NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES

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NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES



Glauco Mattoso

DISSONNETTOS DESCABELLADOS

São Paulo Casa de Ferreiro 2021


Naturebas, ecochatos e outros causões Glauco Mattoso

© Glauco Mattoso, 2021

Revisão Lucio Medeiros

Projeto gráfico Lucio Medeiros

Capa Concepção: Glauco Mattoso Execução: Lucio Medeiros ______________________________________________________________________________

FICHA CATALOGRÁFICA

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Mattoso, Glauco

NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES/Glauco Mattoso

São Paulo: Casa de Ferreiro, 2021 266p., 21 x 21cm ISBN: 978-85-98271-28-4

1.Poesia Brasileira I. Autor. II. Título. B869.1


NOTA INTRODUCTORIA Originalmente publicada em 2007, a plaquette de 33 paginas que levava o titulo de A BICYCLETA RECYCLADA era, em si mesma, um “livro-objecto ecologicamente correcto” e tinha como contehudo sonnettos que poderiam ser chamados de “sustentaveis”. No livro OS MATTOSIANISTAS era assim descripta esta empreitada editorial: {Alem de vir publicando sua obra no convencional formato graphico das editoras commerciaes, Mattoso prosegue, entretanto, cedendo alguns titulos a sellos independentes que mantenham aquella faceta marginal das edições septentistas, entre os quaes se destaccam a Dulcinéa Catadora e a Demonio Negro, ambas trabalhando com manufactura artezanal, porem diversificando radicalmente no methodo: uma collectivizando e cooperativando, outra individualizando e personalizando o livro. A BICYCLETA RECYCLADA (collectanea de sonnettos allusivos à importancia da cultura alternativa na preservação do meio ambiente, com prefacio sonnettizado por José Miguel Wisnik) sae sob o signo da Dulcinéa Catadora (coirman da argentina Eloísa Cartonera), cujas cappas são creadas e montadas a partir do papellão deschartado e reapproveitado pelos catadores de rua. O miolo, impresso em papel recyclado, se abre com a xylogravura creada por um dos jovens catadores, Peterson Emboava, e o livro é produzido durante as officinas de pinctura de cappas pelos integrantes do gruppo de catadores-artezãos. O projecto, que tem o appoio do Movimento Nacional dos Catadores de Recyclaveis, trabalha com catadores


de lixo, editando livros de contos e poesia com cappas feitas de papellão comprado dos catadores a um real o kilo, quando elles normalmente o vendem a 30 centavos. As cappas são pinctadas à mão por filhos de catadores. Quanto ao livro A MALDICÇÃO DO MAGO MARGINAL (collectanea de sonnettos allusivos à mystica dos poetas maldictos e revoltados) sae com a marca conceitual do sello Demonio Negro, pelo qual cada auctor/titulo recebe tractamento graphico distincto e original. Segundo o editor da DN, Vanderley Mendonça, suas cappas não são resultado de um projecto padronizado, mas de muito trabalho de pesquisa com materiaes (tinctas, papel, typos de impressão), e só ficam promptas (junctamente com o miolo) depois que a solução encontrada allie arte, desenho graphico e custo. Explica elle que “sou eu mesmo quem imprime e monta tudo; no caso do Glauco, a cappa foi impressa em hot stamping sobre papel japonez que contem fibras metallicas”.} No caso da plaquette ambientalista, a adventura poetica de Mattoso teve precedente na similar DELIRIOS LYRICOS, anthología preparada por Mario Cámara (Buenos Aires: Grumo / Eloísa Cartonera, 2004, em dois volumes, na Colección “Conexiones-Grumo”), com poemas traduzidos por Mario Cámara e Luciana di Leone, que teve reedição em um volume (Buenos Aires: Eloísa Cartonera, 2006), com sonnettos traduzidos por Cristian De Nápoli, embora athematica fosse diversa. Nesta edição, montada especialmente para publicação em ebook appós postagem na nuvem, o contehudo de A BICYCLETA RECYCLADA foi ampliado e actualizado com poemas seleccionados de toda a obra do auctor, mantendo o foco na questão ambiental mas


contemplando outras implicações politicas, sociaes, culturaes e comportamentaes de character humanistico, porem questionador da supposta “correcção” ideologica, em parte coincidindo com o repertorio do livro INGOVERNABILIDADE. Os sonnettos, agora reestrophados como dissonnettos, teem quattro ou mais quartettos; os demais poemas teem variada estrophação mas preservam a forma fixa do decasyllabo e da redondilha como si fossem exemplares da flora ou da fauna, em vias de extincção. A numeração dos poemas juncta, na mesma sequencia, duas catalogações: a do ACERVO NOVO (2013 em deante) e a do archivo SONNETTUDO ou OPERA INSOMNIA (1999 a 2012), sem que occorra coincidencia numerica entre dois poemas, o que exigiria uma divisão deste contehudo em duas partes.



NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES COUSA COM CAUSA [6489] Chamados, nós poetas, de causões ja fomos tantas vezes, que nem sei si foi porque luctamos contra a lei ou della a favor, raios e trovões! Luctamos, desde tempos de Camões, por causa alguma: amigo ou não do rei, amor à natureza, pauta gay, de cor, de corpo, credos ou facções. Alguma cousa causa a nós, poetas, as dores que tomamos, da velhinha, do cego, do doente que definha, daquelle que votar quer nas directas... Talvez seja por ti, que nem te affectas com themas da politica mesquinha e suja, que luctamos, mas na linha satyrica dos bobos e patetas.

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12 GLAUCO MATTOSO MUSEU A CÉU ABERTO [0041] A lama se derrama como lava vulcanica que excorre sobre a bella Pompéa, mas não é da forte clava juridica a justiça que congela os bens dos responsaveis, pois conchava a mafia do minerio, na sequela dum crime que o mineiro ja apponctava. Museu de Brumadinho, a lama leva, no bojo da ruina, à mesma valla commum dos cemeterios: só se eleva o numero dos corpos e se cala a midia, dentro em breve, quanto à treva, na ausencia da Alvorada. Quando a balla impera, do Vesuvio a lava neva.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES VANGUARDA CONCRETISTA [0042] Si cada viaducto que se eleva por sobre esta cidade nos desaba em cyma da cabeça ou uma leva de carros traga, asphalto addentro, accaba que, dentro em breve, a altura do que neva nas frias capitaes, aqui na taba tupy, será de excombros! Bella treva! Dystopica visão, que se renova a cada construcção que se derruba, a pedra paulistana será prova de como o arranhacéu, por mais que suba, um dia cahirá, vertical cova de tantos habitantes! Ubatuba será São Paulo, um dia? Alguem approva?

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14 GLAUCO MATTOSO MADRIGAL AMBIENTAL [0047] Um indio tem “pé gracil”? Alencar tal coisa de Pery quiz affirmar! Tem logica a supposta theoria dum pé bem torneado num heroe romantico? Pé chato, só, se via nas photos do Xingu! Ninguem se dóe por causa dessa casca que se cria na sola do cacique, nem do boy chamado “curumim”! Eu só queria in loco conferir o que remóe a minha delirante phantasia! Talvez eu ache “gracil” o que põe mais lenha na fogueira do meu cio! Pé “bello” ser não pode um pé de boi? Appenas si pensar me delicio na lancha expalhadissima que foi descripta num guerreiro desse rio famoso da Amazonia! Alguem suppõe que deva ao pedicure ter o brio tal indio de estar indo? Ninguem zoe!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES ODE AO DESAMPARO [0052] Por medo da represa, se evacua, inteiro, um logarejo. Si rompida, inunda cada casa, cada rua. O povo sae às pressas. Deixa a vida diaria para traz. Algum abrigo encontram num albergue que os convida. Mas vejam só que pena! Nem consigo crer nisso! Um animal que pesa mais de quinze kilos fica de castigo! Não pode ir com os donos, ou os “paes”, siquer um basset hound de trinta e trez kilinhos! Quem será que ouve seus ais? Só pode ser um cego, que vocês suppõem quem seja. Alguem traz o cachorro à sua casa, alem de outros bassets. Pequenos cães e gattos teem soccorro appenas pelo peso? Que injustiça! Por todos eu de amores aqui morro!

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Mas deixe estar! Provado que inteiriça esteja a tal represa, ter regresso às casas o povão logo cobiça! De volta a cria querem? Pois impeço que levem o basset, que é meu, agora! Irei, por elle, à lucta, mas me estresso! Si os “donos” o resgatam, quem ja chora é o cego, que sozinho continua, saudoso de outro amor que foi embora...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES OXYMORO DO OXYGENIO OU VICE VERSA [0061] Si tudo que é politico e correcto reprime e robotiza, disso a gente careca de saber está. Me inquieto, porem, com a razão desse evidente repudio que sentimos quando o veto dos chatos nos patrulha justamente naquillo que, mais sadico ou abjecto, nutrimos pelo proximo. Não mente a nossa natureza: sou o netto do Demo, não de Adão! Nossa carente humana raça, digna, não de affecto, mas odio, passará por este quente planeta mais depressa que um insecto. Sim, somos mesmo monstros. Ninguem sente a nossa falta. A fauna tem completo destino sem o “sapiens”. Mas quem tente pensar, concluirá: nesse concreto scenario, do bem resta uma semente, pois tenho consciencia e me interpreto com toda essa autocritica. Contente me sinto si me julgo predilecto dos deuses, luz mantendo em minha mente e, quando achei que irei ao céu directo, da morte sinto medo e pela frente não quero o mau momento. Qual o tecto e o piso da autoestima? Simplesmente o nivel do chão, pó do nosso feto.

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18 GLAUCO MATTOSO MANIFESTO COITADISTA [0146] {Não, Glauco! Você nunca ouviu fallar na “logica do assalto”? Quem assalta é “victima”, no caso! Um assaltado “auctor” é desse crime! Culpa tem o proprio capital! Sim! Quem mandou alguem ter algo de util que o “ladrão”, dizer quero, o “coitado” necessita? Não fosse o consumismo, talvez nem daquillo o coitadinho precisasse! Mas ja que precisou, tem o direito de, claro, appropriar-se, Glauco! Vê você como é bem logico? O subjeito só rouba si não tinha aquillo, saca? Quem tinha não devia ter, é claro! Entende como é logico o clichê?}


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-- Entendo. Quem não tenha, ainda, um lar a casa alheia invade! Só lhe falta a cama? Numa loja, o resultado do assalto foi a cama! Ja ninguem tem duvida: boceta, si faltou, compensa-se estuprando! Pode, então, quem “logica” adventou dizer que a dicta funcciona caso sua casa alguem occupe e seu cuzinho coma! A classe se inverte facilmente! Admanhan, feito bem faz quem foi roubado em seu apê e rouba do vizinho! O mais perfeito joguinho de “justiça”! Algum babaca crê nisso? Caso creia, me declaro “carente” e requisito o seu bassê...

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20 GLAUCO MATTOSO MANIFESTO AMBIENTALISTA [0151] “Glaucão, meu caro, sabe aquella aranha gigante? Sim, aquella que se chama Golias, ella mesma! Sim, bem sei do medo que lhe inspira a tal bichana! Pudera! Até maior do que um prattão daquelles rasos! Glauco, a cabelluda ninguem pode mactar! Sabe por que?” Caralho! Você sabe que tamanha bichana me intimida! Até na cama eu temo que se esconda! Ja fallei, não toque nesse thema! Não me enganna você, que é natureba! A gente não a macta porque exsiste lei que escuda os bichos de exterminio, ja se vê! “Que nada, Glauco! Occorre que façanha tal nunca alguem tentou! Nenhum IBAMA prohibe, mas ninguem, com ou sem lei, nem chega perto della! Só se damna quem della se approxima! Eis a razão de estar proliferando! Quem estuda diz: -- Picca mesmo, adviso eu a você!”


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Ja chega! Quer você ver si me appanha tremendo de pavor? Você reclama si eu xingo, mas me chama até de gay por causa da phobia! Mais bacchana seria si, por causa do tesão por pés, gay me chamasse! Não sou Buddha, não fico zen, sozinho aqui no apê!

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22 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO AO HIPPIE [0202] O flower power viu você crescer e sua juba, à mesma proporção. De São Francisco a Londres, a noção de paz e amor irá permanescer. Tune in, turn on, drop out tentou dizer: Viagem, syntonia, sacação. Na decada da droga era o bordão e o mundo viu o sonho accontescer. Mas, como um optimista assim não sou, e, como todo sonho tem um fim, a roupa colorida desbotou e agora você é pae dum outro teen: Careta, que nem curte rock’n’roll. Seu pé, porem, ainda tem p’ra mim um cheiro de amor livre under the toe e typicas geléas in between.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO AO PUNK [0203] No mundo sem futuro, você quiz levar o seu protesto até o extremo. Em termos de anarchismo foi supremo, alem dos estudantes de Paris. Ao som dos progressivos não deu bis. Não fez nenhum fingido culto ao demo. Lançou, no estylo “faça você memo”, fanzines tão zoneiros quanto fiz. Qual paz! Qual amor, nada! Qual yoga! A paz dos sessentistas foi ballada, às vezes abballada pela droga. Você creou podreira mais porrada. Seu sujo visual, ainda em voga, mais rude que o dos hippies, mais me aggrada: Me faz lamber seu pé depois que poga! Chulé não tem egual na molecada!

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24 GLAUCO MATTOSO MANIFESTO ALTRUISTA [0206] {Não basta liberar, Glauco! Me enfado de tanto fallar nisso! Quero, sem limites, consumir! Que não confisque ninguem o meu direito! Bello achado, dizer “recreativo”! Me deleita aquillo que prefiro! Jamais asco eu tenho de ninguem que dá confesso recado do seu vicio! Na cadeia não quero o dependente! Todos são bem livres para achar o que lhes dê prazer, Glauco! Tesão cada pessoa tem como bem prefere e bem deseja! Assim penso, Glaucão, assim eu vivo!} -- Pois é, si eu lhe offeresço um baseado, você, por certo, acceita, né? Tambem si um coppo de cachaça, vinho ou whisky lhe sirvo, você bebe de bom grado, não bebe? E chocolate? Não acceita? E bollos? E sorvetes? E churrasco? Café, si for espresso? Mas si peço que deixe eu cafungar na sua meia, cheirar por dentro o tennis ou no vão dos dedos lambidellas dar, você recusa, não recusa? Muito boa, a sua noção simples do que seja usar o que será “recreativo”!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO AO PARQUE [0219] Oasis de verdura no concreto. Cantheiro de graminha na calçada. Assim paresce o parque, da sacada da typica babel beirando o tecto. Em meio ao quente chaos, um logar quieto. Pelo Ibirapuera, a caminhada. Rente ao Jardim da Luz, uma fachada, projecto inaccabado do architecto. Ao Horto Florestal falta avenida. Trianon, Acclimação, a Canthareira. Transpira uma metropole trahida. Em tudo tem que ser sempre a primeira? Na pura polluição, vive hoje a vida que um dia viveria a Terra inteira. Não ha pioneirismo sem sahida. Sem arvore está a praça da paineira.

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26 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO AO VIADUCTO [0220] Pelo Anhangabahu, monumental, na perpendicular se allarga o Cha. Está o Sancta Ephigenia mais p’ra la, como uma torre Eiffel horizontal. Divide-se a cidade em chão normal e um outro patamar, que a cobrirá do feio centro velho ao Jaraguá, emmaranhando pontes num varal. Será a avenida como outras serão? Será passar por cyma a sua signa? Que raio de cidade sem vazão, escrava do motor a gazolina! Mas quem só falla mal não tem razão, pois sob o viaducto ja germina uma população de pé no chão, capaz de se expressar, contra a buzina.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO AO METRÔ [0221] Wagão de um olho só, rosto cyclopico. Ao viaducto o tunnel faz espelho. Si caranguejo é o transito, em vermelho, ao Capricornio irá o metrô do tropico. Ter toda a malha urbana é quasi utopico. Ja crer no velho trem é bom conselho. O trilho subterraneo ‘inda é fedelho. No picco é a ferrovia effeito topico. Não ha por que fazer errados testes. Em luxo, estylo e astral, ninguem compara uma estação da Luz ou Julio Prestes à Sé ou ao terminal do Jabaquara! Mas a cidade obstenta novas vestes. Não é mais européa a sua cara, pois nella pisam todos os nordestes e todos os sertões. Sinão, tomara!

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28 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO MAGRO [0329] Coitado de quem teme ser obeso, pois vive se privando dum bom pratto, comendo só ração, porções de matto, escravo dos limites do seu peso. À estupida dieta o cara é preso. Magerrimo, paresce estar, de facto, num campo de exterminio, sob ingrato regime de castigos e desprezo. Costellas tem à mostra, e ainda se acha saudavel! Si mulher, belleza pura, vaidosa duma assaz fina cinctura, do seu cholesterol medindo a taxa! Babaca! Emquanto malha na tortura, comendo dietetica bollacha, seu sabio e nedio medico relaxa e vae se empanturrando de frictura!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO RECYCLADO [0339] Vivemos chafurdando em podriqueira. Os ares se saturam de impureza. As fezes empesteiam a represa. Agua ja sae fedendo da torneira. Nas carnes o sabor travado beira a decomposição. À mesma mesa, tresanda uma fructeira e mantem presa a má respiração de quem a cheira. Soccorro! Vou morrer Preciso duma adjuda! Nas vascas da agonia somente prelibando o

contaminado! Aos céus imploro! ja estertoro, meu boccado!

Que nada! O conservante, o vento, o chloro ou mesmo uma menção dum deputado disfarsa a podridão do mau estado! Vomito, volto, voto, e ja melhoro.

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30 GLAUCO MATTOSO OPPOSTOS POSTOS [0363] {Do lado que, do Atlantico, te fallo, paresce-me, carissimo poeta, que estás a delirar. Como pretendes viver num paiz grande, si jamais estás, ou estiveste, ou estarás dum vasto territorio em quaesquer partes? Hem, Glauco? Como queres, te questiono, viver num paiz rico, si riqueza alguma não terá jamais o povo do qual te julgas parte, caro vate? Questiono-te, meu bardo: como pensas viver num paiz bello, si o desmattam, polluem e lhe extraem das entranhas minerios que nem ouro siquer são? Que raio de paiz é este teu, meu caro menestrel, em que se joga supposto futebol e que se brinca um falso, um falto, um futil carnaval? Responde-me então, cego trovador!}


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-- Confesso que pisaste no meu callo, carissimo confrade, e que me affecta aquillo que me indagas. Por que entendes que estou hallucinado, si normaes viagens são as nossas, ó rapaz, a bordo dum poema? Por que partes do falso presupposto de que dono eu seja da comida que na mesa não viste de ninguem, si me commovo com todos os que comem chocolate emquanto diabetico sou? Densas florestas nunca as gabam os que tractam, ahi, de versejar. Hem? Por que extranhas as mattas que perdemos, si ja não tem quasi teu paiz, tão europeu, aquellas que ja teve? E então? Que droga de seres são humanos, si se finca num touro, por esporte, esse mortal espeto que, em meus olhos, causou dor?

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32 GLAUCO MATTOSO RANHETA GRETA [0439] Estou magoadissima, ah, si estou! Irei ja convocar greve geral! Não! Quero uma global, pensando bem! Meu lindo planetinha todos nós, teenagers do mundinho todo, vamos parar, vocês verão! Eu vim aqui, tão crente e esperançosa, convidada que fora, mas, ouvindo esse discurso vazio, magoada fiquei! Como commigo fazem isso? Destruindo estão a minha linda, crente infancia! A minha linda casa de bonecas (o nosso planetinha) vae ficar sequinho, devastado! Magoada estou! Vou procurar outro caminho!


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E então? Do meu futuro, o que restou? E tantas creancinhas, que são mal amadas? Nisso pensa alguem? Hem? Hem? Não fica assim a coisa! Minha voz farei ouvir! Irão nossos reclamos nas redes propagar o que senti! Advante! Todos junctos, molecada! Não quero conversar só com meu urso, tão fofo, de pellucia! Agora sommo a minha birra às outras! Nosso lindo mundinho devastar vae a ganancia dos homens? Não podemos deixar! Necas! Parar irei a Terra, nosso Lar! Mas sabem por que estou tão chateada? O Glauco me mandou catar coquinho!

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34 GLAUCO MATTOSO FINAS NARINAS [0453] No melhor supermercado, cheira o açougue a carne crua. O fartum não é do aggrado de ninguem, nem se attenua. Pelo gancho pendurado, o cadaver que tem, nua, sua posta, é o que ennojado deixa aquelle que jejua. Vendo assim o morto gado, a madame tapa sua fina bocca, o nariz dado como lindo, e até recua. “Ai, que nojo! (pensa) Aquella perna inteira...! Essa amarella... essa... cappa de gordura! Que nojeira! Eu não aguento!” Um bifão, molle e sangrento, pelo gancho se pendura e tal scena, que desista, faz o pobre ecologista de comprar sua verdura.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES GENTE DO CÉU [0481] {Estou é chocadissima, amigão! Não posso crer naquillo que estou vendo nas telas, nos jornaes! Gente do céu! A praia toda preta! A gente nota a pelle do menino ja todinha pichada, Glauco! Gente do céu, isso é um ecoterrorismo sem limite! Não, gente do céu, como se permitte que toquem nesse toxico? Ninguem devia alli ficar, gente do céu! Você não falla nada, Glauco? Falle!} -- Até ja fiz poema, minha mão sujei para limpar aquelle horrendo petroleo que grudava p’ra dedéu na sola do moleque que, sem bota nem mesmo uma hawaiiana, alli ja tinha entrado p’ra adjudar nesse serviço inglorio de limpar tanto graffitti de estado, ou do terror! Nem dou palpite si queima de “peneus” pode tambem ser ecoterrorismo. Mas ao léu estamos, si Satan diz: “Tudo vale!”

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36 GLAUCO MATTOSO PODRE DE RICO [0517] {Ai, Glauco! Os ricos, muito ricos, são malucos! O dinheiro os enlouquesce! Sabia que Bill Gates inventou... Sim, isso! Uma ecologica privada, capaz de transformar as nossas fezes em agua! Sim, em agua, em agua limpa! Fefito perguntou: “Você bebia tal agua, recyclada do cocô?” Pois é, nosso querido cocozinho virando uma purissima bebida, fresquinha, transparente... Ou não. Talvez um pouco marromzinha, parescendo café com leite... Hem, Glauco? O que você me diz? Hem? Tomaria aquella aguinha?}


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-- Ué, mas ja bebemos, amigão, tal agua! Nada vejo, mas paresce que sae ja da torneira como entrou, barrenta, cor de terra, amarellada. Por isso vou ficar fazendo theses assim conspiratorias? Minha grimpa nem coço. Sem comptar que bem podia a nossa ser cocô, porem... Hem, pô? Nem mesmo recyclada! Ja adivinho aquillo que você, que se intimida com isso, me dirá, por sua vez. Não sente o coração o que não vendo estão os nossos olhos. Quem não vê perguntas não fará. Quem adivinha?

