EXCLUSIVO A vidA nA prisão de um cAmpeão olímpico do hAlterofilismo
a CIdadE daS CanOaS como um povoAdo às mArgens de um rio poluído nA bAhiA produz cAmpeões
nEm VILãO nEm SantO o ídolo giba por trás dA fAmA
dEpOIS da gLórIa o ex-recordistA dA mArAtonA RONALDO DA cOSTA foi AbAndonAdo por Amigos e dirigentes. AgorA, tentA reescrever suA históriA dIagnóStICO os erros e Acertos do brAsil nA cOPA DAS cONfEDERAÇÕES que servem de AprendizAdo pArA 2016
o verdadeiro homem de ferro
carlos chinin faz história no decatlo, o esporte mais difícil do mundo, e renova as esperanças do atletismo nacional
AGOSTO/SETEMBRO 2013 Edição 23 | Ano 4 VENDA PROIBIDA – EXEMPLAR DE DISTRIBUIÇÃO GRATUITA E PARTE INTEGRANTE DA REVISTA ISTOÉ 7
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TexTo: danielle sanCHes, FaBíola perez, FláVia riBeiro, larissa Veloso, MarCel gugoni, Mariana BarBoza, Mariana Bastos, natalie gedra, pedro MarCondes de Moura, raCHel Costa, rodrigo Cardoso, rodrigo lara, rodrigo riBeiro, toM Cardoso, Vera lynn FoTo: adriano MaCHado, daryan dornelles, eduardo zappia, eMiliano Capozolli, MarCio sCaVone, paulo ManCini ilusTração: estúdio luzia, oliVer quinto produção: Cintia sanCHez rePórtereS fotogrÁficoS: João Castellano, Masao goto Filho, pedro dias e rafael Hupsel gerente: Maria amélia scarcello SecretÁria: terezinha scarparo aSSiStente: Cláudio Monteiro auxiliar: lucio Fasan
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4 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
EsportE, drogas E rock’n’roll Duff McKagan é o ex-baixista do Guns N'Roses, a grande banda de rock dos anos 1980 e 1990. Duff foi usuário pesado de cocaína, heroína, crack e álcool. Tudo isso ao mesmo tempo e durante quase três décadas. Duff fez o diabo nesse período. Roubou, brigou, largou a família, abandonou mulheres, pensou em se matar. Duff provavelmente estaria morto se não tivesse encontrado o esporte, meio que por acaso. Ele teve um estalo e começou a andar de bicicleta. Descobriu que, quanto mais se matava de pedalar, menos seu corpo pedia os venenos de antes. Duff conheceu uns campeões no mountain bike e resolveu ir atrás deles. Os caras o levaram para umas montanhas bacanas. Depois para outras. E mais outras. As crises de abstinência sumiram. A fissura passou. Duff, o doidão à beira da morte, queria mais. As artes marciais ofereceram o equilíbrio que nunca teve. A corrida manteve a mente ocupada. O mountain bike supriu o corpo do esforço físico máximo, e assim deu para esquecer tudo – álcool, drogas, ideias suicidas. Duff é hoje um atleta completo. Para quem não reconhece o poder transformador do esporte, a história do baixista Duff McKagan está aí para dizer umas verdades. Basta conferir em “É Tão Fácil e Outras Mentiras”, o livro de memórias de Duff. Amauri Segalla, diretor de redação asegalla@istoe.com.br
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ERRAMOS · Na entrevista com Maurren Maggi (edição 24), o correto é afirmar que a atleta deixou o Clube BM*F Bovespa em 2008, por opção própria. O último clube de Maurren foi o São Paulo/Nestlé. · Ao contrário do que diz a reportagem de capa sobre Joanna Maranhão, ela não foi a primeira brasileira a disputar uma final olímpica na natação. O mérito pertence a Piedade Coutinho, três vezes finalista olímpica em 1936 e 1948. Além disso, em 1948 a equipe feminina de revezamento (da qual Piedade fazia parte) também chegou à final. O texto também afirma que Joanna disputou os Jogos Pan-Americanos de 1999. Na verdade, seu primeiro Pan foi o de Santo Domingo, em 2003.
editorial
LARiSSA VELOSO
MáRCiO SCAVOnE
pAuLO MAnCini
Fotógrafo com 28 anos de carreira, Paulo Mancini foi vencedor de dois Leões de Prata no Festival de Cannes de 2003 e um de bronze em 2013. Iniciou sua carreira em São Paulo, mas trabalhou em Milão, na Itália, de 1989 a 1993. Hoje, empresta seu talento às mais importantes agências de publicidade e veículos editoriais do Brasil. Nesta edição, fotografou, com o brilho de sempre, o jogador de vôlei Giba.
MARiAnA QuEiROz BARBOzA
Nascida em Campinas e criada em Ribeirão Preto, mudou-se para a capital paulista em 2006 para estudar jornalismo na Escola de Comunicações e Artes da USP. Fez balé e praticou todos os esportes que pôde (natação, ginástica artística, vôlei, basquete, tênis e capoeira), mas nunca levou uma medalha para casa. Aos 25 anos, é repórter de ISTOÉ, com passagens por "Exame", "Valor Econômico" e Abril.com. Foi a responsável, nesta edição da 2016, pelo perfil do decatleta Carlos Chinin
EMiLiAnO CApOzOLi
O responsável pelas imagens que ilustram a reportagem sobre os novos e minimalistas tênis da Nike é um brasileiro que vive do outro lado do Atlântico desde 2007 (primeiro Paris, depois Londres). Colaborador das principais publicações brasileiras, Capozoli é especializado em fotojornalismo, mas também retratou personalidades que vão desde a presidenta Dilma Rousseff ao estilista Pedro Lourenço, passando pelo escritor Paulo Coelho e pela cantora Cibelle
TOM CARDOSO
Especialista em revelar a personalidade dos retratados em seus mínimos gestos e olhares, esse paulistano começou a fotografar ainda criança com a Rolleiflex do pai. Aos 20 anos, já era fotógrafo de publicidade. É coautor de “Entre a Sombra e a Luz”, que traz imagens feitas por ele ao lado de textos do romancista italiano Antonio Tabucchi. Fez dobradinha similar em “Luz Invisível”, dessa vez com textos de Luis Fernando Verissimo. Nesta edição da 2016, fez o ensaio duplo com os tenistas Bruno Soares e Marcelo Melo
Nascido no Rio de Janeiro e criado em São Paulo, Tom Cardoso passou pelos jornais "O Estado de S.Paulo", "Jornal da Tarde" e "Valor Econômico". Ex-editor de ISTOÉ Dinheiro, tem três livros publicados – “O Marechal da Vitória”, sobre a vida do empresário e dirigente esportivo Paulo Machado de Carvalho, e “75 Kg de Músculos e Fúria”, perfil do jornalista Tarso de Castro, e "O Cofre do Dr. Rui", sobre o assalto ao cofre de Adhemar de Barros. Nesta edição, ouviu um dos grandes ícones cariocas – o músico e ator Evandro Mesquita – para compor a principal entrevista de nossas páginas.
COLABORADORES
DARyAn DORnELLES
Formado em cinema e jornalismo pela Universidade Federal Fluminense, é um dos sócios do estúdio Fotonauta. Dali saíram mais de 100 capas que embalaram trabalhos de gente como Ed Motta, João Donato, Teresa Cristina e até do guitarrista Andy Summers, do Police. Seus cliques continuam a serviço de grandes publicações do Brasil e do Exterior. Nesta edição, voltou a aliar fotografia e música ao realizar o retrato de Evandro Mesquita
Jornalista formada pela Universidade Federal de Minas Gerais, Larissa, 27 anos, mora em São Paulo desde 2010, mas continua fluente em mineirês. Trabalhou na redação de ISTOÉ como repórter de sustentabilidade. Nesta edição, assina a reportagem sobre a vida de Galabin Boevski, búlgaro campeão olímpico do levantamento de peso, que cumpre pena de nove anos em uma cadeia brasileira. Detalhe: Larissa furou um famoso jornalista da tevê brasileira, que há meses tenta entrevistar Galabin.
4 ExpEdiEntE 5 Editorial 8 ColaboradorEs
SeçõeS
RePORTAGeNS
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Clique OlímpiCO O tcheco que bancou o Super-Homem no Mundial de Esportes Aquáticos e a violência explícita do rúgbi
30 entRevistA: evAnDRO mesquitA
74
A vez DA simpliCiDADe Por que a Nike aposta no minimalismo para criar calçados esportivos cada vez melhores
20
AqueCimentO Quem são os brasileiros que defenderão as cores de outros países na Olimpíada de 2016
34 tODAs As fACes De gibA
78
28
RAiO X Como os juízes avaliam e pontuam as performances impressionantes dos saltos ornamentais
42 AtRás DAs gRADes
De bRAçADA Medalhas no Mundial de Esportes Aquáticos mostram que a nova geração é a mais forte da história da natação brasileira
84
mAis DO que espeCiAl Bruna Alexandre, que perdeu o braço direito quando era bebê, brilha no tênis de mesa e vence até atletas sem deficiência
88
A CiDADe DAs CAnOAs Como Ubaitaba, na Bahia, supera a falta de estrutura e as águas poluídas para forjar campeões
94
DuplA fORçA Marcelo Melo e Bruno Soares conquistam resultados históricos e são a grande esperança do tênis brasileiro em 2016
102 peRfORmAnCe
Os artesanatos e bugigangas que fazem a alegria dos turistas que visitam a Cidade Maravilhosa
104 COnCentRAçãO
Dez livros essenciais para quem quer entender o Rio
106 páginA DOuRADA
O pior nadador da história é hoje herói olímpico
O músico e ator símbolo do Rio sentencia: “Os cariocas voltaram a ser donos da cidade”
O maior jogador do vôlei brasileiro mostra que ídolos são feitos de conquistas e polêmicas Entrevistamos Galabin Boevski, búlgaro campeão de levantamento de peso que está preso em uma cadeia de São Paulo
48 CORRiDA sOfRiDA
Ronaldo da Costa, ex-recordista mundial da maratona, tenta se reerguer após ser abandonado por todos
56 HOmem De feRRO
Quem é Carlos Chinin, o decatleta que fez história no Mundial de atletismo. E mais: a cobertura completa da competição
65 DeveR De CAsA
O que deu certo e o que deu errado na Copa das Confederações e como usar as lições para 2016
70 inflAçãO CARiOCA
O preço das diárias em hotéis do Rio deve subir 200% até a Copa do Mundo. Precisa ser tão caro?
99 pRéDiO veRDe
O edifício sustentável que abriga a sede do comitê organizador dos Jogos do Rio
ínDiCe Foto: Joãs Castellano
CliqueOlímpicO imagens surpreendentes dO espOrte
É SÓ maiS um dia de trabalho Não é fácil ganhar a vida como atleta de rúgbi. Dylan Farrell, do time australiano Rabbitohs, que o diga. É ele quem enfia a cara no chão nesta imagem, enquanto seu companheiro de equipe Andrew Everingham salta atrás de Mahe Fonua, do Storm, em uma disputa de bola. Os “coelhos de Sydney” perderam para os “tempestuosos de Melbourne” por um sonoro 26 a 8 na partida válida pela Liga Nacional de Rúgbi da Austrália. Mas nem tudo é desgraça para o desafortunado Farrell. Apesar da derrota, seu time ainda ocupa a segunda colocação no campeonato da primeira divisão.
Foto: Scott Barbour/Getty
CliqueOlímpicO
Para baixo e avante!
Chegar em quarto lugar na prova de salto de penhasco (27 m) do Mundial de Esportes Aquáticos, em Barcelona, não foi um feito tão espetacular assim. O que fez, então, do tcheco Michal Navratil um dos atletas mais celebrados da competição? Simples: terminadas as provas oficiais, o saltador de 28 anos vestiu sua capa de Super-Homem, pediu as palmas do público e pulou rumo à glória, para baixo e avante. O braço direito esticado, a perna esquerda dobrada e o corpo paralelo à água fizeram da pose heroica uma das imagens mais marcantes do Mundial.
Foto: Javier Soriano/AFP
20 agosto/setembro 2013 | istoĂŠ 2016
O Brasil que expOrta talentOs ElEs já dEfEndEram a sElEção nacional, mas agora vEstEm a camisa dE outros paísEs com o sonho dE disputar os jogos dE 2016
Medalhista pelo Brasil vai defender a ColôMBia
A levantadora Kátia Andréa Monteiro (à esquerda) tem uma antiga ligação com a seleção brasileira de vôlei. Convocada desde as categorias de base, disputou os Jogos de Sydney, em 2000, quando o Brasil conquistou o bronze. Agora, aos 40 anos, sonha disputar uma nova Olimpíada – mas não pelo País em que construiu sua história. Recentemente, Kátia foi surpreendida com o convite do técnico brasileiro Mauro Marasciulo para liderar a renovada seleção da Colômbia. A jogadora possui dupla cidadania graças ao pai, Leonardo Caldeira, jogador de futebol na Colômbia. “Eu nasci lá, mas com dois anos voltei ao Brasil”, diz. “Nunca tinha pensado em usar a dupla cidadania para nada.” Em 2016, ela terá 43 anos, o que é bastante idade para atletas de alto nível. Kátia também sabe que a Colômbia tem poucas, para não dizer mínimas, chances de se classificar para a competição no Rio. “É uma seleção que nunca chegou a um Mundial, mas vai ser interessante compartilhar um pouco do que aprendi com jogadoras de outro país.”
fotos: joão castellano | marcos neigeistein
JudoCa desCoBre que o pai é Ministro eM Guiné-Bissau
CoMo uMa MáGoa leva alGuéM a vestir a CaMisa de outro país
A judoca Taciana Lima, 29 anos, nasceu em Olinda (PE), mas fez carreira esportiva em Porto Alegre (RS). Em 1995, disputou pela primeira vez o campeonato brasileiro de judô. Três anos depois estreou em competições internacionais, em Moscou, na Rússia. “Tudo aconteceu muito rápido na minha vida”, diz. A intensidade dos treinos e a frequência das viagens não a afastaram dos estudos. Formada em educação física, atualmente cursa faculdade de moda na capital gaúcha. Foi apenas em 2007, com 23 anos, que Taciana conheceu o pai. “Sabia que não era brasileiro, mas até então nunca tinha ido procurá-lo”, diz. Ao vasculhar a internet, descobriu que ele, Oscar Suca Baldé, era nada menos que ministro em Guiné-Bissau, país no leste da África. O primeiro encontro veio em 2011, quando passaram a virada do ano juntos no Senegal. “Foi então que conheci a pequena Guiné-Bissau, um país muito pobre, com pouca cultura esportiva”, diz. Taciana decidiu se naturalizar e tem boas chances de se classificar para os Jogos de 2016. “Levar o esporte para um país onde ninguém conhece o judô foi o principal motivo que me fez querer ir para lá.”
Foi uma grande decepção que motivou o judoca Moacir Mendes, 32 anos, a se naturalizar uruguaio. Depois de defender a seleção brasileira em 19 competições internacionais, Moacir foi descartado, pela Confederação Brasileira de Judô, das seletivas para a Olimpíada de Londres. “Fiquei muito chateado com o corte”, diz. “Não recebi nem uma ligação, nem um e-mail sequer.” Apenas a sete dias da eliminação, recebeu um convite do presidente da Federação Uruguaia para representar o país vizinho. “No começo, não tinha coragem de lutar por outra bandeira, mas ao mesmo tempo a vontade de participar de mais um ciclo olímpico era grande.” Até hoje ele não consegue esconder a mágoa. “Se meu país não me quer mais representando a seleção nacional e há outros que querem, não vou hesitar.” Moacir não tem parentes no Uruguai, mas diz que está bem adaptado. Atualmente, divide seu tempo entre Porto Alegre e Rivera, cidade uruguaia já na fronteira com o Brasil.
aquecimento
AnABoLizAnTES
O perigO da vitória a qualquer custO Em julho, cinco atletas jamaicanos, incluindo dois campeões olímpicos, foram flagrados no exame antidoping. Usar substâncias proibidas é uma estratégia antiga no esporte, mas o avanço dos métodos de detecção traz uma esperança: está cada vez mais difícil trapacear. Um recente relatório divulgado pela Wada, agência mundial antidoping, revelou que 2% de todas as amostras retiradas de atletas de alto nível, olímpicos e paraolímpicos, no período de um ano, deram resultado positivo para doping. Parece pouco, mas o percentual corresponde a cerca de cinco mil atletas. O médico Eduardo De Rose, membro da Wada, diz que todas as substâncias proibidas agem na melhora da capacidade cardiorrespiratória, na diminuição da fadiga ou na ampliação da massa muscular. E todas mexem com a saúde dos atletas. “Se existe uma melhora de desempenho, existe também uma consequência prejudicial”, diz. Segundo ele, 140 substâncias e métodos estão na lista negra da Wada. A seguir, saiba como algumas delas atuam e os riscos que trazem à saúde.
22 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
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Segundo a Wada, seis em cada dez casos de uso de substâncias proibidas no esporte no mundo envolvem algum agente anabolizante. A testosterona é o mais comum. Testosterona O que FaZ hormônio masculino que promove a produção de proteínas e o crescimento da massa muscular. Onde age músculo. eFeitO nO atleta aumenta o crescimento e a resistência muscular e diminui o processo de fermentação, responsável pela sensação de queimação e fadiga. eFeitO cOlateral de crescimento excessivo de pelos, acne e oleosidade da pele até câncer de mama e impotência. usO na Medicina para tratar jovens com deficiência hormonal ou homens com impotência. Em mulheres, é usado no tratamento contra câncer de mama. usO nO espOrte recorrente em esportes que requerem explosão e esforço intenso do músculo, como levantamento de peso, ciclismo, natação e mma. Casos confirmados MMa Vitor Belfort, em 2006, apresentou altos graus de testosterona em um exame antidoping. Ele alegou que tudo era resultado de um tratamento de reposição hormonal. nataÇÃO Rebeca Gusmão, em 2007, apresentou grau de testosterona incompatível com o metabolismo feminino. foi banida do esporte e perdeu medalhas de competições internacionais. Ela disse que um problema no ovário foi responsável pelo aumento de massa muscular.
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ESTiMULAnTES São usados como melhoradores de desempenho por acelerar o metabolismo e ampliar a capacidade cardiorrespiratória (transferência e transporte de oxigênio). Praticamente um em cada dez casos de doping envolve algum estimulante. A anfetamina é um dos mais comuns. Anfetamina O que FaZ incentiva a liberação de uma enzima que suprime o apetite, reduz efeitos da fadiga e promove a queima de gordura. Onde age sistema nervoso central e cérebro. eFeitO nO atleta diminui efeitos da fadiga e acelera o metabolismo. eFeitO cOlateral de náuseas, aumento da pressão sanguínea e sudorese até arritmia cardíaca e dependência. usO na Medicina para o tratamento de narcolepsia e distúrbio de déficit de atenção e hiperatividade (ddah). usO nO espOrte Em atividades que requerem grande esforço muscular e aeróbico, como atletismo. Caso confirmado 2011, o agentino Juan Pablo Dotti competiu sob o efeito da substância. foi suspenso por dois anos e, em 2013, teve a suspensão estendida até 2015.
ciclisMO Em
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CAnABinoiDES Quase todos os casos de uso de canabinoides estão relacionados ao THC (maconha). A substância é vetada durante competições pela Wada, mas teve regras flexibilizadas em relação à quantidade considerada doping: passou de 12 nanogramas por mililitro de urina para 150 ng/ml. Maconha O que FaZ tem efeitos analgésicos e relaxantes. Onde age sistema nervoso central e cérebro. eFeitO nO atleta serve como relaxante pós-esforço e diminui a ansiedade. eFeitO cOlateral de aumento de apetite até paranoia e esquizofrenia. usO na Medicina analgésico e contra casos de esclerose. usO nO espOrte relaxante muscular e analgésico. Casos confirmados MMa Em 2012, Thiago Silva foi pego com a substância no sangue após o ufc china. foi suspenso. vÔlei Giba, em 2002, foi flagrado por uso de maconha. Ele disse que “se perdeu” na vida pessoal.
fotos: roberto jayme | pedro dias/ag. istoÉ | ivo gonzalez/ ag. o globo
rEBEca gusmão
vitor BElfort
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daianE dos santos
DiURéTiCoS Geralmente usados para mascarar exames de urina e de sangue e que servem como indício de uso de outras substâncias proibidas em competições. A furosemida está entre as substâncias mais utilizadas. Furosemida O que FaZ atua como diurético e faz com que o corpo
evite a absorção de sais e a retenção de líquidos. Onde age fígado, rins e sistema circulatório. eFeitO nO atleta facilita a eliminação de líquidos e pode ajudar no controle de peso. eFeitO cOlateral de dores, náuseas e cansaços musculares até taquicardia. usO na Medicina para tratamento de hipertensão e retenção de líquidos (edema). usO nO espOrte facilita a eliminação de líquidos e serve para mascarar outras substâncias dopantes. Casos confirmados ginÁstica Daiane dos Santos, em 2009, testou positivo para furosemida durante uma temporada de treinos. Ela se defendeu dizendo que a substância teria sido incluída em uma dose de remédios usados com finalidade estética. ficou suspensa por cinco meses. nataÇÃO Cesar Cielo, em 2011, foi flagrado durante disputa do troféu maria lenk. Ele alegou culpa do laboratório por má manipulação de um suplemento.
aquecimento
QuEM NãO TEM NEvE... Cerca de 50 atletas brasileiros treinam regularmente em modalidades como esqui e snowboard. Alguns deles tentam uma vaga nos Jogos de Inverno de Sochi (Rússia), em 2014. Embora o Brasil tenha registrado, em julho e agosto, algumas das temperaturas mais baixas de sua história, a neve, tão necessária para o esporte de alta performance, ainda é elemento raro. Para tentar contornar esse problema, um centro de treinamento está sendo construído na cidade de São Roque, no interior de São Paulo, em uma área ao lado de um parque que já oferece rampas (artificiais, claro) de esqui e snowboard para turistas. Para a Confederação Brasileira de Desportos de Inverno (CBDN), o local permitirá que brasileiros treinem sem precisar ir a outros países. Construído em parceria com o Ski Mountain Park, o centro de treinamento deverá simular, ao menos em parte, as técnicas utilizadas em uma descida de snowboard ou esqui. A comparação com as pistas de verdade, no entanto, mostra como estamos longe do topo: um circuito de competição internacional pode ser até 14 vezes mais extenso (confira números a seguir). O local tem previsão de ficar pronto em outubro e os treinos começam já neste ano. As pistas serão cobertas por snowflex, um material sintético que simula o atrito e o deslize sobre a neve.
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O centrO de treinaMentOs de sÃO rOque 3 pistas Até 50 m de comprimento Até 5 m de largura Colchão de ar de 400 m2 (20x20 m), utilizado para os saltos Inclinações de descida: 39, 35 e 27 graus; inclinação na rampa: 30, 27 e 24 graus as pistas de verdade Extensão para esqui/snowboard cross: 900 m a 1.200 m* Extensão para esqui/snowboard slopestyle: 700 m a 1.000 m, com mínimo de seis obstáculos (rampas, bunkers e corrimões) * Especificações da fis (federação internacional de ski) para as pistas nível a (usadas em copas do mundo, mundiais e jogos olímpicos)
BOlSA ATlETA BATE RECORDE O número de esportistas contemplados pelo programa Bolsa Atleta acaba de cravar um recorde. Agora, são exatos 5.691 beneficiados de 55 modalidades diferentes. Entre eles estão algumas das maiores estrelas do esporte nacional: Cesar Cielo (natação), Felipe Kitadai (judô), Yane Marques (pentatlo moderno), Esquiva Falcão (boxe) e o paratleta Daniel Dias (natação). O programa vai destinar R$ 180 milhões em cinco categorias. Para o grupo estudantil e de base, a ajuda de custo é de R$ 370 mensais por 12 meses. A chamada bolsa nacional (para atletas que se destacam no País) oferece R$ 925 e a internacional, R$ 1.850. Beneficiários de nível olímpico levam R$ 3.100 mensais.
Medalha de Meteorito O meteorito que atingiu a Rússia em 2012 com força de 30 bombas atômicas, causando danos de quase US$ 30 milhões, vai marcar presença na próxima Olimpíada de Inverno. A competição, que será realizada na cidade russa de Sochi, em 2014, terá algumas medalhas confeccionadas com fragmentos do objeto espacial. No entanto, nem todos os atletas serão premiados com o precioso artefato. Só o ouro nas competições do dia 15 de fevereiro dará direito à raridade. A data não é por um acaso: trata-se do mesmo dia da queda da “bola de fogo”. De onde veio a ideia meio maluca? “Tanto o meteorito quanto os Jogos Olímpicos são eventos globais”, disse o ministro da cultura Alexi Betekhtin. Então tá.
