André KomAtsu Jürgen mAyer Alex Andre deliJAicov BAsurAmA a r t e e C U Lt U r a C O N t e M P O r â N e a
Faculdade de educação da Hogeschool, na cidade de Utrecht, Holanda. arquiteto ector Hoogstad, foto Pedro Kok
AnA ottoni
ARTE E ARQUITETURA Faces da cidade, a maior obra coletiva já criada pelo homem
3
5
Pablo Ruiz Picasso – Mulher sentada apoiada sobre os cotovelos 1939 Coleção do Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, Madri – © Succession Pablo Picasso / AUTVIS, Brasil, 2015.
Exposição
PICASSO
E A MODERNIDADE ESPANHOLA OBRAS DA COLEÇÃO DO MUSEO NACIONAL CENTRO DE ARTE REINA SOFIA
CCBB São Paulo
Rua Álvares Penteado, 112 – Centro São Paulo – SP 25 de março a 8 de junho de 2015
CCBB Rio de Janeiro
Rua Primeiro de Março, 66 – Centro Rio de Janeiro – RJ 23 de junho a 7 de setembro de 2015 Essa exposição foi organizada e realizada em colaboração com o Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía e a Fundación Mapfre. Exposição realizada inicialmente na Fondazione Palazzo Strozzi, Florença, Itália.
Entrada franca
18 de abril a 26 de julho
ARThuR BISpO DO ROSáRIO E LEOnILSOn: OS pEnéLOpE Curadoria de Ricardo Resende SESC JUNDIAÍ
8 de maio a 2 de agosto
AS mARGEnS DOS mARES Obras de: Ângela Ferreira, Arnaldo Antunes, Catarina Botelho, Chelpa Ferro, Chiara Banfi, Gabriela Albergaria, Guto Lacaz, Kiluanji Kia Henda, Maimuna Adam, Mauro Pinto, O Grivo e Susana Gaudêncio Curadoria de Agnaldo Farias SESC PINHEIROS
25 de abril a 26 de julho
LAvADEIRInhA Instalação de Efrain Almeida Curadoria de Marcelo Campos SESC SANTO AMARO
8 de abril a 31 de maio
GERALDO DE BARROS E A FOTOGRAFIA Parceria entre Sesc São Paulo e Instituto Moreira Salles Curadoria de Heloisa Espada SESC BELENZINHO
sescsp.org.br
E D I TO R I A l
12
Divisor De águas Em 2012, quando não podíamos antever
autor da imagem da capa. Já a fotógrafa Ana
as crises hídrica e energética que assolam
Ottoni mostra em primeira mão um recorte
o Brasil, seLecT produziu a edição Código
de sua pesquisa sobre a ruína da arquitetura
Água, que antecipava a conferência climática
brutalista paulista. O ensaio revela de que
Rio+20 e investigava o alinhamento de artistas
forma esse estilo em que o concreto é a
e agentes de diversos campos da cultura em
matéria-prima por excelência acaba por
relação ao meio ambiente. Naquele momento
expor sua fragilidade e incompatibilidade
vislumbramos: a água lidera o ranking das
em relação à natureza tropical.
vulnerabilidades do mundo. Talvez o maior
Da necessidade de integrar natureza e cidade
signo da edição tenha sido a obra Elemento
vale destacar o depoimento da dupla de
Desaparecendo/ Elemento Desaparecido
arquitetos da SUBDV Architecture, na seção
(2002), de Cildo Meireles, composta de
Fogo Cruzado: “A arquitetura modernista
picolés de pura água, que foi apresentada na
está sendo redefinida, pelos neomodernistas
Documenta 11 de Kassel.
e neofuturistas, para trazer de volta a
Aquela, sem dúvida, foi uma edição
natureza como um elemento atuante e não
visionária. Quando os problemas que a
apenas como pano de fundo”.
capital paulista tinha em relação à água
No fim de 2015, quando o Brasil participar
se restringiam às enchentes, o arquiteto
da 21a Conferência do Clima, em Paris,
Gabriel Kogan apontava, em ensaio
seria bom que levasse na mala as ações
publicado na seção Coluna Móvel, de
públicas que alguns coletivos de artistas
que forma o projeto de São Paulo como
e arquitetos estão articulando à margem
metrópole fluvial fora sistematicamente
dos poderes públicos, a fim de resgatar a
negligenciado pelo poder público.
