O direito e o avesso – o que existe de admirável e de abominável na educação brasileira

Page 1


O DIREITO E O AV SSO E



Celso Antunes

O DIREITO E O AV SSO E

O que existe de admirável e de abominável na educação brasileira


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Antunes, Celso O direito e o avesso : o que existe de admirável e de abominável na educação brasileira / Celso Antunes. -- São Paulo : Edições Loyola, 2015. ISBN 978-85-15-04258-6 1. Aprendizagem 2. Educação - Finalidades e objetivos 3. Educação moral 4. Orientação educacional - Brasil 5. Valores éticos : Educação I. Título. 15-01110

CDD-370.13

Índices para catálogo sistemático: 1. Educação de valores

Preparação: Maurício Balthazar Leal Capa: Viviane B. Jeronimo Diagramação: Ronaldo Hideo Inoue Revisão: Vero Verbo Serviços Editoriais

Edições Loyola Jesuítas Rua 1822, 341 – Ipiranga 04216-000 São Paulo, SP T 55 11 3385 8500 F 55 11 2063 4275 editorial@loyola.com.br vendas@loyola.com.br www.loyola.com.br Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou quaisquer meios (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permissão escrita da Editora.

ISBN 978-85-15-04258-6 © EDIÇÕES LOYOLA, São Paulo, Brasil, 2015

370.13


Dedicatória

Algumas vezes penso que existem pessoas, e muitas, que vivem como folhas. Sua passagem pelo mundo, ainda que às vezes prolongada, é efêmera, vazia, quase opaca. Amam e sofrem, abrigam alegrias e guardam decepções, mas estas, sempre serenas, não marcam, não decidem. Passam pela vida mas, como relata o poeta, não a vivem verdadeiramente, e as emoções que esculpem são modeladas pela discrição. Amam levemente e sussurram como o violonista que toca em surdina. São como folhas e, quando abatidas pela idade ou pelo vento, caem sem rumor e sem barulho, sem armazenar paixões. Lembram folhas de um velho carvalho que ao cair não se associam aos frutos e guardam expressiva distância das raízes. Outras pessoas, poucas é verdade, são como troncos. Marcam seu espaço, simbolizam seu tempo e, fincadas ao solo pela solidez de suas raízes, não se abatem pelas tempestades e, ainda que se curvem pela força do vento, jamais se dobram. Um dia, abatidas pelos anos ou corroída pelos raios, tombam, mas o fazem com estardalhaço, não como quem reclama a partida, mas com a fúria silenciosa de quem marcou um lugar, deixou seu registro, marcou o seu tempo. Parecemse com troncos de um carvalho solene ou de uma oliveira teimosa que ofereceram frutos, garantiram sombras, impuseram obstáculos. Este livro ironiza folhas e descreve troncos. Jamais como tratado botânico, mas no reconhecimento de quem trilhou caminhos da educação pelo avesso, tal como folhas, ou ousou buscar o lado direito, igual aos troncos. Nestes dias de escola em rápida transformação, penso que a glória do viver o cotidiano de uma escola, se viver abriga qualquer glória, é conseguir na educação, seja qual for o papel exercido, se fazer tronco e buscar identidade plena no lado direito, onde a individualidade se marca pelo cotidiano exercício de buscar o outro e pelo outro se reconstruir a cada minuto. Que me desculpem as folhas, mas é aos troncos que dedico este pequeno livro. Celso Antunes 2015



Sumário

Introdução .......................................................................................... 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15. 16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30. 31. 32. 33. 34.

