Viva Mandela
Direitos Humanos Revista de Formação Político-Pedagógica do SINTESE
www.sintese.org.br
nº 29 - Sergipe - novembro/dezembro - 2013 R$ 5,00
O racismo que mata os negros
A luta das mulheres negras no Brasil: política, trabalho e estética 1
2
primeiras palavras
Nosso nome é Resistência! Basta observarmos a situação das mulheres negras brasileiras para verificarmos que estamos muito distantes de qualquer nível de democracia étnico-racial. Negação da sua estética nos meios de comunicação, desigualdade salarial em comparação a homens que exercem a mesma função, tratamento vezes como escrava vezes como objeto sexual. São apenas algumas das marcas da profunda opressão que sofrem as mulheres negras em nosso país. Nessa última edição de 2013, a Revista Paulo Freire escancara essa realidade de desigualdade e apresenta reflexões necessárias num país em que a cor da pele, dos olhos ou o tipo do cabelo ainda parecem determinantes na definição de papéis sociais. O texto de abertura dessa edição, de autoria da educadora sexual e ativista dos Direitos Humanos, Jarid Arraes, demonstra como uma das maiores particularidades do racismo brasileiro é o modo como o preconceito se esconde sob a máscara de um país racialmente democrático. Jarid toma o exemplo de opressão que vivem as mulheres negras para mostrar que o racismo dos brasileiros está na vida cotidiana, muitas vezes em atitudes sutis e comentários aparentemente inofensivos. Com o título “Mulheres negras: o desafio de construir a igualdade!”, as sindicalistas Rosane de Deus e Rosana Silva apresentam dados e argumentos que apontam para a necessidade de mudanças estruturais que alterem a vida das mulheres e da população negra e ressaltam a importância de pensarmos a discriminação de gênero e raça não apenas como uma manifestação cultural, mas também como consequência de uma estrutura patriarcal, machista e racista que tem consequências materiais na vida das mulheres. Nas páginas 8 e 9, reproduzimos uma entrevista com Rodrigo Leandro de Moura, pesquisador do IPEA. Ele apresenta os dados e análises da mais recente pesquisa feita
pelo instituto sobre a morte de jovens negros nas capitais brasileiras. O pesquisador não tem dúvidas: o motivo dos altos índices de mortes da população negra é o racismo. Reproduzindo um artigo do site Blogueiras Negras, essa edição da Revista Paulo Freire mostra ainda como o racismo se manifesta também sobre os cabelos e penteados das mulheres negras no Brasil. Diz o texto: “o cabelo e seus penteados sempre possuíram uma grande importância para o povo africano, pois, através dele demonstram a ocupação de cada pessoa da nação, sua inserção em novos períodos de vida, dentre inúmeros significados que não chegaram a nós”. Como sugestão para o trabalho de educadores e educadoras, apresentamos 10 filmes que tratam da discussão entre o racismo e a educação e que podem ser utilizados em sala de aula. São filmes nacionais e estrangeiros, acessíveis na internet, que revelam o poder da educação na superação das desigualdades. Ainda nessa última edição de 2013 temos um artigo da articuladora do Movimento Nacional de Direitos Humanos em Sergipe, Lídia Anjos, e uma homenagem ao poeta sergipano Mário Jorge, na página do Coletivo Saber e Poesia. Por fim, não poderíamos deixar também de, nessa edição, prestar a nossa homenagem ao líder político Nelson Mandela, um dos principais expoentes da luta por liberdade, cidadania, pelos direitos humanos e pela democracia em todo o mundo. Que a história de vida e de resistência de Mandela continue a nos inspirar na luta por uma sociedade sem opressões e por um mundo em que prevaleçam a justiça social e a igualdade. Boa leitura! Ângela Melo Presidenta do Sintese
onde achar Nem escrava nem objeto O desafio da igualdade
04 06
Racismo e Educação em filmes Entrevista Estética negra e invisibilidade
08 10
Nelson Mandela Direitos Humanos: um novo olhar
Revista de Formação Político-Pedagógica do SINTESE Rua Campos, 107 – B. São José - Aracaju-Se CEP: 49015-220 revistapaulofreire@sintese.org.br www.sintese.org.br
Redação e Assinaturas Telefax: (0**79) 2104-9800 Paulo Victor Melo Editor (DRT/BA: 3548)
Diego Oliveira
Coordenação Gráfica (DRT/SE 1094)
Conselho editorial: Angela Melo, Joel Almeida, Lúcia Barroso, Hildebrando Maia, Janieire Tavares, Ana Luzia, Ivonete Cruz, Edileide Barrozo, Franklin Magalhães, Elda Góis Os artigos assinados nesta edição não refletem necessariamente o entendimento da direção do Sintese.
FALE CONOSCO
Tel: (79) 2104-9800 (Bárbara Eloah) E-mail: revistapaulofreire@sintese.org.br
12 14 16
ASSINATURA SOCIAL - R$ 150 (12 exemplares) ASSINATURAANUAL NÃO FILIADOS - R$ 100 (12 exemplares) ASSINATURAANUAL NOVOS-FILIADOS - R$ 60 (12 exemplares) ASSINATURAANUAL FILIADOS - R$ 60 (12 exemplares)
3
Sociedade
Mulher negra: nem escrava, nem objeto Jarid Arraes* Uma das maiores particularidades do racismo brasileiro é o modo como o preconceito se esconde sob a máscara de um país racialmente democrático. Com a justificativa de que o Brasil não enxerga cor e que é composto quase totalmente por pessoas miscigenadas, discursos de ódio são reproduzidos a todo momento. O racismo dos brasileiros está na vida cotidiana, muitas vezes em atitudes sutis e comentários aparentemente inofensivos. Essa realidade cria limites muito palpáveis sobre as possibilidades e oportunidades das pessoas negras, podando as opções de quem podem ser e até onde podem chegar na vida. Não é por acaso que uma das lutas atuais do movimento feminista negro é pela quebra de estereótipos; por meio dos estereótipos e papéis sociais impostos para as mulheres negras, a questão do racismo acaba empurrada para debaixo do tapete. Onde há discriminação e exclusão, levanta-se uma falsa admiração, que na realidade é objetificação sexual e exotificação da mulher negra. Ou seja, para cobrir o preconceito que vem sendo nutrido e espalhado há séculos, rotula-se a mulher negra com as poucas permissões que lhes são concedidas. Para gerar a consciência antirracista tão necessária, é preciso em primeiro lugar compreender a violência das caricaturas impostas às mulheres negras.
4
Não importa se querem sonhar mais alto ou se têm algum problema legítimo, se estão doentes ou passando por um período de luto – algo bastante frequente devido ao genocídio policial contra os homens negros -, as mulheres negras nascem e crescem com poucas alternativas
A escrava - O estereótipo de mulher trabalhadora e incansável é um dos mais antigos e reforçados, vigorando há centenas de anos e se adaptando às mudanças econômicas e culturais da sociedade. Se séculos atrás a mulher negra era usada e explorada como trabalhadora braçal, supostamente dotada de resistência física infinita, na contemporaneidade esse papel continua sendo intenso, as mulheres negras ainda são exploradas em campos de trabalho escravo, que ainda existem nos dias de hoje. Muitas delas são obrigadas a trabalhar em condições precárias e perigosas em troca de um valor monetário insignificante, estando presente na grande maioria das cozinhas dos lares brasileiros, mas praticamente nunca como grandes chefs da gastronomia e sim como eternas subalternas, que vivem para servir as famílias brancas e ricas. Não importa se querem sonhar mais alto ou se têm algum problema legítimo, se estão doentes ou passando por um período de luto – algo bastante frequente devido ao genocídio policial contra os homens negros -, as mulheres negras nascem e crescem com poucas alternativas. Para muitas, é difícil alcançar outra coisa além do trabalho doméstico para famílias brancas, geralmente em forma de faxinas pesadas e salários baixíssimos. A mulher negra é a maior trabalhadora de nossa nação, porém não possui seus esforços reconhecidos; ao invés disso, sua dignidade é barganhada com ameaças de demissão e risco de desemprego.