saúde da vida em comunidade. Para tal,
Nesta seLecT 23, dedicada à função que a
recomendamos a reportagem Urbanismo
arte e a arquitetura têm na construção de
Tático. Enquanto isso, na 56 a Bienal de
cidades mais sociáveis e habitáveis, as águas
Veneza, a partir de maio, os trabalhos
urbanas voltam à tona no projeto Metrópole
de André Komatsu – no Portfólio desta
Fluvial, do arquiteto e urbanista Alexandre
edição – expõem as mazelas e fraturas
Delijaicov, da FAU-USP. A reconfiguração
de nossos problemas urbanos, sociais e
de São Paulo a partir da valorização de seu
políticos. As críticas ácidas ou as propostas
sistema hídrico – tragicamente canalizado no
construtivas apresentadas nesta seLecT
subsolo e confinado entre avenidas, dentro
podem não representar ainda um divisor de
de um sistema de esgotos – está descrita na
águas, mas já têm contribuição certa para
reportagem Cidades Imaginárias, de Gustavo
a ecologia social de nossas cidades.
Paula Alzugaray
Ricardo van Steen
Giselle Beiguelman
Márion Strecker
Luciana Pareja Norbiato
Hassan Ayoub
Luciana Fernandes
Roseli Romagnoli
Fioratti. Esse projeto é uma “utopia concreta”, que deveria ser finalmente contemplada com seriedade pelos nossos governantes.
Guilherme Kujawski
Gabriel Kogan volta a colaborar conosco com um texto sobre fotografia de arquitetura, dissertando sobre gerações de fotógrafos
Paula Alzugaray
que vão de Chico Albuquerque a Pedro Kok,
Diretora de Redação
SELECT.ART.BR
ABR/mAi 2015
iLuSTRAçõES: RiCARdo vAn STEEn, A pARTiR do ApLiCATivo fACE youR mAngá
Luis Gonzalez Palma • Möbius 15 • obra única 1/1 da série Möbius
em breve: Luis Gonzalez Palma • 7 Abril - 30 Maio SP Arte 2015 • Stand J18 Segundo Pavimento • 9 Abril - 12 Abril Vila Modernista - Alameda Lorena 1257 - casa 2 Jardim Paulista - São Paulo - SP + 55 11 3825 0507 instagram.com/galeria_de_babel facebook.com/galeriadebabel galeriadebabel.com
Alfredo de Stéfano Andrea Micheli Andreas Heiniger Ara Guler Araquém Alcântara Cliff Watts Dimitri Lee Elliott Erwitt Kamil Firat Kevin Erskine Luciano Candisani Luis Gonzalez Palma Julio Landmann Mio Nakamura Pablo Boneu Paolo Ventura Simon Roberts Steve McCurry Thomas Hoepker William Miller Zak Powers Zoe Zapot
colaboradores
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eder chiodetto
Mestre em Comunicação pela ECA-USP, jornalista, curador independente e curador do Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM-SP - vernissage i P 102
gabrieL kogan
Jornalista e arquiteto formado pela FAU-USP, com mestrado no Unesco-IHE da Holanda - fotografia de arquitetura P 92
katia macieL
ana ottoni
bernardo mosqueira
Lisette Lagnado
Artista, cineasta e poeta, é professora da Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Tem pós-doutorado em Artes pela Universidade de Walles, na Inglaterra - reviews P 114
Formada em Arquitetura e Urbanismo, atuou como arquiteta até 1990, quando passou a fotografar profissionalmente. Hoje desenvolve mestrado na FAU-USP - ensaio visual P 76
Curador independente, é diretor do Prêmio FOCO Bradesco ArtRio e professor na Escola de Artes Visuais do Parque Lage. Realiza o festival anual independente de performance Vênus Terra - vernissage II P 106
Crítica de arte e doutora em Filosofia pela USP, foi curadora da 27a Bienal de São Paulo. É diretora da Escola de Artes Visuais do Parque Lage (RJ) - coluna móvel P 48
roberto wagner
pauLo d’aLessandro
Luisa duarte
tomás toLedo
