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Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil?

lucia bastos p. neves

Independência

1. O projeto foi de Eliseu Visconti. Neste selo, à esquerda aparece o retrato de d. Pedro i. Entre ele e José Bonifácio de Andrada e Silva, o Cruzeiro do Sul, à direita o presidente da República Epitácio Pessoa. Ao centro, uma figura feminina coroa com uma mão Epitácio Pessoa e, na outra, há o escudo com o valor do selo. Disponível em https:// eliseuvisconti.com.br/obra/a822/. Acesso em 14 out. 2022.

Independência: Memória e Historiografia

Em 7 de setembro de 1922, quando a Independência do Brasil completou 100 anos de existência, a narrativa da história de sua construção ainda se voltava essencialmente para o estudo dos fatos e das grandes personagens que haviam realizado esse processo. Inúmeros festejos e comemorações foram realizados, sempre em caráter oficial, provocando, portanto, desconfiança por parte da historiografia posterior. Artigos de jornais e escritos de divulgação também exaltavam os grandes heróis do feito. Regra geral, não havia novidades que trouxessem inquietações ao historiador para outras abordagens acerca do fato, considerado, por muitos, como o marco fundador da nacionalidade brasileira2.

Na produção historiográfica, coube a Manuel de Oliveira Lima, em 1922, publicar uma das obras fundamentais a fim de explicar o processo – O Movimento da Independência – iniciado pelo regresso de d. João e “as causas e efeitos da Revolução Portuguesa de 1820”, e finalizado com a coroação de d. Pedro e as intrigas e tramas entre os grupos de José Bonifácio e de Gonçalves Ledo3. Utilizando uma narrativa minuciosa e erudita e pautando-se em rigorosa crítica documental de fontes ainda inexploradas, como documentos de arquivos estrangeiros, cartas trocadas entre d. Pedro e seu pai, relatos de viajantes, periódicos e panfletos, Oliveira Lima inovou ao procurar apresentar uma visão processual da Independência, em que estruturas e acontecimentos mesclavam-se4. Malgré tout, os indivíduos não deixavam de se fazer presentes como os grandes responsáveis pela Independência.

Ainda, posteriormente, trabalhos clássicos, como o de Otávio Tarquínio de Sousa, trilhavam o caminho da historiografia do oitocentos, revelando, em certa medida, o papel adquirido por uma personagem fundamental no mundo contemporâneo: o indivíduo.

2. Para o estudo das comemorações dos 100 anos da Independência, ver, especialmente, Marly Silva da Motta, A Nação Faz 100 Anos: A Questão Nacional no Centenário da Independência, Rio de Janeiro, Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1992.

3. O Movimento da Independência, 1821-1822, São Paulo, Melhoramentos, 1922, ver capítulos i e xxi. A obra foi criticada em vários aspectos, à época, por Capistrano de Abreu, Correspondência de Capistrano de Abreu, Rio de Janeiro/Brasília, Civilização Brasileira/inl, 1977, vol. 2, Carta de 3 de agosto de 1922. No sesquicentenário também mereceu a crítica de José Honório Rodrigues, Independência: Revolução e Contrarrevolução: As Forças Armadas, Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora s.a., 1975, p. 16.

4. Para a análise da escrita da história em Oliveira Lima, cf. Eduardo Luis Flach Käfer, Entre Memória e História: A Historiografia da Independência nos Cem Anos de Emancipação, Dissertação de Mestrado apresentada no Programa de Pós-graduação em História na puc-rs, 2016. Disponível em: http://tede2.pucrs.br/tede2/handle/tede/6978. Acesso em: 30 jan. 2020. Cf. também: Lucia Bastos P. Neves, “Oliveira Lima e o Império do Brasil: Uma Nova Narrativa”, em André Heráclio do Rêgo, Lucia Bastos P. Neves e Lucia Maria Paschoal Guimarães (orgs.), Oliveira Lima e a Longa História da Independência, São Paulo, Alameda Casa Editorial, 2021, pp. 165-188.

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No ritual dos sucessos políticos brasileiros da época faltava ainda parte essencial: a consagração no recinto do teatro. E à noite lá esteve o imperador, saudado por vivas estrondosos. [...] “Numerosas composições” de poetas improvisados antecederam ao principal da noite – um elogio dramático, uma cantata de Troncarelli, o drama Independência de Escócia. [...] Programa vasto, a que não faltou “um novo hino patriótico, que a todos agradou, ainda mais pelo entusiasmo que inspiraram as letras do que pela sua harmoniosa música”. [...] No dia seguinte prosseguiram as festas. Salvas de artilharia logo de madrugada lembraram aos fluminenses que tinham um imperador constitucional, e este, ainda debaixo da comoção da véspera, quis louvar a Deus, pedir suas graças. Às onze horas deixava o Paço da Boa Vista para o da cidade e de lá se encaminhava para a Capela Imperial, onde o bispo capelão-mor e todo o cabido, paramentados com magnificência o esperavam. [...] celebrou-se missa pontifical, ouvindo-se no curso desta a “música do insigne herói a quem a natureza prodigalizou todos os talentos”. Quem poderia ser esse herói senão d. Pedro?5

A longa transcrição acima demonstra o caráter laudatório da obra de Tarquínio de Sousa em relação à personagem que considerava como central no processo da Independência do Brasil: Pedro i.

