Sistemas educacionais: concepções, tensões, desafios

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SISTEMAS EDUCACIONAIS CONCEPÇÕES, TENSÕES, DESAFIOS



SISTEMAS EDUCACIONAIS CONCEPÇÕES, TENSÕES, DESAFIOS

DONALDO BELLO DE SOUZA MARISA RIBEIRO TEIXEIRA DUARTE ROSIMAR DE FÁTIMA OLIVEIRA (ORGS.) ALÍCIA BONAMINO ALZIRA BATALHA ALCÂNTARA ÂNGELA MARIA MARTINS BEATRIZ DE BASTO TEIXEIRA CANDIDO ALBERTO GOMES CARLOS ARTEXES SIMÕES CARLOS ROBERTO JAMIL CURY CHOUKRI BEN AYED CLÁUDIA OLIVEIRA PIMENTA CLEITON DE OLIVEIRA DONALDO BELLO DE SOUZA DORA MARIA RAMOS FONSECA DE CASTRO ELDARONICE QUEIROZ DE ALVARENGA JANAÍNA SPECHT DA SILVA MENEZES MARIA FERNANDA REZENDE NUNES MARIA OCÉLIA MOTA MARIA ROSIMARY SOARES DOS SANTOS MARISA RIBEIRO TEIXEIRA DUARTE MARISA TIMM SARI MARISE RAMOS NAIRA DA COSTA MUYLAERT LIMA NEUSA CHAVES BATISTA PEDRO GANZELI RITA DE CÁSSIA OLIVEIRA ROSIMAR DE FÁTIMA OLIVEIRA SONIA KRAMER VALÉRIA VIRGÍNIA LOPES WELLINGTON FERREIRA DE JESUS


Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Sistemas educacionais : concepções, tensões, desafios / Donaldo Bello de Souza, Marisa Ribeiro Teixeira Duarte, Rosimar de Fátima Oliveira, (organizadores). -- São Paulo : Edições Loyola, 2015. Vários autores. ISBN 978-85-15-04280-7 1. Educação 2. Educação e Estado 3. Política e educação 4. Sistema Nacional de Educação I. Souza, Donaldo Bello de. II. Duarte, Marisa Ribeiro Teixeira. III. Oliveira, Rosimar de Fátima. 15-03112

CDD-370

Índices para catálogo sistemático: 1. Sistemas de ensino : Educação 2. Sistemas educacionais

Preparação: Maurício Balthazar Leal Capa: Walter Nabas Detalhe da imagem de © Mykola Velychko / Fotolia Diagramação: Ronaldo Hideo Inoue Revisão: Renato da Rocha

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Um lavrador, sentindo vir chegando O fim da sua vida, e desejando Que os filhos trabalhassem na cultura, Chamou-os e lhes disse: “A sepultura Por instantes me espera: os bens, que tinha, Enterrados estão na nossa vinha”. Morto o pai, e tendo eles suspeitado Que algum grande tesouro sepultado Lhes deixara na vinha, aparelharam Enxadas e solícitos cavaram. Não acharam tesouro, é bem verdade; Mas a vinha deu tanta novidade Que se pode dizer que foi tesouro, Segundo o que rendeu de prata e ouro. Jean LA FONTAINE, O lavrador e seus filhos, trad. Couto Guerreiro, in Fábulas de La Fontaine, 2. ed., Lisboa, Moderna Editorial Lavores [s.d.], trad. por vários autores brasileiros e portugueses do século XIX, referente à 2. ed. do original publicado em Paris pela Imp. De la Société Anonyme de Publications Periodiques, em 1886.



Sumário

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Prefácio Carlos Roberto Jamil Cury

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Apresentação Donaldo Bello de Souza Marisa Ribeiro Teixeira Duarte Rosimar de Fátima Oliveira

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Lista de siglas e abreviaturas

Parte I SISTEMAS NACIONAIS DE EDUCAÇÃO: CONCEPÇÕES 31

O Estado, a educação escolar e o território Choukri Ben Ayed

49

O desenvolvimento do sistema educativo estatal em Portugal: um percurso marcado por regulações externas e pela centralização de poderes Dora Maria Ramos Fonseca de Castro

65

Estado nacional federativo e nova agenda para a educação: montar ou não o cavalo selado? Candido Alberto Gomes Wellington Ferreira de Jesus

83

Planejamento da educação nacional no Brasil: da educação do povo à regulação do sistema federativo Marisa Ribeiro Teixeira Duarte Maria Rosimary Soares dos Santos

105

Avaliação nacional da educação básica e sistemas de ensino: quais as relações? Alicia Bonamino Naira da Costa Muylaert Maria Océlia Mota


Parte II SISTEMAS ESTADUAIS DE ENSINO: TENSÕES 123

Aportes para análise dos sistemas estaduais de ensino: a contratualização da gestão Rosimar de Fátima Oliveira Eldaronice Queiroz de Alvarenga

139

Planos estaduais de educação: (des)vinculações com a gestão dos sistemas estaduais de ensino Donaldo Bello de Souza Janaína Specht da Silva Menezes

