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LITERATURA NEGRA E MARGINAL/PERIFÉRICA: IDEIAS E PROBLEMAS

Temos, com a Frente Negra, o ponto alto dos movimentos, reivindicações e presença do negro na sociedade brasileira, entrando em declínio em 1937, não mais recuperando sua força anterior. […] A Frente Negra Brasileira tinha objetivos e metas a serem atingidos; seu objetivo primordial era a ascensão social do negro, e para tanto [as] metas seriam: estímulo para estudar, trabalhar, ter casa própria e progredir. Com este intuito, sempre presente, eram feitas as domingueiras, tendo por finalidade educar e conscientizar os negros. Nesta ocasião, eram ministradas aulas de higiene e puericultura, aulas de religião e catecismo, conferências sobre filatelia; as poesias de Luiz Gama eram comentadas, bem como as datas nacionais. Também foram feitas campanhas para que os negros depositassem seus salários na Caixa Econômica a fim de possibilitar aquisição de casa própria. […] Assim, os negros começaram na prática a sua ascensão social, conforme depoimento de Pedro Paulo Barbosa: ‘E muitos negros começaram a comprar terrenos na periferia: São Judas, São Mateus, Barra Funda, Freguesia do Ó, Bairro do Limão, Cantareira. E todos eram pobres, viviam de salário. Assim, nosso movimento agiu de baixo para cima. Nosso movimento formou padres, vários professores, políticos, dentistas, todos negros’.” Ibid., p. 62-7.

75 “Com a volta ao regime democrático em 1945, inicia-se o terceiro período da imprensa negra. O que diferencia este dos dois anteriores é a situação política geral, que, de certa maneira, reflete-se nos jornais negros. Temos a propaganda política aberta e o apoio a candidaturas tanto de negros quanto de brancos. Isto seria o reflexo ou decorrência da formação de outros partidos políticos da sociedade brasileira. Partido Social Democrático (PSD), o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), a União Democrática Nacional (UDN), o Partido Social Progressista (PSP), a legalização do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o Partido Socialista Brasileiro (PSB), o Partido Social Trabalhista (PST), o Partido de Representação Popular (PRP) e outros. […] A Frente Negra Brasileira tenta rearticular-se como partido político, funda-se a Associação do Negro Brasileiro (ANB) e é realizada a Convenção Nacional do Negro. Como aponta Roger Bastide, ‘o ponto de vista dos jovens de esquerda parece agora prevalecer-se’ […] Sinal de amadurecimento foi a fundação da Associação dos Negros Brasileiros, que fez uma revisão dos erros anteriormente cometidos, no sentido de uma autocrítica, e se apresenta como a saída possível para o negro. Assim, no jornal ‘Alvorada’, de 1945, os artigos, de modo geral, têm uma finalidade: mostrar aos negros os objetivos e a importância da ANB, criada para que os negros não se dispersassem […].” Ibid., p. 141-2.

76 Entrevista concedida a Mário Augusto M. da Silva em 29 jul. 2007, em São Paulo.

77 Esses aspectos de marginalidade se estendem também ao samba. Apenas para pinçar dois exemplos, em São Paulo, que se cruzam com a argumentação desenvolvida até aqui: Geraldo Filme, importante sambista paulistano, participou do Teatro Popular, de Solano Trindade, nos anos 1960. B. Lôbo, sambista carioca radicado na capital paulista, escreve letra de samba para Carolina Maria de Jesus, publicando-a na revista Níger.

78 Cf. Quilombo: vida, problemas e aspirações do negro, São Paulo: Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo; Editora 34, 2003. Trata-se da edição fac-similar do jornal dirigido por Abdias do Nascimento entre 1948 e 1950, com apresentação do próprio e de Elisa Larkin do Nascimento, bem como introdução de Antonio Sérgio A. Guimarães. Para se ter uma ideia de sua amplitude, veja-se um excerto da introdução: “congregava […] gente da envergadura de Guerreiro Ramos, Ironides Rodrigues, Edison Carneiro, Solano Trindade; ou do quilate de Nelson Rodrigues, Rachel de Queiroz, Gilberto Freyre, Arthur Ramos, Murilo Mendes, Carlos Drummond de Andrade, Péricles Leal, Orígenes Lessa, Roger Bastide, para ficar nos maiores. O Quilombo publicou também intelectuais estrangeiros, como George Schuyler (jornalista do Pittsburgh Courier ), o argentino Efraim Tomás Bó, Estanislau

Fischlowitz, Paul Vanorden Shaw e Ralph Bunche; mantendo-se em sintonia com o que acontecia em Paris, Nova York ou Chicago, traduziu e deu a conhecer o texto ‘Orpheu Negro’, de Jean-Paul Sartre, entrevistou Albert Camus, reproduziu artigos do The Crisis, o jornal dirigido por

[W.E.B.] Du Bois em Nova York; manteve contato regular com a equipe do Présence Africaine” (p. 11).

79 Mendes, 1993, op. cit

80 David Brookshaw, Quatro poetas negros brasileiros, Estudos Afro-Asiáticos, ano 1, n. 2, 1978, p. 32. De acordo com o autor, o poema de Lino Guedes foi publicado em Urucungo, São Paulo: Coleção

Hendi, 1936.

81 Como afirma José Correia Leite: “[…]

Era um negro isolado. Foi na época o único negro a publicar livros de poemas. […] O Lino Guedes nem sempre agradava o meio negro com o trabalho literário dele. A poesia. A poesia social não estava ainda em voga. Só veio mais tarde com traduções (feitas por Sérgio Milliet, Guilherme de Almeida…) dos primeiros poetas negros da América do Norte, como por exemplo Langston Hughes. Aí começaram as pessoas a perceber que era possível se fazer poesia de sentido social, com denúncias, reivindicações e clamor contra certas injustiças. Mas isso apareceu mais tarde. No tempo em que Lino Guedes publicava, os negros faziam poesia como Olavo Bilac”. Cf. Leite e Cuti, 1992, op. cit., p. 38. Ponderei melhor essa argumentação no artigo: Rastros do Cisne Preto: Lino Guedes, um escritor negro pelos jornais (1913-1969), Estudos Históricos, v. 30, n. 62, 2017. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/ index.php/reh/article/view/69143/70173. Acesso em: 3 set. 2022.

82 Eduardo de Oliveira, A presença do negro na literatura brasileira, Estudos Afro-Asiáticos, n. 8-9, 1983, p. 205-14.

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