Catálogo mestres do mundo atualizado 3

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VI Encontro

Mestres do Mundo 1



VI Encontro

Mestres do Mundo


FICHA TÉCNICA

V Encontro Mestres do Mundo

Secretaria de Cultura do Ceará

CURADORIA Henrique Pereira Rocha e Catarina Quintela Soares

GOVERNADOR DO ESTADO DO CEARÁ Cid Ferreira Gomes VICE-GOVERNADOR DO ESTADO DO CEARÁ Domingos Filho SECRETÁRIO DA CULTURA DO ESTADO DO CEARÁ Francisco José Pinheiro SECRETÁRIO ADJUNTO DA CULTURA DO ESTADO DO CEARÁ José de Anchieta Cunha COORDENADORIA DE PATRIMÔNIO Otávio Menezes COORDENADORIA DE AÇÃO CULTURAL Teresa Fernandes Cavalcante ASSESSORIA DE IMPRENSA Sonara Capaverde

Comissão Cearense de Folclore PRESIDENTE Henrique Pereira Rocha DIRETORIA José Clerton de Oliveira Martins Catarina Quintela Soares Lairton dos Santos Guedes Gilberto Rodrigues Carneiro

GERÊNCIA E ACOMPANHAMENTO DO PROJETO Secult-CE: Eduardo Fideles, Otávio Menezes e Norma Paula Moreira Comissão Cearense de Folclore: Henrique Pereira Rocha, Simone de Oliveira Castro, Catarina Quintela Soares e Lairton dos Santos Guedes COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO Catarina Quintela Soares e Danielli de Bernardi Parente PRODUÇÃO Usina 2 Produções ASSESSORIA DE IMPRENSA E PRODUÇÃO DO CATÁLOGO AD2M Engenharia de Comunicação JORNALISTA RESPONSÁVEL Mauro Costa (CE 01035 JP)




Sumário Apresentação

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Mestres da Cultura: Tesouros vivos do saber

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Rodas de Mestres

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Relatos de Experiências

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Palco Mestre

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Mestres em discussão

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Atrações do VI Mestres do Mundo

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Autos de Natal: Celebrações da Fraternidade Henrique Pereira Rocha Presidente da Comissão Cearense de Folclore

O Encontro Mestres do Mundo, em sua sexta edição, une-se às festividades do Ciclo Natalino e objetiva ter nas manifestações e valores cultuados neste período do ano as características principais de sua temática. Os Autos de Natal tiveram o seu apogeu no alvorecer do século XVI, chegando ao Brasil oriundo da tradição medieval ibérica e obedecendo a uma dramatização seguindo temas religiosos ou profanos, sérios ou cômicos, para divertir e moralizar a platéia com o intuito de os conduzirem a fé. Esse clima natalino, aos poucos, foi criando dentro de nós o desejo de nos reunir em comunidade ou em família para celebrar o nascimento do menino Jesus, quando já se aproxima o final do ano trazendo esperança de renovação. Os autos natalinos ganharam ampla legitimidade dentro da cultura tradicional popular e ao longo do tempo foram surgindo outras formas de interagirmos com o Natal através do teatro, da música, do artesanato, da gastronomia, dos artefatos decorativos e da religiosidade. Com a


temática voltada para a valorização dos Autos de Natal, a perspectiva do VI Encontro Mestres do Mundo é recriar um natal regional através dos saberes e fazeres nascidos da inventividade popular e de sua oralidade, em um intercâmbio de vivências que dá visibilidade e impulsiona a preservação de nosso patrimônio imaterial. A realização do Encontro no mês de dezembro, e a diversidade de práticas culturais voltadas para o Ciclo Natalino no estado do Ceará, foram determinantes para favorecer a participação de mestres e grupos de reisados, bumba-meu-boi, pastoris e dramas na programação deste ano. Porém, além das expressões deste ciclo festivo, o Encontro Mestres do Mundo também abre espaço para as manifestações de outros mestres e grupos tradicionais, mantendo sua característica de momento de confraternização, troca de experiências e valorização daqueles que guardam nas práticas culturais cotidianas e na memória, os principais valores de nossa tradição cultural.