Sem dúvida, alguns avanços se fizeram. Em 1972, no sesquicentenário da Independência, José Honório Rodrigues trouxe à luz a participação de atores de menor importância – o homem comum – nesse processo, mas ainda pouco avançou nesse sentido6. Foi preciso esperar a renovação de uma historiografia do final do século xx que forneceu pistas inovadoras em relação ao processo de separação entre Brasil e Portugal, mas, que ainda não se debruçou de maneira profunda sobre aqueles que permaneceram na sombra, embora estes tenham lutado e interferido de algum modo nos rumos da cisão. Tais estudos abriram novas perspectivas para se analisar o papel das camadas médias e populares ao longo desses anos. Mas muito ainda é necessário se fazer.

Há conhecimento que “eles” – escravos, libertos, homens pobres, mulheres livres, brancos ou mestiços, indígenas, homens e mulheres das camadas médias – estiveram presentes no processo de separação do Brasil. Ainda é, contudo, bastante difícil compreender como essa presença se efetivou nas práticas políticas. Um primeiro problema é a escassez de fontes produzidas por esses atores. Regra geral eram iletrados,

5. Otávio Tarquínio de Sousa, A Vida de d. Pedro i, [1952], Brasília, Senado Federal, Conselho Editorial, 2015, tomo 2, pp. 426-428.

6. José Honório Rodrigues, Independência: Revolução e Contrarrevolução, Rio de Janeiro, Livraria Francisco Alves Editora S. A., 1975, vol. 5. Outro trabalho de fundamental importância que veio à luz naquela época foi: Carlos Guilherme Mota (org.), 1822: Dimensões, São Paulo, Perspectiva, 1972.

Independência: Memória e Historiografia embora travassem conhecimento com a cultura letrada por meio da oralidade7, o que muitas vezes levou o historiador a aceitar uma certa inércia dessas camadas populares, cabendo apenas às elites o papel de protagonistas no processo. Além disso, há documentos que foram produzidos pelas camadas ilustradas ou pelas autoridades locais, que preocupadas com qualquer levante ou movimentação que viesse das ruas, ampliavam o teor das mensagens, exagerando a possibilidade de motins ou revoltas. Apesar destes fatores e mesmo que nem sempre seus projetos tenham culminado em uma vitória, esses anônimos e esquecidos precisam ser apreendidos, pois suas ações indicam tensões em um processo repleto de incertezas e de possibilidades. É necessário também observar que nem sempre tais documentos apresentavam como objetivo final a independência do Brasil em si, especialmente em uma sociedade multifacetada, em que mais de 30 por cento da população era escravizada, e em que a população livre de cor era a faixa da população que mais crescia8. Esse trabalho procura apontar outras formas de abordar a Independência do Brasil, para além de seus grandes vultos e heróis, bastante conhecidos e analisados pela historiografia do oitocentos e mesmo do século xx. Objetiva-se, portanto, trazer à tona personagens comuns ou anônimos que mediante suas ideias e práticas políticas também apresentaram projetos distintos de se construir as Independências do Brasil. Por outras linguagens distintas daquelas das elites que comandaram o processo, forneceram argumentos e percepções que possuíam sobre o momento histórico que vivenciaram, emprestando outros significados ao conceito de Independência9. Por conseguinte, nas proximidades dos duzentos anos desse processo, cabe não apenas comemorar ou relembrar fatos que fornecem um discurso político que pode “constituir uma memória nacional”, nas palavras de Pollack10. Torna-se necessário alargar o campo de análise e repensar o processo que não se circunscreve ao Sete de Setembro e ao consagrado Grito do Ipiranga, reconstruindo por meio de uma trama coerente, a Independência, voltada não apenas em suas fronteiras, mas em um diálogo, que encontra no Atlântico o ponto de união de suas ideias e ações11.

7. Cf. Lucia Bastos P. Neves, Corcundas e Constitucionais. A Cultura Política da Independência (1820-1823), Rio de Janeiro, Faperj/Revan, 2003, pp. 103-104.