Mesmo na televisão, nas novelas ou nos filmes, a mulher negra só aparece para representar a escrava de tempos antigos ou a empregada doméstica atual. De que forma, então, pode se esperar que meninas e adolescentes negras consigam se ver em profissões adequadas, em vivências plurais e dignas? É por isso que tal estereótipo de guerreira e batalhadora é tão nocivo: sua existência poda o potencial e a autoestima dessas mulheres, servindo como grilhões de sua liberdade. O objeto - Para as mulheres negras que não são vistas como escravas do trabalho braçal, resta o rótulo do trabalho sexual – igualmente exploratório e limitado -, que existe sob a pretensão de elogio, atuando como uma exibição de pedaços de carne baratos e hipersexualizados, como se uma tendência à “promiscuidade” fosse característica genética. Não é preciso pesquisar muito para encontrar em qualquer rede social uma enxurrada de charges e imagens que apresentam garotas negras como “vulgares” e irresponsáveis, que engravidam ainda na adolescência e não aprendem nunca a lição. Mesmo mulheres negras com um maior nível econômico, como por exemplo a atriz Taís Araújo, são vítimas da objetificação, como pode ser notado no próprio nome da novela da qual ela foi estrela, “Da Cor do Pecado”. Seja por meio de eufemismos ou discursos hostis, a mulher negra sempre transita entre a indesejabilidade e a exotificação: às vezes, é considerada tão feia e nojenta que todas as partes do seu corpo são causadoras de ojeriza, mas por outras consegue se enquadrar no papel de “mulata” sensual e provocante. A questão é que exotificação não é elogio, é objetificação. Não há qualquer valorização ou prestígio em marcar todo um grupo de seres humanos como produtos com valores comparáveis. Isso é uma das formas mais perversas de racismo, pois está oculto e disfarçado, sendo frequentemente confundido com inclusão. No entanto, basta um pouco de senso crítico para perceber que a preta “da cor do pecado” não é verdadeiramen-
Não é preciso pesquisar muito para encontrar em qualquer rede social uma enxurrada de charges e imagens que apresentam garotas negras como “vulgares” e irresponsáveis, que engravidam ainda na adolescência e não aprendem nunca a lição
te aceita em sociedade, ela é vista como o terror das pobres donas de casa, como a sujeita sem moral, oportunista e interesseira, que destrói casamentos e faz do mundo um lugar menos limpo. Essas afirmações podem soar muito fortes, mas essa é a realidade das milhares de meninas sexualmente abusadas, que apesar de serem crianças, não encontram defesa, pois desde a mais tenra idade são consideradas provocantes e feitas exclusivamente para o sexo. O que esses estereótipos possuem em comum é a redução da mulher negra ao seu corpo, ou seja, às supostas características intrínsecas que possuem desde sua formação genética. Por serem retratadas como mais fortes e naturalmente mais sexuais, todos os tipos de violação de direitos humanos são impostos às meninas e mulheres negras. Em pleno ano de 2013, no mês da Consciência Negra, ainda falta muito chão para que o Brasil consiga dar às suas cidadãs negras a valorização que merecem. Até que ponto as pessoas são capazes de refletir a respeito desses exemplos e trabalhar no enfrentamento do preconceito? Pode ser difícil ir além da superficialidade dos discursos de inclusão, mas sem a quebra de estereótipos, jamais será possível extinguir, ou mesmo amenizar o problema do racismo. *Jarid Arraes é educadora sexual, estudante de Psicologia, feminista e ativista pelos Direitos Humanos.
5
Conjuntura
Mulheres negras: o desafio de construir a igualdade Rosane Sousa de Deus e Rosana Silva* É central para nós, trabalhadores e trabalhadoras, refletir sobre as situações enfrentadas pelos negros e, principalmente as mulheres negras. Para iniciar essa reflexão mencionamos um trecho do texto que Márcio Pochmann fez para a apresentação da publicação “Retratos da Desigualdade no Brasil”, do Ipea. “As desigualdades de gênero e raça são estruturantes da desigualdade social brasileira. Não há, nesta afirmação, qualquer novidade ou qualquer conteúdo que já não tenha sido insistentemente evidenciado pela sociedade civil organizada e, em especial, pelos movimentos negro, feminista e de mulheres, ao longo das últimas décadas. Inúmeras são as denúncias que apontam para as piores condições de vida de mulheres e negros, para as barreiras à participação igualitária em diversos campos da vida social e para as consequências que estas desigualdades e discriminações produzem não apenas para estes grupos específicos, mas para a sociedade como um todo.” Essa fala aponta para a necessidade de mudanças estruturais que alterem a vida das mulheres e da população negra e ressalta a importância de pensarmos a discriminação de gênero e raça não apenas como uma manifestação cultural, mas também como consequência de uma estrutura patriarcal, machista e racista que tem consequências materiais na vida das mulheres. Mulheres negras em dados Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de 2012, recentemente divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geo-
6
grafia e Estatística (IBGE), apontam que mulheres, pretos e pardos e pessoas que não completaram o ensino médio era a maioria entre os desocupados no país no ano passado. Isso quer dizer que essas pessoas representam a maioria daquelas que estão em busca de alguma ocupação. Outro dado dessa pesquisa mostra que a discriminação tem sexo e cor. O Programa Brasil Sem Miséria, entre 2002 e 2012, retirou 22 milhões de brasileiros e brasileiras da extrema pobreza – a maioria dos quais negras e negros. Porém, nesse mesmo período a participação da população negra naqueles considerados miseráveis cresceu 15%. Segundo o consultor do Senado e ex-secretário executivo da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (SEPPIR), Mário Lisboa Theodoro, é possível comprovar esse quadro observan-
Ser mulher trabalhadora em uma sociedade machista, capitalista e racista, que desvaloriza o trabalho realizado por nós não é fácil. E essa situação se agrava ainda mais quando se trata das trabalhadoras e trabalhadores domésticos
do-se a evolução de pobres por raça/cor e gênero. “Entre 2002 e 2012, a participação da população branca entre os pobres caiu 19,6% enquanto que a participação da população negra subiu 8,2%. Quando fazemos o corte por gênero e raça/cor, observamos que a maior redução se deu
Em relação à média geral de salários de trabalhadores e trabalhadoras, considerando as variáveis de gênero e raça, as mulheres negras estão em pior situação
no caso dos homens brancos, cuja participação caiu 22,4%, seguido das mulheres brancas cuja participação entre os pobres caiu 17%. Já para o caso da população negra, o maior aumento incidiu sobre a mulher negra, cuja participação entre os pobres cresceu 10,6%, enquanto que no caso dos homens negros esse percentual subiu 5,9%”, afirmou. Esses números demonstram que a população negra está mais afastada do alcance dessas políticas. Estão mais distantes de sair da situação de extrema pobreza. Esses dados demonstram que homens e mulheres negras tiveram mais dificuldade de sair da situação de vulnerabilidade. É uma realidade que necessita ser estudada para saber que dinâmica social causa essa desigualdade social e, a partir daí,