Crítica e curadora, é mestre em Filosofia pela PUC-SP. Foi membro do conselho consultivo do MAM-SP e é crítica de arte do jornal O Globo - reviews P 110
Curador e pesquisador de arte, formado em Filosofia pela PUC-SP. É assistente de curadoria do Museu de Arte de São Paulo (Masp) - curadoria P 84
Artista visual e fotógrafo, colabora com publicações como Casa Vogue, Trip e Wallpaper - selects destaque P 22
SELECT.ART.BR
ABR/mAi 2015
É fotógrafo. Sua pesquisa tem foco em retratos e experimentações formais. É representado pela Galeria Lume - entrevista jurgen mayer P 40
expediente
EDITOR E DIRETOR RESPONSÁVEL: DOmINgO ALzugARAy EDITORA: CÁTIA ALzugARAy PRESIDENTE-ExECuTIVO: CARLOS ALzugARAy
16
DIRETORA DE REDAçãO: PAuLA ALzugARAy DIREçãO DE ARTE: RICARDO VAN STEEN EDITOR míDIAS DIgITAIS: guILHERmE KuJAwSKI EDITORA DE ARTE: LuCIANA fERNANDES REPORTAgEm: LuCIANA PAREJA NORbIATO E guSTAVO fIORATTI CONSELHO EDITORIAL: gISELLE bEIguELmAN E mÁRION STRECKER COLABORADORES
Ana Ottoni, bernardo mosqueira, Eder Chiodetto, gabriel Kogan, Katia maciel, Lisette Lagnado, Luisa Duarte, marcelo Rainho, Paulo D’Alessandro, Roberto wagner, Tomás Toledo
pROjEtO gRáfiCO
Ricardo van Steen e Cassio Leitão
SECREtáRiA DE REDACãO COpy-DESk E REviSãO
pRé-impRESSãO COntAtO SERviçOS gRáfiCOS mERCADO LEitOR ASSinAtuRAS
Roseli Romagnoli Hassan Ayoub
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SELECT (ISSN 2236-3939) é uma publicação da EDITORA bRASIL 21 LTDA., Rua william Speers, 1.000, conj. 120, São Paulo - SP, CEP: 05067-900, Tel.: (11) 3618-4200 / fax: (11) 3618-4100. COmERCIALIzAçãO: Três Comércio de Publicações Ltda.: Rua william Speers, 1.212, São Paulo - SP; DISTRIbuIçãO ExCLuSIVA Em bANCAS PARA TODO O bRASIL: fC Comercial e Distribuidora S.A., www.SELECt.ARt.BR
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pAt R O C í n i O :
SELECT.ART.BR
ABR/mAi 2015
Índex
18
68 PortFólio
Ordem casual André Komatsu participa da 56 a Bienal de Veneza, onde discute manipulação da história e servidão voluntária
44
50
56
76
92
deSign
Fogo Cruzado
Projeto
BrutaliStaS
FotograFia
CidadEs Expandidas
EtErnos modErnos
CidadEs sonhadas
ruínas do futuro
Casa, jardins E janElas
A tecnologia como
Arquitetos debatem
Artistas e arquitetos
Ensaio foca as ambivalências
A arquitetura pelas
mediadora de cidadania
o legado do pensamento
planejam o impossível
da matéria concreta em
lentes de espacializadores
e participação
modernista
que queremos
decomposição
de imagem
SELECT.ART.BR
fEv/mAR 2015
foTo: CoRTESiA AndRé komATSu
Anselm Kiefer, Ignis Sacer, 2014, © Anselm Kiefer, Photo : Charles Duprat
White Cube São Paulo Rua Agostinho Rodrigues Filho 550 + 55 (11) 4329 4474 whitecube.com/saopaulo
Anselm Kiefer Paintings Exposição De 7 abril a 20 junho 2015
Bermondsey London
De terça à sexta, das 11h às 19h Sábados, das 11h às 17h
Hong Kong
Mason’s Yard London
São Paulo
Índex
20
seções
12 22 54 110 130
40
Editorial
Jürgen mayer
Selects / Agenda
arquiTeTura do aGora
Mundo Codificado
Arquiteto/Designer
Reviews
defende casamento do natural com o tecnológico
Em Construção
98
62
entrevista
Comportamento
Pablo león de la barra
urbanismo TáTico
Curador da Casa França-
Ativistas propõem
-Brasil defende a pesquisa
formas de gestão
e a criação de pensamento
e uso das cidades
84
102
106
Curadoria
vernissage i
vernissage ii
TaiPa e TaPume
luis González Palma
afonso TosTes
Artistas repensam
A fotografia da dor
Odisseia e tradições de matriz
