SeLecT Nº 25

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LEDA CATUNDA GUY MADDIN MARIO RAMIRO MUSEU DO AÇUDE A R T E E C U LT U R A C O N T E M P O R Â N E A

EDIÇÃO ESPECIAL 4 ANOS

(SOBRE)NATUREZA Rituais, ocultismo, fantasmagoria e embates com o natural. O que a arte contemporânea tem a dizer sobre isso?

Fotoperformance da série Bori (2008-2011), Ayrson Heráclito

ART RIO


EM TEMPO

A SELECT Nº25 ESTÁ NAS MELHORES BANCAS DE TODO PAÍS. A EDIÇÃO COMPLETA TEM 108 PÁGINAS. AQUI VOCÊ ACESSA PARTE DO SEU CONTEÚDO. FOLHEIE E DEGUSTE. PARA ASSINAR E CONSULTAR AS EDIÇÕES ANTERIORES, FECHE ESTA JANELA E ACESSE OS LINKS ASSINE E ARQUIVO, NO CANTO SUPERIOR DA TELA. BOA LEITURA!



FOGO CRUZADO

QUE PROJETO VOCÊ FARIA ANTES DE MORRER ?

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G U I L H E R M E KUJ AW S K I

Entre os obituários produzidos ao longo dos anos, há alguns personagens que mereceriam, cremos, fazer um pronunciamento post-mortem sobre qual obra realizariam, caso fossem ressuscitados. Não é psicografia, apenas um exercício ficcional

ANTONIO HENRIQUE AMARAL ARTISTA

Já passei do tempo das críticas políticas. Aquela era a época da ditadura, e aquilo era arte política. Hoje tudo mudou. Confesso que certas linguagens atuais não me dizem nada. Essa coisa de arte eletrônica. Eu era um pintor, um desenhista. Eu não tinha muita preocupação com teoria estética. Acho que a arte deve estar ligada a emoções caóticas, algo que o formalismo não capta. Eu queria fazer algo honesto e inspirador. Algo que aflorasse diretamente da alma. Eu sei que isso pode parecer piegas. Mas é isso. Não fiquei chateado com a interrupção de minha trajetória. Sei que isso faz parte do ciclo da vida. O que eu quero dizer é que estava prestes a começar algo complemente novo, talvez na linha do expressionismo abstrato, não sei. Uma extrapolação de minhas pinturas de 2001 e 2002.

SERGIO RODRIGUES

CHRIS BURDEN ARTISTA NORTE-AMERICANO

Uma reedição de Shoot, mas agora com um fuzil M16 (risos)! Qual projeto eu gostaria de ter terminado antes de morrer? São tantos! O que posso dizer é que tenho uma fascinação secreta por aqueles arquitetos que criam cidades imaginárias. Aquela São Francisco futurista do Weygers... Aquilo é maravilhoso! Queria fazer algo assim.

DESIGNER

No fim do ano passado, recebi um telefonema do pessoal que estava trazendo uma filial da TOG para o Brasil, perguntando se eu não queria desenvolver uma cadeira para a loja, algo na linha da cadeira Menna. Respondi apenas que ia pensar no assunto. Pela descrição, o espaço me pareceu bem interessante, o que me deu saudades dos primeiros anos da Oca. As coleções me pareceram também interessantes, com trabalhos de Philippe Starck, Nicola Rapetti e outros. Coisa fina. No momento de minha partida, eu estava quase aceitando o convite. SELECT.ART.BR

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FOTOS: NO SENTIDO HORÁRIO, EVA NORVIND, JOSH WHITE/JWPICTURES.COM/CORTESIA CHRIS BURDEN STUDIO E GAGOSIAN GALLERY, E DIVULGAÇÃO


HARUN FAROCKI

LOU REED

ARTISTA E CINEASTA ALEMÃO

CANTOR, GUITARRISTA E COMPOSITOR NORTE-AMERICANO

Quando ainda estava vivo, minha preocupação não era produzir filmes, mas produzir conceitos com filmes. Claro, tem o meu lado documentarista que fica sempre me dizendo: “Não exagere! Não exagere!” Eu gosto de trabalhar com o acaso. Por outro lado, sou muito formalista, tenho de sempre pensar em algo predeterminado. Sobre a sua pergunta, eu me lembro daquela conversa entre Marguerite Duras e Jean-Luc Godard sobre como terminar uma obra de arte. Terminá-la, para os dois, é deixá-la inacabada. Pode parecer paradoxal, mas isso é tão verdadeiro. Pouco antes de morrer, eu estava pensando em iniciar um trabalho sobre a manipulação de imagens digitais em contextos de guerra, mas sem fazer menção aos videogames, como em Serious Games (sobre esse trabalho, ver a matéria “Sol sem sombra”, publicada na edição nº 13 de seLecT). Mas o projeto estava muito no começo e seria negligente falar dele agora.

Depois daquele álbum gravado com a banda Metallica, eu não queria fazer mais nada, só ficar lendo poesia. Aquilo me exauriu completamente. Psicologicamente e fisicamente. Achei que tinha a energia dos tempos do Velvet. Mas estava completamente enganado. Sobre a sua pergunta, se voltasse ao planeta Terra, eu faria algo mais ligado à poesia. A Laurie (Anderson, companheira no final de sua vida) já tinha me falado de Robinson Jeffers, um poeta ecológico. These grand and fatal movements toward death... Cara, isso é lindo! Queria recitar todos os versos dele em uma poetry slam. Nada de música. Poesia é música pura.