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38 GLAUCO MATTOSO VINHO NA BOTA [0518] {Agora a gente encontra, Glauco, à venda um’agua assim, direi, “saborizada”, purinha, sem assucar! Não é lindo? A gente abre a garrafa, saboreia, degusta, até commenta sobre nota, resaibo, transparencia, marca, tudo! Não é lindo, Glaucão? E faz tão bem ao corpo! Da sahude cuida quem consome essa bebida assim moderna!} -- Lindissimo, sem duvida. Ninguem da selecta sociedade exalta nada inutil nem superfluo. Sorrindo estou, veja você. Garrafa cheia nem quero ver sobrar. Quando na bota beberem, a brindar algum sortudo evento, fingirei ter nojo, nem pedir vou um golinho. Ora, quem tem visão va pedir agua na taverna!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO URUBUEIRO [0532] Cortavam tuas aguas bello bosque, chamado de Dom Pedro, antes de entrares no limpo Tietê, rente a pomares, caramanchões, corettos, a um kiosque. Não falta, agora, entulho que se enrosque nas tuas pedras podres, e teus ares venenos são, a poncto de nem dares abrigo ao ratto audaz que em ti se embosque. Si exgotto a céu aberto é o Tietê, nem isso és tu: tens tecto sobre ti! Teu leito, lodo grosso, mal se vê. Olhando tuas margens, não sorri... Ninguem, mas talvez fique na deprê. Reflexo da tristeza em que cahi, o mais saudoso addeus que alguem te dê, Tamanduatehy, te mando ahi!

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40 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO AO MOTOBOY [0538] Sem ter por protecção jaqueta ou bota, às vezes nem siquer o capacete, emquanto seus patrões no gabinete relaxam, segue o boy a sua ropta. Nem sempre anda em vehiculo de frota, possante ou equipado, mas compete no transito e no picco pincta o septe, nos septe às septe entrega e a quota exgotta. Armado, um delles macta; um outro assalta. Reclamam si as noticias são infames. Algum é descalçado por madames que lambem sola e grana pagam alta. Não passa, a maioria, nos exames, mas é corrida a vida do peralta! Si um bardo que lhe exalte o drama falta, dependes delle, ainda que o não ames!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES INFINITILHO VERMELHO [0583] Signal verde, vermelho, verde... Mas nem quando fica verde livre fica o transito. Uma longa fila vae, de poncta a poncta, pela rua toda. Os carros buzinando vão, mas nada resolve tal barulho. O motorista que, preso no vehiculo, se estressa é visto por pedestres e por gente que mora alli na rua como um pato. Nem sempre taes pessoas são tão más, mas, quando se engarrafa a coisa, a zica de quem está nos carros nellas trae a sadica tendencia. Que se foda desejam ao choffer. Ficam, de cada sacada, janellinha, porta, à vista de todos, caçoando, rindo dessa ralé motorizada. Mui contente percebo o transeunte mais pacato.

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42 GLAUCO MATTOSO

Qualquer velhinha mostra-se mordaz, qualquer moleque exfrega a sua picca, qualquer porteiro ja no riso cae, qualquer vovó sorri, qualquer vovô da desgraça alheia goza na calçada. Eu mesmo, que me julgo masochista, divirto-me com isso, sim, à bessa. Até battendo palmas ha quem tente fazer festa. Aliaz, eu tambem batto.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO IMPROVISADO [0671] Não ha publicação que mais fascine leitores e editores, mesmo os poucos. Utopicos, fanaticos ou loucos, são elles os arteiros do fanzine. Quadrinhos, som, ficção, seus themas, e um auctor brigando p’ra vender por um meio independente que

poema ou cine, soffre suffocos parcos trocos opte e opine.

Si “ver com olhos livres” é anarchismo, o zine é o orgam maximo da imprensa “nannica”, “marginal”, qualquer baptismo, comtanto que, em seu circulo, convença. Modismo, nihilismo ou altruismo, seu merito maior é o que elle pensa e exprime, coherente com o abysmo que apparta a liberdade da licença.

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44 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO GATTO PINGADO [0672] Zineiro, buzineiro da anarchia, que juncta no papel cacos de estrada, galaxia, giria astral, jornal, jornada, garagem, gangue, ghetto ou guerra fria! Si Si Si Si

pensa em poesia, a voz varia. enquadra no quadrinho, berra e brada. mede a Edade Media, espicha a espada. goza o cine em scena, exporra e espia.

Por ser exaggerado e circumscripto é tão contradictorio quanto o facto de erguer, minimo e unisono, seu grito, que pode ser politico ou gaiato. Si estudo, valorizo o seu agito. Si edito, vandalizo e desaccapto. Si leio, fanatizo-me e repito o lemma: “Antes quintal que anonymato!”


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES INFINITILHO DA EMPULHAÇÃO [0702] Dum lado, desconfiam da facada. Uns acham que foi scena bem armada, mas torna-se impossivel suspeitar de tantos hospitaes, de renomados doutores que terão reputação e nunca acceitariam uma farsa. Paresce que, si insistem nisso, vão cobrir-se de ridiculo os que tal versão ainda querem sustentar. Dum outro, mais vexame dá quem brada que plana sempre fora a Terra, nada havendo que se imponha, nem lunar visão, nem solar polo dos dois lados do movel horizonte, num clarão. Um trouxa, que duvida até da Barsa, fé bota num guru, num charlatão que passa por philosopho. Total burrice, dos dois lados, bipolar.

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46 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO EMPORCALHADO [0703] {Sabias tu, Glaucão, que exsiste um typo mais caro de café, mas tão selecto que custa dois mil dollares o kilo? Verdade! Elle é tão raro porque vem o grão do cocozinho dum gambá, alguns dizem dum porco, mas é facto! O bicho o grão engole e não digere, porem aquelle typo de grão é comido pelo bicho por excolha do proprio, sendo, pois, especial! Não achas isso o maximo, Glaucão? Será que tomarias tu daquillo, ainda que pagar não precisasses?} -- Estás é louco! Nunca participo de farsas taes! Sim, tenho um predilecto café: se diz “espresso” por estylo, com “S”, em italiano. Quer alguem provar-me que melhor café não ha que fezes de gambá? Sou eu o pato, talvez? Ha rico trouxa que prefere cocô torrado? Botas nisso fé? Melhor é duma droga ter a folha no cha! Dá mais barato, por signal... Em porco por fallar, por que não vão comer o seu cocô, pago por kilo? Dará menor preju nas altas classes...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES PSYCHOTICO DIAGNOSTICO [0718] {Cantora gospel? Hymno protestante? Um canto gregoriano? Um candomblé? De jeito nenhum! Chega desse pappo! Não posso permittir! Eu, que sou membro da Camara de Agnosticos e Atheus, entrei ja na Justiça para ver si barro um espectaculo onde esteja qualquer canção do typo programmada! Emquanto não puzerem uma banda que toque rockão sceptico, ninguem escuta mais tal musica de egreja! Estou certo, Glaucão, ou não estou?} -- Mas sceptico rockão ja tem bastante tocado por ahi! Creio, não é, não, por ahi, pagão! Va caçar sapo, diriam os Mutantes... Em dezembro você não vae querer que alguns dos meus amigos de Natal não possam ter ouvido umas canções! Beber cerveja deixar não quer quem bebe limonada ou vinho? Ninguem nessas coisas manda! Satanico si sou, ou monge zen, eu ouço o que quizer, seja ou não seja em publico! Procure por seu show!

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48 GLAUCO MATTOSO INFINITILHO MOLHADO [0721] {Odeio os novos jovens, Glauco, odeio! Dos jovens mais antigos, que nos são tambem contemporaneos, raiva tenho por causa do rockinho vagabundo que escutam, differente do da gente, que sabe distinguir o que de bom o rock offeresceu... Glauco, você tambem odeia aquelle novo joven? Nem rock escuta, raios! E nem dá direito p’ra saber que porra aquillo seria! Acho que nome isso nem tem!} -- Talvez se chame funk, axé, mas creio que este comprimidinho sensação mais calma lhe trará. Sei que ferrenho fanzão você dos Beatles foi. Segundo meu senso, ouvir podemos longamente o RUBBER SOUL, que tal? Assim do som dos jovens actuaes nem tem porque você ter odio. Os nossos sons ja chovem, por si, nesse molhado blablablá. Sossegue, meu amigo. Bem tranquillo estou, que peor coisa ainda vem.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES INFINITILHO COMPARTILHADO [0724] {Ahi, Mattoso, quero que me digas si estou equivocado ou si nós dois entramos num accordo. Pois occorre que dó, mesmo, não tenho de ninguem, nem velho, miseravel, cego, mudo, currado, prisioneiro, cadeirante, emfim, ninguem da raça que se diz humana. Mas não é que sinto dó dos bichos? Sim, dó tenho de cachorro, ainda que feroz, si maltractado, faminto, abbandonado, coitadinho! Paresce-te talvez, Mattoso, que eu me mostro um insensivel? Mas tu tens, tambem, com cachorrinhos o maior carinho! Pelos homens tu tambem terás o meu desprezo? Me responde!}

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50 GLAUCO MATTOSO

-- Prezado cidadão, entre as amigas pessoas que me pedem nome aos bois, cachorros, gattos, patos, quem me torre o sacco nunca falta. Mas me vem alguem como o senhor, que falla tudo aquillo que sustento. Semelhante a todos os humanos sou, mas quiz deixar claro nos versos que xodó não tenho por ninguem, por ninguem morro de amores, nem por mim. Por outro lado, adoro cachorrinhos, com carinho refiro-me ao basset. Quem entendeu meu poncto me meresce parabens. Portanto, meu senhor, nada melhor que nós compartilharmos o que tem a gente em commum, sabe só Zeus onde.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DESARVORADO [0732] Paresce que as molestias pulmonares voltaram numa escala assustadora. Pandemicas ja são, como si fora romantica a aridez dos nossos ares. Pulmões são, um por vez, nem sempre aos pares, os alvos das bronchites, da trahidora, fatal tuberculose, e assobiadora se torna a inspiração nos lupanares. A pleura dóe nas costas, e no peito reflecte a grossa tosse da trachéa. Si for com hemoptyse, fodeu, é a sangueira que encatarrha um cano estreito. Asthmatica e pneumonica, a plebéa manada arfa no denso (ou rarefeito) ar nosso. Quem na clinica acha um leito não morre na polluta Paulicéa.

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52 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DAS TROUXAS DOS TROUXAS [0748] Um bando embandeirado dos sem-tecto occupa um edificio abbandonado. Installam-se as familias. Lado a lado, convivem rosto e pé, rango e dejecto. Cubiculos estão onde o selecto e vasto condominio foi lembrado. Até o momento ausente, agora o Estado se mexe, cerca o predio, afflicto, inquieto. Os novos moradores barricada constroem, se entrincheiram e resistem sem terem horizonte algum que advistem, até que o hostil bloqueio os dissuada. Por fim seus dados deixam que se allistem na fila das promessas vans, armada por lideres “pragmaticos”, e cada sem-tecto sae sem rhumo. Outros assistem.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO PRECONCEITO TEMPORAL [0778] Os meteorologistas não teem cura no seu tendencioso linguajar: “mau tempo” dizem quando vae fechar e “tempo bom” si o sol brilha e perdura. “Melhora” só si a chuva não figura nas tortas previsões. Massa polar ou frente fria ao verbo “peorar” vinculam. Si exquentar, delicia pura! E si eu gostar de chuva? E quando o hinverno bemvindo for a alguem? Com que direito, achando que o verão seja perfeito, quem só curte calor quer sol eterno? O clima é democratico e subjeito a subita mudança: ora eu governo e sou, mais que “infernista” fui no inferno, “chuvista”, ora um “solista” accaba eleito.

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54 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO MONUMENTO AO MOMENTO [0794] São Paulo tem no centro um predio antigo cercado de outros tantos, cuja porta lavrada em ferro e vidro não comporta a tanto transeunte dar abrigo. Janellas e sacadas mal consigo notar, graças às placas que põem torta e escura uma fachada quasi morta no tempo, em photos nitida commigo. Por dentro esse edificio ‘inda conserva, nos lustres e no marmore, imponente adspecto, alheio ao chaos que a rua ennerva. Dos fundos num quartinho faz cha quente... A velha, si da vespera tem herva. Dalli sahiu e entrou ja muita gente e cada vez mais pobre está a caterva que, sempre às pressas, passa-lhe na frente.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA ESTIAGEM [0842] O incendio florestal tudo devasta! Reservas inteirinhas viram braza e quem não desoccupa sua casa na pelle vê que a sorte lhe é madrasta! Paiz carente ou rico, extensão vasta ou curta, o fogo até cidade arrasa! Peora quando, cada vez mais rasa, a suja agua retida ja não basta. Si for por tal caminho, tudo indica que della nem beber vae um cachorro! Si morro accyma, é fogo na cangica! Si vae por agua abbaixo, desce o morro! Correu, o bicho pega, e ai de quem fica! O mar não tá p’ra peixe e, sem soccorro, em breve agua só bebe gente rica: si exgotto eu não beber, de sede morro!

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56 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO UNIVERSAL [0879] Calçada agora serve para tudo: deposito de lixo, material de exgotto e construcção, como quintal ou estacionamento ao par desnudo. É salla de visitas ou entrudo aos anjos e marmanjos, e a geral que assiste a uma pellada occasional, affora qualquer outro contehudo. Virou casa da sogra e se destina a tudo e todos, menos à cidade humana, principal finalidade dum publico caminho, exquina a exquina. O cego é quem se fode! Elle que nade no lodo da sargeta, à fedentina subjeito, e que se borre, ou tire a fina no meio duma escada e duma grade!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO NÃO-GOVERNAMENTAL [0895] O que é, o que é? Responda antes que eu gongue! Tem cara, ou duma creche, ou de hospital, às vezes até banco, e o capital tem credito que encurte ou que se allongue. Nem nem nem Não

clube de gamão, nem pinguepongue, mutirão, nem multinacional, fundo de quintal, nem estatal! adivinha? É simplesmente a ONG!

Mais extraofficial é o combattivo estylo do Greenpeace ou dos anarchos, que, intrepidos, transgridem legaes marcos e enfrentam as potencias com motivo! Meu caso é bem atypico: com parcos recursos compto, e da visão me privo, excappo ao litterario e culto crivo, mas contra os baleeiros vão meus barcos!

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58 GLAUCO MATTOSO RHAPSODIA AMARALIANA [0935] {Você ja reparou, Glauco? Foi só algum poeta achar que bom assumpto é ter amor aos rios, e ficamos aqui nós lendo um monte de elogio às aguas fluviaes, como si fosse possivel que ellas limpas, no futuro, conservem-se! Imagine, Glauco! Um monte de merda, nas cidades, em exgotto transforma aquellas aguas! Na rural porção do mappa, as aguas pela lama serão é polluidas! Veja Minas! Cadê que pescadores pescar possam? Cadê que de beber haja padrão? Cadê que plantações se fertilizem? Não, Glauco! Um Amaral da vida não consegue thema achar no rio num presente insustentavel como o nosso!}


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES

-- Nem falle! Realmente é de dar dó. Às vezes, pensativo, me pergunto que typo de potavel agua vamos beber si, em breve, quasi nenhum rio se salva. Que será duma agua doce num sordido planeta de inseguro futuro? Quem passar por uma ponte nem olha para baixo. Nem garoto de rua nada alli. Não, Amaral siquer imaginou a triste fama reinante em Mariana. Mas latrinas não são só nossos rios. Ja se esboçam scenarios taes nos mares. Cagalhão ja boia pelas praias. Que não pisem na merda as creancinhas! Ellas são futuras poetizas, e commum será cantar aquillo que não posso.

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60 GLAUCO MATTOSO RHAPSODIA BELMIRIANA [0936] {Você ja reparou, Glauco? Um poeta não perde qualquer chance de cantar os rios! O Belmiro Braga quiz tambem approveitar do sonho o typo de imagem, comparando o coração instavel ao instavel movimento das aguas. Nada falla, todavia, de exgotto ou polluição. Que lhe paresce, Glaucão? Forçou a barra, ao comparar, ou fica a poesia a lucrar algo?} -- Que fica, fica. Ja que elle interpreta assim, vou completar. Vou, em logar das quedas e das curvas, o nariz tapar e só dizer que participo do caso. Sim, me sinto o cagalhão que fica fluctuando. Quando tento na margem descansar, a agua me envia a alguma cachoeira. Antes que cesse meu susto, novamente dou azar e nunca alguma margem, emfim, galgo.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES RHAPSODIA FONTESIANA DO HERMES [0937] {Você ja reparou, Glauco? Ninguem verseja sobre rios sem usar imagens dum humano ou animal ser vivo, que colleia, serpenteia, se exgueira. A perseguil-o, ou a tentar barral-o, um morro, um mar ou um abysmo. Assim faz Hermes Fontes outro obscuro retracto, sem fallar de polluentes exgottos. Nem paresce haver acção humana, predatoria, nesse caso. Não acha que isso muito delimita o thema, Glauco? Faça algum juizo.} -- Sim, acho. Nesse caso, o que me vem à mente é collocar nesse logar, de facto, uma barragem. Affinal, não ha peor obstaculo, pois freia de vez aquelle curso. Si esse mar postiço se romper, eu logo scismo que pode ser de lama tal futuro, por causa dos minerios que essas gentes fanaticas por lucro sempre estão a achar por toda parte. Nosso prazo se exgotta, aqui na Terra, mas bonita imagem, só os poetas fazem, friso.

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62 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO AO CARNIVORISMO [0973] Vermelha quando crua (verde, até), ainda que, sangrando, induza ao asco, sem ella não teriamos churrasco, croquette, kibbe, almondega ou filé. Não tem cocoricó nem mu nem mé: si for de lan, de escama, penna ou casco, eu testo, tosto, trincho, traço e tasco no almosso, no jantar ou no café! Da carne o que se diz é que é peccado. Mas não é vegetal a tal maçan? Não! Nada de perdão, nem de divan! Problema nenhum vejo em comer gado! Chatissimo seria, de manhan, em vez de lindamente haver casado com ovos o presuncto e o pão torrado, comer só matto e só de cha ser fan!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DIALECTICO-DIETETICO [1016] Attraz do do becco, o lixo e, um velho,

restaurante, rente ao muro em lattões altos se accumula alli por perto, perambula a revirar cada monturo.

Emquanto alguem, la dentro, o azeite puro derrama na salada e cede à gula, na latta um fructo agguarda quem o engula e ha muito está passado de maduro. A scena, que alguns acham tão nojenta, não causa, alli, pudores indigestos. Por entre insectos move-se a cinzenta e gorda rattazana, e fartos restos... Mixturam-se, da almondega à polenta. Ninguem diz, nem nos lares mais modestos, que mal e porcamente se alimenta, malgrado os esquerdistas manifestos.

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64 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA BANALIDADE INESPERADA [1186] Metrô lotado é barra! O punk encosta na porta, que se fecha lentamente. Alguns executivos, logo à frente, se expremem, e daquillo ninguem gosta. Comsigo mesmo, o punk arrisca a apposta: “Só quero ver a panca dessa gente si cuspo na gravata ou bem na lente dos oculos de algum cara-de-bosta!” Quem gosta duma verde excarradella? Foi dicto e feito: a grossa cusparada respinga, ‘inda espumante, na lapella do terno dum bancario! Sae porrada? Facada? Lynchamento? Nada! Aquella sahida foi banal: dando risada, o punk excappa e o trouxa os dedos mella! Depois aquillo vira até piada...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO ACQUESCIMENTO GLOBAL [1199] Fallar de “acquescimento” ja não faz appenas referencia ao jogador de bolla ou ao commercio: o divisor das aguas é o que exsiste por detraz. Agora de “emissão”, de “extupha” e “gaz” se falla. Antigamente, o defensor da Terra, em vez de guerra, fez amor, foi “hippie” e “ecologista”... Hoje, é mordaz: -- Bem feito! Não fallei? Vocês diziam que estavamos no mundo mais lunar! De ozonio agora passam a fallar! Ja disso se (tardou) penitenciam! Si esperam do planeta algum logar de vida e não de morte, si confiam ainda na sciencia, não me riam do rotulo: “Lar, agua doce lar”!

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66 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA PROPHECIA VISCERAL [1209] Meu intestino está, como um radar, sensivel às mudanças que ha no clima: conforme para baixo ou para cyma oscillam os thermometros, vae dar. Só vae, porem, da graça dar seu ar por antecipação: si se approxima a chuva, ou quando o sol, emfim, se anima o meteorologista a annunciar. Cagar ou não cagar tão só depende dos ventos, da humidade, da pressão externa e não interna! Alguem entende? Alguem explica como os factos são? Alguma theoria fructos rende? Si solto o barro ou prendo o cagalhão prevejo olhando o céu: para que agende o dia de sentar, passa um tempão!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO PAPA EM SAMPA [1242] A praça cheira a mijo. O lixo está jogado pelos canthos. Madrugada addentro, o vento é gelido e, alli, nada indica que o local sagrado é ja. Ao fundo, está o mosteiro antigo e, la, deserta agora, a gothica sacada de cujo parapeito era lançada a bençam que aos fieis o Papa dá. Mendigos perambulam, à procura Deus sabe la do que! Se affastam quando, de longe, alguem advista a viatura. O largo de São Bento tem commando. O Papa dorme, em commoda quentura. O carro da policia passa. Em bando, retornam os sem-tecto. Frente à escura fachada, fica um bebado cantando.

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68 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA CHUVA INTEMPESTIVA [1271] A chuva, que era fina, só garoa, augmenta e se converte em aguaceiro. No poncto, sem abrigo, fica inteiro molhado quem da longa espera enjoa. Nenhum omnibus serve, mas a boa vontade, emfim, compensa: o passageiro advista “Villa Diva” no lettreiro! Suspira, alliviado: o tempo voa! Mas tem que cada coisa vir errada! Na hora de embarcar, constata, é tanta a força da enxurrada na calçada (e o nivel d’agua a roda ‘inda levanta) Que o cara, a roupa toda ja encharcada, desiste e volta attraz! Em casa, a janta será, mais tarde, a sopa requentada. Quem acha azar egual coisa que expanta?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO DENOMINADOR COMMUM [1292] Um punk e um hippie attritam p’ra ver qual dos dois mais firme lucta e tem seu thema mais rude e radical contra o Systema que, em ambos, despertou odio mortal. O hippie, pacifista e passional, allega que em maré contraria rema quem quer, a ferro e fogo, e com extrema conducta, combatter tão vil rival. O punk é mais directo: paz e amor não vingam; “flower power” não floresce, pois faz, de facto, o jogo do oppressor. O hippie suggeriu que se fizesse... A guerra sem as armas. Só si for! Não chegam a consenso. Não exquesce nenhum dos dois, porem: diverge a cor, mas contra o mesmo Zeus se reza a prece.