as várias camadas
e da memória do artista
africana são aproximadas em
da cidade de São Paulo
guatemalteco em São Paulo
individual no Rio
fotoS: paulo d’aleSSandro (alto), CorteSIa BaSuraMa e CorteSIa Beto Shwafaty/folhapreSS
agenda
Rio de JaneiRo
O DONO DA COR 22
William Eggleston, A Cor Americana, até 28/6, Instituto Moreira Salles, Rua Marquês de São Vicente, 476, Rio de Janeiro | www.ims.com.br Foto Roberto Wagner
nos anos 1970, quando William eggleston começou a usar cor em suas fotos de cenas frugais dos eUa, os museus torciam o nariz para essa modalidade. Foto artística só em p&b. Foi preciso que o então diretor de fotografia do MoManY, John Szarkowsky, fizesse uma expo em 1976 para que eggleston virasse um mito e influenciasse gerações de fotógrafos e cineastas, como Wim Wenders. O também fotógrafo Roberto Wagner esteve com ele no Rio de Janeiro e entrevistou-o para a seLecT. Você é um pioneiro no uso da cor na fotografia. Mas também fazia fotografias p&b no início de sua carreira. De que forma se deu essa transição? descobri um novo filme (Kodachrome) e já entendia de composição, de como as cores funcionam juntas. Também fui estudando o que era o todo da fotografia, os elementos básicos dessa arte e de como criá-la. antes de tudo, comecei pela composição, pelo conteúdo e pela maneira como as cores interagem numa imagem plana. Ou seja, o que se aprende estudando pintura. e ainda estou estudando não só pintura, mas afresco também. Isso demanda muita reflexão… o que pode ser um problema (risos). Depois de trabalhar com a impressão por dye transfer (técnica direta, por contato, que resulta em cores muito vivas) por tanto tempo, como você vê o advento da fotografia digital? Tem funcionado muito bem para mim. amo dye transfer e ainda uso. Mas venho tendo resultados maravilhosos com o processo do novo pigmento (mineral sobre papel de algodão). nunca vou deixar de gostar do dye transfer, é tão bonito. Mas te digo que o novo pigmento é ainda melhor. Você é citado como influência por diversos diretores, de Gus Van Sant a John Huston. Você também foi influenciado pelo cinema? Sim, trabalho muito com um diretor-irmão, david Lynch. e adoro Hitchcock e sua linda cor. SELECT.ART.BR ABR/MAI SELECT.ART.BR ABR/MAI2015 2015
foto:
ANDREY ZIGNNATTO DESLOCAMENTOS 28 MAR . 30 ABR MARCONE MOREIRA INSTITUTO TOMIE OHTAKE 01 ABR SP-ARTE SÃO PAULO 08 . 12 ABR ART15 LONDRES 20 . 23 MAI #2 C.LAB MERCOSUL WWW.BLAUPROJECTS.COM/CLAB INSCRIÇÕES ATÉ 17 ABR
RUA FRADIQUE COUTINHO . 1464 VILA MADALENA . CEP 05416-001 SÃO PAULO . SP . BRASIL T. +55 11 3467.8819 . 3467.8801 TERÇA A SÁBADO DAS 11H ÀS 19H WWW.BLAUPROJECTS.COM
agenda
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SOMERSET & LONDRES
Pavilhões da serPentine Radic´ Pavilion, até 21/6, Hauser & Wirth Somerset | www.hauserwirthsomerset.com 15º Serpentine Pavilion, junho a outubro, Serpentine Galleries, Londres www.serpentinegalleries.org Há 15 anos, a Serpentine Galleries inaugurava o projeto de seus Pavilions, espaços de arquitetura arrojada criados por grandes nomes da área, como Frank Gehry, Rem Koolhaas, Oscar Niemeyer e Zaha Hadid, que desenhou o projeto inaugural. Nesta edição, foram escolhidos os espanhóis do SelgasCano. Enquanto isso, na Hauser & Wirth Somerset, mistura de galeria, residência artística e hotelfazenda, o serpentine Pavilion de 2014 (foto), desenhado pelo chileno Smiljan Radic´, ganha reedição e programação de debates.
