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A SUSTENTABILIDADE É UM NOVO MANTRA?
PEDRO NORTON DE MATOS,
FUNDADOR DO GREEN FESTIVAL FOUNDER OF THE GREEN FESTIVAL
IS SUSTAINABILITY A NEW MANTRA?
Otema da Sustentabilidade entrou finalmente no ‘mainstream’ e deixa de ser um tema marginal reservado aos amantes de “borboletas e passarinhos”... No tempo que esta revista de referência tem (muitos parabéns!) muito se evoluiu no aprofundamento desta temática, embora exista ainda um grande ‘deficit’ de literacia neste domínio. Os “novos-cristãos” da sustentabilidade são bem-vindos e oxalá continuem a crescer, desde que não mantenham as práticas das anteriores crenças, quando estão fora do escrutínio público. A aceleração das alterações climáticas, o flagelo do plástico de uma só utilização e, mais recentemente, a crise sanitária global, entre outros factores, ajudaram a colocar o tema na linha da frente e aceleraram o sentido de urgência de mudança de rumo. Persistem ainda dificuldades em definir um conceito que é algo difuso e difícil de comunicar, mas vai-se conciliando a ideia que o termo tem como referência os três pilares: Ambiental, Social e Económico, bem como a responsabilidade e compromisso intergeracionais, relacionada com a herança que recebemos e o legado que deixamos. Os factores prazo e solidariedade entram claramente nesta equação. No conceito de sustentabilidade é realçada a interdependência entre os três pilares e é associado um modelo de desenvolvimento (eu prefiro o termo prosperidade ) que urge implementar transversalmente, substituído o vigente. Com efeito, o modelo adoptado no mundo ocidental, sobretudo a partir da década de 50 do século XX, no pós Segunda Guerra The theme of sustainability has finally entered into the mainstream and is no longer a marginal theme reserved for lovers of “butterflies and birds”... In the timespan of this leading publication (and many congratulations!), there has been a great evolution and deepening of this theme even while there still remains a major deficit in the level of literacy around the subject. The “rice Christians” of sustainability are very welcome and shall hopefully continue to grow in number just so long as they do not maintain the practices of their former beliefs when out of the public spotlight. The acceleration in climate change, the curse of single-use plastics and, more recently, the global health crisis, among other factors, helped raise this theme up to its place on the frontline and drove the sense of urgency around a change in direction. There still remain difficulties in defining a concept that is inherently somewhat diffuse and difficult to communicate but there is gradual acceptance of the terms as referring to three pillars, environmental, social and economic, as well as responsibility and commitment to future generations related with the heritage we receive and the legacy that we leave behind. The factors of time and solidarity clearly enter into this equation. The concept of sustainability highlights the interdependence between the three pillars and is associated with a model of development (I prefer the term prosperity) that requires transversal implementation in replacement of that currently in effect. In effect, the model adopted in the western world, especially from the 1950s onwards in the post-World War Two reality,
Mundial, tem-se baseado numa economia linear “Take-MakeWaste” levando a profundas assimetrias em cada um dos pilares e a significativos desperdícios de meios e recursos. É inegável também constatar e justo realçar, que no mesmo período de tempo foram enormes os progressos em diferentes domínios, como é o caso da saúde, educação e ciência, entre outros. Contudo, persiste o tema da ineficiência do modelo e o consequente grande desperdício gerado, que perniciosamente foi entrando nos hábitos e na cultura do “desenvolvimento”. Em Portugal, desperdiçamos água potável (média de 1/3 nas cidades), alimentos (da sementeira ao descarte) e energia. Também o potencial humano nas organizações e na cidadania está muito subaproveitado, com reflexo directo em muitos indicadores preocupantes. Há 20 anos que temos uma economia estagnada, subsídio dependente e com baixos níveis de produtividade. Vamos descendo paulatinamente no ‘ranking’ dos países europeus. O lado positivo é que temos um enorme potencial de melhoria e a oportunidade singular de mudar de estratégia e táctica! Com a consolidação das práticas de sustentabilidade, emerge o modelo da economia circular e regenerativa. Por oposição à economia linear, a economia circular inspira-se na natureza em que segundo Lavoisier “Nada se perde e tudo se transforma”, conceito que aplicado ao modelo de prosperidade, significa o objectivo do zero desperdício. Utopia? Diria que não, até porque os nossos avós e bisavós, antes da sociedade do hiperconsumo, tinham esses comportamentos integrados no seu quotidiano. Agora, por maioria de razão, temos a obrigação da fazer essa transição, pois temos mais informação, mais conhecimento científico e melhor tecnologia. No fundo temos tudo o que é necessário para compatibilizar progresso com racionalidade e demonstrar que somos de facto o animal racional mais inteligente do planeta. Aliás, não basta auto proclamar-nos mais inteligentes, demonstrando uma certa arrogância e desprezo pela natureza que é um laboratório vivo com cerca de 4 mil milhões de anos. É altura de, humildemente, deixar a visão antropocêntrica e aprender com as leis e ritmos