estabelecer políticas que possibilitem à população negra, e em particular as mulheres, terem igualdade de condições de acesso ao programas que objetivam erradicar a miséria. O trabalho das mulheres não é valorizado - Ser mulher trabalhadora em uma sociedade machista, capitalista e racista, que desvaloriza o trabalho realizado por nós não é fácil. E essa situação se agrava ainda mais quando se trata das trabalhadoras e trabalhadores domésticos. Há muito tempo as trabalhadoras domésticas lutam pelos seus direitos e atualmente travam uma dura batalha para que o Congresso Nacional aprove a Proposta de Emenda Constitucional para garantir às trabalhadoras domésticas os mesmos direitos dos demais trabalhadores. Pois o trabalho que realizam é caracterizado pela informalidade, baixos salários e longas jornadas de trabalho. Outra reivindicação das trabalhadoras domésticas, que a CUT tem apoiado ao longo dos últimos anos, é que o Brasil ratifique a Convenção 189 e da Recomendação 201, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras domésticas. Conforme dados da PNAD, em 2012, no Brasil, havia 6,4 milhões de trabalhadores domésticos, sendo que 92% são mulheres. Em relação à carteira assinada, há uma diferença entre homens e mulheres. Em 2012, o emprego sem carteira para as trabalhadoras domésticas representava 72%. Houve uma piora em relação a 2011, em que o emprego sem carteira era de 70,7%. Em relação aos homens os dados melhoraram. Em 2011 eles eram 53% sem carteira e caíram para 51% em 2012. Em relação à média geral de salários de trabalhadores e trabalhadoras, considerando as variáveis de gênero e raça, as mulheres negras estão em pior situação. Dados divulgados, em 2011, no Anuário da Mulher apontam que, em 2009, o rendimento médio mensal dos trabalhadores não negros era de R$ 1.534,00; das mulheres não negras R$ 1.001,00; dos homens negros
R$ 839,00 e das mulheres negras R$ 558,00. Ou seja, as mulheres negras recebem aproximadamente 66% do que recebem os homens negros; 56% do que é pago às mulheres não negras e quase 1/3 (cerca de 36%) do que recebem os homens não negros. O que esses dados nos mostram em relação ao mercado de trabalho? Ao tratar das especificidades das formas de inserção das mulheres negras no mercado de trabalho, pretende-se contribuir para o debate sobre desigualdades raciais e de gênero. A mulher negra é a que enfrenta mais discriminação no mercado de trabalho sobre ela pesa os efeitos combinados da raça/etnia e gênero. É fundamental avaliar o papel econômico das mulheres negras quando consideramos o trabalho que realizam para manutenção de suas famílias, mas, sobretudo, o papel que desempenham enquanto trabalhadoras domésticas remuneradas, sendo uma das maiores categorias deste país. É importante lembrar que na história de nosso país teve um período de escravidão, no qual as mulheres negras desempenharam um papel econômico fundamental no com as tarefas domésticas e de cuidados e na produção agrícola. Também inscreveram seus nomes como guerreiras e lutadoras contra todo tipo de discriminação e opressão. Sem nenhuma ideia de vitimização, mas com a certeza de que “Aprenderam desde muito cedo na dureza das lavouras, do comércio informal, que sua vida valia apenas o que produzia”, é fundamental aprofundar os debates e os estudos sobre os mecanismos de discriminação das mulheres no mundo do trabalho, avaliar as condições de acesso e permanência no mercado de trabalho levando em consideração a questão étnico/racial, como um fator de aprofundamento das desigualdades e colocar em prática políticas que promovam a igualdade de gênero e raça.
* Rosana Sousa de Deus, diretora executiva da CUT, e Rosane Silva, Secretária de Mulheres da CUT Nacional.
7
Entrevista
Mortes de negros no país: o motivo é o racismo! Em entrevista ao IHU On-Line, reproduzida nesta edição da Revista Paulo Freire, o pesquisador Rodrigo Leandro de Moura afirmou com veemência: “O racismo está influenciando esse diferencial de taxa de homicídios. Não conseguimos uma metodologia que seja capaz de quantificar exatamente qual é este percentual, mas cremos, com certeza, que boa parte desse diferencial seja devido ao racismo”, afirma o pesquisador. O percentual de negros assassinados no Brasil é 132% maior do que o de brancos, revela pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea, intitulada Vidas Perdidas e Racismo no Brasil. Embora as razões para explicar esses dados não estejam totalmente claras, “20% da causa da morte de negros” pode ser atribuída a “questões socioeconômicas”, como diferenças em relação a emprego, moradia, estudo e renda do trabalhador, diz Rodrigo Leandro de Moura, um dos autores do estudo realizado pelo IPEA. Os outros 80%, esclarece, podem ser explicados por uma “variável socioeconômica que não observamos,
mas, apesar de não conseguirmos imaginar qual seja, pensamos que um componente importante para explicar esse dado seja o racismo”. E acrescenta: “O que reforça a tese de racismo é que as características socioeconômicas podem ser afetadas por ele. Então, por exemplo, o negro sofre discriminação no mercado de trabalho, pode ter mais dificuldade de ter acesso a postos de trabalho qualificados, pode sofrer bloqueio de oportunidades de seu crescimento profissional e também pode ter o que chamamos de desigualdade de oportunidades e, por causa disso, sofrer tratamento desigual no que se refere às oportunidades no mercado de trabalho”. Confira a entrevista na íntegra. Como foi realizada a pesquisa que demonstra maior violência contra os negros no Brasil? Rodrigo Leandro de Moura - Essa pesquisa surgiu do nosso interesse de avaliar se havia uma discriminação contra negros ocorrendo em relação aos casos de homicídios registrados no país. Procuramos avaliar inicialmente a taxa de mortes por homicídios de negros e não negros e verificamos uma discrepância grande entre os dados. No que se
refere aos resultados por estados, também verificamos que há, principalmente no Nordeste,Norte e Centro-Oeste, uma discrepância grande entre a taxa de homicídios de negros e não negros. A partir dessas informações, calculamos, através de uma metodologia de outro artigo, a perda de expectativa de vida do negro ao nascer, em razão da violência. Por que o número de negros assassinados no Brasil é 132% maior do que o de brancos? Quais as causas desses assassinatos e que atores estão envolvidos nestas mortes? Rodrigo Leandro de Moura - Visto que observamos esse diferencial muito grande entre homicídios de brancos e negros, calculamos a diferença da taxa de homicídios entre negros e não negros e procuramos avaliar, através de um modelo estatístico, qual percentual desse resultado poderia ser explicado por características socioeconômicas - quando falo de características socioeconômicas, refiro-me a diferenças de educação, diferenças demográficas, diferença nas condições do mercado de trabalho, como taxa de desemprego, renda do trabalhador, diferenças de tipo de moradia, densidade domiciliar, etc. A partir desses dados, verificamos que as características socioeconômicas explicavam somente 20% da diferença da taxa de homicídios. Ou seja, 20% da causa da morte de negros pode ser atribuída a essas principais características socioeconômicas. Os outros 80% correspondem a quê? Pensamos que esse resultado se explica através de características socioeconômicas que não observamos. Você tem ideia de quais são essas características ou é impossível identificá-las por enquanto? Qual o significado desses 80%? Rodrigo Leandro de Moura –
8
O racismo cria determinados estereótipos negativos que acabam afetando a autoestima de crianças e jovens negros e, aí, logicamente, influenciam negativamente sobre eles.
