisíveis Imperialismo, racismo e eugenia por: Roksyvan de Paiva Silva
C
omo parte do ciclo de atividades acadêmicas do ano, o curso de Ciências Sociais promoveu “Holocaustos invisíveis: o colonialismo europeu e o subdesenvolvimento do continente africano”, palestra proferida por Deivison Nkosi em 12 de maio (veja nesta edição a matéria “África na sala de aula”, p. 10); e, ainda, “Imperialismo, racismo e eugenia: a reação do pensamento conservador nos séculos XIX e XX no Brasil”, conferência ministrada por Weber Lopes Goes. Lopes, em sua palestra, propôs-se abordar como o imperialismo no fim dos séculos XIX e XX se espraia e se concatena com o pensamento conservador no Brasil. Neste período, e mais especificamente os anos que vão de 1848 a 1871, cria-se um ponto de convergência entre imperialismo, racismo, eugenia e o pensamento conservador. Feito de revoluções proletárias que pululam na Europa, o ano de 1848 representa o marco divisório que põe fim ao longo período de ascensão burguesa. A classe do capital já tinha conduzido as suas revoluções até o fim, particularmente em Inglaterra e França, eliminando definitivamente as relações feudais, o privilégio, a servidão – numa palavra, o Ancién Régime. A partir daí e para sempre, na restrição de horizontes humanitários outrora tão amplos, na acomodação por reproduzir seu mundo recém-criado, a burguesia passa a ser conservadora, enquanto os trabalhadores assalariados – proletários – tomam do chão as bandeiras decaídas
do humanismo e as levantam para vôos mais altos, o historicamente novo. Em 1871, com a Comuna de Paris, a classe trabalhadora “toma o céu de assalto”, nas palavras de Marx. Ao mesmo tempo, o capital entra em outro momento de seu movimento: o imperialismo. Se até meados do século XIX a burguesia ainda é revolucionária, sua ação social se apresenta inevitavelmente também no campo do pensamento. É bastante lembrar que em 1807 Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831) publica A fenomenologia do Espírito, a primeira de uma série de obras revolucionárias – e comprometidas com a razão. Mas Hegel é o último pensador do Iluminismo. A burguesia, a partir daí, torna-se conservadora, chegando ao fim do século já irracionalista. As obras de Schopenhauer e Nietzsche são ramos desta nova seara onde floresce a desrazão. É o início da decadência burguesa na ciência. O pós-1848 é o chão da fragmentação do conhecimento em múltiplas ciências particulares: sociologia, antropologia, geografia etc. Neste chão surge
também a “eugenia”. Ao francês Joseph Arthur de Gobineau (1816-1882) cabe a honra de ter fundado o racismo como ciência. Por não ser trabalho individual – e sendo ainda trabalho com ideias –, os louros devem coroar também outras cabeças pensantes, como a de Sir Francis Galton (1822-1911), um inglês primo de Darwin que, após ler A origem das espécies (1859), concluiu: “os mais adaptados sobrevivem”. Mas ele estava na Inglaterra, em avançado estado de urbanização e industrialização. Aí o que mais prolifera são os “fracos”, a “ralé”, os “operários”. Nova conclusão: é preciso uma fórmula, uma ciência do ser humano belo e puro. É preciso controlar a população, os aleijados, as prostitutas, os delinquentes. Herbert Spencer (1820-1903), outro britânico leitor de Darwin, transplanta os nexos do pensamento darwiniano para a sociedade. Cesare Lombroso (1835-1909) publica L’uomo delinquente em 1876; e surge na Itália a frenologia – uma ciência muito particular. Segundo a frenologia, as saliências e depressões do crânio revelam a alma do indivíduo – em franca oposição ao pen-
samento de Hegel, para quem “o Espírito não se manifesta no osso”, mas na ação. Agora, a nova seara manda olhar para roupas, cabelo, jeito. A ênfase na superfície dos fenômenos – típica do naturalismo – terá ampla repercussão na intelectualidade, na ciência e na arte. A partir daí, “preto”, “pobre”, “operário”, “anarquista” são sinônimos de ‘bandido’ – seja em tratados científicos, seja na literatura. A eugenia é a expressão do movimento conservador. No bojo do imperialismo, fase em que o capital financeiro toma as rédeas do mundo, a eugenia chega também à América e, particularmente, ao Brasil. Raimundo Nina Rodrigues (1862-1906) desbravou os primeiros caminhos, escrevendo obras como As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil, Os africanos no Brasil e As coletividades anormais; foi o primeiro a sistematizar as religiões africanas, bem como lhes atribuir negatividade. Também aqui, alinham-se a esta concepção outros intelectuais, como Euclides da Cunha, Joaquim Nabuco, Sílvio Romero, Oliveira Viana e Monteiro Lobato, que publicou em 1926 seu único romance adulto: O presidente negro ou Choque das raças. Lobato é amigo íntimo de um destacado ideólogo do racismo, Renato Kehl – o precursor dos estudos de eugenia no Brasil. Kehl funda em 1918 a Sociedade Eugênica de São Paulo, instituição científica voltada para as leis da hereditariedade, descendência e “melhoria” da espécie humana; em 1923, publica pela editora do amigo A