da natureza, incorporando no nosso modelo societário os seus “tempos” e sabedoria. A bio-mimética é um excelente referencial e deverá ser aprofundada. O planeta está a “rebentar pelas costuras”, pois os seus recursos finitos estão exauridos e sujeitos a grande pressão, nomeadamente pela crescente demografia mundial, com a previsão de passarmos de 7 para 10 mil milhões de pessoas em 2050. Acresce o ‘stock’ de lixo marinho (previsão de aumentar 4 vezes de 2016/2040) e a concentração de gases de efeito de estufa na atmosfera, pois o CO2 e outros gases permanecem milhares de anos... destruindo eco-sistemas e biodiversidade, fazendo perigar a vida no planeta. A manutenção do ‘business as usual’, mesmo que optimizada, é manifestamente uma não solução. As teses negacionistas, sempre enquadradas num espírito egoísta e de curto prazo na defesa do ‘status quo’, sucumbem aos factos científicos que são esmagadores. A correlação positiva entre indicadores sócio económicos e degradação do planeta, sobretudo a partir da grande aceleração dos anos 50 do século passado, was based on the “Take-Make-Waste” linear economy leading to profound asymmetries in each of the pillars and significant wastage in means and resources. This should also duly bear witness and highlight how, in the same period of time, there were enormous leaps of progress across different domains, such as the cases of healthcare, education and science among others. However, the inefficiency of the model remains a core theme and the consequent level of wastage generated and that has steadily and perniciously entered into the habits and culture of “development”. In Portugal , we waste drinking water (an average of 1/3 in cities), foodstuffs (from seeds to disposal) and energy. The human potential in organisations and in citizenship is also greatly underused with a direct reflection on many concerning indicators. For the last two decades, we have had a stagnated economy, subsidy dependent and with low levels of productivity. We are slowly but surely sliding down the ‘ranking’ of European countries. The positive side is that we have enormous potential to improve and a unique opportunity to change strategies and tactics! With the consolidation of sustainable practices, there emerges the model of the circular and regenerative economy. In opposition to the linear economy, the circular economy takes its inspiration from nature where, according to Lavoisier, “Nothing is lost and everything is transformed” with this concept applied to the model of prosperity encapsulating the objective of zero wastage. Utopia? I would not say so because our grandparents and greatgrandparents, prior to the society of hyper-consumption, had these behaviours integrated into their daily routines. Now, for every good reason, we have the obligation to make this transition as we have more information, more scientific knowledge and better technology. In summary, we have everything that is needed to render progress compatible with rationality and demonstrate that we are in fact the most intelligent rational animal on the planet. Indeed, it is not enough to proclaim ourselves the most intelligent, demonstrating a certain arrogance and disregard for nature that is a living laboratory with some four billion years of experience. It is time to humbly give up on the anthropocentric vision and learn from the rules and rhythms of nature, incorporating such “timings” and wisdom into our social models. Bio-mimetics is an excellent framework of reference and requires deepening. The planet is “bursting at the seams” as its finite resources reach exhaustion and subject to great pressure, especially due to the rising global demographics with the forecast that we move from 7 billion to 10 billion people in 2050. This comes with the additions to the ‘stock’ of marine garbage (forecast to rise four times over between 2016/2040) and the concentration of greenhouse gas emissions in the atmosphere, such as CO2 and the other pollutants that remain for thousands of years... destroying ecosystem biodiversity and placing life on the planet at risk. The maintenance of ‘business as usual’, even when optimised, is clearly not the solution. The negationist theses, always framed within an egoistic spirit and short term defence of the ‘status quo’, can only succumb to the scientific facts that are overwhelming. The positive correlation between socioeconomic indicators and planetary degradation, especially after the major acceleration that took place in the 1950s, is so clear that there remains no alternative to placing our “grey matter” in the service of this
é de tal modo evidente que não nos resta alternativa senão colocar a nossa “massa cinzenta” ao serviço deste grande desafio civilizacional. Urgem mudanças radicais. A esperança reside na investigação cientifica e na aplicação de novas tecnologias ao serviço da sustentabilidade. Reside também na educação das novas gerações (ou são elas que educam os mais velhos?) que ao repetirem comportamentos saudáveis, interiorizam hábitos que reforçam os valores da sustentabilidade e os perpetuam. As novas gerações estão a revolucionar muitas das formas de consumo e usufruto de bens e serviços, obrigando a um redesenho da oferta. Boas notícias. Outro dos factores que permite ter algum optimismo, é a constatação que o pilar económico tem vindo a colorir-se de verde e azul, ou seja, a Economia verde e azul são já realidade, e os mecanismos de financiar a transição para a