Edição 697

Page 1

Diário da Cuesta

NA DEFESA DO

MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU

ANO III Nº 697

TERÇA-FEIRA , 31 DE JANEIRO DE 2023

CAPELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE

A Capela da Santíssima Trindade, conhecida como a Capela do Seminário “é um retrato de Botucatu nos anos 50. Naquela época, Botucatu estava vivendo um momento econômico muito importante, pois saia do marasmo em que se encontrava mergulhada nos anos 30, após a crise do café”, destacou a historiadora da arte, Maria Amélia Blasi Toledo Piza. Em 1948, o bispo Dom Henrique Golland Trindade assume o Bispado de Botucatu e imprime um novo ritmo às atividades da Igreja: “a Capela, construída nesse contexto, baseou-se na tradição dos oratórios da Alemanha, que ficam fora dos mosteiros, nos jardins, nos hortos de meditação. A Capela seria um local de meditação em meio a natureza, que abrigaria todos os seminaristas”, disse Maria Amélia. Ler artigo “A Capela da Santíssima Trindade”, página 2

NÃO HÁ
RUI BARBOSA JORNAL DA CUESTA , 22 DE ABRIL DE 2004
"A PIOR DITADURA É A DO PODER JUDICIÁRIO. CONTRA ELA,
A QUEM RECORRER"

A Capela da Santíssima Trindade

MARIA AMÉLIA BLASI DE TOLEDO PIZA

O pequeno conjunto arquitetônico que constitui a Capela da Santíssima Trindade foi construído em 1952 numa depressão de terreno nos fundos do Seminário de São José, localizado à Rua Dr. Costa Leite, em Botucatu, SP, por iniciativa de Dom Henrique Golland Trindade, então Bispo Diocesano. O arquiteto Benedito Calixto de Jesus Neto (1910-1972), conhecido por importantes obras religiosas, ergueu neste lugar um pequeno átrio cercado de duas galerias abertas em degraus, a nave com abside e a sacristia. Baseou-se no es-

tilo bizantino das basílicas do norte da Itália, conservando assim as paredes de tijolo à vista.

O interior da Capela ostenta uma única pintura, realizada na concha da abside. Trata-se de um painel semicircular, medindo 12 metros de extensão por 6 metros de altura. O painel da Santíssima Trindade foi pintado pelo artista brasileiro Henrique Carlos Bicalho Oswald (1918-1965) seguindo o mesmo estilo bizantino, porém acrescido de

elementos modernos. A pintura foi realizada com recursos mistos de tinta a óleo e têmpera sobre superfície de reboco impermeabilizado.

Representa as três figuras da Santíssima Trindade - Pai, Filho e Espírito Santo - em glória, cercados de anjos e santos. Cristo é representado como sacerdote e estende a Hóstia consagrada, símbolo do Novo Sacrifício. Os santos que constituem os dois processionais, à direita e esquerda, foram escolhidos entre aqueles que têm uma relação direta com o sacerdócio, seja por seus escritos edificantes ou por suas vidas de devoção exemplar.

Destinada aos exercícios piedosos do seminarista, a Capela teve sua função estendida ao público a partir da década de 70 com a propagação dos Cursilhos de Cristandade e especialmente aos movimentos da juventude, como o TLC - Treinamento de Liderança Cristã.

EXPEDIENTE

DIRETOR: Armando Moraes Delmanto

EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO: Gráfica Diagrama/ Edil Gomes

Contato@diariodacuesta com br Tels: 14.99745.6604 - 14. 991929689

O Diário da Cuesta não se responsabiliza por ideias e conceitos emitidos em artigos ou matérias assinadas, que expressem apenas o pensamento dos autores, não representando necessariamente a opinião da direção do jornal. A publicação se reserva o direito, por motivos de espaço e clareza, de resumir cartas, artigos e ensaios.

Diário da Cuesta 2
WEBJORNALISMO DIÁRIO
NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU
A R T I G O

DOM HENRIQUE, O ARQUITETO

Eugênio Monteferrante Netto

Dom Henrique chegou a Botucatu em 15 de agosto de 1948.