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70 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DOS EDIFICIOS TOMBADOS [1295] Em Sanctos, predios tortos são roptina no urbano panorama: mais se inclina um delles que, na Italia, a torre fina, cylindrica, que em Pisa se illumina! Em frente à praia, dando para a exquina, o predio impressão dá de que em ruina irá se transformar, nem bem termina o dia, mas ha decadas se empina! Num desses, por signal, eu mesmo estive: Milagre é o que paresce equilibral-o! La dentro, o appartamento faz declive que dá para um patim descer no emballo! Tontura sempre sente quem la vive! Rollou ja muita pillula no rallo e dum collar a perola, inclusive! Que mais posso dizer si disso fallo?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO SAUDOSO ASSOBRADADO [1390] Vermelho, cappota e ao nosso: londrina,

dois andares, abbahulada direcção do lado opposto este o busão que, da calçada advisto. Estou à chuva exposto.

Embarco e, pela estreita e curva escada, alcanço o andar de cyma. Com que gosto me sento, a contemplar esta nublada cidade, onde o rockão fora composto! Compoz The Who tal saga adolescente. Um omnibus foi magico, e não só à banda que fez delle seu xodó: tambem meu coração saudade sente. Se tracta de salvar um ambiente. Agora me disseram que abolido seria o vermelhinho, mas duvido que alguem possa appagal-o em minha mente.

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72 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA PAZ E DO RANCOR [1396] Sahidas, a hippie reside o verdades

em politica, só duas: e a punk. Appenas na primeira pacifismo, o amor, as nuas e vontades... Mas Zeus queira!

As coisas, na segunda, são mais cruas e, assim como o rockão é mais pauleira, tambem as reacções são, pelas ruas, mais proprias à pedrada, que é certeira! Em termos philosophicos, no plano geral e humanitario, tenho o brio pacato, coherente, e mais me irmano aos hippies, pois em armas não confio. Mas, quando o pessoal e o passional mais alto fallam, quasi não me allio aos hippies, pois me sinto ao punk egual e adjudo a pôr na polvora o pavio.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA GASTRONOMIA SADIA [1421] Agora os “naturebas” querem “viva” a sua verdurinha: si germina o grão, à nutrição é mais activa a acção do broto, rico em vitamina. Eu penso ca commigo: si saliva na bocca provocando esteja a fina modinha culinaria em quem se priva das carnes, e o carnivoro? Rumina? Prefere só tostado? Só crocante? Que nada! Vivos come o porco, a ran, o pato, o peixe... Mexem-se, mas van é a lucta do bichinho estertorante. Lhe servem, admarrado, um elephante. O gajo trincha um naco, ‘inda sangrando: em vez de preparado em fogo brando, procura o cru sabor no restaurante.

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74 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO TRAHIDOR DO MOVIMENTO [1438] O punk, office-boy que sempre fora, resolve procurar um novo emprego. A vaga de bancario é temptadora: por ella perde o gajo seu sossego. Cabello mohicano, que a tesoura jamais appararia, pede arrego e abbaixo vem! Cothurno, que ja extoura, se troca por sapato de pellego. A vaga? Ah, tão difficil conseguil-a! Coitado do moleque! Engravatado, começa a trabalhar... Mas, do outro lado daquelle seu guichê, se allonga a fila... A fila não está, porem, tranquilla, pois nella estão, à espera, os outros boys, de bota e de jaqueta, feito heroes chamando o companheiro, que vacilla.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA MOTO CONTINUA [1453] Ligeiro, esse vehiculo que, em meio ao transito, as cidades attravessa! Mas soffre o motoqueiro, com receio dos carros, e correndo risco à bessa. O motoboy que, rapido, nos veiu trazer uma encommenda, mais depressa ainda leva o proximo correio rodante, sem bloqueio algum que o impeça. Às vezes, na garuppa vem o cara que armado obstenta estar e nem despista, lhe dando cobertura, que dispara caso, no carro, a victima resista. Porem o mais commum é, no accidente, jazendo extatellado em plena pista, ser victima o rapaz que, mais à frente, si vivo, não será motocyclista.

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76 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA BAGUNÇA CLIMATICA [1471] O clima é imprevisivel: sol ou chuva? O gajo sae de casa e leva blusa, casaco, guardachuva, gorro, luva, galocha, cachecol, cappa... e nem usa! Calor ou frio? A practica comprova que a meteorologia é mentirosa: Previra tempestades? Uma ova! Iria fazer sol? Fiada prosa! Quem é que, sem errar, se posiciona? Emquanto, no Nordeste, a enchente allaga, no Sul a secca torna-se uma praga, estraga a safra toda, agua raciona. Quem é que, ecologista, a coisa abbona? Si tudo o effeito-extupha inverte, então calor no hinverno, neve no verão teremos e, nas modas, uma zona.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO MONTURO FUTURO [1474] Depositos de lixo são problema urbano que se aggrava e multiplica, a menos que um montão alguem exprema até virar grãozinho, e passe a dica. Emquanto não compactam, nem a extrema materia em energia alguem applica, o atterro sanitario ainda é thema alheio à economia podre e rica. A propria sociedade repudia o lixo que ella gera todo dia, fechando-lhe seus olhos e o nariz, trocando saudações as mais gentis. Si não se approveitar esse chorume, terá, caso o detrito se advolume, Ministro do Lixão cada paiz dum mundo que pensar nisso não quiz.

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78 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA CHUVA ACIDA [1517] “Chuvinha!”, exclama o velho, ao ver toró cahindo. E batte palmas: “Oba! Está”, diz elle, “chovendinho...” Pois é só nublar-se o céu, e ja risada dá. Ouvir fallar em secca causa dó terrivel no coitado. Embora va mui raro ao interior, tem um xodó damnado, ao se lembrar do Ceará. Eis como, a rir, a lagryma affugenta: “Menino, óia que chuva mais bonita! Não vê como esse arzinho não irrita o zóio nem resecca a nossa venta?” À phrase quem qualquer coisa accrescenta? Durante o hinverno, soffre de anxiedade, ao ver formar-se, sobre esta cidade, a nuvem polluida e pardacenta.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA DESGRAÇA POUCA [1518] Na rua, pouca gente. A noite é fria. Semaphoro vermelho. O carro para. La dentro, o pae, o filho, a mãe, a thia. Armado, da calçada chega um cara. A thia grita. Arranca, vazia o motorista. Mas um tiro o gajo e, logo ferido no volante quem

pela via dispara addeante, arria ousara.

Ainda rindo, tendo pouca pressa, o gajo foge a pé. Desgovernado, o carro sae da pista e tomba ao lado do corrego, onde ha matto e bicho à bessa. Maior complicação, então, começa. Sahindo do vehiculo, é piccada por varias aranhonas a coitada da thia: os outros ficam livres dessa.

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80 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO GYRO SEM VOLTA [1519] Mais uma historia urbana: da ballada sahindo, os jovens lotam a perua e partem, na fatal “desabballada carreira”, pneus cantando pela rua. Chegando ao cruzamento, uma mais brusca faz que o carro depois de cappotar. Ferido, rapaz que sobrevive conta a

freada se destrua cada sua.

Ao facto todos elles bem reagem. Morrera o motorista, mas o resto da turma appenas gaba-se do gesto ousado que causara a cappotagem. Precisa algum dos jovens ter um pagem? Na proxima semana, mais um morre e, ainda de resaca pelo porre, os outros enaltescem-lhe a coragem.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA COMMUNIDADE INCOMMUM [1521] Quem vê dum avião nem accredita que sejam mesmo casas: a favella se expalha morro accyma, uma infinita colméa, um formigueiro, como aquella. Mais fragil que, no mangue, a palafitta, alli barraco é predio, tem janella que não accaba mais! Kosmopolita aquella architectura se revela. Mesquitas, supportam, Cappellas, não perdem

cathedraes, pagodes, ventos tempestades, inclusive. synagogas e conventos equilibrio no declive.

Pyramides, basilicas, mosteiros, até de arranhacéus impressão tive, mostrando que architectos brazileiros la moram, são o povo que alli vive.

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82 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO CARRO DO ANNO [1549] Chamava-se o carrão de “cadillaque” si fosse ultimo typo e o dono rico. Em sendo o carro velho e tendo acchaque, é como “calhambeque”, eu classifico. Agora ambos são dados de almanach, mas cada qual ja teve anno de picco. Quem quer que um delles, hoje em dia, emplaque verá que as peças ja não teem fabrico. Playboys que cadillaques, nos sessenta, usaram, exhibindo-se nas modas de então, só querem hoje barulhenta perua, com tracção nas quattro rodas. Preferem digital som à buzina que ao somno alheio impoz ja tantas podas e, quando dão carona a uma menina, teem mais trazeiros bancos para as fodas.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA FUNDAÇÃO [1554] No Pateo do Collegio, um monumento lhe marca a fundação, mas o que salta aos olhos é o contraste entre o momento diverso em cada predio, e o que alli falta: As do da se

arvores! Cadê? Só me lamento preto em que a avenida se lhe asphalta, pedra que, nos predios, com cemento juncta, e do metal que tudo esmalta!

E as arvores da praça? Onde estão ellas? Cadê do meu affecto o velho objecto? Em vez de verdes folhas, só janellas se empilham na muralha de concreto! Bem onde os alicerces se plantaram não restam nem vestigios do projecto. Os novos jesuitas se deparam com obras: os milagres do architecto.

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84 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA BICYCLETA RECYCLADA [1563] Chamou-a, quando joven, de “magrella”. Agora a está chamando de “sucata”. Ganhou-a nova em folha e ja por ella esteve appaixonado. Hoje a maltracta. Achava que a cidade bem mais bella seria si as pessoas, desde a matta até o velho centrão, fizessem della seu meio de transporte... Hoje ella é chata. Não é que elle se sinta algum ricaço: Depois que comprou carro, está mettido a boy de classe media, e não duvido que se ache só o gostoso do pedaço. Idéa do restante então ja faço: A velha bicycleta, enferrujada, terá sorte de haver sido doada ao circo e ter servido a algum palhaço.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DA CAMA FEITA [1628] Uma saccola plastica demora cem annos (é o que dizem) para, emfim, deixar de polluir tudo que, agora, pollue! É muito tempo, para mim! Em casa, aquelle lixo para fora jogamos sem pensar! Não sendo assim, o plastico accumula e, alguma hora, terá que lhe ser dado qualquer fim. Exsiste solução? Alguem tem peito? Saccolas recyclaveis solução sensata me parescem, porem não entende assim qualquer governo estreito. Dos taes “especialistas” eu suspeito. Que querem? Quando não houver logar nenhum mais para o plastico jogar, com elle forraremos nosso... leito!

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86 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA PRISÃO PERPETUA [1629] Que merda! Essas buzinas, quando está o horario em pleno picco, dão na gente maior irritação do que dará o carro alli parado, à nossa frente! Ja não bastasse o estresse brabo, ja não fosse tanto attrazo, o impertinente barulho das buzinas deixa má a fé que tem no sancto qualquer crente! É cada qual das trilhas mais sacana! Variam esses themas: tem o fan dum time, duma banda, do Tarzan e da cavallaria americana! E cada qual se julga mais bacchana! Assim não dá! Prefiro andar a pé e demorar dois seculos até chegar, que neste carro estar em canna!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO EQUIVOCOMBUSTIVEL [1630] Si somos, das potencias, o quintal, e tudo fornescemos, por que não tornarmo-nos, tambem, cannavial a fim de produzir-lhes combustão? De canna Petroleo testados dos maus

um mar, e nada mais... Que tal? ja não basta: agora são combustiveis com aval ecologistas de plantão!

Alcoholico quer ser o carro gringo e, quando não nos reste mais um pingo, em outras fontes elles vão mammar, brindando alegremente em cada bar! O amargo gosto fica em quem se priva da canna doce, para que bem viva quem só desertifica o que era mar e sobre nossos lixos quer lucrar!

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88 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO CORTIÇO VERTICAL [1645] Vieram me contar que, agora, a casa que foi daquella velha, derrubada seria e, em seu logar, o que se arrasa converte-se em cubicula morada. O predio, que alli surge, agglomerada gentalha abrigará, que só se attraza no transito, só vive endividada e nunca seus anxeios extravasa. Contaram-me estas coisas que interpreto. A velha era sozinha, se perdia nos commodos da casa, e só de thia chamavam-na os vizinhos, com affecto. Mas acho, ao concluir, que estou correcto, pois era, pelo menos, mais feliz, na sua solidão, do que quem quiz morar naquelles cubos de concreto.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DO PASSEIO SEM ASSEIO [1658] Na casca de banana, si alguem pisa, na certa cahirá. Mas muito raro é acharmos pela rua alguma lisa casquinha amarellinha, fique claro. Mais facil é o papel de balla, à guisa de practica emballagem, que o ignaro pedestre joga ao chão: vae ver que visa causar as quedas, como bem reparo. Ninguem, na rua a andar, em nada adjuda. Notei que muita gente, mesmo perto dum cesto, evita usal-o. Estou é certo de que fez de proposito e isso estuda. Reparem na apparencia mais mehuda: Si alguem não excorrega num sorvete, tal como foi, no banho, o sabonete, ao menos num chiclette o tennis gruda.

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90 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DA GUERRILHA URBANA [1682] Polemico, o graffite, arte de rua, seria “pichação”, “mural”, “painel”? Emquanto esse debatte continua, na practica elle cumpre seu papel: Ser clandestino, “vandalo”, insinua quem não lhe reconhesce ser quartel, trincheira de guerrilha, funcção sua, por ser do poder publico revel. Uma arma de brinquedo nunca pifa. “Esprei”, “estencil”, mascara... e elle occupa espaço, juncta os manos, os aggruppa em griffes agguerridas da peripha. Na lucta, mais o mano se cacifa. Os tiras tiram tudo do moleque, o spray jogam na cara e, antes que seque, um delles ‘inda o cuspe lhe borrifa.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UM ROCKZINHO ANTIGO [1730] “Entrei na rua Augusta a cento e vinte por hora...”, é o que cantava o Ronnie Cord. Ja foi aquella rua de requincte, justificando quem assim a abborde. Butiques, lindas gattas, isso o ouvinte podia até suppor, pois quem recorde batte no velocimetro nem vinte anninhos tem, e seu papae é lorde. Mas filhos não são gente tão idonea. No tempo dos playboys, foi cadillac o carro cobiçado, e ‘inda de fraque vestia-se um rapaz na ceremonia. Agora tal noção torna-se erronea. A velha rua abriga appenas putas, emquanto quem tem carro faz disputas nos rachas, bem alem da Villa Sonia.

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92 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UMA VARANDA NOVA [1744] Ja não bastasse o trafego, a buzina dos carros, os allarmes disparados, agora um batteestacca na roptina diaria se incorpora destes lados. Estou mais é fodido! Minha fina, sensivel audição, que os elevados niveis de decibeis tanto abomina, agora aguentará mais alguns grados! Augmenta a barulheira vez mais cada! Ruido é o que não falta na cidade: si cessa o batteestacca, o que me invade o quarto é martellada de ballada! Exsiste differença? Nunca! Nada! Não muda nada: a mesma, egual battida! Prefiro então aquella da avenida, que ao menos ergue um predio com sacada.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA A PERIPHERIA DESASSISTIDA [1854] Si chove, aquelle corrego começa a encher e logo invade toda a villa. Exgotto a céu aberto, fede à bessa e, quando eleva o nivel, horripilla. Até cobras e rattos boiam nessa enchente de cocô! Sem prevenil-a, só chega a prefeitura quando cessa a chuva e quando o povo, ao vivo, estrilla. “Soccorro!”, implora a velha no jornal das septe, voz agonica, chorosa de dor, emquanto, fora, o temporal inunda o bairro todo e às photos posa. Na salla, as aguas cobrem o sofá. A scena, a quem assiste, é desastrosa. Num bairro rico, alguem que viu ja dá a sua opinião: “Gente teimosa!”

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94 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UMA VISTA AEREA [1856] “Vamos sobrevoar toda a cidade!”, annunciou o pae. As filhas dão pullinhos de alegria. Emfim, quem ha de querer contrarial-as? E la vão. De cyma, se vê tudo: aquella grade de ruas e avenidas que vazão aos carros não permittem... Novidade é ver isso de longe, la no chão. Não sei si Sahindo do conversam, das pás em

é verdadeiro o que interpreto. helicoptero, as meninas animadas, tiram “finas” movimento, andando recto.

Mas, claro, um mau desfecho ja projecto: De subito, uma dellas é colhida! No rabo do apparelho, perde a vida e logo o assumpto em pauta é um campo quieto.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA A LUZ CORTADA [1861] “Blecaute” ou “appagão”? Ninguem diria que um desses dois prefere, pois é triste a noite alguem passar sem energia e, sem gelo, a comida não resiste. Som desligado, banho de agua fria. Sem electricidade não exsiste tevê, computador, calor na pia nem vibrador que ponha o pau em riste. Si a pilha não resolve, com a vela se quebra um pouco o galho... Porem della não vamos depender por muitas horas e até nos arriscamos, dando uns foras. Peor, no espaço publico, é ficar a gente sem saber em que logar entrou, si no banheiro das senhoras ou onde os gallos perdem as esporas.

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96 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UMA NOITE TEMPESTUOSA [1869] Relampagos coriscam, formam uma retorcida e brilhante galharia nos céus da megalopole, que a bruma da noite ja encobriu. O clima exfria. Trovões a scena à mente palavra

echoam. Caso alguem resuma num só termo, o que viria é “pesadello”, pois nenhuma exprime mais o opposto ao dia.

Escuro com terror sempre bem casa. Durante a tempestade, para cumulo, ha corte de energia: sobre o tumulo recae a mesma treva que aqui em casa. Piscou, à luz dum raio, a cova rasa. Buzinas ‘inda soam, mas, aos poucos, ja quasi não se escutam esses loucos appellos de pavor de quem se attraza.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UMA CIDADELLA INCENDIADA [1870] O incendio na favella começara por causa desses “gattos”: muito fio ligado, emmaranhado... E a noite clara ficou, enchendo as chammas o vazio. De longe, esse mais triste da exgotto faz, e à succursal do

clarão expõe a cara cidade, que do rio o cego aqui compara Inferno, e me arrepio.

Vizinhos preoccupados sempre estão. Cortaram, outra noite, toda a luz do bairro, e a perguntar então me puz si é mal menor o escuro ou o clarão. Paresce-me insoluvel a questão. Às vezes preferivel é ficar por algum tempo cego a ter o lar ardendo e illuminando a escuridão.

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98 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA DUAS DORES [1871] O carro estacionou sobre a calçada bloqueando a passagem da velhinha que, carregando as compras, bem cansada, a custo e devagar andando vinha. Inconformada que um carrão invada o espaço do pedestre, se abbespinha a velha que, a poder de bengalada, admassa a lattaria ‘inda novinha. A crer este episodio não me custa. Fraquinha ja não é, porque o furor se appossa de seu braço! O admolador que vinha logo attraz até se assusta! Não é tal personagem tão vetusta! O dono do automovel chega, emfim, e leva, tambem elle, a surra! A mim, no carro a bengalada foi mais justa.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UMA VIAGEM PHANTASTICA [1872] A gorda está, coitada, sem o carro, deixado no mechanico. Terá que, agora, pegar omnibus... Que sarro tiraram os moleques della, ja! Na porta ella mal passa... Seu bizarro e molle corpanzil colher de cha não dá si, logo attraz, eu nella exbarro: Na proxima freada, aguento eu ca? Aguenta a turma toda? Aguenta nada! Passar pela catraca? Outro problema! Se expreme, se contorce e, com extrema difficuldade, está desentallada. Emfim, gente surgiu, civilizada! Alguem cede o logar, mas, quando senta, empurra a magra velha rabugenta de encontro à janellinha ja trincada.

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100 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UM ACCIDENTE PRAGUEJADO [1886] Rapazes que, num carro em se adjunctam, bollam nova passar pela sargeta e uma nas pernas nos dar d’agua

disparada, brincadeira: expirrada que mal cheira.

O exgotto alli desagua, e não ha nada mais fetido e mais podre! Bem na beira daquella atroz calçada, uma cansada velhinha, tonta e tropega, se exgueira. Não vendo diversão siquer parelha, os jovens ja deliram de alegria e passam por alli jogando a fria e suja ducha sobre a pobre velha. Ha sempre, de esperança, uma scentelha, pois a veloz manobra os faz perder a direcção: o carro vae batter no poste e, dentro, tudo se advermelha.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UMA EXPOSIÇÃO VALORIZADA [1899] Depois da vernissage, a galleria com pouco movimento e às moscas anda. O punk approveitou: “Peripheria não tem disso...” E pinctou naquella banda. Os quadros são abstractos: não copia nenhum aquillo que o graffite manda ver nos muros pichados. Essa fria pinctura não faz jus à propaganda. Não é como soubera até de cor. Frustrado, o punk excarra sobre a tela exposta: respingada, a excarradella formou novo desenho, e bem melhor. Reflecte: “Mor barato! Mesmo mor!” Repete esse processo o punk: agora que a cara do negocio ja melhora, lamenta não ter publico ao redor.

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102 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UMA ESSENCIA INEBRIANTE [1900] Parou a limusine bem na porta da loja de importados. Desce a dama em busca do que mais alli se importa: perfumes e kosmeticos de fama. Um unico frasquinho não comporta mais que umas poucas gottas, porem chama attenção pelo preço que, “Si corta uns zeros, ‘inda é caro!”, o pobre exclama. Munida das fragrancias, volta ao carro a dama, distrahida, ja se vendo cheirosa, quando um punk o seu catarrho lhe excarra em plena cara e sae correndo. A dama, imperturbavel, usa o lenço. Ainda bem que disso não dependo! Mais tarde, cheira o panno: ‘inda suspenso nos ares, o mau halito é estupendo!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UM PORCO EXPOSTEJADO [1904] Do porco tanta coisa se approveita e gente tem que fica sem comel-o! Ver basta a pheijoada de que é feita e até vi quem do couro coma o pello! Torresmo, bistequinha, a gente acceita; pernil, lombinho... Tenho que dizel-o, porem: meu proprio estomago rejeita “pertences”, do joelho ao cotovello. De tudo não direi que participo. Focinho, orelha, rabo? Assim tambem seria ja demais! Não posso nem ouvir fallar em partes desse typo! Si como, si não como, me constipo. O vegetarianismo e a religião a mim não convenceram, mas eu não devoro, não degollo e não destripo.

