A formação do capitalismo nas terras africanas Implantação forçada do progresso e da liberdade, igualdade e fraternidade
¹David Bruno Narcizo Resumo: nas palavras subseqüentes encontram-se o resultado de um pequeno estudo sobre o capítulo “A soberania das empresas na origem do Capitalismo Moderno” do livro “Democracia Totalitária: Teoria e prática da empresa soberana” de João Bernardo onde o presente texto espera apresentar, mesmo que de forma ainda simplista, uma gradação das mudanças na estrutura econômica que transforma as instituições que forçam a transformação da mentalidade dos trabalhadores, tornando-os receptivos às relações econômicas implantadas pela classe dominante de forma totalitária. O presente estudo procura apresentar essa transformação, que deu-se de forma gradativa na Europa, porém, de forma forçada e acelerada na África.
¹David Bruno Narcizo – Graduando em História pelo Centro Universitário Central Paulista. Técnico Ator e Professor de História na Rede Pública de Educação Básica.
Introdução: O final do feudalismo europeu deixara uma lacuna na estrutura que precisava de séculos para se estruturar e formar-se, na estrutura, o que chamamos de capitalismo. O feudalismo foi, para a estrutura, um período de formação das condições básicas para acontecer o que no século XVII denominaram de Revolução Industrial, nome este dado pelo ingleses para que, pode-se dizer, não ficassem atrás das transformações que na França denominaram de Revolução Francesa. Então, o que chamamos de Revolução Industrial, não foi, se não um processo de transformação da estrutura para que se formasse o capitalismo propriamente dito, nomeado forçosamente pelos ingleses como “A Revolução”. A transição do feudalismo para o capitalismo foi um processo de transformação da estrutura que provocou uma série de mudanças na super-estrutura que transformou a mentalidade da classe trabalhadora, sem a qual não poderia acontecer de fato o que podemos chamar no presente texto de “A Revolução Capitalista”. A Revolução Capitalista necessitou de mecanismos criados durante aproximadamente três séculos na Europa, mecanismos estes que provocaram um processo de cercamento e enquadramento da classe trabalhadora que passara da condição de servos e escravos para trabalhadores livres e assalariados. Os trabalhadores não deixaram a antiga relação de trabalho feudo – vassalica – servil do feudalismo naturalmente, primeiro necessitou da expropriação forçada da classe trabalhadora do principal meio de produção, a terra, que resultou num êxodo rural necessário para sua subsistência tornando dessa forma as cidades abarrotadas de trabalhadores que formara assim, um exercito operário pronto para ser apropriado pelas empresas, ou corporações de oficio ou guildas. Assim, o acumulo de mão-de-obra permitia o pagamento de pequenos salários o que permitia a acumulação de fato, pelos capitalistas burgueses da época. A classe trabalhadora e livre nos primórdios da acumulação capitalista, como apresentado anteriormente, lutou contra o novo sistema, porém, os mecanismos de enquadramento que o Estado dispensara, fez desse exercito
revoltoso, meras forças de trabalho, mecanismos estes: necessidade econômica, obrigatoriedade de suprir o Estado e repressão armada. Todas as ações do Estado e da Burguesia Pré Capitalista se justificava pela esperança de desenvolvimento econômico e progresso, além de, na super estrutura, nascer e disseminar a mentalidade de que o capitalismo propiciaria a igualdade entre os homens, o que, no transcorrer da história, não aconteceu. Não se pode em nosso século dizer que tudo o que fora formado durante esses longos séculos foi uma arquitetura previamente montada e executada durante os séculos XIV ao XVIII, mas uma sucessão de transformações na estrutura econômica que, naturalmente fizera necessário a transformação na super estrutura e, por conseguinte, na mentalidade trabalhadora e burguesa. Na estrutura, acontecera a mudança do trabalho servil para o trabalho assalariado em função da necessidade burguesa de acumulação que a divisão do trabalho e utilização de maquinas no processo de trabalho propiciou. Nessa busca, a utilização de novas forças produtivas atreladas a mão-de-obra assalariada que alavancava a produtividade, que alavancava a acumulação justificava os meios em que se dava tal acumulação. Na super estruturam criavam novas instituições. No feudalismo, a relação feudo – vassálica não propiciava a acumulação sendo a economia para a subsistência tendo como principal instituição a Igreja e as Escolas que por ela eram administradas. Na transição, a mudança na economia com a formação dos feudos/cidades e a mudança na produtividade tendo as guildas como centro de produção e o burgo como centro comercial, mudou-se a mentalidade religiosa que acarretou na Reforma Protestante dando mais liberdade ao ser humano quanto ao destino de sua vida. Com a formação das cidades nasce um mecanismo de desligamento do camponês a terra sendo esta, a cidade, uma esperança de liberdade. Outra mudança importante foi a criação do Estado Nacional e a adoção do direito romano que regulamentava a propriedade privada da terra formando dessa forma, uma justificativa da tomada das terras pela nobreza e burguesia,
que num primeiro momento supria a necessidade de toda a sociedade e agora, tinha como fim principal, suprir a necessidade do proprietário da terra. A formação do Estado seguiu-se da transformação da nobre cavalaria em exército nacional. A cavalaria no sistema feudal era financiada pela produtividade do feudo recebido das mãos do suserano, porém, agora era financiada pelo Estado, proletarizando, dessa forma, a segurança que proporcionaria mais lealdade do cavaleiro quanto aos benefícios necessários ao Estado e à Burguesia. É fato que esse processo deu-se lentamente, tempo necessário para a firmação da nobreza no processo de formação capitalista e consolidação da burguesia capitalista, porém, transportou os camponeses para uma relação de trabalho mais insegura, esses não aceitando de livre vontade espontânea, necessitava de uma mudança forçada na mentalidade que o foi realizada belissimamente pelas novas instituições. Essas mudanças na estrutura e na super estrutura criou com o tempo a classe trabalhadora submissa e enquadrada no modo de produção capitalista no século XVII da Revolução Industrial e Francesa. Brigava por seus direitos, mas atacaram e ajudaram os atores históricos errados, sendo eles mesmos, os trabalhadores, os proprietários da sua própria libertação.