Na grande praça – denominada “Dom Frei Luiz Maria de Sant’Ana”, seu antecessor, falecido em 5 de maio de 1946 -, mesmo emocionado e atento às manifestações da multidão, contemplou, com olhos de arquiteto, a Catedral. Achou-a grandiosa, apesar de inacabada exteriormente; notou suas linhas fortes e puras, com arcos lanceolados, característicos do estilo gótico. Avaliou a sua implantação com relação à grande praça e seus prolongamentos, e considerou-a correta, pois a destacava como centro espiritual da cidade e da diocese.

Informaram-no, de antemão, estar o interior da Catedral, praticamente, acabado, e representar a concretização de um ideal de uma comunidade liderada por Dom Frei Luiz Maria de Sant’Ana

Cumprido o ritual externo, preparou-se, espiritualmente, para entrar na Catedral para as cerimônias de posse e entronização, bem como para receber as primeiras impressões do interior da mesma, ciente de que ficariam gravadas na sua memória para sempre.

Contemplou suas naves e seus suntuosos ornamentos litúrgicos. O impacto das primeiras impressões não correspondeu às suas convicções sobre a “ambiência dos lugares litúrgicos” que, de há muito, proclamava. Sem deixar transparecer qualquer emoção, dirigiu-se à Capela do Santíssimo Sacramento, onde fez breve oração e observou o altar executado num misto de mármore e estuque-lustre imitando mármore. A seguir, encaminhou-se para o altar-mor, onde fez novas orações. Observou ser o altar-mor inteiro de mármore, colocado sob enorme baldaquino com acabamento em estuque-lustre imitando mármore, que, também, abrigava uma grande estátua de Sant’Ana, padroeira da cidade, executada em gesso e pintada em várias cores.

Notou que esse conjunto foi localizado no fundo da nave central, invadindo parte do espaço da abside, a exemplo de certas igrejas antigas que atribuíam a esse espaço o simbolismo do paraíso. Constatou que essa localização dificultava a visão e a participação dos fiéis nos atos litúrgicos.

Na qualidade de Bispo Diocesano de Botucatu, iniciou seu apostolado com os mesmos ideais e procedimento com que se houve em Bonfim, adaptando-os, constantemente, às circunstâncias da nova diocese. Não mediu sacrifícios pessoais para “trazer um pouco do céu à terra” e, fiel ao seu lema SURSUM CORDA, “elevar um pouco a terra para o céu”, na certeza do que de grande poderia realizar.

Sem descuidar de preparar, com segurança, os destinos espirituais de seus diocesanos, de imediato elaborou um plano de ação para adequar as obras de seus antecessores às novas imposições litúrgicas e funcionais, bem como criar “lugares litúrgicos” de alcance religioso e social.

Contratou arquitetos para projetá-los, sempre orientando-os na composição e funcionalidade dos ambientes litúrgicos em seus detalhes, e não mediu esforços para angariar recursos para contratar a mão de obra necessária e artistas para executá-los.

Em poucos anos, realizou várias obras significativas, que contribuíram para justificar o merecido título de Cidadão Botucatuense, aprovado pela Câmara Municipal em 14 de agosto de 1956 e que lhe fora entregue em 26 de outubro de 1957. Outras obras, de maior vulto, somente foram realizadas durante o fecundo exercício de suas funções como 1ºArcebispo Metropolitano de Botucatu, dignidade a que fora preconizado pelo Santo Padre Pio XII que, em 31 de maio de 1958, elevou a Diocese de Botucatu à categoria de Arquidiocese Realizou, entre outras, as seguintes obras:

- Restauração, reforma e ampliação do Seminário São José;

- Construção da Capela da Santíssima Trindade – idealizada em seu coração para o “coração do Seminário” – magnífica pela sua implantação e arquitetura autêntica, “sem artifícios e imitações baratas, fruto de orações e recolhida em sua simplicidade”, ostentando excelente pintura de Henrique Oswald e de sua esposa Jacira, tomando toda a superfície da cúpula da abside da capela;