8. Hendrik Kraay, “Slaves, Indians, and the “Classes of Color: Popular Participation in Brazilian Independence”, em Willem Klooster (org.), The Cambridge History of the Age of Atlantic Revolution, Cambridge, Cambridge University Press, no prelo.

9. Javier Fernández Sebastián, Diccionario Político y Social del Mundo Iberoamericano, La Era de las Revoluciones, 1750-1850, Madrid, Fundación Carolina, Sociedad Estatal de Conmemoraciones Culturales, Centro de Estudios Políticos, 2009, pp. 25-48.

10. Michael Pollack, “Mémoire, Oublie, Silence”, Une Identité Blessée, Paris, Métailié, 1993, pp. 28-29.

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Novos Instrumentos e Espaços da Política: Os Escritos de Circunstâncias, as Ruas, as Praças Públicas, as Petições e as Listas Eleitorais

Às armas Cidadãos. É tempo Às Armas

Nem um momento mais, perder deveis

Se à força da razão, os Reis não cedem

Das armas ao [sic] poder cedam os reis12

Dis o Pagoni que hade por sobrescriptos na testa dos Independentes, cada um deles esta cagando huma poia de merda para lhe cobrir a calva, e as sobras para lhe untar nos bigodes e a seos companheiros bigodistas13 .

Assim proclamavam dois panfletos manuscritos, colados nas paredes e nos postes das ruas de cidades brasileiras entre os anos de 1820 e 1824, quando a política ganhava as ruas e as praças públicas, demonstrando um clima agitado pela constitucionalização e pelas independências do Brasil. O primeiro, encontrado na cidade do Rio de Janeiro, incitava o povo a aderir ao movimento constitucionalista português. Utilizando-se de uma retórica que lembrava aquela dos textos da Revolução Francesa de 1789 – Citoyens! Aux armes! – ainda que não refletisse o mesmo clima, pois o objetivo não consistia em destronar a dinastia reinante – a de Bragança – apenas desejava-se quebrar os grilhões do despotismo, que, há tanto tempo, julgava-se, oprimiam os luso-brasileiros. Refletia, assim, o clima do ano de 1821 – aquele do constitucionalismo e das ideias liberais. O segundo, presente nas ruas do Maranhão, datado provavelmente de 1823, indicava a indignação dos grupos contrários à união com o Rio de Janeiro – os indepen- dentistas – e demonstrava uma outra postura em relação à Independência realizada no Sudeste, sob a égide de d. Pedro.

11. Jeremy Aldeman, Sovereignty and Revolution in the Iberian Atlantic, Princeton, Princeton University Press, 2006.

12. Arquivo Histórico do Itamaraty, Rio de Janeiro, Lata 195, maço 6, pasta 13. Transcrito em José Murilo de Carvalho, Lucia Bastos P. Neves e Marcello Basile, Às Armas Cidadãos Panfletos Manuscritos da Independência do Brasil (1820-1823), São Paulo/Belo Horizonte, Companhia das Letras/Fapemig/Editora ufmg, 2012, pp. 126-128.

13. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos, 27 A, M4A, G – 2, E – 11. Documentos enviados à Junta do Governo da província do Maranhão, contendo pasquins alusivos à Independência, 1822-1823.

Todos eram anônimos, em especial por sua linguagem mais enfática e virulenta do que os panfletos políticos impressos, motivados, sem dúvida, por uma censura que ainda assombrava o Reino/Império do Brasil.

Era o tempo convulsivo das revoluções liberais iberoamericanas que afluíram nos movimentos de independência. Tais conflitos, iniciados em 1820 no chamado triênio liberal, do qual a Revolução de 1820 é resultante, bem como o movimento constitucionalista de 1821 no Reino do Brasil, criaram as condições para os primeiros ensaios de uma relativa liberdade de imprensa, exercida em espaços públicos cada vez mais amplos e que se propagavam por toda as províncias do norte ao centro-sul da antiga América portuguesa. Seus diálogos atravessaram ainda, inúmeras vezes, o Atlântico, numa espécie de conversas estridentes entre o Brasil e a antiga metrópole. Instituía-se, por conseguinte, uma nova maneira de fazer política, uma vez que esta ganhava, de um lado, as ruas, as praças públicas, as casas de pasto e, de outro, os salões, as sociedades secretas e as tipografias. Eram anos de crise e movimentação política.

