Os lírios do campo
150 contos cristãos
SALESIANOS EDITORA
Ficha técnica
Os lírios do campo - 150 contos cristãos
© 2014 Pedrosa Ferreira
Copyright desta edição:
© 2025 Salesianos Editora
Rua Duque de Palmela, 11
4000-373 Porto | Tel: 225 365 750 geral@editora.salesianos.pt www.editora.salesianos.pt
Capa: Paulo Santos
Imagem de Capa: Dreamstime.com
Paginação: João Cerqueira
1ª edição: 2014
3ª edição: Janeiro 2025
ISBN: 978-972-690-882-1
Depósito Legal.: 540901/24
Impressão e acabamento: Totem
Livro escrito ao abrigo do antigo acordo ortográfico
Reservados todos os direitos. Nos termos do Código do Direito de Autor, é expressamente proibida a reprodução total ou parcial desta obra por qualquer meio, incluindo a fotocópia e o tratamento informático, sem a autorização expressa dos titulares dos direitos.
Apresentação
Uma vez, dois peregrinos iam a caminho de uma cidade distante. Um deles, cansado de tantos quilómetros percorrer, pediu ao outro:
– Não me podias encurtar um pouco a estrada?
O companheiro, que não podia reduzir os quilómetros, lembrou-se então de lhe contar histórias interessantes.
O outro escutou-as com muito prazer e foi fazendo comentários. Ficou muito admirado, porque assim a estrada pareceu-lhe mais curta. Chegou contente à meta.
Publicamos estes cento e cinquenta contos para irmos lendo ao longo do nosso percurso pelos caminhos da vida.
Estes contos, belos como os lírios do campo, têm o perfume do Evangelho. Por isso, dizemos que são contos cristãos.
Conto 1
Um dom para ti
Numa lixeira abandonada cresceu um girassol que se fez amigo de um passarinho. A flor estava triste pois gostaria de viver num jardim. Por isso se interrogava: “Para que é que eu sirvo?” Mas o passarinho contemplava o girassol e dizia: “Como és belo!” O girassol, ao ouvir este elogio, ganhava ânimo para crescer no meio do lixo e sempre voltado para o sol.
Uma manhã, o passarinho não apareceu. Passados alguns dias, o girassol ouviu um pequeno gemido a seus pés. Inclinou-se e viu que o passarinho se arrastava com uma asa partida. Perguntou-lhe:
– Meu amigo, o que é que te aconteceu?
– Uma gaivota feriu-me e não tenho nada para comer. É o meu fim.
– Não, não. Espera um momento!
O girassol sacudiu com vigor a sua grande corola e uma chuva de sementes caiu no caminho. Depois disse:
– Come-as, minha amiga. Irão restaurar as tuas forças.
Passado algum tempo, a avezinha retomou o vigor e voltou a olhar para o girassol. Ficou muito surpreendido ao ver que ele tinha perdido toda a sua beleza. Muito triste, perguntou-lhe:
– O que é que te aconteceu, linda flor dourada?
– O meu tempo terminou. Mas desapareço feliz. Durante muito tempo, interroguei-me acerca das razões do meu viver. Agora percebi: fui um dom para ti, consegui que recuperasses as forças e continuasses a viver. E tu também foste um dom para mim, pois sempre me deste coragem. Come todas as sementes que quiseres, mas deixa algumas. Um dia, germinarão e certamente surgirá aqui um belo jardim.
O meu mandamento é este: amai-vos como Eu vos amei. Não existe maior amor do que dar a vida pelos amigos (Jo 15, 12).
Conto 2
A balança
Uma mulher pobremente vestida entrou numa loja e perguntou ao dono:
– Posso comprar e levar algumas coisas a crédito? Não tenho dinheiro. O meu marido está muito doente. Tenho seis crianças para alimentar.
O dono respondeu:
– Lamento muito, mas não posso vender a crédito. São normas da casa.
Porém, a mulher insistiu:
– Por favor! Pagar-lhe-ei logo que puder.
Ao lado, estava um cliente que ouviu a conversa. Disse ao dono:
– Eu encarrego-me de pagar aquilo de que ela necessita.
O dono, que conhecia esse bondoso cliente, disse então à mulher:
– Faça uma lista das compras.
Ela assim fez. Em seguida, disse-lhe:
– Ponha agora a lista num dos pratos da balança.
O dono ficou assombrado, ao ver que o prato da balança desceu até ao mais baixo e assim ficou.
Muito admirado, disse:
– Não posso acreditar! A lista pesa assim tanto?
O bondoso cliente observava e sorria. O dono, incrédulo, começou a pôr alimentos, cada vez em maior quantidade no outro prato, e a balança não se movia. Foi preciso colocar tudo aquilo de que necessitava a mulher, para equilibrar a balança.
O generoso cliente pegou no papel e leu. Não era uma lista de compras, mas uma oração que dizia: “Senhor, conheceis as minhas necessidades. Em Vós confio”. A mulher de fé agradeceu e saiu. O cliente entregou ao dono, pasmado, todo o valor da compra e despediu-se, feliz pela sua boa ação.
