Edição 855

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Diário da Cuesta

3 de agosto de 1988: fim da censura e da tortura no Brasil

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Corajosa entrevista deste valoroso representante da quarta geração da Família Mesquita: desde Júlio Mesquita, Júlio Mesquita Filho e Ruy Mesquita... Página 3

Na defesa

da

CIDADANIA e do PLENO ESTADO DE DIREITO todos temos que lutar pela DEMOCRACIA

NA DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DA CIDADANIA EM BOTUCATU ANO III Nº 855 QUINTA-FEIRA , 03 DE AGOSTO DE 2023 Acompanhe as edições anteriores em: www.diariodacuesta.com.br
“Alexandre de Moraes é um fora da lei”, diz Fernão Lara Mesquita

3 de agosto de 1988: fim da censura e da tortura no Brasil

Brasil inclui fim da censura na Constituição

Nesta data, em 1988, a Assembleia Constituinte incluiu na Carta Magna o veto a toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística

Por Pedro Fuini

Hoje na História

“O fato [...] de não mais existir um aparato oficial responsável pela censura prévia e dela ser proibida não impossibilitam, infelizmente, sua ocorrência”, afirma Cecília Riquino Heredia ao falar sobre os dias atuais (Arte: Pedro Fuini)

Pai, afasta de mim esse cálice

Na famosa canção de Chico Buarque, o jogo de palavras com as expressões “cálice” e “cale-se” faz um ataque disfarçado ao autoritarismo do Estado brasileiro durante a Ditadura Militar (1964-1985). “Cálice”, escrita em 1973 por Buarque e Gilberto Gil, não passou despercebida pelos censores e só conseguiu liberação para lançamento em 1978. A censura à canção nesse período da história foi tema da pesquisa de Cecília Riquino Heredia, Mestre em História Social pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP.

EXPEDIENTE

A pesquisadora contesta o senso comum de que os censores eram facilmente driblados por metáforas sofisticadas. “[Havia uma] busca dos mesmos em vestir uma roupagem intelectual, demonstrando conhecimentos específicos para justificar e legitimar suas decisões em relação ao veto ou aprovação (deveriam, por lei, possuir diploma em Ciências Sociais, Direito, Filosofia, Jornalismo, Psicologia, História ou Pedagogia).” Ela afirma ainda que se tratava de um sistema eficiente, com alto nível de comunicação interna, padronização e preocupação com sua imagem perante a opinião pública.

O Serviço de Censura de Diversões Públicas (SCDP), herança do Estado Novo, e responsável pelo exame de músicas, livros e programas televisivos, por exemplo, era orgulhosamente reconhecido pelo regime, em oposição à censura à imprensa, negada pelo regime, de acordo com Heredia. “Não existia um órgão que formalmente realizasse a censura prévia aos jornais, embora ela ocorresse de maneira sistemática, muitas vezes nas próprias redações, através da presença de um técnico responsável por analisar a edição que seria publicada”.

Em 3 de agosto de 1988, a Assembleia Constituinte incluiu na Carta Magna a proibição de qualquer tipo de censura. “O fato, contudo, de não mais existir um aparato oficial responsável pela censura prévia e dela ser proibida não impossibilitam, infelizmente, sua ocorrência”, afirma.

NOTA: Chico Buarque de Holanda e Gilberto Gil, autores da música, hoje estão a favor do governo do PT que está trabalhando pela limitação da liberdade de expressão e da censura pelos chamados, em narrativa, de “atos antidemocráticos”...rsrsrs

DIRETOR: Armando Moraes Delmanto

EDITORAÇÃO E DIAGRAMAÇÃO: Gráfica Diagrama/ Edil Gomes

Contato@diariodacuesta.com.br

Tels: 14.99745.6604 - 14. 991929689

O Diário da Cuesta não se responsabiliza por ideias e conceitos emitidos em artigos ou matérias assinadas, que expressem apenas o pensamento dos autores, não representando necessariamente a opinião da direção do jornal. A publicação se reserva o direito, por motivos de espaço e clareza, de resumir cartas, artigos e ensaios.