Não. Logicamente estamos restritos à base de dados: utilizamos os dados do Censo. É difícil imaginar outras variáveis socioeconômicas demográficas que não tenham alguma relação no modelo, e também não conseguimos identificar novas características, porque esse exercício foi feito a partir das taxas de homicídio por município. Não conseguimos identificar, por exemplo, que tipo de característica específica, em cada município, pode estar associada ao racismo e que pode, de alguma maneira, afetar o resultado. O que quero dizer com isso? Dentro desses 80% pode ter uma variável socioeconômica que não observamos, mas apesar de não conseguirmos imaginar qual seja, pensamos que um componente importante para explicar esse dado seja o racismo. O que reforça a tese de racismo é que as características socioeconômicas podem ser afetadas por ele. Então, por exemplo, o negro sofre discriminação no mercado de trabalho, pode ter mais dificuldade de ter acesso a postos de trabalho qualificados, pode sofrer bloqueio de oportunidades de seu crescimento profissional e também pode ter o que chamamos de desigualdade de oportunidades e, por causa disso, sofrer tratamento desigual no que se refere às oportunidades no mercado de trabalho. O racismo cria determinados estereótipos negativos que acabam afetando a autoestima de crianças e jovens negros e, aí, logicamente, influenciam negativamente sobre eles. De modo geral, acreditamos que o racismo influencia esse diferencial de taxa de homicídios. Não conseguimos uma metodologia que consiga quantificar exatamente qual é este percentual, mas cremos, com certeza, que boa parte desse diferencial seja devido ao racismo. Como a violência se manifesta entre negros e não negros no país?
Então, haveria um caso de racismo de negro contra negro ou, então, seria mais um problema social, ou seja, como o negro está mais envolvido com o crime, então ele tende a matar mais negros. Acredito mais na hipótese de racismo institucional. Há alguma característica específica para o índice de homicídios ser maior no Norte, Nordeste e Centro-Oeste?
Rodrigo Leandro de Moura – A violência gera uma perda de expectativa de vida. Avaliamos a violência em alguns aspectos: homicídios, acidentes de trânsito, suicídios, etc. A partir disso, observamos que a maior perda da expectativa de vida é para homens. Verificamos também que os homens não negros morrem mais por conta de acidentes de trânsito do que por homicídios, enquanto os negros sofrem mais homicídios. Diante desses dados, entramos na questão que está relacionada ao racismo institucional, ou seja, a uma forma particular de racismo nas instituições, que envolve o funcionamento da polícia. Essas organizações constituem só um segmento, uma ponta do Sistema de Justiça Criminal, que está mais perto do cidadão. Então, é o policial que, em geral, aborda primeiro o criminoso e deveria garantir os direitos civis, os direitos humanos, enfim, a questão da isonomia no tratamento ao cidadão. Entretanto, a partir dos dados do Censo e da Pnad de 2009, observamos que, quanto ao percentual da população que sofreu agressão física em 2009, 1,8% era de negros e 1,3% era de não negros. Entre as vítimas que não procuraram a polícia, 61,8% eram negros e 38,2% eram não negros. Então, o que isso mostra? Que entre aqueles que não procuraram a polícia, ou seja, não procuraram porque não acreditavam, ou porque tinham medo dela, não o fizeram por conta do racismo com que o cidadão é tratado pela polícia. Não descarto também outra possibilidade, que não estaria ligada ao racismo institucional, mas à questão do criminoso, que na maior parte das vezes é negro.
Rodrigo Leandro de Moura – Aí volta a questão das características socioeconômicas. Esperávamos que as diferenças socioeconômicas explicassem esse dado, só que não explicaram. Esse dado de 80% relacionado ao racismo se manifesta, portanto, no Nordeste, em Alagoas, Pernambuco, Sergipe, também no Pará, no Espírito Santo, em alguns estados do Centro-Oeste, onde parece que o racismo é mais alto. Como avalia as políticas públicas dos últimos anos em relação aos negros, como a inclusão nas universidades por cotas? Ações como essa mudam a mentalidade acerca do racismo? Rodrigo Leandro de Moura – As políticas de ação afirmativa, isoladamente, não resolvem o problema. Existem evidências favoráveis em relação às políticas de ação afirmativa, por exemplo, política de cota por raça nas Universidades. Alguns estudos têm mostrado que o desempenho do cotista na Universidade não tem sido estatisticamente pior do que o não cotista. Portanto, a proposta é boa para diminuir a desigualdade e garantir oportunidades. Entretanto, também é necessário melhorar a educação básica na base, porque senão se incorre em outro tipo de discriminação: contra os brancos pobres. As políticas de ação afirmativa deveriam complementar a políticas de educação básica, de qualidade. Você tem que dar uma educação boa desde a primeira infância. Depois de niveladas as características socioeconômicas, a política de ação afirmativa seria menos necessária. O que o nosso estudo mostra é que se você eliminar toda a diferença das características socioeconômicas, a taxa de mortalidade por homicídios reduziria somente 20%.
9
Panorama
A invisibilidade da estética negra: a dor do racismo sobre nossos cabelos
Luara Vieira* Não é novidade que a estética negra – expressão entendida como conceitos e juízos de beleza baseada nas características da população negra - não é valorizada em nossa sociedade, diga-se de passagem, uma sociedade extremamente racista, que tenta a todo custo dissipar qualquer manifestação de negritude contida na mesma. Pois bem, estou passando por um momento muito importante para meu amadurecimento como mulher e negra, que é: transição dos
10
cabelos. Há mais de um ano venho ensaiando essa mudança, que pra mim não é apenas uma mudança estética, é muito mais que isso, é um momento muito especial, em que me reconheço como negra, enxergo meu cabelo como bonito independente do que a sociedade considere como belo, amo meus traços, minha ancestralidade, enfim, enxergo-me negra para além da cor da pele. Desde que o desejo de retornar ao meu cabelo natural começou a ficar forte, beirando às vezes ao desespero por vê-lo com duas texturas (meio
crespo, meio alisado), passei a procurar na internet meios que me auxiliem na passagem desta fase, pois trata-se de uma escolha difícil e muitas vezes sofrida. Afinal, são dez anos usando química e uma vida inteira ouvindo o quão feio é meu cabelo. Além de procurar em blogs, vídeos e páginas, todas as alternativas possíveis para enfrentar esse momento, deparei-me com a falta de locais especializados no cuidado de cabelos crespos na cidade onde moro, Maringá-Paraná, fato que me causou uma grande decepção, pois, por tratar-se de uma cidade de médio porte acreditei que encontraria ao menos algumas opções de salões especializados. Triste engano. Mesmo tendo conhecimento de que a estética negra é extremamente desvalorizada socialmente, a minha crença na existência de lugares especializados talvez tenha se dado pela necessidade de refugiar-me de uma estrutura violenta e opressora, principalmente, quando se trata dos cabelos. Não queria mais agredir minha estética, mas precisava me sentir auxiliada de certa forma. Da última vez que alisei meus cabelos, sai do salão com a certeza que nunca mais voltaria lá (pelo menos para fazer química), chorei o caminho todo até chegar em casa e passei muitos dias pensando como seria bom encontrar alguns lugares para cuidar dos meus cabelos e das demais meninas crespas que existem por aqui. Sinceramente, não sei explicar ao certo o porquê dessa esperança, visto que sou ciente da invisibilidade estética com que somos tratadas. De todo modo, a esperança manteve-se até o momento que percebi de fato não haver nenhum local especializado por aqui (pelo menos não encontrei até hoje). Além de me entristecer, este fato me incitou uma reflexão diferente das que eu já havia feito, acerca da desvalorização estética da população negra e em especial do cabelo natu-