173

Oferta do ensino fundamental: ampliação, tensões e mudanças Rita de Cássia Oliveira Beatriz de Basto Teixeira

191

Ensino médio no Brasil dos anos 2000 e os sistemas estaduais de ensino: a difícil universalização de um direito Marise Ramos Carlos Artexes Simões

Parte III SISTEMAS MUNICIPAIS DE ENSINO: DESAFIOS 217

Desafios à organização dos sistemas municipais de ensino no Brasil: elementos constitutivos, colaboração federativa e qualidade da educação Marisa Timm Sari

245

A gestão de redes e sistemas municipais de ensino: dilemas na organização da educação básica Ângela Maria Martins Cláudia Oliveira Pimenta Cleiton de Oliveira Pedro Ganzeli Valéria Virgínia Lopes

263

Acompanhamento e avaliação de planos municipais de educação metropolitanos: o protagonismo local dos sistemas de ensino Donaldo Bello de Souza Alzira Batalha Alcântara

283

Implementação municipal da política educacional PAR: tensões e contribuições para a autonomia e a gestão democrática dos sistemas municipais de ensino Neusa Chaves Batista

303

Condições, gestão, formação e identidade da educação infantil: desafios e recomendações para os sistemas municipais Sonia Kramer Maria Fernanda Nunes

319

Sobre os autores


Prefácio

A

educação está inscrita em nossa Constituição da República de 1988 como o primeiro dos direitos sociais, consoante o artigo 6º desta Carta Magna. Neste sentido, ela abrange o cidadão ut socius, isto é, como membro de grupos sociais no interior de uma coletividade maior. Mas ela é também um direito que amplia a capacidade de participação dos membros desta coletividade nos destinos nacionais. É o sujeito político apreendido na sua acepção própria de cidadão (ut civis). Junto a essas dimensões há ainda a educação que, tomada como um direito subjetivo, encarna a defesa do indivíduo ut singulus, ou seja, do sujeito concebido na sua singularidade única. Não por outras razões, a Constituição de 1988, inovando sob este aspecto, coloca a educação como um direito juridicamente protegido, a tal ponto que, entendida como direito público subjetivo, põe nas mãos dos sujeitos mecanismos jurídicos contra a omissão ou a interferência indébita do poder estatal na oferta deste bem. Ocorre que este direito do cidadão, nesta tríplice dimensão, isto é, direito civil, direito político e direito social, é também um dever do Estado em que as finalidades e os princípios da educação, claramente dispostos na Lei Maior e na Lei de Diretrizes e Bases, são o horizonte maior da atuação dos poderes públicos. Por este sentido de um panorama comum da efetivação do direito à educação devem se pautar a atuação e os caminhos dos poderes públicos, tanto no que seja nacional, inclusive no respeito às diversidades culturais, quanto no que é próprio do regime federativo em suas peculiaridades regionais e locais. Ora, a consecução desses fins e princípios não poderia curvar-se nem a uma imposição autoritária, típica de regimes verticais, nem a uma dispersividade de orientações capilarizadas, as quais importariam, ao fim e ao cabo, ausência de fins comuns. Congruente com um país democrático, republicano e federativo, o direito do cidadão e o dever do Estado se estruturam em um federalismo educacional, de tal modo que a organização da educação nacional se articula em torno da noção de sistema. Um sistema — entende-se — é um conjunto articulado e coordenado de elementos coexistentes que, dentro de um espaço e um tempo determinados, compartilham um mesmo ordenamento estruturado no qual as diretrizes e bases da educação nacional são da alçada da União pelo inciso XXIV do artigo 22 da Constituição da República e cuja elaboração é competência privativa da União. 9


Por outro lado, o Brasil não é um país unitário. Um país federativo supõe o compartilhamento do poder e a autonomia relativa das circunscrições federadas em competências próprias de suas iniciativas, constitucionalmente definidas. Supõe também a necessidade de um grau de unidade central, sem amordaçar a diversidade regional e/ou local. E a mútua conexão entre elas, já em 1988, foi definida sob a égide do regime de colaboração no artigo 211 da Carta Magna. Assim, compete aos estados e aos municípios, concorrentemente, enquanto sistemas de educação autônomos e articulados, a efetivação do direito à educação, no âmbito de suas atribuições, no que hoje chamamos de educação básica. E na forma federativa adotada pela Constituição Federal de 1988, com a União, 26 estados, Distrito Federal e mais de 5.500 municípios, só a realização do sistema federativo por cooperação recíproca, constitucionalmente previsto, poderá encontrar os caminhos para superar os entraves e os problemas que atingem a educação escolar em nosso país. Esse federalismo impõe atribuições diversas sob a forma de competências privativas, concorrentes e comuns dos e entre os entes federativos, o que torna a satisfação do direito à educação uma realidade bastante complexa e de difícil gestão. Essa complexidade contém um elevado número de sujeitos e de arenas que podem tomar decisões dentro do campo educacional. Por outro lado, a diversidade manifesta dentro de um país continental expressa uma diferenciação entre as várias regiões do país, e mesmo dentro de um estado, em termos da plenitude do direito à educação. De todo modo, a articulação mútua, organizada por meio de um pacto consociador em torno do regime de colaboração, serviria como modo de evitar a dispersão de esforços e como meio de efetivar um regime federativo e cooperativo na educação escolar e, com ele, o direito à educação. Aqui, cumpre distinguir, mas não dividir, o regime de cooperação, posto no artigo 23 da Constituição, do regime de colaboração do artigo 211. O primeiro implica tão só os entes federativos. Já o segundo, ao abranger os sistemas de educação, toca tanto na rede pública quanto na rede privada autorizada pelo poder público. A dimensão federativa, entretanto, vai ganhar com a Emenda Constitucional (EC) nº 59, de 11 de novembro de 2009, um dispositivo novo e original que significa um reforço do direito à educação como um direito próprio da democracia e do federalismo cooperativo. Diz o caput do artigo 214, emendado: A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e o desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a […].