IVENS MACHADO ARTISTA VISUAL

Não voltaria ao vídeo. A materialidade me atrai mais. Gosto muito de juntar pedaços de coisas, cacos de vidro, pedras. Isso me dá um enorme prazer. Pouco antes do dia da queda, sonhei com uma estrutura colossal feita apenas com pedregulhos. Parecia um templo. Lembra daquele carteiro francês que todo dia pegava uma pedrinha por acaso na rua e depois construiu um castelo com elas? Então, queria fazer algo assim, mas que não demorasse tanto.

JORGE WILHEIM URBANISTA, ARQUITETO, ADMINISTRADOR PÚBLICO, POLÍTICO E ENSAÍSTA

Tenho um grande apreço por projetos de mobilidade urbana e estava coordenando os estudos para as estações do trem-bala. Sempre fui fã do Sistema Aeromóvel, de Oskar Coester. Mas esses projetos costumam naufragar, simplesmente por falta de vontade política ou corrupção. Eu não acompanhei mais aquela história do trem transcontinental entre Brasil e China, mas eu não aconselharia o governo a continuar. É muito arriscado. Qual projeto gostaria de executar se eu ressuscitasse? Com certeza, o do banco no parque do Mackenzie! Uma vez por semana eu sentaria nele e bateria um papo com os estudantes sobre a cidade e seus problemas. FOTOS: NO SENTIDO HORÁRIO, ANDREY ROMANENKO, PHIL KING, CORTESIA ARTUR FIDALGO GALERIA, DENISE ANDRADE E TING CHENG

TOMIE OHTAKE ARTISTA PLÁSTICA JAPONESA NATURALIZADA BRASILEIRA

Tanta coisa, que nem sei por onde começar!

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MUNDO CODIFICADO

CHATS COM O ALÉM 46

Do copo ao chat por computador, vários são os canais de bate-papo com quem já passou desta para melhor. Quanto mais tecnologia no mercado, maior o congestionamento das ondas de comunicação com o lado de lá. seLecT traz aqui uma cotação dos equipamentos mais usados. O combustível básico é um só: tem de acreditar, e muito

INDEFINIDO

COPO Este qualquer pessoa tem em casa. Basta colocar o copo no centro de uma mesa, cercado das letras do alfabeto, de números e também das palavras “sim” e “não”. Para que funcione, pelo menos duas pessoas precisam sentar a uma mesa e se concentrar. Ele se moverá sozinho. Qualidade do serviço: ««««« Usabilidade: «««««

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TELÉGRAFO Captar uma mensagem de outra dimensão por Código Morse podia ser uma boa pedida no fim do século 19, quando foi inventado. A entidade se apossava dos sinais e mandava seu recado. Hoje caiu em desuso, com a difusão dos telefones. Qualidade do serviço: ««« Usabilidade: «

1848

LUCIANA PAREJA NORBIATO E GUSTAVO FIORATTI

TABULEIRO OUIJA O legal do tabuleiro ouija é que, uma vez conectado com o Além, ele vai embora. Sua superfície tem as letras do alfabeto, números e outros símbolos. Com um indicador móvel, de signo em signo, conseguimos uma comunicação sem ruído. Dá para comprar pela internet, em lojas especializadas e até criar um com uma boa cartolina. Qualidade do serviço: ««««« Usabilidade: ««« TELEFONE Desde o filme O Chamado, ninguém quer receber uma ligação do Além. Mas há quem use o aparelho para falar com almas penadas, que costumam responder com boa qualidade, segundo inúmeros relatos. Um livro foi publicado no Brasil sobre o tema, Vozes do Além pelo Telefone, de Oscar D’Argonnel (1925), disponível na internet. Qualidade do serviço: ««««« Usabilidade: ««« SELECT.ART.BR

1876

ILUSTRAÇÕES PEDRO MATALLO

FOTOGRAFIA

RÁDIO

Assim como o vídeo, a fotografia permite apenas flagrar intromissões de vultos, em geral ao fundo da cena. Vale a pena só para averiguar se alguém mais habita a sua casa ou apartamento, mas não dá para trocar uma ideia. E nem sempre a imagem é definida. Qualidade do serviço: « Usabilidade: «««

Desde o fim do século 19, quando as ondas eletromagnéticas começaram a cruzar o ar, muitos pescaram vozes do Além entre músicas e narrações radiofônicas. Mas não adianta nada rezar: é preciso ter um bocado de sorte (ou imaginação) para o espírito entrar na sua frequência. E ser mais que um grunhido ou chiado... Qualidade do serviço: ««« Usabilidade: ««

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SPIRICOM Com a evolução dos computadores nos anos 1940, nada mais natural que cientistas americanos criassem um especial para contato com fantasmas. Das cinco versões, a terceira e a quarta tiveram sucesso. Cientistas mortos teriam se comunicado para sugerir melhorias ao equipamento, que sucumbiu a suspeitas de fraude e hoje está inativo. Qualidade do serviço: « Usabilidade: l