ChiCaGo e seus Maus perdedores A decepção de Chicago com a perda dos Jogos Olímpicos de 2016 para o Rio de Janeiro ainda causa constrangimentos. Em meio à onda de protestos que ocorrem na Cidade Maravilhosa, o jornal “Chicago Sun-Times”, demonstrando péssimo espírito esportivo, perguntou se o Comitê Olímpico Internacional está arrependido pela escolha e insinua que a cidade americana poderia ter sido uma alternativa mais estável. “O COI poderia ter o ouro, mas se contentou com o bronze”, escreveu o colunista Neil Steinberg. Chicago caiu na primeira fase da disputa, realizada em 2009. Madri e Tóquio também estavam na briga – e nenhum jornal dessas duas cidades reclamou de nada até agora.
fotos: reprodução facebook | alexey filippov/ria | julian finney/getty
alan FOnteles nOs JOgOs OlíMpicOs dO riO? Com 16 ouros, 10 pratas e 14 bronzes, o Brasil superou o próprio recorde no Mundial de Atletismo Paraolímpico, realizado em julho, em Lyon, na França. Só a Rússia (com 53 medalhas, 26 de ouro) e os Estados Unidos (52 no total, 17 douradas) ficaram à frente. no mundial de 2011, o Brasil terminou na quinta posição, com 30 pódios e 12 ouros. Foram à França 35 atletas brasileiros e 24 deles voltaram com medalhas. o maior destaque foi o velocista Alan Fonteles, que faturou três títulos. nos 200 metros, Fonteles já cravou tempos que o credenciam a disputar provas com corredores sem deficiência. Já há quem diga que ele vai repetir o feito do biamputado sul-africano oscar Pistorius, que disputou os Jogos olímpicos e Paraolímpicos de Londres.
parte escrita Um dia antes do torneio, os atletas entregam aos juízes uma lista com todos os movimentos que pretendem fazer antes de cair na água. Com base nesses dados, sete juízes determinam o grau de dificuldade de cada salto. Quanto mais complicados e ousados forem os movimentos, maior é o grau – que geralmente vai de 1 a 4, mas pode chegar a mais (confira exemplo). Esse valor será usado depois para multiplicar as notas dos jurados, resultando na nota final do salto.
Número de juízes: 7 Quem são: ex-atletas, treinadores, professores de educação física e outros especialistas de diferentes países Onde ficam: Quatro eM uM lado da piscina e três eM outro, dispostos transversalMente aos traMpolins e plataforMas
Modalidades Individual masculino Individual feminino Sincronizado masculino (dupla) Sincronizado feminino (dupla)
AlcAnçAR As MAIORes nOtAs
nA águA sãO fundAMentAIs pARA
cORpO e uMA entRAdA dIscRetA
pOsIcIOnAMentO cORRetO dO
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MOvIMentOs cOMpleXOs
sincronia No caso dos saltos sincronizados, movimentos perfeitamente casados são essenciais para boas notas.
entrada na água Quanto menos “splash”, melhor. Isso é obtido com uma entrada perfeitamente vertical, com as mãos esticadas, juntas e espalmadas.
execução e dificuldade Um salto inicial com boa altura ou uma bananeira seguida por diversas piruetas e mortais garante notas melhores. No entanto, quanto mais complexos os movimentos, maiores as chance de erro. Todos devem corresponder à lista entregue pelo atleta aos juízes no dia anterior.
postura Quanto mais ereto o atleta permanecer, melhor. Caso opte pela posição carpada, os joelhos não devem se dobrar. Manter os pés sempre juntos e os dedões alinhados também conta pontos.
O que é AvAlIAdO
Tudo o que você precisa saber sobre a pontuação dos saltos ornamentais
aquecimento RAIO X
5 Metros
as alturas As competições oficiais são disputadas em trampolins de 1 e 3 metros de altura ou em plataformas de 5 e 10 metros. Na Olimpíada, apenas o trampolim de 3 metros e a plataforma de 10 metros são utilizados. O atleta realiza cinco saltos, em posições diferentes, em cada fase da competição.
as saídas No trampolim, é possível iniciar o salto em cinco posições: de frente, de costas, em pontapé (saindo de frente, mas dando um mortal para trás), revirado (saindo de costas, mas com mortal para a frente) e parafuso (fazendo uma pirueta com corpo, independentemente da forma inicial). Na plataforma, o atleta ainda pode realizar a saída em equilíbrio (quando planta uma bananeira, de frente ou de costas).
no ar! Ao saltar e atingir o pico, o atleta deve assumir uma das quatro posturas: esticada, com o corpo totalmente reto; carpada, com as pernas esticadas e o corpo dobrado na altura da cintura; grupada, com joelhos e coxas junto ao torso; e livre, quando é possível usar qualquer posição para saltar em parafuso.
coMo é calculado o grau de dificuldade de uM salto eM pontapé coM Quatro Mortais e Meio Saída em pontapé: 0,3 Voo carpado: 0,6 Rotação de quatro mortais e meio: 3,5 Entrada não natural: 0,4 (dificuldade adicional porque o atleta não consegue ver a água até o momento em que a toca) total: 4,8
cortes, soMa e Multiplicação Para reduzir a chance de erros, a nota mais baixa e a mais alta são excluídas da contagem final. As cinco restantes são somadas e depois multiplicadas pelo grau de dificuldade inicial. 6,0 + 5,5 + 5,0 + 5,0 + 5,0 + 5,0 + 4,0 = 25,5 Notal final: 25,5 x 4,8 (grau de dificuldade) = 122,4
0 salto coMpletaMente falho 0,5 a 2 salto insatisfatório 2,5 a 4,5 salto deficiente 5 a 6 salto satisfatório 6,5 a 8 salto boM 8,5 a 10 salto ótiMo
As nOtAs dOs juízes vãO de 0 A 10
3 Metros
entrevista evandro mesquita
MUDANÇAS Evandro diz que o Rio melhorou muito nos últimos anos, mas ainda falta muito. "As praias continuam imundas", reclama
“ Os cariO cas vOltaram a se r dOnOs da c idade” ii v
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por tom cardozo foto daryan dornelles
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Poucos brasileiros estão tão associados ao ideal de felicidade quanto Evandro Mesquita.
Afinal, foram raros os que aproveitaram – e continuam aproveitando – tão intensamente o Rio de Janeiro. O Rio do Píer de Ipanema, do Baixo Leblon, da Lapa do Circo Voador, do fim dos anos 70 e começo dos 80, que muitos consideram o último sopro criativo de uma cidade, mas que começa a renascer agora, revigorado pelos ventos da Olimpíada. Evandro não se considera um saudosista. Tem, é verdade, saudade da Ipanema de Leila Diniz, mas, aos 61 anos, olha pra frente, fugindo dos estereótipos e se reinventando, seja na pele do Paulão da Regulagem, o mecânico-malandro do seriado “A Grande Família”, seja como vocalista sessentão da Blitz, ainda a banda mais bem-humorada do rock nacional. Sobre o Rio, continua apaixonado. E está otimista. “Os cariocas voltaram a ser donos da cidade”, diz. Hoje você está na tevê como o mecânico Paulão da Regulagem, no seriado “A Grande Família”, mas em boa parte de sua carreira como ator você parecia representar sempre a mesma pessoa, o surfista boa-praça que é amante da natureza. Ou seja, você mesmo. Por que isso acontecia? Durante uma fase da minha carreira isso me incomodou um pouco. Em minha primeira novela, "Top Model" (1989), eu fiz o Saldanha, um surfista que morava na praia, vendia sucos, tinha uma ligação estreita com o mar, com a natureza. A novela fez bastante sucesso na época e por um tempo fiquei muito associado ao personagem. Eu já tinha toda uma ligação com essa temática. Fui criado pegando onda em Ipanema, em Saquarema, portanto, era inevitável essa associação. No começo achei legal, mas depois virou um rótulo. As pessoas achavam que eu era só aquilo, mas o meu trabalho como ator era muito mais amplo. Eu tinha passado pela peça “Hoje é Dia de Rock” e pelo Asdrúbal Trouxe o Trombone (grupo teatral que marcou época nos anos 70 e revelou, além de Evandro, nomes como Regina Casé e Luís Fernando Guimarães), montagens que já propunham uma desconstrução da dramaturgia, que tinham uma proposta original e transgressora.
entrevista evandro mesquita
Onde você buscou inspiração para fazer o Paulão da Regulagem, um personagem tão distante de seu universo? Não é distante do meu universo. Eu fui criado num Rio absolutamente democrático. Eu subia o morro pra jogar bola junto com empresário, traficante, advogado, delegado, surfista. A praia também era um espaço de todos, apesar de ser na zona sul. Não tinha essa divisão. O Paulão é inspirado no Pepeu, um amigo mecânico, que tinha essa coisa que eu chamo de "ignorância inteligente", uma ingenuidade misturada com sabedoria, que é própria do malandro carioca.
O Rio experimentou, a partir dos anos 80, um aumento desenfreado da violência, e ficou impossível subir os morros para jogar bola depois que eles foram ocupados pelo narcotráfico. Com o processo de pacificação e instalação das UPPs, houve um respiro. Você sente essa nova fase do Rio ou é muito cedo para comemorar? A cidade melhorou bastante. Antes estava terrível. Neguinho só pensava que tipo de cerca ia colocar no muro de casa, que horas podia voltar para casa com segurança. Agora os cariocas voltaram a ser donos da cidade. Pintou um “astralzinho”. Mas é claro que faltam milhões de coisas. As praias continuam imundas, é preciso investir pesadamente em educação, em saúde pública.
Como você vê a atual onda de manifestações pelo Brasil? Eu acho o máximo. É muito bacana essa virada, essa tentativa de não deixar esse barco tão lindo afundar. Hoje as pessoas estão discutindo política em todo lugar, no barbeiro, na loja de suco, no Maracanã. Acho ótimo não engolirmos essas merdas que fazem a gente engolir. As manifestações são o troco pelos anos de descaso do poder público. Hoje não dá mais para colocar a sujeira debaixo do tapete. O lixo cresceu tanto que está aí, escancarado.
Sua geração viveu uma das melhores fases do Rio, dos anos 70 até o começo dos 80, de grande efervescência política, cultural e comportamental. Essa fase não volta mais? Eu não sou um cara saudosista, que fica apegado ao passado, querendo viver de novo coisas que já vivi. Mas é difícil não ser saudosista em relação à cidade do Rio. Ipanema era um lugar tão sedutor, tão agradável (Evandro mora atualmente no bairro de Itanhangá, na zona oeste do Rio). Tinha os botequins, as pessoas mais interessantes que você poderia sonhar em conhecer. Você andava de sandália havaiana e esbarrava com a Leila Diniz. Hoje é um bairro muito distante do que eu vivi na minha época, você não encontra mais a mesma turma.
32 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
"O LOBãO TEM A CARACTERíSTICA DE DETONAR TODO MUNDO, mas aprendi a cOdificar a metralhadOra giratória"
Mas vivia-se sob uma ditadura militar. As manifestações públicas eram reprimidas com violência pela polícia, a censura estava estabelecida. É curioso. A gente morria de medo da polícia, minha mãe vivia escondendo professor universitário lá em casa, mas nós nunca deixamos de ser livres. Em pleno auge da censura, o Píer (ponto de encontro da Praia de Ipanema, que marcou uma época e uma geração) era uma trincheira de liberdade. Os artistas plásticos, os músicos, Woodstock, Jimi Hendrix, havia muita coisa rolando com enorme força. O País vivia um momento difícil, mas o Rio era nosso. Só nosso.
Você pegou onda com grandes nomes do surfe brasileiro, mas, pelo jeito, não tinha o mesmo talento dos caras. Eu peguei muita onda, mas acabei indo para outro caminho, para o teatro e a música. Vi toda essa moçada do surfe começar. Lembro de um dia que o mar estava muito agitado, uma grande ressaca, todo mundo meio cabreiro de pegar onda. Quando olho para o lado, vejo dois loirinhos caminhando em direção ao mar. A gente perguntou: "Vocês vão encarar? Estão loucos?" E eles: "Está na boa, está na boa". Eram o Pepê e o Pipi, os irmãos que viraram lenda em Ipanema (Pepê Lopes se tornou um dos maiores surfistas da história e, após migrar para o voo livre, morreu durante uma prova em Wakayama, no Japão, em 1991). O Pepê era um cara especial, o primeiro brasileiro a entrar no top ten do surfe mundial, bom em tudo que fazia, do hipismo ao voo livre.
Você não virou surfista, mas vocalista de uma banda de rock, a Blitz. E foi por acaso, não? Sim. O Asdrúbal estava dividindo o Teatro Ipanema com a Marina Lima. Primeiro entrava a gente e depois o show dela. Como os músicos da Marina chegavam antes para ver o Asdrúbal e a gente também ficava mais tempo pra ver o show dela, acabavam rolando umas jam sessions, um improviso. O Lobão, que era baterista da Marina, começou a se entrosar com o Ricardo Barreto, primo da Regina Casé, e o som foi saindo. A Blitz nasceu assim, do acaso, da união de duas turmas, de uma brincadeira. Um dia, fomos chamados pra tocar na abertura da boate Caribe, em São Conrado. Era preciso arrumar um nome para a banda, mas ninguém tinha a menor ideia. O Lobão lembrou da geral que a gente tomava toda vez que ia pegá-lo em casa pra ensaiar. Toda noite uma joaninha (Fusca, viatura da PM na época) parava aquela turma de cabeludos.
O Lobão sugeriu Blitz... É, e todo mundo adorou. Logo no primeiro show na boate Caribe a gente decidiu entrar no palco caminhando pela plateia, com um capacete de minerador que vinha com uma lanterna na cabeça. A galera tomou um puta susto. Achou que era blitz da polícia. Era outra Blitz.
"a blitz queria tOcar para O maiOr númerO de pessOas e ser recOnhecida pelas massas, NãO Só PELO GRUPINHO DA zONA SUL DO RIO"
O Lobão saiu e, hoje, toda vez que se refere à Blitz, diz que o grupo virou a “banda do Carequinha”, que não tem mais a mesma irreverência e ousadia dos primeiros anos. O Lobão tem essa característica de detonar todo mundo, mas tenho o maior carinho por ele. Acho que aprendi a codificar a metralhadora giratória. O Lobão sempre foi mais “black” e a gente mais colorido. Ele dizia: "Vocês vão acabar recebendo o Papai Noel no Maracanã". E a gente queria isso mesmo, tocar para o maior número de pessoas, tocar no Chacrinha, ser popular, reconhecido pelas massas e não só pelo grupinho da zona sul. A gente queria ser ouvido no Acre, por todas as classes. Tanto que acabamos mesmo tocando para o Papai Noel no Maracanã. Sem o Lobão, claro.
Não era só a polícia que pegava no pé de vocês. A Blitz também sofreu com a censura, não? Sim, censuraram várias músicas nossas. Eu me lembro que a Dona Solange (Solange Teixeira Hernandes, diretora do Departamento de Censura Federal), que sempre pegava no nosso pé, implicou com a letra "Betty Frígida". Minha mãe, decana da faculdade de letras da UFRJ, redigiu um texto, em meu nome, explicando que os palavrões eram importantes, que se tratava de uma poesia de rua, etc. e tal. E não é que a Dona Solange ficou emocionada e liberou "Betty Frígida" do jeito que nós fizemos?
O “menino do Rio” chegou aos 60. Mudou algo? Não. Eu nasci na praia, meu pai era vegetariano, faixa marrom de judô, montava a cavalo, tinha um sítio. Desde a minha infância sou ligado à natureza, sempre cuidei do meu bem-estar. Malho até hoje, com exceção do futebol de campo, que parei de
Fotos: Rui Mendes | Edu Ribeiro | Yahsuyoshi Chiba/AFP
"as manifestações sãO O trOcO pelOs anOs de descasO dO pOder públicO. NãO Dá MAIS PARA COLOCAR A SUJEIRA DEBAIxO DO TAPETE. O LIxO CRESCEU TANTO QUE ESTá Aí, ESCANCARADO" jogar por causa de problemas no joelho. Não gosto de falar de idade, dessas coisas, Quando eu me olho no espelho eu acho que tenho 35, no máximo 40 anos. Estou bem. Continuo fazendo shows com a Blitz, surfando e me reinventado como ator. Enquanto houver bambu, tem flecha.
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O maiOr jOgadOr da história dO vôlei brasileirO mOstra que, pOr trás da imagem de ídOlO infalível, está alguém que cOmete errOs dentrO e fOra das quadras por Lucas BesseL fotos pauLo mancini
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“QUATRO LATAS DE RED BULL E UM MAçO DE CIGARROS, POR FAVOR.” Gilberto Amauri de Godoy Filho, o jogador de vôlei Giba, se prepara para a sessão de fotos da 2016 com energéticos e nicotina. Ao seu lado, a linda namorada de 32 anos, a modelo Maria Luiza Daudt, opina sobre os figurinos escolhidos para a ocasião. “Esta camisa aqui é boa, vai funcionar direitinho em contraste com seus olhos”, diz. Giba concorda, mas descarta outra peça estampada, que classificou de “over”. O atleta sabe o que agrada. Aos 36 anos, com a experiência de quem conviveu por muito tempo com os bemvestidos esportistas italianos, combina calça, paletó e colete impecavelmente. Faz parte de seu papel de ídolo, de estrela, que representa com louvor, mesmo agora, no fim da carreira. “Além de jogador, sou um produto”, diz o maior nome da história do vôlei brasileiro. Ele não se preocupa em admitir que fuma – “jamais deixaria isso afetar meu desempenho em quadra” – e chama de demagogia as críticas a atletas que se associam a marcas de bebidas. “Você vende uma imagem como qualquer outra.” Giba é o melhor vendedor de si mesmo, mas apenas porque tem o que entregar. Venceu todos os títulos possíveis ao longo de 17 anos na seleção adulta de vôlei, foi capitão da geração mais vitoriosa da história do esporte no País e virou símbolo de um time que
não se entregava nunca, que arrebentava placas de publicidade nas quadras para salvar bolas impossíveis. Ao mesmo tempo, soube usar sua imagem de atleta bonitão, desejado pelas mulheres e invejado pelos homens, para construir uma carreira fora das quadras. Como um ídolo pop, adicionou doses de polêmica – um doping por uso de maconha e um divórcio conturbado, com acusações abertas em redes sociais, para ficar em dois exemplos – que o fizeram se aproximar ainda mais dos fãs. E, enquanto se prepara para aquela que deve ser a última temporada no esporte profissional, como jogador do Vôlei Taubaté, do interior de São Paulo, Giba olha para seu passado na seleção brasileira com serenidade. “Não fiz nem mais nem menos do que poderia. Fiz o justo.” O novo contrato e a nova namorada são boas notícias para Giba após um período atribulado, marcado pela frustrada mudança para o vôlei argentino e a separação da mãe de seus dois filhos, a ex-jogadora de vôlei romena Cristina Pirv, com quem foi casado por nove anos. O relacionamento acabou de forma explosiva em novembro de 2012, mas já vinha abalado desde o início daquele ano. Pouco depois de anunciar o fim da união no Twitter, Cristina disse que o divórcio foi motivado por “traição, baladas, festas e álcool”.
À 2016, ela afirma que se viu diante de um relacionamento do qual não queria mais fazer parte. “As informações (sobre as supostas traições) vieram até mim por torpedos, Skype, Messenger”, explicou. “Minha preocupação, agora, é com meus filhos.” Quando perguntado sobre as alegadas razões para o divórcio, Giba rebate: “Mulher ferida é difícil de lidar”, diz o atleta. “Eu não chegaria onde cheguei se fosse um drogado, um baderneiro que só pensa em mulherada.” Fato é que a divisão de bens do casal foi parar nos tribunais, um processo que, segundo Giba, “está bem bravo”. Hoje, o contato entre os dois só se dá por meio de advogados. “Ela chegou ao absurdo de incluir as minhas medalhas no processo”, afirma o jogador. Cristina nega e se mostra magoada com as alegações de Giba. “O que me intriga é que, durante todo o nosso casamento, ele fazia questão de dizer que o sucesso profissional dele era em razão da nossa parceria”, diz Cristina. “Agora, ele simplesmente parece esquecer do passado no que diz respeito à pensão e à partilha de bens.” Poucas brigas de marido e mulher se tornaram tão públicas quanto a de Giba e Cristina. Esse sintoma da era digital, em que a esposa anuncia a separação pelo Twitter – e é quase imediatamente respondida pela outra parte no Facebook –,
vai contra um dos princípios que o atleta diz seguir. “Uma coisa é o Giba, outra é o Gilberto”, diz. “Sempre procurei resolver a vida pessoal dentro de casa.” Neste episódio, no entanto, não houve divisão entre atleta e homem, entre estrela e pai. Cristina demonstra remorso pela forma como a crise matrimonial se tornou pública. “Aquilo (a exposição nas mídias sociais) foi um ato de desespero, um momento de liberação, o ponto final de que precisava”, afirma. “Não posso dizer que me arrependo disso, mas deveria ter sido mais racional, como sempre fui ao longo da minha vida.” Agora, eles buscam uma forma de manter a criação dos filhos sem traumas para ninguém. Giba tem direito a visitar o casal Nicoll, 9 anos, e Patrick, 5, em dois fins de semana por mês. “Sinto muita falta deles, porque sempre fomos muito próximos”, diz Giba. “Mas a nossa relação não mudou, e acho que o afeto até aumentou”, afirma o jogador. Regularmente, Giba vai a Curitiba para ver as crianças e também visitar o pai, Gilberto, e a mãe, Solange. Apesar de ter uma agenda cheia de compromissos, a vida de Giba está mais simples agora que ele vive definitivamente no Brasil. De 2001 a 2007, o atleta morou na Itália, onde jogou pelo Ferrara e pelo Cuneo. Em seguida, pas-
sou dois anos na Rússia defendendo o Iskra Odintsovo. Retornou ao Brasil em 2009 e, em 2012, foi à Argentina para atuar pelo Drean/Bolívar sob o comando do ex-técnico da seleção nacional Javier Weber. Embora o casamento já estivesse em crise, levou Cristina e os filhos para morar nos arredores de Buenos Aires. Chegou a matricular as crianças na escola, mas, pouco tempo depois, viu-se forçado a retornar ao Brasil. “Dei um ultimato porque fazia sete meses que eles não me pagavam”, explica o jogador. Giba ainda lamenta que o contrato com o clube argentino não tenha sido cumprido. “Enquanto joguei, ganhamos quatro dos cinco campeo-
natos que disputamos”, diz. Embora a direção do time nunca tenha apresentado justificativas oficiais, o atleta especula que a crise econômica tenha sido responsável pelo enrosco. Ao assinar o contrato (em dólares), a moeda americana valia 4,5 pesos. Quando começou a jogar, a cotação já tinha disparado para 9,2 pesos. “O que aconteceu na Argentina foi um desrespeito porque eles não falavam cara a cara, não davam explicações, não tentaram chegar a um acordo”, afirma Giba. “Pelo Weber, eu teria jogado até o final, mas foi impossível.” Recentemente, Giba acionou o Drean/Bolívar na Justiça para tentar receber os salários atrasados.