Desses acontecimentos inéditos surgiu uma espantosa quantidade de jornais e panfletos, contendo vocabulários, palavras e conceitos ressignificados, que utilizados pelos atores da época, traduziam, de alguma forma, uma época de mudanças e revoluções. Igualmente, uma nova prática política – aquela do uso de requerimentos, petições, cartas e memórias, escritas por camadas médias, não só pelos homens, mas também pelo belo sexo, permitem identificar argumentos e percepções que esse grupo, mantido, muitas vezes, fora do direito de cidadania, possuía sobre a moderna política daquele momento na passagem para o Império no Brasil14

Um ponto fundamental para esse novo olhar sobre as Independências é trazer à tona esta documentação rica, em sua maioria inédita ou pouco explorada pelas pesquisas históricas sobre o período. Esse material constitui a história de um tempo, pois os fatos e personagens que aí se encontram narrados podem ser vistos como registros com que os historiadores elaboram a reconstrução de um momento do passado. Como escrevia o redator do jornal O Conciliador do Maranhão, em abril de 1821: “Os grandes acontecimentos políticos das Nações devendo algum dia entrar nas páginas da História, precisam ser minutados por testemunhas contemporâneas e desinteressadas, a fim de que a posteridade possa avaliar o mérito, ou demérito dos seus cooperadores”. Assim, os jornais serviam de “mediadores entre os governos e os povos”, auxiliando o trabalho dos historiadores, contemporâneos dos fatos, e cuja história escrevem, precisando do auxílio de “documentos verídicos”, como os periódicos, para além de uma tradição, “quase sempre suspeita”15. Portanto, esses escritos constituem-se em memórias que, ao apresentar distintas visões de um mesmo fato, servem como fundamentos da história porque servem também para pensar e repensar a História do Brasil. E, muitas vezes, é possível se deparar nesses textos com personagens desconhecidas ou com uma gama de anônimos que também foram protagonistas das Independências. Em meio a esse clima agitado e efervescente, as pessoas, mesmo as comuns, passavam a discutir sobre todas essas novidades políticas ainda que não tivessem voz decisiva na condução política do governo, mas expressavam suas opiniões com indignação e veemência, expressando-se por meio da cultura escrita e oral.

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Ao dar forma a esse discurso, utilizavam-se de instrumentos simples, por meio de uma escrita pouco custosa e de rápida circulação. Não eram tratados teóricos, mas textos que trilhavam o caminho entre a história e a política, permitindo a circulação das informações entre os vários segmentos da sociedade – principalmente os panfletos políticos.

Há muito conhecidos no mundo da política ocidental trouxeram à luz, especialmente os panfletos manuscritos, aqueles indivíduos que permaneceram anônimos.

Aqueles que, muitas vezes, não se encontra o rosto ou o nome de seus autores, mas cujos traços revelam outras interpretações sobre as Independências do Brasil16. Chamados, algumas vezes, de papelinhos ou pasquins, pois se apresentavam em folhas soltas, ora verticais, ora horizontais, eram colocados nas paredes e postes dos locais públicos, como demonstram os restos de caliça nos poucos exemplares encontrados hoje nos arquivos, especialmente nos arquivos regionais. Revelavam por meio de sua escrita um estilo simples e direto, buscando causar impacto sobre o receptor e facilitar a compreensão da mensagem.

Encontravam-se repletos de erros de grafia e de estruturação lógica do texto, indicando que, provavelmente, eram redigidos por indivíduos que apresentavam algum grau de estudo, mas não eram, certamente, letrados diplomados em Coimbra ou ver- sados nas ideias do século das Luzes, que, regra geral, são considerados como personagens-chave do processo que permitiu a entrada do antigo Reino Luso-Brasileiro na modernidade política, conduzindo-o à formação de um novo Estado, independente de Portugal. Se de início, apresentavam suas opiniões sobre as novas ideias constitucionais, anos mais tarde fornecem pistas de outros projetos de independência. Assim, refletindo o ambiente do processo constitucional de 1821, e ainda da aceitação da Constituição que se elaborava em Portugal, encontra-se um panfleto que, certamente, não expressava a linguagem mais moderada daqueles que lideraram o movimento de 1821:

AVISO

Pelo povo ao Rei, o poder é dado, A(o) povo portanto legislar compete, Se a este aviso o Rei não cede, Às armas cederá o seu poder inerte.

Da Nação o Rei não é mais que chefe, Para executara Lei por ela imposta.

Como é possível então que o Rei dite?

Não! Não! Cidadãos! ex [eis] a resposta!!

Viva o rei que jurar

A sábia Constituição

Que pelas Cortes for dada

Da Portuguesa Nação17.