CÂMERAS DE VÍDEO Alguns manuais consideram acidentais as aparições em vídeo. Mas há relatos de quem deixou a câmera ligada de propósito só para flagrar um Gasparzinho perdido. Se você pretende travar uma conversação de mais fôlego com o Além, não é este, contudo, o método mais eficaz. Qualidade do serviço: «« Usabilidade: «

DISCO DE VINIL Os discos da Xuxa são o alvo preferido de quem tentou ouvir algo satânico. No YouTube há registros de experiências (e com legenda!!!!!!). Enfim, parece eficiente, mas não permite chamar alguém em específico. Para usar é preciso rodar ao contrário Qualidade do serviço: ««« Usabilidade: ««

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CELULAR Se o telefone já era um avanço tremendo, pelo celular pode-se bater aquele papo com o espírito que se deseja evocar. Smartphones servem também para fazer fotos e vídeos do Além. Mas não depende só de uma fezinha para funcionar: aparelho, operadora e plano de internet fazem a diferença. Qualidade do serviço: ««««« Usabilidade: ««««

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COMPUTADOR Alguns manuais na internet indicam o Skype. Dizem por aí que adicionando o contato crossovertalk dá para tentar alguma experiência. Computadores, afinal, reúnem quase todas as ferramentas de comunicação com os mortos. Há de gravadores a tábuas ouija online. Qualidade do serviço: «««« Usabilidade: «««««

1944

FAX Não é muito legal e os relatos de sucesso são bastante escassos. É preciso deixar o fax ligado e rezar muito, mas muito mesmo. De qualquer forma, alguns sites de transcomunicação instrumental citam, sim, alguns casos, só que quase todos não foram planejados. Qualidade do serviço: « Usabilidade: ««

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GRAVADOR Dizem que, de rolo, fita cassete ou digital, esses equipamentos captam com facilidade sons do outro mundo. É só deixá-los em ação e acreditar: ao ouvir a gravação, surgem várias frases. Há quem diga que são pareidolia (crença de que se entendeu algo porque o som e a imagem parecem com uma coisa conhecida). Qualidade do serviço: ««««« Usabilidade: «««««

TELÉGRAFO VOCATIVO CAMBRAIA Se alguém duvidava da funcionalidade do telégrafo comum no bate-papo com o Além, o português radicado no Brasil Augusto de Oliveira Cambraia patenteou, em 1909, seu próprio aparelho para contato com almas. De alcance restrito, não sobrou dele nenhum exemplar em uso. Qualidade do serviço: Desconhecida Usabilidade: l

TELEVISÃO Depois do filme Poltergeist, quem nunca temeu uma TV fora do ar? Mas as aparições na telinha são mais que pontinhos em p&b. Há registros de visões perfeitas por parapsicólogos notórios, como o alemão Ernst Senkowski. Se elas são reais, não se sabe. E depende da boa vontade da entidade luminosa. Qualidade do serviço: «« Usabilidade: «««

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PORTFÓLIO

AYRSON HERÁCLITO RELIGAR E DAR A VER PA U L A A L Z U G A R AY

Em ritos performáticos, Ayrson Heráclito age politicamente. Dá alimento às cabeças e faz pensar, na medida em que revela os espaços doentes da história do Brasil

EM ABRIL ÚLTIMO, AYRSON HERÁCLITO VESTIU-SE DE BRANCO PARA

entrar na Casa da Torre de Garcia D’Ávila, construção de 1550, em Mata de São João, Bahia, sede do que foi o maior latifúndio da história do Brasil, que se estendia da Praia do Forte até o Maranhão. Pisava em terreno que fora o arcabouço da aristocracia baiana e a gênese da sociedade escravocrata brasileira. Portava galhos e folhagens de para-raios, romãzeira, aroeira, espada-de-são-jorge e outras plantas mágicas, a fim de realizar a primeira parte da performance O Sacudimento.

Fotografia da performance O Sacudimento da Maison des Esclaves (2015), em Gorée, Senegal FOTOS: AYRSON HERÁCLITO FOTOS:

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Acima, fotografias da performance O Sacudimento da Casa da Torre (2015); abaixo, fotos de O Sacudimento da Maison des Esclaves (2015)

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FOTOS: AYRSON HERテ,LITO


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Realizado por iniciados no candomblé jejê, como ritual de cura e limpeza de ambientes domésticos, o “sacudimento” ganha uma dimensão universal na obra de Heráclito. Segundo o artista, a energia quente desprendida das folhas batidas nos cantos da casa-forte de Garcia D’Ávila não era destinada a expulsar os frios “eguns” – espíritos que permanecem entre os vivos, trazendo-lhes infortúnios – de escravos vítimas de torturas e abusos extremos. Heráclito sacudia um único egum que assombraria o local: o senhor de escravos – e a violência infiltrada por ele sobre o antigo sistema social da Bahia e irradiada até os dias de hoje, na pobreza e na desigualdade social distribuídas por todo o País. “Trata-se de um ritual de ativação e apaziguamento de nosso passado colonial”, diz Ayrson Heraclito à seLecT. A segunda parte do trabalho foi realizada em meados de maio, na outra margem do Atlântico, mais especificamente na última porta cruzada pelos africanos escravizados e transportados ao Brasil. O Sacudimento da Maison des Esclaves, na Ilha de Gorée, no Senegal, forma com O Sacudimento da Casa da Torre um díptico. As duas casas são conectadas por uma performance que busca religar o que havia sido cindido à força. “Realizei o grande projeto da minha vida, um díptico que promove a reunião das SELECT.ART.BR