- Execução do revestimento das faces externas das paredes da catedral com “sirex” término das agulhas das duas torres em estrutura de madeira revestida com chapas articuladas de alumínio, encimadas por enormes cruzes;

- Instalação de quatro sinos de bronze – os Sinos do Centenário de Botucatu – e respectivo controle elétrico; vitrais e a grande rosácea da fachada principal da Catedral, por ocasião do Cinquentenário da Diocese. Construção da Igreja do Menino Deus, no Bairro Alto;

- Reforma interna da Igreja Matriz do Sagrado Coração de Jesus, na Vila dos Lavradores, decorada com pintura do casal Henrique Oswald;

- Construção da Igreja Matriz de São Benedito;

- Reforma do Convento das Servas do Senhor e construção da Capela Votiva de Nossa Senhora das Dores;

- Construção do corpo principal da Casa Santo Ignácio em Rubião Junior

- Execução do loteamento do Jardim Bom Pastor e Construção da Vila dos Meninos “Sagrada Família”, nos altos do Jardim Bom Pastor

No entanto, nutria a esperança de realizar outra grande obra, arquitetada em seu íntimo desde que recebera, de forma desfavorável, as primeiras impressões do interior da Catedral no dia de sua posse. Durante mais de dez anos, manteve, resignadamente, inalterado o interior da Catedral, em respeito a seu antecessor e à comunidade – clero, fiéis, doadores, construtores e artistas, que não mediram esforços para erigi-lo em

homenagem ao Altíssimo e à senhora Sant’Ana.

No começo de 1959, reconhecendo, com lealdade e clarividência, não mais ser possível manter a situação interna da Catedral, tomou a decisão de dar os primeiros passos no sentido de reformá-la. Com auxílio de arquiteto, consolidou suas ideias em projetos arquitetônicos. Submeteu-os à apreciação do Núncio Apostólico no Brasil, o Arcebispo Dom Armando Lombardi, quando de sua estada em Botucatu, para proceder a instalação da Arquidiocese, em 12 de abril de 1959, que os aprovou e abençoou.

Arquitetou a estratégia para assegurar o bom êxito da reforma, ciente de que iria enfrentar dificuldades, principalmente as criadas pelas pessoas afeiçoadas àquela composição interna.

De início, entendeu-se, pessoalmente, com vários benfeitores da Catedral, expondo-lhes o sentido e o alcance da reforma, e de todos recebeu palavras de aprovação e encorajamento. Em seguida, com muita diplomacia, estabeleceu um procedimento contínuo de “pregação sobre ambiência litúrgica”, para a todos conscientizar da suprema razão de adequar o interior da Catedral, aos legítimos anseios de renovação espiritual, proclamando-a como “ a volta ao autêntico espírito litúrgico de participação mais ativa dos fiéis, em pleno contato com o celebrante e não como meros espectadores mudos e informes do Santo Sacrifício”. Em outras palavras, “ não se tratava de deixar a Catedral mais bonita, mas sim, de deixá-la mais ampla, sóbria, litúrgica e funcional”. Divulgou seu propósito de não pedir auxílio financeiro a seus fiéis, atitude que os induziu a colaborarem espontaneamente.

Sob sua orientação, as obras da reforma foram iniciadas em maio de 1961. Dos ornamentos litúrgicos, apenas o altar-mor e a mesa da comunhão, por terem sido construídos em mármore legítimo e constituírem preciosidades, foram, cuidadosamente, desmontados, para posterior reconstrução na Capela do Santíssimo Sacramento. Os demais ornamentos – baldaquino, altares e púlpitos – foram totalmente demolidos em razão de suas inadequadas localizações e da artificialidade de suas suntuosas confecções, de elevado padrão artesanal, mas sem nenhum valor artístico. Os pisos e estruturas de concreto, existentes entre o início do cruzeiro e o fundo da abside, foram totalmente demolidos.