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104 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UMA AVENIDA SATURADA [1907] Movimentada, a arteria o centro corta ao meio, em linha recta. À multidão pedestre, bem maior que a que transporta a fila de busões, mal dá vazão. Calçada exburacada, em cada porta barracas de ambulantes, um lixão em cada degrauzinho... E quem se importa? Na pressa passam todos que la vão. Barulho quer fazer alguem mais alto. Mulheres perdem salto, quebram pé. Moleques acham graça: alguns até empurram suas victimas de assalto. Alguem de polidez é sempre falto. Os homens de gravata andam ligeiro, fingindo não notar o passageiro pingente que se solta e jaz no asphalto.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA O TRAFEGO TREFEGO [1908] À frente, são vermelhas. Formam fila as luzes, quasi immoveis. Para traz, quem olha vê pharoes. Uma intranquilla travessa engarrafada gasta o gaz. O transito até quando visivel na como “veia

é tão lento, que affunila o signal verde se faz neblina... Definil-a entupida” não me appraz.

No meio do chaotico scenario, melhor dizer que a rua é feito um cano de exgotto, ou de excremento, num urbano contexto digestivo ou sanitario. Num quadro escatologico viario, não vale, quando a merda está entallada, gemer ou buzinar, visto que nada desprende esse intestino sedentario.

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106 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA O PRECONCEITO RACIAL [2005] Si alguem me perguntar si sou racista, respondo: “Com certeza! Odeio poodle, chihuahua e pekinez! Entra na lista de affectos só cachorro salsichudo!” E caso na pergunta alguem insista, direi que a raça humana, inteira, é tudo motivo do meu odio, seja “mixta” ou “pura”, branco ou indio botocudo. Não ha nenhuma “raça superior”! Nem mesmo um basset hound disso se uffana! Qualquer que seja a classe, a cara, a cor, é tudo a mesma merda: a besta humana! Dos bichos, não se salva nem o gatto, que é muito traiçoeiro e não se irmana siquer à propria raça: aquelle ingrato bichano abbandonou sua bichana.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UM DESASTRE AMBIENTAL [2040] Permitta-me, Excellencia, que eu pondere accerca do perigo que reside numa devastação que tudo altere na natureza, caso ella revide. Quem, como o Senhor, sobre nós decide precisa pensar bem si assim não fere a flora, a fauna, e o solo não aggride a poncto de que não se recupere. Qualquer cautela, agora, não é mera! Reflicta, por favor! Não cause à Terra tal damno! Ella dá chances a quem erra, mas isso...! É irreversivel o que gera! “Ah, foda-se! Fodão não sou? Pudera! Não quero nem saber si o pato é macho! Eu quero é ovo! Foda-se! O que eu acho é que essa merda toda aqui ja era!”

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108 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA A GENTARADA ENJAULADA [2150] Da rua, só se vê grade e mais grade defronte a cada predio. Alli, quem passa se appressa, pois viver em sociedade é como, ao caçador, fugir a caça. Cabine com porteiros dissuade quem pense em visitar ou questão faça de ver um morador: acham que invade, que um rosto, sendo extranho, é uma admeaça. Curiosos factos rollam todo dia. De fructa um vendedor para a carroça bem rente à grade, a poncto de que possa, por entre os vãos, passar mercadoria. Sem elle, não se sabe o que seria... É como dar comida aos animaes na jaula dum zoologico, que mais paresce fauna presa a freguezia.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UMA FOLIA RUEIRA [2152] Dizer que carnaval um punk odeia procede, e a diffundir isso eu adjudo. Mas muda a idéa caso o cara leia alguma coisa sobre o tal do “entrudo”. Em vez dum espectaculo, era feia a scena no Brazil: valia tudo em termos de sujeira! A roupa alheia não tinha, contra as aguas, um escudo. Quaes aguas? Ora, exgotto, ou mijo puro! Só fico imaginando, minha gente! Ninguem que se vestisse com appuro às ruas sahiria impunemente! Um punk adoraria tal casquinha tirar, numa attitude irreverente, cruel, quando alvejasse o “almofadinha” na cara, com urina ainda quente!

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110 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UM PONCTEIRO OSCILLANTE [2242] Horario de verão? Mas que tolice! Só por economia de energia? Mais tarde que escuresça: mas quem disse que alguem trocou a noite pelo dia? Maior é o prejuizo que a crendice terá com menos trevas: poesia não ha si o lobishomem nos surgisse ainda quando mal annoitescia. Mais coisas rollarão, ‘inda por cyma! Teremos o trabalho de poncteiros mover em todos esses fevereiros e outubros! Hora adjusta, hora approxima. Ninguem tal treco observa nem estima! Então por que não deixam, duma vez, mudado, si o verão ja não tem mez de inicio nem de fim no chaos do clima?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UM CIDADÃO MOTORIZADO [2334] Andar num carro desses é, na certa, motivo de piada! Ninguem lava os vidros, lattaria, e não estava ligado, no accidente, o pisca-allerta. Parado em fila dupla, a porta aberta propaga um som bem brega, e nunca a trava funcciona quando a camera ja grava o carro cappotando e um “Oh!” desperta. Em tudo o tal carrinho lindo pecca! Não tem, de segurança, nenhum cincto, é claro, e seu “pineu” está careca! Xixi de gatto fede o assento, eu sinto! Grudou na direcção até melleca e, sendo o proprietario tão distincto, nem pasmo si alli mesmo elle defeca, em vez de procurar melhor recincto!

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112 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UM VERDE QUE SE PERDE [2336] O cheiro de xixi, pela cidade, attinge o poncto maximo no centro, logar onde, faz tempo, ja nem entro, pois nada alli resiste que me aggrade. “Havia, na avenida juncto à grade do parque, a ilha verde. Hoje, concentro o olhar e, cada vez mais para dentro da grade, até ao gramado o asphalto invade...” Me disse assim o amigo que visita São Paulo raramente, e melhor nota as más transformações, como a descripta. Jamais uma cidade alguem adopta... Si nunca pode achal-a mais bonita. Si nada vejo e perco minha quota de verde, eu me lamento. Mais se irrita quem vê como a cidade se desbota!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA A MOTO QUE EU NÃO PILOTO [2378] O transito, em São Paulo, dia a dia peora, e na garagem ja engarrafa. Nem mesmo sae do predio, e ja se estaffa aquelle que automovel proprio guia. Quem opta pela moto está, na via que a camera indiscreta photographa, achando que “costura” e, assim, se sapha do proximo gargalo que se cria. Não vejo outro scenario, ja, tão feio. Pedestres approveitam que parado está tudo na rua e, bem no meio dos carros, attravessam pr’outro lado. O cego é quem se ferra, pois, em cheio, é pelo motoqueiro attropelado, ainda que não saia do passeio e tenha, ao caminhar, maior cuidado.

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114 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO PARA UM INDIGENA INDIGNADO [2632] O que? Mim não querer quinquilharia, missanga, annel, collar, porra nenhuma! Pensando indio ser trouxa? Aqui não fuma cachimbo algum da paz quem negocia! Não quer indio saber pirataria! Só quer que o cara pallida se assuma e veja si a tal “ongue” logo arrhuma as coisas que promette todo dia! Um indio necessita é dum apito! Por isso nossa tribu mais se ennerva! Faz falta, aqui na taba e na reserva, quem ouça nosso appello e nosso grito! Aqui só vem o branco buscar herva, madeira, mineral, e até palmito! Só sabem desmattar! Não accredito que, desse jeito, a selva se preserva!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO PARA UMA CARA CARA [2696] Você, que é jardineira, ja não acha que está fora de moda essa mania de sempre lamentar si a ventania as flores despetala e até despacha? Que importa si a camellia se exborracha? Chorar ja viu você que nem valia a pena. Ainda vale a melodia, porem, e pode ser refeita a marcha. Talvez eu introduza a minha tara! Que tal assim: “Não fiques mais tão triste, que o cheiro do teu pé nem se compara àquelle que nas flores tu sentiste!” “Prefiro teu pezinho em minha cara que todas as camellias! Vae, desiste de tanta choradeira, minha cara! Ver quero o teu pezão, dedão em riste!”

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116 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE UM RAPAZ PERTINAZ [2774] Na rua Augusta entrei na contramão. Voando no meu carro, nem buzina usei. Mas, na calçada, uma menina chamou, sem me notar, minha attenção. Insisto na buzina, porem não ha jeito de attrahil-a: uma vitrina toda a attenção da joven ja domina, e perco tempo, aqui no meu carrão. Caralho! De mim ella nem suspeita! Tentando estacionar, eu não consigo nenhuma vaga nessa rua estreita. Na exquina, attropelei mais um mendigo. Subindo na calçada, desta feita consigo vel-a olhar-me, mas ja sigo em frente, e a loja abbaixo o carro deita. Bem feito! Para todas foi castigo!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE A VOZ POETICA [2807] Naquelle tempo, nem havia IBAMA, por isso é que um espirito damninho furou, sem compaixão, do passarinho os olhos, e ninguem delle reclama. Uns dizem “passo preto”, ou que se chama “assum”, mas qual será nem adivinho. Só sei que, p’ra cantar mais bonitinho, o bicho, cego, em choro se derrama. Coitado! De gaiola nem caresce! Impossibilitado de voar, é como si soltinho elle estivesse e quasi nem se affasta do logar. A gente da canção jamais se exquesce: Gonzaga comparou-se àquelle azar, mas eu é que sou passaro! Uma prece me resta: “Dae-me, ó Zeus, voz p’ra cantar!”

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118 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE A PADROEIRA E A LADROEIRA [2823] Cantava a Dalva a prece em samba feita: “Ave, Maria! Laraririri! Rogae por nós...”, e tal, vae por ahi. E dava dos devotos a receita: “Rogae por esta terra, que se deita em berço exsplendoroso e nunca vi mais bella outra no mundo...”, e piriri, pororó, que mais nada se approveita. Façamos, entretanto, umas erratas. O que não se approveita não é nem a lettra, mas a terra, sem cascatas, sem mattas, borboletas... tudo sem! Pilhada, devastada, ella, às barattas entregue, nem espera mais do Alem qualquer dessas benesses, dessas chatas cantigas, desse falso nhenhenhem.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE UMA DESVALORIZAÇÃO IMMOBILIARIA [2851] Você está vendo só? Foi deste jeito que as coisas accabaram... Nossa casa estava accostumada com a rasa altura destas aguas... Que defeito! Foi erro de projecto, pois o leito do corrego, de subito, extravasa e põe tudo a perder! A gente casa, constroe um lar... e nada eu approveito! Só resta, agora, fetida, essa lama! As flores na janella, uma varanda tão grande, em que cabia até uma cama! por agua abbaixo tudo isso desanda! O vento, na roseira, não reclama mais nossa poesia: a propaganda do immovel tem que arcar com a má fama, sem cheiro dum perfume de lavanda.

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120 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE UM GALANTE NO VOLANTE [2865] Buzina que se preza faz “Fom! Fom!”, e não “Curru! Curru!”: no meu carrão, eu tenho as duas, mas só lanço mão daquella que appresenta melhor som. Si passo pela praia do Leblon mostrando-me, lindão, na direcção do carro, não ha puta e boy que não deseje uma carona, e eu acho bom. Galan superdotado me sahi! Cappota conversivel me permitte expor melhor a cara, que, por si, bastava p’ra que acceitem meu convite. Mas quero impressionar quem sente aqui no banco do carona e que accredite ser bella a minha mascara que ri. Ninguem mais me supera, aqui na city!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE O UFFANISMO E O AFFANISMO [2911] Perguntam ao poeta: “Donde vens? Que tem o teu paiz? Onde é que está?” Responde elle dizendo que não ha logar melhor no mundo, ou com mais bens. Não valem nossas minas só vintens, nem mares, nem florestas valem, ca, centavos ou tostões. Quem menos dá por nosso solo, extrae-lhe uranio em trens. Pedreiro, garimpeiro, jangadeiro, vaqueiro, boiadeiro, estes jamais verão o que foi feito do dinheiro de leve mencionado nos jornaes. Dos tempos de merreis e de cruzeiro, os poucos pinheiraes e syringaes, e os parcos palmeiraes do brazileiro mal valem bananaes dos mais banaes.

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122 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE CANTOS E DESENCANTOS [2913] No céu, no mar, na terra, quem escuta o som deste paiz até se expanta com tantas battucadas e com tanta battida percussiva, rude e bruta. Trovões no céu trovejam, numa lucta titanica, que assusta mas encanta. Em ondas, com extrondos, o mar canta nas praias e rochedos que disputa. Si formos nós nos hippies botar fé, a Terra se defende como pode. Supporta secca ou chuva, até maré, e agguarda um terremoto que a accommode. Barulhos naturaes ja deram pé a muitas louvações, mas só se fode quem tenta enaltescer pagode e axé, que dão, nos musicologos, um bode.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE UMA ILHA PARADISIACA [2940] Formosa ilha fora Paquetá. Agora, o que restou de vegetal limita-se ao jardim, mas em total estado de abbandono é que elle está. Jardim que foi de affectos, mas que ja em nada corresponde ao tal pombal, ao ninho dos amores. Bacchanal, alli, perdeu a graça. É melhor ca. Aqui, tudo floresce, bemfazejo. Aqui, nestas Cagarras, a suruba paresce temptadora, pois não vejo problemas de censura, como em Cuba. Na praia, pelladões, damos ensejo a toda putaria, nem que suba na gente, em plena foda, um caranguejo, tal qual em Botafogo ou Ubatuba.

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124 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE O DIREITO DE IR E VIR [2956] Vocês pensam que nós “fumos” embora? “Engannemos” vocês! Somente a gente fingiu que tinha ido, e simplesmente “vortemos” para ca! Que tal, agora? Fallando de vae-vem, como peora o nivel dos transportes, hem? Pingente é coisa do passado: ninguem tente siquer entrar num omnibus, senhora! Appenas de pensar, eu suo, offego! A hora, antigamente, era de picco. Mas hoje, a qualquer hora, eu nunca pego trem, omnibus nem taxi: em casa fico! Tá louco! Eu, que não finjo que sou cego, nem deixo que me engannem, justifico a ausencia: menos saio, mais sossego! Não quero mais passar por esse mico!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE A NOSTALGIA QUE ALLIVIA [2961] Saudoso, o lampeão acceso a gaz que mal illuminava, na cidade, a praça principal, jamais invade o bairro mais distante, um tempo attraz. Aquella idéa bella que se faz das coisas do passado dá vontade na gente de lembrar tudo que aggrade e esteja ultrapassado ou morto. Mas... Não quero ser chamado de casmurro. Nem tudo era melhor que o que é moderno. Os bondes, por exemplo, pelo burro puxados, nos seriam um inferno! Foi tempo em que era crime um mero murro! Agora, um trombadão, ou “ex-interno”, atteia fogo e macta por um urro, um berro, uma cachaça, neste hinverno.

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126 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE UM PLANETA MAL MOLHADO [2988] Agua que a chuva empoça no telhado e cria o mosquitinho que nos picca... Agua que, mal brotando la da bicca, aqui ja chega suja, e a bebe o gado... Agua fedendo a lodo que, cagado no corrego, o empesteia e por la fica... Agua residual de quem fabrica venenos e agrotoxicos ao lado... Agua que a gente bebe da torneira, insipida, mas, caso a gente observe, com cheiro de alga podre e que não serve siquer para lavar uma lixeira... Agua que, mesmo quando a gente ferve, nos sabe a mau sabor, que mal nos cheira, que aquella da latrina até ja beira e irriga, no meu verso, o verme e a verve...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO SOBRE A EXCASSEZ DE VERDES [2989] Aqui temos yoyô, temos yayá! Ninguem pode dizer que estamos sem bellezas numa terra assim, que tem palmeiras, onde canta o sabiá! Aqui temos cuscuz e mungunzá! Palmito ja não ha, de tanto alguem cortar e devastar! Não temos nem palmeiras, onde cante o sabiá! Até que A terra de rua, do mez,

valeria a pena, sim! até que é boa, numa farra em fevereiro, mas, no fim não sobra grana nem na marra.

Terra carnavalesca é, para mim, synonymo de attrazo, que se aggarra à musica, na falta do dindim, e sempre esse problema nos exbarra.

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128 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO SOBRE O QUE É ISTO [3007] “Pouquinho” do Brazil? Eu não resisto, sarcastico que sou, si pouco caso achei nessa expressão! Sempre extravaso meu riso, si daqui só cantam “isto”. Cascatas, mattas... coisas dum bemquisto paiz, a mim me soam como raso pretexto às ommissões do que deu azo a lettras mais raivosas. Nisso insisto: Fedor, polluição: tudo sae caro! Sucatas, lattas velhas: estas são as rhymas mais exactas, chatas, claro, porem inevitaveis, na nação. Às instituições podres comparo a quasi que total devastação do nosso verde, cada vez mais raro. Não ha por que escrever bella canção.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES SARNAS PROCURADAS [3101] Pacato villarejo, aquelle juncto ao rio. Quando chove, até o prefeito vae ver, por sobre a ponte, qual o effeito da cheia, algo que rende muito assumpto. Mas chove alem da compta, e eu me pergunto: que foram la fazer? Inda approveito e digo: esse accidente foi bem feito! Agora, é calcular quanto defuncto. A coisa vae, aos poucos, peorando. As aguas sobem tanto que, da ponte, não resta nem pilar. Sob o commando do padre, accorre alli quem corpos compte. Termina a busca. Salva-se, nadando, somente um cachorrinho que, defronte a egreja, está: “Meu dono, volta quando?”, paresce perguntar a alguma fonte.

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130 GLAUCO MATTOSO TRAIÇOEIROS AGUACEIROS (I) [3109] A cantharos chovendo, um carro, ilhado, não passa pela exquina ja allagada. O pae dirige, e o filho, attento a cada detalhe, olha a calçada do seu lado. Difficil, por um vidro tão molhado, flagrar com nitidez, mas, como nada lhe excappa, não demora p’ra que invada a salla illuminada dum sobrado. As coisas são assim, pelo caminho... Emquanto cae a noite e a chuva apperta, la dentro elles festejam, servem vinho, ignoram si a sacada fica aberta. Comsigo o joven pensa: “No quentinho os caras ‘stão, e eu mofo aqui! Na certa tem pão, salame e queijo, até adivinho! Fartura goza aquella gente experta!”


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES TRAIÇOEIROS AGUACEIROS (II) [3110] Mais longe, noutro lado da cidade, a chuva não poupou nem casa boa, de classe media: forma-se a lagoa na frente e, logo, a enchente a salla invade. As aguas quasi attingem a metade da altura no andar terreo! Uma pessoa de edade alli se affoga! Não excoa boeiro algum, e salve-se quem nade! Quem barco tiver, ora, que navegue! O rallo é um chafariz! Quarto é piscina! Mobilia foi pro brejo! Quem consegue prever? Não ha signal que nos previna! Quem compra casa alli chora: “Meu jegue, onde é que eu admarrei?” Se contamina na lama: “Isso é doença que se pegue?” Não é disso que tracta a medicina!

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132 GLAUCO MATTOSO DAMNOS URBANOS [3125] Aquillo que a sciencia chama “clima” eu chamo “cataclysma”! Às vezes chove, mais do que choverá nos outros nove, appenas em trez mezes! Desanima! Alem da chuva, azar virá, por cyma, de termos um terreno que se move e, caso a prefeitura tudo approve, soterra a architectonica obra-prima. Bar chique, botequim que serve lanche, malloca, condominio de alta classe, vae tudo de roldão numa avalanche que muitos macta, até que a chuva passe. Comptados os defunctos, a revanche viria só si o povo depredasse a Camara, ou si o Paço elle desmanche, tal como dos politicos a face.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES RECIPROCA IMPRECAÇÃO [3206] Si está ruim o tempo, que fazer? Repete-se o relampago, o trovão e, a cada, corresponde um palavrão. Quem xinga não terá, jamais, poder! As chuvas de verão, ultimamente, teem sido, cada uma, um cataclysmo. Normal, portanto, a raiva que se sente e sobre isso, na lyra, sempre eu scismo. Troveja, e escuto “Vae tomar no cu!”; um raio e “À merda, puta que o pariu!” eu ouço, de alguem curto de pavio, que solta a sua praga de urubu. “Caralho!”, e o céu corisca, reluzente. “É foda!” e, sem usar um euphemismo, o sceptico povão maldiz a enchente, que vira, na estatistica, algarismo. Não resta muita coisa que dizer. À merda todos vão e todos vão tomar no cu: recae a maldicção naquelles que ja nunca teem prazer.

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134 GLAUCO MATTOSO ECOSYSTEMA CARCERARIO [3230] Justiça de que typo, meu irmão? Invoca-se a justiça, a genuina, que nunca foi humana e sim divina. Culpados todos somos, todos são! Quiz Christo Inquisição, pedophilia? E Allah, quer Guerra Sancta, terrorismo? E ghetto em Chanaan, Javeh queria? Qual deus bençam dará ao capitalismo? Nenhuma egreja ou crença manifesta nem cumpre uma Divina Providencia. Então, como saber que justa pense-a um Ente Superior? Que Lei é esta? Nos resta a Natureza, nem judia, nem arabe ou christan, que, em cada sismo, vulcão ou temporal, nos repudia com seu elementar ambientalismo. Quaes codigos justiça nos farão? Mais justa que o xadrez ou que a chacina, nos pune a Terra, o Inferno nos destina e todos que tomar no cu terão!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CARISSIMO CARRINHO [3272] Alguma novidade sempre vem: O autonomo automovel não precisa de gente a dirigil-o, a midia advisa. Mas nisso confiança tem alguem? Sensores movimentam o carrão que, deante dum obstaculo, estaciona, e nunca desrespeita a contramão. Quem nelle quer pegar uma carona? O genro, do escriptorio, por controle remoto, a sogra leva e traz no carro, sozinha. Dum buraco, expirra barro no vidro aberto, e a velha que se admole! No proximo semaphoro, um ladrão apponcta-lhe o revolver: a mandona senhora abbraça a bolsa e diz que não! O gajo sua cara, então, detona! Não foi appenas ella. Apposta quem? De muitas houve a morte: uma pesquisa revela que o carrão se vulgariza. Vocês o comprariam? Que tal? Hem?

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136 GLAUCO MATTOSO MIOLOS EM MOLHO À PAULISTANA [3352] Coitado do burguez! Ah, coitadinho! Ja teve carro. O transito suffoca e o bolso o convenceu: por moto troca. Será feliz, emfim? Nem adivinho! Tambem a moto é cara... e barulhenta se mostra: o cara adopta a bicycleta. Pedala, agora... e mais suffoco enfrenta, ainda com mais cara de pateta. Um omnibus e um carro, lado a lado, seguindo estão, emquanto elle, no meio, dirige a bicycleta. Seu receio é ver-se entre os vehiculos prensado. Accaba accontescendo: o carro tenta abrir caminho e exmaga esse poeta cyclista: a scena é tragica e sangrenta. Imagens pela midia ninguem veta. O sangue se expalhou, molhou tudinho. O cerebro se expõe. O quadro choca. No asphalto, a massa passa por passoca, segundo as impressões dum garotinho.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES POTAVEL DISPUTAVEL [3382] Convem não confundirmos tanto assim. Cachaça, por acaso, você pensa que é agua? Exsiste muita differença! A coisa está bem clara para mim. Suppondo que eu não faça disso excracho, cachaça, do alambique é que é provinda! Mas agua, a gente tira do riacho, do poço, da represa e, quando finda... Até tem quem a tire da sargeta, da fossa ou dum exgotto a céu aberto, na falta doutra fonte, alli por perto, do liquido da vida no planeta. Nem pensa nisso o gajo que é borracho. Da canna sae bebida mui bemvinda ao bebado, mas sede tenho e eu acho só lodo, e com cocô, por cyma ainda! Nem quero imaginar qual seja o fim! Fatal, si verdadeira, aquella crença, na Terra agua será excassez immensa! Melhor um thema achar menos ruim...