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margens do Atlântico por meio da prática da performance”, diz ele. “Tal obra tem como temática central o exorcismo de dois monumentos arquitetônicos ligados ao tráfico Atlântico de escravos e à colonização”. O Sacudimento, o mais recente projeto de Heráclito, foi premiado pela Associação Videobrasil, que propiciou sua residência no Senegal, e pelo Novo Banco Photo 2015, que expõe as fotografias e os vídeos do projeto no Museu Coleção Berardo, em Lisboa, até outubro. ALIMENTO PARA A REFLEXÃO

Artista, pesquisador da diáspora africana no Brasil e professor de artes visuais na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Ayrson Heráclito sempre se interessou por materiais “intermediários”, isto é, em estado de transformação física ou simbólica. Tomando como referências conceituais a escultura social de Joseph Beuys e sua pesquisa com a energia da matéria, chegou aos materiais utilizados nos rituais e na culinária afro-baiana. O açúcar, a carne de charque e o azeite de dendê – que substitui o sangue animal nos rituais para Exu e é o material intermediário da obra Divisor – foram os primeiros elementos trabalhados. “Simultaneamente,


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Heráclito sempre se interessou por materiais “intermediários”, isto é, em estado de transformação física ou simbólica

Fotografias da série Bori (2008-2011), de Ayrson Heráclito

promovo uma decodificação e uma nova forma de absorção de seu significado usual”, diz ele. Grãos, frutos e matérias da natureza adquirem aqui um sentido mágico. A rota dos elementos levou o artista a conceber uma performance inspirada na prática de ofertar comidas para a cabeça em cerimônias religiosas. Bori, no idioma ioruba, é a fusão de bó (oferenda) e ori (cabeça). Nesta ação, o artista oferece comidas sacrificiais a 12 cabeças, ritualizando os 12 principais orixás do candomblé, de Ogum a Oxalá. Quiabo para Xangô; milho para Oxóssi; feijão-branco para Oxum; vatapá para Iansã; arroz e favas, simbolizando a espuma do mar e a madrepérola, para Iemanjá. Em Bori (2008-2011), há também a pipoca (doburu, em ioruba, ou “flor do Velho”), alimento de Obaluaiê. Mas o deus da varíola e das afecções ganhou do artista deferência especial na performance Buru Buru (2010), em que um homem recebe, de braços abertos, uma chuva de flores. Segundo a mítica do candomblé nagô, as flores do doburu representam chagas do corpo doente de Obaluaiê. E seus banhos servem para curar. Com seus ritos performáticos, Ayrson Heráclito age politicamente. Dá alimento para as cabeças e faz pensar, na medida em que dá a ver as feridas dos corpos e revela os espaços doentes e castigados pela história do Brasil. FOTOS: AYRSON HERÁCLITO


CURADORIA

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L U C I A N A PA R E J A N O R B I AT O

OS CINCO ELEMENTOS Em interlocuções e interpretações anímicas da natureza, artistas evocam os poderes da água, do ar, fogo, terra e das profundezas da mata ATRIBUI-SE NORMALMENTE AO SOBRENATURAL AS MANIFESTAÇÕES DA NATUREZA que não se consegue entender

racionalmente. Seja o barulho do vento nas folhas das árvores ou o fogo fora de controle. Sejam as tempestades e maremotos ou os desmoronamentos de terra. No contato com fenômenos causados por elementos naturais, o mistério e o horror provocados pela ignorância transformam-se no temor contemporâneo: a vingança do meio ambiente contra os abusos cometidos em nome do progresso. Nesta seleção, artistas que não têm medo de água, ar, fogo, terra, nem mesmo das profundezas da floresta, restabelecem a percepção de que fazemos parte de um organismo vivo muito maior do que os nossos corpos. SELECT.ART.BR

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ÁGUA WOLFGANG TILLMANS

IGUA ZU

( 2 010 )

Uma, duas, três gotas não metem medo em ninguém. Mas, quando o volume de água é colossal, a ferocidade da correnteza mostra seu poder de arrastar no seu curso terra, mata, coisas e seres. Na imagem clicada pelo artista alemão Wolfgang Tillmans, durante a viagem que o fotógrafo fez pelo Brasil e fronteiras antes de sua individual no MAM-SP, em 2010, o plano que encerra uma porção das Cataratas do Iguaçu dá a dimensão da força da água, que ali é geradora de energia. FOTO: WOLFGANG TILLMANS/CORTESIA DO ARTISTA FOTOS:


ÁGUA

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R E G I N A VAT E R

SÉRIE A R T – UM A SEM A N A MENO S UM DI A

(19 7 7 )