Esta mesma emenda estabelece a necessidade de um plano nacional de educação, sob o qual subjaz o sistema nacional de educação. Isto significa que o Título IV da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, recepciona este sistema como sendo o núcleo da organização da educação nacional. 10

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Ela também amplia o direito à educação ao instituir obrigatoriedade dos 4 aos 17 anos, financiamento público constitucionalizado por meio de impostos vinculados referidos ao Produto Interno Bruto (PIB), exigência de carreira, piso salarial nacional profissional e gestão democrática. São exigências novas de cuja concretização depende a ansiada qualidade educacional. Um sistema nacional, em um regime federativo e republicano, se assenta em diretrizes e bases da educação nacional que devem cobrir o conjunto dos sistemas de educação: o federal, os estaduais, o distrital e os municipais e, no seu interior, as redes públicas e privadas que os constituem. E a mútua conexão entre eles, já em 1988 definida constitucionalmente sob a égide do regime de colaboração (art. 211), agora, sob o novo conceito, deve significar algo mais do que apenas um novo termo para dizer o mesmo. O sistema nacional de educação, agora posto pela EC nº 59/2009, é aquilo que todos os sistemas federativos possuem em comum, e estes sistemas são aqueles que contêm este comum, e também aquilo que faz deles sistemas autônomos, dentro de suas competências. Portanto, há algo nos sistemas federativos que é comum (sistema nacional) e, assim, compartilhado. E há também nos sistemas federativos o que lhes é próprio. E ambos devem dialogar entre si na busca maior das finalidades maiores da educação nacional. Nesse sentido, há que se esperar que a educação tenha um perfil que atenda a uma coesão social, a uma unidade nacional, respeitadas as diferenças regionais e as peculiaridades locais. Recentemente, um novo estatuto jurídico-legal infraconstitucional, advindo da EC referida, trouxe um novo alento para o enfrentamento destes desafios. Trata-se do novo Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014, articulado a um (conceito inédito no Brasil) Sistema Nacional de Educação e, desta vez, com financiamento referido aos 10% do PIB do país. Após quatro anos de pressões, projetos, emendas e consultas, o novo PNE foi, finalmente, aprovado e sancionado com vinte metas ousadas e ambiciosas em suas 245 estratégias divididas entre tais metas. O Plano é nacional porque se conjuga com as diretrizes e bases da educação nacional, e agora, sob o novo conceito, deve significar algo mais do que apenas um novo termo para dizer o mesmo. Com efeito, no processo legislativo, o Projeto de Lei (PL) nº 8.035, de 20 de dezembro de 2010, ao se tornar a Lei nº 13.005/2014, conheceu mudanças consideráveis no corpo da lei. Ao lado de outras alterações, como o alteamento do Fórum Nacional de Educação (FNE) como dispositivo legal, deve-se destacar na citação a seguir os parágrafos 5º, 6º, 7º: Art. 7º — A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios atuarão em regime de colaboração, visando ao alcance das metas e à implementação das estratégias objeto deste Plano. § 1º Caberá aos gestores federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal a adoção das medidas governamentais necessárias ao alcance das metas previstas neste PNE. § 2º As estratégias definidas no Anexo desta Lei não elidem a adoção de medidas adicionais em âmbito local ou de instrumentos jurídicos que formalizem a cooperação Prefácio

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§ 3º

§ 4º

§ 5º § 6º

§ 7º

entre os entes federados, podendo ser complementadas por mecanismos nacionais e locais de coordenação e colaboração recíproca. Os sistemas de ensino dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios criarão mecanismos para o acompanhamento local da consecução das metas deste PNE e dos planos previstos no art. 8º. Haverá regime de colaboração específico para a implementação de modalidades de educação escolar que necessitem considerar territórios étnico-educacionais e a utilização de estratégias que levem em conta as identidades e especificidades socioculturais e linguísticas de cada comunidade envolvida, assegurada a consulta prévia e informada a essa comunidade. Será criada uma instância permanente de negociação e cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. O fortalecimento do regime de colaboração entre os Estados e respectivos Municípios incluirá a instituição de instâncias permanentes de negociação, cooperação e pactuação em cada Estado. O fortalecimento do regime de colaboração entre os Municípios dar-se-á, inclusive, mediante a adoção de arranjos de desenvolvimento da educação.