ral. Me pus a pensar o que faz com que sejamos tão invisibilizados dentro de uma sociedade, visto que, segundo o SAE ( Secretaria de Assuntos Estratégicos) dos 35 milhões de pessoas que ascenderam para a classe média, nós negras/os somamos 80% do total, ou seja, somos consumidores ativos como qualquer outro e no entanto temos nossas especificidades constantemente ignoradas, não nos vemos representados nas campanhas publicitárias, nas novelas e filmes, nas revistas etc. e quando por ventura aparecemos nesses locais somos retratados de modo negativo, carregados de estereótipos, vide a “bela homenagem” feita pelo estilista Ronaldo Fraga, colocando palhas de aço na cabeça de modelos brancas para retratar, segundo ele, a “representação da cultura negra”. Diante disso, me pergunto constantemente por que nossa estética não é representada e o porquê de não encontramos lugares especializados em nossa beleza? Será que não somos bonitas/os? Ou não somos consumidores? As respostas a esses questionamentos são facilmente encontradas quando levamos em conta que vivemos em uma sociedade racista, sexista e elitista, onde pensar a estética negra parece ser o último dos esforços das empresas, dos publicitários e das mídias em geral, já que estão há séculos nos estereotipando, dizendo que não representamos o belo, adjetivando nossos cabelos ora de “cabelo de bombril” ora de “cabelo ruim”, tentando a todo custo ofuscar a beleza que trazemos em cada traço. Portanto, creio que a questão de resgatar e difundir a estética negra não seja meramente um ‘golpe’ comercial, há de fato uma luta política por trás disso, existem milhares de autoestimas sendo construídas ou reerguidas, principalmente a das mulheres negras, já que estas são as que mais sofrem com os pré-requisitos de uma “boa aparência” impostos de forma cruel por nossas sociedade, já que esses requisitos geralmente dizem respeito a jovialidade, brancura e cabelos lisos. Para comprovarmos a existência desses pré-requisitos basta observarmos os anúncios de trabalho e nos depararmos com a exigência de fotos nos currículos, usadas geralmente como quesito eliminatório para
aquelas/es que apresentem sua estética fora dos padrões estabelecidos. Desse modo, a exigência de uma visibilidade estética é mais que o consumo de produtos e serviços que sejam específicos pra nossas características, mas é, sem dúvidas um resgate a nossa ancestralidade. O cabelo e seus penteados sempre possuíram uma grande importância para o povo africano, pois, através dele demonstram a ocupação de cada pessoa da nação, sua inserção em novos períodos de vida, dentre inúmeros significados que não chegaram a nós. Portanto, manter e resgatar o cabelo crespo demonstra um resgate da memória, da cultura e espiritualidade ancestrais do negro. Para Lody (2004) o cabelo é uma marca de procedência e é através dele que o negro marca sua estética perante a sociedade, constituindo também um posicionamento político.
Me pergunto constantemente por que nossa estética não é representada e o porquê de não encontramos lugares especializados em nossa beleza? Será que não somos bonitas/os? Ou não somos consumidores?
Por isso, precisamos sim nos vermos retratados em todos os âmbitos sociais, pois, representamos uma grande parcela consumidora, movimentamos os diferentes mercados, seja consumindo ou trabalhando. Temos o direito de vermos nossa estética tratada com respeito, para que nossas crianças cresçam com uma autoestima elevada, percebendo desde cedo que ser negro é lindo e que nossos cabelos crespos, ao contrário do que querem que acreditemos, é bom. É pela necessidade de construirmos uma autoestima desde cedo, que se faz necessário romper com esse padrão estético racista e a todo momento lutar contra a invisibilidade com que somos tratados, para que essa sociedade entenda, com muito amor, de uma vez todas: O NOSSO CABELO CRESPO NÃO É RUIM. REFERÊNCIAS: LODY, Raul Giovanni. Cabelos de axé: identidade e resistência. Rio de Janeiro: Ed. SENAC. Nacional, 2004. p. 119 e 123 *Fonte: Blogueiras Negras (www.blogueirasnegras.org)
11
Cultura
Filmes sobre Racismo e Educação
C
aro educador, cara educadora, a edição 29 da Revista Paulo Freire apresenta sinopses de 10 filmes que discutem a questão racial e o papel da educação. São filmes acessíveis na internet e podem ser utilizados em sala de aula para discussão com os estudantes. Confira as dicas!
Escritores da Liberdade
Vista a Minha Pele
Direção: Joel Zito Araújo e Dandara Ano: 2004 O vídeo ficcional-educativo traz em menos de 30 minutos uma paródia sobre como o racismo e o preconceito ainda são encontrados nas salas de aula do Brasil. Invertendo a ordem da história, o vídeo utiliza a ironia para trabalhar o assunto de forma educativa. Nele, negros aparecem como classe dominante e brancos como escravizados e a mídia só apresenta modelos negros como exemplo de beleza. te por via parlamentar. Por essa razão, a direita compreende que os mecanismos legais já não lhe servem. De agora em diante, sua estratégia será a do golpe de estado. Essa é a primeira parte de uma trilogia que é considerada um dos melhores documentários de todos os tempos.
12
Diretor: Richard LaGravenese Ano: 2007
Preciosa
Uma nova professora chega a escola tentando mostrar aos estudantes que aquilo que trazem de casa ou das ruas faz sentido também dentro da sala de aula. Problemáticas como racismo, desigualdade social e exclusão social dão o mote do filme. Baseado em fatos reais,o longa mostra como a professora Erin Grunwell transformou a relação de aprendizagem em uma escola dividida por tribos. Escola marcada pela resistência dos estudantes em lidar com as diferenças, é por meio da professora que a discussão de cor/raça é trazida para as atividades, que incluem escrever sobre a história de vida de cada um.
O filme conta a trajetória de Claireece “Preciosa” Jones, uma garota negra que sofre diversas dificuldades. Quando criança, é abusada e violentada pelos pais. Cresce pobre e passa por uma série de discriminações por ser analfabeta e acima do peso. Após muita insistência pessoal e com a ajuda de uma educadora que muito acredita na sua possibilidade de mudança, Preciosa dá a volta por cima.
Direção: Lee Daniels Ano: 2009
Ao mestre com carinho
Direção: James Clavell - Ano: 1967
Um engenheiro desempregado começa a lecionar em uma escola pública da periferia de Londres, formada por estudantes rebeldes e também racistas. Aos poucos, ganha a confiança, amizade e respeito dos alunos.
Encontrando Forrester Mãos talentosas
Direção: Thomas Carter Ano: 2009 O filme conta a história de um menino pobre do Detroit. Desmotivado por tirar baixas notas na escola, era motivo de bullying de forma frequente. Incentivado a estudar pela mãe, que voltou a estudar já adulta, Ben Carson torna-se diretor do Centro de Neurologia Pediátrica do Hospital Universitário Johns Hopkins aos 33 anos, em Baltimore, EUA.