descarbonização e para a economia circular estão em curso. “Green and Blue Bonds” já fazem parte do novo léxico e alguns grandes fundos de investimento adoptam critérios rigorosos que confirmam tendência de um novo rumo. Como dizia um assessor de Clinton, tudo passa pela economia e a frase “Its the Economy, stupid” celebrizou-se... Com a criação de postos de trabalho e com o valor transferido para a sociedade, poderá impor-se um novo modelo de prosperidade que integre o respeito pela Mãe Natureza e seus limites. É neste contexto que o tão propalado “New Green Digital Deal”, constitui uma grande oportunidade desta década. Saberemos aproveitar? Na dimensão das empresas e muito por pressão de novas gerações de consumidores e cidadãos em geral, a filosofia do “triple bottom line” vai-se consolidando. Trata-se de uma tendência imparável e as empresas jogam a sua reputação e sucesso a prazo, no triângulo interdependente: Economia, Responsabilidade Social e Pegada Ecológica. O “bottom line” económico-financeiro é uma condição necessária, mas deixa de ser suficiente para garantir o êxito a prazo. Substituiremos o tradicional relatório e contas das empresas, por um relatório global que integre as contas e os impactos social e ambiental da actividade. As empresas têm uma grande responsabilidade e capital importância na transição para o modelo circular e regenerativo, pois podem multiplicar na sua cadeia de valor os efeitos benéficos. Necessitamos sim é de mais líderes que sejam inspiradores e verdadeiros “agentes de mudança”! A dinâmica da mudança é alimentada nos dois sentidos. Dos consumidores e cidadãos para as empresas/instituições/marcas e no sentido inverso das empresas líderes e inovadoras para o mercado. Neste movimento circular é importante que os consumidores e cidadãos se consciencializem do poder do seu voto, seja nas urnas ou nas decisões de compra de um produto ou serviço. Cada uma dessas opções tem um enorme impacto. As empresas/marcas com os seus sofisticados meios digitais, percebem as tendências reveladas pelo “big data”, algoritmos e inteligência artificial, e percebem a mensagem. O que é preciso é enviar sinais claros...no mercado e na política. l great civilisational challenge. This urges radical change. Hope resides in scientific research and the application of new technologies in the service of sustainability. This also involves the education of the younger generations (or should they be educating the older generations?) who, in repeating healthy behaviours, internalise habits that strengthen and perpetuate the values of sustainability. The new generations are greatly revolutionising the forms of consultation and the benefits of goods and services driving the redesign of supply. Good news. Another of the factors that underpin a certain degree of optimism is the observation that the economic pillar has now been coloured both green and blue; thus, the green and blue economies are now already a reality and the mechanisms for financing the transition to decarbonisation and the circular economy are now ongoing. “Green and Blue Bonds” are already part of the new lexicon and some of the major investment funds have adopted rigorous criteria that confirm this tendency to head off in a new direction. As an advisor to Clinton once stated, it all happens in the economy and with the sentence “It’s the economy, stupid” thus going mainstream... With the creation of posts of employment and with the value transferred to society, we may be able to advance with a new model of prosperity that integrates respect for Mother Nature and its respective limits. It is in this context that there is the greatly heralded “New Green Digital Deal” that constitutes such a great opportunity for this decade. Shall we know how to leverage it? In terms of the private sector, and greatly due to the pressures of new generations of consumers and citizens in general, the philosophy of the “triple bottom line” is gaining ground. This represents an unstoppable trend with companies balancing their reputations and sustained success on the interdependent triangle of the Economy, Social Responsibility and the Ecological Footprint. The economic-financial “bottom line” is a necessary condition but no longer sufficient in itself to guarantee success over the course of time. We are replacing traditional annual company reports and accounts with global reports that integrate the accounts and the social and environment impacts of company activities. Companies hold a great deal of responsibility and capital importance in the transition to the circular and regenerative model as they multiply the value of the beneficial effects along the lengths of their chains of value. We do very much need more leaders who are inspirational and true “agents of change”! The dynamics of change are being fed in two directions. From consumers and citizens to the companies / institutions /brands and in the inverse sense from leading companies and innovators to the market. In this circular movement, it is highly important that consumers and citizens are aware of the power of their vote; whether in the ballot boxes or in their decisions when buying products and services. Each of these options has an enormous impact. The companies /brands, with their sophisticated digital means, understand the trends revealed by big data, their algorithms and artificial intelligence, understand the message. What is necessary is to send out clear signals… both in the market and in politics. l