cura da fealdade. Mais tarde, tendo a USP como depositária, tais pesquisas serão financiadas pela Fundação Rockefeller, cujas atividades caseiras não devem ter sido tímidas. Nos EUA, a eugenia tem seus primeiros e fortes lampejos também no século XIX. A miscigenação degrada o ser humano - eis a tese de Gobineau. Porém, um segundo momento da eugenia, no Brasil, será marcado pelas políticas de incentivo à miscigenação e à arianização do povo. “A nacionalidade brasileira só embranquecerá à custa de muito sabão de coco ariano”, diz Kehl em Lições de eugenia (1929). Desde fins do século XIX vinha crescendo o movimento de imigração, de tal modo que políticas de controle, como esterilização, vão se efetivar mesmo contra imigrantes. Todo um aparato de controle, prisão, internação e esterilização é posto em movimento. De um modo geral, à medida que avançam as leis para libertação dos escravos no Brasil, avança também o pensamento conservador. Ao contrário do que se poderia pensar, o pensamento racista surge justamente quando acaba o escravagismo. Vista desta perspectiva, a obra de Gilberto Freyre (1900-1987) põe outra proposta de mestiçagem, uma vez que não trilha a via da eugenia, mas do reconhecimento das contribuições históricas do branco e do negro para a constituição do Brasil. Ainda que replena de debilidades outras, Freyre representa um ponto de inflexão no interior do pensamento conservador.
por: Juarez Donizete Ambires
M
uitos são os vínculos entre Brasil e Cabo Verde. O fato de ambos haverem sido parte do império ultramarino português garante as principais ligações. Por isto, tal como aqui, o arquipélago é espaço fabricado e encontro promovido de povos. Nas ilhas, estão sangues diversos e uma natureza de inclemências, devido aos ventos do Saara. Por ser uma geografia desabitada quando da chegada portuguesa (1460), tornou-se espaço de povoamento, logo caracterizado pela mestiçagem até mesmo na língua. A historiografia das ilhas indica que, já no início do século XVI, o Crioulo existe e é língua de comunicação. Devido à mestiçagem física, entretanto, o arquipélago é, ao longo de sua história, uma gama de variações nas cores de pele de seus habitantes. Sua situação é, por isto, muito peculiar no universo africano e, ao mesmo tempo, muito parecida com a nossa. Em uma família cabo-verdiana, para exemplo, podem ser vários os matizes de tez e, devido à situação, mais uma vez nos irmanamos. Há, entre eles, negros, morenos de olhos claros, gente de pele clara com cabelos encrespados, todos mestiços nos muitos tons entre a matriz europeia e as matrizes africanas. Nas ilhas, estão o sangue africano de muitas e sucessivas etnias, o ibérico, o nórdico, o judaico, o árabe. O mundo cabo-verdiano, por conseguinte, não está marcado pelo preconceito racial. Se esta adversidade ali existiu, já foi há muito banida das
O mundo cabo-verdiano não está marcado pelo preconceito racial
práticas daquele cotidiano. A vivência diária dá conta do fato. A mestiçagem forjou o país, e o mulato lá continua, empenhado. Ele é quem resolveu e resolve os problemas cruciais de sua terra. A natureza adversa e semi-árida do arquipélago exigiu e exige a atitude. No passado, a ausência de uma gestão metropolitana atuante, conhecedora de sua colônia e com ela conivente levou a uma discreta autonomia, nem sempre a mais eficaz por falta de recursos. Promoveu também uma valorização das representações locais. Para a lógica da espaciali-
dade, já no período colonial o mulato é o herdeiro, é o funcionário administrativo, é o comerciante, é a identificação daquela sociedade. Ele também é o resultado do encontro entre mulatos e nada em contrário a isto. Quem teoriza o fato é o pensamento de Gabriel Mariano (José Gabriel Lopes da Silva – 1928 a 2002). Sua ligação à Claridade dá-lhe a acolhida intelectual necessária. O movimento, iniciado em 1936, fala em essências da terra, em independência política e convida à produção literária engajada e à reflexão sociológica de dissidência.