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138 GLAUCO MATTOSO ESPECULADOS CUBICULOS [3399] Immoveis sempre estão em promoção. Nos novos edificios, muito espaço se vende, e eu de comprar questão não faço, até porque bem caro custarão. Varandas com piscina e churrasqueira, sacadas neoclassicas, fachada de pedra e bronze, cada a luxo cheira. Teem tudo, por signal, que nos aggrada. Mas, quando a gente addentra o appartamento, percebe que a sacada é até maior que a salla! E os dormitorios, ao redor, nem medem o banheiro onde eu me sento! Paredes são tão finas, que quem queira fural-as com um chute vê que nada impede, nem que vede a barulheira. Percebe-se ter sido uma roubada. Mas como revelar quem foi ladrão? Mais caro o otario paga num terraço que até num sobradinho? Eu longe passo! Em sonho, o que comprei é um casarão!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES TEMPORARIO BALNEARIO [3400] Nem toda paizagem se sustenta. Na beira da represa, um arvoredo esconde o que accontesce, tarde ou cedo, em volta da lagoa fedorenta. Familias invadindo aquillo vão em casas clandestinas. No começo, paresce tudo solido, mas não. O custo nunca batte com o preço. As aguas que recuam e distantes se advistam, de repente voltam, tudo cobrindo: nada resta do mehudo casebre e da mansão que estavam antes. Não dura muito tempo uma invasão: appenas para entrar um endereço no imposto predial que cobrarão, até que tudo vira pelo advesso. Será que residir la ninguem tenta? Alli ninguem mais vende? Enganno ledo! Depois da chuva, acchegam-se, sem medo! Um dia, a nuvem volta, à tarde venta.

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140 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DO CRENTE SORRIDENTE [3434] “Não! Não como! É carne impura!” Si é de porco, irado, falla o judeu, que ainda jura não querer siquer cheiral-a. “Que bobagem! Que frescura!”, diz o hindu, porem se eguala, si é sagrada a vacca e obscura a razão de não proval-a. Mas dirá o vegetariano: “Não sou massa de manobra! Aos judeus e hindus me irmano, pois nem como ran, nem cobra!” Quem é louco por churrasco, que é dos deuses tambem obra, e do bacon não tem asco, diz a todos: “Mais me sobra!”


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES ABBALLOS A INTERVALLOS [4112] A cada terremoto ou furacão o Dia do Juizo se approxima. Rhymaram Hiroshima e Fukushima na tragica noticia que nos dão. Tambem rhymam Japão com radiação, mas voto e terremoto é pobre rhyma, pois, quando treme abbaixo, o que está accyma nem vem ao chão nem perde uma eleição. São themas que darão sonnetto ou trova: Que nada está tão solido no mundo phenomenos assim nos dão a prova, excepto no Brazil, paiz fecundo. Aqui, si tudo é fragil, se renova a creatividade que, segundo as urnas, torna berço o que era cova e lava tudo quanto fosse immundo.

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142 GLAUCO MATTOSO EMPREHENDEDORISMO CREATIVO [4405] Que boa idéa eu tive para abrir a minha empresa! Quero fabricar sabão feito de lixo! Em cada lar terei materia-prima a conseguir! Emquanto um charlatão vende elixir rejuvenescedor e o patamar se eleva da inflação, baratear eu posso o nosso asseio, sem fingir! Verdade é que o sabão não tem odor assim tão aggradavel, mas fazer o que? Bem sei que a barra nem prazer nos causa, visual, por sua cor... Calumnia, todavia, é me dizer alguem que elle não limpa e que, si for ver bem, até mais suja! Ah! Por favor, assim ja é demais! Vão se foder!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES UM METRO E MEIO [4459] No transito, quem segue em linha recta nos engarrafamentos preso fica. Quem faz seus ziguezagues, eis a dica, consegue “costurar” e attinge a meta. De moto, é bem mais facil. Nem se affecta o audaz motocyclista: prejudica pedestres e automoveis, mas se explica. Só não se justifica a bicycleta. Ja viram panorama assim tão feio? Onde é que ja se viu querer alguem, tranquillo, pedalar no asphalto, em meio aos omnibus? Que cerebro elle tem? Si algum cycloactivista a morrer veiu tentando ser heroe, não quero nem saber, pois nem a pé saio a passeio e fico sempre em casa, muito zen.

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144 GLAUCO MATTOSO ACCIDENTE QUE SE SENTE [4587] Tomou duas garrafas de bom vinho, daquelles fortes. Ella, a namorada, declara ter tomado agua, mais nada. No carro, o beberrão erra o caminho. Insiste em dirigir. Falla sozinho, pragueja. A namorada está calada: nem vale discutir. Bifurca a estrada, à frente. Tudo passa rapidinho. É facil de prever o resultado. Veloz, o caro carro, então, cappota, battendo na mureta. Arremessado, o corpo do rapaz dá cambalhota. Não consta que o pae tenha se importado si o filho, tão novinho, batte a bota. Lamenta-se o vehiculo importado, que custa, convenhamos, uma nota.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES ESTYLO RUEIRO [4663] Na movimentadissima avenida, um cynico skatista radicaes manobras faz. Desviam delle os paes e mães, levando os filhos, ja na ida. Na volta, o descarado ainda lida, com sua prancha, alli. Passaram mais de duas horas, e elle sempre os taes pullinhos repetindo, nem que aggrida. E aggride mesmo: a velha, que voltava do banco, leva um tranco pelo flanco e tomba na calçada! Fica brava, se exalta, ja trepada no tamanco: “Que coisa! Mais o transito se aggrava! Seu louco! Seu bandido! Eu, que ja manco, ainda sou jogada? Só faltava mais essa!” E elle ja longe: passa em branco.

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146 GLAUCO MATTOSO VIOLENTO VENDAVAL [4664] Mormaço. O temporal que se advizinha assusta: todo mundo corre para algum abrigo. O transito ja para, formando, de automoveis, uma linha. O vento tudo abballa! Aqui da minha janella, escuto o allarme, que dispara, os gritos, as buzinas... Suspeitara alguem? Fazia sol ‘inda agorinha! Das arvores mais velhas, a maior se inclina com perigo. Emfim, desaba na rua, attinge tudo ao seu redor. Morar ha quem prefira numa taba! Desfechos deste typo, os sei de cor. No carro que ficou debaixo, accaba morrendo um velho. A velha está melhor. Salvou-se, mas, gagá, sorri, se gaba.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES TETRICO TRECHO KILOMETRICO [4665] Foi tudo muito rapido: a neblina baixou na pista... Que engavetamento immenso se formou! Não ha quem lento dirija e um accidente assim previna! Vê varios collidindo e, eis que uma fina tirando, alguem excappa: em movimento, do carro salta! A perda é cem por cento! Prensados, alguns sangram gazolina. Explode um caminhão! De fogo a bolla se allastra! Para longe dalli corre quem pode! Do barranco um carro rolla! Não ha quem, deante disso, não se borre! Se mija quem o carro não controla! Quem preso nas ferragens fica, morre! Vem, pelo accostamento, e nem se exfolla, um cego, às tontas, feito alguem de porre.

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148 GLAUCO MATTOSO PANORAMA PUNK [4675] Tem duas mãos a rua, mas trafegam muitos omnibus, do typo articulado. Pois que um delles encrencou?

por ella até não é A scena é bella.

É bella a quem por transito se pella, si esteja engarrafado! Agora a pé caminha o passageiro. Quem café tomando está na exquina, ao chiste appella: “Prefere ir a pé, cara? Admassar barro? E então? Prefere andar? Melhor! Assim, mais rapido cê chega, né?” Do carro, alguem faz cara feia, achou ruim. Da fila de vehiculos, um sarro tirando, aqui fiquei. Não tem mais fim a fila. Eu, da janella, a rir, excarro aquillo que tossi. Sou cruel, sim.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES ATTEMPTADO NÃO REIVINDICADO [4679] “Olé!”, berra o rapaz que, no volante dum omnibus roubado, pela pista dispara, hallucinado. Quando advista alguem na frente, macta, e segue advante! Mactar! Attropelar! É o que, durante seu rapido trajecto, esse anarchista deseja! Caso nisso elle persista, ainda mactará gente bastante! Com isso, vez mais cada, a gente lida. Ninguem, nada, o detem! Berrando “Olé!”, o joven psychopatha, na avenida central, advança! E pisa, affunda o pé! Cappotam carros! Perde alguem a vida de graça! Em ziguezague, corre, até que batte e explode: o algoz se suicida, mas acha que extermina a tal “ralé”...

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150 GLAUCO MATTOSO FLAMMEJANTE GIGANTE [4719] O incendio no edificio, aquelle mais estreito, bem mais alto, foi terrivel! No oitavo começou e, desse nivel, subiu até o trigesimo! Os jornaes... Nem quero me lembrar! Sensacionaes, as photos mostram coisas que um sensivel estomago rejeita: combustivel virou o corpo humano, entre altos ais! Depois virou lembrete em almanach: Pessoas se jogavam duma altura tão grande, que, na rua, quando o baque se ouvia, que foi jaca a gente jura! Immensas labaredas um destaque vermelho ao céu nos davam! Era pura comedia urbana, aos olhos dum basbaque que pense nuns bollinhos em frictura.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES BARULHEIRA DOMINGUEIRA [4765] Em plena exposição, na galleria immensa, lotadissima de gente, um quadro a contemplar, indifferente, está quem vem da vil peripheria. É o punk, aquelle mesmo que, outro dia, cuspiu numa pinctura. Pela frente tem elle um poster lubrico, indecente, que até, de pedra, a um frade coraria. A photo é da modello mais famosa chupando um pau erecto, no momento exacto em que o machão, sorrindo, goza e exporra aquelle liquido gosmento. Pinctura, filme, verso como prosa. Em arte, o nu não causa expanto. Attento, observa o punk a bocca indecorosa. Por perto, um bebê chora, barulhento.

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152 GLAUCO MATTOSO EPHEMERA EMERGENCIA [4766] Será que todo shopping, aqui nesta cidade, construido foi por cyma dum toxico lixão? Não desanima a gente? E o comprador, não se molesta? Os gazes se accumulam. Pela fresta, invadem uma loja. Sente o clima fedido algum freguez, que se approxima e affasta-se depressa... Que mais resta? Só resta que mais gazes, emfim, vazem. Emquanto um exhaustor ninguem installa, agguardam-se explosões que tudo arrasem, transformem tudo numa enorme valla. O tempo passa e, como nada fazem as partes responsaveis, quem se cala são elles, os jornaes, que novas trazem accerca dum artista novo, um mala.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES VIAJANDO NO DESEJO [4789] Num omnibus lotado, o punk attraz está do funccionario engravatado, no meio dos que estão em pé. Do lado direito deste está mais um rapaz. Do lado esquerdo, a gorda que está faz diversos movimentos: seu gingado instiga o punk, a poncto de, assanhado, ficar de picca rigida, sem paz! Tentando approximar-se da gorducha, o punk exbarra, erecto, no subjeito de terno que, num ecstase, extrebucha! Tambem outro desfructa, nesse estreito... Espaço, da pistola, ou da garrucha do punk, e quer, em sonho, o ter no leito... Me contam e commigo penso: Puxa! Será que isso contaram-me direito?

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154 GLAUCO MATTOSO VEGETARYANISMO [4797] Não pode comer isso. Nem pensar naquillo. Isto tambem não. Permittido, de facto, só legumes sem ter sido cozidos, sem tempero, sem frictar. Deixemos claro: em nada o paladar prazer pode sentir. Nosso partido quer tudo prohibir, quer que o sentido do gosto, emfim, se annulle, é bom fallar. Assim como o clitoris, que a mulher exstirpa à força, vamos impedir que façam dos “refris” um elixir, que todo mundo coma o que quizer. Gastronomo? Qual nada! Só fakir meresce vez! No garfo e na colher, sem molho, sem pigmenta, alho qualquer, só matto insosso! Hitler fez-se ouvir!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES AMIGA DUMA FIGA [4799] Agora commum é que a moça insista: chamar-se quer “nutrologa”! Não serve qualquer outro jargão que se reserve à mesma profissão: nutricionista. Um novo termo em nada a faz bemquista. Não deixa comer algo que se ferve ou fricta. Que em tempero se conserve a carne, ella não deixa, a moralista. Paresce mais pastora puritana ou velha solteirona ante o tesão que technica nalguma profissão. Se damna quem seus codigos prophana. Frictura? Prohibida! Doce? Não se deve comer! Carne? Nananana! Nem massas? Nada? Dar-lhe uma banana maçan, bem verdolenga, é o jeito, então!

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156 GLAUCO MATTOSO BAMBIENTALISTA AFFECTADO [4873] Vegetal mal temperado: é só disso que o subjeito se alimenta... “Si for gado, si for peixe, eu não acceito!” “Natureba”: assim chamado, irritado fica! O “effeito” dicto “extupha” é o que seu brado mais lamenta, insatisfeito. Um detalhe surge, grave: Dum subjeito assim se espera, mesmo affeito a tal chimera, que, no minimo, se lave. Mas aqui pinctou entrave, pois é porco, o “natureba”! Seu pau sujo, que se enseba, tem fedor pouco suave.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CASA ISOLADA [4883] O tractor, quando nivela o terreno, contra batte a parede duma bella casa. Dentro, um bassê latte. Só sobrou, da villa, aquella, que vender não quiz um vate. O coitado, agora, appella ao demonio: “Não me macte!” Novidade promissora: Dentro em breve, no logar, vae um predio levantar a sedenta constructora. Vence a celere invasora: Restará, do lado, appenas a mais velha das pequenas, que pacata, um dia, fora.

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158 GLAUCO MATTOSO A VEZ DA EMBRIAGUEZ [4982] Bebendo foi mais choppes, mais e mais. Sahiu do bar bebum, cambaleante. Que pode dirigir elle garante, mas outros o convencem, cordiaes. No carro todos entram. Sem os paes por perto, o molecão quer ao volante ficar. Não, nada disso! Mas, durante o rapido trajecto, enfrenta os taes. Os taes em pouco tempo se encherão. Emfim, o motorista seu logar lhe cede. Enthusiasmado, o molecão põe no accelerador o calcanhar. E pisa, pisa fundo! Um avião paresce pilotar! Quando parar, aos poucos, cappotando, ao céu irão aquelles taes, sim. Victimas de azar?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DROGA MIXTURADA [4985] Immenso mattagal baldio: alli terá logar a grande construcção. As machinas, a curto prazo, dão adspecto differente ao que ja vi. Não é como Itaquera ou Morumby. As obras começadas alli são mais simples: só conjunctos. O povão, em breve, vae cuidar disso por si. As obras eram lentas. De repente... Conjuncto prompto, arranja o morador seu proprio e comfortavel ambiente: tem cada favellão a sua cor. Em tempo: não resolve, ninguem tente barrar o trafficante, quando for morar, comprar, vender, fingir ser gente que pela propria pelle tem amor.

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160 GLAUCO MATTOSO ENSEJO PARA DESPEJO [4986] Não pega, preoccupada, mais no somno. Terá que devolver o appartamento. “Eu era ponctual! Agora enfrento problemas financeiros!”, diz ao dono. Jamais fora em estado de abbandono deixada a kitchenette. No momento, estava até bonita, entrava vento fresquinho e era a poltrona como um throno. Cuidou bem do logar, sim, a coitada. Porem, o proprietario nem queria saber: pediu de volta. Endividada, não sabe a prostituta aonde iria. Terá que, cedo ou tarde, junctar cada pertence e cahir fora. É que a vazia sallinha ao trafficante até que aggrada e, deste, nova amiga alli se enfia.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CALÇADA ARBORIZADA NADA! [5034] Eu era, sim, das arvores ardente e firme defensor, numa cidade, ainda que a ramagem desaggrade a muitos, quando chova ou quando vente. Até que accontesceu, aqui na frente do predio, este accidente: pela edade, um galho cae, bloqueia a nossa grade, nos corta os fios, damnos causa à gente. Sem força, elevador não ha! Cansado, eu subo e desço escadas, não connecto nenhum computador! Me desaggrado. Desastre tal, direi que foi completo. Ja chega! Pelo verde eu ja não brado! Das arvores, agora, sou secreto e tacito inimigo! Estou do lado dos subditos do asphalto e do concreto!

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162 GLAUCO MATTOSO PRECIOSO LIQUIDO [5068] Mas isso é mesmo o cumulo! A frescura chegou ao poncto maximo! Eis que, agora, virou “sommelier” quem diz que adora sabor achar num coppo d’agua pura! Até “flavorizar” virou figura corrente de expressão e, sem demora, adhere à nova moda quem “decora” o liquido e attenção chamar procura! As aguas teem sabores, não sabia? Ninguem queira saber qual a receita! Alguns são tão subtis, que nem suspeita a gente si é de coco ou melancia! Exsiste uma, de petalas, perfeita às linguas delicadas! Quão macia a sua subtileza! Que seria das fraudes sem o otario que as acceita?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CYCLOACTIVISMO NO CIRCUS MAXIMUS [5107] Destina-se a fazer com que desista de andar de bicycleta qualquer um o caso que me contam, ja commum, agora accontescido na Paulista. Foi outra mulher: vinha essa cyclista em pleno dia, quando mais nenhum moleque balladeiro está bebum no transito e ninguem corre na pista. Em these, nada havia de bizarro, mas, mesmo assim, morreu ella, na briga brutal e desegual em meio ao carro e ao omnibus: paresce historia antiga. Em Roma, nas corridas, quando eu narro que tomba e macta alguem alguma biga, ninguem liga: até gozam, tiram sarro daquella ja antiquissima cantiga.

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164 GLAUCO MATTOSO NECA DE CUECA! [5129] Unindo dois protestos, “pedalada pellada” foi o nome que, occorrido aos cycloactivistas, fez sentido. A idéa de junctar questões me aggrada. Assim, a bicycleta berra e brada, no transito, por chance e, si eu decido despir-me connectado, não aggrido pudores, ninguem pode dizer nada. Eu tenho, pela lyra, dupla meta! Nas redes sociaes, defendo o nu! Nas ruas, eu defendo a bicycleta! Por duas causas, faça-se um rebu! Mas quero que a nudez seja completa, com sacco no sellim, com chota e cu raspando o couro, sem tirar da recta, sem medo da policia, sem tabu!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES RELENDO VINICIUS (II) [5183] Vinicius profissão faz de fé. Faço a minha sobre o mesmo thema e noto: concorde estou! Tambem não sou devoto appenas de verdura: tudo eu traço! Si alguem trouxer da feira aquelle maço de folhas ou raizes, claro, eu boto na bocca, si o criterio que eu adopto seguido for: tempero! Sou devasso! Uns molhos addiciono, uma pigmenta bem forte... Tem vinagre? Tem azeite? Tem alho? Tem cebolla? Isso! Accrescenta! Assim é que preparo o meu deleite! Com carne faço o molho da polenta! Não basta o vegetal, se vê! Do leite, bons queijos; do boi, uma succulenta piccanha... E o torresminho? É só de enfeite?

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166 GLAUCO MATTOSO RELENDO AMADEU AMARAL (II) [5186] Os rios Amadeu vê com aquella romantica noção: margens sem nada de feio nem de sujo, expondo, em cada remanso, em cada curva, a scena bella. Tranquillas aguas, limpidas? Appella ao nosso senso critico essa amada visão! Agora a coisa está mudada: exgotto... lixo... e, às margens, a favella. “Fecundam plantações, movem engenhos, dão de beber, sustentam pescadores, supportam barcos e carreiam lenhos...” Assim o bardo delles toma as dores. À parte taes poeticos empenhos, em vão o bardo os pincta, pois as cores das aguas são de merda! Os mais ferrenhos chorões ja nem são delles defensores!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES RELENDO HERMES FONTES [5204] É thema o rio ao Hermes Fontes. Nilo? Danubio? Sena? Thamisa? Amazonas? Prefere o bardo os nossos aos cafonas e calmos do exterior, ao velho estylo. Nos nossos, nunca o curso é tão tranquillo: carcassas de automoveis, trens, poltronas, sofás, productos chymicos, paus, connas, “Bojuda serpe, docil crocodillo...” Ao Hermes, só detem um rio o mar, que engole suas aguas num bocejo. Faltou somente um poncto mencionar, que para mim jamais será sobejo: Aquillo que é difficil de tragar. Aquillo que, mais sujo e malfazejo, lhe causam é cocô nelle jogar. Peor thema poetico não vejo.

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168 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DUM ESPAÇO EXCASSO [5308] Façam como esse activista que põe sua bicycleta entre os carros, numa pista cheia, e vejam si isso affecta! Na avenida, que desista! Pretender que alguem dê setta, que o respeite, na Paulista, é sandice a mais completa! Ninguem liga nem condemna! Mais provavel é que alguem jogue o carro nelle, sem o menor signal de pena! O debatte se envenena! Depois, resta que a moçada mobilize-se e a jornada, nos jornaes, faça mais scena.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES

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DISSONNETTO DUMA CONFERENCIA SEM CONSEQUENCIA [5316] Um congresso mundial sobre o verde se prepara. Ja virou data banal, que enche o sacco e nos enfara. Presidentes chegam; mal discursaram, mal a cara deram, fogem. Verde? Qual! Sae a compta muito cara! Debandou, ja, todo o bando! Dar ouvido a um “ecochato” elles fingem, mas, de facto, continuam desmattando. Assim, tudo vão levando. Só se espera a ecologia respeitada caso, um dia, haja um “chato” no commando.


170 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DUM CULTO TUMULTO [5317] Corre-corre. Gritaria. Quebra-quebra. Barulheira. A velhinha, que antes ria, assustou-se e está cabreira. Minha nossa! Que seria? Arrastão? Ah, não, Deus queira! Na janella a velha enfia o nariz e os ventos cheira. A coitada até se borra: Vê, na rua, a molecada destruindo os carros, cada qual mais caro a quem não torra. Só moleque é quem exporra, mas se entende: são cyclistas que, cansados de nas pistas serem mortos, vão à forra.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DUNS URBANOS DAMNOS [5392] Martellando estão no meu lado, em cyma, embaixo, em toda parte, aqui neste plebeu condominio, até que imploda. De esperar que alguem exploda ja cansei! O templo atheu nunca accaba as obras! Eu estou cheio! Que se foda! Imitar obra de egreja, que jamais termina, eu vejo este predio! Quem deseja? É meu signo malfazejo! Mais renova-se este ensejo! Mais um dia que admanhesce, sem silencio sertanejo, causa estresse! Quem meresce!