Como um í d olo pop, Gi b a ad i Ci on ou à Ca rre i ra d ose s de p olê mi Ca – um d opi n G por uso de ma Con ha e um d i vórCi o Con turb a d o, com acusações aber tas em r edes soci ai s, pa ra ficar em doi s ex emplos – q u e o f i zer am se apr ox i mar ai n da mai s dos fãs
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A força de ataque, a vibração e o bom humor que Giba levou ao time argentino sempre foram sua marca registrada. Eleito o melhor jogador do planeta, três vezes campeão mundial, ganhador de oito ligas mundiais, vencedor de uma medalha de ouro (Atenas-2004) e duas de prata (Pequim-2008 e Londres-2012), o esportista paranaense ganhou respeito e admiração. “É um cara fantástico, um ponto fora da curva”, afirma o técnico Bernardo Rezende, o Bernardinho, da seleção brasileira. Giba se aposentou do time nacional após a Olimpíada de Londres, em 2012. Em julho de 2013, no entanto, uma brincadeira do atleta com o treinador gerou rumores de que poderia voltar a vestir a camisa da seleção. Bernardinho descarta qualquer chance de isso acontecer. “O Giba brincou e disse: ‘Patrão, estou aí’. Mas chega uma hora que não dá mais”, diz o técnico. Em 2012, na final olímpica contra a Rússia (o Brasil levou uma histórica virada após começar vencendo por 2 sets a 0), ainda dava? Giba vinha de uma lesão – uma fratura na tíbia por estresse – e estava sem ritmo de jogo. Mesmo assim, Bernardinho o colocou em quadra quando os russos apertaram a partida. O resultado foi o pior possível. O ponta não conseguiu colocar uma única bola no chão. Parou no bloqueio russo. Perdeu a confiança. “Durante muitos anos, fui o cara da decisão”, diz Giba. “Mas é como a gente brinca: tem dia em que a noite é foda”, afirma, referindo-se especificamente àquele jogo. Para o atleta, é difícil julgar a decisão de Bernardinho agora, um ano depois. “O time russo mudou tudo, e aí entra o desespero, entra a adrenalina da Olimpíada, aquela coisa de não perder, e quando vai ver, já perdeu. A boa relação de Giba com Bernardinho sobreviveu a duras provas. A primeira delas aconteceu em 2002, quando o atleta testou positivo para maconha em um exame antidoping realizado na Itália. “Eu tinha acabado de
me separar da minha primeira mulher, tinha brigado com a minha família, estava num momento de merda”, diz. “E aí, porra, caiu, sabe? Como qualquer pessoa normal. Sabe aquele dia do foda-se? Ah, foda-se, a vida é uma merda, mesmo”, relembra, emendando palavrões sinceros para explicar por que cedeu à tentação durante uma festa realizada por amigos. Giba pegou a punição mínima – na contramão do pedido do Comitê Olímpico Italiano – e foi suspenso por apenas oito jogos, mas não deixou a seleção brasileira. O episódio também não rendeu prejuízos financeiros (com exceção da multa de 3.000 euros aplicada na Itália), já que os patrocinadores da época continuaram a apoiá-lo. Mesmo assim, Giba fez questão de vir ao Brasil para se desculpar publicamente. Ele afirma que aquela foi a única vez em que usou a droga e defende que a maconha continue a ser considerada doping. “É por uma questão de imagem do esporte, já que a gente vende saúde”, afirma. Ele não tem medo de falar do episódio nem de fazer piadas a respeito. No ensaio para a 2016, enquanto observa no monitor do estúdio uma das muitas fotos em que fez caretas, brinca: “Ó, esta aqui é da época do doping, com cara de doidão”. A segunda ocasião em que a dupla Giba/Bernardinho enfrentou turbulências foi em 2007, pouco antes do início dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro. O corte do levantador Ricardinho, um dos melhores amigos de Giba na época, ameaçou rachar a seleção brasileira e gerou o episódio mais polêmico – e menos esclarecido – da história do time nacional. Esse é um dos poucos assuntos sobre os quais o ponta paranaense quase não fala. “Houve uma cumplicidade muito grande entre os jogadores, a gente fechou a porta e resolveu dentro de casa”, afirma. “Peço desculpas, mas sobre isso eu não vou falar, e não me importo mais.” Há diversas pistas, no entanto, sobre o que teria levado à rusga entre Ricardinho e Bernardinho. A fala
“ó, e sta aqu i é d a é poCa d o d opi n G, Com C a ra d e d o i d ão” , d i z o b e m- h u mor ad o G i b a e n qu an t o ob se rva u m a das mu i tas foto s em q u e fe z ca re ta
do próprio Giba deixa claro o pano de fundo da confusão: “Quando há duas pessoas com personalidade muito forte, como o Ricardo e o Bernardo, isso acaba acontecendo.” A briga, de acordo com as versões mais aceitas, foi motivada por uma sequência de cobranças do levantador sobre o treinador em assuntos que variavam da qualidade da hospedagem oferecida ao time nas viagens ao número de folgas, passando, crucialmente, pela divisão de prêmios em dinheiro obtidos nas competições. “O Ricardo, como capitão, pleiteava os desejos dele de uma maneira que não era a mais correta, de uma maneira explosiva”, afirmou o levantador Marcelo Elgarten, o Marcelinho, em 2012. Quando o técnico optou pelo corte, Ricardinho esperava que Giba ficasse ao seu lado, que o defendesse junto ao treinador. O ponta, no entanto, permaneceu no grupo e se manteve fiel a Bernardinho, para desgosto do amigo. A relação com
na pele nas costelas, giba tem tatuada uma fênix, ave que representa sacrifício, renovação, renascimento e coragem
39 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
vôlei
Ricardinho, que ficou abalada em 2007, hoje é amigável, segundo o próprio Giba: “Sempre converso com ele e com as filhas dele”, diz. Em 2012, Bernardinho voltou a convocar o levantador para a seleção, encerrando uma briga que durou quase cinco anos. Brigas não são do feitio de Giba, segundo as pessoas próximas. “Ele é tranquilo, focado e empenhado”, diz o pai, Gilberto. “Sempre achei que ele chegaria longe no esporte por causa disso”, afirma o empresário paranaense, que se divorciou da mãe de Giba quando o garoto tinha 12 anos. “Ele é um cara extremamente divertido e esse é o traço mais forte da personalidade dele”, diz a namorada, Maria Luiza Daudt, apelidada de Malu, mas a quem o jogador chamava carinhosamente de “Caramelo” durante a realização das fotos. Giba e Malu ficaram juntos pela primeira vez no início de 2012, quando a relação do atleta com a ex-esposa começava a desmoronar. “A gente se encontrava nos eventos da confederação em que ela desfilava, mas era sempre como amigo”, explica. “Quando me separei da Cristina pela primeira vez, em janeiro de 2012, encontrei a Malu em Florianópolis e começamos a namorar”, diz Giba, que pouco tempo depois retornou para casa para “tentar resgatar o casamento”. Não deu certo. Desde novembro do ano passado, eles dividem a ponte aérea entre o Rio de Janeiro, onde mora Malu, e Curitiba, onde ficam os filhos de Giba. Agora, o roteiro terá que incluir Taubaté, casa do novo time do jogador. A questão poderia ser resolvida com um novo casamento? “Não, chega de casamento”, diz o atleta, com um sorriso no rosto. “No máximo ficar junto. Casar não dá mais, não.” Giba traz na pele as marcas que contam parte da história de sua vida. Nas costelas, do lado direito do tronco, tem a tatuagem de uma ave fênix, símbolo de renascimento, renovação, sacrifício e coragem. Próximo à cintura, no lado esquerdo, exibe um olho de hórus, figura egípcia que representa poder e proteção. No braço esquerdo, do cotovelo até o pul-
as Con qui st as de Gi ba Com a sel eção brasi l ei ra 1 ouro olímpico (atenas-2004) 2 pratas olímpicas (pequim-2008, londres-2012) 3 campeonatos mundiais (2002, 2006 e 2010) 8 ligas mundiais (de 12 disputadas) melhor jogador do campeonato mundial (2006, 2010) melhor jogador da liga mundial (2004, 2006, 2010) melhor jogador da copa do mundo (2007) melhor jogador da olimpíada (2004)
so, uma cicatriz bem aparente relembra o acidente que o atleta sofreu aos 11 anos. Ao brincar de esconde-esconde perto de sua casa em Londrina, no Paraná, Giba subiu em uma árvore, mas pisou em um galho que não aguentou seu peso. Caiu e teve o braço literalmente rasgado por uma lança de portão. “Dava para ver o osso”, diz. O episódio não deixou sequelas, mas se somou à lista de “quase mortes” de Giba, que quando bebê teve leucemia e precisou passar por um tratamento que durou nove meses. “Eu brinco que sou o patinho feio da família”, diz. “Meus pais tinham um monte de negócios, mas, quando cheguei, todo mundo ficou pobre.” Se Giba acha que o dinheiro gasto com remédios e tratamentos foi em vão, seu pai tem certeza. “O tratamento não resolveu nada, inclusive o médico o tinha desenganado”, afirma Gilberto. Mas como, então, o menino
pessoal e profissional giba com os filhos e a ex-mulher cristina pirv, de quem se separou em 2012, e em jogo contra a polônia durante a liga mundial de 2011
o que d i ze m so b r e Gi b a “É UM CARA FANTáSTICO, UM PONTO FORA DA CURVA” Bernardo rezende, o bernardinho, técnico da seleção brasileira
“É FAMOSO USUáRIO DE DROGAS PROIBIDAS” Wikipédia
“ELE É TRANQUILO, FOCADO E EMPENHADO” gilberto de godoy, pai
“ELE FAzIA QUESTãO DE DIzER QUE O SUCESSO PROFISSIONAL DELE ERA EM RAzãO DA NOSSA PARCERIA. AGORA, ELE SIMPLESMENTE PARECE ESQUECER DO PASSADO NO QUE DIz RESPEITO À PENSãO E À PARTILHA DE BENS” cristina pirv, ex-jogadora e ex-esposa
“ELE É UM CARA ExTREMAMENTE DIVERTIDO” maria luiza daudt, modelo e namorada
“ELE NãO ERA O AMIGO QUE EU PENSAVA QUE FOSSE. IRMãO E AMIGO SãO COISAS COMPLETAMENTE DIFERENTES”
ricardinho, levantador, em 2008, um ano depois de ser cortado da seleção brasileira. segundo ele, giba poderia tê-lo defendido
“ACHO QUE A BRIGA Já ACABOU, E ESTá BEM CLARO PARA TODO MUNDO” ricardinho, levantador, em 2012, na Olimpíada de londres
produção: cintia sanchez agradecimentos: calvin Klein, crawford, dc shoes, siberian, coca-cola clothing, aramis e Jorgito donadelli
“ uma G e ra çã o inte i ra foi le mb ra d a Como pra ta . a outra , d e 1 992, vi rou a G e ra çã o d e o uro. pOr mi m, pO ssO ser a geraçãO de u m OurO e d uas pratas. tá bOm, né? ”
se livrou da doença? O pai atribui a cura à religião. “Uma tia que era espírita fez umas orações.” Desde o início, nas equipes infantojuvenis no Paraná, até o posto de capitão da seleção brasileira, Giba sempre soube tirar proveito de sua personalidade cativante. Quando abre os impressionantes olhos azuis, mulheres de todas as idades se derretem. O atleta entendeu seu papel como ídolo também fora das quadras. Tanto que chama os fãs de “meu público”, como um publicitário que define o target de uma campanha ou o humorista de stand-up que cria uma sequência específica de piadas. “Meu público vai dos 5 aos 90 anos”, afirma. “As senhoras falam: ‘Ai, meu Deus, se você chegar perto de mim, vou desmaiar’. E eu vou, brinco, pego, abraço”, diz. Embora de forma quase involuntária, Giba também usou seu talento como marqueteiro para criar um personagem dentro das quadras. Chamado de “El Bigodón”, esse era o Giba das finais importantes, quando sempre ostentava um senhor bigode de causar orgulho no mais tradicional dos machos. E tudo começou com o ouro em Atenas-2004. “Eu falei: ‘Ah, estou com preguiça, não vou fazer a barba. Minha mulher não está aqui, mesmo’. E deixei a barba crescer.” Na semifinal, para não repetir o figurino, o atleta optou pelo cavanhaque. Por superstição ou diversão, quando chegou à final, Giba decidiu mudar novamente, e raspou os pelos da cara até deixar apenas o bigode. A vitória sobre a Itália, por 3 a 1, foi arrasadora. “Isso ajudou a reforçar a imagem do cara que assusta o adversário”, afirma. É assim que Giba quer ser lembrado quando deixar o vôlei? Como o cara que causava medo, que não perdia? “Uma geração inteira foi lembrada como prata”, diz o atleta sobre o time de vôlei brasileiro que conquistou o segundo lugar na Olimpíada de Los Angeles, em 1984. “A outra, de 1992, virou a geração de ouro”, afirma. “Por mim, posso ser a geração de um ouro e duas pratas. Tá bom, né?”
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ENCARCERADO O búlgaro Galabin Boevski, campeão olímpico no levantamento de peso, posa para a 2016 na sala dos professores da penitenciária de Itaí, no interior de São Paulo, onde cumpre sentença de nove anos de detenção
Um ca m peão o l í m pi co a trás da s g ra de s No lugar da areNa, o pátio do presídio. em vez de pesos e halteres, garrafas pet com água. coNheça a rotiNa de galabiN boevski, halterofilista búlgaro, medalhista de ouro e recordista muNdial seNteNciado a Nove aNos de prisão No brasil por tráfico iNterNacioNal de drogas por Larissa VeLoso, foto frederic jean, ag. istoé
Os mais de 1,3 mil trancafiadOs na penitenciária de itaí, região de itapetininga, interior de são paulo, são uma plateia pequena se comparada à multidão que acompanhou – ao vivo e pela tevê – a final olímpica do levantamento de peso na olimpíada de sydney, em 2000. Na ocasião, o búlgaro galabin boevski ergueu 196,5 kg na prova de arremesso, praticamente três vezes seu próprio peso, e estabeleceu um novo recorde mundial na categoria leve, com um total de 357,5 kg, somando-se a prova de arranque. aquele foi o auge da carreira de um atleta brilhante, um dos mais técnicos que a modalidade já viu. hoje, os únicos que têm o privilégio de vê-lo levantar pesos são os outros detentos da cadeia paulista onde boevski está preso por tráfico internacional de drogas. foi lá que o búlgaro recebeu a reportagem da 2016, na tarde de uma segunda-feira de julho que não começou de forma muito promissora. “eu estou aqui para falar de esporte e das medalhas que ganhei. se não for assim, não vai ter entrevista.” pela terceira vez a mesma frase era traduzida pela intérprete búlgara, que já dava sinais de impaciência. apesar de ter autorizado a conversa, boevski, 38 anos, se recusava terminantemente a falar sobre o episódio que o levara até a penitenciária cabo pm marcelo pires da silva. a cadeia, que leva o nome do policial assassinado a tiros de fuzil durante uma ação de resgate de presos na rodovia castello branco, em 2001, é a casa do búlgaro há quase dois anos. em 2011, o ex-atleta acompanhava uma das filhas a um torneio de tênis em camboriú, santa catarina, e deveria retornar à bulgária no dia 25 de outubro. uma inspeção de rotina na bagagem despachada por ele no aeroporto internacional de guarulhos, em são paulo, selou seu novo destino. agentes da polícia federal encontraram nove quilos de cocaína escondidos nos forros de três malas. o campeão olímpico e recordista mundial foi preso e, em maio do ano seguinte, condenado a nove anos de reclusão.
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desde o fatídico episódio no aeroporto de cumbica, boevski espera o dia em que será mandado de volta para a bulgária. “só quero sair daqui o mais rápido possível”, disse, em um dos poucos desabafos durante a entrevista. o mais rápido não será rápido o bastante: sua pena – até quatro anos mais longa do que a de outros estrangeiros condenados pelo mesmo crime, graças à especial severidade da juíza – termina apenas em 2020. o ex-atleta já teve a expulsão do país decretada, mas, de acordo com seu atual advogado, Jackson Nilo de paula, terá de cumprir a sentença até o fim. hoje, o defensor tenta aprovar recursos para que a pena de boevski seja reduzida. o ex-atleta, no entanto, não soa otimista. Quando perguntado o que pretende fazer quando deixar a prisão , é categórico: “primeiro preciso sair”, diz. “depois vou pensar no que fazer.” enquanto boevski, a intérprete e eu conversamos, um dos guardas lê descontraidamente uma revista no fundo da sala. longe de se parecer com uma prisão, o cômodo é composto por mesas, cadeiras e estantes, já que funciona como sala de reuniões para os professores que dão aulas aos presidiários. ao lado, a biblioteca da penitenciária abriga cerca de 16 mil livros escritos em 35 idiomas. É possível encontrar poemas do chileno pablo Neruda em inglês ou o clássico drácula, do irlandês bram stoker, em alemão. a biblioteca multilíngue tem razão de ser: é nesta cadeia que se concentram todos os presos estrangeiros do estado de são paulo. entre eles, pelo menos 15 são búlgaros, mas a maioria é composta por nigerianos (355), bolivianos (130), peruanos (118), paraguaios (78) e angolanos (70). mais de 80% estão na prisão pelo mesmo motivo que boevski: tentaram embarcar para fora do país com drogas escondidas nas bagagens ou até dentro do estômago. o segundo crime mais comum, em larga desvantagem, é o furto, que corresponde a 7% das condenações. a penitenciária cabo pm marcelo pires da silva é, de fato, peculiar. cerca de 20% dos presos estudam. outros 45% trabalham nas oficinas, onde montam os uniformes que eles mesmos usam no dia a dia. alguns ainda se dedicam à horta, onde são plantados os vegetais que abastecem a cozinha. segundo dados do censo interno, 11% deles têm curso superior e 41% completaram o ensino médio. o índice de analfabetismo é de apenas 1%. mensalmente, a biblioteca empresta cerca de mil livros, quase um por detento.
mesmo assim, itaí ainda é uma prisão e chegar à sala de entrevistas não foi fácil. além da viagem de mais de três horas desde são paulo, fotógrafo, repórter e intérprete tiveram que passar, claro, por uma meticulosa revista. depois dessa etapa, fomos novamente revistadas – a intérprete e eu – por agentes femininas. sem os sapatos e pertences, passamos pelo detector de metais. por mais que eu não carregasse nada comigo, ele apitava todas as vezes. o motivo: minha calça jeans tinha um fecho com dois botões de metal. “Normalmente, quando tem alguma coisinha além de um botão normal, a máquina já detecta”, explica uma das funcionárias. tenho, então, que ir até outra salinha e vestir uma calça de moletom oferecida pela penitenciária. depois de passar novamente pelo detector sem que ele apitasse, volto para colocar meus jeans, dessa vez vigiada por uma agente. mas a revista ainda não terminou. após sair por uma porta de metal, chegamos a um pátio e entramos em outra sala, na qual há um aparelho de raio X semelhante aos usados em aeroportos. passo meu caderno, caneta e dois exemplares da 2016 pela máquina. depois, é a vez dos sapatos, que também são checados por funcionários. mais trabalhosos foram os equipamentos do fotógrafo. flashes, câmera e objetivas foram retirados da mala e vistoriados, após passarem pelo raio X. finalmente na sala da entrevista, pergunto a boevski se os outros presos o admiram por sua condição de atleta campeão olímpico. Quase indignado, ele refuta a ideia. “aqui é um presídio”, diz.
“Aqui, eu sou iguAl A todo mundo.” tornar todos iguais diante do sistema é um dos objetivos das prisões. os detentos de itaí, sem exceção, usam camiseta branca e calça bege. pelos corredores frios, sobre o chão de concreto amarronzado, de paredes cinzas, teto branco e luzes fluorescentes, caminham com as mãos para trás e a cabeça baixa. portões e grades, feitos de aço pintado de azul, são trancados manualmente com pesados cadeados. vale a regra de toda cadeia: uma porta nunca é aberta sem que a anterior esteja fechada. de acordo com o diretor da penitenciária, fernando ricardo renesto, o búlgaro é discreto e nunca se envolveu em brigas ou atos de indisciplina. “o tratamento para ele é o mesmo que para os demais presos”, diz. “com a diferença de que costumamos receber mais pedidos de entrevistas com ele, principalmente da imprensa búlgara.” apesar disso, o interesse pelo caso tem diminuído com o passar do tempo. em novembro de 2011, quando foi transferido do cadeião de pinheiros, na capital paulista, para itaí, a situação de boevski chegou a gerar um relatório do embaixador interino da bulgária para o ministério das relações exteriores daquele país. Nele, o diplomata dizia que o atleta estava bem fisicamente, mas em estado de choque emocional. “ele simplesmente não aceita o fato de estar na prisão”, reportou. Na mesma ocasião, o então advogado do campeão, ivaylo dermendzhiev, afirmou à imprensa que boevski tinha sido “abusado” por outros detentos no cadeião de pinheiros. hoje, o drama humano tem bem menos apelo, mesmo na bulgária. AUGE: Galabin faz careta ao erguer três vezes o próprio peso para conquistar o ouro em Sydney-2000. Ao lado, fatura o Mundial de 1999, em Atenas, na Grécia
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enquanto boevski permanece preso no brasil, sua família tenta se adaptar à nova realidade. a mulher se mudou para são paulo com dois dos três filhos do casal. Quando soube que uma reportagem sobre seu marido seria escrita, krasimira boevska se dispôs a contar toda a história pessoalmente. também se prontificou a fornecer todas as informações que fossem necessárias para “provar a inocência de galabin”. as promessas, no entanto, não se cumpriram. pouco depois de conversar com o marido, ela sentenciou que a entrevista com boevski havia sido suficiente e que não havia necessidade de mais palavras sobre o assunto. a dedicação de krasimira ao companheiro impressiona. “Qualquer coisa que disser será pouco para expressar o que sinto por esse homem”, afirmou em um dos e-mails trocados com a reportagem. “É um homem incrivelmente interessante, um bom marido e ótimo pai.
eu iriA Até o fim
do mundo por ele, porque eu Acredito nA inocênciA dele.”
além de ter se mudado para um país desconhecido trazendo as filhas, ela é uma das poucas visitantes regulares da penitenciária de itaí (a maioria dos detentos recebe apenas cartas) e acompanha o andamento do caso de perto. foi dela a iniciativa para a troca de advogados que aconteceu no início de 2012. também partiu de krasimira a ordem para que o defensor não passasse à reportagem nenhuma informação que não fosse sobre os trâmites do processo. “Nos últimos dois anos, nossa família foi muito ferida pelos jornalistas como um todo”, explicou. “acho que, compreensivelmente, nos incomoda um país onde aconteceu o pior pesadelo de nossa família.” acima de tudo, boevski parece o tipo de pessoa que cuida meticulosamente da própria imagem. esse traço se revela em pequenos detalhes da aparência, como a
cabeça bem raspada, a barba bem-feita, as sobrancelhas desenhadas e as unhas impecavelmente limpas e cortadas. apesar de não praticar mais o halterofilismo competitivo desde 2004, ainda conserva bíceps e peitoral musculosos. de acordo com os guardas, a forma atlética é fruto do treinamento que os presidiários fazem com garrafas pet cheias de água amarradas a bastões. a academia, que fica em uma sala separada das celas, é visível pelo lado de fora do presídio, se alguém se aventurar pelos canaviais que cobrem o solo da região. além da aparência física, boevski é extremamente cuidadoso com sua imagem pública. mesmo sem entender bem o português, vigia as notas que tomo e corrige expressões que considera inadequadas. também se recusou a aparecer em qualquer foto que o retratasse no ambiente da prisão. Quando finalmente foi convencido a tirar a camiseta para um retrato, o guarda penitenciário proibiu categoricamente. “ele me pareceu uma pessoa inteligente, com a cabeça muito focada, talvez uma qualidade que veio dessa vida de atleta”, diz o primeiro advogado brasileiro do caso, leandro pereira. a preocupação com a maneira como é apresentado não é para menos. dono de uma carreira meteórica no levantamento de peso, boevski é reconhecido no mundo todo como um dos grandes atletas búlgaros. em 1999, depois de faturar o campeonato mundial, foi eleito esportista do ano em seu país. além de conquistar o ouro olímpico, quebrou 11 recordes mundiais, um dos quais ainda detém. segundo boevski, a carreira como halterofilista começou como brincadeira, mas virou coisa séria quando ganhou os primeiros campeonatos, aos
13 anos. entrou para a seleção búlgara e venceu o primeiro título mundial aos 25. em uma das nações mais pobres da europa, logo percebeu que seu papel transcendia o esporte. “Quando eu era criança, tinha vários ídolos”, diz. “mas, hoje, quem tem que ser ídolo sou eu.” mesmo dez anos depois de suas últimas vitórias, os vídeos de boevski levantando quase 200 quilos ainda fazem sucesso no Youtube. É possível ver as imagens do jovem halterofilista dando saltos de felicidade depois de quebrar o recorde mundial e conquistar a medalha de ouro em sydney. Quando pergunto sobre a sensação de subir no pódio olímpico, ele baixa a guarda. “Não tem como descrever em palavras” afirma, emocionado. “É o topo da carreira de qualquer atleta, o topo da emoção.” a carreira do atleta que ainda estava no auge aos 29 anos acabou subitamente. No fim de 2003, ele e outros dois halterofilistas búlgaros foram acusados pela federação internacional de levantamento de peso (iWf) de forjar o resultado do antidoping. as três amostras submetidas pelos atletas, que testaram negativo para substâncias proibidas, na verdade vinham de uma só pessoa. um exame de dNa confirmou que a urina não era de nenhum dos três halterofilistas. boevski jurou inocência e questionou como poderia ter enviado uma amostra falsa se fora vigiado durante todo o exame por agentes da federação. Não adiantou. como era reincidente (já havia falhado no teste em 1995), foi suspenso do esporte por oito anos. mais tarde, o escândalo do doping entre os halterofilistas búlgaros estourou: todos os 11 atletas que disputariam os Jogos de pequim, em 2008, falharam nos testes. o campeão nega ter utilizado substâncias
no julgAmento, em 2012, A tese
dA defesA foi A de que A drogA já estAvA escondidA nAs mAlAs quAndo o búlgAro As comprou no brAsil, ou que o mAteriAl foi colocAdo nA bAgAgem por AlgumA pessoA no hotel
proibidas e se recusa a estender o assunto. “Não fui pego no doping, não foi isso que aconteceu”, diz. “meu bom desempenho foi fruto de inúmeras horas de treinamento e muita persistência.” ele demonstra a mesma decisão quando fala sobre lesões e problemas físicos. “Nunca tive nenhum problema de lesão”, afirma. Não é verdade. pouco depois de conquistar o mundial de 1999, boevski passou por uma cirurgia. em sydney, após garantir o ouro, sua primeira atitude foi beijar o joelho esquerdo, operado poucos meses antes. Na última década, a vida de boevski tem sido uma sucessão de negações. apesar da prisão em flagrante no aeroporto de guarulhos, o ex-atleta nunca parou de alegar inocência. “ele sempre negou”, disse o advogado leandro pereira. “Negou para mim, inclusive.” No julgamento, em 2012, a tese da defesa foi a de que a droga já estava escondida nas malas quando o búlgaro as comprou no brasil, ou que o material foi colocado na bagagem por alguma pessoa no hotel. para a promotoria, a história não é plausível. a acusação argumentou que não faria sentido um traficante abandonar quase meio milhão de dólares em cocaína em malas que seriam vendidas. a juíza maria isabel do prado, da 2ª vara federal, foi ainda mais severa. em sua sentença, disse que seria impossível o acusado não ter percebido o peso adicional das bagagens na hora da compra. afirmou, ainda, que boevski tirou vantagem de seu status de celebridade internacional e que usou o torneio de tênis da filha em santa catarina como desculpa para cometer o crime. o búlgaro não se importa com as evidências. “eu sei quem eu sou e sei que não fiz nada”, disse. “os outros podem dizer o que quiserem.” enquanto isso, aguarda e sonha com o dia em que voltará à bulgária, onde, depois de se aposentar do esporte, era dono de duas academias. “independentemente do que aconteceu, estou esperando meu tempo passar aqui.”
IMAGEM: Galabin Boevski é vaidoso. Mantém a cabeça perfeitamente raspada, a barba impecavelmente aparada e as sobrancelhas desenhadas. Apesar de estar sem competir há quase dez anos, cultiva forma física invejável dentro da cadeia paulista
depois da fama
Por que abandonaram ronaldo?