Mestres da Cultura: Tesouros Vivos do Saber


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alorizar os saberes e conhecimentos das tradições populares ao se louvar as figuras dos próprios sujeitos desta história, promovendo um encontro onde a troca de experiências transcenda fronteiras e chegue a um número cada vez maior de pessoas. Assim é o Encontro Mestres do Mundo, evento que já entrou para o calendário cultural do Ceará e, em 2011, chegou à sua

sexta edição. Realizado no município cearense de Limoeiro do Norte, a 190 km da capital Fortaleza, o evento reuniu entre os dias 01 a 04 de dezembro os grandes mestres da cultura tradicional popular do Ceará, João Pessoa (PB), Rio de Janeiro (RJ), Arco Verde (PE) e São Luís (MA) em uma mistura de ritmos, danças, manifestações, conhecimentos e estudos. Os tesouros vivos da cultura popular – pessoas, grupos ou comunidades detentores de conhecimentos da tradição popular – são reconhecidos por meio de edital público e diplomados por lei pela Secretaria da Cultura do Estado (Secult), que valoriza e dá espaço para a disseminação de seus saberes

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e fazeres, consolidando o programa de Preservação do Patrimônio Imaterial. O Encontro Mestres do Mundo se configura em uma oportunidade diferenciada de manter contato e de estar perto de muitos destes mestres que mantém vivas as tradições nas diversas vertentes da cultura popular brasileira. Expressões de linguagens variadas se juntam em uma arena onde os mestres mostram o que sabem, brincam e ao mesmo tempo se divertem. São momentos mágicos onde o público participante trava contato com memórias, lembranças, reminiscências de narrativas que permanecem entre nós graças à dedicação destes senhores e senhoras, a maioria de idade avançada, pele curtida, corpos encurvados, mas com o olhar vibrante e toda a energia e disposição para mostrar o que sabem. Com uma programação ampla e atividades teóricas e práticas, o Encontro é dividido em rodas de mestres, relatos de experiências, um Seminário de Políticas Públicas e apresentações em praça pública. Para o ano de 2011, o Encontro Mestres do Mundo juntou-se às festividades do Ciclo Natalino com o objetivo de ter nas manifestações e valores cultuados nesse período do ano. Com o tema “Autos de Natal”, o VI

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Encontro Mestres do Mundo recriou um Natal imbuído de valores abrangentes dos saberes e fazeres nascidos do gênio do povo. Um momento especial que antecedeu a cerimônia de abertura e envolveu toda a população foi o cortejo pelas ruas de Limoeiro do Norte, anunciando a chegada do evento ao município. Com a participação do Boi do Mestre Zé Pio, integrantes de outros grupos também se juntaram para improvisar durante a caminhada, com coreografias e canto afinado. No Palco Mestre, montado na Praça da Igreja Matriz, na noite do dia 1º de dezembro, o secretário da Cultura do Ceará, Francisco Pinheiro; o prefeito municipal de Limoeiro do Norte, João Dilmar da Silva; o secretário municipal da Cultura, Renato Remígio; o presidente da Comissão Cearense de Folclore, Henrique Pereira Rocha; e demais autoridades presentes louvaram cada um à sua forma a relevância do tradicional Encontro, reforçando as particularidades das ricas tradições do Vale do Jaguaribe, uma das mais ricas em cultura, com tradição de trovadores, cantadores, vaqueiros e bois. A primeira atração da noite de abertura foi a Mestra Dina, aboiadora de Canindé, que cantou suas experiências da infância e divertiu


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Os tesouros vivos da cultura popular são reconhecidos por meio de edital público e diplomados por lei.

o público presente ao citar o encontro que teve com Luiz Gonzaga. O aclamado Mestre Zé Pio, de Fortaleza, subiu ao palco e fez uma das apresentações mais aplaudidas da noite no Palco Mestre. Completaram a programação da primeira noite o Maracatu Solar, de Potengi, que levou para a Praça da Matriz um figurino luxuoso e mostrou um ritmo que chamou a atenção dos presentes. Em seguida, Nelson da Rabeca, de Alagoas, mostrou aos jovens e encantou os mais experientes com as origens do forró, utilizando-se do tradicional instrumento para apresentar também músicas autorais que canta e toca ao lado da família. O encerramento da primeira noite de shows foi com o charmoso grupo Catarina Mina, do Maranhão, que tirou o público da arquibancada para dançar tambor de crioula, em uma