Isto significa que o regime de colaboração agora tem instâncias formais, permanentes e imperativas de negociação, cooperação e pactuação. Negociar é firmar acordos, cooperar é atuar juntos em vista de um mesmo fim, e pactuar é decidir em conjunto. Se esta imperatividade abrange todos os entes federados pelo parágrafo 5º, o 6º implica a mesma postura no âmbito dos estados e seus municípios. Já o parágrafo 7º coloca em pauta, entre municípios, especialmente limítrofes, com especial atenção para as regiões metropolitanas (RMs), os chamados arranjos de desenvolvimento da educação, já abrangidos pelo artigo 25 (§ 3º) da Constituição Federal, que, por sua vez, assinala a possibilidade de integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum. Esta pactuação, por sua vez, conta com a precedência de outro desafio que está determinado pelo artigo 8º: “Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão elaborar seus correspondentes planos de educação, ou adequar os planos já aprovados em lei, em consonância com as diretrizes, metas e estratégias previstas neste PNE, no prazo de 1 (um) ano contado da publicação desta Lei”. É preciso considerar, então, como se montarão as equipes que comporão as instâncias de pactuação e os planos estaduais e municipais. O espírito que perpassa o corpo da lei é o do princípio da gestão democrática. Espera-se, então, que este princípio que subjaz ao conjunto da lei se faça efetivo na composição das equipes. Se temos o Plano Nacional, se os planos estaduais e municipais devem se configurar tanto quanto a consistência efetiva do sistema nacional, outros passos muito importantes ainda devem ser dados. O primeiro se refere ao modus operandi do financiamento em termos de gestão dos recursos, já que se têm os valores do pré-sal, do fundo social e da progressão dos valores do PIB. O segundo se reporta ao parágrafo único do artigo 23 da Constituição. Trata-se do regime de cooperação, postulada sob a forma de lei complementar. A omissão do Congresso, desde 1988, na feitura desta lei que regula os entes federativos não mais se justifica. 12

Sistemas educacionais: concepções, tensões, desafios


Consequente, pois, com este conjunto, o Sistema Nacional de Educação, conjugado ao Plano Nacional de Educação, deixa de ser uma adesão voluntária dos sistemas de educação. O que está em pauta na agenda pública, na tradução destes desafios, é o direito do cidadão e o dever do Estado, direito juridicamente protegido e obrigação dos poderes públicos. Entrementes, este quadro indica que, se há nos pilares dos sistemas de educação que restam para a sua concretude uma pluralidade de concepções que contêm tensões e desafios, há razões esperançosas para a efetividade de um Sistema Nacional de Educação. Este livro joga, com realismo crítico, na esperança de um caminho novo para a nossa educação.

Belo Horizonte, setembro de 2014 Carlos Roberto Jamil Cury Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-Minas)

Prefácio

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Apresentação

W

alter Benjamin, no celebrado ensaio “Experiência e pobreza”1, principia remetendo-nos à fábula de La Fontaine que epigrafa esta coletânea, denominada “O lavrador e seus filhos”. Para além do fundo moral que esta fábula encerra, Benjamim, ao evocá-la, reafirma o valor da parábola para uma estreita relação entre palavra e imagem, neste caso aludindo à “experiência” que o moribundo transmitira aos seus filhos (e não de imediato por eles percebida) ao informá-los acerca do tesouro sepultado nos vinhedos que, em última instância, não consistia em “ouro, mas no trabalho”, conotando a semeadura que o revolver da terra implicaria. Considerando a importância que a temática dos sistemas educacionais vem progressivamente assumindo nas discussões acadêmicas e para a formulação de políticas públicas de educação, nos níveis nacional e local, tanto no Brasil quanto no exterior, a presente obra se movimenta em torno do revolver das suas concepções, tensões e desafios com vistas ao semear de novas dimensões teórico-conceituais e teórico-práticas, tomando por base algumas das inúmeras experiências nacional e internacionalmente constituídas na área. Reafirma, portanto, o seu valor para o enfrentamento dos desafios postos tanto em relação aos estados federados quanto aos unitários. Não se trata de um trabalho, no entanto, que visa analiticamente a novas definições conceituais relativas aos sistemas de educação ou, de forma instrumental, a novas engenharias político-administrativas que os contemplem, mas a evidenciar o valor de determinadas experiências institucionais para a práxis da gestão política educacional no Brasil, especialmente em um momento tão privilegiado, que sucede à aprovação do novo Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Este, precedido pela Emenda Constitucional (EC) nº 59, de 11 de novembro de 2009, tornase central na mediação de um possível funcionamento articulado e cooperativo entre os sistemas de ensino federados, de modo que se dê corpo à noção de “sistema nacional de educação em regime de colaboração”. Conforme divulgado em 2010, o tema central da Conferência Nacional de Educação (Conae) veio a abordar a construção de um sistema nacional articulado de educação 1 Walter BENJAMIN, Experiência e pobreza, in ID., Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura, 3. ed., São Paulo, Brasiliense, 1987, p. 114-136 (Obras Escolhidas I).