Único brasileiro vivo que quebrou um recorde mundial no atletismo, o ex-maratonista ronaldo
da costa viu os dirigentes darem as costas, os amigos sumirem e o dinheiro desaparecer. agora, ele tenta reconstruir a vida no distrito Federal
por pedro marcondes de moura, de Ceilândia fotos adriano machado
O endereçO tem nOme pOmpOsO: Condomínio Privê. Basta circular pelo bairro, porém, para ver outra realidade. Ruas estreitas, casas simples e botecos em cada esquina dão a dimensão desse violento distrito de Ceilândia, cidade-satélite de Brasília. Ali, numa espécie de pensão com 14 apartamentos de 30 metros quadrados e varais espalhados pelos corredores, uma lenda do esporte brasileiro tenta recomeçar a vida. Trata-se do fundista mineiro Ronaldo da Costa, 43 anos. Apesar de a maioria dos vizinhos desconhecer os seus feitos, ele é um dos quatro brasileiros a cravar um recorde mundial no atletismo. Ao seu lado na lista figuram apenas os já mortos Adhemar Ferreira da Silva, Nelson Prudêncio e João do Pulo. A maior façanha de Ronaldo se deu na Maratona de Berlim, em setembro de 1998, quando estabeleceu a então melhor marca mundial da modalidade: duas horas, seis minutos e cinco segundos. Mais de 14 anos depois, ele permanece como recordista brasileiro e sul-americano. Em uma manhã de sábado, a 2016 encontrou-se com Ronaldo da Costa. Ele acabara de sair do trabalho no Instituto Joaquim Cruz, localizado no Centro Olímpico de Ceilândia. Lá, dá expediente como auxiliar técnico em um projeto de alto rendimento com 30 jovens de 18 a 21 anos. Ainda no carro, ele mostra o comportamento irreverente. Brinca com os alunos, perturba o motorista, faz graça com o fotógrafo e o repórter. Seria assim o dia inteiro com as pessoas que cruzassem o seu caminho. Os amigos invariavelmente falam dele como alguém que “é brincalhão o tempo inteiro.” Ronaldo realmente estampa uma alegria permanente – tão cativante quanto enigmática. Em dado momento, parece ser um alienado que desconhece a maldade do mundo. Em outro, encarna o típico malandro brasileiro. É de se pensar se essa felicidade exagerada não seria um escudo ao qual recorre para evitar assuntos fora da sua zona de conforto.
o REComEçaR: depois de anos de ostracismo, o ex-recordista mundial Ronaldo da Costa volta ao mundo esportivo em Ceilândia, cidade-satélite de Brasília
depois da fama
novos tEmpos: após gastar o dinheiro conquistado no atletismo e viver períodos de dificuldade, Ronaldo faz planos para deixar o quarto de 30 metros quadrados que fica numa espécie de pensão na cidade de Ceilândia, no Distrito Federal
Ao entrar em casa, Ronaldo se justifica pela bagunça. Recolhe roupas de cima do sofá, pega banquinhos na cozinha e pede para os convidados sentarem. No canto da sala do apartamento há um colchão e uma dezena de caixas com utensílios domésticos e roupas de cama. Não existem objetos decorativos, quadros ou fotos de familiares. A exceção é um pôster comemorativo à façanha na Maratona de Berlim, em setembro de 1998. Nele, além de seu retrato, aparece o tempo do recorde mundial. Berlim 1998 está presente no endereço de e-mail de Ronaldo e dá nome ao sítio que ele possui em São João Nepomuceno. A prova alemã não foi o único feito de sua carreira. “Tenho muito carinho pela conquista da São Silvestre em 1994”, diz. Com a vitória, ele encerrou um jejum de nove anos sem conquistas de atletas nacionais na principal prova de rua do Brasil. Enquanto oferece um café – Ronaldo bebeu sete xícaras durante a reportagem –, ele relembra a infância e a juventude. Nascido na cidade mineira de Descoberto, na Zona da Mata, começou a trabalhar cedo. Aos sete anos, entregava a marmita do pai, que cultivava um lote em troca de ceder parte da produção ao dono do terreno. Depois, Ronaldo passou a pegar pesado na enxada. Só deixou os afazeres
na zona rural aos 14 anos. Na época, conseguiu um emprego mais rentável, de meio salário mínimo, produzindo tijolos na olaria da prefeitura local. “A vida era dura para todo mundo lá em casa”, lembra. A mãe trabalhava como empregada doméstica. Os outros 11 irmãos também contribuíam para complementar o orçamento. Junto com seu irmão gêmeo, Romildo, Ronaldo é o caçula da família. “O Romildo até treinou por um tempo, mas desistiu”, diz o ex-recordista mundial. Hoje, Romildo é açougueiro em Juiz de Fora, Minas Gerais. O primeiro contato com o atletismo foi tardio para os padrões do alto rendimento: prestes a fazer 17 anos. Ao andar pela cidade, viu um cartaz sobre uma corrida de rua de Descoberto. O prêmio para o primeiro lugar era de 1,5 mil cruzeiros. Ronaldo ficou em segundo e faturou 500 cruzeiros. “O homem que venceu era 15 anos mais velho, tinha experiência e até tênis bom”, diz. Em outra prova, deu o troco. “Aí o Ronaldinho ganhou.” Frequentemente refere-se a si mesmo, quando fala do atleta, na terceira pessoa. O passo seguinte foi competir em cidades vizinhas até ir a Juiz de Fora. Lá, trabalhava no almoxarifado de uma empresa, treinava e competia. Chegou a se destacar liderando o ranking da modalidade da
cidade. “Uma hora vi que não tinha dinheiro nem para comer e voltei a morar em Descoberto.” diz. Ronaldo é inquieto, não para de se mexer. “Hoje até que estou sossegado. Na infância, era hiperativo, perturbava todo mundo.” O salto na carreira veio no começo da década de 90. Foi convidado a competir e treinar na equipe Pé de Vento, em Petrópolis. Passou a ter o acompanhamento de Henrique Vianna, responsável pela carreira dos principais fundistas brasileiros. Em 1994, obteve o primeiro grande marco esportivo ao vencer a São Silvestre. O título foi comemorado com desfile em carro de corpo de bombeiros, distribuição de chope e muito discurso na cidade do interior mineiro. Parecia que tudo daria certo, mas ele encontrou obstáculos. Após vencer outras corridas, sofreu uma lesão no calcanhar, que o acompanha até hoje. Ademais, como ele próprio reconhece, uma boa dose de deslumbramento atrapalhou seus planos futuros. Nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, nem sequer conseguiu passar das etapas preliminares na prova dos 10 mil metros. “Talvez tenha deixado o sucesso subir à cabeça”, diz. “Na minha época, os atletas não tinham essa assistência de hoje, como psicólogo. Agora, o cara ganha uma prova qualquer e já tem agente, assessor.”
A redenção veio em setembro de 1998. Em Berlim, desembarcou sem responsabilidades. No começo da prova, acompanhou os pelotões intermediários. Aos poucos, foi aumentando o ritmo, de modo a terminar a primeira metade da corrida na liderança. Dali em diante, fez algo incomum entre os maratonistas. Sentindo-se bem, imprimiu no segundo trecho uma velocidade ainda maior que no anterior. “Olha o filho do diretor da prova falando que, se eu continuasse naquele ritmo, ia bater o recorde”, diz, enquanto exibe para este repórter o vídeo da corrida histórica. No final dos 42 quilômetros, Ronaldo, então com 28 anos, cravou o recorde mundial com a marca de duas horas, seis minutos e cinco segundos. Saiu da corrida sem sinais de cansaço. Deu cambalhotas, concedeu entrevistas e correu à procura do empresário. As roupas e o troféu foram oferecidos ao treinador dessa época: Carlos Alberto Cavalheiro, técnico também do medalhista olímpico Robson Caetano. Desde a conquista, Ronaldo ainda não realizou o sonho de voltar a Berlim. De uma hora para outra, o atleta viu os holofotes virarem para si. Jornalistas brasileiros e de outros países disputavam entrevistas. O seu feito foi publicado com destaque no jornal americano “The New York Times”. Além de receber US$ 200 mil em premiações, passou a ser requisitado por fornecedoras de materiais esportivos e outros patrocinadores interessados em vincular sua marca ao novo recordista. O cachê para disputar corridas de rua, então de R$ 7 mil, multiplicou-se. Na cidade natal, foi recebido com ainda mais festejos do que depois da conquista da São Silvestre. Além da distribuição de bebidas pagas por um deputado estadual em campanha, Ronaldo recebeu outros mimos. A prefeitura do município, de cerca de cinco mil habitantes, decretou feriado. Crianças elaboraram na escola um hino para recepcionar o recordista, que chegou num helicóptero cedido por uma emissora de televisão. “Quando você está por cima é só festa, todo mundo quer estar ao lado do campeão”, constata,
um tanto chateado. O maratonista diz se ressentir principalmente da aproximação de políticos, que depois o abandonaram. Cerca de um ano depois, Ronaldo viu sua marca ser superada pelo marroquino Khalid Khannouchi na Maratona de Chicago (EUA). Coincidência ou não, a carreira do mineiro entrou em declínio. Ele voltou a sofrer com lesões, deixou de participar de competições importantes e não obteve o índice para os Jogos Olímpicos de Sydney, em 2000. Fora do atletismo, os problemas também se acumularam. Em dezembro de 1998, o maratonista se envolveu em uma confusão. Ao renovar a carteira de motorista usada desde 1993, o documento foi apreendido por ser falso. “Eu não sabia que era cópia”, defende-se. “Paguei R$ 200 e um sujeito que se dizia policial me entregou.” Ele diz que não desconfiou do fato de não ter precisado fazer exames para obter a habilitação. A história acabou se tornando um inquérito na Justiça mineira. Ronaldo passou por outra situação estranha em 1999. Segundo a versão da época (mantida até hoje), um jovem atleta que residia em sua casa contou que homens estariam atrás dele para cobrar uma suposta dívida. “Nunca devi a ninguém”, diz o ex-recordista. “Sempre fui correto, não me envolvo com bandidagem.” Mesmo não sabendo quem o ameaçava e a razão de fazerem isso, registrou um
boletim de ocorrência e partiu para um exílio temporário nos Estados Unidos. “Acho que o atleta queria que eu o levasse para treinar nos Estados Unidos e arrumou esta história”, afirma Ronaldo. Depois ele se envolveu em outra confusão. Seu automóvel bateu em um carro que levava uma família inteira. O veículo desceu uma ladeira enquanto Ronaldo tentava abrir a porta do passageiro, sem perceber que o freio de mão não estava puxado. Por sorte, ninguém se machucou com gravidade. Depois de sucessivos resultados ruins, Ronaldo se aposentou oficialmente aos 33 anos, em 2003. “Com tudo que aconteceu, estava desmotivado”, diz. Questionado sobre os motivos de nunca mais ter repetido os resultados da maratona de Berlim, ele se esquiva com brincadeiras e tenta mudar de assunto. De repente, volta à questão. “Sempre me pergunto o que aconteceu, se foram as lesões, a pressão, a falta de foco, os problemas”, diz. “Mas não consigo saber.” Com o tempo livre, ele passou a ficar em tempo integral no município de São João Nepomuceno. Em 1995, o maratonista havia mudado para a cidade vizinha, Descoberto. Lá, atualmente, vivem sua ex-mulher Carla e a filha Victória, 13 anos. A relação de Ronaldo com as duas cidades da Zona da Mata, segundo ele, é esquisita. Ao mesmo tempo que se refugiava nelas, acredita que não recebeu a
Ronaldo passou poR váRias situações estRanhas. em 1999, paRtiu paRa o exílio nos estados unidos, depois de descobRiR que estavam atRás dele paRa cobRaR uma dívida. ele só não lembRa que dívida eRa essa 51 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
depois da fama
EXpERIÊnCIa: Ronaldo trabalha atualmente como auxiliar-técnico de um programa de alto rendimento para jovens do Instituto Joaquim Cruz, no Distrito Federal. para conseguir o emprego, ele teve que garantir que voltaria a estudar
gratidão devida. Na verdade, lá o ex-atleta se sentia à vontade, mas isso prejudicou sua própria carreira. Ao se afastar dos principais centros esportivos do País, Ronaldo perdeu a chance de se manter no topo. No final, foi esquecido. Um dos maiores símbolos da perda de interesse nele se deu na comemoração dos dez anos da conquista de Berlim. O recordista precisou fazer uma maratona com crianças para se auto-homenagear. “Cansei de receber tapinhas no ombro em época de eleição”, diz. “Queria que respeitassem a minha história. O esporte vai. O que fiz fica.” Ronaldo deixa escapar o tempo todo a insatisfação com a falta de reconhecimento. Ficou especialmente magoado com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que não o homenageou pela façanha em Berlim. O maratonista não teve a preocupação de zelar pelo dinheiro obtido no auge. Não foram poucas as extravagâncias que cometeu. A cada oito meses, trocava de carro. Comprou dois apartamentos e perdeu ambos por pagar apenas a entrada dos imóveis. Tinha obsessão por tênis de corrida. Além dos pares recebidos dos patrocinadores, comprava outras dezenas mensalmente. “Eu era inexperiente para administrar o dinheiro”, admite. Mas ele atribui parte das perdas ao então agente,
o colombiano Luis Felipe Posso. Diz que o empresário, em vez de repassar os ganhos, pagava com atraso – e parcelado. Ronaldo perdeu muita coisa. Para sobreviver, chegou a vender óleo de cozinha usado. Ganhava R$ 60 por dia. “A minha filha disse que eu estava louco”, afirma. “Mas prefiro capinar, fazer qualquer trabalho a pedir favor.” A nova oportunidade de se reerguer veio por acaso. Em março de 2010, foi convidado pelo ex-atleta Anísio da Costa Tavares para apadrinhar uma prova de crianças em Ceilândia. Ele não receberia nada, mas aceitou o convite. “Quando eu falava que o Ronaldo da Costa viria, ninguém acreditava”, diz Anísio, responsável por convencer os diretores do Instituto Joaquim Cruz a contratar o ex-recordista mundial. De início, a ideia foi recusada pelos dirigentes, que temiam o comportamento instável do maratonista. O emprego foi oferecido com a condição de ele retomar os estudos, que haviam sido interrompidos na oitava série. Recentemente, Ronaldo passou para o segundo ano do ensino médio no supletivo. Em abril de 2012, Ronaldo desembarcou no Distrito Federal com apenas R$ 600 no bolso para ser assistente técnico do Instituto Joaquim Cruz. A passagem de avião foi parcelada no cartão
de crédito de um amigo. “Eu não tinha noção de que ele estava nesta situação”, diz Anísio. O amigo faz questão de lembrar que Ronaldo possui três imóveis residenciais, uma loja e o sítio em São João Nepomuceno. Mas esforça-se para não vendê-los. Foi o que sobrou da vida de atleta e a renda ajuda a complementar a pensão da filha e a mensalidade escolar. Anísio e a mulher, Kledileuza, fazem de tudo para ajudar Ronaldo. Às vezes, ao sair do supletivo às 11 da noite, ele passa na casa do casal para conversar. “Não tenho muitos amigos”, diz o maratonista. “Nos finais de semana, fico em casa assistindo tevê ou vou ao shopping.” Seu meio de transporte é um Voyage novo, adquirido após pagar 52 prestações de um consórcio. No Distrito Federal, Ronaldo casou. No dia 20 de julho de 2013, oficializou o relacionamento com Edileuza Ribeiro, 29 anos. Os amigos, no começo, riam quando ele falava do enlace. Sua fama é de mulherengo, do tipo que entrava em uma loja de produtos femininos e pedia para experimentar o batom da vendedora. O recordista não nega o rótulo. “Eu gosto de mulher”, diz. “Tem mal nisso?” Ronaldo e Edileuza se conheceram pela internet. Praticante de provas de rua como hobby, ela adicionou o
o s fe i tos de r ona ldo d a C os ta > Campeão da são silvestre em 1994, encerrando um jejum de 9 anos sem vitória brasileira
> Bicampeão sul-americano de corridas de rua > Bronze no mundial de meia maratona de Oslo, noruega > recordista mundial na maratona de Berlim em 1998, com a marca de 2 horas, seis minutos e cinco segundos
> medalhista de bronze na prova dos 10 mil metros nos Jogos pan-Americanos de mar del prata, em 1995
> detentor do recorde brasileiro e sul-americano da maratona há 14 anos
recordista mundial no Facebook. Quem começou a paquera virtual foi ele. Depois de três meses de muita digitação, Ronaldo conseguiu, enfim, marcar um encontro na rodoviária de Goiânia, onde ela morava. Agora, para viver junto do marido em Ceilândia, ela deixou o emprego de doméstica e, em breve, irá transferir a faculdade de educação física. Com o salário de R$ 3,2 mil no Instituto Joaquim Cruz e dono de uma empresa recém-aberta de aluguel de chips para cronometragem esportiva, Ronaldo quer comprar um apartamento. A nova residência, avaliada em R$ 150 mil, possui dois quartos. Sua ideia é vender o ponto comercial no interior de Minas e usar o dinheiro para dar a entrada. Mais centrado, está cheio de planos. Sua meta é evoluir no emprego e chegar a treinador. Para isso, precisa terminar o colégio e ingressar no curso de educação física. “O problema é que a gente aprende a correr, não a parar”, filosofa um dos maiores atletas da história do Brasil. Corre, Ronaldo.
53 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
capa
O
f a nt ást i c O hOmem de
fe rrO
Contra todos os prognóstiCos, o paulista Carlos Chinin faz história no deCatlo, se torna o sexto atleta mais Completo do mundo e ColoCa seu nome entre os gigantes do esporte brasileiro
por Mariana Queiroz BarBoza fotos pedro dias/ag. istoé
CONFIANÇA "Em 2016, espero estar entre os favoritos para conquistar o ouro"
capa
“Mais livre”, resmunga o treinador ucraniano Oleg Ruyev,
para depois disparar uma mistura incompreensível de português, russo e inglês. “Mais para a frente”, exige o estrangeiro, enquanto faz careta, balança os braços, ombros e quadris – tudo ao mesmo tempo. Não seria estranho se fosse um exercício de balé, com Ruyev no papel do coreógrafo rigoroso e superficialmente mal-humorado que confere cada centímetro da cintura das bailarinas. Em vez disso, Ruyev ensaia os movimentos do salto com vara de um marmanjo de 1,94 metro de altura e 86 quilos, musculoso em cada ângulo que se pode observar. Há três horas sofrendo o diabo nas mãos do técnico está o decatleta paulista Carlos Chinin, 28 anos. De bermuda azul e camiseta amarela, as mesmas cores do chão e das paredes do Centro de Treinamento do Clube de Atletismo BM&F Bovespa, em São Caetano do Sul, na Grande São Paulo, Chinin leva o corpo à exaustão máxima. Mas ele não reclama. O Mundial de Atletismo de Moscou será realizado dali a alguns dias e é preciso acelerar os treinamentos. Àquela altura, Chinin ocupa um tão surpreendente quanto improvável terceiro lugar no ranking da Federação Internacional de Atletismo (afinal, os melhores não deram o máximo ainda neste ano, dizem os críticos) e muita gente acha impossível para ele ficar entre os dez primeiros na Rússia, algo jamais alcançado por um decatleta brasileiro. Os pessimistas estavam errados. Chinin terminou o Mundial de Moscou em sexto lugar, muito perto de faturar uma medalha. De todos os 32 brasileiros que foram à Rússia, talvez a performance mais notável tenha sido a dele. Ao contrário de algumas estrelas do atletismo nacional, Chinin está em ascensão. Seus resultados mostram isso. No decatlo,
considerado por muitos especialistas a modalidade mais difícil do mundo, os atletas disputam dez provas em apenas dois dias. No primeiro dia, 100 metros rasos, salto em distância, arremesso de peso, salto em altura e 400 metros rasos. No segundo, 110 metros com barreiras, lançamento de disco, salto com vara, lançamento de dardo e 1.500 metros. Na Rússia, Chinin bateu seu recorde pessoal nos 100 metros, nos 110 metros com barreiras, no salto com vara e no lançamento de dardo. Dá para contar nos dedos de uma mão os competidores do Brasil que foram capazes de superar suas melhores marcas pessoais durante o Mundial. “O resultado dá muita confiança”, diz Chinin. “Em 2016, espero estar entre os favoritos para ganhar o ouro.” Exagero? Não, segundo quem o segue de perto. “Ele tem evoluído de forma muito rápida”, diz Edemar Alves dos Santos, que divide com Ruyev a responsabilidade de forjar uma das novas estrelas do atletismo brasileiro. Antes do embarque para Moscou, a 2016 acompanhou a dura rotina do decatleta. Nos treinos no Clube BM&F Bovespa, cada vez que o salto com vara não sai do jeito que o treinador Ruyev quer, Chinin deixa os ombros caírem para a frente, senta no colchão e levanta os olhos até quase encostá-los nas sobrancelhas, numa demonstração de que está atento às instruções, apesar de frustrado. Ele ouve as orientações do ucraniano e consente com a cabeça, enquanto a vermelhidão do rosto cansado diminui. Depois, levanta e volta para o fim da fila. Naquela sexta-feira de inverno, seus saltos são revezados com dois atletas juvenis. O foco é aprimorar a parte técnica, o que só é possível com a repetição dos movimentos incontáveis vezes. Há um ano Chinin treina sob a supervisão de Edemar Santos. Ruyev é contratado da
Confederação Brasileira de Atletismo para auxiliar na preparação dos esportistas. A rotina de treinos varia de três a cinco horas por dia, de segunda a sábado, com raras folgas às quintas-feiras. Segundo os treinadores, Chinin é bom nos 100 metros, no lançamento de disco e de dardo e excelente nos saltos em distância, altura e com vara, no arremesso de peso, nas corridas de 400 metros, 110 metros com barreiras e 1.500 metros. Não há nada que faça mal. “Um decatleta não precisa fazer tudo muito bem, mas não pode ser ruim em nada”, afirma Santos, que tem dificuldades em escolher uma prova para a qual Chinin tenha mais aptidão. “O Carlos é um atleta que tem facilidade de aprendizagem.” É num aplicativo de celular que o técnico mede o desempenho diário do decatleta e, na mesma hora em que uma marca acaba de ser feita, a compara com as melhores do mundo. De acordo com Santos, o momento mais complicado é a transição dos 110 metros com barreiras para o lançamento de disco, no início do segundo dia
da s de z prO vas que disputO u nO m undia l de mO scOu, chinin quebrO u m a r ca s pessOais e m qua t r O delas. NOs ú ltI mOs AN Os, pOu C O s AtlEtAs br A sI l E I rOs EvO lu í r Am dE FOrmA tãO vElO z
de provas. Como são modalidades que não têm nada em comum, são raros os atletas que conseguem fazer com que o cérebro se ajuste rapidamente às mudanças, sem comprometer a execução dos movimentos. Também é nesse momento que a competição começa a se definir – e qualquer erro pode jogar uma pontuação para trás. O decatlo, exclusivamente masculino, desgasta tanto que competições oficiais só são recomendáveis num intervalo de dois meses. Em 2013, Chinin chegou a fazer três em 26 dias. Chinin sempre foi acima da média, e não apenas no esporte. Para o filho de um analista de sistemas e de uma professora de ensino fundamental, ir bem na escola era obrigação. A mãe, Patrícia Bezerra, conta que Duda, como é chamado desde bebê, tinha que ser avaliado de forma separada do grupo, num canto da sala, porque todo mundo queria colar dele. Aos 4 anos, começou a ler, porque era extremamente curioso e questionador. “Ele já deve ter lido mais livros do que eu em toda a minha vida”, diz Patrícia. Ao mesmo tempo, Duda foi uma criança hiperativa, que tirava vantagem da altura para trepar em muros e árvores, alheio ao risco de acidentes. “Seu poder de destruição era incrível”, diz o pai, Jair Chinin. Por outro lado, o atleta era tímido e tinha dificuldades em se comunicar. Quando estava no primeiro ano do ensino fundamental, seus pais não puderam mais pagar as mensalidades de um colégio particular e o matricularam na rede pública. O período de adaptação incluiu visitas à psicóloga da instituição, porque Chinin simplesmente “não se abria” com ninguém. Foi nessa época que uma professora captou a atenção do garoto. Márcia Caccia Rosalem dava aulas de educação física na Escola Estadual Professor Joaquim Leme do Prado, no bairro do Imirim, na zona norte de São Paulo, quando notou que a altura e o gosto por ação poderiam fazer daquela criança terrível um atleta. A mãe foi contra. Preferia que ele se dedicasse aos estudos e acabasse dentro dos limites de alguma empresa
multinacional. “Tão inteligente e só usa os músculos?”, questiona Patrícia até hoje. Como achava o vôlei muito parado, Chinin começou a se dedicar ao basquete, em que conseguia saltar bem mais alto que o restante da turma, e ao futebol, em que podia correr como gostava. Aos 15 anos, cruzou com outra professora num encontro que seria definitivo para a futura profissão. Inscrito no salto em distância pela professora Ângela do Homero nas Olimpíadas Colegiais de Guarulhos, Chinin competiu pela primeira vez no atletismo e contra garotos federados, ávidos por mostrar o produto de horas de treinos disciplinados. Ficou em terceiro lugar. A cara de bonzinho e a certeza de impunidade fizeram com que Chinin fraudasse a inscrição de outras provas e competisse além do que
COmplEtO Chinin na prova do arremesso de peso, em moscou. Não há nenhuma modalidade que ele faça mal
59 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
Foto: Adrian dennis/AFp
capa
c hi n i n c Ontra Os re c Ordis tas a s m e l hO r e s ma r cas d O br asileir O cO mpar ad as c Om Os r e cO r d e s m und iais em cad a categ O r ia 100 metrOs
a melhor marCa de Chinin 10s78 reCorde mundial (usain bolt) 9s58
saltO em distância a melhor marCa de Chinin 7,76 m reCorde mundial (mike powell) 8,95 m arremessO de pesO a melhor marCa de Chinin 15,28 m reCorde mundial (randy barnes) 23,12 m saltO em altura
a melhor marCa de Chinin 2,13 m reCorde mundial (Javier sotomayor) 2,45 m
400 metrOs
a melhor marCa de Chinin 48s18 reCorde mundial (miChael Johnson) 43s18
110 metrOs cOm
a melhor marCa de Chinin 14s05
barreiras
reCorde mundial (aries merritt) 12s80
lançamentO
a melhor marCa de Chinin 48,38 m
de discO
reCorde mundial (Jürgen sChult) 74,08 m
saltO cOm vara
a melhor marCa de Chinin 5,10 m reCorde mundial (sergey bubka) 6,14 m
lançamentO
a melhor marCa de Chinin 59,98 m
de dardO
reCorde mundial (Jan zelezny) 98,48 m
1.500 metrOs
a melhor marCa de Chinin 4m23s99 reCorde mundial (hiCham el guerrouJ) 3m26s
de inicialmente planejara. Antes de começar os 100 metros rasos, disse que tinha perdido o papel que comprovava seu registro na corrida. A desculpa colou. Mais uma vez, ficou com o bronze. A cena se repetiu nas provas dos 400 metros e dos 1.500 metros. No fim do dia, quatro professores diferentes o haviam convidado para treinar atletismo no clube da cidade. Disse sim a todos. Antes de iniciar o treinamento para valer, Chinin ainda tentou realizar um sonho antigo. Foi aprovado na peneira do time de futebol do coração, o São Paulo, e passou três meses alimentando a ideia de completar a zaga do clube. A primeira oportunidade seria na tradicional Copa São Paulo de Futebol Júnior, em 2002. No fim de semana anterior à inscrição no campeonato, um acidente interrompeu seus planos. A família, que inclui as irmãs Juliana, hoje com 29 anos, Bruna, 27, e Bryan, 18, mal havia acabado de chegar a uma colônia de férias no interior do Estado quando Chinin pulou de pé na piscina. O encontro do furacão com a água provocou um choque entre o pé do garoto e um ralo destampado. “Meu pé entrou inteirinho no alumínio e senti uma dor como se uma faca estivesse me cortando.” O resultado foi a sola do pé fatiada – e o adeus precoce ao futebol. Depois disso, pensou em desistir dos esportes e procurar um emprego convencional. No dia em
que faria uma entrevista para trabalhar em um supermercado, o pai o convenceu de que aquela era a decisão errada. “Na hora, fiquei bravo e insisti para que fosse procurar os técnicos de atletismo que já tinham feito convites para ele”, afirma Jair, que, apesar das dificuldades financeiras, teve a sensibilidade de perceber que o futuro do filho era outro. Logo depois, Chinin começou a treinar com Neilton Moura, inaugurando uma parceria que duraria dez anos. Com menos de cinco meses de exercícios, foi vice-campeão estadual de octatlo. Em seguida, quebrou o recorde sul-americano no campeonato brasileiro da categoria. “Nasci para isso”, pensou. A partir de então, engatou uma sequência de conquistas nos principais campeonatos do continente, brevemente interrompida por duas lesões em 2009 e 2010. Em 2011, na Alemanha, Chinin ultrapassou a barreira dos oito mil pontos no decatlo (pontuação mínima estabelecida pela Federação Internacional para a classificação do Mundial e da Olimpíada). Na volta ao País, no Troféu Brasil, sentiu uma fisgada na coxa durante o salto em distância. A lesão no músculo posterior o condenou a três meses de fisioterapia e à perda da temporada de 2011. Com o objetivo de se classificar para a Olimpíada de Londres, Chinin embarcou sozinho para Gotzis, na Áustria, a meca
dos decatletas, um mês e meio antes dos Jogos de 2012. Já havia queimado duas tentativas das três possíveis no salto com vara, a sétima prova do decatlo. Na última, saltou mal e foi jogado para fora do colchão. Por puro reflexo, percebeu o erro e girou o corpo para evitar uma queda de costas. Em vez disso, o que encontrou o chão foi o seu rosto. Enquanto relembra a cena, espalma as mãos, forjando um som alto e agudo. “Apaguei.” Foi retirado da pista coberto por uma mórbida proteção térmica metálica e partiu para o hospital num helicóptero. No Brasil, os familiares tinham a certeza de que estava morto. “Me faltou o chão”, diz a mãe. O pai só teve coragem de olhar as imagens que circulavam pela internet depois de saber que ele estava bem. Londres se tornou um destino fora do mapa. Sentenciado a meses de tédio e pouco movimento, foi no videogame que Chinin se refugiou. “Até nisso ele quer ser o melhor”, afirma a namorada, Maíra Correia, com quem compartilha memórias há dez anos e divide um apartamento na divisa de São Paulo com Guarulhos. “Ele fica tão viciado que tenho que dar uns toques” , diz a estilista, que chegou a esconder o brinquedo. Hoje em dia, Chinin acha que o acidente do ano passado representou um virada em sua vida. “Eu estava numa situação em que treinava com um grupo de saltadores numa pista de terra”, diz. “Aconteceu isso para que eu pudesse pensar como um profissional de alto rendimento, dando valor ao meu corpo.” Foi depois da quase tragédia que encontrou o técnico Edemar Alves dos Santos e o caminho para se tornar o sexto melhor do mundo. Mas isso ainda é pouco. Pode apostar que vem muito mais por aí. vOCAÇãO pArA O EspOrtE Antes de ser decatleta, Chinin foi jogador nas categorias de base do são paulo, mas um acidente em uma piscina o afastou dos campos de futebol
produção: Cintia sanchez
capa
uma decepçãO atrás da Outra depois do fiasCo do atletismo brasileiro nos Jogos de londres, a promessa era formar um time mais forte para os próximos anos. mas no mundial de mosCou o país novamente fraCassou. Como será em 2016?