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roda de dança com crianças e adultos que não tiveram receio de colocar o pé no tablado e arriscar alguns passos. Ao longo das três noites seguintes, um amplo rol de artistas representantes legítimos da cultura popular se fez presente ao Palco Mestre, com manifestações ricas em sons, cores e sentimentos. Passaram pelo tablado e receberam os aplausos da população os reisados de Mestre Aldenir (Crato-CE), de Mestre Piauí (Quixeramobim-CE) e da Comunidade São Joaquim (Senador Pompeu-CE); os pastoris da Mestra Dona Zulene (Crato-CE), da Mestra Mariinha (Paracuru-CE) e da Oficarte (Russas-CE); os dramas contados por Mestra Ana Maria da Conceição (Tianguá-CE); os afoxés Oxum Odalá e Acabaca (ambos de Fortaleza-CE); as ladainhas e benditos cantados por


D. Maria do Horto (Juazeiro do Norte-CE); a ciranda de Mestra Vó Mera (João Pessoa-PB); as tradições, lendas e folguedos da música brasileira popular com Geraldo Júnior e Grupo (Rio de Janeiro-RJ); o bumba meu boi de Mestre Chico (Limoeiro do Norte-CE); e a força musical e rítmica do Maracatu Az de Ouro (Fortaleza-CE), do Maracatu Solar (Fortaleza-CE), do samba de coco Raízes de Arcoverde (PE) e de Rosa Reis e Grupo (São Luís-MA). Cada um com seu estilo peculiar, os mestres e grupos cantaram composições próprias ou conhecidas pelo público e enriqueceram as noites de Limoeiro do Norte, tirando a platéia de seus lugares para dançar, interagir e receber dos mestres verdadeiras aulas de cultura. Passada a festa de cada noite, as manhãs e tardes reuniram estudantes, profissionais e estudiosos da cultura popular, em uma rica e ampla programação de debates e troca de experiências promovidas no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE) de Limoeiro do Norte. Durante as manhãs, os mestres formavam grupos durante as Rodas de Mestres, de acordo com cada especialidade: corpo, mãos, sons, oralidade e sagrado. Nas tardes, os Relatos de Experiências foram marcados por histórias emocionantes, depoimentos sobre a trajetória de vida dos mestres, as dificuldades encontradas e esforços para se manter vivas as tradições, saberes e fazeres. Também no período da tarde, a programação abriu espaço para a realização do Seminário Discutindo Políticas Públicas para o Patrimônio Cultural, com o tema “Diálogos sobre Afrobrasilidades”. Para um evento com o porte do Encontro Mestres do Mundo, além de muita organização e planejamento, é

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O Encontro Mestres do Mundo está consolidado no calendário cultural cearense.

preciso amor para fazer com que tudo saia como pensado. Com a supervisão da Secretaria de Cultura do Ceará, uma ampla equipe de produção foi montada e trabalhou com empenho e cuidado para garantir o sucesso do evento. O desafio maior foi reunir os 58 mestres da cultura participantes e oferecer a eles todo o conforto e segurança necessários para que eles ficassem à vontade para mostrar suas habilidades e conhecimentos. O suporte à equipe de produção ficou à cargo de um grupo de jovens estudantes de Limoeiro do Norte, carinhosamente chamados de Anjos, que deram todo o suporte para os mestres da

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cultura, acompanhando-os com atenção e carinho em todos os momentos do Encontro. Ao final, um sentimento de orgulho e alegria invadiu o coração de todos que se envolveram ou participaram de alguma forma do VI Encontro Mestres do Mundo, consolidado como um

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projeto intrínseco ao calendário cultural cearense. Antes do encerramento, uma missa na Igreja da Matriz foi realizada para agradecer os bons resultados do encontro e pedir a bênção à padroeira Nossa Senhora da Conceição. Que venham novos encontros e tragam consigo o vigor e a coragem dos guardiões da memória de nossas tradições culturais.