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“Alexandre de Moraes é um fora da lei”, diz Fernão Lara Mesquita

FOLHA DA POLÍTICA

O avô do meu entrevistado de hoje foi preso 17 vezes e exilado durante a ditadura de Getúlio Vargas, o famigerado Estado Novo. Fernão Lara Mesquita faz parte da quarta geração de jornalistas da família que por mais de um século esteve à frente do grupo O Estado de S. Paulo. Com 50 anos de profissão, o neto de Júlio de Mesquita Filho e filho de Ruy Mesquita, ambos grandes nomes da imprensa brasileira, segue a tradição familiar na defesa da liberdade e da democracia. Em seu blog Vespeiro e agora como comentarista da Jovem Pan, Fernão não tem usado meias-palavras para denunciar os abusos ditatoriais do STF e o processo golpista que está conduzindo Lula de volta à Presidência da República. “No Estado Novo, o Estadão foi invadido com baioneta calada e tomado da família Mesquita. Hoje está acontecendo a mesma coisa no Brasil, com a diferença de que tudo se dá no mundo virtual”, compara o jornalista. Veja a seguir os principais trechos da entrevista que ele concedeu ao BSM:

BSM: Você vem de uma família que enfrentou a censura e os ataques à liberdade de expressão. Hoje em dia, nas redações, muitos jornalistas justificam e até aplaudem a censura. Como o jornalismo brasileiro chegou a esse ponto?

Fernão Lara Mesquita: Os jornais são ferramentas de luta política. Nascem por iniciativa de indivíduos que travam essas batalhas. Meu bisavô era abolicionista e republicano na São Paulo do Império e dos barões do café. Ele sonhava com o modelo de república americana, que está descrito no Manifesto Republicano. E o Brasil, mesmo o Brasil supostamente revolucionário, sempre esteve dividido entre essa corrente americana e a corrente francesa, que é adoradora do Estado. Os jornais foram fundados por indivíduos como o meu bisavô. Eram ferramentas de luta, depois viraram negócios. Esses fundadores vão tendo filhos, que vão tendo outros filhos, e de repente o jornal tem um monte de donos, dos quais frequentemente nenhum é jornalista, e entregam as suas redações a profissionais que, hoje, na verdade são profissionais da luta pelo poder. A esquerda é especialista em aproveitar espaços no sistema. Quando comecei no jornalismo, em 1972, tinha de tudo na redação: médico, engenheiro, advogado, padre... O que a esquerda fez? Conseguiu a obrigatoriedade do diploma de jornalismo. Então, eles ocuparam as escolas de jornalismo. Jornal é um produto feito em poucas horas, por muitas pessoas. Esse processo só é controlável se você estiver lá dentro e conhecer todas as etapas da produção e acabe por estabelecer um grupo de jornalistas que atue dentro de um esquema de lealdade, de olho no olho. É impossível controlar esse processo a distância. Nem o Elon Musk consegue.

BSM: O processo que nós estamos vivendo no Brasil hoje é comparável às crises de 1937 (início do Estado Novo) e de 1964 (início do regime militar)?

Fernão Lara Mesquita: O Estado Novo era uma ditadura formal. Não havia essa trapaça que temos hoje, em que os ditadores fazem questão de se intitular defensores da democracia. Hoje eles chamam a antidemocracia de democracia e vice-versa. Eles se apropriam dos termos do vocabulário democrático. Então fica essa enganação. Em 1937, não houve fingimento: eles revogaram a Constituição e fizeram um imenso “AI-5”, atribuindo todos os poderes aos Alexandres de Moraes da época. Não havia a tapeação de hoje Hoje o outro lado, que se obriga a seguir as formalidades da lei e a respeitar o processo legítimo, fica em um beco sem saída, tentando usar argumentos racionais para combater aquilo que não é racional, é apenas violência, exercício de violência: “Perdeu, Mané”. É revólver na tua cara, eles não estão querendo te convencer de nada, eles estão te dando um “dá ou desce”. Mas o que acontece hoje é tão violento quanto 1937 – e muito mais violento do que 1964. Olha, 64 era uma brincadeira perto de hoje. Nós tínhamos censura no Estadão, mas nós não permitíamos que os censores ficassem na redação. Eles ficavam nas oficinas, cortando uma ou outra matéria, às vezes pedaço de matéria, que eles tiravam e nós avisávamos ao leitor que a matéria tinha sido censurada. Hoje os caras fuzilam a pessoa que alguma vez falou contra o regime. Essa pessoa fica banida das tribunas em que hoje você pode expressar o pensamento, as redes sociais. Acontece que essas tribunas também são a praça pública em que se dá o processo econômico. Então essas pessoas ficam banidas também da vida econômica, ficam proibidas de trabalhar, de ganhar dinheiro, são “desmonetizadas”. Não exigem só o silêncio: tem que passar fome também É uma ditadura brutal, como nunca houve no Brasil