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172 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DUMA PERMISSIVIDADE NOCTURNA [5423] É commum, de madrugada, passar moto barulhenta pela rua. E passa cada caminhão! Ninguem aguenta! Britadeira, rojão, nada falta! E passa a noite, lenta! De manhan, noto que, a cada noite, a zona mais augmenta! De chiar quem é capaz? Reclamar à prefeitura? À policia? A gente attura tudo e nada ninguem faz! Não teremos, nunca, a paz! Si de vida é qualidade o silencio, dissuade a pamonha, alem do gaz!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DISSONNETTO DUNS PAPPOS DE ELEVADOR [5453] Muito pappo o elevador tem ouvido, mas egual. Só se falla do calor ou da chuva, que enche, e tal. Vae nevar? E si não for? Foi previsto um temporal? Escuresce o céu? Tem cor de tuphão? De vendaval? Eu, por mim, nada pergunto. Bem podia uma pessoa dar bom dia, até dar boa noite, entrando noutro assumpto. Mas dou tractos ao bestunto: Vou fallar de que? De morte? “Morreu logo... Teve sorte...” De cadaver? De defuncto?

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174 GLAUCO MATTOSO DISSONNETTO DUNS PHARISAICOS AMBIENTALISTAS [5455] O problema da saccola deschartavel ja se aggrava. A desculpa que não colla do mercado, eu mando à fava! Proteger a bella bolla planetaria? Tem quem lava suas mãos doando esmolla a quem lucro maior cava? Eu tambem vou dar pittaco! Si quizessem, mesmo, um meio ambiente menos feio, davam gratis outro sacco! É commum o que eu destacco! Que exemplar supermercado! Quer cobrar pelo que dado sempre fora! Que velhaco!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES EM CLIMA DE CATACLYSMO [5506] Faz tempo que eu observo como a imprensa o tempo monitora. Tempo clima, não tempo chronologico. Se estima que appenas olha um facto. É o que se pensa. Mas, quando o céu nublado um cinza addensa, as radios e tevês ficam em cyma, prevendo o furacão que se approxima, e chove muito menos que a sentença. Abutre elle será da actual era? Allarme falso? Às vezes. No accidente, no crime, tambem factos exaggera. Entende-se: a audiencia quer que augmente. Mas, quanto ao clima, o allarme não é mera questão de facturar. É mesmo a urgente visão do Apocalypse, a tal chimera que tanto ronda a nossa pobre mente.

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176 GLAUCO MATTOSO LINHAS TORTAS [5598] Está Sancta Thereza, volta e meia, de novo na berlinda. Morei la em annos septentistas, quando ja creava alguma coisa que se leia. O bonde ainda sobe, serpenteia por ruas imperiaes e voltas dá na beira dos abysmos, mas eu ca commigo indago: “Em bondes ha quem creia?” Sim, penso que o bondinho representa aquillo que é possivel preservar, num seculo tão vandalo e vulgar, de magico, ou nonsense, nos septenta. Em plena dictadura, a gente attenta estava ao pacifismo, sem lunar nem sonho marciano, um par a dar os termos “amor livre”, em marcha lenta.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CELLA ESPACIAL [5600] Eu moro, vejam, numa verdadeira caixinha! Sim, de phosphoro! Os apês de classe media, aqui, de quem os fez reflectem a cabeça de toupeira! É tão pequeno o apê que, caso eu queira vestir um paletó, dou, toda vez, com minha mão no tecto ou, vão vocês rir mesmo, na parede! É brincadeira? Me expremo, entre as poltronas e o sofá, si quero pela salla deslocar-me, e quando, na cozinha, tento achar-me, mal entro e minha mão queimada está! Nem caio mais da cama, pois não ha um vão tão largo assim! Não sei quem charme enxerga em tal apperto! Caso o allarme dispare, p’ra sahir daqui nem dá!

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178 GLAUCO MATTOSO AND THE SUN WILL SHINE [5622] Não nasce o sol por minha causa, não scintillam as estrellas pelo canto dalgum poeta à sua amada. Não percebo si da noite cae o manto. A chuva não cahiu por mim só, não. Cahiu porque rezou para algum sancto o pobre lavrador. Porem eu não me importo caso caia, nem me expanto. O clima, ao trovador, varia appenas conforme seus humores. Chove, sim, por sua causa. Aquellas lindas scenas romanticas são todas delle, sim. As coisas não são grandes ou pequenas só quando o sol raiou. São, isso sim, pequenas alegrias, grandes penas. Poetas mais valor lhes dão? Pois sim!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES PRAIEIRA PICHAÇÃO [5629] A praia nordestina sua cor turistica perdendo vae, fetiche frustrado. Quem mais querem que se lixe com isso? O morador? O pescador? Emquanto falta a alguem o que suppor, alguma venenosa lingua -- Vixe! -fallou que foi navio do “Greenpiche” da mancha de petroleo o causador. O povo, de mãos nuas, limpa a praia que dessas negras ondas ficou cheia. Nenhum moleque experto que alli caia livrar vae sua pelle, nem a alheia. Um delles seu pé limpa, até que saia tudinho, pela mão que lhe tacteia a sola: mão dum cego que, cobaya fazendo-se, addemais, a massageia.

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180 GLAUCO MATTOSO JARDINS SUSPENSOS [5655] Passaram elles decadas trocando appenas o seu nome. Minhocão o povo preferiu. Agora não dá tempo, pois um parque vae virando. Mas não porque quizessem. Leve e brando, um verde foi brotando pelo vão rachado no concreto. Ja grandão, o tronco ramifica, arborizando. Na nossa Babylonia paulistana, um bosque só se forma si for pelo processo natural, sem um modello ou plano, sem proposito, sem grana. Emquanto a prefeitura, que se uffana das obras, não suspende esse novello selvagem, a cidade pode vel-o florir, primaveril, uma semana.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES LAVAGEM PORCORAL [5658] Você, terraplanista? Não consigo crer nisso! Não consigo crer que alguem consiga crer num troço assim tão sem sentido! Falla serio, meu amigo? {Sim, fallo. Por que não? Não dão abrigo vocês ao lobishomem, ao “alem sepulchro” dos zumbis, aos monges zen buddhistas, ao vampiro? Ouça o que digo!} Mas pense ca! Depois daquelle Antigo Mundinho, o pensamento ficou bem mais culto, scientifico! Se tem noção do Kosmo! Pense ca commigo! {Na physica, ja “quantica”, me instigo a ver como illusão tudo que vem do olhar mais astronomico. Ninguem provou que de morrer não ha perigo...}

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182 GLAUCO MATTOSO TURMA DO MALÃO MAGICO [5662] Ficou Justin grandinho demais para servir de bonequinho pros seus teens. Agora chega a Greta, que mirins anxeios representa com voz clara. A Barbie, superada, ja nem tara desperta, ja nem mancha jovens jeans. A nova bonequinha tem mais fins, mais meios, à Madonna se compara. À parte quem moral qualquer não tem por ser bozonazista, acha a platéa babaca que faz Greta muito bem em seu papel, com manha, na Assembléa. Bonecos de ventriloquo, ninguem os pode condemnar. Bem peor é a massinha de manobra. À mente vem: “Bilu, bilu, bilu! Bilu, tetéa!”


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES SCENA TERRENA [5666] {As aguas sobem tanto, quando vem a chuva de verão, que sae do carro quem vinha dirigindo! O que lhe narro occorre muito, Glauco! Veja bem! Ao tecto do vehiculo elle tem que, rapido, subir! Mas é bizarro o caso, pois as aguas, mais o barro, não param de subir! Aguenta quem? Até que, excorregando, o gajo cae naquella correnteza! Todo mundo assiste! Elle é levado num segundo! Seu corpo, ja não visto, longe vae!} -- Sei disso. Ouço no radio. Caro sae, da victima, à familia. Vagabundo, exime-se o politico. Eu redundo si indago: “Quem perdeu crerá no Pae?”

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184 GLAUCO MATTOSO CONVIVENCIA PACIFICA [5718] Abolir a carne? Só pensa nisso o vil vegano! Não commigo! Tenha dó! De comer bem eu me uffano! Só verdura no gogó não me passa, mas enganno commetteu quem me deu nó! Tambem como folhas, mano! Como carne com salada, mas questão faço de estar a piccanha bem passada e tempero não faltar! Vegetaes? Não tenho nada contra, desde que em meu lar tambem tenha, defumada, a linguiça p’ra frictar!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES FLOR DO AMOR [5743] Uma rosa verdadeiro valor ganha numa rica poesia, mas tem cheiro proprio aquella que aqui fica: Margarida! Seu primeiro servicinho é dar a dica de quem ama o jardineiro que a colheu e que a critica. Flor nenhuma ninguem casa nem namoro arranja a cada que a desfolha toda, mas a margarida foi culpada. Qual hypothese que embasa a amorosa flor? Mancada commetteu quem extravasa seu rancor e pragas brada.

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186 GLAUCO MATTOSO AMBIENTANDO THEMAS [5753] “Natureba” ou “ecochato”? Ambos esses termos são meio improprios, eu constato. É melhor dizer “bobão”. O babaca acha que em matto ninguem pode pôr a mão! Carne evita, esse insensato! Quer comer, mas plantar, não! Só verdura, a ser exacto, o papel não faz do pão. As florestas... Bem as tracto, sim, mas verbo perco, em vão. A attitude que, de facto, eu adopto é não ser tão radical: cerveja empatto com churrasco. E então, irmão?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES MOTOBOY QUE SE REMOE [5770] Chovendo, o motoboy na vida pensa. Do Alem lhe vem e advisa a voz sensata: “Cuidado! Está molhada a pista!” {Bença, Senhor!}, elle responde em prece grata. O sobrenatural explica a crença nas vozes dos espiritos: exacta sciencia não exsiste que convença alguem de que um defuncto não nos macta. Por isso, quando um delles attropela alguem que soffre e morre em hospital de pobres condições, pensa no tal anjinho que da guarda se revela. Mas, quando um motoqueiro não appella ao proprio protector, será fatal que sonhe toda noite com o mal que fez e a Satanaz deu tanta trella.

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188 GLAUCO MATTOSO ADEPTO DO SEM-TECTO [5789] Eu não tenho onde morar, si não moro onde desejo. Só reside em bom logar quem o vê, mas eu não vejo. Pode um lar ser doce lar si ao comforto der ensejo, mas, si é para accommodar mal, a casa eu não festejo. Si faltou habitação, falta tudo nesta vida. Só se sente cidadão quem tem casa, tem comida. Por que fallo disso? O pão não me falta, nem devida moradia. Meu irmão é que, errante, me convida.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES SCENARIO RODOVIARIO [5805] Do global acquescimento quem dirige caminhão ja bem sabe, no momento da coceira no colhão. O calor augmenta, o vento mal soprou e a comichão faz no sacco um soffrimento. Larga ou não a direcção? Me contou o travesti que chupou o conductor dum pesado, bem alli onde é torrido o calor. O ceguinho fica, aqui, a suppor quanto suor não brotou como o xixi si chulé virando for.

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190 GLAUCO MATTOSO MERITOS PERIPHERICOS [5843] Houve phase em que a favella se chamou “communidade”, mas em nada muda aquella expressão, nem persuade. A noção que se tem della é dum cancro na cidade, mas quem nella mora appella mudo, caso alto não brade. Na vulgar peripheria muitos moram e ninguem falla della que seria o melhor que lhes convem. Mas orgulham-se, eu diria, com justiça, pois tambem talentosa cantoria alli surge e mil fans tem.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CONSCIENCIA ECOLOGICA [5870] Eu na lyra ja dei trella aos amantes da natura. Que fazer posso por ella mais que um bardo que dedura? É o poeta quem mais zela pela flor, que lhe assegura bellos themas, si for bella uma rosa... sem frescura. Mais amor tem pela flora um poeta que, talvez, o politico que adora trazer flores em buquês. Ecochatos vão, agora, combatter o bom burguez. Mas quem sempre, em verso, chora mais por toda a Terra fez.

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192 GLAUCO MATTOSO PLUVIAL TRIVIAL [5955] Ninguem razão consegue dar ao clima. Si chove, allaga tudo e causa o chaos. Si falta chuva, os niveis estão maus. Assumpto desse typo desanima. Paresce a crise hydrica o dilemma do seculo: agua molle ou pedra dura? Concreto ou varzea verde? A gente rema mais contra a correnteza ou a natura... Nos pune com a secca? A pena extrema será bebermos mijo ou merda pura? Não falta um palpiteiro que assegura: exgotto se approveita, si tractado! Eu fico imaginando: que fartura de merda! Estamos salvos! Mero dado visivel e olfactivo é o da tinctura marron... Quanto ao sabor... será do aggrado!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES MISCELLANEA AMBIENTAL [5973] Mudanças, as climaticas me chocam. Enchente alli com secca aqui: que extranho phenomeno, tirando ou dando um banho! Poetas taes eventos pouco enfocam. A cheia na Amazonia tem contraste com nossa falta d’agua, o que provoca piadas, impedindo-me que gaste no banho o que bebi, me dando, em troca... Do mijo, mais um coppo... e, mais se arraste a crise, mais a gente em merda toca. Até nas classes altas a fofoca ja rolla: beberemos, não demora... Exgotto recyclado ou, na malloca, directo da privada... Só peora si a secca perdurar, pois desembocca o corrego na valla, a bosta afflora!

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194 GLAUCO MATTOSO TURBA DA DESURBANIDADE [6013] Nas ruas o convivio bem se estima. Caminha olhando para qualquer poncto, excepto para a frente, aquelle tonto. Em vez de olhar p’ra baixo, olha p’ra cyma. No meio da calçada, desanima e fica alli parado. Olha um descompto na loja? Nada! Delle mais lhes conto no proximo quartetto, noutra rhyma. Carrega a saccolinha do mercado, observa a cor das nuvens, a imprudencia dos motoboys, um omnibus lotado. Attento ao cellular, não tem urgencia. Exbarra na velhinha andando ao lado e a xinga, caso contra um poste prense-a. Ha muito cara assim, despreparado na vida para tanta convivencia.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES VALENTES VIGILANTES [6020] Em plena quarentena, dum vigia nocturno ouço o assobio, bem no meio da muda madrugada. Até receio por elle, mas mais riscos ha de dia. Saber que elle está alli ja me allivia um pouco. Não por elle ser esteio da lei contra ladrões do bem alheio, mas por estar bem vivo. Que alegria! Allivio tambem sinto quando escuto pessoas nas janellas, panellaço fazendo. Ouço e, si egual auê não faço, estou dissonnettando, tambem puto. Nas redes sociaes eu ja permuto meu Casa de Ferreiro, um novo espaço de livros digitaes, e dou o braço a todos que resistem no reducto.

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196 GLAUCO MATTOSO BARULHO NA JANELLA [6022] Na rua a cachorrada não está podendo passear. Ficam em casa, lattindo la de dentro, o que bem casa com nossa paciencia, cheia ja. Ja muito panellaço ouvi de la de fora. Não da rua que extravasa a raiva, mas do ghetto, como em Gaza, Varsovia, confinado no sofá. Chineza, a grippe Do nosso seremos,

koreana ou hespanhola, não tem raça nem paiz. nós, o povo, seu juiz pois janella... Alguem controla?

Talvez para bassês ninguem dê bolla, mas, para quem defende seus civis direitos, a ração não tem matiz. Appenas “sahidinha” ja não colla.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES EMPATHIA COM QUEM CHIA [6079] {Emquanto a classe media fica ahi fazendo a quarentena de motivo appenas de diario, eu, que convivo com gente da peripha, sou cricri! Não, Glauco, pense bem! Quem é que ri brincando com um drama collectivo, com tanto desemprego? Não! Passivo não fico! Não é mero mimimi! Tem gente sem comida! Ja não é questão só de ficar entediado! Não é como chiar porque o calçado produz, num pé estressado, mais chulé!} -- Concordo. No povão pensei, até. Mas esse seu exemplo foi forçado demais! Por que citar o pé estressado? Da cuca alguem ficou, tambem, lelé.

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198 GLAUCO MATTOSO VIRUS VINGADOR [6115] Emquanto, Glauco, um baile funk está rollando solto, como si nenhum contagio houvesse, penso no bebum, no joven drogaddicto, nessa pa... De dó pensa que eu morro, Glauco? Bah! Com esse povo nada, que em commum eu tenha, alguem encontra! Solto um pum, bananas dou e mando que elle va... Se junctam? Agglomeram-se? Que bom! Assim se contaminam mais depressa! Mais rapido morrer vão elles dessa virose, que é peor que aquelle som! Comtanto que eu não fique tambem com o virus, Glauco, faço uma promessa: Bem alto não rirei! Vou rir à bessa, mas quieto, aqui debaixo do edredom...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES OBITUARIO COMMUNITARIO [6128] Por ser Paraisopolis um mar de casas populares, sendo cada pequena para muitos, é levada ao leito de campanha a avó, sem ar. Semanas depois, chega a se salvar do virus, sem ter sido visitada siquer pelo marido. Ja sem nada sentir, alta recebe e volta ao lar. Nem entra no barraco. Dum vizinho escuta a má noticia. Todos ja morreram. Quem a veja san não ha. Chorou ja. Vae chorar mais um tantinho. Não tendo logar, acha algum carinho alli na vizinhança. Alguem lhe dá qualquer abrigo. Um tumulo será por ella visitado, bem pertinho.

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200 GLAUCO MATTOSO MEME DA MERRECA [6134] É logico: o mercado financeiro não vive só por causa de quem senta em cyma de papeis, mas elle exquenta com base em quem investe. Isso é certeiro. Hem, Glauco? Vae valer nosso dinheiro zero mil, zerocentos e zerenta e zero? Qual mercado se sustenta sem juros, Glauco? Diga-me, parceiro! Si forem reduzir a renda a pergunto, Glauco: Para que Melhor, então, torrar alli a grana toda! Achou que eu

zero, poupar? no bar exaggero?

Dinheiro que é “de pinga” não é mero trocado, não concorda? Ah, quer tomar commigo umas, Glaucão? Hem? Quer um par comprar de tennis velhos que eu não quero?


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES HASHTAG JURO QUE VI [6177] Tucanos sendo vistos por aqui? Só pode ser piada! Mas piada de gosto duvidoso, Glauco! Nada indica que proceda o que eu ouvi! Habitam elles mattas, do sacy, da mula sem cabeça, duma fada dos bosques são collegas! Mas que invada um bando delles justo o Morumby... Ahi ja é demais! Não é, Glaucão? Ja bastam bemtevis e sabiás, alem das maritacas! São as más linguinhas, que expalharam, do povão! Ja bastam os politicos! Razão tens tu! Mas convenhamos, meu rapaz: Não achas que figura melhor faz tucano que urubu, quando aves são?

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202 GLAUCO MATTOSO MEME DO COLLECTIVO SELECTIVO [6183] Num omnibus lotado, o passageiro, sem mascara, primeiro pigarreia. Depois passa a tossir. A bocca cheia lhe fica. De cachaça tem mau cheiro. E tosse, tosse, tosse... O corpo inteiro saccode. Mais a coisa fica feia: A pique de excarrar, ja não refreia seu impeto. O catarrho sae certeiro. Aquella gosma verde gruda feito chiclette no cabello da senhora sentada à sua frente. Para fora ja querem empurrar o tal subjeito. “Não toquem em mim! Puro preconceito! Appenas porque tenho o virus? Ora!” Dalli todos excappam sem demora. Ouvi, mas que foi meme eu ca suspeito.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES SERRA QUE FERRA [6213] Te juro, Glauco! Mesmo que não queira ninguem accreditar, mesmo que rias de todas estas miseras phobias, te juro que essa achei na Canthareira! Achei phenomenal caranguejeira, Glaucão! Appavorado ficarias! Na matta nem tem graça moradias haver! Vendi ja minha casa à beira! Reserva florestal tive na minha varanda, Glauco, quando, um bello dia, aquella cabelluda vi na pia andando, como um gatto que caminha! Me viu, a tal bichana que, damninha, persegue suas victimas! Eu ia fugir, mas não deu tempo! Uma agonia guardei: não foi de nada a piccadinha!

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204 GLAUCO MATTOSO BLACK BLOCK [6220] Você não me entendeu, Glauco! Não quero appenas protestar! Quero quebrar! Ja fui anarchopunk! Agora, azar! Eu quero o pé metter! Chega de lero! Me diga agora, Glauco, que sincero você tem sido: os homens que vetar queriam nossas mascaras logar darão aos que as permittem? É o que espero! Permittam, não permittam, tanto faz! Nós vamos promover o quebra-quebra! Assim eu me divirto! Quem celebra a nossa pauta nunca almeja a paz! Mas, Glauco, que pergunta! Sou rapaz limpinho! Tomo banho! De Genebra eu sigo a convenção! Só quando zebra meu pé tem de pigmenta aquelle gaz!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CABIDEOLOGIA [6221] Mas esses governistas não estão levando uma bandeira de Israel, alem da americana? Por que, então, no meio os neonazis teem papel? É contrasenso, Glauco! É confusão mental! Então se pode ser, ao bel prazer, fan de Caim como de Abel, discipulo do russo ou do allemão? Se pode ser de Stalin defensor, assim como de Gandhi? Ser de franco assim como de Lorca? Até quem for de Luther King appoia a Klan do branco? Então, Glaucão, um Orwell eis que eu banco! Lhe informo que me faço dictador e imponho só tesão, nenhuma dor! Na marra quem não goze eu... Hem? Expanco!

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206 GLAUCO MATTOSO MORADOR [6223] Accontesceu de novo! Pelo vento uma arvore tombada foi aqui no predio! Quebrou tudo! Ja assisti ao filme desse tragico momento! As arvores podadas eu lamento, mas, quando nossa sorte não sorri, é cada qual cuidando só de si. Fiquei preso no proprio appartamento! Sem força, sem chuveiro, elevador... Comida a se estragar na geladeira... Nenhum computador... Ah, que canseira! Nem venha quem da flora adepto for! Fallar quero, Glaucão, com o doutor prefeito, para vermos a maneira mais rapida de todas cortar, queira ou não quem nem daqui for morador!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES GARRAFA QUE GRAPHA [6237] Mensagens na garrafa até ja as dera o punk, aquelle naufrago na scena rockeira: gesto grande em tão pequena escala. Mais será na actual era. Do seculo gran coisa não se espera em termos de empathia, nem de plena acção humanitaria. Nos condemna o jogo do Systema à van chimera. Utopicos, ou loucos, somos nós, poetas e philosophos, que iremos, em verve engarrafada, aos mais extremos canthinhos do oceano. Estamos sós? Não creio. Por mais tragico ou atroz que seja nosso barco, sem os remos nem bussola, a garrafa nós podemos lançar, uma appós outra, appós, appós...