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RODAS DE MESTRES

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m dos principais objetivos do Encontro Mestres do Mundo é agregar as experiências dos diversos mestres da cultura participantes e fazer um amplo intercâmbio de práticas e saberes por meio de atividades paralelas onde eles manifestam sua sabedoria. Como eles vêm de várias regiões do Ceará e de muitos Estados brasileiros, as Rodas de Mestres

funcionam como o momento de maior integração do Encontro Mestres do Mundo. As ações aconteceram durante o dia, nas salas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFCE) de Limoeiro do Norte e foram abertas para a participação do público em geral. Dividida em cinco tipos, de acordo com as especialidades de cada mestre, as Rodas de Mestres deste ano focaram suas atividades no corpo, mãos, sons, oralidade e sagrado. Os artistas se encontravam todas as manhãs e, mediados por especialistas e estudiosos em cada segmento, mostravam seus talentos e se divertiam junto com seus

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companheiros. Neste momento especial, os mestres deixavam a timidez de lado e se doavam de corpo e alma em performances particulares. Para quem assistiu, foi um momento mágico de aprendizagem sobre a riqueza da cultura e do folclore brasileiros. Na roda do Corpo, os professor es Clerton Vieira e Lairton Guedes reuniram os mestres em um encontro que valorizou as diversas manifestações de dança e de música popular de raiz, explorando uma mescla de ritmos e gingas. Difícil ficar parado. A cada apresentação individual, a plateia entrava no ritmo dos reisados, cirandas e danças diversas. Em meio a tanto embalo, os mestres e mestras contavam sobre a sua paixão por tudo aquilo que os

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As Rodas de Mestres focaram suas atividades no corpo, mãos, sons, oralidade e sagrado.

tornam únicos, por aquilo que os mantém vivos há tantos anos. A pesquisadora Mônica Emanuela coordenou a roda de Mãos, servindo como facilitadora para que os mestres mostrassem aos presentes os processos criativos que transformam toda o talento inventivo em peças. Esculpir, moldar e montar foram as principais atividades desta roda, que gerou belos trabalhos com riqueza de detalhes e formas. Cada mestre usava sua vasta experiência para elaborar as peças de acordo com seus costumes, técnicas e sabedoria pessoal. A música também foi tema da roda de Sons, mediada pela dançarina e pesquisadora Graça Martins. Uma variedade de instrumentos como rabecas, violas, violões, acordeões e percussões passearam pelas mãos de dezenas

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de mestres que se encontraram no auditório para brincar e improvisar misturas musicais. Os mestres tiraram sons tradicionais ou fizeram novas leituras para levar aos ouvintes, que se entregaram à folia e alegria do momento. Na roda da Oralidade, coordenada pela professora e pesquisador Simone Castro, os músicos expressaram

a sabedoria e as tradições de seus povos e regiões. Cantorias, cordéis, rezas, dramas e poemas compuseram a roda, onde os próprios mestres puderam conversar sobre temas amplos e distintos. Já na roda do Sagrado, a pesquisadora Dani de Jade reuniu os mestres

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para uma troca de experiências pessoais focadas nas vivências desde a infância até o atual cotidiano, com foco nas manifestações de religiosidade que passaram por benditos, ladainhas e orações cujas tradições remontam a comunidades espalhadas por todo o Brasil. Ao final dos dias, os participantes perceberam que os mestres da cultura têm tanto a oferecer, que se torna ainda mais relevante buscar formas de valorizar estas personalidades e seus saberes. A dança e a música parecem ter nascido junto com eles e vieram sendo aprimorados com o tempo; as crenças e suas diversas formas de expressão destacam a força do sagrado para o povo brasileiro; as habilidades manuais demonstram a fertilidade do artesanato brasileiro em suas inúmeras manifestações públicas. Tudo isso transforma esses senhores e senhoras em relíquias vivas que merecem ser valorizadas e têm no Encontro Mestres do Mundo um momento onde todos os olhos e atenções estão direcionados para eles.

Os Mestres se encontravam todas as manhãs para mostrar seus talentos e se divertir juntos.