por rodrigo riBeiro, de Moscou
a delegaçãO brasileira chegou ao Mundial de Moscou em clima de festa e com o velho discurso “temos a nossa melhor equipe da história.” Foram necessários apenas alguns dias de competição – ou talvez algumas horas, para ser mais rigoroso – para ficar evidente que há algo de errado com o atletismo nacional. Os 32 competidores enviados à Rússia não beliscaram uma medalha sequer, repetindo o lamentável desempenho dos Jogos de Londres, em 2012. No domingo 18, depois de eliminação do revezamento 4 x 100 feminino – o bastão caiu na última passagem, quando o Brasil se encaminhava para a prata –, sentimentos que pareciam amortecidos se revelaram. Ficou evidente que há problemas entre a comissão técnica e os atletas. Logo depois da prova, Vanda Gomes, indicada de última hora para substituir Rosângela Santos na final do revezamento, afirmou que faltou treino para a equipe e que o erro decorreu disso. Ana Cláudia Lemos deixou o estádio aos gritos, praquejando contra tudo e todos. Rosângela chorou. Ricardo D’Angelo, técnico chefe da equipe brasileira, afirma que não há motivo para desespero. “Fizemos uma campanha razoável”, diz. Antes do Mundial, a projeção era de que o Brasil ganharia pelo menos duas medalhas. Elas não vieram e D’Angelo se apoia no número de finais alcançadas: foram oito, contra três nos Jogos de Londres. “Temos um
projeto muito forte para os times de revezamento e os resultados certamente virão”, diz o técnico. O problema é que esse discurso se tornou recorrente. O Brasil chega a uma competição com uma equipe numerosa, cheia de esperança, e no final os dirigentes vêm com as promessas de sempre – as vitórias virão na próxima vez. Nos Jogos de Londres, foi assim e as conquistas não apareceram logo depois, como ficou provado no Mundial de Moscou. Em 2016 será diferente? Uma análise fria da performance brasileira permite algumas conclusões. A primeira é óbvia: o Brasil, apesar do crescente investimento dos últimos anos – o atletismo recebe R$ 30 milhões anuais entre patrocínios e verbas de loterias –, regrediu no tempo. Nas corridas de fundo, de forte tradição com nomes como Joaquim Cruz e Zequinha Barbosa, o País passou longe das finais. O mesmo se deu no salto triplo, prova de mitos como Adhemar Ferreira da Silva e João do Pulo. Nas provas masculinas de velocidade, até resultados recentes, como a prata no revezamento 4 x 100 nos Jogos de Sydney-2000, parecem acasos que não vão se repetir mais. O que há de errado? Para André Domingos, medalhista do revezamento na Austrália e comentarista do Sportv no Mundial, o problema é que o Brasil deixou de se preocupar com a formação de atletas e agora, na base do desespero diante da Olimpíada que se
aproxima, investe de forma atabalhoada, sem critérios e planejamento. “Não dá para fazer milagre até 2016”, diz Domingos. “Não dá mais tempo de formar um time vencedor até lá.” No Mundial de Moscou, as esperanças de medalha estavam novamente depositadas em Fabiana Murer, já veterana, e em Mauro Vinicíus da Silva, o Duda, que, aos 26 anos, não é exatamente uma revelação. Ok, ambos chegaram em quinto lugar e, por detalhes, não subiram ao pódio. “O importante é me manter entre os mais fortes do mundo e tentar fazer história no Rio”, disse Duda à 2016. Beleza, eles certamente terão boas chances daqui a 3 anos, mas o que mais?
d I NhE I rO NãO é pr Ob l EmA. O Atl Et I smO b r A sIl E I r O rECEb E r $ 30 mil hõ e s pOr a nO, e ntr e pa t r OcíniO s e ve r b a s de l Ote r i a s
Fotos: Gary hershorn/reuters | Olivier morin/AFp
l adeira a baix O O de s e mp e nhO b rasileir O n Os mu nd i a i s d e atletismO edição
medalha
atleta
prova
helsinque 1983
bronze
Joaquim Cruz
800m
roma 1987
bronze
zequinha BarBosa 800m
tóquio 1991
prata
zequinha BarBosa 800m
stuttgart 1993
sem medalhas
gotemburgo 1995
bronze
Luiz dos santos
maratona
atenas 1997
bronze
CLaudinei quirino
200m
sevilha 1999
prata
CLaudinei quirino
200m
prata
sanderLei ParreLa 400m
bronze
raPhaeL de oLiveira 4x100m
CLaudinei quirino Édson LuCiano andrÉ domingos edmonton 2001
sem medalhas
paris 2003
prata
viCente de Lima Édson LuCiano
4x100m
andrÉ domingos CLáudio roBerto souza helsinque 2005
sem medalhas
paris 2007
prata
berlim 2009
sem medalhas
daegu 2011
ouro
mosCou 2013
sem medalhas
JadeL gregório
salto triplo
FaBiana murer
salto Com vara
Para o técnico D’Angelo, que em Moscou exibiu uma tranquilidade surpreendente mesmo diante dos resultados adversos, o Mundial trouxe, sim, boas-novas. A começar pelos corredores de 400 metros. “Nossa equipe no 4 x 400 era muito jovem e mesmo assim chegou à final”, diz D’Angelo. A principal aposta do País é Anderson Henriques, 21 anos, que realmente se destacou em Moscou. Ele quebrou duas vezes o seu recorde pessoal e colocou o Brasil em uma final dos 400 metros pela primeira vez em 14 anos (o autor da façanha era Sanderlei Parrela, no Mundial de Sevilha, em 1999). “Corri abaixo dos 45 segundos, uma barreira para os atletas dos 400 metros, e sinto que posso melhorar muito mais”, diz Henriques. Outro resultado para comemorar se deu na maratona masculina. Solonei da Silva e Paulo Roberto de Almeida Paula terminaram a prova de mãos dadas, na sexta e sétima posição. “Nós provamos que, se corrermos em equipe, podemos enfrentar os africanos”, diz Solonei. A estratégia de usar o time para acuar os adversários vem sendo adotada com sucesso principalmente por quenianos e etíopes e agora os brasileiros perceberam que esse pode ser o caminho para um bom resultado no Rio de Janeiro. Apesar dessas ressalvas, não há mesmo muito o que comemorar. Para um País do tamanho do Brasil e que tem investido tantos recursos no atletismo, é um absurdo terminar um Mundial zerado e ver até a Colômbia ficar à sua frente no quadro de medalhas. A continuar assim, o Rio será palco de novas decepções. A não ser que um milagre aconteça até lá.
AltOs E bAIXOs Acima, a queda do bastão que eliminou o brasil na final do 4 x 100 metros. À esquerda, uma das raras boas exibições brasileiras: solonei da silva e paulo roberto de Almeida paula correm juntos a maratona e terminam em sexto e sétimo
diagnóstico
As lições dA CopA dAs ConfederAções Um balanço completo do qUe deU certo e do qUe deU errado em cada Uma das sedes da competição e como o diagnóstico pode ajUdar na preparação para a copa de 2014 e a olimpíada de 2016 por Natalie Gedra
segurAnçA policiais montam guarda em frente ao estádio do Maracanã, no rio de Janeiro, no dia da final da Copa das Confederações: manifestações foram desafio
diagnóstico
O Brasil venceu a Copa das Confederações. Mas o que o País ganhou, de fato, com o torneio? Como eventoteste para o mundial de futebol em 2014 e, de certa forma, também para a Olimpíada de 2016, a competição mostrou que temos importantes lições a aprender, apesar de a avaliação geral da Fifa ter sido positiva. É justamente no balanço exato de prós e contras – e no devido reconhecimento do que deu certo e errado – que está o segredo para organizar uma boa Copa do Mundo. Os estádios ficaram prontos e encheram os olhos dos presentes. Mas nem tudo repetiu a modernidade e a eficiência europeias. A retirada de ingressos foi um dos aspectos que deixaram a desejar, de acordo com a avaliação da entidade máxima do futebol. Para a Copa, o número de postos de distribuição terá que aumentar. Chegar ao local dos jogos muitas vezes foi um desafio à parte. Algumas cidades, como Recife, não suportaram o fluxo gerado pela competição e todas as sedes passam por obras de mobilidade para suportar o que está por vir no ano que vem. Construções viárias, ampliação no número de bolsões de estacionamento, aumento do volume de ônibus circulares que levam torcedores aos estádios e novas estações de metrô são algumas das obras previstas para as seis cidades que sediaram a Copa das Confederações. “Dos três jogos que recebemos, dois caíram em finais de semana e ainda assim o trânsito ficou complicado”, reconhece o secretário extraordinário da Copa em Pernambuco, Ricardo Leitão. “Na Copa do Mundo, teremos cinco partidas e três delas serão em dias de semana”, afirma. “Então estamos revisando todo o plano de mobilidade.” Nas arenas, o mesmo olhar deslumbrado que contemplava as imensas obras saltava com os preços dos produtos vendidos dentro dos estádios. O torcedor enfrentava longas filas para desembolsar R$ 6 por uma água de 500 ml. A cerveja estava a R$ 12. Matar a fome com um sanduíche custava R$ 8. A recepção dos
telefones celulares era ruim, assim como a rede de dados 3G. Os turistas estrangeiros ainda enfrentaram um problema específico: o baixo número de voluntários que falavam inglês. “A sinalização da cidade foi um ponto negativo”, diz Ney Campello, secretário estadual para assuntos da Copa na Bahia. “Além disso, temos que melhorar a ambientação, fazer com que a sede respire Copa, com decorações, eventos e mais diálogo com os moradores.” As manifestações que se espalharam pelo Brasil em junho fizeram com que a questão da segurança – e a qualidade da resposta das forças policiais a possíveis protestos – fosse colocada à prova. Ainda assim, a avaliação foi positiva, na opinião dos organizadores. A Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos (Sesge), ligada ao Ministério da Justiça, considerou que não houve “qualquer incidente que ameaçasse a competição”, apesar dos confrontos violentos entre policiais e manifestantes em cidades como Rio de Janeiro, Brasília e Fortaleza. No total, 77,8 mil pessoas, incluindo membros das Forças Armadas, foram designadas para atuar na segurança da Copa das Confederações. O Brasil mais que dobrou o número da África do Sul, que contou com um efetivo de 33 mil policiais. Chegar às sedes e sair delas não representou um problema. O fluxo de passageiros nos aeroportos não teve alta significativa, já que 73,5% dos ingressos foram vendidos para moradores locais, de acordo com dados divulgados pela Fifa. Apenas 3% do público da Copa das Confederações era de estrangeiros, porcentagem que deve aumentar consideravelmente no Mundial de 2014. O verdadeiro teste para os aeroportos, portanto, ainda está por vir. Os números da Copa do Mundo serão bem mais volumosos: 12 sedes, 32 dias, 64 jogos, 32 seleções, 550 sessões de treinamento e 250 voos. Até lá, é preciso analisar o que funcionou ou não em cada uma das sedes e fazer a lição de casa como um aprendiz dedicado.
> BRASÍLIA Estádio: Bom Projeto moderno, com bom funcionamento. O aspecto questionável foi a divisão dos setores: em alguns casos, torcedores com ingressos mais caros assistiram à partida bem próximos daqueles que pagaram menos. trânsito E acEsso ao Estádio: Bom A Fifa avaliou a cidade como a melhor do torneio em mobilidade. A proximidade dos hotéis em relação à arena facilita a locomoção a pé. No entanto, o público se queixou de estacionamentos distantes e de complicações no tráfego pela cidade. turismo: Bom O estádio fica a 800 metros do setor hoteleiro da cidade, o que facilitou a ocupação de 95% dos leitos no jogo de abertura. Um levantamento mostrou que o faturamento do comércio e dos serviços vinculados ao evento aumentou em 10%. aEroporto: rEgular Segundo a Infraero, a abertura da Copa das Confederações provocou um aumento de 22% no número de passageiros e houve atrasos e cancelamentos. Após o jogo de abertura, alguns passageiros chegaram a esperar uma hora e meia na fila para fazer o check-in. sEgurança: rEgular O estádio Mané Garrincha não teve nenhuma ocorrência. No entanto, a ação da polícia contra manifestantes proporcionou imagens fortes de violência em frente à arena.
positivos: à esquerda, zagueiro david luiz celebra título da seleção. Acima, o moderno estádio de Brasília (df) e um torcedor devidamente paramentado em Belo Horizonte (Mg)
> BELO HORIZONTE Estádio: Bom Inaugurado quase quatro meses antes da Copa das Confederações, o Mineirão pôde receber eventos-teste, entre eles um jogo da Seleção. Um dos diferenciais do estádio foi a estrutura montada na área da esplanada, com lojas, bares, jogos e pontos de venda do tradicional feijão tropeiro. A limpeza também foi um aspecto bastante elogiado pela Fifa. A reforma do Mineirão custou R$ 695 milhões. trânsito E acEsso ao Estádio: ruim A própria Fifa avaliou como deficiente a mobilidade em Belo Horizonte, que foi bastante prejudicada pelas manifestações. Duas grandes avenidas levam o público ao Mineirão e uma delas foi interditada pelos protestos, gerando confusão e falha de comunicação com os voluntários. “No entanto, não tivemos nenhum bloqueio que durou muito tempo”, diz Tiago Lacerda, secretário extraordinário da Copa em Minas. turismo: rEgular Como uma cidade habituada apenas a receber o turismo de negócios, faltaram leitos, especialmente na semifinal entre Brasil x Uruguai. A rede hoteleira teve uma ocupação de cerca de 70% em média e 100% nos dias que antecederam o jogo da Seleção. Para a Copa do Mundo, é esperado que mais 52 hotéis entrem em funcionamento na região metropolitana de Belo Horizonte. aEroporto: Bom De acordo com a Infraero, embarques e desembarques foram realizados com tranquilidade. No entanto, o fluxo de passageiros caiu em relação ao mesmo período de 2012, tanto nos voos domésticos (-6,87%) quanto nos internacionais (-19,45%). sEgurança: Bom O Centro de Comando e Controle Integrado reuniu representantes de 27 órgãos de segurança e registrou poucas ocorrências. Além disso, deixou como herança para a cidade mais de 400 câmeras de monitoramento.
protAgonisMo nordestino: acima, jogadores de itália e espanha disputam bola durante a semifinal da Copa das Confederações, em fortaleza (Ce). À direita, torcedores assistem à partida do Brasil em telão montado pela fifa no recife (pe)
> FORTALEZA Estádio: Bom Primeiro estádio pronto para a Copa, o Castelão foi reformado ao custo de R$ 623 milhões e recebeu 21 partidas oficiais e três eventos-teste antes da Copa das Confederações. Seu gramado foi o mais bem avaliado.
> RECIFE Estádio: rEgular Apesar do projeto moderno e bem executado (construído ao custo de R$ 529,5 milhões), a Arena Pernambuco está localizada a 19 km do centro da cidade. Os três maiores times do estado já possuem estádios próprios, o que coloca em questão a sua utilização após a Copa.
trânsito E acEsso ao Estádio: Bom De acordo com as autoridades locais, a cidade suportou bem e o trânsito trânsito E acEsso ao Estádio: ruim não teve complicações nem mesmo nos arredores do estádio. O trânsito na cidade foi caótico, complicando até o deslocamento das seleções aos treinamentos. Os bolsões de estacionamento da turismo: Bom Arena Pernambuco foram insuficientes e a Seleção do Uruguai não A cidade apresentou crescimento de 13,7% no fluxo turístico e ocupação conseguiu chegar ao centro de treinamento porque parte do acesso hoteleira de 70%. O número fica abaixo das outras sedes que receberam estava enlameado. jogos da Seleção. Por outro lado, foi a cidade que mais recebeu turistas turismo: rEgular estrangeiros A imagem da cidade saiu arranhada com as reclamações públicas das aEroporto: rEgular delegações e o suposto furto sofrido pela seleção espanhola em um O ministro chefe da Secretaria Nacional de Aviação Civil, Wellington hotel. Ainda assim, vale destacar o bom número da ocupação hoteleira: Moreira Franco, manifestou preocupação especial com o ritmo das obras média de 76,69% durante o torneio. no aeroporto de Fortaleza. Vale ressaltar que a variação de fluxo nos desembarques domésticos e internacionais foi mínima: 4,97% e 0,20%, aEroporto: Bom respectivamente, em relação a 2012. De acordo com a Infraero, o aeroporto operou normalmente, mesmo com um acréscimo nos desembarques domésticos (18,85%) e internacionais sEgurança: Bom (18,16%). O aumento no fluxo interno pode também estar relacionado Nem mesmo o Arraial da Copa, festejo organizado na Praia de Iracema, aos festejos juninos, bastante tradicionais no estado. teve um número significativo de ocorrências. sEgurança: Bom O delegado federal Humberto Freire, porta-voz do governo de Pernambuco para questões de segurança durante a Copa das Confederações, fez um balanço “totalmente positivo”. De acordo com ele, poucas ocor68 rências foram registradas. agosto/setembro 2013 | istoé 2016
defesA: à esquerda, policial da tropa de Choque monta barreira contra manifestantes, no rio de Janeiro (rJ). Acima, o goleiro do uruguai, fernando Muslera, detém pênalti cobrado pelo italiano Mattia de sciglio, na Arena fonte nova, em salvador (BA)
> RIO DE JANEIRO Estádio: Bom O aspecto inacabado do estádio poucos dias antes do torneio causou uma primeira impressão ruim. No entanto, o novo Maracanã agradou aos presentes e se mostrou eficiente durante toda a competição. O estádio foi reformado por R$ 808,4 milhões.
