Edição 447

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MODERNO COMO VOCÊ!

Diário da Cuesta

QUINTA-FEIRA, 14 de abril de 2022 ano II

Nº 447

NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU

Diário da Cuesta EMBAÚBA

FELICIDADES BOTUCATU EM 2022!


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Diário da Cuesta

ARTIGO

PRINCESA DA SERRA

Olavo Pinheiro Godoy

Conta-nos o Velho Testamento, na rudeza singela dos seus capítulos, que a mulher de Loth foi transformada em estátua de sal por ter olhado para trás – para o Passado. As cidades velhas não olham para o futuro, fazem como a mulher de Loth :- voltam-se para o passado e nele se petrificam. E, enquanto, essas cidades jazem inânimes e o vento dos séculos lhes arrebata o último átomo de grandeza e opulência a centenária Botucatu continua vigorosamente de pé – velha e moça – num contraste que não cansa, cultuando o seu passado e acompanhando a febricitante vibração da era em que vivemos. Se os crentes dominam e empolgam pela excepcionalidade das suas manifestações de Fé, aos visitantes subjuga e arrebata com a atração de beleza que emana de sua serra da qual parece redemoinhar o espírito do gigante deitado, essa lenda viva, que fez brotar os estudos profundos de Frei Fidélis. Num velho cartaz de propaganda turística do Chile há estes dizeres : Chile El País Com Aire Acondicionado. Ora isso nos faz lembrar logo a nossa querida cidade serrana, que bem merece tal qualificativo ou melhor, ajusta-se perfeitamente a Botucatu, que já é conhecida como terra dos bons ares, cognominação que lhe serve como uma luva.

Os que a não conhecem trazendo plasmado no sub-consciente o refrão de que ela é uma cidade saudável, talvez influenciados pelo seu nome de origem tupi e, segundo Batista Caetano significa vento bom, vislumbram o lugar ideal para se viver. Teodoro Sampaio é mais expressivo ao dar-lhe o sentido de bons ares, clima bom. Antenor Nascentes nos informa que a palavra aparece no poema CARAMURU de Santa Rita Durão sob a forma ibo-ti-catu. Xavier Fernandes citado por Nascentes explica como “muito vaporoso”. Plínio Airosa nos esclarece sobre a origem do nome Botucatu : “Sendo Katu, enfim adjetivo, que se traduz por bom, util; saudável; etc nada mais natural que ybytukatu equivalha a : bons ares, ventos

saudáveis, ventos bons, como geralmente já vem registrado em vários estudos de toponomia brasileira de origem tupi-guarani”. Botucatu não imitou o gesto curioso da mulher de Loth. Não se petrificou no passado. No tumultuar constante da vida moderna, ela acompanha passo a passo as arrojadas arremetidas para o futuro. Cheia de seiva e ânimo prossegue na grande caminhada que deu em todos os setores da atividade humana, o seu desenvolvimento o seu progresso, tudo em abono da vibrante sentença, terra dos bons ares e das boas escolas , em zelo da qual Botucatu atira-se resoluta, pela caminhada gloriosa do seu esplendoroso futuro. Olavo Pinheiro Godoy (do Centro Cultural de Botucatu)

Que a Cuesta é a forma de relevo escarpada em um dos lados e apresentando um declive suave do outro? Este verdadeiro “degrau”, que popularmente era conhecido como “serra”, passou a ser conhecido pelo nome da cidade próxima da qual assume proporções mais gigantescas: Cuesta de Botucatu. A Cuesta de Botucatu marca o início do Planalto Ocidental Paulista. Ela tem, na sua escarpa, o limite físico e humano entre o leste e o oeste do estado; só o rio Tietê a ultrapassa (fenda natural); rodovias e ferrovias que a cruzam serpenteiam por entre seus patamares mais suaves para atingir o topo e, depois, deslizar suavemente em direção aos limites com Mato Grosso e Paraná. No seu topo, a suavidade de um tipo climático que talvez tenha induzido os povoadores a reconhecerem ali os “bons ares”. Assim é a CUESTA: um relevo característico de regiões mexicanas, espanholas, francesas, sul-africanas e indianas, mas a Cuesta de Botucatu tem a sua identidade; por sua história, por seu significado; inclusive porque a partir dela se internacionalizou o nome “cuesta” e por se constituir, em nossa região, o espaço mais significativo e marcante do relevo paulista, ela é, por todos os aspectos um patrimônio natural, cultural, histórico, geológico e até artístico – fonte de inspiração para muitos artistas de nossa região.

EXPEDIENTE NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU WEBJORNALISMO DIÁRIO

DIRETOR: Armando Moraes Delmanto EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO: Gráfica Diagrama/ Edil Gomes Contato@diariodacuesta.com.br Tels: 14.99745.6604 - 14. 991929689

O Diário da Cuesta não se responsabiliza por ideias e conceitos emitidos em artigos ou matérias assinadas, que expressem apenas o pensamento dos autores, não representando necessariamente a opinião da direção do jornal. A publicação se reserva o direito, por motivos de espaço e clareza, de resumir cartas, artigos e ensaios.