Removidos os entulhos, contemplou a grandiosidade dos espaços e em cada um deles visualizou o seu ideal de como ocupá-los : sob a cúpula seria colocado o novo Altar-Mor, que seria, também, o Altar das Relíquias dos Santos Mártires – Urbano, Mansueto e Pacífico; o baldaquino seria a própria cúpula sustentada pelos quatro pilares principais do templo; do segundo arco do cruzeiro, de frente para a porta de entrada, penderia um grande Crucificado de madeira; na parede principal do fundo da abside, seria construído um modesto nicho para abrigar a artística e veneranda imagem da Senhora Sant’Ana, de origem portuguesa e esculpida em madeira; logo abaixo e à frente desse nicho estaria o Altar de Sant’Ana; entre o cruzeiro e o início da abside, seriam construídas as estalas do cabido; as pinturas das paredes seriam na cor branca e a das colunas e arcos na cor de tijolo; as colunas do baldaquino seriam pintadas na cor cinza, para destacá-las do conjunto; na Capela do Santíssimo seriam reconstruídos o altar-mor e a mesa de comunhão, retirados da abside; a sacristia seria valorizada como espaço litúrgico; junto à sacristia seriam construídas pequenas capelas para São José e Nossa Senhora Aparecida; a balaustrada do coro seria toda de madeira, colocada no sentido vertical; os vitrais seriam compostos apenas com vidros coloridos para criar a ambiência que convida à oração e ao recolhimento; os vitrais redondos, próximos da cúpula seriam compostos com vidros nas cores natural e âmbar para transmitirem mais luz sobre o altar-mor, valorizando-o como “Mesa do Senhor entre os Homens”; as imagens dos santos e da Via Sacra seriam pintadas na cor de tijolo, transmitindo a ideia de despojamento e escondendo “o mau gosto das figuras pintadas em cores berrantes, com corpos e trajes respingados de tinta imitando sangue...”

Prontos em seu íntimo, restava-lhe transformá-los em realidade. Para tanto, não mediu esforços e sacrifícios. Coordenou todas as atividades dos construtores, artistas e colaboradores, e sempre controlou seus desenhos, mesmo de longe, quando participava do Concílio Ecumênico Vaticano II. Em tudo fez prevalecer a busca constante da arte, através da simplicidade e da autenticidade dos materiais empregados, afirmando: “ferro é ferro, madeira é madeira, pedra é pedra, tijolo é tijolo, nada de imitações baratas”. Esclarecia aos fiéis sobre o andamento das obras, ao mesmo tempo em que agradecia as contribuições espontâneas, através de publicações quinzenais no jornal “Monitor Diocesano”. Com a coragem da continuidade e das adaptações constantes às novas circunstâncias, concluiu a reforma da Catedral, cuja composição agradou a todos e antecipou, em muitos pontos, as decisões litúrgicas proclamadas pelo Concílio.

Cumpriu o que prometeu: fazer a reforma interna da Catedral de modo a torná-la Digna, Sóbria, Litúrgica e Funcional.

Preparou-se para receber a SAGRAÇÃO, que ocorreu aos 30 de agosto de 1964, pelas mãos do Núncio Apostólico no Brasil, o Arcebispo Dom Sebastião Baggio.

Solicitou ao Santo Padre Paulo VI a elevação da Catedral à dignidade de Basílica Menor, no que foi atendido em 27 de novembro de 1965, sendo a primeira do Brasil dedicada à Senhora Sant’ana

Continuou suas atividades eclesiásticas até 18 de abril de 1968, quando, espontaneamente, renunciou ao múnus da Arquidiocese, sendo substituído pelo Arcebispo Metropolitano Dom Vicente Marchetti Zioni, empossado aos 12 de abril de 1969.

Recolheu-se, como Arcebispo Resignatário, na Casa dos Meninos “Sagrada Família”, onde, no alegre convívio com seus orfãozinhos queridos e assistidos pelas Irmãs das Servas do Senhor, permaneceu até os últimos dias de sua santa vida.

Faleceu no Convento das Servas do Senhor aos 6 de novembro de 1974. Foi sepultado na cripta de sua querida Catedral Basílica Menor de Sant’Ana. A divina providência reservou-o para Botucatu para todo o sempre...

Diário da Cuesta 3
Diário da Cuesta 4 JORNAL DA CUESTA, 22 DE ABRIL DE 2004

Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.