Para a empreitada, o ponto de partida é o Brasil. Nosso Modernismo dá a deixa literária e Gilberto Freyre, a sociológica. A reflexão de Gabriel Mariano, entretanto, é diálogo de oposição. Longe vai a acolhida positiva que, em todo o mundo africano de Língua Portuguesa, recebera Casa grande & senzala (1933). Do funco ao sobrado ou o mundo que o mulato criou (1959), de Mariano, é aberta contestação a pareceres de Freyre. No livro, a postura se insurge contra o endeusamento gilbertiano do português. Para Gabriel, os predicados de “criador de mundos” e “civilizador”, o português não os levara para Cabo Verde. Na extensão, o pensamento de Mariano se contrapõe aos conteúdos de O mundo que o português criou (1940) e de Aventura e rotina (1959). Nestes livros, o pensamento de Freyre alinhara-se à ideologia do estado salazarista. Fazia, por isto, uma apologia injustificada à ação portuguesa pelo mundo, segundo o parecer do escritor. Para Gabriel, Cabo Verde era mundo que o mulato criara. No arquipélago, o português pouco se dera, embora fosse e seja uma referência considerada positiva pelo povo da terra. A política metropolitana de interesse maior pelo Brasil e, depois, por Angola deixara as ilhas à deriva, governadas por si mesmas. Em Cabo Verde, quem sempre atuou foi a gente mestiça, falante de Crioulo e filha, segundo a tradição, mais do sol e do vento que do pai português.
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O mundo que o mulato criou
Pós-Graduação: Ciências Sociais Economia-mundo, Arte e Sociedade
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África na sala de aula. Da invisibilidade à estigmatização por: Deivison Nkosi
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e solicitarmos a um grupo qualquer de alunos do ensino médio que escrevam em tarjetas palavras que lhes vêm à cabeça quando pensam em África, veremos que a maioria fará referência a catástrofes de toda ordem, barbárie, doenças, primitivismo, escravidão, guerras, chacinas e conflitos tribais. Se repetirmos a mesma dinâmica com um grupo de professores do ensino médio, ou de qualquer outro nível de ensino, veremos que a situação se altera muito pouco; exceto por um possível esforço por parte de alguns, em mostrar o que se considera como os “as-
pectos positivos da África”: as cores, a alegria, a musicalidade, a ludicidade, a corporeidade. Do “senso comum” ao “politicamente correto”, da ofensa ao elogio, a África ainda é apresentada de acordo com os preceitos (e pré-conceitos) surgidos na Europa colonial do século XIX. Nos termos de Hegel, “O negro representa o homem natural em toda a sua barbárie e violência”. Esta forma de apreender a história, quando não “exclui”, invisibiliza completamente os negros e os africanos da noção de ser humano, os concebe de forma distorcida e estereotipada. Por outro lado, a abordagem da
A caminho da Universidade
história da África ou dos negros no Brasil, recortando apenas os aspectos negativos deste legado, contribui para a desumanização desta parcela da população e dificulta a apreensão correta da história do Brasil e do desenvolvimento do gênero humano. O problema que se coloca é o seguinte: Como os professores das redes pública e privada de ensino podem se preparar para suplantar estes estereótipos historicamente construídos? O que as universidades estão fazendo para corrigir estas distorções e oferecer reflexões e conteúdos que auxiliem os futuros professores a abordar, compreender e ensinar a verdadeira história dos africanos e dos negros no Brasil? A Lei 10.639/03 de 2003 altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Art. 1º da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996) estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história da África e da cultura negra no Brasil. A publicação da resolução nº 1, de 17 de junho de 2004 (Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana) apresenta as seguintes observações: “§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil. § 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística
e de Literatura e História Brasileira”. No entanto, quase dez anos após a promulgação desta legislação, os conteúdos supracitados ainda se encontram ausentes ou são precariamente abordados nas grades curriculares das Universidades e escolas do Brasil. A própria história da humanidade fica mal compreendida se não considerarmos o fato de que é no continente africano que surgem os primeiros Homo sapiens, e de lá se espalham para colonizar o globo terrestre. Desconhece-se que os africanos contribuíram ativamente para o desenvolvimento humano universal. Em outra dimensão, subestima-se o papel da ideologia do racismo na constituição da sociedade moderna, em especial a brasileira. Deixando-se, assim, de problematizar os interesses ocultos nesta estigmatização dos africanos e dos negros no Brasil. Ignora-se, ainda, a persistência do racismo em nossa sociedade, invisibilizando os seus efeitos devastadores no processo de ensino-aprendizagem e na formação geral de todos.
