Os meus segredos

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Os meus segredos: João Armando Gonçalves recolha e edição Rita Miguel

«Ser escuteiro não fez de mim o pai ideal, longe disso, mas fui aprendendo a ter um grande respeito pelas gerações mais novas e percebi que educar também é dar espaço. (...) o erro é uma ferramenta educativa importante» João armando Gonçalves Presidente do Comité Mundial da Organização Mundial do Movimento Escutista (OMME)

João Armando Gonçalves Natural da Figueira Foz, tem 51 anos e é escuteiro no CNE - Corpo Nacional de Escutas (escutismo católico português) há 38. Passou por vários cargos internacionais, o que lhe «abriu os horizontes do ponto vista da humanidade», e em agosto tornou-se o primeiro português a presidir ao Comité Mundial da OMME. Casado e pai de três filhos – Inês (21), Catarina (19) e Miguel (15) –, é engenheiro civil e professor no Instituto Superior de Engenharia de Coimbra. Diz ter «imenso prazer» em «absorver a energia» dos alunos e orgulha-se de os «olhar nos olhos» e de «perceber que se sentem à vontade» para falar consigo.

Ser exemplo

«O que vivi no escutismo despertou-me para a noção de que vivemos em comunidade e temos quase uma obrigação de a servir. Fui construindo a consciência do meu lugar no mundo, natural e humano, e um certo sentido de estar para o outro, de contribuir para o que é comum. Também desenvolvi características práticas, muito na perspetiva de aprender fazendo: saber trabalhar em equipa, desenvolver projetos, liderar, ter espírito de iniciativa, querer resolver, não ficar à espera. Comecei a ser chamado a funções de liderança aos 17 ou 18 anos. Fiquei muitíssimo surpreso, mas senti um enorme orgulho e satisfação por ser merecedor da confiança. Lembro-me de sentir essa responsabilidade e de pensar “vou fazer isto bem”. Em 2003, quando fui convidado para dirigir o acampamento europeu de Caminheiros, que ia realizarse pela primeira vez em Portugal e ter três mil participantes, pensei “será que tenho cabedal para isto?”, mas hoje é das coisas de que mais me orgulho. Soube rodear-me de pessoas extremamente competentes, com um grande brio e vontade de fazer bem. E li muito, procurei relatórios de outras atividades – não basta confiar na experiência, é sempre preciso ter consciência de que não sabemos tudo e buscar conhecimento. Alguns amigos dizem que tenho a mania da excelência: mesmo que corra tudo muito bem, há sempre alguma coisa que acho que podíamos fazer melhor. E gosto muito de planear, de pensar no porquê, nos objetivos, de não fazer por fazer. Ser escuteiro não fez de mim o pai ideal, longe disso, mas fui aprendendo a ter um grande respeito pelas gerações mais novas e percebi que educar também é dar espaço. Às vezes temos a preocupação de os meninos se “portarem bem”, mas o erro é uma ferramenta educativa importante. Não deixo de pensar que há algumas coisas em casa que não consegui acompanhar tão bem como devia, mas sinto compreensão e um enorme orgulho da parte deles e isso é recompensador. As minhas filhas saíram dos escuteiros quando foram para a universidade, mas envolveram-se em associações ligadas às faculdades. Sempre as encorajámos a aproveitar as oportunidades. Conhecer mundo e abrir cabeças faz parte da construção enquanto pessoas, é tão ou mais importante do que o chamado “sucesso académico”.»

132 prevenir / outubro 2014


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