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no Brasil, acrescido, quatro anos após, no âmbito da Conae de 2014, da temática relativa à importância do PNE para sua consecução, em paralelo à questão da participação popular. Assim, as duas conferências focalizam suas reflexões em torno do conceito de Sistema Nacional de Educação e da realidade atinente ao Brasil, suas desigualdades, suas diversidades, seus desafios e, em especial, suas perspectivas futuras. Mas essas preocupações, como sabemos, não são necessariamente recentes. Em 1932 o Manifesto dos Pioneiros da Educação já denunciava nossa incapacidade de criar um sistema de organização escolar à altura das necessidades modernas do país. Assim, ao olharmos para as desigualdades que ainda hoje persistem em nosso sistema educacional, indagamos sobre as relações educacionais que as promovem, em especial sobre os múltiplos movimentos de centramento e descentramento que marcam as relações de poder. Inicialmente, caberia indagar acerca da autonomia das reflexões e dos encaminhamentos coletivos proporcionados pelas conferências e pelos encontros científicos da área, no sentido de serem, por exemplo, produtores ou reprodutores das relações que marcam sistemas educacionais desiguais. Do ponto de vista das abordagens clássicas da sociologia, a ação social seria considerada, contraditoriamente, ou como produto do sistema ou como dele derivada. Por outro lado, os pesquisadores do campo da sociologia das regulações sociais2 insistem que toda pessoa, todo grupo ou toda organização implicados em um sistema desempenham ou podem desempenhar um papel no seu funcionamento. Nessa vertente analítica, para proceder ao exame de um sistema específico, seria necessário proceder ao desvelamento do jogo de forças nele atuante. Nessa perspectiva, o sistema educacional atua sobre as ações individuais e coletivas circunscrevendo umas e potencializando outras, sendo condicionado por algumas ações e, a um só tempo, condicionando outras, as mais diversas. Problematizar as posições dos grupos sociais, atores coletivos e classes para alçar a análise de um sistema específico, em nosso caso o educacional, permitiria desvelar o jogo de forças presente no seu interior? Ou, ainda, como são produzidos os efeitos de verdades no interior das práticas discursivas sobre o Sistema Nacional de Educação? E a solução federativa é uma resposta simultânea às exigências democráticas como também à permanência das assimetrias de poder ao longo do território. A adoção da fórmula federativa acha-se associada à desresponsabilização do poder central para com os serviços que asseguram a educação básica, como reitera a extensa literatura sobre municipalização? Que medidas em desenvolvimento contribuem para favorecer um arranjo institucional sistêmico com descentramento de poder e promoção de maior igualdade social? Esses consistem, entre outros, em desafios analíticos caros à sociologia política da educação, de modo que se problematize, a relação entre os sistemas educacionais e a ação dos diversos atores sociais como trabalhadores, professores, educadores, militantes, suas entidades e organizações, governos e instituições privadas, desafios que a coletânea em tela, não obstante o reconhecimento de suas limitações para conduzir 2 Christian MAROY, École, régulation et marché: une comparation de six espaces scolaires locaux en Europe, Paris, Presses Universitaires de France, 2006; Jean-Daniel REYNAUD, Regulation de contrôle, regulation autonome, regulation conjointe, in Gilbert de TERSSAC, La théorie de la regulation sociale de Jean-Daniel Reynaud. Débats e prolongements, Paris, La Decouverte, 2003, p. 103-113.