> SALVADOR Estádio: rEgular Pouco menos de um mês antes do início da competição, uma parte da cobertura do estádio se rompeu. Isso, no entanto, não implicou maiores problemas no decorrer da Copa das Confederações. A reforma da Fonte Nova custou R$ 591,7 milhões.
trânsito E acEsso ao Estádio: Bom trânsito E acEsso ao Estádio: rEgular Por se tratar de um estádio já existente, o Maracanã contava com boas Os 12 km de malha metroviária serão inaugurados somente em 2014, o opções de transporte coletivo, já conhecidas e fartamente utilizadas pelo que deve desafogar um pouco o trânsito da cidade, que já costuma ser público. O trânsito da cidade não sofreu impacto significativo em relação caótico. As vias ao redor da arena representaram um problema. ao que normalmente se encontra. turismo: Bom turismo: ruim A média de ocupação hoteleira, de 75%, foi superior aos 50% que cosA taxa de ocupação hoteleira foi de apenas 55%, abaixo dos 75% tumam ser registrados nesta mesma época. A partida entre Brasil x Itália aguardados. A média para o mês de junho no Rio de Janeiro costuma ser chegou a registrar 99,9% dos leitos da cidade tomados. de 70%. Nem a final da competição preencheu os leitos da cidade: 83% aEroporto: Bom estiveram ocupados. Os protestos causaram queda de 35% no movimento Os passageiros passaram pelo aeroporto sem enfrentar desconfortos. de bares e restaurantes da zona sul e de 70 % na Lapa. No entanto, deve ser lembrado que a movimentação sofreu queda de aEroporto: Bom 6,4% em relação ao mesmo período de 2012. O aeroporto Santos Dumont teve fluxo 6,4% maior em relação ao mesmo sEgurança: ruim período do ano passado e mesmo assim não houve registros de filas A cidade protagonizou um dos protestos mais violentos da acima do normal nem problemas na recepção de atletas e autoridades. competição, quando dois ônibus da Fifa e um hotel com membros sEgurança: rEgular da entidade foram apedrejados. A forte ação policial contra manifestantes gerou imagem negativa. Patrocínio: Além disso, o Rio teve diversos registros de furto de ingressos, especialmente na final.
vida carioca
Precisa ser tão caro assim? altos Preços cobrados Pelos hotéis do rio de Janeiro geram temor de fuga de turistas durante e aPós a coPa de 2014 e a olimPíada de 2016 por Flávia RibeiRo ilustração estúdio luzia
O Brasil é um País carO Para se viver. Por aqui, pagam-se impostos de mais por serviços públicos de menos e os produtos, de todos os tipos e faixas de preços, custam quase sempre acima de seus semelhantes vendidos no Exterior. Em algumas áreas em especial, esse quadro é mais preocupante. Um estudo recente realizado pelo Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur) revela quão proibitivo é se hospedar nas grandes cidades. Pior ainda: o levantamento constata como os grandes eventos esportivos dos próximos anos vêm contribuindo para uma aceleração incontrolável de preços. A Embratur comparou as tarifas de 13 hotéis de Brasília, Rio de Janeiro e Fortaleza em julho e agosto de 2013 com os valores previstos para a Copa do Mundo de 2014. Dos 13 estabelecimentos pesquisados, oito apresentaram variações acima de 200%. Em um dos casos, num hotel cinco-estrelas de Brasília, o valor sobe de US$ 134 em 2013 para US$ 639 em 2014, uma alta espetacular de 376,4%. Ainda segundo a pesquisa, a tarifa média dos hotéis disponíveis no site da Fifa no Rio de Janeiro, entre 20 e 24 de junho de 2014, perto da final da competição, é de US$ 461,04. No mesmo período, em 2006, a diária média em Berlim – cidade-sede da final da Copa da Alemanha – era de US$ 300. Em 2010, em Johannesburgo – onde ocorreu o último jogo da Copa da África do Sul –, o valor não passou de US$ 200. “Rio e São Paulo já têm preços acima dos vizinhos sul- americanos, comparáveis aos de Londres e Paris”, diz o presidente da Embratur, Flávio Dino. “E a gente está percebendo uma tendência perigosa de acréscimo nos grandes eventos.”
vida carioca
Para o executivo, o risco maior é de que o fenômeno seja repetido por outros setores. “O que receamos é que isso se torne indexador para restaurantes, bares e botecos”, diz. “Imagino o sujeito que vende cerveja em frente ao Copacabana Palace pensando: ‘se o turista paga tão caro por um quarto, pode desembolsar R$ 15 por uma latinha’. O mesmo raciocínio vale para restaurante mais sofisticado.” Segundo o presidente da Embratur, se o Brasil ficar com fama de destino caro, o turismo será afetado no longo prazo, e não apenas nas competições esportivas. Por isso, ele pede um pacto nacional que ajude a tornar os preços de serviços, se não baixos, ao menos razoáveis. “O mecanismo atual é conversar com os representantes do setor”, diz. “Se o pacto não funcionar, podemos conter abusos por meio de instrumentos legais, como o Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Defesa da Concorrência”, afirma. Embora ainda não haja tarifas definidas para os Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro, o histórico preocupa, especialmente considerando que quase todo o fluxo de turistas será destinado a apenas uma cidade. O pacto proposto pela Embratur não agrada ao presidente do Sindicato de Hotéis, Bares e Restaurantes do Rio de Janeiro (SindRio), Pedro de Lamare. Segundo o executivo, o mercado se regula sozinho, sem a necessidade de intervenções. Ele dá como exemplo o que aconteceu na Copa das Confederações, quando a expectativa era de 75% de ocupação dos hotéis, bem acima dos 55% efetivamente registrados, o que levou à queda nos preços das diárias. “Temos que lembrar que a cidade já é cara normalmente, e não é de agora”, diz. “Se o hotel estrelado está caro, o sujeito procura um hostel.” Segundo Lamare, a
um estudo da embratur concluiu que o Preço das diárias na coPa de 2014 vai subir até 200% em comParação às tarifas de hoJe em dia
72 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
busca por opções mais em conta será intensificada nos Jogos Olímpicos. “A oferta de leitos será tão grande que vai permitir que as pessoas escolham com muito mais facilidade”, diz, referindo-se aos novos 18.574 quartos que surgirão no Rio até 2016, segundo estimativa da Empresa Olímpica Municipal, e que se unirão aos atuais 20.431 quartos – ou 32.425, se forem considerados aparthotéis, motéis, pousadas e albergues. Os representantes do setor hoteleiro, ofendidos pela postura da Embratur, assinaram juntos uma nota informando que as tarifas previstas para os grandes eventos “se encontram dentro de uma margem perfeitamente aceitável e justa, levando em conta padrão dos hotéis, qualidade dos serviços, localização e alta demanda.” Quando o Brasil foi escolhido país-sede da Copa, há seis anos, a operadora Match Hospitalit, detentora dos direitos do Programa de Hospitalidade da Fifa e responsável por negociar os pacotes com hotéis credenciados, assinou pré-contratos com 850 estabelecimentos, já definindo preços e critérios de correção. No ano passado, começou
a assinar os contratos definitivos sob os mesmos parâmetros. A taxa cobrada pela agência parceira oficial da Fifa contribui para esse aumento de valores. “É natural um incremento nas tarifas em períodos de grandes eventos, mas a sobretaxa das agências chega a encarecer o valor final das diárias divulgadas no site da Fifa em 30%”, afirma Alfredo Lopes, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (ABIH), do Rio de Janeiro. Segundo ele, a cidade está revivendo o período da conferência Rio+20, em junho de 2012, quando foi necessária a intervenção dos órgãos reguladores federais para detectar que o problema dos altos preços estava na taxação abusiva das agências. “Se algum hotel estiver cobrando preços exorbitantes, a associação apoia o acompanhamento dos órgãos de defesa do consumidor”, diz Lopes. “O que não podemos permitir é que o comportamento normal da sazonalidade do mercado seja considerado prática abusiva. Isso acontece em qualquer lugar do mundo.” A Embratur também diz que a comissão cobrada pela Match poderia diminuir, o que, em tese, resultaria em
O s pr eçO s méd iOs d as d i ária s d e hOt é is cre d e nci ad Os pela Fi Fa nO ri O d e JaneirO > na coPa das confederações: Us$ 212 > um mês dePois da coPa das confederações: Us$ 198 > na coPa do mundo de 2014: Us$ 461
O pr eçO dO s i ng res s Os par a a cO pa d e 2014 >abertUra mais caro: r$ 990 mais barato (meia-entrada): r$ 80
>Fase de grUpOs mais caro: r$ 350 mais barato (meia-entrada): r$ 30
>Oitavas de Final mais caro: r$ 440 mais barato (meia-entrada): r$ 55
>QUartas de Final mais caro: r$ 660 mais barato (meia-entrada): r$ 85
>semiFinal mais caro: r$ 1.320 mais barato (meia-entrada): r$ 110
>3º e 4º lUgares mais caro: r$ 660 mais barato (meia-entrada): r$ 85
>Final mais caro: r$ 1.980 mais barato (meia-entrada): r$ 165
queda nas tarifas. Mas seria de fato ela a grande vilã dos altos preços? Dilson Jatahy, presidente da Resorts Brasil – outra entidade representativa do setor hoteleiro –, afirma que, por contrato, não pode revelar o valor das comissões cobradas pela empresa, mas que elas estão dentro da normalidade do mercado. A própria Match, representada no Brasil pelo diretor Paul Whelan, garante que a média de comissões cobradas é de 19%. “Até agora, nós só pudemos concordar com as tarifas de 650 hotéis (dos 850 contatados), que apresentaram valores razoáveis”, informou a empresa em nota. De acordo com a Match, hotéis brasileiros “têm tradição” de cobrar altas tarifas em grandes eventos anuais, como Carnaval e Ano Novo. “Ainda assim, para a Copa do Mundo, os hotéis chegaram a um acordo com a Match que consideramos normal no mercado.” Se os altos valores de diárias em hotéis incomodam, os preços dos ingressos para a Copa de 2014 surpreendem positivamente. O Brasil terá os tíquetes mais baratos da história da competição. O torcedor pagará R$ 30 pela meiaentrada em jogos da fase de grupos. Já para assistir à final, no Maracanã, os fãs poderão desembolsar até R$ 1.980 – o valor mais alto do torneio (confira na tabela). Mesmo assim, a notícia não apagou as reclamações em relação aos preços dos lanches vendidos dentro dos estádios durante a Copa das Confederações: cachorro-quente a R$ 8, garrafa de água mineral a R$ 6 – quando normalmente custa R$ 2 – e refrigerante a R$ 7. Torcedores e turistas, brasileiros e estrangeiros, não querem só ingresso a preço justo: querem acomodação digna e alimentação boa por valores realistas.
tecnologia
C a d a
v e z
m a i s
...e sofisticados. ao apostar nessa aparente contradição, a nike quer – mais uma vez – revolucionar o mercado mundial de tênis
por Rachel costa, de BeaveRton, estados Unidos fotos emiliano capozzoli
74 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
MINIMALISTAS Apresentação, em julho, da nova geração de tênis da Nike
s i m p l e s . . . Como serão os tênis que usaremos nos próximos anos? Se fosse possível cravar uma única resposta, a mais provável seria a seguinte: cada vez mais simples – e, ao mesmo tempo, sofisticados. Parece uma contradição? Nem tanto. Basta conversar com os profissionais que trabalham nos laboratórios da Nike na cidade de Beaverton, em Oregon (a 2016 visitou o local a convite da empresa), para perceber como isso faz sentido. Se, por um lado, a tendência mais forte é o minimalismo no desenvolvimento dos calçados – com solados e revestimentos cada vez mais delicados – por outro, há notáveis inovações tecnológicas. A gigante americana aposta nos tênis que permitem monitorar o desempenho de quem os usa. O resultado é um dossiê muito mais preciso do que qualquer observação humana, em que é possível acompanhar o rendimento do atleta e identificar suas falhas recorrentes. Falta impulso na hora do salto? Ele se cansa no meio da partida? O tênis traz essas respostas. A tecnologia já vem sendo usada no basquete e a previsão é que migre, nos próximos anos, para as chuteiras, permitindo produzir o mesmo tipo de informação no futebol.
tecnologia
MARK PARKER, CEO DA NIKE, E uM DOS MODELOS INSPIRADOS NO CONCEITO DA SIMPLICIDADE. NOVOS TêNIS SãO FEITOS COM SETE COMPONENTES. ANTES, ERAM 60 Dentro do quartel general da Nike, cientistas, designers, atletas profissionais e engenheiros se misturam pelos corredores do complexo de 16 prédios que mais parece uma universidade, pelo tamanho e pela quantidade de equipamentos para pesquisa. O recurso investido não é informado, mas estima-se em mais de cinco mil pessoas a população que circula por ali. Robôs, computadores de ponta, sensores para captação de movimento, salas para a simulação de diferentes condições climáticas, tudo isso faz parte da expertise da gigante americana, cuja história é marcada pela inovação. Muitas portas são trancadas a sete chaves, com acesso restrito a poucos funcionários. Justifica-se: ali estão segredos que valem milhões. A sofisticada tecnologia, porém, não impede a busca pelo simples. Os modelos em desenvolvimento pela Nike são exemplo disso. Eles têm solado ultrafino e revestimento superior feito de tecido, em uma trama que lembra o
tricô. Nada de acolchoamentos, nada de superamortecedores. Além da evidente mudança estética, o impacto na linha de produção também é imenso. Um calçado como esse possui apenas sete componentes em sua fabricação. Um modelo nas tecnologias anteriores possuía entre 50 e 60 componentes. A redução da perda de material durante o processo de fabricação, apenas para a produção do revestimento superior, é de 90%. Esse processo, mais econômico e simples, poderia ser feito em pequenas estruturas industriais dentro de cada país. Assim, as lojas receberiam a trama em tecido e seriam responsáveis por imprimir o solado no tamanho correto para o cliente e fazer a junção das duas partes. Uma mudança que, se concretizada, representará uma revolução no modelo de produção dos calçados. “O conceito surgiu na corrida, mas vem se estendendo como uma tendência a outras áreas”, diz Brian Stewart,
presidente de inovação em calçados da Nike. “Estamos buscando maneiras de fazer as coisas de um jeito mais simples, com menos material, menos peso. Nem sempre esse pensamento vai ser o melhor, mas, em linhas gerais, o minimalismo é uma boa ideia.” A busca pela simplicidade significa uma revolução. Até pouco tempo atrás, as fabricantes buscavam exatamente o oposto. “Realizei pesquisas que mostram que o impacto não é perigoso nem está relacionado a lesões”, diz Benno Nigg, diretor do laboratório da performance humana da Universidade de Calgary, no Canadá, e um dos maiores especialistas mundiais em calçados esportivos. “Eu e vários colegas sugerimos que o sistema locomotor humano possui um caminho preferencial para se mover e passamos a propor que os calçados não deviam tentar mudar isso, mas, sim, deixar que ele ocorresse naturalmente.” Enquanto
a evolu ç ã o em oito passos OS MOMENTOS quE MARCARAM A HISTóRIA DO TêNIS ESPORTIVO sola de borracha Só no século XIX surgiram os primeiros calçados manufaturados com sola de borracha. A principal responsável pela popularização da tecnologia foi a Goodyear, hoje mais conhecida pela produção de pneus. travas nos tênis As travas, hoje comuns nos calçados dos corredores e nas chuteiras, apareceram pela primeira vez em 1852. Os primeiros atletas a usar a novidade foram os corredores. O calçado da época, porém, em nada se parecia com os de hoje: era feito de couro e borracha dura. passada certa Na virada para o século XX, a ideia de produzir tênis capazes de dar conforto e melhorar a “pisada” começou a ganhar força. Primeiro veio o Keds, propondo leveza e flexibilidade. Depois surgiu a marca New Balance, com a proposta de melhorar o desempenho do pé durante a prática esportiva. tênis com assinatura Em 1917, o All Star Converse foi lançado para rapidamente se tornar febre entre jogadores de basquete. Três anos mais tarde, o jogador e técnico Chuck Taylor ajudou na remodelagem do tênis. Sua assinatura foi, pela primeira vez na história, impressa nos calçados junto da logomarca.
os sistemas de amortecimento perdem força, principalmente na corrida, o uso de tecnologias digitais para monitorar o desempenho dos atletas se tornou o novo mote da indústria esportiva. Os primeiros calçados inteligentes debutaram nos treinos para os Jogos Olímpicos de Londres, nos pés dos jogadores de basquete. Sensores colocados no tênis transmitiam os dados do usuário para um computador. A máquina, ao receber as informações, as transformava em uma série de gráficos. A evolução dessa tecnologia pode fazer com que, no futuro, os técnicos usem esses dados para guiar suas escolhas durante a partida. Quem precisa ser substituído? O que determinado jogador está fazendo de errado? Essas são apenas algumas das questões que poderão ser respondidas em tempo real, com a ajuda de sensores e computadores. Tudo muito sofisticado – mas cada vez mais simples também.
mais leveza Veio da cozinha a tecnologia que permitiu à indústria produzir solados mais leves. Em 1974, um dos cofundadores da Nike, Bill Bowerman, resolveu usar a máquina de waffle de sua casa para fazer novos desenhos para a borracha da sola. Resultado: uma opção mais leve e com melhor tração. ar contra o impacto Há até um ex-funcionário da Nasa por trás do surgimento da tecnologia de bolsas de ar na sola dos tênis. O engenheiro aeroespacial Frank Rudy criou os primeiros modelos para a Nike, que os lançou na Olimpíada de Montreal, em 1976. O sucesso garantiu o predomínio dessa tecnologia por muitos anos. a vez do gel Dez anos depois, em 1986, foi a vez da Asics lançar sua novidade na guerra contra o impacto causado no pé durante as práticas esportivas. Em vez de ar, a marca criou revestimentos preenchidos por gel, que logo viraram febre entre os corredores. modelos minimalistas Na última década, o acolchoamento foi posto em cheque pelos cientistas. Isso tem incentivado o surgimento de vários modelos com solas mais simples e leves. Em vez de amortecedores, a tônica agora é dada por tecnologias que permitem ao pé mover-se o mais próximo do natural.
natação
D e b r a ç a D a Brasil faz a sua melhor campanha na história do mundial de esportes aquáticos e renova a esperança de medalhas para 2016
por Mariana Bastos, enviada especial a Barcelona
único cesar cielo comemora vitória nos 50 m livre: brasileiro é o primeiro tricampeão da prova
Foto: Al Bello/Getty
natação
Vinte e um anos após a seleção masculina de Vôlei ter conquistado o ouro olímpico nos Jogos de Barcelona-1992, o Palau Sant Jordi voltou a se render a um brasileiro. No dia 3 de agosto, Cesar Cielo subia ao topo do pódio do Campeonato Mundial de Esportes Aquáticos e soluçava enquanto o hino nacional brasileiro ecoava pela arena. Seu choro emocionado, aliviado, comoveu os 16 mil torcedores das mais diversas nacionalidades, que levantaram de suas cadeiras e aplaudiram, enquanto duraram os acordes, o primeiro tricampeão mundial dos 50 m livre. Cielo não conseguiu proferir nem sequer uma estrofe. “Eu estava colocando tudo para fora”, diz. “Foi um momento de redenção por tudo o que aconteceu no ano passado”, afirmou o nadador brasileiro logo após a premiação. Há um ano, Cielo retornava da Olimpíada de Londres-2012 com “apenas” um bronze nessa mesma prova. Dois meses depois, foi submetido a cirurgias nos dois joelhos. “Eu comecei a ter dúvidas se conseguiria me curar rápido, se conseguiria voltar a tempo.”
Os dois ouros de Cielo no Mundial (o outro foi nos 50 m borboleta, prova não olímpica) tiraram as dúvidas do nadador e de seus rivais quanto à competitividade do brasileiro. O homem mais rápido do mundo na água está de volta. E gritou a plenos pulmões quando olhou para o placar eletrônico e viu seu nome ao lado do número 1. “Vem, vem!”, berrava ele na piscina, enquanto jogava água para o alto e batia no peito após a conquista. “Essa foi a melhor sensação que eu tive após uma prova em toda a minha carreira”, disse Cielo, colocando esse momento acima até daquele após a obtenção da medalha de ouro, também nos 50 m livre, na Olimpíada de Pequim, em 2008. A façanha de Cielo foi o ponto alto do Brasil em Barcelona, mas não o único motivo de celebração na capital da Catalunha. O Mundial foi recheado de boas notícias. O País conquistou o maior número de medalhas de sua história, com dez no total (três ouros, duas pratas e cinco bronzes), e alcançou a oitava posição no quadro geral. A melhor colocação da natação feminina, com o quarto lugar
de Etiene Medeiros nos 50 m costas, também foi motivo de celebração. Duas medalhas inéditas para Thiago Pereira, que ficou com o bronze nas provas de 200 m e 400 m medley, foram muito comemoradas. A terceira colocação de Felipe Lima nos 100 m peito surpreendeu e trouxe esperanças de bons resultados em mais uma prova. E o troféu geral nas águas abertas comprovou o espetacular trabalho realizado por Poliana Okimoto e Ana Marcela Cunha. “O resultado foi melhor do que o que a gente esperava”, diz Ricardo Moura, supervisor técnico da natação da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA). “Para começar um ciclo olímpico, foi ótimo.” A evolução foi mesmo surpreendente. Há dez anos, quando Barcelona sediou o outro Mundial, o Brasil conseguiu colocar apenas um atleta na final: Fernando Scherer. “Albertinho (o coordenador da equipe masculina, Alberto Silva) estava até brincando que, em 2003, a gente veio para Barcelona mais para passear do que para nadar”, diz Thiago Pereira. Atletas e
Foto: Sergio Moraes/Reuters
PRiMEiRA Poliana okimoto (ao lado) levou o ouro na maratona aquática de 10 km, única olímpica entre as provas de longa distância
M unD ial Da J u v e n tu D e nA nAtAção FEMininA, AtLEtAS ADoLEScEntES DoMinAM AS PRoVAS E MUDAM A cARA Do ESPoRtE Pouco antes da prova final dos 200 m costas, era possível observar pelo telão as nadadoras conversando animadamente na sala de concentração dos atletas. Uma cena incomum, já que, normalmente, os esportistas estão tensos nesse momento, antecipando como será cada braçada que darão durante a prova. curiosamente, as três que mais tagarelavam foram justamente as vencedoras da prova. “Estávamos conversando sobre tatuagens”, disse, aos risos, a australiana Belinda Hocking, medalha de prata. Ao que foi acompanhada por gargalhadas de suas companheiras de pódio, a canadense Hilary caldwell e a grande estrela do Mundial de Barcelona, a americana missy Franklin. “Estávamos realmente focadas na prova”, ironizou Missy. “isso ajuda a tirar um pouco da tensão”, disse a jovem de 18 anos, abrindo um largo sorriso, sua marca registrada. Brincadeira de menina, de jovens nadadoras. na ausência de Michael Phelps, que se aposentou após a olimpíada de Londres, as meninas foram as maiores estrelas de Barcelona. na saída da coletiva de imprensa, Missy parou em frente a uma tevê. nesse momento, nadava a outra estrela teen do Mundial: sua compatriota Katie Ledecky, de 16 anos. Missy abriu de novo o largo sorriso quando Katie ganhou a disputa não só contra as rivais, mas também contra a linha do recorde mundial. nos 800 m livre, cravou 8min16s86. A prova já tinha lhe rendido o ouro há um ano, nos Jogos de Londres-2012. Era seu segundo recorde mundial quebrado em Barcelona. nos 1.500 m livre, ela também se tornou a mais rápida da história. no mesmo dia, a arena Palau Sant Jordi já havia se curvado diante de outra adolescente. A lituana Ruta Meilutyte, 16 anos, bateu o recorde mundial dos 50 m peito. Dias antes, havia obtido a mesma façanha nos 100 m peito. “A maturação da mulher é precoce em relação ao homem”, diz Fernando Vanzella, técnico da seleção feminina de natação. “Sem um estudo muito aprofundado, a gente já percebe que uma menina com 15 ou 16 anos está pronta para o resultado internacional, enquanto a maturidade do nadador ocorre em torno dos 20, 21 anos, que é quando ele constitui um corpo mais forte.” Katie foi eleita a melhor nadadora do mundial, mas quem mais chamou a atenção dos holofotes foi mesmo missy, que, nas sete provas que disputou, conquistou seis ouros e uma prata. com isso, ela entrou num seleto grupo. os mitos michael phelps, mark spitz e Kristin otto foram os únicos nadadores na história a superar seis ouros em um edição de olimpíada ou mundial. o interesse em seus gostos e sua vida pessoal era grande. Uma jornalista perguntou o que ela fazia quando não estava nadando. “nado”, respondeu a americana, arrancando gargalhadas. “A natação exige que eu me cuide fora da piscina”, explicou. “Mas eu sou como qualquer garota de 18 anos, gosto de sair com meus amigos, ver filmes”, disse. “Eu me preocupo em ter todas as boas experiências na escola, porque sei que essa fase da vida é única.” os pais da estrela americana fizeram esforço para permitir que a vida de Missy permanecesse dentro de uma certa normalidade mesmo após seu sucesso em Londres, onde conquistou quatro ouros. não tiveram pressa para torná-la profissional logo no ano passado, assim a nadadora pôde curtir seu último ano no colégio antes de partir para a vida universitária.“Minha vida mudou muito após a olimpíada, mas só uma parte”, diz Missy. “Ainda sou a mesma garota de três anos atrás.”
tEEn A americana Missy Franklin (abaixo), de apenas 18 anos, fez história em Barcelona: ganhou seis ouros e uma prata
natação
O brasi l eM Mun Dia is D e es p O rtes a quá tic Os > em provas olímpicas • 6 ouros • 1 prata
• 6 bronzes
> em provas não olímpicas • 4 ouros • 2 pratas
• 3 bronzes
total • 10 ouros
• 9 bronzes
• 3 pratas
(em negrito, provas olímpicas)
> Berlim-1978 • Bronze – 100 m costas (rômulo arantes Júnior) > Guayaquil-1982 • ouro – 400 m medley (ricardo prado) > roma-1994 • Bronze – 100 m livre (Gustavo Borges) • Bronze - 4x100 m livre (Gustavo Borges, Fernando scherer, teófilo Ferreira e andré teixeira) > roma-2009 • ouro – 50 m livre (cesar cielo) • ouro – 100 m livre (cesar cielo) • Prata – 50 m peito (Felipe França) • Bronze – maratona 5 km (Poliana okimoto) > XanGai-2011 • ouro – 50 m livre (cesar cielo) • ouro – 50 m borboleta (cesar cielo) • ouro – 50 m peito (Felipe França) • ouro - maratona 25 km (Ana Marcela cunha) > Barcelona-2013 • ouro – 50 m livre (cesar cielo) • ouro – 50 m borboleta (cesar cielo) • ouro - maratona 10 km (poliana okimoto) • prata - maratona 10 km (ana marcela cunha) • Prata - maratona 5 km (Poliana okimoto) • Bronze – 200 m medley (thiago pereira) • Bronze – 400 m medley (thiago pereira) • Bronze – 100 m peito (Felipe lima) • Bronze - maratona 5 km (Ana Marcela cunha) • Bronze - maratona 5 km por equipe (Allan do carmo, Poliana okimoto e Samuel de Bona)
Foto: Fabrici coffrini/AFP
dirigentes atribuíam o feito brasileiro ao forte investimento recebido, sobretudo dos Correios. Segundo Moura, a última temporada foi praticamente bancada apenas pelo patrocinador oficial da CBDA. O projeto Medalhas do Ministério do Esporte, voltado para os Jogos do Rio em 2016, deve sair do papel somente agora. Coube aos Correios e ao Comitê Olímpico Brasileiro (COB) bancar toda a preparação da equipe para o Mundial. De acordo com o dirigente da confederação, o investimento do patrocinador cresceu entre 30% e 40% em relação ao ciclo olímpico anterior. O retorno desse investimento foi sentido, sobretudo, na maratona aquática, que rendeu sozinha ao Brasil cinco medalhas e o troféu de melhor nação da modalidade. Até então, o País só tinha levado em Mundiais um bronze, em Roma-2009, e um ouro, em Xangai-2011. Na prova de 10 km, a única olímpica, o Brasil conseguiu colocar duas nadadoras nos dois degraus mais altos do pódio. Poliana Okimoto levou o ouro e Ana Marcela Cunha, a prata. “Esse resultado surpreendeu todos os nossos rivais, não só a gente”, diz, exultante, Coaracy Nunes, presidente da CBDA, com o troféu nas mãos. “O Brasil nunca tinha chegado nem perto”, afirmou. “Foi uma surpresa que demonstra que estamos no caminho certo para os Jogos Olímpicos de 2016. Vamos entrar em Copacabana como favoritos.” Pouco antes, nos bastidores, ainda pairava a dúvida sobre qual país receberia a honraria do primeiro lugar. Em tese, Brasil e Alemanha estavam empatados, até que o chefe de equipe Igor de Souza alertou os dirigentes da federação internacional que, segundo as regras, os pontos do revezamento não deveriam ser conta-
bilizados, o que colocaria os brasileiros na frente dos alemães. “Nós éramos os azarões”, disse Igor. “Os favoritos eram Alemanha, Estados Unidos e Itália. Depois, ainda vinha a Rússia”, afirmou. “Já seria excelente se conquistássemos três medalhas de qualquer cor. Então, voltar com cinco e com o título de melhor equipe do mundo foi ainda melhor.” Segundo ele, a partir desse novo ciclo olímpico, os atletas passaram a contar com atendimento individualizado de uma equipe técnica mais ampla. Graças a isso, uma nutricionista detectou que Poliana tinha intolerância a glúten, o que a obrigou a consumir uma dieta diferenciada. “Estamos com uma estrutura equiparada à da Alemanha, que era a melhor do mundo”, afirmou o chefe de equipe. Segundo Igor, agora o Brasil é a bola da vez, o time a ser batido até a Olimpíada de 2016. “Mas nós gostamos de pressão”, disse. “E o principal legado desse Mundial foi o fato de que acabou aquele tabu de que os outros são melhores. Hoje, brigamos de igual para igual.” Ana Marcela, que pretende priorizar a prova de 10 km por ser olímpica, já antecipa até uma vantagem para 2016. “Se a gente se classificar para os Jogos do Rio, as condições de Copacabana são bem parecidas com as daqui (de Barcelona), com água fria e ar quente”, explica. “Ponto positivo para a gente.”