BSM: Até onde pode chegar essa ditadura que se instalou no Brasil?

Fernão Lara Mesquita: Os adversários do regime ainda não precisam ser eliminados fisicamente – mas pode ser que chegue nisso. Se não houver uma reação, pode acontecer o que aconteceu na Venezuela. Eles armaram o MST de lá com fuzis Kalashnikov e fuzilam que participa de manifestações. É possível que o Brasil chegue a esse ponto, eu não duvido nada, pela violência com que esses caras estão vindo. Depois que descondenaram o criminoso, eu enxerguei o que estava por vir. Tenho repetido o alerta: a diferença do Lula de outras vezes para o Lula atual é que hoje ele se sente dispensado de convencer as pessoas com argumentos. Ele não precisa disso. Ele não fez nenhum projeto, ele não acenou com nada em termos de governabilidade, a não ser churrasco com cerveja. Ele sabia que a eleição estava roubada e que iria acontecer esse assalto eleitoral. Então, agora é na porrada: ele não quer convencer. Ele não apresenta um argumento, no máximo fala em “pacificação”. Pacificação? Enquanto isso, o Alexandre de Moraes atira em todo mundo?

BSM: Você tem ressaltado sempre que o STF impediu a produção de provas contra a fraude eleitoral. Como isso aconteceu?

Fernão Lara Mesquita: Essa é a natureza do golpe – algo que sempre foi a especialidade da esquerda. Ela assiste ao espetáculo, vê o que é decisivo no espetáculo e diz assim: “E se a gente invertesse esse negócio?” Mas isso é uma construção longa e paciente: só a eliminação da prova da fraude levou 13 anos sendo construída. Em 2009, o Brasil implantou o primeiro passo de uma reforma eleitoral, com o uso de uma urna eletrônica que previa a instalação de uma impressora acoplada. Nesse momento, entra o STF e com argumentos completamente fúteis – “Se enguiçasse uma impressora, poderia ser quebrado o sigilo do voto...” – anulou o voto impresso. Em 2015, o Congresso foi lá de novo e votou maciçamente a favor de acoplar a impressora na urna. O STF foi lá e derrubou de novo. Depois, foi aprovado de novo, e Dilma vetou e o veto foi derrubado pelo Congresso. O STF derrubou de novo. É uma construção, uma marca registrada da esquerda, que sempre trabalhou assim e é competentíssima nisso. A esquerda tem um treino de 150 anos na construção de falcatruas. Eles vão aperfeiçoando, têm uma rede internacional, aplicaram o mesmo golpe na Venezuela. Tudo isso foi estudado meticulosamente no Foro de S. Paulo

BSM: Você tem insistido que as manifestações populares estão no endereço errado. Para onde as pessoas deveriam ir?

Fernão Lara Mesquita: A reação do povo é fundamental – e a vitalidade da democracia brasileira até me surpreendeu. Eu só espero que essas manifestações populares não sejam o canto do cisne da democracia brasileira. Na verdade, nós estamos correndo atrás de um prejuízo que tem