Os diferentes estados da matéria são um vasto campo para experimentações poéticas sobre a efemeridade da arte – e da vida. Ao registrar o desaparecimento gradual da palavra gravada em um bloco de gelo, a pioneira Regina Vater – que aproxima sua pesquisa artística de uma militância ecológica e social – traça um paralelo entre a obra artística e a volatilidade da existência humana. A solidez lentamente torna-se líquida e borra os contornos da matéria, como a memória que se extingue com o passar do tempo. SELECT.ART.BR

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JOAN JONA S

RE A NIM AT ION

( 2 013 )

Precursora norte-americana da performance e da videoarte, Joan Jonas segue contundente em sua produção atual. Na obra atualmente exposta no Pavilhão dos Estados Unidos, na 56ª Bienal de Veneza, ela faz parceria com o pianista de jazz Jason Moran. A base narrativa, sobre a qual são costuradas imagens em vídeo e sons ao vivo, é o livro Under the Glacier, do escritor islandês Halldór Laxness, premiado com o Nobel. O resultado é uma narrativa em que a água e o oceano têm lugar central: o derretimento das geleiras na Islândia ganha denúncia de contornos xamânico, totêmico e poético. FOTOS: CORTESIA JOAN JONAS E BIENNALE DI VENEZIA. NA PÁGINA AO LADO, CORTESIA REGINA VATER


AR

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F R A N C I S A LŸ S

TORN A DO, MIL PA A LTA , MÉ X IC O

( 2 0 0 0 -2 010 )

Só um maluco – ou, claro, um artista – sai correndo ao encontro de um tornado, e não na direção contrária. Pois o belga Francis Alÿs, conhecido por suas performances que subvertem usos e costumes no trato com elementos naturais, enfrentou o medo e se misturou à nuvem de terra levantada pela poderosa corrente de ar, que se move numa velocidade de 65 a 180 quilômetros por hora. No meio do deserto mexicano, enfrentou o fenômeno natural como um toureiro encara o touro na arena. SELECT.ART.BR

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N A N D I P H A M N TA M B O

LW E T I

( 2 013 )

O ponto de partida foi uma pesquisa sobre a sensação de leveza e maleabilidade conseguida por escultores da Antiguidade em materiais rígidos como o mármore. Em Lweti, a artista sul-africana Nandipha Mntambo desenvolveu o processo de moldar couro de boi sobre seu próprio corpo. Aprendeu sua técnica com um taxidermista. A matéria-prima evoca corpos naturalizados, cobertos de pelos, uma estratégia para tensionar o padrão físico considerado normal na atualidade. Nesta instalação, as figuras são tão leves que parecem voar contra o vento. FOTOS: MARIO TODESCHINI/STEVENSON CAPE TOWN-JOHANNESBURG. NA PÁGINA AO LADO, CORTESIA FRANCIS ALŸS/GALERIE PETER KILCHMANN, ZURICH


FOGO

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JOACHIM BROHM

ON FIRE , DA SÉRIE OHIO

(19 8 3 - 8 4 )

Precursor no uso da cor na fotografia desde os anos 1970, foi a partir da década de 1980 que o fotógrafo alemão Joachim Brohm tornou-se um dos ícones de sua vertente, a paisagem. Como o norte-americano William Eggleston, que o inspirou, Brohm registra cenas cotidianas de regiões como o centro da mineração na Alemanha, o Vale do Ruhr, e Ohio, estado dos EUA que teve intensa imigração germânica. Nesta série de imagens, ele flagrou o fogo consumindo um carro em plena luz do dia. Nem nas cidades os fenômenos naturais estão sob controle. SELECT.ART.BR

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C A M I L A S P O S AT I

V ERMEL HO C OM V ERDE

( 2 0 0 9)

Há um quê de alquimia mesclada a ciência nos trabalhos de Camila Sposati. A artista paulistana trabalha com elementos como fumaça colorida, intervenções diretas na paisagem e cristais. Com eles traz à tona a entropia e o acaso, presentes em todas as misturas de elementos químicos que formam o mundo. Ao mesmo tempo, ela torna evidente a efemeridade dos processos pela dissipação da energia gerada com as reações. No fim, apenas o vazio. Brincando com fogo, gera efeitos de cor nas chamas pela combinação de estrôncio e cobre. FOTOS: CORTESIA CAMILA SPOSATI. NA PÁGINA AO LADO, CORTESIA JOACHIM BROHM/GRIMALDI GAVIN


TERR A

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RODRIGO BR AGA

DO PRAZER SOLENE 1 ( 2 0 0 5 ) Talvez por ter nascido em meio à floresta amazônica, o manauara Rodrigo Braga constitui seu universo poético por meio das relações do homem com a natureza selvagem. Em várias de suas imagens, apresenta um contato visceral com a terra. Seja ao enterrar-se com um bode recém-sacrificado, traduzindo visualmente a conexão entre a morte e a vida, na obra Comunhão I (2006), seja esfregando seu próprio corpo na terra vermelha, encenando um ritual de união e pertencimento, em Do Prazer Solene 1 (2005).