QUASE LÁ thiago Pereira (no topo) compete pelo bronze nos 400 m medley
ParaolímPicos
m inha v i da co r-d e- r o s a A jogAdorA de tênis de mesA BrunA AlexAndre perdeu pArte do BrAço direito Aos 3 meses, mAs se recusou A sofrer por isso. Hoje, Aos 18 Anos, encArA quAlquer AdversáriA – e vence Até AtletAs sem deficiênciA por rodrigo cardoso fotos joão castellano/ag. istoé
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“É engraçado. a vida inteira sorrindo. a vida toda fazendo bagunça. uma vida melhor que a de todo mundo aqui em casa. uma vida cheia de amigos. É engraçado, nÉ? Pensei que seria o contrário. que ela fosse Precisar de Psicólogo, essas coisas.” Ao telefone, falando de Criciúma, em Santa Catarina, onde mora, dona Vera Regina Costa Alexandre, 44 anos, deixa transparecer uma mistura de orgulho e surpresa ao se referir à filha caçula, a catarinense Bruna Alexandre. A sua guria, que hoje mora em São Paulo, teve o braço direito amputado em consequência de um erro médico quando tinha apenas três meses de vida. E não, não precisou recorrer ao divã para se aceitar e superar a provação de viver sem um membro. Instintivamente, Bruna escolheu crescer feliz, mais na rua do que dentro de casa, tripudiando da própria deficiência e, melhor, construindo com a única mão que restara, a esquerda, mais uma excepcional história de superação daquelas que só esporte consegue patrocinar. Aos 18 anos, Bruna é a única mesatenista das Américas a competir profissionalmente sem um braço. Troca golpes com a raquete na mão esquerda tanto em torneios paraolímpicos quanto em olímpicos (para atletas sem deficiência). Ela compete pela seleção olímpica desde 2011. Em junho, no campeonato latino-americano juvenil, só para citar um torneio, foi ouro na duplas
INQUIETA Bruna praticou futsal e andou de skate antes de optar pelo tênis de mesa, aos 7 anos
85 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
novos talentos ParaolímPicos
femininas e por equipes, prata nas duplas mistas e bronze na categoria individual. Ressalte-se: nesta competição, só enfrentou rivais sem deficiência. Com a medalha individual, garantiu vaga para o Mundial juvenil olímpico, em dezembro, no Marrocos. “Ela tem uma habilidade acima da média das demais meninas”, diz Lincon Yasuda, coordenador técnico de seleções olímpicas da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa (CBTM). “É capaz de compensar as dificuldades ocasionadas pela falta de um braço com uma grande capacidade de jogar à média e longa distância.” Bruna é mesmo um fenômeno. Dona de 190 medalhas e 15 troféus, vem sendo lapidada minuciosamente pela confederação, que a trouxe para treinar no melhor clube do Brasil, situado em São Caetano do Sul, em São Paulo. É amparada pelo Bolsa Atleta, do ministério do Esporte, e passará a receber também dinheiro do Bolsa Incentivo, da CBTM, e do Time Pódio Paraolímpico, além de um patrocínio da Caixa Econômica Federal. Atualmente, é a sétima melhor jogadora do País – incluindo atletas olímpicas. No ranking mundial de jogadoras com deficiência, ocupa a quinta posição. “Em 2013, quero ficar entre as três melhores do mundo”, diz. “Sei que posso chegar a ser a primeira do mundo.” Não parece mesmo haver limites para a atleta catarinense. Antes de enveredar para o tênis de mesa, aos 7 anos, vivia na rua em cima de um skate, pedalando em uma bicicleta ou com uma bola nos pés praticando futsal. “A habilidade que eu desenvolvi com os pés nesses esportes me ajuda, hoje, a me deslocar para frente e para trás da mesa sem perder muito o equilíbrio”, diz a atleta. Sua irmã, a advogada Mariane Costa Alexandre, 23, recorda-se que Bruna engessou o tronco aos 5 anos depois de ter sido atropelada e, mesmo assim, não deixava de se aventurar em cima do skate. “Se ela tivesse dois braços, teria colocado fogo em casa”, diverte-se a irmã. Vera, a mãe, também tem uma boa história para contar: “Quando bebezinha, Bruna engatinhava
sentada, já que não tinha um braço”, lembra a mãe. “Eu nem precisava encerar o chão, que vivia brilhando porque ela não parava quieta.” Bruna teve o braço direito amputado depois de dar entrada, com um quadro de pneumonia, em um hospital público de Criciúma. Um cateter foi colocado no antebraço para que o medicamento fosse aplicado na veia, mas o procedimento interrompeu a circulação sanguínea. Uma trombose se desenvolveu e a morte seria certa, se os pais não decidissem pela amputação imediata. O médico que a atendeu foi responsabilizado e condenado a 2 anos e 4 meses de prisão, mas a pena foi convertida em distribuição de cestas básicas. “Eu nunca perguntei aos meus pais como perdi o braço”, afirma a mesatenista. “Sempre aceitei a minha deficiência. Sempre fiz tudo sozinha, desde pequena.” Atualmente, a família busca na justiça uma indenização por danos morais em um processo aberto contra o hospital. Bruna recusou-se a usar prótese. Hoje, ela só precisa de ajuda para amarrar os cabelos compridos – faz todo o resto sozinha. Para partir uma carne, segura a faca com a rEfrEsco mão esquerda e o garfo com o pedaço do Praia do rincão (sc): passatempo predibraço direito que restou, chamado por leto da pequena Bruna (aos 2 anos) ela de “toquinho”. No tênis de mesa, exibe a mesma desenvoltura. Para sacar, prende a bola com o polegar na raquete e depois a lança para o alto. Seu jogo tem um problema: ela desenvolveu o vício de jogar afastada da mesa. Competindo dessa forma, se cansa mais do que as adversárias. “A Bruna tem bom toque na bola e muita habilidade, mas ela precisa jogar próxima da mesa”, diz Hugo Hoyama, dono de dez medalhas de ouro em Jogos Pan-americanos e atual técnico da seleção feminina principal. “Atualmente, a gente vem combinando a qualidade nata dela com treinos de velocidade”, reforça Yasuda, da CBTM. “Se ela for capaz de adaptar os dois estilos, será uma atleta completa.” Bruna treina cinco horas por dia. E conta com um preparador físico para desenProdução: cintia sanchez volver rapidez nos movimentos laterais Agradecimentos: Bob store, dimmy Jeans, Aramis e colcci e fortalecer o braço esquerdo. Vaidosa,
gosta de usar unhas coloridas (azul e rosa são as cores preferidas) e tênis de marca. Tem três tatuagens – a primeira feita aos 13 anos. Seu sonho é juntar dinheiro para comprar dois apartamentos e alugar um deles para ter uma renda fixa quando deixar de competir. Mas não em São Paulo. “O pessoal de São Paulo é muito mal humorado”, diz.“Fora que aqui tudo é muito caro. A manicure me cobra R$ 15 para fazer uma mão só, acredita? Em Criciúma, pago cinco pilas.” A polonesa Natalia Partyka, que não possui uma parte do braço direito, é a maior adversária de Bruna entre as atletas com deficiência. Tricampeã dos Jogos Paraolímpicos, estreou nesse tipo de competição aos 11 anos, em 2000, em Sydney. No ano passado, foi a única mulher com deficiência a competir na Olimpíada de Londres, que terminou na 32ª colocação. A catarinense Bruna também esteve em Londres, disputando sua primeira Paraolimpíada. Não passou da primeira fase ao ser derrotada por uma chinesa que ocupa o segundo lugar no ranking mundial. A brasileira vencia o jogo por 2 sets a 1 e o quarto set por 8 a 6, quando sucumbiu à experiência da adversária, que disputava sua sexta Paraolimpíada e que terminou a competição com a prata no pescoço. “Foi um jogo inesquecível, por pouco não ganho”, diz Bruna. “Quem diria”, emociona-se a mãe Vera. “A menina que perdeu um bracinho virou atleta profissional.”
crAQUE PrEcocE Aos 13 anos, rebatendo bola em criciúma
talento a toda prova
A mesatenista catarinense é a 5ª no ranking mundial paraolímpico e coleciona 190 medalhas e 15 troféus na carreira. confira algumas de suas conquistas:
> campeonato sul-americano juvenil olímpico (2013) > 3 medalhas de ouro (dupla mista, dupla feminina e por equipe) > 1 medalha de bronze (individual)
> campeonato latino-americano juvenil olímpico (2013) 2 medalhas de ouro (dupla feminina e por equipe) 1 medalha de prata (dupla mista) 1 medalha de bronze (individual)
> etapa mundial paraolímpico medalha de ouro na frança, república tcheca, holanda, itália, alemanha, argentina, china e eslováquia
B r u n a t ev e o Braço di re i to a mputa d o d e poi s d e d a r e n t r ada, co m p neumon i a , e m um Hospi ta L p Ú BL i c o . um c a t e t er f o i co Lo cad o n o a n te Bra ço, ma s o p r o c e d i ment o int errompe u a ci rcuLa çã o sa n guín ea. PA r A A crIA NçA N ão mor r Er , o Br Aço TEv E Q UE sE r A mP U TA do. o mé d Ico foI coNdEN Ado à P r Isão
canoagem
A cidAde 88 agosto/setembro 2013 | istoĂŠ 2016
Gênese: em Ubaitaba, às margens do rio de Contas, a canoa é meio de transporte, esperança de medalha e sonho de um futuro melhor
dAs cAnoAs por Mariana Bastos, de Ubaitaba fotos joão castellano
Como a pequena ubaitaba, na bahia, enfrenta a pobreza e a falta de estrutura para gerar alguns dos mais promissores talentos do esporte brasileiro
canoagem
Cotidiano: atleta da associação Cacaueira de Canoagem treina no poluído rio de Contas enquanto mulheres lavam a roupa
“Ubá canoa, de proa ao rio. Taba é cidade, UbaiTaba é só amor.” O pequeno município do sul da Bahia já traz no hino e no nome a sua maior vocação. Em tupi-guarani, Ubaitaba é formada pela união dos vocábulos “ubá”, que significa canoa pequena, e “taba”, que pode ser traduzida como cidade. Em suma, Ubaitaba quer dizer “Cidade das Canoas”. Quem nasce em Ubaitaba aprende desde a mais tenra idade a dar suas primeiras remadas nas canoas nativas, que cruzam o tempo inteiro o rio de Contas. Não à toa, o município de apenas 20 mil habitantes é o maior celeiro de atletas de uma modalidade olímpica de pouca tradição no Brasil. “Todo mundo lida desde criança com a canoa nativa”, diz Luciana Costa, medalhista de bronze do Mundial de 2010. “Desde cedo a gente brinca de remar. Os gestos da remada e a forma de equilíbrio são parecidos com a canoa de competição.” A carreira de Isaquias quase foi interrompida há dois Foi em Ubaitaba que surgiu o maior nome da canoaanos. Ele teve problemas de adaptação quando deixou gem nacional. Isaquias Queiroz, de 19 anos, conquistou em 2011 o Mundial Júnior, disputado em Brandemburgo, Ubaitaba para se aventurar no Rio, defendendo o Flamengo. Além disso, pensou em abandonar o esporte na Alemanha. Levou o ouro na prova de C1 200 m e a quando ficou fora da lista de atletas que disputariam o prata no C1 500 m. Nunca um canoísta brasileiro havia Pan de Guadalajara, em 2011.“Disseram que a pressão obtido tal título em nenhuma das categorias. Hoje em ia ser grande, mas eu sabia que tinha potencial para dia, Isaquias é cuidadosamente lapidado para subir ao disputar o Pan”, afirma. “Eu estava com muita raiva e pódio nos Jogos Olímpicos do Rio, em 2016. Passou a fazer parte do programa “Projetos Especiais”, criado pelo voltei para Ubaitaba mesmo sem permissão. Recebi uma Comitê Olímpico Brasileiro (COB) e voltado para atletas punição e isso me deu mais raiva ainda.” Foi somente após um telefonema de Sebástian Cuattrin, maior nome que podem render bons resultados na próxima Olimda canoagem brasileira, que o baiano resolveu voltar aos píada. Ele treina em São Paulo, na represa Guarapiranga treinos. “Liguei para o Isaquias e ofereci a estrutura de e na raia olímpica da USP, comandado por um dos meSão Paulo para ele treinar”, afirmou Cuattrin, que coorlhores técnicos do mundo em canoagem de velocidade. dena o CT da Guarapiranga. Contratado pelo COB, o espanhol Jesús Morlán chegou Até então, o CT estava montado somente para atender ao Brasil em março passado com a pompa de ter treinado a seleção de caiaque. Foi somente a partir da chegada de o maior medalhista da história de seu país, o canoísta David Cal, que obteve cinco pódios nas últimas três Isaquias que o local passou a ser também a “casa” dos atletas da canoa. À disposição das duas seleções há duas Olimpíadas (um ouro e quatro pratas). Com Morlán no salas de musculação com ar-condicionado, tevê, piso emcomando, Isaquias já tem o que comemorar. Em junho, faturou um ouro e uma prata em uma etapa da Copa do borrachado e equipamentos como ergômetros (máquina de remar a seco) da única marca homologada pela FederaMundo, realizada em Poznan, na Polônia.
Salvador
Valença
Ubaitaba
Ilhéus
UBAI T ABA, BAH IA > População: 20.691 > Área territorial: 178 km² > Índice de desenvolvimento
Humano: 0,611 (médio)
> Hospitais e postos de saúde públicos: 10 > analfabetismo: 28% > População ocupada: 2.637 (12%) > PiB per capita (em reais): 6.919 > Renda média mensal per capita
(urbana/rural, em reais): 261/170
ção Internacional de Canoagem. O atleta também recebe uma bolsa-auxílio para realizar seus estudos em São Paulo e se sustentar. Graças ao dinheiro conquistado com a canoagem, Isaquias pôde realizar um de seus sonhos: “aposentar” a mãe, que trabalhava como zeladora da rodoviária de Ubaitaba e, eventualmente, como lavadeira. Dilma Queiroz, 52 anos, criou os seis filhos praticamente sozinha. O marido morreu em 1999, vítima de um derrame. Na casa situada em um bairro humilde de Ubaitaba, Dilma conta emocionada sobre os percalços da história de Isaquias. Aos 10 anos de idade, o menino se equilibrava nas barras de ferro que servem de guarda-corpo nas margens do rio de Contas quando caiu sobre uma pedra e sofreu uma lesão grave. “Eu tinha acabado de chegar do trabalho quando soube que ele tinha sido levado para um hospital em Itabuna”, afirma Dilma. “Ele ficou dois dias e meio internado na UTI e teve que tirar um rim.” Depois do acidente, ela começou a sofrer pressão de familiares. “Diziam para eu não deixar o menino praticar canoagem, porque ele não podia mais fazer esforço”, lembra a mãe. “Às vezes, ele voltava do treino e sentia tanta dor que não conseguia levantar da cama.” Quase dez anos após a queda, as dores ainda perseguem Isaquias. Mas a maior marca do acidente ficou em seu nome. “Todo mundo me conhece como Sem-Rim”, diz o atleta, com bom humor. “Acho que vou botar esse nome no meu
Foi em UbAitAbA qUe sUrgiU o mAior nome dA cAnoAgem nAcionAl. isAqUiAs qUeiroz, de 19 Anos, conqUistoU em 2011 o mUndiAl Júnior, dispUtAdo em brAndembUrgo, nA AlemAnhA
registro porque meu nome verdadeiro é difícil de pronunciar”, afirma. Tratado como maior esperança de medalha da canoagem em 2016, Isaquias ganhou experiência e corpo desde que saiu de sua cidade natal. Nos últimos três anos, aumentou o peso em dez quilos somente com massa muscular. Toda a estrutura e mimos que tem à disposição não o fazem esquecer, no entanto, do lugar que o revelou. “Levo comigo a lembrança de todo o sofrimento”, diz. “Sou do Flamengo, mas levo o nome da Bahia para qualquer competição, nem que seja para divulgar minha antiga associação e tentar mudar um pouco a estrutura do lugar de onde saí”, afirma o canoísta, que iniciou sua trajetória no esporte graças ao Programa Segundo Tempo, do Ministério do Esporte, e à Associação Cacaueira de Canoagem (ACC). Atualmente, a ACC é o maior retrato da precariedade da canoagem ubaitabense, que teve sua origem em 1985, quando foram levadas à cidade as primeiras canoas de competição. A pequena sede situada à beira do rio de Contas serve de depósito para embarcações ultrapassadas. Possui dois banheiros sem água nem luz e uma sala de musculação com piso quebrado, além de dois equipamentos com pesos enferrujados. À disposição dos 23 atletas adultos que ainda treinam em Ubaitaba há apenas cinco canoas, que já estão oito gerações ultrapassadas. São feitas de fibra de vidro, ou seja, bem mais pesadas do que as embarcações mais modernas de fibra de carbono, como as usadas por Isaquias em São Paulo. Quando entram na água, os atletas da ACC ainda precisam encarar outro inimigo invisível: os esquistossomos. Recebendo esgoto sem tratamento em grande parte de sua extensão, o rio das Contas se encontra poluído. De acordo com o biólogo Hugo de Almeida, grande parte dos canoístas toma medicamentos periodicamente, pois testes demonstraram que todos foram afetados pelo verme
canoagem
atleta e CaRtola: luciana Costa, bronze no Mundial de 2010 e vice-presidente da associação Cacaueira de Canoagem (aCC)
causador da esquistossomose, conhecida popularmente por barriga d’água. Mesmo com tantas adversidades, os canoístas da ACC e das cidades vizinhas são reconhecidos por serem os maiores campeões da modalidade no País. “É tão natural voltarmos para Ubaitaba com uma medalha de ouro que, quando voltamos com uma prateada, acham até estranho”, diz Luciana Costa, medalhista de bronze do Mundial de 2010, que também é vice-presidente da ACC. “Se treinando com essas condições já conseguimos bons resultados, imagine se tivéssemos uma boa estrutura.” Ubaitaba é lar de praticamente todas as modalidades do esporte, inclusive as não olímpicas. É ali que treina o bicampeão brasileiro de canoagem maratona Edivan Francisco, que também se classificou para o Mundial do ano passado. Nessa prova, os atletas percorrem distâncias superiores a 15 km, que incluem trechos a pé, em que o barco precisa ser carregado. A história recente de Ubaitaba se confunde com a da própria canoagem brasileira. A seletiva para os Jogos de Barcelona-1992 ocorreu na cidade. De lá, saiu a primeira equipe olímpica da modalidade. O ubaitabense Jefferson Lacerda foi um dos atletas.
Em 1998, a convite da Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa), Jefferson montou a primeira seleção de canoa em Ubaitaba e convidou o técnico cubano William Flores. A equipe ficou baseada ali até 2004. Nesse período, até 2008, a canoagem local viveu um período de glórias. Todos os anos, no dia 27 de julho, a cidade promovia um grande evento de canoagem em comemoração do aniversário municipal. O evento se espalhou inclusive por cidades vizinhas também banhadas pelo rio de Contas, como Ubatã (cidade de Erlon de Souza, também da seleção) e Itacaré (da bicampeã paraolímpica Marta Ferreira). A região consolidou-se então como maior polo da modalidade no Brasil. “A estrutura não cresceu na mesma proporção dos bons resultados que Ubaitaba dá ao Brasil”, lamenta Jefferson, um dos responsáveis por tocar o projeto Segundo Tempo, que acabou naufragando em 2006. Atualmente, atletas e dirigentes tentam, mesmo com poucos recursos, dar continuidade à formação de talentos. O projeto da vez é tocado pela Associação Atlética Banco do Brasil (AABB). Contratado pela prefeitura, Figueroa Conceição é o responsável pelos treinos de adultos e crianças e acumula também o cargo
ResistênCia: edivan Francisco, bicampeão brasileiro de canoagem maratona, em que as provas superam 15 km, é cria de Ubaitaba
de presidente da Federação Baiana de Canoagem. Segundo ele, chegou a ficar cinco meses sem receber salário. Os atletas adultos se sustentam graças ao Bolsa Esporte, concedido pelo governo da Bahia, e ao Bolsa Atleta, do governo federal. Isso, porém, não é suficiente para bancar as viagens internacionais e a compra de equipamentos de ponta. Para competir no Exterior, normalmente recorrem a uma “vaquinha” entre comerciantes locais. As queixas sobre o descaso vêm em uníssono. Uma das principais reclamações é sobre o baixo número de atletas da canoa na seleção (16) se comparado ao do caiaque (25). Até o início de julho, a seleção de canoa contava apenas com sete atletas. “Sempre houve preconceito em relação aos baianos”, diz Figueroa, enquanto todos os atletas ao seu redor balançam a cabeça concordando.“Quantas medalhas olímpicas se disputam no caiaque? São nove. E na canoa? Apenas três”, rebate Cuattrin. “Essa seria uma reclamação pertinente se as duas modalidades disputassem o mesmo número de medalhas.” Outra reclamação é dirigida à falta de investimento governamental e da confederação para incrementar a estrutura local. Quando firmou acordo de patrocínio com a CBCa
em 2011, o BNDES prometia criar um núcleo de base na cidade. O projeto foi engavetado. Em seu lugar, a confederação conseguiu, via convênio com a Secretaria Nacional de Alto Rendimento do Ministério do Esporte, a liberação de cerca de R$ 250 mil para a compra de material esportivo (27 barcos) e a manutenção de uma equipe técnica em Ubaitaba por um ano.“Para receber essa verba, o Ministério exigiu que a gente reforme a sede da ACC, mas não temos dinheiro para isso”, afirma Figueroa. O presidente da CBCa, João Tomasini Schwertner, diz que aguarda há quatro meses que a federação baiana entregue o projeto para que haja a liberação da verba. “Até hoje não veio projeto, que demoraria mais quatro ou cinco meses tramitando no Ministério”, afirma. “Ou seja, para este ano, ainda não deve ter o dinheiro.” Enquanto a situação não chega a um bom termo, o projeto da formação de base, que tem como maior objetivo a inclusão social dos jovens de Ubaitaba, míngua. “Estamos perdendo talentos”, diz Figueroa. “A ACC faz um trabalho social porque o atleta que hoje deixa de praticar a canoagem é o que amanhã vai estar com arma na mão roubando.”