AVESSO — Uma aula ................................................................... DIREITO — Uma aula ................................................................... AVESSO — Explorando linguagens e inteligências .......................... DIREITO — Explorando linguagens e inteligências .......................... AVESSO — Ensinando conteúdos conceituais ................................ DIREITO — Ensinando conteúdos conceituais ................................ AVESSO — Estimulando a memória significativa ............................ DIREITO — Estimulando a memória significativa ............................ AVESSO — Interrogação ou afirmação .......................................... DIREITO — Interrogação ou afirmação .......................................... AVESSO — Administrando questões disciplinares .......................... DIREITO — Administrando questões disciplinares .......................... AVESSO — A escola como espaço epistemológico ........................ DIREITO — A escola como espaço epistemológico ........................ AVESSO — A escola como ambiente socializador .......................... DIREITO — A escola como ambiente socializador .......................... AVESSO — A escola como centro gerador de competências .......... DIREITO — A escola como centro gerador de competências .......... AVESSO — A aula e a exploração de habilidades ........................... DIREITO — A aula e a exploração de habilidades ........................... AVESSO — Trabalhando valores e virtudes na sala de aula ............. DIREITO — Trabalhando valores e virtudes na sala de aula ............. AVESSO — A inclusão e as diferenças .......................................... DIREITO — A inclusão e as diferenças .......................................... AVESSO — O relativismo da verdade ............................................ DIREITO — O relativismo da verdade ............................................ AVESSO — Avaliando o desempenho dos alunos ........................... DIREITO — Avaliando o desempenho dos alunos ........................... AVESSO — Uma rica escola pobre ............................................... DIREITO — Uma pobre escola rica ............................................... AVESSO — A crítica e o elogio em sala de aula ............................. DIREITO — A crítica e o elogio em sala de aula ............................. AVESSO — O “sim” e o “não” em sala de aula ............................... DIREITO — O “sim” e o “não” em sala de aula ...............................

9 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 23 24 25 26 27 29 31 33 35 37 39 41 43 45 46 48 49 51 53 55 56 58 59


35. 36. 37. 38. 39. 40. 41. 42. 43. 44. 45. 46. 47.

AVESSO — DIREITO — AVESSO — DIREITO — AVESSO — DIREITO — AVESSO — DIREITO — AVESSO — DIREITO — AVESSO — DIREITO — AVESSO —

Um diretor de escola .................................................. Um diretor de escola .................................................. Um funcionário administrativo em uma escola .............. Um funcionário administrativo em uma escola .............. O envolvimento familiar............................................... O envolvimento familiar............................................... O uso de tecnologia nas escolas ................................. O uso de tecnologia nas escolas ................................. O bullying .................................................................. O bullying .................................................................. Uma aula para a solução de problemas ....................... Uma aula para a solução de problemas ....................... Orientador(a) educacional e pedagógico(a) e suas funções .................................. 48. DIREITO — Orientador(a) educacional e pedagógico(a) e suas funções ..................................

61 63 65 67 69 71 73 75 78 80 82 84 87 89

Conclusão: Transformando o avesso no direito ...................................... 91 Livros (recentes) de Celso Antunes ....................................................... 93 Sugestões de leituras .......................................................................... 103


Introdução

A educação brasileira, tanto em escolas públicas como em escolas particulares, exibe cenário de contrastante desigualdade. Sem muito esforço, percebe-se algumas escolas públicas de excelente qualidade, ainda que em espaços restritos e carentes, e a maior parte das escolas com uma qualidade de ensino deplorável e uma formação docente distante do que se poderia considerar sofrível. Da mesma forma, em escala diferente, encontram-se escolas particulares de qualidade baixa, preparando mal e se justificando apenas como empreendimento financeiro para seus mantenedores, e algumas vezes, do outro lado da rua, escolas excelentes que, se não têm meios e recursos para investir em alta tecnologia, podem desenvolver, com professores empolgados e uma gestão coesa, ensino de qualidade. A presente constatação não reflete opinião isolada. Resultados do desempenho de alunos brasileiros através de sistemas públicos ou privados atestam essa desigualdade, como também a atestam resultados de avaliações do estudante brasileiro em inúmeras provas e olimpíadas culturais internacionais. Em face dessa desigualdade idealizou-se o projeto “Avesso & Direito”, visando a expor, ao lado de sistemas e processos pedagógicos arcaicos e comprometedores, situações de aprendizagem excelentes, tão eficientes quanto as desenvolvidas nas regiões mais avançadas do planeta. Essa exposição busca abordar, dessa forma, o cotidiano da escola e da ação pedagógica de má e excelente qualidade, e pretende contribuir para um processo de uniformização e uma mudança significativa que já não pode mais esperar. Os objetivos são apresentar em páginas opostas dois textos breves, caracterizando o panorama de agudo contraste que caracteriza a educação pública e a educação privada no Brasil, e explorar de maneira propositalmente irônica o lado “avesso”, onde se destaca a forma tradicional e retrógrada de agir, e o lado “direito”, revelando que em situações ambientais semelhantes e com exemplos exitosos é possível, 9