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208 GLAUCO MATTOSO ENGARRAFAMENTO [6238] Mas, cara, agora a tudo só de carro se vae, até em testagem e cinema! Agora, quem de casa sahir tema só sae si for assim! Não é bizarro? Sahindo, cara, a pé, sempre eu exbarro em agglomerações! Não, nesse eschema não dá p’ra ser feliz! Glauco, que thema legal para poema, né? Que sarro! Você pode fazer, Glaucão, um monte de estrophes p’ra contar casos assim, de gente nesse transito, sem fim nem rhumo, na avenida, numa ponte... Pensou, Glaucão, o caso da menina olhou, sorriu da guiando, mas, em

em algo? Quer que eu conte que p’ra mim rua? Sou ruim lances taes, sou fonte!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES VERY DELIVERY [6244] Pedi que me entregassem cannellone, salada, sobremesa, até bebida inclusa, mas jamais suppuz na vida que venha a tal entrega por um drone! Foi foda, Glauco! Caso alguem accione errado, o troço chega, na descida, veloz, trombando em tudo! Quem decida paral-o mais verá que elle detone! Entrou pela janella, Glauco! Veiu batter contra a parede! Foi a massa aos ares se expalhando! Minha taça quebrou-se, de crystal, partida ao meio! Glaucão, aquelle estrago foi bem feio! Jamais peço de novo que se faça a coisa! Agora a fama pela praça divulgo desse troço! Reprovei-o!

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210 GLAUCO MATTOSO MESMICE [6245] Durante a quarentena, do pavê o thio ja não é fonte de problema. Mais proxima pessoa faz que tema a gente esta roptina de clichê. Miojo todo dia! Acha você saudavel? Mas, Glaucão, mamãe só rema na mesma direcção! Ovo com gemma durinha, ja cozido, outro dilemma! Domingo muda a coisa de figura! Emfim, aquelle frango de padoca! Alguem a mesma mascara colloca e sae para buscar! Que gostosura! E sempre se commenta: “Até mais dura roptina aguenta o povo da malloca!” A gente se consola, pois se toca que para até mesmice exsiste cura...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES APOCALYPSE [6281] Cyclone bomba... Nuvem ja se vê até de gafanhoto, Glauco! Praga assim é para a gente ver si paga peccados nunca vistos na TV! Peccaste muito, Glauco? Caso dê, me compta aquillo tudo que desbraga! Estava demorando um céu que traga castigos que na Biblia a gente lê! Na data apocalyptica, verás catastrophes ineditas, Glaucão! Nevar irá durante este verão! Calor fará que em junho nunca faz! Chulé não acharás mais num rapaz! Botinas te darão menos tesão! Comptados nossos dias hoje estão! Nos resta confiar em Satanaz!

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212 GLAUCO MATTOSO INCOGNITA EXCEPÇÃO [6304] De rua a moradora ja addormesce debaixo do rasgado cobertor. Ninguem mais passa. Pode-se suppor que tenha a velha feito sua prece. A camera gravou. Eis que apparesce um carro, que estaciona. Alguem de cor mais branca salta. Seja la quem for, a midia adoraria si soubesse. Jamais se soube. Em vez de ser nocivo, o gajo simplesmente põe comida, calçado, roupa limpa, na sortida saccola, sob a manta. Sae, furtivo. A velha accordará, sem ver ao vivo quem foi que lhe salvou, talvez, a vida. No radio ouvi. Chorei. Você duvida? Anonymo, um se salva no meu crivo.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES PIEGAS ÀS CEGAS [6305] Vocês ironizaram quando, sem reservas, fiz poema de insuspeito teor e chorei quando um homem tem coragem de ser justo, sem proveito. Não choro por ter feito alguem o bem. Eu choro por ninguem mais tel-o feito. Não choro por estar na rua alguem. Eu choro si lhe falta, mesmo, um leito. Alguem ser excepção, quando devia ser regra, me commove, mas talvez se deva ao triste facto de que eu lia taes coisas, mas, ja cego, ouço vocês. Talvez motivo seja a poesia deixar um bardo meio que freguez de ingenuas emoções e phantasia fazer da redempção dalgum burguez.

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214 GLAUCO MATTOSO MARRON DEGRADÊ [6442] Total polluição! Della nos falla um ambientalista apocalyptico! Lamenta ter chegado o poncto critico dum “peido industrial” em larga escala! Enormes chaminés, alem da valla de exgotto, com seu halito mephitico, expalham polluentes que o politico ignora, a peidorrar em sua salla! Ninguem tá nem ahi, Glauco, com essa sujeira fabricada na atmosphera! Achamos natural, na actual era, cheirarmos e passarmos mal à bessa! Si dessa fumaceira, que não cessa, ninguem mais se protege, primavera teremos, não com flores -- Quem nos dera! -porem com tons marrons... Lindos, confessa!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CAUSÃO SEM PRECAUÇÃO [6471] Choveu? É mau o tempo? Olh’eu ahi, correndo pela rua, feito athleta! Às vezes, saio a andar de bicycleta emquanto os carros berram seu “Bi! Bi!” Eu gosto do perigo, Glauco! Vi a morte bem de perto! Quem completa septenta, como a gente, tem por meta bem mais longe chegar, e não alli! Vivi bastante, Glauco! Não preciso temer, nem ter prudencia para andar descalço na calçada! Nenhum par de tennis de corrida tenho, eu friso! Não, Glauco! O calçadão nem plano ou liso é, nada! Por que insiste em perguntar? Si callos tenho, ou grosso o calcanhar, não é da sua compta, eu logo adviso!

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216 GLAUCO MATTOSO BLUE EARTH [6484] (para Luiz Roberto Guedes) Os orphans de John Lennon e Raul vagueiam, como mulas sem cabeça, ainda accreditando que accontesça na Terra algo que a faça mais azul. Porem, nos hemispherios, Norte e Sul, alguns terraplanistas que mais cresça a treva vão fazendo, mais espessa a nuvem que as idéas dum pitbull. Aquella Sociedade Alternativa que todo saudosista antecipava paresce mais distante, sob a clava dum novo Brucutu com voz activa. Não morrem, todavia, Lennon, Piva, Camões nem Raul Seixas. Uma oitava heroica, por si só, mais desaggrava a gente que, de senso, o Ogro nos priva.


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES NUTRICHATO [6492] Jamais chamei um gajo de “ecochato”, Glaucão, de “natureba” tambem não! Ainda que pentelhos sejam, tão grosseiro não serei si delles tracto! Agora, chato mesmo (o que constato com maximo pesar) é o cidadão mettido a patrulhar a nutrição dos outros! Esse eu chamo “nutrichato”! Não pode comer isto, mas aquillo ja pode si for pouco ou sem tempero! Aquillo outro só pode si exaggero ninguem fizer, sinão vae ganhar kilo! Ah, va lamber sabão! Comer tranquillo o gajo não me deixa! Desespero ja tenho demais, porra, sem comer o que quero por ser caro conseguil-o!

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218 GLAUCO MATTOSO CHRONICA AMAZONICA [6496] Pô, Glauco, todo o pappo da floresta queimada não tem nada a ver com nada! A flora recompõe-se, camarada! É falso repetir que nada resta! Tem gente que reclama, que protesta sem minima noção! Acham que cada parcella desmattada condemnada seria à secca! Falta só mais esta! Melhor negocio, sabe qual será? Queimarmos, desmattarmos, a madeira vendermos! Os minerios ha quem queira! Depois renasce tudo, Glauco! Bah! Você não accredita? Acha que está errada, confundida, a gente inteira da terra? Até seus indios? De maneira nenhuma! Discordou? Se foder va!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES INCONSPIRACIONISMO [6506] O conspiracionismo, Glauco, vem crescendo! Não percebes? Na verdade, o proprio obscurantismo persuade os trouxas de que sempre trama alguem! Apponctam adjuda da o Papa! A as nossas

communistas, com ou sem Kabbala! Apponctam Sade, midia, dizem ja, que invade consciencias! Vão alem!

Extranho paradoxo, não é não? Fallavam que internet era terreno que democratizava! Até pequeno zineiro confrontou o Grande Irmão! Foi era technologica? A licção que eu tiro me confirma que é veneno o que era tão tranquillo, tão sereno advanço cultural! Que decepção!

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220 GLAUCO MATTOSO FRUCTEIRA CASEIRA [6507] Algum pesquisador, um canadense, paresce, descobriu algo que cura a peste do corona, Glauco! Obscura receita, mas que faz com que se pense! A formula assahy tem! E pertence a alguma forte industria que procura mercado, claro! Mas quem usou jura que cura mesmo! Ocê não se convence? Mas Glauco, muito sceptico ocê vem mostrando ser! Por que não assahy? Por ser fructa amazonica, daqui da nossa terra? Ah, Glauco, o que é que tem? Assim não precisamos a ninguem de fora pagar royalties! Só vi problema si faltar a fructa! Ahi os gringos a terão num armazem!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES REICH DE MIL ANNOS [6514] Não basta, a mim, deixar de comer gado bovino, porco ou peixe, emfim, deixar as aves ou os ovos de botar na bocca, não, Glaucão! Por mais eu brado! Eu brado por melhor apprendizado, no vegetarianismo, do vulgar povão, que só consome cavallar porção dum alimento processado! Eu quero ver os outros sem comer nadinha fricto, nada de gordura, de carne, de temperos! Gostosura nenhuma, em summa! Neca de prazer! Prazer, siquer no sexo, si for ver, meresce ter ninguem! Da dictadura vegana, Glauco, quero ver si dura ao menos um millennio o seu poder!

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222 GLAUCO MATTOSO VESPERA DA DESTRUIÇÃO [6515] Ainda a bomba atomica perigo será! Sempre será, Glauco! Mas eu tentando dizer sigo, ao europeu, ao russo ou ao chinez: Não, meu amigo! O clima maior bomba será, sigo dizendo, Glauco! O mundo ja perdeu a chance de evitar o sujo breu que irá nos polluir! Bello castigo! Não poupo, no Occidente, quem protesto lançou pela canção! Americanos tambem são responsaveis pelos damnos causados ao planeta com seu gesto! Só fingem protestar! Meu manifesto é contra, justamente, esses insanos abutres consumistas! Poucos annos nos restam, Glauco! O resto será resto!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CORRIDA DESPIDA [6523] Glaucão, ja disputei uma corrida nudista la na America! Tu tens que ver! Nossos thesouros, nossos bens ballançam aos clamores da torcida! Tão facil não é para que eu decida correr pellado, Glauco! Não convens commigo que exsistir vão uns porens que cercam a nudez, quando exhibida? Magina! Não, descalço nunca corro! A gente tennis usa, Glauco, claro! Mas, antes de correr, nosso preparo precisa ser na rua, sob exporro! Pensei em usar mascara... A de Zorro bastava, mas o povo mais ignaro vaiava, assim tambem! Segui meu faro: Ja perco o medo, olhando o meu cachorro...

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224 GLAUCO MATTOSO ARREDIA REBELDIA [6533] Não sei por que, Glaucão, tanto se expande a lenda pacifista! Que utopia! Na India, em paz o povo ja vivia submisso, antes de lider ser o Gandhi! A desobediencia civil grande conflicto sempre gera! Mais o guia causou de violento! Quem diria? Augmenta a repressão de quem commande! Passivo quem domina nunca fica perante quem se nega a accaptar quieto as ordens, as sentenças, um decreto, ainda que lhe imponham chupar picca! Aos sadicos, a teima justifica mais gosto em castigar quem rompe um veto! Eu mesmo, Glauco, tracto como objecto aquelle em quem pisei ou dei a bicca!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES ARTIFICIALMENTE NATURAL [6558] Glaucão, todo garçon me entende mal! Si eu peço, sem gaz, agua, sempre vem aquella de garrafa, mas que tem algum sabor de assucar ou de sal! Nem peço mais a aguinha mineral que sempre costumava pedir, nem siquer refrigerante, pois ninguem attende como quero, tal e qual! Antigamente, tinha agua com gaz ou agua torneiral! Está lembrado? Agora nada tem, do meu aggrado, nenhum boteco! O typo, tanto faz! Pé sujo ou bistrô rico, o garçon traz o mesmo coppo plastico, fechado com lacre tambem plastico! Salgado, o preço me reporta a um ladravaz!

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226 GLAUCO MATTOSO NATURALMENTE ARTIFICIAL [6559] Que rosa linda, Glauco! Mas que flor cheirosa, colorida, até brilhante! Magnifica! Quem olha até garante ser unica! Ah, capaz sou de suppor! Ahi cabreiro fico! Sim, quem for pegar na mão, sentil-a com bastante cuidado, ja não acha algo que encante seu gosto pela forma, pela cor! De plastico foi feita aquella bella flor, Glauco! Sim, de plastico! Tem graça? De fraude esse espectaculo não passa! Você, que é menestrel, não se rebella? Si dermos a tal rosa alguma trella, então é poesia a que se faça da falsa curtição, que enganna a massa, mas nunca à verdadeira dor appella!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES MULHER MAGRA [6565] (para a doutora Veronica) Magerrima fiquei, Glauco! Nem queira saber! Sim, resolvi fazer dieta por causa do meu medico, um pateta completo, um alloprado, uma toupeira! A gente, em desespero, faz besteira, começa a comer pouco, tem por meta ficar esbelta, porte ter de athleta, modello... Mas virei uma caveira! Disseram de mim tudo: que era aidetica, que tinha cancer, syphilis, lombriga! Ninguem se conformava! A minha amiga mais intima tambem estava sceptica! Até que me toquei! Faltou foi ethica ao medico, que compra aquella briga babaca, a da dieta que castiga o corpo! Só questão é de genetica!

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228 GLAUCO MATTOSO TERRACUBISMO [6572] Sem essa de ser plana a Terra! Ah, cada bobagem que se escuta, Glauco! Mais embaixo está o buraco! Esses bossaes não sabem que será a Terra quadrada? Qual circulo! Qual orbita! Qual nada! Planura no planeta? Não, jamais! É tudo geometrico! Teem taes celestes corpos solida camada! São trez um cubo, Qualquer a besta,

as dimensões, Glauco! Portanto, só, será nosso planeta! terraplanista, que se metta padroeiro nem tem sancto!

Mas, Glauco, p’ra ser franco, nem me expanto com tanta estupidez! Basta a gaveta olhar! Ja viu gaveta, sem ser peta, redonda? Nunca vi, Glauco, garanto!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES BRANQUITUDE NA ATTITUDE [6584] Ah, Glauco! Não aguento mais! A nossa local litteratura ja só falla dos negros! Tudo bem que não se eguala a penna à realidade, nem a endossa! Mas falta a falla ao branco! Caso possa fallar, elle dirá que na senzala não vive, mas tambem só leva balla e rolla, no cortiço ou la na roça! Não é porque sou branco que não faço eu parte da mais infima camada da nossa sociedade elitizada! Tambem nas lettras busco o meu espaço! Você, que é um fodidão cego devasso, se sente injustiçado ou não? A cada momento não ouviu uma risada de branco ou negro quando perde o passo?

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230 GLAUCO MATTOSO COMPORTAMENTO REPROVAVEL [6585] Glaucão, faço questão de ser causão! É foda appromptar! Gosto dum excracho! Alguem se incommodou? O bicco eu racho! Não achas divertido, Glauco, não? De chato ser, Glaucão, não abro mão! Não quero nem saber si o pato é macho! Eu quero é ovo, ouviste bem? Eu acho um sarro quando causo sensação! Na moto, de proposito, accelero, dou susto na velhinha, passo rente ao cego na calçada! Quem aguente meu jeito não exsiste, nem meu lero! Mas, Glauco, te serei muito sincero! Si fosse do Brazil o presidente, eu ia foder toda aquella gente que ja me deu, nas provas, nota zero!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES JEITO SUSPEITO [6586] Passou por mim, correndo, o molecão que tinha ja assaltado uma velhinha! Nem mesmo vacillei! Estiquei minha botina! Ah! Foi de cara bem no chão! Então eu comecei a dar pisão, dar chutes! Essa raça acho damninha! Depressa a multidão accorrer vinha! Dispostos a lynchar todos estão! O rosto do moleque ficou tão sem formas que, depois, deu mais trabalho p’ra ser reconhescido! Quem o galho quebrou foi a velhinha, a seu jeitão! Fallou ella: “Certeza, mesmo, não terei eu si foi, gente, esse pirralho! Menor achei que fosse, mas me valho da dica de vocês! Morreu, então?”

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232 GLAUCO MATTOSO VACCINA DA CHINA [6603] Chinezes são damnados! Põem à venda quaesquer mercadorias, bem barato cobrando... Quando chegam, eu constato que, juncto, veiu um brinde na encommenda! Achava que seria appenas lenda, mas eis que está na caixa aquelle exacto saquinho de sementes que, de facto, foi dicto que incluiam! Eu que entenda! Pensei em semeal-as, Glaucão, mas fallaram que teriam um veneno terrivel, que seriam um acceno satanico! Somente intenções más! Emfim, não as plantei... Foi, aliaz, melhor assim, pois fallam dum pequeno bichinho que se expalha... Não condemno ninguem, mas bem conhesço Satanaz!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES INCENDIARIOS COMMENTARIOS [6604] Queimada na Amazonia? Ah, Glaucão, não confundas! Um incendio florestal não pode ser chamado, com venal proposito, de “crime”, meu irmão! Não, mano! Uma queimada à plantação convem como recurso na rural cultura! Mas na selva não ha tal roptina! Alli factores outros são! Só podem ser maldosas essas notas que correm pelas redes sociaes! Accusam um governo que jamais da selva desleixou! Então não notas? Ah, Glauco! Só porque lamber as botas eu quero dos milicos, uns bossaes disseram que sou “gado”! Os animaes merescem mais respeito! Sem chacotas!

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234 GLAUCO MATTOSO ORACULO DO CENACULO [6607] Soubemos, ó Poeta, que te oppões às drasticas dietas restrictivas! Soubemos que, por nada, tu te privas daquillo que dá fome nos gluttões! Por isso, perguntamos: os causões, nutrologos, doutores, que convivas não são dos que na bocca teem salivas gulosas, vencerão com seus sermões? Um dia comeremos só verdura sem gosto, sem tempero, emfim, sem graça? Ainda a quituteira que nos faça bollinhos, empadões, pasteis... perdura? Sim? Viva! Ah, será a festa da fartura! Ninguem sem gostosuras taes mais passa! Poeta, aggradescemos-te! Que massa preferes? Gnocchi? Pizza? Ah, que loucura!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES AGGRESSIVAS NARRATIVAS [6615] Imagens de satellite não são “versões contradictorias”, Glauco, nada! Mas elles ficam nessa palhaçada, dizendo que “Queimada não ha, não!” Satellites não mentem! Né, Glaucão? Insiste esse governo na saphada fricção de “narrativas”, onde cada extremo quer na marra ter razão! Razão não se disputa assim, na marra! Razão requer exame consciente, à luz de dados serios! Essa gente paresce com creança que se excarra! Cuspindo cuspindo cuspido, dos dois

um vae daqui; vae, na algazarra, outro dalli! Ninguem se sente mas, na cara, a baba quente excorre e troca de boccarra!

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236 GLAUCO MATTOSO BORN ON THE BAYOU [6618] Nasci no Pantanal, Glaucão! Aquillo está pegando fogo! Uma tragedia! Agora é tarde, irmão! Ninguem impede a total devastação! Foi um vacillo! É culpa do governo, estou tranquillo dizendo o que fará com que se azede a imagem que terei! A classe media nem sabe si é possivel impedil-o! Mas era, até, possivel ser prevista, talvez mesmo -- Quem sabe? -- prevenida aquella situação, Glaucão! Duvida? Ganancia foi! Furor capitalista! A flora recupera-se, despista, depois, mas as oncinhas, cuja vida se perde, essas oncinhas, quem decida salval-as não ha! Nada mais se advista!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES HAVE YOU EVER SEEN THE RAIN? [6629] Hem, Glauco? O tempo secco não está incommodo demais? Não chove faz semanas! Previsões seguem as más de sempre! Ninguem boas novas dá! Os meteorologistas dão é má noticia! Respiramos certo gaz bem toxico, que virus novos traz! Emfim, vae peorar, você verá! Você, que tem rhinite, não se sente mal nessa longa falta de humidade? Melhor é nem andar pela cidade à tarde, nesse tempo, que é tão quente! É mesmo! Você fica ahi, contente, na sua quarentena! Ninguem ha de negar que se isolou! Não, meu confrade! Prefiro o sol, ainda que inclemente!

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238 GLAUCO MATTOSO WHO’LL STOP THE RAIN [6630] Mas pode deixar, Glauco! Quando for momento de chover, ahi ninguem irá se conformar com o que vem prevendo quem entende do sector! Enchentes nos farão, é de suppor, sentir muita saudade desta bem sequinha primavera! Alguem que tem problemas de rhinite vae ter dor! Você tem tal problema? Bicho pega si chove e si não chove? Que infeliz nariz o seu! Alem do olho, o nariz lhe causa afflicção? Nunca que sossega? Não quero de qualquer pessoa cega estar no logar, porra! Nunca quiz! Mas muita gente soffre, nos Brazis affora! A chuva chega, meu collega!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES GREEN RIVER [6644] Me lembro, onde morei, do rio, cuja cor verde se devia à densa matta das margens. Hoje tudo, se constata, mudou: a cor das aguas ficou suja! É, Glauco, natural que o povo fuja dalli, pois ja da matta ninguem tracta e está a polluição, de longa data, fedendo em grau que à merda sobrepuja! Nem, Glauco, reconhesço o rio mais! Ficou a paizagem tão deprê que até paresce, em Sampa, o Tietê, por compta dos garimpos illegaes! Si fosse só garimpo! Si meus paes me enviam uma photo, ninguem crê que foi ja tal exgotto o que você viu verde, cor que não verá jamais!

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240 GLAUCO MATTOSO PARIAH COM ORGULHO [6750] Eu moro no paiz mais viralatta, poeta! Assim tambem você não sente? Orgulho-me de ser esse indigente que chamam “brazileiro”, bem na latta! Mais alto não consinto que alguem latta, pois sou de estimação do presidente, que muito bem me educa! Ah, ninguem tente batter nelle! Não, nelle ninguem batta! Cachorro sou, Glaucão! Você me entende? Nós temos que encarar nosso destino! Assim como você, só me imagino aquelle que dum dono mais depende! A gente comida, comemos dizendo

para todo o mundo vende mas producto bem canino na ração! Aqui termino, que qualquer lixo nos rende!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES DEPOSITO DE PROPOSITO [6778] Graphava que “o Brazil é de quem USA e quem USA sou EEUU” a pichação dos annos sessentistas! Hem, Glaucão, você se lembra della? Achou confusa? Ainda de “colonia” alguem accusa as nossas relações com a nação de cyma... De você, Glauco, que é tão sensato, pedirei que mais adduza! Então acha você que era mais grave que simples influencia cultural? Maior risco corremos? Sim? Mas qual? Virarmos um appenso, um grande enclave? Virarmos plataforma duma nave atomica qualquer, espacial? Virarmos um immenso bananal? Lixeira? Ah, Glauco, seja mais suave!