Tratava-se, sem dúvida, de algum escrito, claramente favorável à adesão da causa portuguesa, não apresentando qualquer menção a um processo de separação entre Brasil e Portugal. No entanto, em suas palavras, encontram-se uma proposta de uma nova legitimidade que se pautava na vontade e na soberania da nação e dos povos e, não mais, na “figura simbólica do rei” ou em uma ordem imemorial sancionada por Deus. O panfleto transmite uma mensagem como se fosse uma estrutura complexa de pressupostos, usos e experiências presentes de um tempo determinado, cujos agentes, que dela fazem uso, articulam uma visão de mundo e possibilitam um grande número de enunciados coerentes entre si, pois só dessa forma, essa linguagem era capaz de for- necer significado ao passado. Seus autores podiam não ser homens da plebe, mas eram anônimos que, embora aceitassem a monarquia, vislumbravam um outro horizonte de expectativas, distinto dos projetos das elites do Rio de Janeiro, comandadas por José Bonifácio ou por Joaquim Gonçalves Ledo.

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Nestes escritos é possível também encontrar propostas distintas para a constituição do Império, considerando-se, inclusive, uma participação mais ampla das diversas camadas da sociedade. Se os conceitos de liberdade e igualdade eram proclamados por todos os cidadãos, nem sempre seu significado era semelhante. Assim, em um panfleto impresso encontra-se uma alusão crítica ao conceito de igualdade social. Um “pedreiro” (entenda-se um pedreiro-livre) narrava a seguinte passagem em relação a um sonho que tivera a respeito das Cortes de Lisboa:

Diz-se que todas as comodidades que deve ter uma sociedade devem ter os habitantes dessa sociedade: isto não é assim; os direitos dos habitantes de uma sociedade são iguais, mas as comodidades não o podem ser para todos, [dizia o Sr Cal]. Ora isto lá me pareceu assim, quando me recordei então, que todos têm direito a dormir na cama, mas que nem todos têm a comodidade de deitar-se em colchões fofos, porque alguns dormem em tarimbas!18

Depreende-se que o conceito de igualdade social não se incluía nessa nova cultura política19, proclamada pelas camadas mais abastadas e ilustradas. Tal perspectiva, no entanto, não era uma proposta totalmente ignorada. No Maranhão, província que se destacou por sua adesão às Cortes de Lisboa, sendo contrária, de início, ao movimento separatista, um panfleto manuscrito, proveniente dessa conjuntura, proclamava:

El Rey e as Cortes, e por isso, a Lei é igual para todos e somos iguais qual seja o castigo para quem fizer crime, que tanto faz o branco como os das mais cores livres, e não cativos; iguais se hão de enviar para mais longe desta capital. [...] O Povo Livre do Maranhão20

18. Carta de Hum Pedreiro ao Seu Amigo em que lhe Refere Hum Sonho que Teve a Respeito das Cortes, Rio de Janeiro, Tip. do Diário, 1822, pp. 6-7. O Sr. Cal era, na discussão das Cortes, o deputado português Manuel Borges Carneiro, segundo o autor do próprio panfleto.

19. Para o conceito de cultura política, cf. Keith Michael Baker, “Introduction”, em K. M. Baker (ed.), The French Revolution and the Creation of Modern Political Culture (vol. 1: The Political Culture of the Old Regime), Oxford, Pergamon Press, 1987, p. 12; Serge Berstein, “La Culture Politique”, em Jean-Pierre Rioux e Jean François Sirinelli, Pour une Histoire Culturelle, Paris, Seuil, 1997, pp. 371-386.

20. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos. 27 A, G2, E11. Documentos enviados à junta da Província do Maranhão contendo pasquins alusivos à Independência, 1820-1823.

Nesse pasquim o povo livre não era certamente formado pelas camadas mais altas da sociedade. Indicava, contudo, outros setores que acreditavam na possibilidade de uma igualdade civil e social, que, embora, não tenha se constituído em realidade, não deixou de se fazer presente nas expectativas de determinados segmentos sociais. Pasquins em São Luís conclamavam que o bispo, como presidente da junta da província, devia ler o papel que se encontrava à “entrada da porta da Catedral”, para que os fiéis à Constituição não permitissem que “homens mulatos e mulatas forras” apanhassem “castigos arbitrários”. Afinal, a Lei era igual para todos21.

Encontram-se ainda para esse tipo de abordagem os panfletos políticos impressos –uma das mais instigantes fontes para o estudo das Independências22. Sendo instrumentos de divulgação da nova cultura política do constitucionalismo e, posteriormente, do separatismo, apresentavam um caráter didático e polêmico. Mantinham-se, regra geral, anônimos por causa da censura. Escritos sob a forma de comentários aos fatos recentes ou de discussões sobre as grandes questões do momento, traduziam em linguagem acessível os temas fundamentais do constitucionalismo. Procuravam, assim, levar notícias e informações a uma plateia mais ampla, que deixava de vê-las como meras novidades do domínio privado para encará-las como parte de um espaço comum, esboçando-se a formação de espaços públicos. Naquelas ocasiões esses escritos surgiam como eficazes meios de mobilização por meio do debate que propiciavam, fazendo alcançar um público cada vez mais amplo, graças à leitura coletiva em voz alta, concorrendo para uma maior familiaridade com o escrito e assegurando uma roupagem nova – a interpretação política – a antigos hábitos. Afinal, vislumbrava-se a possibilidade de intervenção do indivíduo comum na condução dos destinos públicos.

