Cidade submersa
De uma cidade, não aproveitamos suas sete ou setenta maravilhas, mas as respostas que dá às nossas perguntas. Italo Calvino, Cidades invisíveis.
presidente da república
curadoria
som e vídeo
Luiz Inácio Lula da Silva
Daniela Name
Terceriza Som Áudio Visual
ministro de estado da fazenda
realização
Guido Mantega
Tisara Arte Produções
iluminação
nonononononono
Uma cidade é feita de cidades sobrepostas. Há muitos mapas invisíveis nos bairros e regiões de uma metrópole. Eles revelam as diversas camadas de tempo que aquela cidade viveu, costuradas pela memória individual ou coletiva dos moradores daquele lugar. Para construir esta exposição, nosso ponto de partida foi o livro Cidades invisíveis, de Italo Calvino, em que o viajante Marco Polo descreve para o imperador Kublai Khan os lugares por onde passou. Depois de narrar cidades muito distintas – elas têm personalidade e nomes femininos e podem ser sonhadoras, destrutivas, tímidas, arrebatadoras –, o navegador italiano chega à conclusão de que esteve falando o tempo inteiro de Veneza, seu berço e ponto de partida. Esta exposição quer dar à experiência urbana a dimensão que ela merece como semente do processo de criação artística. A cidade e a arte sempre caminharam juntas. A própria ideia de cidade – e de cada cidade, especificamente – foi pensada pelos artistas. Foi assim com a Florença Renascentista, cuja construção não pode ser dissociada dos grandes artistas e arquitetos do período; com o Império Turco Otomano, quando tapetes e gravuras sobrevoavam uma Istambul próspera e criativa mostrando-a como se estivesse sendo vista pelos olhos de Alá; com a São Paulo de 1922, redimensionada para todo o Brasil com a antropofagia de Oswald de Andrade; com o Rio Modernista dos anos 1950, traçado por arquitetos como Lúcio Costa, Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy, mas também pelos artistas construtivos e pela bossa nova. Para realizar estes Mapas invisíveis, convidamos 11 artistas e um coletivo que têm sua história profissional marcada pelo Rio de Janeiro. Eles se debruçaram sobre lugares da cidade que passaram por intensa transformação urbana, caso da Avenida Rio Branco, do Aterro do Flamengo, das comunidades da Maré e da Península, na Barra da Tijuca; que são encruzilhadas de grupos heterogêneos, como a região conhecida como Saara ou o bairro de Copacabana; ou que têm muitas camadas de histórias sobrepostas, caso de Madureira, Botafogo, a Região Portuária ou São Cristóvão, regiões que assumiram inúmeros papéis ao longo dos anos. Há ainda lugares marcados por iniciativas ou grupos sociais específicos, como a Floresta da Tijuca, sonho transformado em realidade por dom Pedro II, e Realengo, na Zona Oeste, onde reinam o imaginário e a simbologia dos militares. Nosso desafio foi criar trabalhos que não anulassem a trajetória dos artistas e também não fossem uma mera ilustração das regiões da cidade. Com suportes e propósitos diversos e confrontados com a malha urbana que abriga todos os cariocas, eles mostram como o Rio de Janeiro foi desde sempre uma cidade-projeto, que teve na cultura um de seus principais motores. De sua origem até hoje, os cariocas por adoção ou por nascimento têm na capacidade de reinvenção seu maior trunfo para todas as crises. “O Rio é uma cidade de cidades misturadas”, nos ensina Fernanda Abreu. Os Mapas invisíveis são um mergulho nesta “cidade submersa”, personagem de Paulinho da Viola e Chico Buarque em outras lindas canções. Enfrentar este caldo fervente é encontrar às vezes bálsamo, às vezes purgante. Mas sempre alimento. Daniela Name curadora
presidenta da caixa econômica federal
coordenação geral
Maria Fernanda Ramos Coelho
Mauro Saraiva
apresenta
Angelo Venosa
montagem
Jorge Pinheiro produção executiva
Heloisa Vallone
Alexandre Vogler
Anna Bella Geiger
cenografia
H. O Silva projeto gráfico