O capitalismo primitivo fez da América o seu celeiro e da África sua força produtiva As grandes navegações permitiram à Europa começar a sua empreitada de industrialização. Ela tinha relações comerciais com a Índia, Ásia, América, China e África que supria suas fábricas primitivas sem levar em questão as relações de trabalho que se dava nessas localidades, tendo como necessidade somente a liberdade de comércio entre os continentes. Essas relações mercantis sustentavam o capitalismo europeu. Porém, com o tempo, o processo da produção abarrotou a Europa de produtos fazendo-se necessário a comercialização dos mesmos em maior escala e para isso fazia-se
necessário a mudança das relações de trabalho. Essas mudanças deram-se primeiramente na América, depois na Índia e por fim, na África onde foram transformadas as antigas, transcendentais e arcaicas relações de trabalho em relação de trabalho propriamente capitalista. As transformações graduais que aconteceram durante séculos na Europa, aconteceram bruscamente nos outros continentes transformando-os em grandes territórios para suprir o capitalismo europeu, que não se importou com os seres se não com a acumulação desenfreada de capital se transformando assim, de um Capitalismo Mercantil para um Capitalismo Industrial. Na África e nos outros continentes as relações davam-se nas costas sendo as relações dos respectivos portos com os portos europeus tendo poucas melhorias dessas regiões costeiras e pequenas incursões no seu interior sendo a mercadoria o seu principal objeto-valor.
As relações mercantis na África O comércio mercantil na África dava-se, como já fora dito, pelas bordas com relações entre os lideres africanos e os comerciantes europeus, dali compravam escravos para transportá-los à América onde eram usados como força de trabalho na produção de matéria prima que supria as indústrias européias. Esse comércio África-Europa durante os séculos XV ao XVIII ocorria nos portos distribuídos pela região costeira da África com poucas incursões no interior barradas pelos lideres africanos, pelas condições geográficas e pelo desconhecimento de antídotos contra as doenças que a diferença climática e insetos peçonhentos os encontravam durante a viagem. É fato que a Europa poderia ter dominado a África em menos tempo, porém, as relações econômicas no curso da história não tornaram necessário tal empreendimento acontecendo efetivamente no século XIX.
Inicialmente a Inglaterra que na época era a principal exportadora de produto e líder da economia mundial, forçou o fim do tráfico escravo com a lei Bill Aberdeen de 1845 começando um processo de mudança na super estrutura para efetivar o trabalho livre, a lei permitia o aprisionamento, ataque e submersão de navios negreiros, dessa forma, cortaram as relações mercantis com a África do principal produto que permitia a entrada de dinheiro europeu, os escravos. Essa lei dificultava aquisição de seres humanos de pele negra para trabalharem de graça e em péssimas condições nas colônias americanas (mesmo que o tráfico tenha se estendido até 1870 clandestinamente) e também dava forças às revoltas no interior das colônias de negros e abolicionistas forçando o final da escravidão nas Américas. As relações mercantis propiciaram diversas relações econômicas da Europa com Lideres Africanos que, com o tempo, forçou a quebra da estrutura política consolidada durante séculos na áfrica. Onde iniciou durante o século XIX o processo de capitalização africano.
A transição capitalista e formação dos estados na África
Soberania, política fiscal e proletarização foram os três aspectos indissociavelmente
ligados
na
implantação
do
colonialismo
moderno. João Bernardo
Estes três ingredientes apresentados pelo autor da obra que nos propusemos a observar são indispensáveis em qualquer processo de formação capitalista. A soberania bélica e econômica da Europa permitiu a entrada de forças na áfrica efetivando relações com soberanos africanos, dessa forma, entraram no intervalo de três séculos de mercantilismo no solo africano. Essas relações com alguns lideres africanos que se davam em função da necessidade de proteção exclusiva a um determinado líder e seus liderados permitia que outros
lideres fossem subjugados, dessa forma, um grande numero de pessoas aumentava as forças produtivas de um único líder e aumentava a quantidade da troca de mercadoria necessária para as industrias européias. É curioso que nos meados do século XIX, precisamente no momento em que se esgotava na Índia a função soberana de uma empresa privada, a África começasse a abrir-se às empresas soberanas. (BERNADO/2004)
Outro mecanismo é a política fiscal onde o trabalhador vê-se na necessidade de pagar o imposto cobrado pelo Estado Soberano, é lhe apresentadas como saída a produção de produtos em suas próprias terras para criação de renda para pagamento ou a venda da própria terra como produto para o pagamento do imposto, forma esta que aos poucos o trabalhador se verá na necessidade de trabalhar no sistema capitalista para obtenção do capital. E por fim a proletarização de fato que a partir da mais-valia propicia a acumulação de capital pelas empresas e manutenção do ciclo capitalista.