tênis
não falta dupla Amigos de infânciA, Bruno soAres e mArcelo melo AfinAm o jogo pArA BuscAr umA inéditA medAlhA olímpicA pArA o tênis BrAsileiro em 2016 por RodRigo LaRa fotos máRcio scavone
94 agosto/setembro 2013 | istoé 2016
Se noS eSporteS praticadoS em duplaS conhecimento mútuo, habilidades complementares e amizade verdadeira são requisitos vitais para o sucesso, os tenistas Bruno Soares, de 31 anos, e Marcelo Melo, de 29, já têm meio caminho andado. Nascidos em Minas Gerais, eles são parceiros de longa data, muito antes de qualquer um virar atleta profissional. “O Marcelo é um dos meus melhores amigos”, diz Bruno. “Nós crescemos juntos, somos do mesmo clube.” Marcelo confirma: “Conheço o Bruno desde os 6 anos de idade”, diz. “Por estar perto dele há tanto tempo, fica fácil ter abertura dentro e fora de quadra.” Eles são a principal esperança de medalha olímpica para o tênis brasileiro no Rio de Janeiro em 2016. Nos Jogos de Londres, no ano passado, bateram na fita da rede e conquistaram a quinta colocação. Em casa, não é qualquer medalha que satisfará. “O ouro é o nosso grande objetivo”, diz Bruno. “Acredito que estaremos no auge.” Para o tenista, apesar dos ótimos resultados obtidos nos últimos anos – em Wimbledon, em julho, Marcelo chegou à final de duplas masculinas, enquanto Bruno repetiu o feito nas mistas e, em seguida, venceu o Masters 1000 de Montreal, em agosto –, ainda há muito espaço para evolução. Bruno e Marcelo são exemplos do que se tornou o tênis de duplas nos últimos anos. “Essa modalidade mudou bastante desde que parei de jogar, há dez anos”, diz o ex-tenista Fernando Meligeni. “O que dá para dizer é que houve uma transição, praticamente surgiu um esporte dentro do esporte.” Meligeni afirma que, antes, quem jogava dupla eram tenistas que também disputavam partidas de simples. “Hoje, os atletas perceberam que uma coisa é disputar partidas de duplas para aprimorar suas habilidades e outra, bem diferente, é querer ser a melhor dupla do mundo.” Bruno deu suas primeiras raquetadas quando tinha 5 anos. “Comecei por influência dos meus pais”, diz. “Frequentava um clube com eles e logo me interessei pelo esporte.” Mesmo mineiro, Bruno não deu os
tênis
primeiros passos em seu estado natal. “Aí vem a parte engraçada: eu comecei jogando no Iraque”, conta. O pai de Bruno, engenheiro civil, trabalhou no Oriente Médio na década de 1980. “Devido ao trabalho dele, já morei em vários lugares diferentes”, explica. Bruno começou a disputar torneios com 9 anos. Aos 10, jogou pela primeira vez no campeonato brasileiro. O que poderia ser um problema acabou se tornando um empurrão para que ele se concentrasse no jogo em equipe. Em 2005, lesionou o joelho e ficou fora das quadras por dois anos. “Quando retornei, estava meio sem rumo, porque não sabia como o meu corpo iria reagir”, diz. A impossibilidade física de conciliar a carreira de simples com os jogos de duplas fez com que direcionasse o foco à segunda opção. Marcelo teve trajetória similar. “Meu irmão mais velho e o do meio chegaram a ser profissionais e meus pais jogavam tênis todo fim de semana”, afirma. Seus primeiros torneios foram disputados quando tinha 10 anos. Aos 15, já estava disputando um circuito juvenil na América do Sul. “Conforme fui evoluindo, vendo que os resultados vinham, a mentalidade da minha família acabou me direcionando para tentar ser profissional.” A evolução de Marcelo foi veloz. “Em 2007, comecei a ter muitos resultados bons em sequência jogando em duplas e acabei me concentrando nisso”, diz. Entre 2007 e 2009 conquistou cinco torneios da Associação de Tenistas Profissionais (ATP) ao lado de André Sá. Outro resultado digno de nota foi a semifinal de Wimbledon, também com Sá, em 2007. “Jogo de duplas é mais estratégico e menos físico”, diz Marcelo. “Tem a questão tática, você depende do seu parceiro, precisa treinar com ele e ter uma boa relação.” A dupla segue uma dura rotina de treinamentos. As práticas são diárias e chegam a somar quatro horas de tênis e uma hora e meia de atividades voltadas ao preparo físico. Além disso, há as viagens para os torneios. Por ano, é comum passar 30 semanas fora do País.
>para Bruno, quem é marcelo? “ele sempre foi um cara diferenciado nas duplas. joga muito bem na rede. é um cara alto, então ajuda demais a fechar os espaços naquela área. A gente sempre jogou dupla junto, sempre se deu muito bem como parceiro. e sempre que jogamos juntos os resultados apareceram.”
>para marcelo, quem é Bruno? “o Bruno é muito sólido, especialmente na devolução, o que complementa meu jogo de rede. ele também é muito tranquilo de conversar para decidir tática, mesmo durante o jogo. isso ajuda na hora de encontrar outras opções durante uma partida.”
Com isso, a vida pessoal é afetada. “Às vezes a gente fica longe da família muito tempo”, diz Marcelo. “Faz parte da nossa rotina passar três meses viajando, ficar duas semanas no Brasil e emendar outros três meses fora. Não é fácil, você acaba perdendo uma fase legal da vida.” A família de Bruno também é afetada pelo tênis. “Eu sou casado e gosto de ficar em casa, mas passo muito tempo longe da família e dos amigos de Belo Horizonte”, diz o tenista. De fato, a agenda dos dois é tão concorrida que juntá-los na mesma data, em São Paulo, para a realização das fotos desta reportagem foi um pequeno milagre. Mesmo próximos, Bruno e Marcelo não formam dupla atualmente. Enquanto o primeiro tem atuado com o austríaco Alexander Peya, Marcelo divide as quadras com o croata Ivan Dodig. Na última vez que jogaram juntos, o resultado foi bom: vitória sobre os americanos irmãos Bryan – que formam a melhor dupla do mundo – por 3 a 2, em partida válida pela Copa Davis, em fevereiro passado. A vitória não foi um fato isolado. Juntos, eles ganharam quatro torneios da ATP. Se a parceria é tão bem-sucedida, por que não jogam lado a lado sempre? “Quem não tem
Bruno SoareS Cidade natal: Belo Horizonte (MG) Nascimento: 27 de fevereiro de 1982 (31 anos) Estatura: 1,80 m Destro Treinador: Rodrigo Laender Profissionalizou-se em: 2001 Vitórias nas duplas: 202 Derrotas nas duplas: 135
marcelo melo Cidade natal: Belo Horizonte (MG) Nascimento: 23 de setembro de 1983 (29 anos) Estatura: 2,03 m Destro Treinador: Daniel Melo Profissionalizou-se em: 1998 Vitórias nas duplas: 221 Derrotas nas duplas: 165
parceiro fixo acaba escolhendo na hora”, diz Marcelo. “Funcionou assim comigo e com o Ivan Dodig.” Foi com o atual parceiro croata que Marcelo conquistou o vice-campeonato na última edição de Wimbledon. Bruno também tem trocado de parceiro dentro do jogo de duplas. Além do austríaco Peya, fez dupla com a russa Ekaterina Makarova e com a americana Lisa Raymond. Com o primeiro, venceu o U.S Open em 2012 e o Masters 1000 de Montreal, em 2013. Com Lisa, alcançou o vicecampeonato de Wimbledon neste ano. Trocar de parceiro é uma boa estratégia para ganhar variação de jogo. Para a Olimpíada, a ideia de ambos é criar um planejamento que permita não apenas treinar juntos, mas disputar torneios preparatórios para os Jogos do Rio. “Podemos não formar, necessariamente, uma dupla fixa”, diz Marcelo. “Mas certamente jogaremos juntos na Copa Davis e também em outros torneios.” A julgar pelo retrospecto da dupla, o tênis brasileiro pode ter boas expectativas para a Olimpíada de 2016. Segundo Meligeni, o favoritismo dos irmãos Bryan em praticamente todas as competições de duplas será relativo nos Jogos do Rio. “Até as quartas de final, o favoritismo conta muito, mas depois disso não mais.” Outro que aposta no sucesso da dupla para os Jogos do Rio é Gustavo Kuerten. O mais bem-sucedido tenista brasileiro acredita que a dupla está em franca evolução. “A cada ano, eles melhoram e apresentam resultados mais consistentes”, diz o tricampeão de Roland Garros. Para Guga, Bruno e Marcelo não devem focar somente nos Jogos de 2016. “Acredito que eles têm, pelo menos, mais um ou dois ciclos olímpicos”, diz. “São surpresas excelentes.”
sustentabilidade
foco no esporte corredor interno com marcação de pista de corrida: projeto criativo
O caminhO da sustentabilidade Sede do Comitê organizador rio 2016 vira exemplo de edifíCio “verde” ao optar pela ConStrução em móduloS, que variam de tamanho de aCordo Com a neCeSSidade de peSSoal, e apliCar medidaS inovadoraS que agridem menoS o meio ambiente
por larissa veloso
sustentabilidade
COmO pRImEIRA gRAnDE COnstRuçãO a ficar pronta para os Jogos Olímpicos de 2016, a sede do Comitê Organizador na Cidade Nova, no centro do Rio de Janeiro, virou vitrine do que o Brasil pretende mostrar ao mundo. Além de provar que é capaz de organizar uma Olimpíada, o País ainda tem o desafio de inovar num dos assuntos que mais têm despertado a atenção da comunidade internacional: a sustentabilidade. A primeira fase da obra ficou pronta em fevereiro deste ano, mas a metragem do edifício vai quase dobrar até a cerimônia de abertura dos Jogos. Isso porque a construção não foi feita com paredes comuns, mas com vários módulos de encaixe, como num brinquedo Lego. “O Comitê é uma entidade dinâmica, com um tempo finito de duração pelo tipo de atividade que irá desenvolver” , diz Luís Henrique Ferreira, diretor de instalação do Comitê Organizador. “Essa foi a forma que encontramos para que o prédio crescesse junto com o órgão e o volume de trabalho.” O tamanho e o número dos cômodos no interior do imóvel (serão de 20 a 54 salas de reunião) também podem variar de acordo com a demanda.
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Uma espécie de caixa de 2,40 m de largura por 2,50 m de altura e 6 m de comprimento é a peça básica da estrutura. Semelhantes a contêineres, os módulos recebem acabamento refinado e, no total, poderão acomodar mais de 2,6 mil funcionários, que trabalharão nos períodos de maior movimentação. Uma vez que não há espaço ocioso, o uso de energia é reduzido a apenas o necessário. A construção com blocos pré-montados também propicia economia de material, algo raro na maioria dos canteiros de obras do País. “O método construtivo que temos hoje no Brasil é muito arcaico”, afirma Luiz Henrique Ferreira, da Inovatech Engenharia e homônimo do diretor do Comitê. “Existe um custo de reforma muito grande. Para unir dois cômodos de uma casa, por exemplo, são necessários muito material e energia para derrubar as paredes.” De acordo com ele, a solidez do concreto fazia sentido quando as famílias moravam nas mesmas casas por mais de 50 anos. Nestes novos tempos, em que as pessoas mudam mais
de cidade e os grupos familiares são mais dinâmicos, o melhor seria construir com estruturas leves e flexíveis. A adaptabilidade não é a única inovação da sede do Comitê Organizador. Os sistemas de iluminação e ar-condicionado foram projetados para gastar o mínimo de eletricidade possível. “Somando a economia gerada pelos dois sistemas, acreditamos que teremos um consumo de energia 60% menor do que nos demais prédios comerciais”, estima Ferreira, do Comitê. No pacote sustentável também estão inclusos uso de água da chuva, reaproveitamento do calor liberado pelo ar-condicionado e janelas que permitem melhor iluminação natural. O próprio modelo de negócio do edifício foi alterado. Em vez de comprar, o governo alugou o prédio e todas as estruturas internas, incluindo o mobiliário, que é de madeira certificada. Depois do fim dos trabalhos, tudo será devolvido à construtora.
As etapas de construção e ocupação do edifício sustentável da Olimpíada do Rio fase
Data de entrega pessoal
1
28 de fevereiro
907
12 mil m²
1.400
2
final de 2013
1.617
17 mil m²
2.300
3
final de 2014
2.631
20.900 m²
2.900
patrocínio:
Metragem
Luminárias de LeD
Janelas o edifício conta com vidros reflexivos, que melhoram o aproveitamento da luz natural, diminuem a necessidade de iluminação artificial e reduzem o consumo de energia
ExEm plo a s E r sEg uido As inovAções que tornArAM A seDe Do coMitê orgAnizADor rio 2016 uM MoDeLo De sustentAbiLiDADe
Aquecimento de água o calor gerado pelo sistema de ar-condicionado é reaproveitado para aquecimento da água nas áreas de serviço. parte dela também é aquecida por painéis solares
Construção modular todo o edifício foi feito em módulos que podem ser desmontados e montados em outros locais. o prédio também pode crescer ou diminuir de acordo com o espaço necessário, evitando desperdício de material Iluminação de LED todas as 1,4 mil luminárias da sede do comitê usam lâmpadas de LeD, que duram mais, não esquentam e consomem 70% menos energia do que as convencionais Aproveitamento de água da chuva os coletores com capacidade para 2 mil litros se enchem durante as chuvas. A água é usada para irrigação de áreas verdes e limpeza pesada
Reciclagem Há uma área específica do edifício destinada à separação de resíduos recicláveis e orgânicos, além de lixeiras identificadas em todos os andares Ar-condicionado o sistema de ar-condicionado usa uma nova tecnologia que permite o reajuste da temperatura de acordo com a ventilação do ambiente e a quantidade de pessoas nas salas
performance Consumo inspirado pelo esporte
> Cores e TeCidos Cangas nos mais diversos tons e com todas as estampas imagináveis povoam as praias cariocas. R$ 25 • LuÍS FeRnando, ambuLante da PRaia de iPanema
Co mPr ei n o ri o Lembranças e artesanatos que fazem a aLegria dos turistas que se encantam com a cidade maraviLhosa produção e fotos Masao Goto Filho
> seu PróPrio CrisTo
> BiCudo
> neve no rio?
Em nove tamanhos diferentes, o Cristo Redentor esculpido em pedra-sabão pode decorar da mesa do escritório ao pórtico de entrada da casa. R$ 30 a R$ 300 • SouveniR coRcovado (no cRiSto RedentoR)
O tucano lapidado e empoleirado sobre belas pedras brasileiras é certeza de sucesso entre os turistas gringos. R$ 1.650 • Lido SouveniRS (LidoSouveniRS.com)
O globo de água cheio de purpurina traz a famosa figura do Redentor que abençoa a Cidade Maravilhosa. Não tem neve, mas tem brilho. R$ 35 • SouveniR coRcovado (no cRiSto RedentoR)
> Três em um
> QuenTinho
> na saCola
O mini-trio-carioca, feito pela designer Joana Angert, é uma escultura decorativa que traz elementos clássicos da cidade, como a praia, o Cristo e o Pão de Açúcar. R$ 79 • PaRceRia caRioca (ShoPPing da gávea / PaRceRiacaRioca.com.bR)
Esta caneca de cerâmica tem desenho feito por criança autista e retrata os arcos da Lapa e o bonde de Santa Teresa. A renda é revertida para projetos assistenciais. R$ 35 • PaRceRia caRioca (ShoPPing da gávea / PaRceRiacaRioca.com.bR)
A designer Joana Pegado criou esta prática bolsa inspirada em um clássico aperitivo carioca: o biscoito Globo. Feita de tecido cru, é perfeita para ir à praia. R$ 79 • PaRceRia caRioca (ShoPPing da gávea / PaRceRiacaRioca.com.bR)
> o sal do rio
> o galinho
> na hora
O simpático saleiro de cerâmica com cara de passarinho traz a imagem do Cristo Redentor. Possui apoio para mesa com a inscrição do nome da cidade. R$ 27 • vitacuRa (bondinho do coRcovado / vitacuRa.com.bR)
A camisa do Flamengo com autógrafo do craque Zico comemora um dos tricampeonatos do time mais popular do Brasil. R$ 99,90 • centauRo.com.bR
O relógio enfeitado com pedras brasileiras e imagens do Rio é uma das vedetes entre os visitantes do Corcovado. R$ 125 • SouveniR coRcovado (no cRiSto RedentoR)
> Fumaça
> loira e gelada
> Pé do monTe
O clássico estádio do Maracanã, cenário dos inesquecíveis jogos entre Flamengo e Fluminense, decora o cinzeiro para quatro cigarros feito de cristal. R$ 25 • SouveniR coRcovado (no cRiSto RedentoR)
Sempre que tomar aquela cerveja gelada, você vai se lembrar dos dias no Rio de Janeiro. A silhueta do bondinho do Pão de Açúcar gravada no abridor de garrafas garante isso. R$ 20 • SouveniR coRcovado (no cRiSto RedentoR)
A silhueta do Pão de Açúcar, com bondinho e tudo, é colocada sobre uma base em formato de chinelo Havaianas, pintada com as formas do calçadão de Ipanema. R$ 20 • FeiRinha da PRaça do Lido (em coPacabana)
concentração Cultura e esporte juntos
u m r i o d e P a l a v r a s Livros indispensáveis para quem quer entender e conhecer o rio de Janeiro por Danielle Sanches
a aLma encantadoRa daS RuaS
abuSado – o dono do moRRo dona maRta
aS caRiocaS
Autor: João do Rio/ Páginas: 256 Onde encontrar: dominiopublico.gov.br Preço: grátis
Autor: Caco Barcellos/ Páginas: 508 Onde encontrar: livrariasaraiva.com.br Preço: R$ 59,90
Autor: Sérgio Porto/ Páginas: 164 Onde encontrar: livrariacultura.com.br Preço: R$ 29,91
Famoso cronista carioca do início do século 20, João Paulo Emílio Cristovão dos Santos Coelho Barreto entrou para a posteridade com o seu mais famoso pseudônimo, João do Rio. Foi sob essa alcunha que o jornalista e teatrólogo reuniu, em uma única obra, textos publicados na imprensa do Rio de Janeiro entre 1904 e 1907. À época, a cidade vivia uma realidade efervescente, passando de corte à capital federal da ainda jovem República brasileira.
Em formato de livro-reportagem, o jornalista descreve em detalhes as operações ilícitas envolvendo as corporações criminosas que comandam o tráfico de drogas no Rio de Janeiro. A ocupação do morro e o dia a dia de quem vive por um fio nas comunidades cariocas são narrados por meio da história de Juliano VP – nome fictício usado para contar a vida do traficante Marcinho VP e sua trajetória à chefia do tráfico no morro Dona Marta, em Botafogo.
Jornalista, radialista e compositor, Sérgio Marcus Rangel Porto viveu as décadas de 1920 e 1960 sob o pseudônimo de Stanislaw Ponte Petra. Mas foi com seu nome de batismo que conquistou os leitores ao criar este livro de seis histórias sobre as mulheres cariocas. Cada capítulo narra a trajetória das personagens e suas aventuras pela cidade, além de incluir observações perspicazes a respeito da psicologia feminina.
oS endeReçoS cuRioSoS do Rio de JaneiRo
bLocoS de Rua do caRnavaL do Rio de JaneiRo
guia de FeiJoadaS daS eScoLaS de Samba do Rio de JaneiRo Autor: Augusto Carazza e Regina Lucia Sá (organizadores) Páginas: 176/ Onde encontrar: travessa.com.br Preço: R$ 27,65
Além do samba, a feijoada é uma das marcas registradas do Rio. E o que é melhor do que um guia para aproveitar os dois? Em edição bilíngue, o livro desvenda, em fotos e reportagens, a história social do prato típico da culinária brasileira e sua relação com o samba. A obra traz também depoimentos sensíveis como o de Tia Nilda, ícone da Mocidade Independente de Padre Miguel.
outRo oLhaR: uma FRanceSa no Rio de JaneiRo Autor: Marie-Laure Solanet Número de páginas: 96 Onde encontrar: submarino.com.br Preço: R$ 34,90
Depoimento delicado e pessoal da francesa MarieLaure Solanet, que foi embaixatriz por dez anos no Brasil e deixou para trás sua Paris natal para viver no Rio de Janeiro. A vida tranquila e ensolarada da parisiense é descrita em momentos e experiências, como as aventuras pelos blocos de rua durante o Carnaval, uma viagem de van pela cidade e o dia a dia simples em seu refúgio, na Barra da Tijuca.
Autor: Sérgio Garcia/ Páginas: 232 Onde encontrar: livraria.folha.com.br Preço: R$ 29,90
Autor: Aydano Andre Motta Páginas: 260/ Onde encontrar: reptileditora.com.br Preço: R$ 90
Fuja do lugar-comum com este guia, ideal para quem quer sair da rota típica dos turistas. Entre praias e montanhas, o jornalista Sérgio Garcia apresenta serviços escondidos em pequenas portinhas – que passariam despercebidas sem a devida menção. É o caso do comerciante que vende práticos descascadores de ovos de codorna. Ao todo, o autor garimpou 350 lugares inusitados da Cidade Maravilhosa, mesclando endereços úteis a outros simplesmente divertidos.
Nem só de escolas de samba é feito o Carnaval carioca. Nesta obra, Aydano Andre Motta presta uma homenagem aos outros artistas dessa festa popular: os foliões que saem às ruas em blocos. Com imagens belíssimas captadas pelos fotógrafos Custódio Coimbra e André Arruda, o livro ainda traz mapas de página dupla e mostra a divisão temática dos blocos, além de apresentar um prefácio escrito pelo prefeito da cidade, Eduardo Paes.
do Rio de JaneiRo e SeuS PeRSonagenS: cRônicaS PaRa JovenS
Rio de JaneiRo: caRnivaL undeR FiRe
Autor: Clarice Lispector/ Páginas: 144 Onde encontrar: martinsfontespaulista.com.br Preço: R$ 20
A dama da literatura brasileira modernista apresenta a cidade do Rio de Janeiro sob o seu ponto de vista pessoal – uma especialidade de Clarice, que ficou famosa pelos romances psicológicos e profundamente filosóficos. Percepções secretas e visões do coletivo da cidade se misturam nesta coletânea de crônicas dedicada aos jovens leitores, que passam a conhecer a Cidade Maravilhosa com outros olhos.
Autor: Ruy Castro/ Páginas: 244 Onde encontrar: amazon.com Preço: US$ 36
Jornalista com vasta experiência na imprensa carioca e paulistana, Ruy Castro redefiniu o conceito de biografia e pesquisa histórica com obras como “Estrela solitária – um brasileiro chamado Garrincha” e “O anjo pornográfico – a vida de Nelson Rodrigues”. Neste livro, em inglês, Castro pinta um retrato meticuloso do desenvolvimento do Rio de Janeiro, desde seu passado imperial, passando pela invasão dos intelectuais europeus, a bossa nova, as praias e, claro, a alegria do povo carioca.
página dourada Conquistas que entraram para a história
ouro com conhaque e estricnina
Vera lynn texto
Oliver Quinto arte
Ataque de cães, trapaceiros e bêbados na maratona olímpica mAis mAluCA de todos os tempos A mArAtonA nos Jogos olímpicos de saint louis (EUA), Em 1904, foi dispUtAdA sob cAlor dE 38 grAUs, Em rUAs dE tErrA E com AtlEtAs rEspirAndo A poEirA lEvAntAdA pElos cAlhAmbEqUEs qUE os AcompAnhAvAm.
dois AfricAnos, qUE EstAvAm nA cidAdE ApEnAs pArA pArticipAr dE UmA fEirA dE nEgócios, dispUtArAm A corridA. desistiram no meio da prova.
o primEiro corrEdor A crUzAr A linhA dE chEgAdA foi o AmEricAno Fred lorz.
no km 15, lorz pegou carona no cArro dE Um Amigo.
mAs ElE trapaceou.
no km 35, dEscEU do AUtomóvEl E corrEU os 7 km restantes.
o motivo: três vira-latas Ferozes qUE pErsEgUirAm os corrEdorEs.
shame on you!
Ao dEscobrir qUE rEcEbEriA o prêmio dAs mãos dA filhA do prEsidEntE (1) theodore roosevelt (2), lorz sE constrAngEU E confEssoU A torpE EstrAtÉgiA.
foi desclassiFicado.
com As rEgrAs AtUAis, hicks pErdEriA o títUlo por doping.
o sEgUndo colocAdo, o AmEricAno thomas hicks, foi dEclArAdo vEncEdor. hicks crUzoU A linhA dE chEgAdA dEpois dE 3 horAs, 28 minUtos E 53 sEgUndos.
Ao AnUnciAr, no mEio dA corridA, qUE dEsistiriA dA provA, hicks foi socorrido pelo técnico.
É A pior marca rEgistrAdA por cAmpEõEs olímpicos nA mArAtonA, qUE já hAviA sido dispUtAdA Em AtEnAs (1896) E pAris (1990).
não foi só isso
o sUjEito lhE ofErEcEU estricnina, sUbstânciA qUímicA banida dAs compEtiçõEs hojE Em diA E qUE EstimUlA o sistEmA nErvoso cEntrAl.
rEcEbEU sUA mEdAlhA...
A 10 km do fim, hicks desistiu de novo.
dEstA vEz o rEmÉdio foi oUtro: várias doses de conhaque pArA Animá-lo A conclUir o pErcUrso.
dEU cErto.
(1) Alice Lee Roosevelt Longworth (1884–1980) foi a única filha do ex-presidente americano Theodore Roosevelt. Viveu uma longa vida, morrendo perto dos 100 anos de idade. Foi conhecida como Princesa da Casa Branca. (2) Theodore "Teddy" Roosevelt (1858–1919) foi o vigésimo sexto presidente dos Estados Unidos, de 1901 a 1909.
... E foi direto para o hospital.