sem outro esforço que o de uma atualização docente e gestora, uma situação de aprendizagem e administração de ensino análoga, mas de qualidade excelente. Ao expor esse contraste e destacar sua possibilidade de superação, objetiva-se enfatizar como não são difíceis o esforço e a coerência no sentido de uma mudança progressiva e positiva das formas e situações que envolvem o ensino brasileiro.

10


AVESSO 1 Uma aula “Bom dia, alunos. Para começar bem nossa aula, por favor, alinhem suas carteiras. Muito bem. Vocês sabem que sem ordem não existe aprendizagem. Agora coloquem sobre a carteira todo o material necessário para a aula: lápis, borracha, caderno, régua, canetas, livros e tudo mais. Muito bem. Agora anotem ao alto, com destaque, o título do assunto que irá ser trabalhado; vejam como faço e façam de igual maneira. Agora vou escrever na lousa um quadro sinótico destacando as ideias principais do tema. Por favor, copiem em silêncio e destaquem com caneta de outra cor as palavras que destacarei com giz amarelo. Muito bem. Agora que todos estão com seus cadernos iguais, ouçam minha explicação. Não anotem nada, apenas prestem atenção. Após a síntese que farei, deverão com suas palavras expressar minhas ideias. Se tiverem dúvida, levantem o braço e irei até vocês. Excelente. Pronto, nossa aula está terminando. Anotem, por favor, a lição de casa: ler o livro da página 63 à página 72 e, observando ideias novas e não apresentadas em aula, anotar no caderno. Quero todos os cadernos iguais: um título, uma síntese de ideias, um sumário explicativo e uma relação de eventuais acréscimos. Tenham um bom dia e até a próxima aula.”

11


DIREITO 2 Uma aula “Bom dia, alunos. Sabem que esta noite eu sonhei que o Ricardo havia sonhado que a Clarice caiu de uma falésia? Acordei me perguntando o que poderia ser essa falésia. Enquanto eu faço a chamada, pensem em algo que pode causar um despencar e discutam o que poderia ser uma falésia. Excelente. Agora que trocaram pensamentos, por favor, me ajudem. Como achar o significado do conceito de falésia usando um computador? Fale você, Ricardo. Ótimo, parece que a Sandrinha tem algo a dizer? Fale, querida. Excelente. Quem mais pode opinar? Luciana? Muito bem, relate sua experiência. Adorei. Por favor, e se, entretanto, não existisse computador? Como achar o sentido para “falésia”? Muito bem, Luís Paulo. Livros. Isso mesmo Alice, dicionários. André, qual a diferença entre a consulta a um dicionário e a um livro? Ótimo. Gostei muito. Agora, amigos, que sabemos como buscar respostas, vamos ver o que nos conta o livro. Abram na página onze. Vejam esse conceito. Vamos construir novos conceitos? Muito bem, agora que formamos grupos, discutam como construir um conceito correto, mas sem o uso de palavras usadas pelo autor. Será que conseguem? Excelente. Parabéns, cada grupo organizou uma resposta ótima. Então vamos formar novos grupos com um ou dois componentes dos grupos iniciais, e dessa forma todos saberão o que dizem os conceitos construídos em sala. Muito bem. A aula está chegando ao fim. Por favor, observem a lição de casa: devem pesquisar em fontes diferentes novas ideias e, na próxima aula, apresentá-las aos colegas. Não vale usar apenas palavras. Expliquem os conceitos encontrados com fotos, mímicas, recortes, paródias, desenhos. Usem linguagens diferentes. Tenham um bom dia e até a próxima aula.” 12