Nestes escritos de circunstâncias faziam-se presentes personagens diversas, que envolviam em seus diálogos figuras das mais distintas categorias sociais. Se o médico formado em uma universidade tornava-se presença frequente, pois a metáfora bio-

21. Biblioteca Pública Benedito Leite, São Luís. Documentos Manuscritos. 27 A, G2, E11. Documentos enviados à junta da Província do Maranhão contendo pasquins alusivos à Independência, 1820-1823.

22. A edição mais accessível de alguns folhetos é a de Raimundo Faoro, “Introdução”, O Debate Político no Processo de Independência, Rio de Janeiro, Conselho Federal de Cultura, 1973. Para uma visão mais completa dos panfletos impressos, ver José Murilo de Carvalho, Lucia Bastos P. Neves e Marcello Basile, Guerra Panfletária... Essas publicações foram estudadas de maneira mais sistemática por: José Honório Rodrigues, A Independência: Revolução e Contrarrevolução (vol. 1: A Evolução Política), Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1975, pp. 156-168; Cecília Helena Salles de Oliveira, O Disfarce do Anonimato. O Debate Político Através dos Folhetos: 1820-1822, Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade de São Paulo, 1979; Maria Beatriz Nizza da Silva. Movimento Constitucional e Separatismo no Brasil, 1821-1823, Lisboa, Livros Horizonte, 1988; Lucia Bastos P. Neves, Corcundas e Constitucionais lógica dominava esse tipo de discurso, uma vez que devia curar as deformidades dos “corcundas”23, outras figuras do povo também eram contempladas, como um alfaiate, adepto às ideias liberais, voltadas para “servir o povo”, enquanto muito de seus clientes – o negociante, o fidalgo, o mercador de lã, o comendador e outros – assumiam atitudes, no mais das vezes, anticonstitucionais24.

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Um exemplo pode ser fornecido pelo panfleto intitulado Diálogo político e instrutivo entre dois homens da roça, André Raposo, e seu compadre Bolonio Simplício, acerca da Bernarda do Rio de Janeiro e Novidades da mesma25. O compadre André explicava a Simplício o que eram as Bernardas – “novidades e mudanças que se fazem no Rocio, juntando-se tropas e o povo”. Num tom crítico narrava o que havia acontecido no dia 5 de junho de 1821 – um motim liderado pelas tropas portuguesas, comandadas por Jorge Avilez, que impuseram a d. Pedro o juramento das bases da Constituição portuguesa, a demissão do ministério e a nomeação de uma Junta Consultiva de Governo. Mesmo sem ter um desfecho totalmente favorável, o diálogo mostrava a imagem de uma turba, composta por homens do povo – soldados – que fizeram grande barulho. Tudo se iniciara com um tiro dado inadvertidamente por “um soldado, que corria, caiu e disparou-se-lhe a espingarda”. Apesar da ironia, o diálogo não deixava de indicar uma participação de segmentos mais comuns das camadas sociais. Ainda fazia críticas aos “letrados da Corte”, que ao invés de cuidarem de suas obrigações, envolviam-se em discussões estéreis e tomavam medidas inúteis, deixando muita gente desaconselhada porque escreviam “na areia e [faziam] castelos no ar”26. Embora, muitas vezes, tais personagens fossem figuras de retórica, artifícios de construção do texto indicavam, sem dúvida, certa preocupação social, produzindo escritos que pudessem transmitir os princípios fundamentais do constitucionalismo a uma camada mais alargada da população.

23. Corcundas eram os seguidores do Antigo Regime, cf. Diálogo entre Hum Médico e Três Corcundas, Lisboa, Officina de J. F. M. de Campos, 1821.

24. Cf. O Alfaiate Constitucional. Diálogo Entre o Alfaiate e Seus Fregueses... por José Anastácio Falcão, Rio de Janeiro, Tipografia Nacional, 1821.

25. Rio de Janeiro, Tipografia Régia, 1821.

26. Diálogo Político e Instructivo Entre Dous Homens da Roça..., pp. 4-5 e 16. Esse panfleto trouxe inúmeras discussões que se fizeram presentes por meio de correspondências nos periódicos, como no Revérbero Constitucional Fluminense, nos números 12, 16 e 17 de janeiro, fevereiro e março de 1822. Para a análise dessa polêmica, ver Isabel Lustosa, Insultos Impressos: A Guerra dos Jornalistas na Independência, 1821-1823, São Paulo, Companhia das Letras, 2000, pp. 149-155.