P E D R O M O T TA

SEM T Í T ULO, DA SÉRIE N AT URE Z A DA S C OI S A S

( 2 013 )

Premiada pelo BesPhoto 2013, a série da qual esta foto faz parte ganha intervenções a lápis. Sobre a imagem de um desnível de terra, o artista mineiro desenhou a raiz da árvore que está no topo. Com essas intervenções, parte do aporte documental da fotografia para a intervenção, usando a relação com o ambiente como tema recorrente. SELECT.ART.BR

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FOTOS: FOTOS:CORTESIA PEDRO MOTTA. NA PÁGINA AO LADO, RODRIGO BRAGA/GALERIA VERMELHO


M ATA

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K AT I A M A C I E L

SUSPEN SE ( 2 014 ) A instalação Suspense faz parte de um projeto de cinema, performance e ficção de Katia Maciel. Realizadas para a câmera, suas performances apresentam fragmentos de uma narrativa que deverá ser paulatinamente construída pelo espectador, a partir de uma experiência rarefeita com a obra. Como um expedicionário diante de um mapa a ser decifrado.

VÉIO

SEM T Í T ULO

(S.D.)

O artista sergipano Cícero Alves dos Santos, mais conhecido pelo apelido, demonstra uma capacidade rara de combinar cultura e natureza. Ao se apropriar das formas sugeridas pelos troncos de madeira usados como matériaprima, dá vida às figuras de animais escondidas nas bases das árvores, numa interpretação anímica da mata. SELECT.ART.BR

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FOTOS: DE CIMA PARA BAIXO: LEANTRO PIMENTEL E GERMANA MONTE MÓR/GALERIA ESTAÇÃO. NA PÁGINA AO LADO, GUI GOMES/ZIPPER GALERIA


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JANAINA MELLO L ANDINI

CICLOT R A M A 2 0 (ONDA ) ( 2 015 ) Com o desmembramento de cordas de materiais que vão do sisal ao plástico, a jovem artista mineira insere em espaços fechados grandes árvores, construídas com um trabalho meticuloso. Com esse gesto, versa sobre os limites do espaço e do tempo em relação com a natureza e a produção humana. FOTOS:


INSTITUIÇÕES

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E S PA Ç O S D E A R T E E N AT U R E Z A Nos altiplanos chilenos, em localidades remotas da Amazônia, na Serra da Bocaina ou no coração da Floresta da Tijuca, artistas, curadores e educadores se engajam em projetos de residências e iniciativas pedagógicas que buscam resgatar sabedorias ancestrais e ensinamentos da natureza

PA U L A A L Z U G A R AY, G U I L H E R M E KUJ AW S K I E M Á R I O N S T R E C K E R SELECT.ART.BR

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PL ATA FORM A ATAC A M A D A S N AT I VA S M A N I F E S TA Ç Õ E S I N C A S E A I M A R Á S À S INTERVENÇÕES DA ARTE CONTEMPOR ÂNE A

Considerado o deserto de maior altitude e aridez do mundo, destino cativo do turismo de aventura, o Atacama é uma região de grande diversidade geológica e arqueológica, localizada no norte do Chile. Aos seus habituais visitantes – astrônomos, cientistas e esportistas, praticantes de trekking, off-road e mountain bike – soma-se, desde 2012, uma tribo de artistas-aventureiros, convidados pela curadora chilena Alexia Tala a caminhar e a refletir sobre a vastidão da paisagem, da história e das culturas locais. Com o luxuoso apoio logístico dos Hotéis Explora, a Plataforma Atacama já ofereceu cinco residências. Marcelo Moscheta inaugurou o projeto com caminhadas nos entornos do Salar. Catalogou rochas, desenhou, fotografou e realizou uma intervenção sobre a linha imaginária do Trópico de Capricórnio, marcando sua passagem com uma fileira de pedras. Caio Reisewitz passou dez dias fotografando o altiplano, a 4,5 mil metros de

O artista Caio Reisewitz fotografa o altiplano do Atacama

altura; Cadu esteve dois meses na Praia Hornitos, onde o deserto encontra o Oceano Pacífico; o artista-caminhante Hamish Fulton realizou um walking project de 14 dias perto da fronteira com a Bolívia. Os trabalhos resultantes desses embates com a natureza são convertidos em publicações ou exposições em instituições parceiras. O próximo passo é uma série de residências coordenadas com o Eye Film Museum, de Amsterdã. Assim, a Plataforma Atacama vai constituindo um acervo de arte contemporânea em diálogo com o precioso legado arqueológico de arte rupestre e pré-colombiana local. PA FOTOS: CAIO REISEWITZ, CORTESIA PLATAFORMA ATACAMA


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RUR A L . S C A PE S A A LTA T E C N O L O G I A E M C O N V I V Ê N C I A C O M A S S A B E D O R I A S A N C E S T R A I S E O S O F Í C I O S D A R O Ç A