AVESSO 3 Explorando linguagens e inteligências “Admiro vocês por algumas coisas, mas por outras não. E, para que não fiquem dúvidas sobre o que gosto e o que não gosto, quero deixar muito claro o que aprecio e, portanto, qual o caminho para o sucesso e as boas notas. Eu gosto de alunos que não inventem a roda. Isso mesmo. Não estranhem, pois inventar a roda significa buscar jeito novo de fazer o que a tradição e a experiência ensinaram a fazer. Vejam o caso dos conceitos que ensinamos. O que explico em aula é exatamente o que explicava há dez anos. Portanto, tenho segurança e experiência no conteúdo que transmito e na forma de melhor transmitir. Além disso, recomendo sempre que comparem os temas que explico com os que os livros apresentaram. Nem sempre o autor fala a minha linguagem e nem poderia mesmo falar. A linguagem escrita difere da linguagem oral e, além disso, eu estou olhando nos olhos dos alunos a quem falo e o autor do texto não os conhece. Assim, ele generaliza ideias e conceitos, e eu trato de compreender essas generalizações e dar a elas um sentido local e pessoal. São coisas que aprecio e aprovo. Eu não gosto de alunos metidos a apresentar opiniões, pontos de vista, ideias próprias. Afinal, essas ideias podem valer para um palpite no futebol, mas não em uma aula. Qual a bagagem do aluno? Será que ele não percebe que é um absurdo tentar contrapor o que imagina ao saber da experiência de seu professor e do amplo conhecimento do autor que está sendo analisado. Portanto, vamos direto ao assunto: quer se sair bem nas provas? Não invente o que não necessite ser inventado e estude muito o que foi apresentado por seu professor e pelos textos que ele sugere. Estamos entendidos?”

13


DIREITO 4 Explorando linguagens e inteligências “Vocês podem, com segurança, garantir o que é melhor e mais perfeito: uma tela genial de Leonardo da Vinci ou uma sinfonia bem tocada composta por Chopin, uma escultura fenomenal de Rodin ou a coreografia de uma extraordinária companhia de balé? Claro que não. Penso que essas perguntas, se refletidas por vocês, somente poderiam abrigar um tipo de resposta, e essa resposta seria ‘Impossível’. Podemos, é claro, apreciar e gostar mais da pintura que da música, podemos preferir os passos de uma dança bem executada a uma escultura, mas somos obrigados a reconhecer que, além do nosso gosto pessoal, toda obra de um gênio é sempre admirável e incomparável. E por que estou dizendo essas coisas? Simplesmente para mostrar que inteligências diferentes produzem criações diferentes, e todas são admiráveis. A ciência e a arte sempre se expressaram por múltiplas linguagens, formas diferenciadas de olhar. E é justamente esse esforço que espero de vocês. Discutimos, analisamos, comparamos e sintetizamos diferentes ideias e teorias. Conversamos sobre hipóteses e destacamos alguns princípios que se transformaram em leis. Vocês aprenderam esses conceitos e por aprendê-los se transformaram. Já não são mais o que eram antes. E é por essa razão que eu gostaria de solicitar que expressassem ideias e pensamentos conquistados por meio de linguagens e inteligências diferentes. Se desejarem, preparem um texto, mas pensem na possibilidade de uma música e não descartem fotos, desenhos ou até mesmo uma maquete. Aprecio e admiro como aprenderam e se transformaram e desejo verificar essa transformação, mas, por favor, criando formas diferentes de apresentação, refletindo sobre maneiras específicas de contar. Não tenham medo do erro e jamais fujam da ousadia. Quem sabe bem sabe dizer de maneira diferente do que ouviu.” 14