Assim, pode-se afirmar que o povo, ou seja, aqueles que se situavam nas fímbrias da sociedade, mesmo sem estudos mais aprofundados, não desconheciam o que se passava na Corte e nas demais províncias naquele agitado momento. Mesmo sem saber ler, inteiravam-se das novidades políticas por meio do falar de boca do cotidiano, do imaginário que se fazia circular, traduzindo uma luta simbólica das representações e concepções de mundo que eram resultantes de um novo horizonte de expectativas por meio do ingresso na política moderna27. Comprovando tal argumento, pode-se verificar que Cailhé de Geine, considerado um espião da polícia, elaborara um relatório em 1820 ao Intendente geral da polícia alertando para a gravidade da situação em que se encontrava o Brasil, pois inúmeras obras eram lidas “diante de um auditório já predisposto” a “passagens mais infestadas do espírito revolucionário das obras francesas mais perniciosas”, traduzidas “para o português, para a edificação dos ignorantes”. Não se tratavam de reuniões secretas, mas se manifestavam no “salão dourado, na humilde loja e mesmo na praça pública”28. Logo, ainda que se tratasse de documento redigido por indivíduo que pretendia alarmar as autoridades, pode-se pressupor que o público real desses acontecimentos e manifestações era bem mais amplo do que a historiografia fez supor. E que a massa anônima, à sombra dos fatos, assistia ao desenrolar do processo, nem sempre de forma silenciosa, pois a política tornava-se pública, demonstrando a capacidade do indivíduo em interferir na vida e nos acontecimentos da sociedade.

Outro meio de manifestação dessas personagens, esquecidas pela história da Independência, foi o das petições. Conhecidas no Império português desde os tempos medievais, elaboradas de forma oral ou escrita, por súditos – em caráter privado – ou por corporações, representavam a opinião de um corpo coletivo do Antigo Regime, apresentando reclamações ou queixas ao monarca ou a qualquer instância jurisdicional. Foi no contexto da Revolução Liberal do Porto de 1820, possibilitando uma nova linguagem relacionada à cultura política do constitucionalismo, que as petições se ressignificaram e politizaram29, sob a forma de requerimentos e memórias ainda que escritas ao monarca, mas também a um novo poder que se estabelecia – o Soberano Congresso. Segundo Benjamin Constant, a petição institucionalizada em seu sentido moderno era

27. Reinhart Koselleck, Futuro Passado, Contribuição à Semântica dos Tempos Históricos, Rio de Janeiro, Contraponto/ puc-Rio, 2006, pp. 305-327.

28. “Rapport sur l’Opinion Publique”, em Angelo Pereira, d. João vi, Príncipe e Rei, Lisboa, Empresa Nacional de Publicidade, 1856, pp. 304-307, citação à p. 306.

29. Reinhart Koselleck, “Introducción al Diccionario Histórico de Conceptos Políticos-sociales Básicos em Lengua Alemana”, Revista Anthropos, trad. Luis Fernández Torres, 223, pp. 92-105, Barcelona, 2009.