A casa-sede da Fazenda Santa Teresa, localizada próximo à cidade de São José do Barreiro, no interior de São Paulo, foi construída na época de ouro da produção cafeeira paulista, na primeira metade do século 20. Desde 2014, ela é o QG de rural.scapes, programa de residência rural concebido pelos artistas Rachel Rosalen e Rafael Marchetti, que há tempos assinam juntos projetos de arte e tecnologia. Ao herdar a fazenda de seu pai, Rachel decidiu que esse era o momento certo de retirar o monopólio dos hacklabs dos grandes centros urbanos brasileiros. As residências rurais – como a do Museu da Mutuca, em Altamira (PA), a Estação Rural Nuvem, em Visconde de Mauá (RJ) e rural. scapes – têm entre seus princípios filosóficos a reinvenção da noção de natureza. Ou seja, elas se propõem a remover a pátina romântica tão presente na chamada “arte ecológica”, cujos

praticantes geralmente se valem de uma estética que “gourmetiza” a physis com ambiências estéreis e inofensivas. A natureza, para elas, é ameaçadora e implacável. Tem mais a ver com o lado escuro da lua do que com os comerciais de SUVs. Segundo as linhas da convocatória de rural.scapes, a proposta da segunda edição é mesclar as mecânicas da lavoura arcaica aos circuitos integrados, os ícones da cultura maker urbana. Assim, a “alta tecnologia” passaria a conviver com as sabedorias ancestrais e os ofícios da roça, que, em tempos de crise hídrica, devem ser encaradas não como ultrapassadas, mas altamente sofisticadas. Veja-se, por exemplo, a técnica de bombeamento de água por meio de gravidade, o chamado “carneiro hidráulico”, estratégia comum em regiões campesinas. O programa tem o incentivo de leis de cultura e recebe projetos de países do mundo todo, literalmente (o Iraque está presente na segunda edição). Quando chega a Kombi com os artistas, a fazenda torna-se um microcosmo autossuficiente, um miniplaneta. Ao final de cada etapa, as oficinas e as invencionices estéticas são compartilhadas com os alunos das escolas públicas estaduais da região, exercício de formação educativa crucial para o sucesso do projeto. Quem sabe, em breve, os resultados das residências não serão os verdadeiros utensílios para uma nova realidade ecológica? GK

Detalhe de Rádioplanta, projeto inspirado no livro A Vida Secreta das Plantas e realizado pela dupla Paloma Oliveira e Mateus Knelsen SELECT.ART.BR

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Diferentes Maneras de Cruzar un Río, instalação de Carlos Garaicoa realizada durante residência da Casa Deuxsoleils, na Colômbia

FLOR A A R S +N AT UR A A N AT U R E Z A C O M O U M T E M A Q U E N Ã O S E L I M I TA A O C A M P O D A B I O L O G I A , MA S PODE SER ABORDADO DESDE DIVERSOS OUTROS LUGARES, COMO A FILOSOFIA , A HISTÓRIA ETC.

FLORA ars+natura é um espaço de arte contemporânea, focalizado na relação entre arte e natureza, criado pelo curador colombiano Jose Roca. De importância central dentro do espectro de pesquisa do curador, o tema já foi abordado, direta e tangencialmente, em vários de seus projetos, entre eles Otras Floras, na Galeria Nara Roesler, em São Paulo (2008), e na 26ª Bienal de São Paulo (2006), quando acompanhou as residências artísticas no Acre e curou uma retrospectiva do artista autodidata Hélio Melo. “Outro aspecto detonante de FLORA foi que, nos últimos anos, percebi um interesse pela natureza na prática de alguns artistas colombianos, por exemplo, uma abordagem da botânica em relação a sucessos sociais e políticos”, diz Roca. O que particulariza FLORA ars+natura em relação a outros projetos que enfocam arte e natureza é seu amplo campo de ação, ainda que suas duas sedes não estejam localizadas em zonas rurais, mas dentro dos perímetros urbanos de Bogotá e da cidade colonial de Honda, também na Colômbia. Com isso, as propostas selecionadas para exposições e residências por meio de editais para artistas jovens são, não raro, atravessadas por questões de caráter poético, político e ético. Como o projeto Visualización de Honda, realizado pelo coletivo 4-18 a partir de residência de seis semanas no Programa Verão Permanente, na Casa

Deuxsoleils, em Honda, que identificou na cidade três problemáticas sobre as quais trabalhar: uma serra emblemática, mas que se tornou zona de conflito e deixou de ser frequentada pela comunidade; a contaminação do Rio Madalena e a vertiginosa desaparição da pesca na região; e a gentrificação da zona colonial. O cruzamento conflituoso entre natureza e cultura também faz parte das preocupações de Carlos Garaicoa, que realizou um retrato subjetivo de Honda, a partir das pontes que atravessam o Rio Madalena. Um dos projetos para 2016 é a Escola FLORA, programa de formação de artistas, a modo de curso de pós-graduação, em que jovens terão ateliê e acompanhamento com diferentes artistas, curadores e historiadores colombianos e estrangeiros, com ampla trajetória no campo. PA FOTOS: GONZALO ANGARITA. NA PÁGINA AO LADO: MANOELA CARDOSO


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E AV DO PA RQUE L AGE AT I V I D A D E S T O M A M O S J A R D I N S E A M ATA D A F L O R E S TA D A T I J U C A