AVESSO 5 Ensinando conteúdos conceituais “Queridos alunos, minha missão nesta classe é ensinar e a de vocês é aprender. Vamos, pois, refletir um pouco sobre o significado dessas palavras e com essa reflexão modelar como deverá ser o meu trabalho e o trabalho de vocês. Ensinar, e isso não é novidade para ninguém, é passar informações específicas sobre os conteúdos conceituais que caracterizam a programação de nossa disciplina. Mas, é claro que essas informações específicas necessitam ser compreendidas por vocês e, portanto, tenho de ser claro e preciso, procurando tornar mais fácil o que muitas vezes à primeira vista parece difícil. É por essa razão que é essencial que vocês perguntem muito, perguntem sempre, mas que saibam pensar no que perguntam e saibam aguardar o melhor momento para apresentar essas perguntas. Aprender é uma palavra que faz mais sentido quando o aluno possui claro enfoque sobre o que busca saber. Por isso, não divaguem, jamais se desviem da rota traçada pelos conteúdos conceituais. Olhem nossa programação, verifiquem os títulos dos inúmeros assuntos distribuídos pelo ano letivo e pensem que cada um desses temas deve ser contemplado com sua compreensão. Compreender um tema, portanto, não significa ser capaz de repeti-lo de forma automática, mas assumir esse tema buscando relacioná-lo com as coisas que já conhecem e com seu uso nos desafios de cada dia. Ensinar não é difícil quando existe empenho do professor, e eu prometo me empenhar a fundo; e aprender é sempre fácil quando existe interesse. Portanto, vamos a nossas missões…”

15


DIREITO 6 Ensinando conteúdos conceituais “Queridos alunos, minha missão nesta classe é ensinar e a de vocês é aprender. Vamos, pois, refletir um pouco sobre o significado dessas palavras e com essa reflexão modelar como deverá ser o meu trabalho e o trabalho de vocês. Ensinar é tornar fáceis e significativos os conteúdos conceituais da disciplina, ajudando todos em geral e cada um em particular a compreender e aplicar o que descobriram. Mas ensinar é bem mais que isso, pois todo ensino envolve o saber usar múltiplas competências, e entre as mais importantes delas estão as que os ajudam a estabelecer relações interpessoais e construir amizades. Por esse motivo, em muitos momentos iremos trabalhar em equipes, aprendendo a aprender com o outro e com o outro compartilhar. É importante que os conteúdos conceituais aprendidos por vocês se transformem em instrumentos de comunicação com o outro, e essa comunicação deve sempre se fazer efetiva e afetiva, destacando o diálogo e a evolução particular e progressiva na capacidade de argumentar. Os saberes conceituais não possuem apenas valor em si, mas também como instrumentos de ajuda para se aprender como resolver problemas e as muitas maneiras que toda tomada de decisões envolve. Além disso, é essencial que o que ainda não sabem e buscam saber possa ajudá-los a observar os muitos elementos de cada situação e o domínio de uma visão do mundo sem preconceitos, livre de estereótipos. Ensinar não é difícil quando existe empenho do professor, e eu prometo me empenhar a fundo, e aprender sempre é fácil quando existe desejo de transformação e vontade de ter mais e, sobretudo, ser mais.”