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RELATOS DE EXPERIÊNCIAS 28


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cultura popular está enraizada na nossa história por meio de manifestações dos mais diferentes estilos de dança, canto, artes visuais, música. Cada mestre da cultura vive na pele sua própria arte desde muito cedo, traz consigo conhecimentos aprendidos de outras gerações e mantém isso ao longo da vida. São saberes que precisam ser perpetuados. Uma

das formas de se fazer isso é tornar esses conhecimentos cada vez mais conhecidos, compartilhando as experiências mais marcantes e detalhando os desafios de se manter tais tradições. Pensando nisso, o Encontro Mestres do Mundo mantém em sua programação um momento onde os mestres convidados são estimulados a uma conversa informal, brindando a platéia participante com histórias emocionantes, plenas de riqueza e informação. As tardes no auditório do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFCE) de Limoeiro do Norte eram tão festivas quanto foram as apresentações musicais no Palco Mestre,

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Relatos de Experiências emocionaram o público com histórias de vida dos Mestres.

na Praça da Matriz. Em paralelo ao Seminário Discutindo Políticas Públicas para o Patrimônio Cultural, os Relatos de Experiências se tornaram um dos momentos mais preciosos de conhecimento e harmonia entre os mestres durante o evento, quando eles puderam trocar informações de forma descontraída. A peculiaridade e o intimismo do encontro impressionaram os presentes e possibilitaram se descobrir um pouco mais sobre aquelas vidas tão singulares e tudo isso em um ambiente mais intimista. Era durante os Relatos de Experiências que os mestres mais tímidos puderam se expressar de forma mais confortável ou ocupar o silêncio do jeito que achassem necessário. A Mestra Dina, aboiadora de Canindé (CE), abriu o primeiro dia de relatos, falando sobre as dificuldades enfrentadas quando optou por

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ser vaqueira. Mestra Dina mostrou detalhes sobre sua vida desde pequena e reforçou a necessidade de um bom trabalho em torno da divulgação e do repasse da cultura. Sempre bem humorada e integrada com os demais mestres, ela encantou os presentes com seus pontos de vista firmes, sempre falando com paixão sobre aquilo que sabe fazer de melhor. Mestre Sabastião, embolador e cordelista, também registrou as dificuldades em disseminar a cultura de raiz e brindou o público ao recitar algumas peças de sua autoria. Já Mestre Aniceto abordou o formato e ritmo naturais


da banda cabaçal, um dos mais tradicionais e reconhecidos movimentos musicais cearenses. Quem também levou inquietação ao público foi o Mestre Cirilo, do Crato (CE), que fez todos cantarem o maneiro pau e se mexerem ao som do coco. Outro representante da região do Cariri, o embolador, cordelista e poeta Mestre Luciano Carneiro, também do Crato, mostrou seu trabalho

com o cordel, com direito a uma empolgante recitação de alguns versos com uma expressividade que só mesmo os autores conseguem caracterizar da forma adequada. O cordel também foi o assunto do Mestre Lucas Evangelista, que aproveitou para explicar como se dá o processo criativo e produtivo, baseado

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também em sua experiência de visita às escolas. As artes manuais tiveram seus momentos de destaque durante os Relatos de Experiências, quando os artistas explicaram como aprenderam a produzir sua própria arte, seja de forma autodidata ou recebendo as informações vindas de geração em geração. Um exemplo foi o da Mestra Lucia Pequeno, que falou sobre o seu trabalho com barro, e do Mestre Pedro Balaieiro, de Guaramiranga, que mostrou como construiu sua fama com a feitura de peças à base de cipó.

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Alguns Mestres se apresentavam após os relatos dos seus causos e histórias de vida.

Assim como esses, vários foram os mestres que contaram suas histórias. Superação, tristezas, alegrias, arte, talento e família foram temas recorrentes nas tardes limoeirenses. E selando o encontro descontraído, os mestres sempre davam um jeito de realizar apresentações de improviso, com um toque especial de simplicidade. Os aplausos eram recorrentes, sempre em alto e bom som.