De caráter livre e experimental, a Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, completa 50 anos de atividades culturais e tensões permanentes. Ocupando um espaço de 523 mil metros quadrados em plena Floresta da Tijuca, na encosta do Morro do Corcovado e aos pés do Cristo Redentor, é vizinha da Lagoa Rodrigo de Freitas. No Brasil Colônia, o local era dominado pela cana-de-açúcar. O engenho de Fagundes Varela foi comprado em 1620 por Rodrigo de Freitas de Mello Castro. Em 1809, foi desapropriado pelo príncipe dom João. Na década de 1840, um nobre inglês, cujo nome escapa aos registros históricos, contratou o também inglês John Tyndale para transformar o antigo engenho numa quinta, com os jardins geométricos ao gosto europeu. Em 1859, Antônio Martins Lage comprou a propriedade. Em 1920, Henrique Lage contratou o arquiteto Mário Vodrel para projetar a mansão para agradar à mulher, a cantora lírica italiana Gabriella Besanzoni. O casarão eclético, que é cenários de festas memoráveis até hoje, tem azulejos, ladrilhos e mármores italianos e pinturas decorativas de Salvador Payols Sabaté nas paredes e tetos. Endividado, Henrique Lage entregou a propriedade que o Instituto Florestal determinou tombar como patrimônio histórico e paisagístico. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) realizou o tombamento, desapropriando a área para a construção de um parque público. Filmes como Terra em Transe (1967), de Glauber Rocha, e Macunaíma (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, usaram o local como cenário. A Escola de Artes Visuais foi criada em 1975, em pleno regime militar, pelo Departamento de Cultura da Secretaria de Estado de SELECT.ART.BR

AGO/SET 2015

Puxador-Paisagem H=c/ M=c, 1998/1999, obra de Laura Lima apresentada na exposição Encruzilhada, em abril de 2015

Educação. Espaço de resistência, teve Rubens Gerchman como seu primeiro diretor. Nelson Leirner, Eduardo Sued, Anna Bella Geiger, Frederico Morais e Daniel Senise estão na vasta lista de célebres professores que a escola já teve. Em 1976, o parque tornou-se domínio da União, que o cedeu, em 1977, ao IBDF, antecessor do atual Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), para ampliação do vizinho Jardim Botânico. Em 1983, a escola realizou a histórica exposição Como Vai Você, Geração 80? Em 1984, o muro que cerca o parque foi liberado aos artistas. Em 1986, áreas internas e externas foram usadas na exposição intitulada Território Ocupado. Em 1989, a escola fez a primeira individual de Arthur Bispo do Rosário (1911-1989). Em 1991, ameaçada de despejo, depois de um período de manifestações e negociações, a escola foi autorizada por decreto a permanecer ali e estender sua área aos jardins. Atualmente, administrada pela organização social Oca Lage, vemos atividades didáticas, criativas e expositivas tomarem os jardins, a antiga lavanderia dos escravos, outros marcos da história do local e a própria mata, reflorestada durante o Segundo Reinado. A escola está mais uma vez preocupada com uma prática artística comprometida com o mundo contemporâneo. Isso inclui a floresta. MS


T HE S CHOOL OF T HE FORE S T, MI A MI C A MP US U M P R O J E T O D E M A R J E T I C A P O T R C A PA R T I R D O A P R E N D I Z A D O C O M A S C O M U N I D A D E S D A F L O R E S TA A M A Z Ô N I C A

Em 2006, a artista eslovena Marjetica Potrc realizou uma residência de dois meses no Acre a convite da 27ª Bienal de São Paulo, sob a coordenação da curadora Lisette Lagnado e do cocurador José Roca. O trabalho resultante da pesquisa reuniu desenhos, vídeos e objetos que refletiam sobre as soluções encontradas entre as comunidades amazônicas para levar educação e tecnologia aos pontos mais remotos da floresta. Com a instalação Xapuri: Rural School – que recriava uma pequena escola rural sobre palafitas dentro do Pavilhão da Bienal – Marjetica plantava a semente do projeto The School of the Forest, em exibição no Perez Art Museum, em Miami, até 9 de outubro. A instalação é composta de construções elevadas, concebidas a partir das moradias do Acre, onde é realizada extensa programação de palestras e workshops que giram ao redor dos aprendizados com a floresta. Entre os colaboradores do projeto estão William Barbosa de Almeida, professor da Unicamp, que teve um papel decisivo na fundação da Universidade da Floresta, no Acre; o arquiteto e urbanista Paulo Tavares, residente em Quito e São Paulo; e Nicholas Mirzoeff, fundador da cadeira de Cultura Visual na New York University. PA

Caracas Growing Houses, 2012, obra da série The School of the Forest, de Marjetica Potrc

FOTOS: GERHARD KASSNER/ CORTESIA DA ARTISTA E DA GALERIA NORDENHAKE, BERLIN/STOCKOLM. NA PÁGINA AO LADO: PEDRO AGILSON / OCA LAGE

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LEDA CATUNDA GUY MADDIN MARIO RAMIRO MUSEU DO AÇUDE A R T E E C U LT U R A C O N T E M P O R Â N E A

EDIÇÃO ESPECIAL 4 ANOS

AGO / SET 2015

(SOBRE)NATUREZA Rituais, ocultismo, fantasmagoria e embates com o natural. O que a arte contemporânea tem a dizer sobre isso?

S O B R E ( N AT U R E Z A ) WWW.SELECT.ART.BR Fotoperformance da série Bori (2008-2011), Ayrson Heráclito

ART RIO

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