Verbo Arte e Design Fernando Leite Julia Sampaio
administração
Antonio Goes Loane Malheiros
Daniel Senise Daisy Xavier Luiz Alphonsus
22 de novembro de 2010 a 5 de janeiro de 2011 Terça a sábado, das 10h às 22h Domingo das 10h às 21 h CAIXA Cultural Rio de Janeiro – Galeria 1 Avenida Almirante Barroso, 25 Centro Rio de Janeiro – Cep 20031-003 Tel: (21) 2544-4080 / 2544-7666
Luiza Baldan Opavivará
caixacultural.rj@caixa.gov.br www.caixa.gov.br / caixacultural
Paulo Vivacqua
programa educativo
Tel: (21) 2544-4080 Entrada franca
Rosângela Rennó l i v re p a ra to d o s o s p ú b l i co s
Suzana Queiroga produção
patrocínio
Thiago Rocha Pitta
Alexandre Vogler se debruçou sobre Realengo. O artista criou uma série de aquarelas e uma maquete, que se referem
Daniel Senise fez
Rosângela Rennó
seu mapa invisível a partir de
seu mapa a partir da região conhe-
Botafogo, precisamen-
Saara. A artista re-
Suzana Queiroga esco-
alizou uma ação em que dividiu a
lheu se confrontar com o universo
Avenida Senhor dos Passos em sete
do
cida como
te a partir do Cemitério São
criou
à memória militar deste importante bairro
João Batista. Ele recolheu as
Luiza Baldan ficou com a Barra da Tijuca. Bairro
da Zona Oeste carioca e se relacionam com
folhas que caíam das árvores
planejado pelo arquiteto modernista Lúcio Costa, nunca teve seu
áreas. Em cada uma delas, colocou
reunião de 16 comunidades que
o modernismo e o futurismo. Antigo ponto
da área interna do cemitério
plano-piloto plenamente realizado, mas se expande cada dia mais
dois turíbulos feitos a partir de re-
formam o maior grupo de fave-
de parada para as viagens de dom Pedro I,
e realizou com elas um site
para as regiões de pântano que tomam conta da chamada Zona
sinas essenciais, formando assim
las do Rio de Janeiro. Apresenta
Oeste. Luiza morou durante um mês em um apartamento na re-
das de Copacabana, apresentando
14 pontos, correspondentes aos
dois trabalhos: um vídeo em que
gião de condomínios da Península, e desmitifica o bairro em um
passos da Paixão de Cristo, pas-
transforma as subidas e descidas
sagem do Evangelho que dá nome
das marés em espelho da pintura
à rua. Rosângela voltou a unir ca-
e uma grande instalação feita em
Realengo é um bairro marcado pela Escola do
specific na galeria. Bairro dos
Exército e por uma fábrica de pólvora. A Pra-
comerciantes endinheirados
Daisy Xavier mergulha nas on-
Complexo da Maré,
ça do Canhão é o principal ponto de referên-
no fim do século XIX e início
dois trabalhos para a exposição. Em uma
vídeo editado em três telas distintas, em que grava uma ilha no
cia do bairro, que tem sua memória coletiva
do século XX , Botafogo foi
série de fotos, funde a ideia dessa imen-
meio da lagoa que banha o grupo de prédios.
vinculada à iconografia bélica e do Exército.
ficando cada vez mais de-
sa rede heterogênea formada pelo bairro
tólicos, árabes, judeus, coreanos e
parceria com crianças inscritas nas
gradado depois das reformas
com as redes trançadas pelos pescadores
umbandistas da Saara através do
aulas de arte do Projeto Redes, que
que demoliram o Palácio do
da colônia do Posto 6. Apresenta ainda um
incenso, que em todas as culturas
funciona na Maré. Estimuladas por
Mourisco e abriram o túnel
vídeo gravado da cestinha de sua bicicleta,
tem a mesma função: fazer a liga-
Suzana, elas traçaram seus mapas
para Copacabana. O cemi-
ção entre o céu e a terra, religare,
dentro da comunidade. Esses ca-
tério é um espelho para um
em que registrou o gigantesco paredão de
Opavivará pesquisou Madureira, na Zona Norte do Rio,
Paulo Vivacqua ficou com São Cristóvão, ,
prédios da Avenida Atlântica de um ângulo
que representa uma das regiões mais ri-
bairro que pulsa História. Foi
princípio básico da religião. Uma
minhos sobrepostos, desenhados
sede dos engenhos dos jesuí-
mesa com os mesmos incensos
no ateliê da artista, formam uma
está na Caixa.
grande rede suspensa.