Quebra das estruturas Em 1880, segundo João Bernardo, quatro quintos da áfrica ainda obedeciam aos sistemas políticos nativos e regiam-se por formas de produção não capitalistas. Porém, as medidas européias para o fim da escravidão acirrou as revoltas dos trabalhadores contra as lideranças africanas onde, esses mesmos trabalhadores, lutaram ao lado das grandes empresas européias (as quais instalaram relações capitalistas na Índia) propiciando nessa mesma década a perda da sua própria liberdade para as empresas européias se vendo agora num novo sistema econômico. Essas revoltas foram seguidas de cobranças de impostos e requisição de trabalho forçado.
A Palhota A palhota era um imposto cobrado por unidade habitacional. Era cobrado pelas administrações coloniais, que dessa forma encurralava os trabalhadores a trabalharem efetivamente para o pagamento do imposto. Inicialmente o imposto poderia ser pago em espécie, porém, a cobrança em moeda européia do respectivo colonizador era justificada pela facilidade de troca e amarzenamento nos bancos que já se instalaram na costa africana e, por conseguinte, no seu interior. ...o que diferenciava este sistema fiscal de todos os sistemas fiscais anteriores foi o fato de o pagamento, em principio, efetuar-se em dinheiro emitido pelo ocupante. Ora, para obterem o dinheiro com que deviam pagar o imposto, as famílias nativas tinham de vender primeiro alguma coisa aos detentores dessas novas formas pecuniárias. (BERNARDO/2004) Ao chegar ao fim suas finanças, estava formada a proletarização. A proletarização Naturalmente forçado os trabalhadores se viam na necessidade de se curvar ao atual regime e se proletarizar, não que acontecesse de forma branda e pacifica, mas agüentando ao máximo de suas forças para não se curvar ao sistema opressor que fora lhe apresentado. A proletarização se deu pela formação da mentalidade fiscal, pois com o tempo o trabalhador recebia a lei do imposto e o trabalho forçado como uma lei natural.
“O imposto indigena não pode ser tão excessivo que represente uma espoliação e suscite revoltas; mas não há de ser tão baixo que o negro o possa pagar sem modificar os seus hábitos de vida.(...) É o
pagamento em dinheiro que se deve preferir, pois para o obter há de o indígena trabalhar ao serviço dos europeus, ou transacioanar os seus produtos nos grandes centros comerciais da colônia”. 1934-Direito público colonial português (BERNARDO/2004)
A conferência de Berlim
Na conferencia de Berlim reuniram os principais lideres europeus e estabeleceram que todos os países que tivessem ocupação efetiva no litoral africano poderiam estender seus domínios ao interior do continente sem limites pré estabelecidos. Dessa forma, começara a partilha da terra sem o menor escrúpulo com alento simplesmente às necessidades de acumulação. O Estado criado dava poder político ás lideranças européias que ali se estabelecera e subjugava economicamente e politicamente os que ali serviriam simplesmente de força de trabalho. Dessa forma estava estabelecido o colonialismo moderno em terrenos africanos. Muitas autoridades políticas e econômicas surgiram nesse território deixando a duvida se o poder político supre e alavanca o poder econômico ou vice-versa, porém, o que de fato aconteceu é o fato de que a partilha e a colonização aconteceu.
Conclusão: Fica claro no transcorrer desse estudo que a formação do Estado Nacional é extremamente necessária para a efetivação das relações capitalistas no interior das sociedades, porém, na sua concepção foi de maneira natural, processual e gradativos sendo necessários vários séculos. Porém, na África não se deu dessa forma. Foi de forma arbitrária e numa força totalitária provocando resultados desumanos que ficará, durante vários séculos, exposto como mácula preta na vestimenta branca da humanidade.
O resultado desse estupendo empreendimento são as inúmeras revoltas atuais e a miséria escancarada que passam os países africanos, que a partilha irracional, que o berço da filosofia e civilização proporcionou aos anos posteriores. Sendo que, nesse momento, posso nessas ultimas linha me atrever: É inconcebível o que aconteceu; se deus existe... aonde estão teus olhos? Por que com sua própria mão “não apagas de teu manto esse borrão”(C.Alves)? Bibliografia: HOBSBAWIN, Érick.: A Era das Revoluções BERNARDO, João.: Democracia Totalitária: teoria e prática da empresa soberana. São Paulo: Cortez, 2004. A partilha da África