Direção: Gus Van Sant - Ano: 2000 O filme trata sobre a história de Jamal, um adolescente do Bronx que vai estudar em uma escola de elite de Manhattan (EUA). Mas continua sofrendo discriminação e preconceito por conta de sua cor. Com a ida, conhece o talentoso escritor William Forrester , que percebe seu talento para a escrita e o incentiva a prosseguir nessa área.
Separados mas iguais Entre os muros da escola
Direção: Laurent Cantet Ano: 2008 François Marin atua como professor de língua francesa em uma escola de ensino médio, na periferia de Paris, composta por estudantes de diversos países da África, do Oriente Médio e da Ásia. Ele e seus colegas docentes tentam buscar diversas ações para ensinar os estudantes, mas ainda assim encontram dificuldades, dada as condições socioeconômicas em volta da unidade escolar.
Direção: George Stevens Jr. Ano: 1991 Baseado em fatos reais, “Separados, mas iguais” narra a disputa entre pais de alunos negros e juízes do Condado de Claredon, na Carolina do Sul, no início dos anos 50. Na época, as escolas separavam os alunos brancos, que claramente tinham acesso à educação de maior qualidade acesso à verba para manter a estrutura das escolas.Um diretor da escola , tem o pedido de um ônibus escolar negado, com o apoio do pai de um de seus alunos, entra com processo contra o estado, alegando a inconstitucionalidade do país ao promover escolas diferenciadas para negros e brancos.
Mentes Perigosas
Direção: John N. Smith Ano: 1995 A professora Louanne Johnson entra em uma escola da periferia norte-americana e é hostilizada pelos alunos. Percebendo que seu método de ensino não está funcionando Louanne passa a se envolver mais com a diversidade cultural de seus estudantes e, assim, percebe melhor as dificuldades que passam.
Sarafina – o som da liberdade
Direção: Darrell Roodt Ano: 1992 Com Whoopi Goldberg no papel principal, o filme conta a história de uma professora sul-africana que não aceita ver seus estudantes se sentindo diminuídos. Em um processo educativo permanente, ela ensina seus alunos negros a lutarem por seus direitos e compreenderem a sociedade em que vivem, não esquecendo que podem diariamente transformá-la.
13
Capa História
Nelson Mandela (1918-2013) O “Madiba”, cuja vida é inspiração de dias melhores, morreu aos 95 anos em sua casa, em Johannesburgo
E
m 12 de fevereiro de 1990, quando Nelson Mandela foi solto, após 27 anos encarcerado, a África do Sul estava à beira de uma guerra civil entre brancos e negros. A libertação de Mandela era fruto de negociações entre o regime segregacionista do Apartheid e a resistência negra, mantidas em segredo para não estimular ainda mais violência por parte dos extremistas de ambos os lados. Havia uma imensa desconfiança a respeito das intenções de Mandela, mas mesmo após séculos de opressão e de seu sofrimento pessoal, Mandela tomou as decisões que fazem muitos considerá-lo o maior líder político de todos os tempos. Ao levar a todo o país uma mensagem em defesa da democracia e da igualdade, o Madiba, como é conhecido no país, se tornou o artífice da reconciliação entre brancos e negros sul-africanos, evitando o que poderia ser uma sangrenta guerra civil. Foi
14
esse homem que a humanidade perdeu decorrente de uma infecção pulmonar em 5 de dezembro de 2013. O anúncio oficial foi feito em rede nacional pelo presidente da África do Sul, Jacob Zuma. A morte de Mandela era a má notícia que os sul-africanos esperavam há anos, desde que a saúde debilitada do ex-presidente começou a preocupar. A cada internação, o país entrava em apreensão, inúmeros boatos circulavam, o governo divulgava notas oficiais, até que vinha a notícia da alta. Desta vez, foi diferente. A morte de Mandela deve jogar boa parte do país em depressão. Violência e o fim do Apartheid O luto não se dá à toa. Após anos lutando contra o regime da supremacia branca de forma institucional, Mandela ajudou a fundar, em 1961, o Umkhonto weSizwe, braço armado do Congresso Nacional Africano (CNA). Dois anos
depois de entrar na luta armada, Mandela foi preso e condenado à prisão perpétua no famigerado Julgamento de Rivonia. Ele deixaria a prisão apenas nos anos 1990, quando se juntaria a algumas poucas figuras que tentariam colocar fim ao Apartheid. Como o regime beneficiava diversos grupos, a resistência às mudanças seria ferrenha. Logo após a soltura de Mandela, uma onda de violência tomou conta da África do Sul. Chacinas foram cometidas várias vezes por dia em trens e outros locais públicos. Líderes comunitários e outras figuras públicas foram executados. Massacres nos guetos negros se tornaram comuns. A execução do “colar”, por meio da qual um pneu com gasolina era colocado no pescoço da vítima e incendiado, se tornou a horrenda face da violência no país. Isso sem contar a repressão violenta da polícia contra as manifestações de populações negras.
Era uma época que os sul-africanos “morriam como moscas”, nas palavras do arcebispo anglicano Desmond Tutu, Nobel da Paz. A violência daquele período era atribuída a uma guerra entre o Congresso Nacional Africano, grupo liderado por Mandela, que pregava a igualdade entre brancos e negros, e o Inkatha, movimento nacionalista zulu, um dos diversos povos sul-africanos. Essa era apenas parte da explicação. A violência generalizada era uma ação orquestrada pelas forças de seguranças do regime e pelos extremistas de direita do Inkatha. Milhares de membros da facção zulu foram treinados em campos secretos e receberam armas e dinheiro das forças de segurança do regime e de líderes brancos de extrema-direita. Alguns policiais, brancos e negros, chegavam a coordenar e participar dos massacres. Quando não havia gente do Inkatha, mercenários de países como Angola e Namíbia eram contratados. Em silêncio, para não serem identificados como estrangeiros pelo sotaque, matavam sul-africanos a esmo. Para o Inkatha, aquela era uma luta para manter a autonomia da terra KwaZulu e buscar a independência. Para os extremistas brancos, era uma estratégia dupla: primeiro manter a argumentação de que os negros eram incapazes de se autogovernar. Caso isso não desse certo, o CNA, de Mandela, ao menos ficaria enfraquecido para a eleição presidencial que se seguiria, a primeira na qual brancos e negros poderiam votar e ser votados livremente. A estratégia de desestabilização não deu resultados graças à força de caráter de inúmeras pessoas, entre elas o então presidente sul-africano, Frederik Willem de Klerk, e de Mandela. Entre 1990 e 1993, a África do Sul revogou leis que davam amparo jurídico ao Apartheid, desmantelou seu arsenal nuclear e convocou eleições livres para 1994. Ao contrário do que pensavam os extremistas, o CNA não estava enfraquecido por conta da violência. Nas urnas, o partido obteve uma vitória massacrante, e Mandela se tornou o primeiro presidente negro na história do país. “Nação Arco-Íris” - No poder, Mandela operou um milagre político. O Madiba fez os sul-africanos acreditarem no seu sonho, o de que a África do Sul poderia ser mesmo uma “Nação Arco-Íris”, na qual todas as “cores” poderiam conviver de forma harmônica. Mandela conseguiu contemplar os anseios das mi-
“Durante a minha vida, me dediquei à luta do povo africano. Lutei contra a dominação branca, e lutei contra a dominação negra. Eu defendi o ideal de uma sociedade democrática e livre, na qual todas as pessoas vivem juntas em harmonia e com oportunidades iguais. É um ideal para o qual espero viver e conseguir realizar. Mas, se preciso for, é um ideal para o qual estou disposto a morrer.” Nelson Mandela, na abertura de sua declaração de defesa no Julgamento de Rivonia, em Pretória, em 20 de abril de 1964