Foram os Grandes Vultos que Fizeram a História das Independências do Brasil? o “exercício de um direito político” desejável em um país de governo representativo30. O periódico Correio do Rio de Janeiro informava que “nos governos constitucionais” as representações e petições são parte integrante da “Liberdade Pública”, pois podem conter “assinaturas de todas as classes”31. Assim, é possível exemplificar essa questão com a Petição do Senado da Câmara do Rio de Janeiro de 23 de maio de 1822, que encaminhou uma representação a d. Pedro pedindo a convocação de uma Assembleia Geral das províncias do Brasil, consolidando essa instituição como lugar essencial nos espaços públicos de poder político. Se o documento foi elaborado por alguns membros das elites mais radicais: Joaquim Gonçalves Ledo, José Clemente Pereira, os padres Januário da Cunha Barbosa e Antonio João Lessa, João Soares Lisboa e Bernardo José da Gama, buscava-se um cunho popular, convidando o público, por meio de um anúncio estampado no Correio do Rio de Janeiro. Exortava a todos a comparecerem à loja da Gazeta ou à Tipografia de Silva Porto nos dias 21 e 22 de maio, “desde às 8 horas da manhã até o meio-dia, e desde as duas até às seis da tarde”, trazendo memórias e planos a este respeito, ou para simplesmente “ver, ler e assinar a representação a ser enviada a Sua Alteza Real”. Segundo o mesmo jornal, 6 000 pessoas assinaram. Entretanto, o original do documento registra um total de 2 982 assinaturas32. De qualquer modo, legitimava-se a representação por meio de uma demonstração da vontade popular, caracterizando uma nova postura na prática política do Brasil constitucional, pois, doravante, o apoio da nação representava a decidida maioria da opinião pública”. Analisar tais assinaturas pode desvendar pistas interessantes, especialmente porque no documento, ao lado da assinatura, identifica-se a ocupação do subscritor. Assim encontram-se profissões das camadas mais baixas, como marceneiros, sapateiros, lavradores33, alfaiates, criados, empregados e, mesmo uma mulher que dizia ser viúva. Talvez, o mais instigante seja a indicação em 31 assinaturas da categoria “cidadãos”. Como afirmava Cipriano Barata, deputado baiano junto às Cortes de Lisboa – “todos diante da lei são iguais”, todos são cidadãos34. Verifica-se, portanto, o interesse e a participação daqueles que se podem enquadrar como povo nestes novos meios de organização da política. Uma outra fonte que pode trazer à luz atores originais e pouco conhecidos nesse processo são as listas eleitorais. Para a época, uma “lei fundamental de eleições pode chamar-se o paládio das liberdades civis”35. O fim último desse processo era o voto, direito que cada cidadão exercia individualmente. O voto transformava-se em uma arma com que se podia defender os direitos e os foros pelos representantes de cada indivíduo. Daí, por não haver no primeiro processo eleitoral de 1821 para a deputação nas Cortes de Lisboa, o estabelecimento de censo, foi necessário a adoção de vários níveis de eleição. Em um primeiro nível, elegiam-se os compromissários, por meio dos paroquianos votantes, que se reuniam na Casa da Câmara ou na igreja, sob a presidência do Juiz de Fora, Juiz ordinário ou de quem fizessem suas vezes. Esse era o nível em que os eleitores se achavam mais próximos de seus escolhidos. Embora, o material seja muito escasso, é possível encontrar as listas dos compromissários eleitos em diversas freguesias do Rio de Janeiro. Por exemplo, na freguesia de Santa Rita os eleitos em 8 de abril de 1821 revelam as diversas personagens que se envolveram nesse processo: negociantes, totalizando um número de 15; dois bacharéis em Direito, sendo que um obteve o maior número de votos; quatro militares; um médico; um tabelião; um conselheiro; um lente de matemática; e um funcionário da administração real. Somam-se a essas personagens outras figuras comuns, que eram presenças marcantes na freguesia: o vigário e o coadjutor da freguesia e o mestre de primeiras letras. Também, na freguesia de Santana, encontra-se o pároco da mesma na lista dos compromissários36. Verifica-se, portanto, que em um primeiro nível das eleições, segundo as fontes de época, os compromissários deviam ter como qualidades, além de um juízo reto e um “decidido amor à causa da Constituição”, o conhecimento das pessoas da respectiva freguesia37, demonstrando uma maior proximidade entre eleitores e candidatos, e escolhendo-se, por conseguinte, figuras do cotidiano da vida desses votantes. Nesse sentido, a importância do papel do pároco em uma sociedade que ainda sentia o peso de ser regida por alguns valores do Antigo Regime.

30. Para o papel das petições políticas no mundo ibérico cf. Diego Palacios Cerezales, “Ejercer Derechos: Reivindicación, Petición y Conflicto”, em M. Romeo, e M. Sierra, (eds.), La España Liberal, 1833-1874, vol. ii: Historia de las Culturas Políticas en España y América Latina, Madrid, Marcial Pons, pp. 253-285. A citação de Constant encontra-se nesse texto.

31. Correio do Rio de Janeiro, n. 40, 28 de maio de 1822.

32. Cf. Correio do Rio de Janeiro, n. 33, 18 de maio de 1822. A última citação encontra-se no Correio do Rio de Janeiro, n. 62, 27 jun. 1822. Para o número de assinaturas na Representação do Rio de Janeiro, cf. Arquivo Nacional do Rio de Janeiro. Cód. 2. Representação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, pedindo a convocação de uma Assembleia Legislativa, 20 de maio de 1822.

33. Essa categoria não inclui os proprietários, que vão também assinalados.

34. Diário das Cortes de Lisboa, Sessão de 17 de junho de 1822, pp. 467-468.

35. Porto, Gênio Constitucional, n. 13, 16 out. 1820.

36. Para as listas de compromissários, cf. Gazeta do Rio de Janeiro, n. 30, 14 abr. 1821. Para a análise da lista de Compromissários da Freguesia de Santa Rita, ver Maria Beatriz Nizza da Silva, Movimento Constitucional..., pp. 58-63.

37. Semanário Cívico, n. 15, 7 jun. 1821, Bahia.

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