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PALCO MESTRE

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A

s festividades do sexto Encontro Mestres do Mundo tomaram conta da Praça da Matriz de Limoeiro do Norte de 1º a 04 de dezembro de 2011. A população local, já familiarizada com o evento e apaixonada pelo intercâmbio cultural proporcionado pela iniciativa, presenciou uma mistura de ritmos e danças todas as noites, lotando as arquibancadas da estrutura montada para receber os mestres da cultura popular brasileira. Ao todo, 58 artistas ocuparam o Palco

Mestre demonstrando grande profissionalismo e envolvimento, misturando alegorias, figurinos, maquiagens, cantorias e muita dança. Promovido pelo Governo do Estado do Ceará, por meio da Secretaria de Cultura (Secult) e em parceria com a Comissão Cearense de Folclore e da Prefeitura Municipal de Limoeiro do Norte, o Encontro abriu livre acesso à população, que durante quatro noites teve diversão garantida, em um banho de cultura.

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Expressões de diversas linguagens invadiram a arena, repleta de mestres de várias partes do Brasil que vieram participar do encontro, que recupera a tradição popular e o folclore. Com a inspiração nos Autos de Natal, aproveitando a realização do evento em dezembro, período também dedicado à padroeira de Limoeiro do Norte, Nossa Senhora da Conceição, o Encontro resgatou a riqueza da religiosidade popular e suas raízes Preocupado com a manutenção dessa originalidade e linha mestra trabalhada pelo evento desde seu início, o Secretário da Cultura, Francisco Pinheiro, anunciou a inclusão do encontro no calendário oficial do Estado. “Temos que manter a tradição para não perdê-la. É importante que jovens e crianças conheçam a história dos nossos mestres, porque quem não tem memória não tem futuro nem presente”, comentou o secretário. Para o prefeito de Limoeiro do Norte, João Dilmar, e para a população local, este foi um momento de grande satisfação. “Receber o encontro é motivo de

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A Praça da Matriz recebia todas as noites uma mistura de ritmos e danças.


uma alegria incontida, pois foi aqui onde ele nasceu e temos ligações sentimentais fortes com o evento, que esse ano teve uma de suas mais belas edições”, disse o prefeito. Após a solenidade de abertura, o Palco Mestre virou uma festa que durou quatro noites. O público de Limoeiro e os visitantes tomaram conta da praça para dançar até o fim dos espetáculos. Não raro, alguns se empolgavam e entravam no tablado para acompanhar os mestres, que há tanto tempo se dedicam a um trabalho primoroso de valorização da cultura popular. Essa mistura de ritmos sempre foi a característica mais marcante do Encontro Mestres do Mundo. O Reisado de Caretas se fez presente com o Mestre Luis

Antonio, de Potengi (CE), com suas máscaras e interpretações marcantes. Quem também mostrou o quanto entende de reisado foram o Mestre Aldenir, do Crato (CE), e os integrantes da Comunidade São Joaquim, de Senador Pompeu (CE). O vigor da percussão do tambor de crioula encantou Limoeiro do Norte com a apresentação do grupo Catarina Mina, do Maranhão. As moças e seus vestidos rodados dividiram o palco com os instrumentistas que cantavam com gosto suas letras bem elaboradas e de exaltação.

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Ao todo, 58 artistas ocuparam o Palco Mestre com muita alegria, cores e sons.

Os experientes Maracatu Solar e Maracatu Az de Ouro, ambos de Fortaleza, levaram as cores, as bandeiras e os rostos pintados de uma das mais tradicionais manifestações da cultura cearense para o Palco Mestre. De Alagoas veio Nelson da Rabeca e sua simplicidade que, transformada em música, rendeu aplausos incansáveis da plateia. A figura icônica do vaqueiro foi objeto de manifestação da Mestra Dina, de Canindé (CE), que abriu o espetáculo narrando sua vida e citando Luiz Gonzaga. Mestre Chico, nascido em Limoeiro do Norte, e o aclamado Mestre Piauí também levaram a cultura do boi ao Palco Mestre. O drama se fez presente com as histórias contadas pelo grupo da Mestra Tereza Lino, de Beberibe (CE), e pela Mestra Ana Maria da Conceição, de Tianguá (CE). De Juazeiro do Norte veio Mestra Maria do Horto,