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Diário da Cuesta

P O E S I A O Batizado da Cidade Morena poesia de José Pedretti Neto. Trazemos uma preciosidade literária que é o poema-homenagem de Pedretti Neto à sua cidade. Em um tempo em que os poetas escreviam e homenageavam seu torrão natal... Ao mesmo tempo que divulgamos a boa literatura, procuramos incentivar novos poetas a apresentarem seus trabalhos no exercício sadio da cidadania. Pedretti Neto exerceu o magistério e o jornalismo, tendo participado de todos movimentos culturais de nossa cidade. Já falecido, foi lembrado na fundação da ABL – Academia Botucatuense de Letras como seu PATRONO, quando HUGO PIRES fez sua ilustração para a Galeria dos Patronos da ABL. O seu poema cívico em homenagem a Botucatu também foi apresentado durante as comemorações do 1º Centenário, no dia 26 de maio de 1955 e publicado na edição de nº 1, da revista botucatuense de cultura - PEABIRU, de janeiro/fevereiro de 1997:

O BATIZADO DA CIDADE MORENA

Houve uma festa enorme no batizado da cidade recém-nascida. Na catedral verde da mata toda enfeitada de festões e cipoama o padrinho foi o primeiro que chegou. Era um bandeirante ousado e façanhudo. um comedor de terra. um come-léguas, um Chico vira mundo. Entrou com o facão abre-picada e sem dar satisfação meteu as botas pela nave tapetada de musgo. Lá fora no átrio da igreja de esperança, - capim fino, dormideiras, maravilhas brancas e vermelhas...joás... tudo que é planta e flor se transformou num tapete em demanda da pia batismal! O bandeirante façanhudo carranca carregada. barba negrejante, subiu a serra e parecia que o coração aos saltos lhe saia pela boca. Lá em cima, nos corcovos da terra a serra descia e subia e voltava e sumiabrincando de esconde-esconde com o sol. O bandeirante parou extasiado e respeitoso fez o Sinal da Cruz. Depois, conclamando as gentes prá festança disparou um violento tiro de arcabuz. A serra inteira incendiou-se de luz... Veio o padre. seu vigário. todo de preto, mas alegre e brincalhão. Parece que este homem tem um sol no coração. Bem se vê que ele é destemido, destorcido. capaz de enfrentar o saci, o curupira e até assombração ! Cruz credo ! Este homem não tem medo de mula sem cabeça... Este homem dá risada do caipora e da magia dos pagés. Este homem - parece mentira ! na terra de Tupã plantou uma capelinha. Uma capelinha que diante da serra é tão pequenina, miudinha, assim deste tamanho... Mais parece uma casa de boneca essa capela... Mas essa capela tão pequena, com seu sino espevitado. desafinado. marcou o destino da terra que nascia : a marca da alegria e da bondade que os sinos de Deus imprimem na vida, nos homens, nos povos, nas cidades... E seu vigáno-jesuíta trouxe coroinhas cor de cobre uns tapuias que moravam por ali. Na cátedral verde da mata os picos da serra eram torres apontando o Infinito !

Um artista consumado, o vento sul, vento andejo. moleque endiabrado, independente como ele só, altivo como não há outro, ajeitou a ondulante cabeleira de maestro e depois com a batuta das palmeiras vaidosas, esperançosas, altaneiras, preludiou o “Glória” na ramagem da floresta. Era o início da festa ! O bandeirante chegou desajeitado carregando nos braços possantes um corpo franzino de menina. Um corpo moreno vestido do azul do céu e do branco das nuvens. O padre tirou do Lavapés a água lustral para o batismo da cidade. E enquanto falava com Deus numa língua desconhecida tomou o óleo louro do sol e com ele traçou no corpo moreno da terra o sinal da Cruz! Depois, num gesto altivo e nobre, levantou a voz e proclamou : “Em nome do Pai e do Filho e do Espirito Santo eu te batizo. Botucatu.” Pelas quebradas, pelos vales, pelas grotas, pelas picadas da serra, na paz das solidões e das malocas, o eco repetiu o nome batismal... Acordaram as tribos mal dormidas... Repetia a Natureza comovida : Este nome tem um gosto de cantiga este nome simboliza um fanal... Depois. a festança de fazer água na boca. O Lavapés alcoviteiro. novidadeiro. perdendo a languidês saiu aos pulos e aos pinotes contando umas coisas que ele ouviu. Umas coisas que não entendeu muito bem umas coisas esquisitas, uns pensamentos, umas profecias saidos da boca de seu vigário-jesuíta. No ocaso o sol se punha. O jesuíta olhou a paisagem ensangüentada de sol e erguendo o braço apontou a distância. E ali do púlpito telúrico, para as aves, para as plantas, para os bichos, para o bandeirante, pronunciou o seu sermão : - Esta cidade, meus irmãos, um dia será nossa esperança como já é nossa alegria. Do Lavapés ao ribeirão Tanquinho, do Capivara ao Tietê ao Pardo e ao Paranapanema pela terra onde zunem flechas por onde andejam as tribos erradias do Iguatemi ao Ivinhema há de impor-se o nome de Ibitucatu ! Nome, mensageiro de amor. mensageiro de fé, mensageiro de paz, um nome que há de ser símbolo para dar ao amigo um abraço, para dar à criança um regaço, para fechar os olhos do que morre, para rezar sobre a campa uma oração. Para dar ao inimigo o seu perdão! Botucatu será maior que todas as cidades, de todos os tempos, de todos continentes, de todas as idades ! Nessa avaliação não importa a riqueza, nem tamanho. O que importa é ter nobreza e coração ser trabalhador, ser honesto e ser cristão ! E Botucatu o será ! Na sua majestade sobre a serrania ela mesma confessará um dia : acima de mim, olhai vós todos, acima de mim somente existe, a cidade de Deus, o Deus que me criou ! Acervo Peabiru


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