Para saber mais:
WALDMAN Maurício e SERRANO Carlos. Memória d’África. A temática africana em sala de aula. Cortez Editora, 2007. MUNANGA, Kabengele. Origens africanas do Brasil contemporâneo. São Paulo: Global, 2009. África: uma história rejeitada www.youtube.com/ watch?v=c1P884OBMIk Café com leite (água e azeite?) www.youtube.com/ watch?v=375sS13XAT0
Robert Kurz 1943-2012
O filósofo e sociólogo alemão Robert Kurz morreu no último dia 18 de julho, aos 68 anos -segundo sua viúva, em decorrência de complicações cirúrgicas após uma operação no pâncreas. Considerdo inovador da tradição marxista, Kurz, nascido em Nuremberg em 1943, participou da criação da revista e do grupo Krisis, em torno dos quais se desenvolveu a chamada Wertkritik (crítica do valor, em alemão). A Wertkritik é uma vertente teórica que se propõe a criticar a sociedade capitalista do ponto de vista da produção de mercadorias, usando como principal referencial o conceito de fetichismo da mercadoria tal como proposto por Karl Marx (1818-1883). No seu “Manifesto contra o Trabalho”, publicado em 1999, o grupo de Kurz contesta a tradicional noção marxista que põe a luta de classes como motor da história. Para o Krisis, a relação entre burguesia e proletariado não é uma luta entre revolucionários e opressores, mas entre dois interesses opostos e necessários ao capitalismo, como integrantes de um único “campo de trabalho”. Em 2004, o grupo sofreu uma cisão, com Kurz e outros integrantes se reagrupando em torno da revista “EXIT!”. O livro mais conhecido do filósofo no Brasil é “O Colapso da Modernização”, lançado em 1991 com prefácio do crítico Roberto Schwarz. Na obra, escrita após a queda do Muro de Berlim, Kurz vê na derrocada da URSS o fracasso de um regime imposto como forma de “modernização recuperadora” e prevê futuras crises no capitalismo. (Fonte:www1.folha.uol. com.br/fsp/mundo/57383-robert-kurz-autor-de-o-colapso-da-modernizacao-morre-aos-68.shtml)
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Arte e Cultura
Grupos artísticos promovem salão de artes na Fundação Santo André
O
Salão Coletivo de Artes Plásticas do ABCD é um projeto idealizado por grupos artísticos da região (Escola Livre de Ciências e Artes e Fórum de Hip Hop de São Bernardo do Campo apoiados pelo Colegiado de Ciências Sociais do CUFSA), com o objetivo de estimular o debate sobre a produção artística atual e impulsionar a interação entre artistas, diletantes e interessados no assunto. Durante o evento, foram levantados questionamentos sobre o papel da arte no terceiro milênio, a condição social de seus produtores e as implicações dos novos meios de reprodução, circulação e fruição de objetos artísticos. Fazendo frente aos interesses do mercado e suas constantes interferências, tanto no trabalho do artista quanto na padronização do público, as atividades apontaram para a necessidade da organização autônoma dos produtores de arte, pelo desenvolvimento e conquista de espaços coletivos alternativos que permitam uma perspectiva da arte para além de sua finalidade mercadológica. Complementando a exposição de mais de cinquenta obras de artistas e diletantes, durante um mês, foi realizado, entre os dias 4 e 6 de junho, um ciclo de palestras com professores e pesquisadores do assunto. Os professores Henri de Carvalho e Ana Cotrim trouxeram reflexões sobre a importância de uma produção artística que discuta as principais dinâmicas sociais de sua época e a função sempre premente à
Foram premiadas cinco obras escolhidas por meio de votação aberta
arte de educar os sentidos humanos. Foram premiadas cinco obras escolhidas por meio de votação aberta (descritiva e comentada), na qual artistas, público e críticos tiveram iguais direitos à voz e voto. Por tratar-se de atividade coletiva, autônoma e inteiramente gratuita, a premiação foi realizada com o Fundo de Arrecadação do Salão formado pelas contribuições dos interessados em estimular o evento. A exposição das obras (de 04 a 29 de junho) foi realizada no pátio da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Fundação Santo André, de acordo com a ideia que aponta a importância e a necessidade da abertura de espaços públicos para a realização de trabalhos culturais comprometidos com a sociedade e abertos à livre participação. Ideia que ainda não se vê inteiramente nas práticas da atual administração desse centro universitário.