norias brancas e conter a ânsia por justiça de líderes negros, muitos dos quais desejavam vingança após décadas de abusos e arbitrariedade. A face mais visível do esforço de reconciliação feita por Mandela foi o apoio à seleção de rúgbi da África do Sul, osSpringboks, na Copa do Mundo de 1995. Mandela não permitiu a mudança de nome e uniforme da equipe e tornou a seleção, símbolo de orgulho dos brancos, em orgulho nacional. A empreitada teve um fim épico com a improvável vitória da África do Sul sobre a Nova Zelândia, no hoje mítico Ellis Park, em Johannesburgo. A história foi registrada de forma magistral no livro Conquistando o Inimigo, de John Carlin, e no filme Invictus, de Clint Eastwood. O apoio aos Springboks era parte da estratégia de Mandela de liderar pelo exemplo. Para o sul-africano comum, branco ou negro, era inevitável se questionar: como pode um homem que ficou encarcerado por 28 anos deixar a prisão sem qualquer resquício de rancor e adotar um tom tão reconciliatório? Se Mandela podia, todos podiam. O milagre da Nação Arco-Íris foi também institucionalizado. Sob Mandela, a África do Sul passou a ter programas de habitação, educação e desenvolvimento econômico para a população negra; instalou a Comissão da Verdade e da Reconciliação, que serviu como catarse coletiva para o país; e aprovou uma nova Constituição, vista até hoje como ponto central de estabilidade na África do Sul. O legado de Mandela - Desde que assumiu a presidência, Mandela deixou claro que gostaria de ser apenas o responsável pela transição da África do Sul,
e não o guia eterno do país. Ele fez isso pois desejava uma África do Sul independente, inclusive dele próprio. A África do Sul que Mandela imaginou, no entanto, não conseguiu completar o sonho do líder visionário durante sua vida. Contra a vontade de Mandela, e de sua família, sua imagem é usada persistentemente de forma política, às vezes por líderes que dilapidam seu legado. Esse processo foi agravado pelo silêncio ao qual Mandela foi obrigado a se recolher devido ao agravamento de sua doença. Nos governos de Thabo Mbeki (1999-2007) e do atual presidente, Jacob Zuma, ambos do CNA, a África do Sul teve grande crescimento econômico, mas a desigualdade social é maior que a existente no fim do Apartheid. O CNA, por sua vez, deixou de ser o partido da liberdade para se tornar um amontoado de políticos acusados de corrupção e de agir em benefício próprio. A Liga Jovem do ANC, fundada por Mandela, passou a ser conhecida pelos atos e palavras de intolerância de seus líderes, um perigo para uma país onde a violência racial está contida, mas a tensão entre brancos e negros, não. Apesar do uso político de sua imagem, Mandela continua sendo o bastião da democracia na África do Sul. Talvez, o distanciamento entre seu legado e a condição atual do país tenha servido para, nos últimos anos, tornar mais agudo o sofrimento da população a cada nova internação. Hoje, finalmente, chegou o dia de deixar Mandela descansar, e dos sul-africanos colocarem o país no rumo sem um exemplo vivo para guiá-los. Fonte: Carta Capital
15
Atualidade
Uma nova perspectiva para os Direitos Humanos Lídia Anjos* Refletindo sobre um pensamento de Nélson Mandela de que “ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar”, é possível promover algumas reflexões na perspectiva dos direitos humanos importantes para a construção de formas mais justas de vida em nossa sociedade. Reconhecer o processo de aprendizado nessa relação é reconhecer que nada é simplesmente um todo dado. O ódio não é um todo dado, assim como não o são as desigualdades sociais, as intolerâncias, as injustiças e exclusões sociais. Esses processos são construídos historicamente e para superá-los é necessário ter esse entendimento para que se possa desconstruir aquilo que não nos interessa e reconstruir outra forma de viver mais igualitariamente. Se por exemplo a exclusão e a desigualdade social são construções históricas, faz-se igualmente necessário se questionar quem são os mentores desse processo? A quem interessa a relação de dependência, de fome, de exploração, opressão vivenciada pela maioria da população no mundo? Quem se favorece com a naturalização de que a exclusão e a desigualdade social nunca serão superadas? A naturalização e banalização desse processo de violência é tão grave que sutilmente faz com que um coletivo inteiro “doentemente” não perceba suas consequências. A situação passa a fazer parte da cultura das pessoas, mas uma cultura de violência. Em relação a esse fato, algumas situações, se faz necessário denunciar e
16
refletir, como os casos constantes de linchamentos públicos em nome dos direitos humanos e da democracia que se multiplicam em vários lugares, produzindo cenas de barbárie. Também o controle excessivo do Estado brasileiro sob a população negra moradora de favelas, morros e comunidades periféricas, com a entrada radical de agentes públicos, em nome da defesa dos direitos humanos e mais uma vez da democracia, tratando a população afrodescendente como se fossem todos criminosos amplia a cada dia as estatísticas de morte dessa população, principalmente entre os jovens. Essa realidade anuncia um extermínio de jovens negros em quase todos os Estados. Em especial coloca o Estado de Sergipe no 5º lugar do ranking dos Estados mais violentos do país. Considerar natural idosos vivendo do lixo, adultos morando nas ruas, crianças pedindo nas sinaleiras, famílias inteiras sem perspectiva de vida futura e até as situações em que se alegam fazer “justiça com as próprias mãos”, colocam as pessoas numa
situação confortável de não precisarem lutar para que essa realidade se altere e esse fato favorece a uma determinada classe social. No mundo inteiro e não diferente no Brasil, há uma minoria hegemônica do ponto de vista do poder que têm todos os seus direitos garantidos, como o direito a uma educação de qualidade, saúde com dignidade, à moradia, direito de ir e vir, outros. Por outro lado há uma maioria desprovida de condições básicas para sobreviver: moradia, alimentação saudável, educação, saúde, etc. É justamente esse grupo que tem acesso aos bens materiais e imateriais para se viver dignamente que estrategicamente utiliza os direitos humanos como instrumento para reprodução das relações de dominação. Essa estratégia de reprodução hegemônica gera posição desigual de acesso aos bens. São estratégias que objetivam rechaçar as possibilidades de lutas sociais por parte dos grupos oprimidos que diretamente vivenciam as injustiças cotidianas da impossibilidade de uma vida digna.
É necessário pensar os direitos humanos sob uma nova perspectiva, reinventando-os à luz do pensamento crítico
Considerando a Declaração Universal dos Direitos Humanos – DUDH assim como o Pacto Internacional pelos Direitos Sociais e Civis, que surgiram em um período de Guerra Fria (1948 a 1966), entre dois grandes sistemas de relações sociais que disputavam a hegemonia mundial. Foi um período que vigorou um processo de políticas públicas interventoras do Estado sobre as consequências perversas da aplicação do mercado à sociedade. Aí, proliferam além das empresas públicas, negociações estatais entre sindicatos e governos por melhores condições de trabalho nas empresas e uma produção legislativa tendente à reconhecer cada vez mais direitos à cidadania nos países, principalmente os mais desenvolvidos. De um modo geral a DUDH foi pautada em valores ocidentais sem abarcar a perspectivas dos povos oprimidos e resumiu-se ao direito do cidadão de ter direitos, sem se importar se as pessoas possuíam os meios necessários para exigi-los e colocá-los em prática. Daí a concepção simplista de que os direitos humanos são os direitos que os indivíduos têm. Essa forma tradicional e conservadora de atuar e perceber os direitos humanos não os promove na prática. É reprodutora de violência, arbitrária, ilegítima, mas hegemônica. Confunde o plano da realidade e das razões dos direitos humanos, motivo pelo qual se faz necessário cotidianamente analisar as situações considerando os contextos em que elas se dão afim de que os direitos humanos não sejam utilizados pela minoria hegemônica como instrumento de reprodução de violência a serviço do capital como o é na atualidade.
