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LITERATURA NEGRA E MARGINAL/PERIFÉRICA: IDEIAS E PROBLEMAS

108 Sônia F. Conceição, Ser negro, povo, gente: situação de urgência, em: Quilombhoje (org.), 1985, op. cit..

109 I Encontro de Poetas e Ficcionistas Negros Brasileiros (org.), Simplesmente Histórico, em: Criação crioula, nu elefante branco, São Paulo: Imesp, 1987, p. 5. A Comissão ainda lembra que num “clima de bastante discussão, ficou de consenso a escolha de dois temas básicos: 1) Intervenção dos poetas e ficcionistas negros no processo de participação política; 2) Avaliação crítica da produção literária dos últimos dez anos […]. Igualmente, de maneira polêmica, definiu-se o caráter político e ideológico do Encontro, o qual deveria ser efetuado de forma autônoma e independente, isto é, sem verbas oriundas do poder público ou privado (aspecto este que também serviu para explicar a dissidência anteriormente citada)” (p. 6, grifos meus). A dissidência a que se refere a comissão é a de um escritor, Abelardo Rodrigues, que não concordava com os termos do encontro.

110 “[Cuti]: […] É importante notar como o editor branco raciocina sobre a nossa produção. No texto, ele [Oliveira Silveira] aborda a insegurança deste editor em relação à compra, ao mercado. Lembro um texto do Semog que falava ser o editor branco no mínimo burro de não estar investindo na gente. Agora, a preocupação que o Oliveira apresenta da nossa concorrência possível – daqui [a] alguns anos, para os editores – porque estamos abrindo mercado e amanhã este mercado será tirado de nossas mãos – é uma preo- cupação séria, mas que não diz respeito muito profundamente a escritores, mas a possíveis e prováveis editores negros”

[Kilamba]: “A ideia que o editor tem é que o nosso produto só serve a nível de consumo na comunidade negra […] A nossa dificuldade de escritores negros é que temos de pagar 400 mil cruzeiros para colocar dois contos numa coletânea e sair vendendo de mão em mão para poder ressarcir o dinheiro empregado, para custear mais alguma coisa e publicar novamente neste processo”. Ibid., p. 12-3.

111 “[Arnaldo Xavier]: O Semog falou que a função primeira é ensinar o pessoal a ler. Tem 50 milhões de negros analfabetos no país. Então é barra. A quem estão dirigidos estes textos? Qual o retorno disto?” “[Cuti]: Quando o Semog levanta o problema do analfabetismo, não é problema do escritor. O escritor não tem nada a ver com isto. Não posso me imaginar escrevendo para analfabetos. É o educador que deve se preocupar com o problema da aprendizagem. O escritor deve se preocupar em produzir, colocar este povo que não sabe ler dentro do seu texto. O escritor não deve estar se propondo pegar uma série de funções: editor, vendedor etc. […] Não temos a obrigação de fazer com que o pessoal saiba ler, mas criar uma forma para que nosso trabalho chegue a eles.” Ibid., p. 15 e 17, respectivamente (grifos meus).

112 “[Miriam Alves]: […] Acredito que a literatura, o poema, a ficção, não irão fazer revolução. A literatura é a própria revolução, tem frente de batalha e de atuação.”

“[ Éle Semog ]: Estamos passando por um processo de reflexão intensa sobre a questão do partido. Partido não é o caminho para esta questão de transformação social. Agora, com relação à literatura, me soa tão anos [19]68, 69, 70. Isto de associar livro a fuzil foi uma experiência feita numa escala razoavelmente significativa. Temos de procurar outro discurso. […] Se pretendemos uma transformação social através da literatura, podemos tirar o cavalinho da chuva, é uma coisa a longo prazo. Longo prazo mesmo! Falo em 20, 30 anos, tranquilo. Fazer transformação social através de literatura… […] Pra mim a literatura tem uma função, o fuzil tem outra”. Ibid., p. 14.

113 “[Hermógenes]: Faço uma proposta aos companheiros de que o resultado deste Encontro seja enviado para todas as entidades ligadas ao ensino, à educação, a começar pelos irmãos negros como Carlos Moura, que está agora na Assessoria para Assunto[s] Afro-Brasileiro[s] do Ministério da Cultura, assim como ao próprio Marco Maciel, ministro da Educação, no sentido de que eles tomem conhecimento. Isto falando das autoridades a nível federal, proponho também o envio para os secretários de Educação das principais cidades brasileiras. Se pretendemos introduzir poesia negra no currículo, temos que fazer chegar as questões polêmicas ao conhecimento público. Faço esta proposta para ver concretizados todos os nossos objetivos” “[Ari Cândido]: Se a gente entrega o material para o Estado, tem que haver formas de negociação […] Tem que haver condições. Não devemos entregar coletâneas de poemas para edição, sem saber a distribuição econômica disto. […] O Estado não pode pegar de graça.” Ibid., p. 21.

114 “[Márcio Barbosa]: Sabemos o sufoco que é fazer livros e Cadernos Negros. Infelizmente fazemos de fim de semana. É preciso admitir isto. Vivemos a coisa diariamente, mas trabalhamos em fins de semana, em tempo livre. É a questão que o grupo Negrícia tem colocado aqui: ninguém é remunerado para isto. Não existe profissionalismo para fazer isto.”

“[ Oubi ]: Um dos grandes problemas que estamos enfrentando é o papo da divulgação […] Penso como poderíamos fazer para agilizarmos a informação do nosso trabalho […] Precisamos urgentemente criar um esquema de divulgação, passar durante um período fazendo aviso sobre o livro em todos os locais de concentração do nosso pessoal, para que o livro não seja consumido por uma pequena parcela que chamo a nata da ralé negra”. “[Kilamba]: Concordo com a Miriam, quando diz que nós estamos nadando neste rio, mas sem rumo. Vamos dizer que este rio é a indústria cultural existente. Nesses termos, estamos sem rumo porque não fazemos parte dela. Com relação a ela, somos marginais, uma literatura marginal. [ Cuti ]: Estamos criando os rumos. Discordo do Kilamba. Nós não somos purinhos e não podemos continuar com esta ideia [de] que somos negrinhos purinhos.” Ibid., p. 23-4 e 26, respectivamente.

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