milhares de anos. Nós somos filhos da contra-reforma, estamos acostumados com isso. Mas a reação da metade da população – e eu acredito que seja mais da metade, porque a eleição foi falsificada – é a primeira vez que se levanta a censura no Brasil. Mesmo a parte da imprensa que sinceramente se dizia democrática estava tão acostumada a não ouvir outra coisa que era incapaz de pensar diferente. E, de repente, veio a internet, que suspende essa censura. Primeiro, caiu a censura da autorreferência: a imprensa é uma classe média, que se refere a si mesma. Os jornalistas só se falam entre eles, ficam naquela panelinha entre universidades e imprensa, e esse pessoal domina o país. Por isso, com a internet, nós temos primaveras no mundo inteiro, com a reação de uma outra parte da classe média, meritocrática excluída. O pessoal que dominava a imprensa e a universidade era a mesma turma do funcionalismo público, uma turma que tem privilégios enfiados na Constituição – garantindo que eles ganhem mais que os outros, tenham mais direitos que os outros, sejam intocáveis. De repente, a internet rompe essa censura e a massa dos excluídos começa a se reconhecer e enxergar o seu próprio tamanho, vai pra rua e começa a se manifestar. E faz isso de modo tosco, improvisado, porque não tem traquejo pra isso. Não tem a burilação da universidade, da mumunha, do refinamento da corte – e é isso que aterroriza essa turma dos privilégios. Aí aparece um Bolsonaro, que é um bruto, um bronco, mas está falando a verdade. É o homem que veio de Eldorado Paulista (Xiririca). Eu conheço Xiririca, eu adoro mato. Bolsonaro é o cara que veio dali, que não tem esse traquejo, nem quer ter. É uma “invasão dos bárbaros” que horroriza a corte.

BSM: Como você vê essa PEC da Gastança?

Fernão Lara Mesquita: Eu sempre tive um fascínio especial pela Inglaterra, porque foi ela que inventou a democracia moderna. Os ingleses sempre tiveram esta inteligência e objetividade: Follow the money. Faça uma viagem pela Europa, veja os castelos franceses: é tudo folheado a ouro, aquela coisa luxuosa, riquíssima. Os castelos ingleses são de pedra e madeira. O rei, na Inglaterra, sempre foi mantido pobre. Não tem dinheiro para ter um exército, nunca teve. Quer fazer uma guerra? Tem que pedir dinheiro ao Parlamento. Isso resultou que em 1689 o Parlamento inglês tinha os mesmos poderes que tem hoje – e o rei estava under God and under the law (sob Deus e sob a lei). Os ingleses inventaram assim democracia: deixando o rei a pão e água. Mas aqui, se o Congresso abrir as pernas e entregar 200 bilhões para o Lula, o Lula não precisará mais do novo Congresso Então ele está subornando um Congresso em fim de legislatura para ter um passe livre e não se aborrecer com o Congresso que vem por aí, muito mais adverso a ele. Mas a PEC vai ser aprovada, e num valor obsceno. Mesmo um valor menor que o de R$ 200 bilhões –digamos, R$ 60 bilhões para o Auxílio Brasil – deveria ser garantido como vinha sendo feito no governo Bolsonaro: cortando gastos, fazendo ajustes. É mentira que a economia brasileira esteja bombardeada. Tudo está em nível de recorde: emprego, crescimento, inflação, etc. O Paulo Guedes é, de longe, a maior perda que nós estamos tendo agora.

BSM: Mas, na prática, o Alexandre de Moraes fechou o Congresso.

Fernão Lara Mesquita: Sim, fechou – e vai fechando. Mas eles querem manter as aparências, porque fica difícil, no mundo de hoje, um país do tamanho do Brasil virar a Venezuela, sobrevivendo com tráfico de cocaína. É melhor então manter essas aparências. O resto da Europa – Macron, essa Europa latina – é a mesma merda que nós. Nós aprendemos com eles. Tudo podre, tudo na teta, todo mundo pendurado no governo.

BSM: Você acredita que a melhor estratégia do movimento popular agora seria centrar forças em eleger um presidente do Senado independente e com coragem para enfrentar o STF?