A quem interessa a relação de dependência, de fome, de exploração, opressão vivenciada pela maioria da população no mundo?
O contexto atual é muito diferente do que o contexto em que foram declarados os direitos humanos internacionalmente. Desde a queda do muro de Berlim e o “fim da história’ por parte dos que se autoproclamaram vencedores da Guerra Fria, houve a paralisação da intervenção do Estado em relação às atividades econômicas e consequente deteriorização do meio ambiente, injustiças provenientes das relações do comércio e consumo indiscriminado e desigual, relações transculturais e deficiências em matéria de saúde e convivência individual e social vivenciada por quarto quinto da humanidade. A intervenção do mercado passou a impor as regras ao Estado por meio de instituições globais como o Fundo Monetário Internacional – FMI, o Banco Mundial e a Organização Mundial do Comércio. Com isso os direitos obtidos em favor dos trabalhadores foram substituídos pelo “Mercado Livre” que fizeram e ainda fazem com esses direitos fossem considerados como custos sociais para as empresas que devem suprimi-los em nome da competitividade. Portanto, no contexto atual é necessário reconhecer que a DUDH representou um esforço internacional importante para formular juridicamente esses direitos. Entretanto, na linha do que pensa o escritor Joaquim Herrera Flores, é necessário pensar os direitos humanos sob uma nova perspectiva, reinventando-os à luz do pensamento crítico. Assim, os direitos humanos devem ser definidos como o conjunto das lutas por dignidade promovidas por grupos que diretamente vivenciam as injustiças sociais, cujos resultados deverão ser garantidos por normas jurídicas, mas também por políticas públicas e uma economia aberta às exigências da dignidade. Somente assim, é possível fortalecer os grupos excluídos dotando-os de instrumentais necessários para uma prática educativa e social que considere as necessidades daquele que vive diretamente a condição de oprimido. *Lídia Anjos é mestranda em Direitos Humanos na Universidade Tiradentes e Articuladora do Movimento Nacional de Direitos Humanos em Sergipe.
17
Este é o espaço dedicado à produção do COLETIVO SABER E POESIA DO SINTESE, um grupo de professores da rede pública que une a força da militância à sabedoria poética. Visite nosso blog: http://coletivosaberepoesia.blogspot.com.br
A página do Coletivo Saber e Poesia presta, na última edição de 2013 da Revista Paulo Freire, uma pequena homenagem a um dos maiores artistas sergipanos, Mário Jorge Vieira. Em 11 janeiro de 2014, completam exatos 41 anos da morte do primeiro poeta concretista de Sergipe. Mas Mário Jorge não foi apenas poesia concreta. Foi neoconcretismo, poema processo, poesia práxis, poesia social, tropicalismo e, sobretudo, poesia marginal. Aqui, três poemas de Mário Jorge.
canção do agora com amanhã
em tempo de dura andança (a liberdade germina no seio de falsos natais)
Manoel,Pedro, Francisco, João andam na rua calados Manoel,Pedro, Francisco, João pensam com seus botões pensam nos seus patrões pensam nos tubarões pensam nos bobalhões qua não pensam nos ladrões; pensam nos seus irmãos que também não tem pão; pensam sem ilusões e sofrem pensando assim. sofrem sem solução porque pensam que a ação da verdade teve um fim. Maria, Josefa, Rosa e Teresa estão em casa caladas (claro! quem falar vai presa!) Maria, Josefa, Rosa e Teresa em casa desesperadas vendo as chamas apagadas as panelas penduradas as janelas despregadas a porta malamarrada a casa desconjuntada os buracos no taipal da parede esburacada onde a chuva tem entrada e o frio vem invernar. Manoel,Pedro, Francisco, João Maria, Josefa, Rosa e Teresa juntos esfomeados sem ver comida na mesa pensam em casas e mansões sacadas iluminadas joias caras, carro esporte boite de luxo no escuro onde o rico faz besteira gastando todo o dinheiro do trabalho do obreiro qua não pode fazer feira. e choram pensando e continua a pensar nos garotos sem escola nas barrigas sem comida no luto, na fome, na miséria no patrão, que é ladrão no dinheiro que não tem pensam em “Revolução” quartelada exploração tubarão papagaiada morte, fome, desemprego e prisão injustiça, pulhas, ladrões e traição pensam na pátria querida sendo vendida sendo roubada sendo explorada sendo “abrilhada”.
a pedra, a flor, a palavra o gesto, o dia, a estrada brotam das mãos do menino: estrelas de sangue, esperma e argamassa sóis de fúria e pranto e alegria iluminando o novo horizonte: claro e verdadeiro como o azul que nasce do ventre da manhã
mas de repente a VERDADE se faz ver, e o esperado sofrer é LUTAR, SANGUE, POEIRA E AÇÃO E O QUE ERA ALGEMA É LIBERTAÇÃO. Manoel,Pedro, Francisco, João Maria, Josefa, Rosa e Teresa de mãos dadas pela estrada cantem juntos uma canção a VIDA está libertada... há AMOR... é a SALVAÇÃO.
brados que tortura maior pode existir do que não poder falar? de ver tantos homens a dormir, e não poder a eles acordar! dormem todos, dormem um sono profundo. poucos são os acordados. todos dormem o sono dos tolos. dorme o mundo, acordemo-lhe aos brados.
em tempo de dura andança (povoado de inimigos armados de ilusões) é pedra a flor na estrada (cercada de cemitérios onde cruzes são cifrões)
bradando pela justiça, pela razão, pela consciência. gritando que nossa pátria sofre muito, é espoliada.
é pedra feita palavra (quase sempre sepultura do trabalho apodrecido)
clamando pelo despertar, clamando pela luta. clamando pelo bem-estar de quem com suór labuta.
leve e puro do menino (flor sa(n)grando rebeldia: clara semente da aurora)
o povo sofre, a pátria sofre também. o povo chama a morte, a morte diz que já vem. cansada ela já está de tantos homens do povo levar. que o choro das crianças famintas. que os gritos de dor do homem agonizante. que as chagas purulentas dos meninos doentes. que o desespero da mãe de um filho morto, morto de fome, de sede e de frio. acorde os que dormem o sono inocente e casto da ignorância, o sono terrível da alienação. e que mate os que sabem e vêm porém nada fazem...
18
pedrada
palavra filha do gesto (para os velhos: indigesto)
quebrando o negro cristal (estrela velha, caída na noite da mais-valia) estilhaçando a vidraça (redoma, muro, prisão: precipício solidão)
Imagens da Luta
Abrindo alas para a cultura sergipana, diversos grupos culturais participaram do cortejo promovido durante a abertura da VII Conferência Estadual de Educação. Aracaju, Outubro de 2007
FOTO: EDINAH MARY
NAS ASAS DO TEMPO
19
20