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esses reptos à sua solução, se esforça por semear exatamente pelo revolver e pelo esquadrinhar dos “vinhedos” cujas imagens sugerem. Esta obra consiste, pois, em um dos produtos relativos ao desenvolvimento da investigação Os Planos Municipais de Educação (Brasil) e as Cartas Educativas Municipais (Portugal): perspectiva comparada entre as regiões/áreas metropolitanas do Rio de Janeiro e do Porto3, em processo de desenvolvimento pelo Núcleo de Estudos em Política e História da Educação Municipal (Nephem) da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FE/Uerj), em conjunto com o Centro de Investigação e Inovação em Educação (InEd) da Escola Superior de Educação (ESE) do Instituto Politécnico do Porto (IPPorto), pesquisa coordenada no Brasil pelo Prof. Dr. Donaldo Bello de Souza (Uerj) e em Portugal pela Profa. Dra. Dora Fonseca Castro (IPPorto)4. A um só tempo, a coletânea em tela aporta estudos e pesquisas em curso no âmbito do Grupo de Pesquisa Política e Administração dos Sistemas de Ensino da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (GrPesq-Pase/FAE/ UFMG), em especial o programa denominado “Observatório da Gestão Municipal da Educação”, desenvolvido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e coordenado pelas Profas. Dras. Marisa Ribeiro Teixeira Duarte e Rosimar de Fátima Oliveira. Os pesquisadores do grupo analisam a administração do sistema educacional federativo brasileiro por locus diversos, porém com o objetivo de desvelar as relações políticas subjacentes aos dispositivos e mecanismos de gestão. Em 2014, inicialmente motivados pela organização desta coletânea, seus organizadores também vieram a constituir o Núcleo Interinstitucional de Pesquisas: Observatório da Educação Municipal (Nupoem), resultado de acordo de cooperação técnicocientífica celebrado entre o GrPesq-Nephem/FE/Uerj e o GrPesq-Pase/FAE/UFMG5, tendo como coordenadores, respectivamente, o Prof. Donaldo Bello de Souza e a Profa. Marisa Ribeiro Teixeira Duarte. O referido Núcleo vem estimulando o empreendimento de novos projetos de investigação e de cunho editorial na área de política e gestão da educação, assim como a promoção de ações vinculadas à assessoria e/ou consultoria educacionais na esfera local, tanto no território mineiro quanto no fluminense. Retornando à pesquisa anteriormente mencionada — Os Planos Municipais de Educação (Brasil) e as Cartas Educativas Municipais (Portugal)… —, sua fase inicial veio motivarnos, ao longo de 2012 e 2013, à organização de duas primeiras coletâneas, tematicamente coesas, que ora são complementadas por esta obra, visando, em termos gerais, a subsidiar o desenvolvimento do ramo brasileiro desta investigação comparada. A primeira obra, sob título Mapa dos Conselhos Municipais de Educação no Brasil: criação, implan3 Cf. Donaldo Bello de SOUZA, Dora Fonseca de CASTRO, Projeto de investigação — Os Planos Municipais de Educação (Brasil) e as Cartas Educativas Municipais (Portugal): perspectiva comparada entre as regiões/ áreas metropolitanas do Rio de Janeiro e do Porto, Rio de Janeiro/Porto, Nephem/FE/Uerj/InEd/Esse/IPPorto, 18 jun. 2012. 4 O Termo de Cooperação Acadêmica para a realização desta pesquisa conjunta Uerj/IPPOrto veio a ser publicado pela Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro (Sect) no Diário Oficial do Estado (DOE-RJ), v. 38, n. 017 (Parte I), p. 22, em 25 de janeiro de 2012. 5 Acordo firmado em 19 de fevereiro de 2014 entre os seus coordenadores e também entre as direções das Faculdades de Educação da Uerj e da UFMG, com aprovação da Congregação da unidade acadêmica no dia 10 de março deste mesmo ano.

Apresentação

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tação e funcionamento institucional e sociopolítico, organizada por Donaldo Bello de Souza, pauta-se pela análise dos resultados relativos a pesquisas acadêmicas teórico-empíricas que tenham enfocado os Conselhos Municipais de Educação (CMEs) no país, locus privilegiado da elaboração dos Planos Municipais de Educação (PMEs), o que implicou contemplar os problemas que marcam cerca de 291 desses órgãos colegiados em doze estados e no Distrito Federal, por intermédio de dez textos de autoria de renomados pesquisadores, obra publicada em 2013 por Edições Loyola. Na sequência, uma segunda coletânea visou à reflexão sobre o sentido e a implantação dos planos de educação no Brasil, problematizando, entre outros aspectos, o seu movimento de translação da esfera federal para a estadual e a municipal, assim como o papel do Estado, dos governos e da sociedade civil neste processo. Denominada Planos de educação no Brasil: planejamentos, políticas, práticas, a referida coletânea, sob organização de Donaldo Bello de Souza e Ângela Maria Martins6, veio a ser também publicada por Edições Loyola, em outubro de 2014, sendo composta por trabalhos de pesquisadores dos principais centros de pesquisa em educação do país. A trilogia se completa por meio da presente obra, agora organizada por Donaldo Bello de Souza, Marisa Ribeiro Teixeira Duarte e Rosimar de Fátima Oliveira, visando, conforme já destacado, à reflexão acerca das concepções, das tensões e dos desafios relacionados à implantação de sistemas educacionais nacionais e subnacionais. Aprecia, portanto, as relações político-institucionais entre poder central/nacional e local, suas mediações e contradições, quer na esfera de estados federados, como no caso brasileiro, quer no âmbito dos estados unitários, aqui exemplificados a partir do contexto francês e português. Contudo, a abordagem proporcionada à temática não se detém apenas no binômio central/nacional-local, mas, com igual vigor, projeta-se na direção das relações internas aos sistemas de ensino locais, buscando captar algumas das suas especificidades, assim como o papel que esses sistemas assumem na formulação e na implementação de políticas públicas locais de educação, quer por ressignificação daquelas emanadas pelo poder central/nacional, quer por autoria de políticas próprias, coesas às particularidades dos vários contextos que os marcam. Assim como nas duas coletâneas anteriores, esta obra se edifica por meio de trabalhos de reconhecidos autores que há muito se dedicam à reflexão e à pesquisa dessas questões, agora não apenas nacionais, mas internacionais. Assim, os catorze textos que compõem a obra encontram-se organizados segundo categorias temáticas definidoras de suas três partes fundamentais, a saber: sistemas nacionais de educação, sistemas estaduais de ensino e sistemas municipais de ensino que, ainda em alusão à fábula de La Fontaine, conotariam os três grandes vinhedos revolvidos e semeados pelas reflexões que expõem, respectivamente, em termos de suas concepções, suas tensões e seus desafios. A primeira parte reúne cinco estudos que, no seu conjunto, versam sobre as concepções presentes na constituição e no funcionamento dos Sistemas Nacionais de Educação 6 A investigação Os Planos Municipais de Educação (Brasil) e as Cartas Educativas Municipais (Portugal)… também vincula-se à pesquisa denominada “Planos Municipais de Educação: um estudo em regiões metropolitanas no Estado de São Paulo”, em execução pela Fundação Carlos Chagas (FCC), sob coordenação da Profa. Dra. Ângela Maria Martins.