Deus está atento ao clamor dos pobres e escuta a sua oração. Para isso, serve-se de pessoas generosas.
Conto 3
Os saldos
Um dia, espalhou-se a notícia de que o diabo iria fazer uma renovação total do inferno. Por isso, tinha posto à venda todas as ferramentas até então utilizadas, e que serviam para tentar as pessoas.
Na noite da venda a saldo, lá estavam todas as ferramentas dispostas nas prateleiras: ódio, ciúme, infidelidade, soberba, avareza, luxúria, ira, gula, inveja, preguiça, injustiça, egoísmo. Estas são as ferramentas do mal.
O diabo queria vendê-las, a fim de fabricar ferramentas mais apropriadas para os tempos modernos. Precisava de material mais sofisticado, para apanhar muitas pessoas para o inferno.
Numa prateleira ao lado estava um instrumento de forma inofensiva, já muito gasto, como se tivesse sido usado muitas vezes e cujo preço era, contudo, o mais elevado de todos.
Alguém perguntou ao diabo:
– Qual é o nome dessa ferramenta?
Ele respondeu prontamente:
– Chama-se “desânimo”.
– E porquê um preço tão elevado?
O diabo respondeu:
– Porque este instrumento é mais útil que qualquer outro. Posso entrar na consciência de um ser humano, quando os outros falham. Depois de estar
dentro dele, por meio do desânimo, a pessoa deixa de ter força para fazer o bem. É isso de que eu gosto: pessoas que andam de braços caídos, sem audácia para fazer algo de bom. É o pecado da omissão. Tenho o inferno quase cheio de gente de boas intenções, mas sem ânimo para as realizar.
O desânimo é uma atitude diabólica, que consiste em baixar os braços e não lutar pela vitória da paz e do bem.
Conto 4
A gota de água
Era uma vez uma nuvem formada de muitas pequenas gotas de água, que dançava no céu numa manhã de Primavera. Uma gota de água disse à outra:
– Queres saltar comigo lá para baixo?
Ela respondeu:
– Não tenho medo de saltar para a terra, mas hoje não quero.
A gota de água explicou melhor:
– Convidei-te, porque não quero ir sozinha. Sozinhas, não somos nada. Mas, todas juntas, conseguiremos uma boa chuva.
Porém, a segunda gota replicou:
– Que tolice, todas juntas! Eu posso lançar-me sozinha e brilhar formosa como o sol. E é já!
A gota juntou as mãos e, sozinha, lançou-se de cabeça no vazio em direção ao solo. A gota chegou à terra sequiosa e nem sequer conseguiu molhar a pétala de uma flor. Entretanto, lá do alto dos céus, as gotas disseram:
– Nós iremos todas juntas. Uma, duas, três, agora!
Saltaram todas juntas ao mesmo tempo. Que chuva tão benéfica! A terra ficou colorida de verde e as flores sorriram. Os camponeses ficaram felizes.
As gotinhas procuraram depois a sua irmã, a que quis fazer a chuva sozinha, e não a encontraram.
Perguntaram à terra se a tinham visto. Ela respondeu:
– Vimos uma gotinha louca que caiu e morreu.
Não serviu para nada. Pelo contrário, vós, todas juntas, tornastes possível a chuva tão aguardada, que trouxe imensa alegria a toda a gente. A Primavera pode continuar a florir.
Sozinhos, não conseguiremos fazer nada. Todos juntos, teremos o mundo na mão e poderemos fazer maravilhas.
Conto 5
A teia de aranha
Uma vez, um homem estava a ser perseguido por inimigos, que o queriam matar. Foi então esconder-se numa gruta escavada nas montanhas. Os inimigos começaram a procurá-lo nas proximidades, a ver se o encontravam. O pobre homem estava tão desesperado, que se ajoelhou e fez a Deus a seguinte oração:
– Deus todo-poderoso, envia os teus anjos para que desçam à terra e fechem a entrada desta gruta. Mostra o teu amor.
Nesse momento, viu aparecer uma aranha à entrada da gruta. Esta começou a tecer lentamente uma teia. O homem, angustiado, rezou de novo: – Senhor, eu pedi que enviasses anjos e não uma aranha. Por favor, com a tua mão poderosa, coloca um muro forte à entrada, para que os meus inimigos não possam entrar e eu salve a vida.
Esperou que a sua oração fosse escutada, mas viu apenas que a aranha continuava a tecer a sua teia. Os inimigos já se aproximavam da gruta e este resignou-se a esperar pela morte. Quando os inimigos chegaram à entrada da gruta, já a aranha tinha tecido uma grande teia que cobria toda a entrada. Lá dentro, o homem ouviu um dos seus inimigos a dizer:
– Vamos, entremos nesta gruta!
Um outro, que devia ser o chefe, disse:
– Não vês que tem uma teia de aranha? Ninguém entrou aqui dentro. Sigamos adiante.