O grupo
Angelo Venosa explorou a Floresta da Tijuca. A
Anna Bella Geiger ficou com a Região Portuária, ,
maior área verde urbana do mundo
um dos berços do Rio como cidade.
lugar de passagem, que virou
completamente inusitado, em um passeio
cas culturalmente da cidade. Berço de
não existia até que dom Pedro II,
Local: Zona Portuária com águas do
bairro-fantasma, mas hoje
realizado ao longo de toda a orla, do Forte
escolas de samba tradicionais – Portela
tas; abrigou dom João VI e sua
preocupado com o abastecimento de
mar une uma imensa gravura de
de Copacabana até o Leme.
e Império Serrano –, também abrigou
Corte na chegada ao Brasil; e
água do Rio, mandou que os escravos
cinco metros e um vídeo para falar
antigos quilombolas e preservou a dan-
passou por sucessivas refor-
a plantassem. Venosa tira partido do
do porto como começo e recomeço,
ça e o ritmo do jongo. O trabalho do
mas urbanas, como a cons-
plano mental envolvido na história
como criação. A artista partiu do
trução da Linha Vermelha.
do lugar para criar uma obra que
texto bíblico em hebraico, que ain-
gráfico no Mercadão de Madureira.
Vivacqua criou um trabalho
precisa contar com a participação do
da não sintetiza a palavra “oceano”
As imagens feitas no lugar serão impres-
sonoro batizado de Mosaico,
espectador. Ouve-se o som da flo-
e usa “águas do mar” para definir
Luiz Alphonsus apresenta um trabalho híbrido, misto de fotografia e instalação, sobre o Aterro do Flamengo. Obra que fundou a era moderna do
Opavivará consistiu em um ensaio foto-
sas em bolos confeitados e oferecidas
em que inúmeros alto-falan-
resta misturado a uma narração de
águas salgadas. Mesclando ima-
urbanismo carioca, o Aterro nasceu sob o signo da po-
ao público na inauguração da exposição
tes fazem um mapa auditivo,
poemas românticos alemães. A gra-
gens de origens diversas, sobrepõe
lêmica, especialmente por afastar o mar dos prédios
e em dias específicos pré-agendados
afetivo e histórico de lugares
vação se relaciona com uma peça de
visões reais e inventadas de regiões
à beira da Glória e da Lapa (a Avenida Beira-Mar não
pela produção.
como a Feira Nordestina de
Venosa, para onde nosso olhar con-
de baía em várias partes do mun-
tem este nome à toa, afinal). Luiz Alphonsus inter-
São Cristóvão e a Quinta da
verge. Aqui, a ideia é de imaterialida-
do – como a que mostra a de San
rompeu a paisagem da região com uma imensa faixa
Boa Vista. Os sons de cada lu-
de, numa aparente contradição com
Francisco sendo invadida por discos
branca e fez uma foto da intervenção. Na galeria, a
gar são mesclados com depoi-
a exuberância tropical da mata.
voadores.
faixa se prolonga para o espaço expositivo, gerando
mentos dos moradores sobre
uma estranheza no percurso dos visitantes.
São Cristóvão ontem e hoje.
passa por revitalização.
Thiago Rocha Pitta criou um trabalho sobre a Avenida Rio Branco. Antiga Avenida Central, que inaugurou o século XX com a reforma urbana empreendida pelo prefeito Pereira Passos, expulsando do Centro para os morros cariocas a população mais pobre. Por outro lado, foi um vetor de integração de toda a região, rasgando-a da Praça Mauá até a Cinelândia. Rocha Pitta apresenta três aquarelas para um projeto de jardim suspenso para a avenida. Babilônia carioca em seu tempo, a Rio Branco ganha aqui uma aproximação lírica de sua história.