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em arranjos unitário e federado de Estado. Inicia com o trabalho de Choukri Ben Ayed, intitulado “O Estado, a educação escolar e o território”, que, dialogando com a sociologia da educação francesa, nos conduz à reflexão para as emergências do “local” tanto nas análises contemporâneas quanto na governance das contradições presentes no sistema educacional unitário. Em sequência, Dora Maria Ramos Fonseca de Castro, ao retomar a história do sistema público da educação em Portugal, por meio do texto “O desenvolvimento do sistema educativo estatal em Portugal: um percurso marcado por regulações externas e pela centralização de poderes”, revela-nos que, apesar das fortes influências do exterior para que a gestão educativa se processe de forma mais descentralizada, o sistema educacional português continua fortemente regulado pelo poder central. O terceiro estudo, de Candido Alberto Gomes e Wellington Ferreira de Jesus, também recorre à história, porém com o objetivo de revelar como as lutas em torno da formação de repúblicas federativas na América Latina e nos Estados Unidos se fizeram mediante a construção de estruturas políticas que incorporaram os valores da Ilustração e das revoluções europeias do século XVIII, em contraste com a história da emergência do Estado brasileiro, questões consubstanciadas no trabalho intitulado “Estado nacional federativo e nova agenda para a educação: montar ou não o cavalo selado?”. A história do planejamento do Sistema Nacional de Educação e as formações discursivas que legitimam/legitimaram PNEs é o recurso epistemológico pelo qual Marisa Ribeiro Teixeira Duarte e Maria Rosimary Soares dos Santos, no texto “Planejamento da educação nacional no Brasil: da educação do povo à regulação do sistema federativo”, analisam as permanências e mudanças pretendidas no sistema educacional em diferentes contextos. Por fim, ao analisar as atuais iniciativas de avaliação educacional do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), na perspectiva da constituição de um sistema nacional de avaliação da educação básica, Alicia Bonamino, Naira da Costa Muylaert e Maria Océlia Mota, no texto “Avaliação nacional da educação básica e sistemas de ensino: quais as relações?”, atentam para a relevância política de priorizar uma nova ênfase no sistema nacional de avaliação, além da qualidade técnica, agora dirigida à tarefa de explorar e traduzir o potencial dessas informações para professores e gestores, na perspectiva concreta da melhoria da qualidade e da equidade da educação no país. Por seu turno, a segunda parte do livro, formada por quatro estudos, aborda algumas das principais tensões presentes no sistema estadual de ensino brasileiro, focalizando a sua gestão e os seus efeitos sobre o direito à educação básica por meio do atendimento ao ensino médio e ao ensino fundamental. O primeiro texto, “Aportes para análise dos sistemas estaduais de ensino: a contratualização da gestão”, escrito por Rosimar de Fátima Oliveira e Eldaronice Queiroz de Alvarenga, analisa os efeitos do modelo de contratualização da gestão sobre o princípio constitucional da gestão democrática do ensino público. Em seguida, o texto “Planos estaduais de educação: (des)vinculações com a gestão dos sistemas estaduais de ensino”, de Donaldo Bello de Souza e Janaína Specht da Silva Menezes, por meio de criteriosa análise documental, discorre sobre o planejamento da educação em nível estadual e sua relação com o planejamento nos níveis federal, municipal e das unidades de ensino. O terceiro trabalho, cuja autoria é de Rita de Cássia Oliveira e Beatriz de Basto Teixeira, discute a “Oferta Apresentação