Fernão Lara Mesquita: Sim, esse é o caminho. A alternativa militar é complicada. 1964 era para durar até 1966; durou 21 anos. Porque militar é a mesma merda que o resto da humanidade: na hora que ele se senta na cadeira e se sente no poder, não quer mais sair. Vira o Lula –evidentemente com grandes diferenças no que se refere a desonestidade e falta de compromisso com qualquer coisa que se pareça com ética. Mas o poder é o poder – e ele seduz. Portanto, a alternativa que existe é enquadrar o Congresso. Depois, mais adiante, fazer a revolução que definitivamente enquadra o Congresso – a revolução do voto distrital, do recall, dos projetos de lei populares, de referendo das leis do Executivo, da renovação de mandato dos juízes. Antes de soltar os tanques na rua e atirar com os canhões, há uma série de conversinhas privadas. E é só um lado que está fazendo isso. Alexandre de Moraes e todos esses fora da lei a serviço do golpe estão chamando um por um os deputados e senadores para dizer: “Você vai se ferrar, eu vou te pôr em cana”. Só o que eles têm de conversa gravada da Vaza Jato – inclusive de mim e de você – coloca todo mundo no bolso. O lado de cá deveria estar fazendo a mesma coisa: “Olha aqui, se você não ajudar a restabelecer a lei e a ordem, vou ferrar com você”. Essas pressões valem muito. Ninguém precisa necessariamente sair com os tanques na rua e ocupar o palácio. O presidente Bolsonaro deveria estar fazendo isso. Ele fica com essa coisa de “Olha, excelência, general, data vênia, posso liderá-los”. Não adianta nada Tinha que chegar dizendo: “Quem for brasileiro me siga: Marcha pro Senado!” Os generais iam todos prestar continência e seguir para o Senado. Bolsonaro também poderia descumprir uma ordem dos bandidos. Ir para o confronto. Esses caras estão fora da lei. Nada do que o Alexandre de Moraes tem suporte em qualquer lei ou na Constituição Brasileira Ele é um fora da lei. E fora de lei se trata com poder de polícia. Quem tem poder de polícia? O Senado. Mas o Senado também tem um regimento que também foi construído – como se fez com a eliminação da prova de fraude. Esse regimento dá poderes a um indivíduo para bloquear o Senado inteiro. Para destravar essa coisa, nós precisamos dessa posição. Por isso, temos que concentrar toda força do Brasil que está na rua nesse indivíduo: Rodrigo Pacheco. Se fizermos isso dez segundos, ele desmancha no ar. Porque o Brasil tem uma força gigantesca – mas essa força está aí, oferecida nas ruas, e ninguém pega. Se não queremos partir para uma ação militar que nós sabemos como começa e não sabemos como acaba, a saída é essa.

BSM: Você tem medo do Xandão?

Fernão Lara Mesquita: Eu tenho certeza que ele vem pra cima de mim. Já tiraram O Vespeiro do ar por 24 horas, não sei se foi só uma experiência. Porque chegou uma hora em que eu decidi sair da minha zona de conforto e ir para a televisão, para o rádio. Meu avô foi preso 17 vezes... Minha avó contava que eles já viviam com uma maletinha pronta que ficava na porta do apartamento. Porque de vez em quando chegaria o policial com a mesma conversa: “Dona Marina, a sra. me desculpe, eu tô cumprindo ordens, tenho que levar o Dr. Júlio...” Estamos reduzidos a isso outra vez.

BSM: Se pudesse dizer algo ao presidente Bolsonaro, o que diria?

Fernão Lara Mesquita: Mexe a bunda, cara! Vai! Levanta da cadeira! Toda essa situação está prevista na Constituição. Pela ordem dos fatores, a primeira instância é o Senado. Juntar a força armada, a força popular e a força política para empoderar o Senado e dizer: “Xandão, você tá em cana, acabou”.

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tem marcado minha caminhada nesta vida”.

AMD: Arruda Camargo foi quem abriu as primeiras portas para mim.

Em 1969, eu tinha coluna diária no “DCI - Diário do Comércio & Industria”, além de colunas nos semanários “Shopping News” e “City News”. O tema era sempre a participação dos jovens na renovação política e na construção da cidadania. Essa atuação nos jornais serviu para amenizar a frustração de não ter podido trabalhar no “Estadão”: no ano de 1967, já havia sido bem sucedido em entrevista para começar como revisor no jornal, através de seu então redator-chefe, jornalista Flávio Galvão, quando recebi pedido irrecusável de meu pai para fazer um trabalho político junto ao novo governador. Mudança radical no rumo de meus projetos...