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O Encontro resgatou a religiosidade do período do ano e se inspirou nos Autos de Natal.

que teve seu espaço reservado no Palco Mestre para cantar os tradicionais benditos. Não podia faltar a apresentação da ciranda de Mestra Vó Mera, vinda direto da Paraíba. O afoxé também se fez presente com os grupos fortalezenses Oxum Odalá e Acabaca. Já o ritmo cadenciado e empolgante da dança do coco foi mostrado pelos pernambucanos do Raízes do Arcoverde, que transformaram o Palco Mestre em uma roda de dança que varou a madrugada. Participações mais que especiais foram a da maranhense Rosa Reis, com suas canções em ritmos que vão do tambor de crioula ao carimbó de caixeiras, passando pelo

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bumba-meu-boi e por sambas e reggae; e a do carioca Geraldo Junior e Banda, que misturaram cantos e danças para celebrar a cultura popular. Nada mais adequado ao tema deste ano do que valorizar a figura dos pastoris, representados por apresentações da Mestra Dona Zulene, do Crato (CE); da Mestra Mariinha, de Paracuru (CE); e do Pastoril da Oficarte, de Russas (CE). Todos exaltaram as figuras

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religiosas por meio da voz e do talento de famílias unidas no palco, adultos, adolescentes e crianças, em uma cultura passada por várias gerações. As apresentações reforçaram a religiosidade inerente a essa edição do evento, abrilhantado com uma gigantesca árvore de Natal que decorou a praça durante todo o espetáculo.


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MESTRES EM DISCUSSÃO 44


A

s apresentações, encontros presentes ao evento ou o público interessado em conhecer e relatos de experiências um pouco mais sobre temas essenciais para a preservação foram complementadas durante da cultura nacional em sua essência. a programação do VI Encontro Durante os dias 2 e 3 de dezembro, o Seminário Mestres do Mundo por um espaço Discutindo Políticas Públicas para o Patrimônio Cultural para uma discussão teórica mais debateu sobre políticas públicas de preservação para o ampla entre pesquisadores e espatrimônio, tomando como base os saberes, fazeres, forpecialistas em cultura popular. Os mas de expressão e celebrações trazidas pelos mestres conhecimentos foram compartida cultura presentes e tendo como tema desta edição lhados com todos os participantes, “Diálogos sobre Afrobrasilidades”. Os encontros foram fossem eles os próprios mestres realizados na sede do Instituto Federal de Educação,

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Ciência e Tecnologia (IFCE) de Limoeiro do Norte. Presente na abertura do Seminário, o Secretário da Cultura do Estado do Ceará, Francisco Pinheiro, ressaltou a importância das discussões levantadas pelo encontro. “Precisamos começar a trazer esse debate das culturas negras, ciganas, indígenas e de grupos marginalizados no Brasil e hoje isso é possível com o Seminário dentro do Encontro Mestres do Mundo”, destacou Pinheiro. O primeiro dia trouxe na programação duas mesas de debate reunindo estudantes e interessados pelo tema. A primeira tratou de “Africanidades Cearenses: a presença das comunidades quilombolas no Ceará”, com a participação de Willian Augusto Pereira, da Coordenadoria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura Municipal de Fortaleza; e Eurípedes Funes,

professor do Departamento de História da Universidade Federal do Ceará. Eles discutiram as influências da cultura africana no Estado e seus costumes agregados às raízes culturais. As discussões foram impulsionadas pelo desejo do público presente em conhecer um pouco mais sobre cada tema. Em seguida, a mesa “Influência africana nas manifestações populares do Ceará: religiosidade e festa” abordou a presença das práticas religiosas da cultura afro no Ceará e contou com as participações de Wagner Pereira da Silva, da Comissão Cearense de Folclore e do Instituto de Difusão de Cultura Afrobrasileira; de Oswald Barroso, da Comissão Nacional de Folclore e da Universidade Estadual do Ceará (Uece); e do pesquisador e professor Franck Ribard, da Universidade Federal do Ceará (UFC). Ao longo dos debates, foram levadas