O homem, feliz, fez então uma oração de agradecimento a Deus que, de uma forma simples, o livrou da morte. Percebeu que Deus se tinha servido de uma forma desconcertante para o salvar da mão dos inimigos.
Na dificuldade, o crente fala com Deus de amigo para amigo, na certeza de que ele escutará a sua oração.
Conto 6
Os sapatos
Era um dia frio de Inverno numa grande cidade.
Uma criança de 10 anos parou diante de uma sapataria. Estava descalça e olhava para a montra, tremendo de frio.
Uma bondosa senhora aproximou-se dele e perguntou-lhe:
– Como te chamas?
– Sou o Jaime.
A mulher, impressionada por o ver descalço, continuou:
– Meu amigo, por que é que estás a olhar com tanta atenção para a montra?
– Estava a pedir a Deus que me desse um par de sapatos.
A senhora pegou-lhe pela mão, e entraram na loja. Ela disse ao dono:
– Esta criança é minha amiga. Precisa de um par de sapatos ao seu gosto.
Vieram os sapatos mais variados em caixas, que se foram abrindo.
A mulher pediu ao dono:
– Antes dela começar a calçá-los, pode trazer-me uma bacia com água e uma toalha.
A bondosa mulher, num lugar reservado, lavou os pés à criança, e enxugou-os com a toalha. Tendo a criança os pés limpos, a senhora ajudou-a a experimentar o melhor par de sapatos. No final, acariciando-a, exclamou:
– Jaime, sem dúvida que te sentes melhor com estes sapatos!
Enquanto se despediam, a criança, com lágrimas de alegria nos olhos por tão belo gesto de amor dessa desconhecida, perguntou-lhe:
– A senhora é a esposa de Deus?
Deus é Amor. Ele torna-se visível em todas as pessoas de bom coração, que amam os pobres e abandonados.
Conto 7
As sementes
Era uma vez um rei que tinha três filhos. Quando chegou o momento de escolher o seu sucessor, chamou-os à sua presença e entregou a cada um pequeno saco de sementes. E disse-lhes:
– Vou partir para uma longa viagem. Não sei quanto tempo estarei ausente. Cada um de vós faça das sementes que vos entrego aquilo que achar melhor. No final, escolherei quem será o meu sucessor.
O rei despediu-se deles e partiu para longe.
O primeiro filho fechou as sementes num cofre a sete chaves, esperando devolver ao pai as sementes tal como as tinha recebido.
O segundo filho pensou: “Se eu guardar as sementes, elas podem apodrecer. O melhor é eu ir à feira vendê-las e guardar o dinheiro. Quando o meu pai regressar, irei comprar sementes novas, que serão melhores que as primeiras”. E assim fez.
O terceiro filho semeou todas as sementes no jardim. Delas nasceram lindas plantas, que se cobriram de flores.
Quando o rei regressou, foi ter com os filhos. O primeiro abriu o cofre. Dentro estavam as sementes apodrecidas.
O pai repreendeu-o, dizendo:
– Estas sementes não servem para nada.
O segundo filho correu para o mercado e trouxe novas sementes. O pai disse-lhe:
– Perdeste tempo, pois não as semeaste no momento oportuno.
O terceiro filho levou-o ao jardim e mostrou-lhe toda a beleza das plantas floridas e de suave aroma.
O pai, felicitando-o, disse-lhe:
– Tu serás o meu sucessor.
Cada pessoa, ao longo da vida, deve fazer frutificar as suas qualidades, deixando no final o mundo mais bonito.
Conto 8
O coelho
Era uma vez um macaco, uma raposa e um coelho. Viviam juntos como bons amigos. Durante o dia, divertiam-se nos campos e vales. À noite, regressavam ao monte. Assim se passaram vários anos.
Um dia, Deus ouviu falar da harmonia que existia entre eles. Querendo comprovar com os seus olhos esta convivência pacífica, disfarçou-se de velho vagabundo e desceu ao mundo.
Aproximou-se daquelas terras e disse-lhes:
– Viajei por montes e vales. Estou muito cansado. Podeis dar-me alguma coisa para comer?
Sentou-se para descansar. O macaco correu imediatamente a buscar frutos caídos das árvores e
deu-lhos. A raposa, generosa, ofereceu-lhe os peixes que pescara no rio. O coelho correu por todos os lados e não conseguiu trazer nada. Deus, o velho vagabundo, continuou o seu caminho.
Quando os três animais regressaram ao monte, o macaco e a raposa riam-se do coelho e diziam:
– Tu não serves para nada!
O coelho ficou muito triste e pensativo. Passado pouco tempo, o velho vagabundo passou de novo por ali, e pediu ao macaco que fosse recolher lenha e à raposa que acendesse uma fogueira. Eles assim fizeram.
Então o coelho chamou o velho vagabundo e disse-lhe:
– Come-me, por favor.
E atirando-se para a fogueira, ofereceu-lhe a sua vida.
Como era Deus, esse desconhecido restituiu a vida ao coelho e levou-o consigo para o Céu.
Não há maior amor do que dar a vida pelos outros. Foi este o exemplo que Jesus deixou aos seus seguidores.