Com o Arruda Camargo, em60, uma experiência que foi marcante. Ainda calouro da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP), fui com o Arruda Camargo a uma reunião na casa do poeta Paulo Bomfim, quando fui apresentado por ele à “verdadeira instituição cultural” que era Aureliano Leite e para a “lenda viva”, o “Tribuno da Revolução Constitucionalista”, Ibrahim Nobre... Dá para imaginar o que isso significou para um jovem estudante “botucudo” que chegava à capital cheio de sonhos e encontrava, de uma só vez, os referenciais maiores da alma paulista?!?

Em 1966, portanto há mais de 50 anos, é o roteiro de minha crença política que tem marcado minha caminhada nesta vida. Claro que há tanto tempo e ainda cursando a universidade, o roteiro ainda não estava completo em sua indispensável pesquisa e estudo necessários. Mas é, em sua essência, o mesmo. Naquele ano, militante político na Sociologia e Política, mantinha contatos políticos com Carlos Lacerda, já então ferrenho adversário do Regime Militar e idealizador da Frente Ampla, com Jango e Juscelino, pela volta do país à democracia

Em 1966, participei do lançamento do livro “Crítica & Autocrítica”, de Carlos Lacerda; e publicava, no moderno “Jornal da Tarde”, do Grupo Estado, minha posição a favor da renovação política brasileira:

“NEM CONTRA, NEM A FAVOR...”

Sr. Redator: Em toda a política do Brasil - politicalha - não se tem dado o devido valor à verdadeira Revolução Brasileira, aquela que começando com Rui Barbosa ainda não se completou, até hoje. O grande obstáculo para renovar os ideais da nossa política é a figura com a mentalidade pessedista dos “nem contra nem a favor, muito pelo contrário...”

Após Rui, entre muitos houve Armando de Salles Oliveira - o último paulista que poderia realmente ser chamado barra limpa. Vieram depois as grandes figuras de Eduardo Gomes e Carlos Lacerda - cuja capacidade de renovação fará com que se levante e retome a direção da verdadeira e única revolução.

Certamente, o marechal-presidente sabe do ridículo papel que está assumindo na nossa história política, só comparável ao de Getúlio Vargas. Ele sabe que essa que diz ser a revolução - a irreversível revolução - é uma farsa. Na Revolu-

ção Brasileira não há lugar para um A de Barros, nem para homens como Negrão de Lima e Israel Pinheiro, para citar os mais conhecidos.

Nem para Bob Fields, ou para um Congresso como o atual, e as assembléias atuais. Na Revolução Brasileira o Exército tem que ter um objetivo e razão de ser - patriotismo e eficiência - e não ser transformado em motivos de chacotas e fofocas. O Brasil tem que assumir o seu papel de líder e não tornar-se um “yes man”.

Em nossos dias a elite no poder tem como primeira finalidade alienar a juventude, matando assim a força propulsora, a única capaz de acordar o gigante adormecido.

Essa juventude que, agora, deve unir-se e fazer da brasilidade uma feliz e presente realidade. E do entreguismo e esquerdismo medíocre parte daquele passado que não voltará.

É necessário compreender que temos, em primeiro lugar, o Brasil, e faze-lo assumir o seu papel. “O destino aí está, manifesto: a grandeza territorial impondo-nos a consciência de que somos por obra e graça dos que não acreditaram nos deixa-disso a nação destinada à hegemonia da América Latina; para, uma vez adquirida essa hegemonia, impor ao continente as soluções nossas - e não dos outros, que tem outro destino, às vezes conflitante com o brasileiro.”

A chave do prosseguimento da Revolução está na união da juventude, especialmente da classe estudantil. Não será demais repetir: “...que temos a certeza de que um dia, não importa quando, haverá um eco à nossa voz e um apoio à nossa verdade.” - Armando M. Delmanto - Capital.

- Por falta de espaço, tivemos que resumir a matéria que você enviou, sobre a situação atual do estudante brasileiro. Satisfeito?”

(“JORNAL DA TARDE”, de 10/06/1966, na Coluna:”SÃO PAULO PERGUNTA”)

Nota do Autor: As citações da carta são do professor Oliveiros S. Ferreira, à época Professor de Ciência Política do Curso de Ciências Sociais/USP e Diretor de Redação do “Estadão” e do jornalista Carlos Lacerda, Político, Escritor e Diretor da Editora Nova Fronteira.

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TESTEMUNHO: “...é o roteiro de minha crença política que

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