16


AVESSO 7 Estimulando a memória significativa “Queridos alunos, a aula terminou e cumpri a minha parte. Agora é chegada a hora do trabalho pessoal de cada um. Vocês sabem que aprender e depois esquecer o que se aprendeu nada vale e, dessa maneira, necessitam conhecer como funciona a memória humana e fazê-la agir para que não esqueçam o aprendido. Vamos então à tarefa que lhes cabe. Para que possamos guardar coisas na memória é essencial ler uma, duas, três ou ainda mais vezes o texto que se deseja guardar. Nossa memória funciona com base na repetição e, assim, quanto mais repetimos, mais facilmente guardamos. Mas não creiam que isso basta. A repetição da escrita necessita ser ajudada pela insistência do pensamento verbal; por esse motivo, falem em voz alta e falem muitas vezes tudo quanto desejam conhecer. Imaginem-se tendo a tarefa de ministrar uma aula sobre o que aprenderam e ministrem essa aula, se possível diante de um espelho, repetindo muitas vezes e com persistência o texto que precisa ser decorado. Com esse trabalho, sua tarefa memorativa está quase pronta. Basta agora em outros momentos e em outras oportunidades repetir essa aula; e quanto mais vezes você ler e falar, mais facilmente aprenderá. Será sempre fácil recordar para uma prova ou exame o que dessa maneira e com essa insistência se decorou. Sucesso para todos.”

17


DIREITO 8 Estimulando a memória significativa “Queridos alunos, vocês sabem que a memória é atualmente uma das áreas do cérebro mais bem conhecidas? Pois é. O avanço da neurologia desvendou segredos sobre como a memória funciona, e por essa razão seria interessante que ao estudar os textos que vocês desejam fixar sempre levem em conta alguns princípios básicos. Vamos a eles. A memória enfrenta imensa dificuldade de reter tudo quanto apresentamos a ela sem significação. Por esse motivo, não procurem guardar nada se não compreenderem com clareza o que estão lendo. Se um conceito possui palavras que você desconhece, busque o seu significado, procure tornar sempre o que deseja reter algo fácil de compreender. Além da significação, a memória gosta de ser ajudada por associações. Por essa razão, nunca deixe de ‘associar’ o que está aprendendo com algo que já sabe, ligando o conteúdo do novo saber aos conteúdos de saberes que já estão retidos na sua memória. Outro procedimento importante para a memória é procurar ‘organizar’ os fatos que se deseja aprender. Ao pesquisar um texto, separe ‘causa’ de ‘consequência’, ‘opinião’ de ‘fato’, ‘argumento’ de ‘relato’. Priorize as ideias principais, pois quem as retém lembra com maior facilidade das ideias que a elas se ligam. Para finalizar, pense sempre que possível em associar fatos e conceitos que necessita guardar com experiências da sua vida carregadas de ‘emoção’. Um conceito que se liga a uma alegria ou a uma tristeza vivida é mais fácil de ser lembrado, pois essa emoção já está na memória e ao acessá-la se está também acessando essa associação. Guardar as coisas na memória é ato inteligente que envolve procedimentos inteligentes, e toda boa memória é sempre produto de significação, associação, organização e emoção. Boa sorte.”

18


AVESSO 9 Interrogação ou afirmação “Queridos alunos, nossa aula vai começar e creio que vocês já sabem o papel que devem desempenhar. De qualquer forma, quero reafirmar esse papel. O professor representa quem sabe e ensina, e os alunos os que ignoram e necessitam aprender, e por esse motivo ao professor cabe sempre o ponto de exclamação ou de afirmação, e ao aluno, naturalmente, o ponto de interrogação. É por esse motivo que vou expor uma parcela de meu saber e vocês vão ouvir, e na hora indicada podem perguntar o que não entenderam e solicitar que eu repita o que não ficou claro. Por favor, não me venham com perguntas descabidas e que se desviam do que expliquei. Não queiram saber nada além do que exponho, pois se o que poderiam querer saber fosse importante isso já constaria de minha exposição. Detesto alunos que fazem perguntas desejando saber, por exemplo, onde e quando vão usar o que estão aprendendo. Vão usar na vida, já falei tantas vezes. Outras perguntas que acho ridículas são as que ligam os conteúdos conceituais que ensino ao que ensinam meus colegas professores de outras disciplinas. Isso é pura estupidez, pois a aula de matemática é apenas para a matemática, assim como a aula de língua portuguesa é apenas para a língua portuguesa. Outra coisa importante que é sempre oportuno reafirmar é que não precisam querer ampliar o que ensino, pois se isso fosse necessário eu já o faria antecipadamente. Não venham também com essa conversa torpe de habilidades e competências, pois cansei de mostrar que são palavras novas para o que sempre destaquei como objetivos principais e secundários. Fui claro? Alguma dúvida?”