Meses antes do salão, a administração fechou – sem aviso prévio – o espaço onde funcionava o diretório acadêmico da FAFIL e, desde
2008, um ateliê coletivo de pintura mantido pela Escola Livre de Ciências e Artes. São os dilemas enfrentados pelos que pretendem desen-
volver práticas que estimulem a produção e fruição de materiais culturais, contribuindo para a formação de indivíduos críticos – papel dos centros públicos de ensino. O trabalho sério e engajado continuará e com perspectivas de render bons frutos, enquanto outros interesses se dissiparão com o passar do tempo, sem deixar muitas saudades. Ainda na oportunidade do evento e de acordo com suas preocupações, realizou-se uma homenagem ao artista plástico brasileiro Mário Gruber, falecido neste ano de 2012 – um destacado pintor e gravurista comprometido com problemas sociais, autor de relevante trabalho de temática popular através de sofisticados recursos estéticos.
Conhecer e transformar o mundo Participe desse desafio! Faça Ciências Sociais na Fundação Santo André Teoria e prática, reflexão e ação, pesquisa e ensino Bacharelado e Licenciatura
Bolsas de estudo para alunos da Fundação Santo André: * Bolsa da Prefeitura de Santo André: em 2011, 500 bolsas no valor de R$ 200 cada. * Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID/CAPES: 310 bolsas, no valor de R$ 400 cada. * Iniciação Científica/FSA: 40 bolsas, no valor de R$ 263 cada. * Programa Institucional de Bolsa para Iniciação Científica- PIBIC/CNPq: 3 bolsas, no valor de R$ 360 cada. * Monitoria/FSA: 273 bolsas Monitoria, no valor de R$ 12,30/hora. * Programa de Extensão Científica Sabina – Escola Parque do Conhecimento: 162 bolsas, no valor de R$ 750,90 cada. * Projeto Formadores do Saber: 133 bolsas, no valor de R$ 750,90 cada.
Informações pelo telefone 4979-3333 ou no portal www.fsa.br
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A proposta desse trabalho é realizar uma análise do surgimento do Grupo Forja dentro do aparelho sindical, sua importância nas campanhas salariais empreendidas pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC representativo no plano institucional do operariado do ABC nos anos que vão
de 1979 a 1982, e finalmente compreender a influência desse trabalho no desenvolvimento da consciência da classe trabalhadora, a partir da produção artística do período, em especial os textos de criação coletiva: Pensão Liberdade (1979) e Pesadelo (1982).
Iniciação Científica
Entre os projetos em desenvolvimento neste ano, o CNPq contemplou com uma bolsa de estudos os trabalhos: A superação do modelo neoliberal no ideário de Emir Sader, de Alessandro R. Chaves, e O pré-64 e a esquerda sob a ótica de Caio Prado Jr. e Florestan Fernandes, de Renata Adriana de Sousa, ambos estudantes de Ciências Sociais da FSA. Confira os resumos:
O pré-64 e a esquerda Renata Adriana de Sousa
O projeto O pré-64 e a esquerda sob a ótica de Caio Prado jr. e Florestan Fernandes consiste em recuperar as análises de Caio Prado Jr. e Florestan Fernandes (foto) sobre o capitalismo brasileiro, as lutas do pré-64 e as posições da esquerda, identificando as convergências e divergências entre ambos, de forma a possibilitar uma apreensão mais profunda das questões levantadas por estes autores no que se refere a uma perspectiva socialista no Brasil.
Superação do modelo neoliberal Alessandro R. Chaves
Em A nova toupeira (2009), Emir Sader discute os governos que tomaram posse na América Latina em finais da década de 1990. Sua tese é a de que esses governos formaram um “conjunto híbrido de forças” que colocaram em prática alternativas ao até então hegemônico modelo neoliberal. Segundo Sader, o Brasil do governo Lula seria um dos países que estaria avançando em direção à superação do modelo neoliberal. A pesquisa de iniciação cientifica irá focar os argumentos do autor que apontam nessa direção, destacando o neoliberalismo como resposta à crise de superprodução da década de 1970, ou seja, como uma nova ofensiva do capital. Somente assim poderemos identificar o que é de fato o neoliberalismo e investigar a proposta de sua superação pela atual configuração política do continente anunciada por Sader.
qual o trabalhador imagina-se livre, na prática, as correntes que o prendem são tão coercitivas quanto nos períodos anteriores à modernidade do capital. É o que ocorre com os imigrantes bolivianos em São Paulo. Um aparato estabelecido na cadeia produtiva da confecção oprime e explora com requintes de escravidão e submete os trabalhadores das pequenas confecções de costura ao ritmo da máquina.