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242 GLAUCO MATTOSO QUEBRANTO NA QUEBRADA [6826] Si num supermercado o negro não consegue entrar siquer em paz, está ficando clara nesta nossa má e plumbea consciencia a atroz questão! Nós somos todos negros! Ou irmão me sinto de quem soffre e é morto, ou ja não basta a allegação de que não ha racistas no Brazil, si todos são! Nós somos cada negra assassinada e cada negro preso ou torturado! Ou isso, ou estaremos, sim, do lado de cada auctor de crime! Sim, de cada! Unimo-nos agora, mas si nada fizermos a seguir, terá voltado ao zero tudo! Mesmo revoltado, não creio que nos basta a voz que brada!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES WHY CAN’T WE LIVE TOGETHER [6834] Si Timmy Thomas falla, tem logar! Cantava: “Não importa a sua cor, nós somos irmãos, brancos, negros! Por que guerras accontescem sem parar?” Tambem o Paul McCartney quiz fallar e, juncto com o Stevie, foi auctor do thema antiracista que, em favor da paz, fez da canção these exemplar! Não cabe qualquer critica a nenhum dos dois, naturalmente, Glauco, mas cricris não vão faltar com suas más linguinhas restringindo o “bem commum”! Razão teem Paul e Timmy, qualquer um que queira appellar para haver mais paz, em vez de erguer altar a Satanaz, que adspira, dos defunctos, o fartum!

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244 GLAUCO MATTOSO MELODIA MACCABRA [6860] O forte calorão nuvem escura formou e, pela tarde, muito vento soprou ao vir a chuva. Num momento terrivel, a tragedia foi mais dura. Uma arvore tombou. A gente attura taes factos, mas “normaes” eu jamais tento dizer que sejam, Glauco! Que tormento foi ver uma familia alli, insegura! No carro que, exmagado, dirigia, morreu a mãe. Viveu uma creança, berrando por adjuda! Quasi a alcança um cabo energizado! Triste dia! Glaucão, estão as arvores, por fria, fatal constatação minha, na dansa maccabra duma chuva que as ballança, ao som da assobiada ventania!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES POR PREÇO DE BANANA [6886] Glaucão, sou optimista! Bom motivo eu vejo, mesmo nessa carestia! Exsiste inflação? Sobe todo dia o preço da comida? Ah, bem me exquivo! Me viro! Sou bastante creativo! Si falta bacon, minha theoria é simples: de banana as cascas ia jogar no lixo? Nunca! Sou é vivo! As cascas, dependendo do que faço com ellas, frictas podem ser, Glaucão! Serão tiras de bacon, quando são salgadas, ao tempero dando espaço! Você nunca provou? Jamais excasso será tal alimento! Tambem não estão em falta, podem ser ração, das fructas ja chupadas, o bagaço!

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246 GLAUCO MATTOSO EPA! VIVA A XEPA! [6954] Não, nesta pandemia ja ninguem negar vae que da feira se approveita um monte de verdura! Agora acceita a gente comer isso, ou nojo tem? Mas nojo por que, Glauco, si tambem no lixo nós achamos insuspeita porção de coisa podre que, si feita alguma concessão, a servir vem? Tomates estragados teem sabor não muito differente dum bonito que, cheio de agrotoxico, eu vomito depois de ter comido! Por favor! Não sei si tanto nojo do fedor é livre e natural, ou só de mytho não passa! Nesta crise, eu accredito que xepa approveitar irão propor!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES CAFÉ PEQUENO [6959] Desculpa ahi, Glaucão, mas acho um sacco dizerem que está muito polluida a aguinha que bebemos! Quem duvida que tenha, sim, cocô? Que thema fracco! Comtudo, o que pondero, o que destacco é tanta gente rica, que convida a gente pr’um café, mas a bebida é feita, sim, de bosta de macaco! Hypocritas, não achas tu, poeta? É como o cidadão que nos critica por sermos chupadores duma picca sujissima, tirando o cu da recta! Mas esse phariseu só tem por meta lamber boceta quando cheia fica de sangue menstruado, ou de titica um anus feminino, que não veta!

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248 GLAUCO MATTOSO NATUREZA MORTA (I) [6974] As fructas na fructeira não são mais que exemplos de descaso, pois ninguem as come. São de plastico! Porem alguem as quiz comer, qual naturaes! Não foram nem os filhos, nem os paes, mas sim um thio maluco, que não tem siquer um parafuso muito bem certinho no logar, nunca, jamais! O velho mordiscando vae a pera, roendo, pouco a pouco, até que nada mais reste! Faz assim elle com cada maçan, cada laranja, alli, de cera! De cera, de borracha... Ah, si não zera aquillo tudo, o gajo, que se enfada de nada fazer, sae da creançada attraz, finge ser fera, ser panthera...


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES NATUREZA MORTA (II) [6977] Nenhum pinctor pinctava a minha rua, à margem deste corrego nojento, subjeita a tempestade, enchente, vento que tudo varre, estraga, cerca, accua! Não ha polluição que mais pollua que merda a céu aberto, Glaucão! Tento tapar o meu nariz, mas não aguento ficar sem respirar nesta cafua! Pinctores pinctam flores, fructas, bellas imagens florestaes, uma casinha à beira dum riacho... Não a minha, aqui nesta peripha de favellas! Você concorda, Glauco? Taes mazellas inspiram bardos criticos, na linha politica, mas quem aqui caminha prefere nem ver isto numas telas!

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250 GLAUCO MATTOSO NATUREZA MORTA (III) [6981] Fallar de natureza morta até paresce redundancia! Ja viu viva a flora alguem que della só se priva? A fauna, quem conhesce? Essa ralé? Não, Glauco! Todo mundo um jacaré compara ao crocodillo! Uma aggressiva aranha não differem da passiva e calma taturana! Pois não é? Cavallo não distinguem de jumento, nem lobo de cachorro viralatta! Então como saber irão da matta extincta por qualquer desmattamento? Giraffa alguem achou (Ai! Eu aguento?) perdida na Amazonia que, constata algum ecologista de gravata, estão todos queimando no momento!


NATUREBAS, ECOCHATOS E OUTROS CAUSÕES NATUREZA MORTA (IV) [6983] Si vejo um percevejo, vate, eu macto! Si pulgas eu percebo, não excappa nenhuma! Até baratta vou, a tapa, mactando pela casa! Tambem ratto! Não, Glauco! Faz enorme expalhafacto quem pensa que protege, em todo o mappa, a fauna, a flora... Bollas! Por que tapa os olhos ao piolho, ao carrapato? Bah! Muitos desses bichos teem veneno, poeta! Não, não servem para nada! Aranha, por exemplo: uma piccada nos macta! Mesmo um bicho tão pequeno! Estás tremendo, Glauco? Não condemno a tua posição! Caso uma invada a cama em que te deitas, nem a fada madrinha vem salvar! É pavor pleno!

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SUMMARIO COUSA COM CAUSA [6489]......................................11 MUSEU A CÉU ABERTO [0041]...................................12 VANGUARDA CONCRETISTA [0042]................................13 MADRIGAL AMBIENTAL [0047]...................................14 ODE AO DESAMPARO [0052].....................................15 OXYMORO DO OXYGENIO OU VICE VERSA [0061]....................17 MANIFESTO COITADISTA [0146].................................18 MANIFESTO AMBIENTALISTA [0151]..............................20 DISSONNETTO AO HIPPIE [0202]................................22 DISSONNETTO AO PUNK [0203]..................................23 MANIFESTO ALTRUISTA [0206]..................................24 DISSONNETTO AO PARQUE [0219]................................25 DISSONNETTO AO VIADUCTO [0220]..............................26 DISSONNETTO AO METRÔ [0221].................................27 DISSONNETTO MAGRO [0329]....................................28 DISSONNETTO RECYCLADO [0339]................................29 OPPOSTOS POSTOS [0363]......................................30 RANHETA GRETA [0439]........................................32 FINAS NARINAS [0453]........................................34 GENTE DO CÉU [0481].........................................35 PODRE DE RICO [0517]........................................36 VINHO NA BOTA [0518]........................................38 DISSONNETTO URUBUEIRO [0532]................................39 DISSONNETTO AO MOTOBOY [0538]...............................40 INFINITILHO VERMELHO [0583].................................41 DISSONNETTO IMPROVISADO [0671]..............................43


DISSONNETTO DO GATTO PINGADO [0672].........................44 INFINITILHO DA EMPULHAÇÃO [0702]............................45 INFINITILHO EMPORCALHADO [0703].............................46 PSYCHOTICO DIAGNOSTICO [0718]...............................47 INFINITILHO MOLHADO [0721]..................................48 INFINITILHO COMPARTILHADO [0724]............................49 DISSONNETTO DESARVORADO [0732]..............................51 DISSONNETTO DAS TROUXAS DOS TROUXAS [0748]..................52 DISSONNETTO DO PRECONCEITO TEMPORAL [0778]..................53 DISSONNETTO DO MONUMENTO AO MOMENTO [0794]..................54 DISSONNETTO DA ESTIAGEM [0842]..............................55 DISSONNETTO UNIVERSAL [0879]................................56 DISSONNETTO NÃO-GOVERNAMENTAL [0895]........................57 RHAPSODIA AMARALIANA [0935].................................58 RHAPSODIA BELMIRIANA [0936].................................60 RHAPSODIA FONTESIANA DO HERMES [0937].......................61 DISSONNETTO AO CARNIVORISMO [0973]..........................62 DISSONNETTO DIALECTICO-DIETETICO [1016].....................63 DISSONNETTO DA BANALIDADE INESPERADA [1186].................64 DISSONNETTO DO ACQUESCIMENTO GLOBAL [1199]..................65 DISSONNETTO DA PROPHECIA VISCERAL [1209]....................66 DISSONNETTO DO PAPA EM SAMPA [1242].........................67 DISSONNETTO DA CHUVA INTEMPESTIVA [1271]....................68 DISSONNETTO DO DENOMINADOR COMMUM [1292]....................69 DISSONNETTO DOS EDIFICIOS TOMBADOS [1295]...................70 DISSONNETTO DO SAUDOSO ASSOBRADADO [1390]...................71 DISSONNETTO DA PAZ E DO RANCOR [1396].......................72 DISSONNETTO DA GASTRONOMIA SADIA [1421].....................73 DISSONNETTO DO TRAHIDOR DO MOVIMENTO [1438].................74 DISSONNETTO DA MOTO CONTINUA [1453].........................75 DISSONNETTO DA BAGUNÇA CLIMATICA [1471].....................76


DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO DISSONNETTO

DO MONTURO FUTURO [1474]........................77 DA CHUVA ACIDA [1517]...........................78 DA DESGRAÇA POUCA [1518]........................79 DO GYRO SEM VOLTA [1519]........................80 DA COMMUNIDADE INCOMMUM [1521]..................81 DO CARRO DO ANNO [1549].........................82 DA FUNDAÇÃO [1554]..............................83 DA BICYCLETA RECYCLADA [1563]...................84 DA CAMA FEITA [1628]............................85 DA PRISÃO PERPETUA [1629].......................86 DO EQUIVOCOMBUSTIVEL [1630].....................87 DO CORTIÇO VERTICAL [1645]......................88 DO PASSEIO SEM ASSEIO [1658]....................89 DA GUERRILHA URBANA [1682]......................90 PARA UM ROCKZINHO ANTIGO [1730].................91 PARA UMA VARANDA NOVA [1744]....................92 PARA A PERIPHERIA DESASSISTIDA [1854]...........93 PARA UMA VISTA AEREA [1856].....................94 PARA A LUZ CORTADA [1861].......................95 PARA UMA NOITE TEMPESTUOSA [1869]...............96 PARA UMA CIDADELLA INCENDIADA [1870]............97 PARA DUAS DORES [1871]..........................98 PARA UMA VIAGEM PHANTASTICA [1872]..............99 PARA UM ACCIDENTE PRAGUEJADO [1886]............100 PARA UMA EXPOSIÇÃO VALORIZADA [1899]...........101 PARA UMA ESSENCIA INEBRIANTE [1900]............102 PARA UM PORCO EXPOSTEJADO [1904]...............103 PARA UMA AVENIDA SATURADA [1907]...............104 PARA O TRAFEGO TREFEGO [1908]..................105 PARA O PRECONCEITO RACIAL [2005]...............106 PARA UM DESASTRE AMBIENTAL [2040]..............107


DISSONNETTO PARA A GENTARADA ENJAULADA [2150]..............108 DISSONNETTO PARA UMA FOLIA RUEIRA [2152]...................109 DISSONNETTO PARA UM PONCTEIRO OSCILLANTE [2242]............110 DISSONNETTO PARA UM CIDADÃO MOTORIZADO [2334]..............111 DISSONNETTO PARA UM VERDE QUE SE PERDE [2336]..............112 DISSONNETTO PARA A MOTO QUE EU NÃO PILOTO [2378]...........113 DISSONNETTO PARA UM INDIGENA INDIGNADO [2632]..............114 DISSONNETTO PARA UMA CARA CARA [2696]......................115 DISSONNETTO SOBRE UM RAPAZ PERTINAZ [2774].................116 DISSONNETTO SOBRE A VOZ POETICA [2807].....................117 DISSONNETTO SOBRE A PADROEIRA E A LADROEIRA [2823].........118 DISSONNETTO SOBRE UMA DESVALORIZAÇÃO IMMOBILIARIA [2851]...119 DISSONNETTO SOBRE UM GALANTE NO VOLANTE [2865].............120 DISSONNETTO SOBRE O UFFANISMO E O AFFANISMO [2911].........121 DISSONNETTO SOBRE CANTOS E DESENCANTOS [2913]..............122 DISSONNETTO SOBRE UMA ILHA PARADISIACA [2940]..............123 DISSONNETTO SOBRE O DIREITO DE IR E VIR [2956].............124 DISSONNETTO SOBRE A NOSTALGIA QUE ALLIVIA [2961]...........125 DISSONNETTO SOBRE UM PLANETA MAL MOLHADO [2988]............126 DISSONNETTO SOBRE A EXCASSEZ DE VERDES [2989]..............127 DISSONNETTO SOBRE O QUE É ISTO [3007]......................128 SARNAS PROCURADAS [3101]...................................129 TRAIÇOEIROS AGUACEIROS (I) [3109]..........................130 TRAIÇOEIROS AGUACEIROS (II) [3110].........................131 DAMNOS URBANOS [3125]......................................132 RECIPROCA IMPRECAÇÃO [3206]................................133 ECOSYSTEMA CARCERARIO [3230]...............................134 CARISSIMO CARRINHO [3272]..................................135 MIOLOS EM MOLHO À PAULISTANA [3352]........................136 POTAVEL DISPUTAVEL [3382]..................................137 ESPECULADOS CUBICULOS [3399]...............................138


TEMPORARIO BALNEARIO [3400]................................139 DISSONNETTO DO CRENTE SORRIDENTE [3434]....................140 ABBALLOS A INTERVALLOS [4112]..............................141 EMPREHENDEDORISMO CREATIVO [4405]..........................142 UM METRO E MEIO [4459].....................................143 ACCIDENTE QUE SE SENTE [4587]..............................144 ESTYLO RUEIRO [4663].......................................145 VIOLENTO VENDAVAL [4664]...................................146 TETRICO TRECHO KILOMETRICO [4665]..........................147 PANORAMA PUNK [4675].......................................148 ATTEMPTADO NÃO REIVINDICADO [4679].........................149 FLAMMEJANTE GIGANTE [4719].................................150 BARULHEIRA DOMINGUEIRA [4765]..............................151 EPHEMERA EMERGENCIA [4766].................................152 VIAJANDO NO DESEJO [4789]..................................153 VEGETARYANISMO [4797]......................................154 AMIGA DUMA FIGA [4799].....................................155 BAMBIENTALISTA AFFECTADO [4873]............................156 CASA ISOLADA [4883]........................................157 A VEZ DA EMBRIAGUEZ [4982].................................158 DROGA MIXTURADA [4985].....................................159 ENSEJO PARA DESPEJO [4986].................................160 CALÇADA ARBORIZADA NADA! [5034]............................161 PRECIOSO LIQUIDO [5068]....................................162 CYCLOACTIVISMO NO CIRCUS MAXIMUS [5107]....................163 NECA DE CUECA! [5129]......................................164 RELENDO VINICIUS (II) [5183]...............................165 RELENDO AMADEU AMARAL (II) [5186]..........................166 RELENDO HERMES FONTES [5204]...............................167 DISSONNETTO DUM ESPAÇO EXCASSO [5308]......................168 DISSONNETTO DUMA CONFERENCIA SEM CONSEQUENCIA [5316].......169


DISSONNETTO DUM CULTO TUMULTO [5317].......................170 DISSONNETTO DUNS URBANOS DAMNOS [5392].....................171 DISSONNETTO DUMA PERMISSIVIDADE NOCTURNA [5423]............172 DISSONNETTO DUNS PAPPOS DE ELEVADOR [5453].................173 DISSONNETTO DUNS PHARISAICOS AMBIENTALISTAS [5455].........174 EM CLIMA DE CATACLYSMO [5506]..............................175 LINHAS TORTAS [5598].......................................176 CELLA ESPACIAL [5600]......................................177 AND THE SUN WILL SHINE [5622]..............................178 PRAIEIRA PICHAÇÃO [5629]...................................179 JARDINS SUSPENSOS [5655]...................................180 LAVAGEM PORCORAL [5658]....................................181 TURMA DO MALÃO MAGICO [5662]...............................182 SCENA TERRENA [5666].......................................183 CONVIVENCIA PACIFICA [5718]................................184 FLOR DO AMOR [5743]........................................185 AMBIENTANDO THEMAS [5753]..................................186 MOTOBOY QUE SE REMOE [5770]................................187 ADEPTO DO SEM-TECTO [5789].................................188 SCENARIO RODOVIARIO [5805].................................189 MERITOS PERIPHERICOS [5843]................................190 CONSCIENCIA ECOLOGICA [5870]...............................191 PLUVIAL TRIVIAL [5955].....................................192 MISCELLANEA AMBIENTAL [5973]...............................193 TURBA DA DESURBANIDADE [6013]..............................194 VALENTES VIGILANTES [6020].................................195 BARULHO NA JANELLA [6022]..................................196 EMPATHIA COM QUEM CHIA [6079]..............................197 VIRUS VINGADOR [6115]......................................198 OBITUARIO COMMUNITARIO [6128]..............................199 MEME DA MERRECA [6134].....................................200


HASHTAG JURO QUE VI [6177].................................201 MEME DO COLLECTIVO SELECTIVO [6183]........................202 SERRA QUE FERRA [6213].....................................203 BLACK BLOCK [6220].........................................204 CABIDEOLOGIA [6221]........................................205 MORADOR [6223].............................................206 GARRAFA QUE GRAPHA [6237]..................................207 ENGARRAFAMENTO [6238]......................................208 VERY DELIVERY [6244].......................................209 MESMICE [6245].............................................210 APOCALYPSE [6281]..........................................211 INCOGNITA EXCEPÇÃO [6304]..................................212 PIEGAS ÀS CEGAS [6305].....................................213 MARRON DEGRADÊ [6442]......................................214 CAUSÃO SEM PRECAUÇÃO [6471]................................215 BLUE EARTH [6484]..........................................216 NUTRICHATO [6492]..........................................217 CHRONICA AMAZONICA [6496]..................................218 INCONSPIRACIONISMO [6506]..................................219 FRUCTEIRA CASEIRA [6507]...................................220 REICH DE MIL ANNOS [6514]..................................221 VESPERA DA DESTRUIÇÃO [6515]...............................222 CORRIDA DESPIDA [6523].....................................223 ARREDIA REBELDIA [6533]....................................224 ARTIFICIALMENTE NATURAL [6558].............................225 NATURALMENTE ARTIFICIAL [6559].............................226 MULHER MAGRA [6565]........................................227 TERRACUBISMO [6572]........................................228 BRANQUITUDE NA ATTITUDE [6584].............................229 COMPORTAMENTO REPROVAVEL [6585]............................230 JEITO SUSPEITO [6586]......................................231


VACCINA DA CHINA [6603]....................................232 INCENDIARIOS COMMENTARIOS [6604]...........................233 ORACULO DO CENACULO [6607].................................234 AGGRESSIVAS NARRATIVAS [6615]..............................235 BORN ON THE BAYOU [6618]...................................236 HAVE YOU EVER SEEN THE RAIN? [6629]........................237 WHO’LL STOP THE RAIN [6630]................................238 GREEN RIVER [6644].........................................239 PARIAH COM ORGULHO [6750]..................................240 DEPOSITO DE PROPOSITO [6778]...............................241 QUEBRANTO NA QUEBRADA [6826]...............................242 WHY CAN’T WE LIVE TOGETHER [6834]..........................243 MELODIA MACCABRA [6860]....................................244 POR PREÇO DE BANANA [6886].................................245 EPA! VIVA A XEPA! [6954]...................................246 CAFÉ PEQUENO [6959]........................................247 NATUREZA MORTA (I) [6974]..................................248 NATUREZA MORTA (II) [6977].................................249 NATUREZA MORTA (III) [6981]................................250 NATUREZA MORTA (IV) [6983].................................251


Titulos publicados: A PLANTA DA DONZELLA ODE AO AEDO E OUTRAS BALLADAS INFINITILHOS EXCOLHIDOS MOLYSMOPHOBIA: POESIA NA PANDEMIA RHAPSODIAS HUMANAS INDISSONNETTIZAVEIS LIVRO DE RECLAMAÇÕES VICIO DE OFFICIO E OUTROS DISSONNETTOS MEMORIAS SENTIMENTAES, SENSUAES, SENSORIAES E SENSACIONAES GRAPHIA ENGARRAFADA HISTORIA DA CEGUEIRA INSPIRITISMO MUSAS ABUSADAS SADOMASOCHISMO: MODO DE USAR E ABUSAR DESCOMPROMETTIMENTO EM DISSONNETTO DESINFANTILISMO EM DISSONNETTO SEMANTICA QUANTICA INCONFESSIONARIO DISSONNETTOS DESABRIDOS SONNETTARIO SANITARIO DISSONNETTOS DESBOCCADOS RHYMAS DE HORROR DISSONNETTOS DESCABELLADOS


São Paulo Casa de Ferreiro 2021




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