19


DIREITO 10 Interrogação ou afirmação “Queridos alunos, nossa aula vai começar e eu gostaria de ainda uma vez relembrar a importância de suas perguntas. Não tenham medo de perguntar e não hesitem em querer saber cada vez mais. Certamente poderei não saber tudo o que irão me perguntar, mas por certo sou capaz de oferecer pistas para juntos procurarmos respostas. Além disso, estejam atentos ao que vou explicar, pois de instantes a instantes proporei desafios, buscando ligar o novo aos saberes antigos, associando a minha disciplina com outras que estão aprendendo. Uma atitude impensável é imaginar que cada conteúdo conceitual trabalhado se fecha sobre si mesmo; ao contrário, tudo quanto é essencial que se aprenda precisa se vincular à vida que se vive, ao entorno que nos cerca e ao que já sabemos. Impossível uma nova informação desligada de outras que vocês já conhecem. Lembrem-se também de que uma aula somente ganha sentido quando associa o saber conceitual à competência, isto é, ao saber fazer. Aprender não é para se guardar na memória, mas para se transformar em ação, e assim o que estão descobrindo é importante para exercitar sua capacidade de antever soluções, solucionar problemas, investigar novos conceitos. Não creio que possa existir um bom professor que não saiba usar em todos os momentos os pontos de interrogação para desafiar, ensinar a argumentar, fazer pensar. Tudo quanto em uma aula se aprende exige que se afine com as competências de comparar, analisar, classificar, relatar e outras, muitas outras. Todos já estão de posse dos seus muitos pontos de interrogação? Excelente. Então nossa aula pode agora começar.”

20


AVESSO 11 Administrando questões disciplinares “Bom dia, turma. Não gosto de repetir sempre as mesmas coisas, mas gosto menos ainda de ser considerado uma pessoa injusta. Por essa razão e para que as coisas fiquem bem claras, quero que compreendam o seguinte: Primeiro: a disciplina e a obediência representam o fator essencial da aprendizagem. Por isso e para que ninguém deixe de compreender o que exponho e fique com uma nota zero é que sou firme e rigoroso com questões disciplinares. Segundo: existe uma imensa diferença entre professores e alunos. Os primeiros estão na escola para ensinar, e os alunos vêm à escola para aprender; portanto, quem determina regras de procedimentos em sala de aula são os que ensinam, e cabe aos alunos seguir suas instruções. Terceiro: quem ensina é quem fala e quem aprende é quem ouve, e por esse motivo não se tolerará qualquer conversa entre alunos. Para conversar existe a hora do intervalo e existe o pátio. Sala de aula é ambiente de silêncio e atenção. Quarto: é natural que alunos possam ter uma dúvida ou outra, e por essa razão reservo sempre os dez minutos finais de cada aula para as perguntas. Somente responderei a perguntas inteligentes e se, após a minha resposta, persistirem as dúvidas procurem resolvê-las entre vocês mesmos nas horas de intervalo. Não admito que alunos entrem em aula após a minha entrada, e dessa forma não justifico qualquer pretexto para se argumentar a favor desse desrespeito. Qualquer regra imposta em sala de aula visa ao benefício de vocês; dessa forma, qualquer protesto ou desobediência implica a exclusão da aula e o devido encaminhamento à Diretoria. 21


Para finalizar, quero deixar bem claro que sou um professor democrata, e em toda verdadeira democracia a autoridade e o poder emanam sempre dos que comandam para os comandados. Quem não aceitar minha maneira de atuar sobre questões disciplinares procure a direção da escola, que já foi informada por mim de que não aceito e nem admito qualquer tipo de reclamação e não hesitarei em diminuir a nota de todo aluno que ignorar o que digo ou se fizer de engraçado.”

22



Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.