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Seminário debateu políticas públicas de preservação do patrimônio imaterial.

informações sobre a herança deixada pelos negros no Nordeste e que são reverenciadas até os dias de hoje. O segundo dia do Seminário reservou espaço para duas mesas, uma delas sobre “Políticas Públicas para a igualdade racial: a cultura como vetor de promoção”, reunindo como expositores Ivaldo Ananias Machado da Paixão, da Coordenadoria de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial do Governo do Estado do Ceará; e Willian Augusto Pereira, da Coordenadoria de Políticas Públicas para a Promoção da Igualdade Racial da Prefeitura de Fortaleza. Em seguida, as discussões passearam pelo tema “Cultura e Ascestralidade Africana no Ceará”, encerrando o Seminário, e conduzidas por Hilário Ferreira, professor e mestre em História Social

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Pesquisadores e professores trocaram saberes com os Mestres durante Seminário.

da Universidade Federal do Ceará (UFC), e por Oswald Barroso. O Patrimônio Cultural é reconhecido pela Constituição Brasileira de 1988, onde inclui os bens de natureza material e imaterial que formam a identidade, a ação e a memória dos grupos formadores da sociedade brasileira, dentre eles as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, os objetos documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; e os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, paleontológico, ecológico e científico (artigo 216, seção II). No que se refere ao patrimônio imaterial, o decreto presidencial nº 3.551, de 04 de agosto de 2000, tem registro nos livros dos

saberes, que contempla conhecimentos, habilidades e modo de fazer; das celebrações, onde incluem rituais e festas representativos para a sociedade brasileira; e das formas de expressão, onde estão registradas manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas. Assim, a realização do Seminário Discutindo Políticas Públicas para o Patrimônio Cultural dentro do Encontro Mestres do Mundo agrega valores de pesquisa e faz um estudo de caráter sociológico e antropológico da contribuição e da herança da cultura popular através do tempo. A iniciativa dá luz sobre nossa cultura, potencializa a identidade dos povos e demonstra que quanto mais se discute e se valoriza os tesouros culturais, mais será possível preservar para as novas gerações suas histórias, conhecimentos, saberes e fazeres.

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ATRAÇÕES DO VI MESTRES DO MUNDO 52


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urante os quatro dias de realização do VI Encontro Mestres do Mundo, o município de Limoeiro do Norte foi palco para um dos maiores encontros de manifestações populares de todo o país. Dezenas de Mestres da

cultura e grupos convidados de vários Estados brasileiros realizaram apresentações noturnas que levaram uma diversão diferenciada e de uma ampla riqueza, animando a platéia com suas danças, cantos e improvisações. Segue lista das atrações da sexta edição do Encontro Mestres do Mundo:

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Afoxé Acabaca Afoxé, Fortaleza - CE

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Afoxé Oxum Odalá Afoxé, Fortaleza - CE

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Coco RaĂ­zes de Arcoverde Coco, Arcoverde - PE

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Comunidade São Joaquim (Reisado, Senador Pompeu - PE)

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Dona Dina (Aboio, CanindĂŠ - CE)

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Dona Maria do Horto Benditos, Crato - CE

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Gerardo Júnior e Banda Aboio, Canindé - CE

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Maracatu Az de Ouro Maracatu, Fortaleza - CE

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Maracatu Solar Maracatu, Fortaleza - CE

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Mestra Dona Zulene Pastoril, Crato - CE

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Mestra Mariinha Pastoril, Paracuru - CE

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Mestra Vรณ Mera Coco, Joรฃo Pessoa - PB

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Mestre Aldenir Reisado, Crato - CE

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Mestre Chico Bumba Meu Boi, Limoeiro do Norte - CE

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Mestre Luis AntĂ´nio Reisado de Caretas, Potengi - CE

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Mestre PiauĂ­ Reisado de Boi, Quixeramobim - CE

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Nelson da Rabeca Luthier e instrumentista, Marechal Deodoro - AL

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Pastoril da Oficarte Pastoril, Russas - CE

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Rosa Reis e Grupo Tambor de Crioula, São Luís - MA

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Tambor Catarina Mina Tambor de Crioula, São Luís - MA

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