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do ensino fundamental: ampliação, tensões e mudanças”, analisando as tensões entre a oferta e a demanda dessa etapa de ensino, a sua qualidade e a relação com o modelo federativo em curso, bem como problematizando o “lugar de passagem” ocupado pelo ensino fundamental na estrutura das políticas públicas de educação atuais. Finalizando essa segunda parte, o capítulo de Marise Ramos e Carlos Artexes Simões, intitulado “Ensino médio no Brasil dos anos 2000 e os sistemas estaduais de ensino: a difícil universalização de um direito”, aborda a história mais recente das políticas públicas para o ensino médio no Brasil, especificamente a partir da segunda metade dos idos de 1996, pela perspectiva do direito à educação, que parece se repetir em ciclos, segundo os autores, apresentando-se ora como tragédia, ora como farsa. A terceira parte desta obra, que reúne os seus últimos cinco textos, se volta para os desafios postos aos sistemas municipais de ensino no Brasil, evidenciando reflexões que, além de enfocar aspectos relacionados à sua gestão, também em escala metropolitana, apontam importantes questões acerca da oferta da primeira etapa da educação básica. Assim, o minucioso estudo de Marisa Timm Sari, denominado “Desafios à organização dos sistemas municipais de ensino no Brasil: elementos constitutivos, colaboração federativa e qualidade da educação”, apoiado tanto na revisão da literatura pertinente quanto no ordenamento jurídico e normativo correlato, de modo também didático, aclara-nos a respeito da institucionalização e do funcionamento desses sistemas locais no país. Em seguida, dois outros estudos situam a problemática dos sistemas municipais de ensino em termos da sua gestão metropolitana, por um lado remetendo à organização da educação básica em municípios pertencentes a três regiões metropolitanas (RMs) do estado de São Paulo — produção coletiva de Ângela Maria Martins, Cláudia Oliveira Pimenta, Cleiton de Oliveira, Pedro Ganzeli e Valéria Virgínia Lopes intitulada “A gestão de redes e sistemas municipais de ensino: dilemas na organização da educação básica” — e, por outro, enfocando alguns dos desafios postos aos sistemas municipais de ensino da RM do estado do Rio de Janeiro em face do acompanhamento e da avaliação dos seus respectivos Planos Municipais de Educação (PMEs) — trabalho sob autoria de Donaldo Bello de Souza e Alzira Batalha Alcântara intitulado “Acompanhamento e avaliação de planos municipais de educação metropolitanos: o protagonismo local dos sistemas de ensino”. Na sequência, Neusa Chaves Batista, por intermédio do estudo “Implementação municipal da política educacional PAR: tensões e contribuições para a autonomia e a gestão democrática dos sistemas municipais de ensino”, problematiza as complexas relações entre autonomia dos municípios e a gestão democrática dos seus sistemas, tomando por base indicadores do Plano de Ações Articuladas (PAR) relativos a uma amostra de municípios do estado do Rio Grande do Sul. O quinto e último trabalho desta terceira parte, de autoria de Sonia Kramer e Maria Fernanda Nunes, denominado “Condições, gestão, formação e identidade da educação infantil: desafios e recomendações para os sistemas municipais”, discute resultados de pesquisa longitudinal voltada para o diagnóstico da gestão pública em municípios do estado do Rio de Janeiro, articulada à oferta local da educação infantil. Conforme visto, trata-se de uma obra de fôlego, produto do esforço coletivo dos seus autores e organizadores ao longo de cerca de um ano e meio, que assumiu por 20

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tarefa distinguir contribuições para o debate relativo aos sistemas educacionais na atualidade brasileira, sob múltiplas dimensões analíticas e diferentes níveis de abordagem, movimentando-se, portanto, dos processos da sua coordenação nacional para a local, da sua macrorregulação para a microrregulação, da hegemonia da formulação de políticas educacionais no nível do poder central para a valorização do protagonismo local. Importante também destacar que esta coletânea, generosamente prefaciada por Carlos Roberto Jamil Cury — Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUCMinas) —, tem o seu valor reflexivo maximizado pelas importantes considerações que agrega, quer nesta primeira seção da obra, o que nos leva a registrar os nossos sinceros agradecimentos, quer no corpo da obra, já que a quase totalidade dos textos que a compõem encontra-se respaldada pelos meritórios estudos deste autor. Igualmente agradecidos ficamos em relação à prontidão com que Flávia Obino Corrêa Werle — Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) — se dispôs a apreciar a obra, cuja avaliação veio a traduzir-se no texto de apresentação das orelhas do livro, expressão de seu comprometimento e seu entusiasmo pela temática e, a um só tempo, de sua coragem intelectual e sua competência técnica em retratá-la por meio de tão poucas palavras. Nossos agradecimentos se estendem também a Márcia Angela Aguiar — então Presidenta da Associação Nacional de Política e Administração da Educação (Anpae) e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE) —, pesquisadora de larga experiência e flagrante reconhecimento público na área que, em atendimento à nossa solicitação, não se furtou a, sinteticamente, registrar suas dadivosas impressões sobre o sentido deste trabalho para a realidade dos sistemas nacional, estaduais e municipais de educação do país. Finalmente, cabe agradecer a Marcelo Perine, gestor editorial de Edições Loyola, e a sua competente equipe, que mais uma vez, sensível à problemática das políticas públicas e de gestão da educação no Brasil, avalizou a obra, comprometendo-se, nesta data, com sua breve publicação, conforme levou a efeito. E “Com a chegada do outono, as vinhas produzem mais que qualquer outra na região. Só então compreenderam que o pai lhes havia transmitido certa experiência: a felicidade não está no ouro, mas no trabalho”7.

Rio de Janeiro, setembro de 2014

Belo Horizonte, setembro de 2014

Donaldo Bello de Souza

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Marisa Ribeiro Teixeira Duarte Rosimar de Fátima Oliveira

Walter BENJAMIN, Experiência e pobreza, cit., p. 114. Apresentação

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