Fonografia Binária: indivíduo, reprodução técnica e indústria cultural Eduardo Zambetti
Confrontando o cenário musical das grandes corporações fonográficas com o circuito da chamada música alternativa, vemos que se delineiam, frente às mudanças de formatos (analógico para digital), alguns paralelos entre produção (formas poéticas e seus conteúdos), dinâmica social (de onde vem e para onde vão estas mudanças) e a reação de perplexidade dos indivíduos diante de tais tecnologias.
No presente texto, estes paralelos aparecem a partir da utilização crítica de material “jornalístico” veiculado pela Folha de São Paulo (período 1980-2010), desdobrada na teorização dos conceitos de reprodução técnica e indústria cultural desenvolvidos por Walter Benjamin e Theodor Adorno, os quais, aliás, mostraram-se bem aplicáveis ao mundo contemporâneo, ainda que exigindo ajustes.
Leituras críticas da teoria de Jürgen Habermas Renilda Oliveira de Almeida
Em virtude das mudanças operadas nas estruturas do mundo contemporâneo, em razão da dupla crise de âmbito global: a crise mundial do capitalismo e a do “socialismo real”, alguns temas se destacaram no debate atual, entre eles a ideia de fim do marxismo, fim do trabalho e a necessidade de uma reavaliação do conceito de revolução ou emancipação humana. Jürgen Habermas, sob a influência do estruturalismo francês e, dialogando com todos os clássicos, rejeita a ideia da dominação totalitária da razão instrumental e defende a possibilidade de emancipação; em contrapo-
sição à ideia de post historie, ele aponta para aceleração das mudanças no mundo contemporâneo e a afinidade dessas com os ideais da modernidade. Habermas propõe a mudança da sociedade tendo como paradigma a “ação comunicativa”, assentado numa racionalidade que é essencialmente comunicativa. O presente trabalho visa demonstrar que, uma vez que tudo depende de um “consenso pragmático” sobre a verdade dos fatos e processos reais contraditórios, tal discurso anti-ideológico serve apenas como mais uma ideologia legitimadora do sistema.
Juliana Sassi
As transformações sofridas no capitalismo pós Segunda Guerra Mundial levaram a uma série de reinterpretações quanto ao papel do mercado e do estado, imputando ao segundo um novo conteúdo: o estado não seria mais um mero instrumento de coerção, mas de coesão social. É neste cenário que Francisco de Oliveira vai identificar o nascedouro de um fundo público estatal que é tanto condição para a reprodução do capital como da força de trabalho, e que atuaria no sentido de livrar um e outro da determinação da forma mercadoria, abrindo novas perspectivas para a sociabilidade em geral. Nesse sentido, objetivamos confrontar os conceitos forjados por Oliveira com as categorias marxianas às quais se refere, tal como valor, mercadoria e fetiche, e demonstrar a origem dos recursos do fundo público, desmistificando a neutralidade do conceito de antivalor. Fundação Santo André, prédio da Fafil (Av. Príncipe de Galles, 821)
Eduardo Salles Ulian
A busca por trabalho para bolivianos no Brasil tem gerado sérias consequências para a condição humana desses imigrantes. Quando se menciona exploração do trabalho, é importante lembrar que acima de tudo o sistema de produção capitalista retira do trabalhador as reais condições de sua existência, em que o trabalho passa ser essencial para reprodução do próprio capital apenas. No modo de produção vigente no
(leia nesta edição artigo na p. 4) Atividade aberta e gratuita
Teatro operário: Grupo Forja – um estudo a partir dos textos Pensão Liberdade (1979) e Pesadelo (1982)
Fernando Soares da Silva
Crítica à Teoria do Antivalor de Francisco de Oliveira
“Agronegócio” e luta de classes
No primeiro semestre deste ano, foram defendidas cinco monografias no curso de Especialização em Ciências Sociais: Economia-mundo, Arte e Sociedade
Precarização do trabalho: imigrantes bolivianos
15 e 22 de setembro, das 9h às 12h
Monografias
Atividades Acadêmicas Científicas e Culturais (AACC)
Vida Acadêmica
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