N OVA YO R K
Cidades visíveis Ideas City, 28/5 a 30/5, New Museum, 235 Bowery, Nova York | www.ideas-city.org O evento que debate o futuro das cidades, promovido por um dos mais inventivos museus nova-iorquinos, ganha sua quinta edição estreando novo diretor, Joseph Grima. O arquiteto e jornalista baseado em Gênova, Itália, tem em seu currículo passagens pela Bienal de Arquitetura de Veneza e a Triennale de Milão, além de ser o diretor da 1a edição da Bienal de Arquitetura de Chicago, que inaugura em outubro. Nesta edição do evento, o tema é The Invisible City, baseado no livro de Italo Calvino. As Cidades Invisíveis de Calvino também tematizam matéria de select sobre Cidades Imaginárias (pág. 56). Ou seja, o tema é bem atual.
SELECT.ART.BR
ABR/MAI 2015
foToS: dE CIMA pARA BAIxo, John offEnBACh E @ ETA fLoREnCE REnEwABLE EnERgIES/fLICkR
EDUARDO KAC early media works
25.04 > 23.05
rua teixeira de melo 31C ipanema [55 21] 2513 2074
agenda
N OVA YO R K
26
AméRICA LATINA Em CoNsTRução Latin America in Construction: Architecture 1955-1980, até 19/7, MoMA, 11 West 53 Street www.moma.org A mostra marca os 60 anos de Latin American Architecture Since 1945, exposição paradigmática do MoMANY com foco na arquitetura de seus irmãos do Sul. Na nova versão, põe em debate as mudanças e inovações acontecidas tanto no México e em Cuba quanto no Cone Sul entre 1955 e 1980, incluindo o Brasil. Maquetes, fotografias vintage (acima, foto de 1962-66 de prédio da oNu no Chile por Emilio Duhart) e plantas nunca exibidas lado a lado ganham a companhia de novas imagens de Brasília por Leonardo Finotti, comissionadas para a exibição.
S ã O PA U lO
EsPAço PERfoRmáTICo ANTImoNumENTAL glory hole, Galeria Jaqueline Martins, Rua Virgílio de Carvalho Pinto, 74 Em 1974, Chris Burden entrou na sala da caldeira no porão de uma galeria e recebeu visitantes para conversas individuais, na performance The Visitation. Apesar da tensão iminente graças ao espaço e ao performer – conhecido pela ação Shoot, em que toma um tiro no braço em plena galeria –, as conversas transcorreram bem. Guardadas as diferenças de contexto, frisson semelhante forma-se com glory hole, novo espaço de projetos curatoriais da Galeria Jaqueline Martins, atualmente com o projeto Raree show 2, de Cristiano Lenhardt (foto), com curadoria de Bruno Mendonça. O local tem dimensões que fogem ao padrão convencional de espaços expositivos: fica sob a escada de acesso ao segundo andar e tem 2,15 x 1,38 x 0,90 centímetros. Grafado em caixa baixa, glory hole é performático, low profile e antimonumental, na contramão da tendência de expansão que assola as galerias paulistanas. Um espaço sensacional sem sensacionalismo.
CURITIBA
EXPERIÊNCIA DIGITAL Arte Cibernética, de 1/4 a 7/6, Museu Oscar Niemeyer, Rua Mal. Hermes, 999 | www.museuoscarniemeyer.org.br Organizada pelo Itaú Cultural no MON de Curitiba, Arte Cibernética reúne obras que investigam possibilidades de interação por meio da utilização de tecnologia. Em OP_ERA, por exemplo, Daniela Kutschat e Rejane Cantoni criam um sistema de cordas que vibram de acordo com frequências de som e de luz. Já Raquel Kogan propõe, em Reflexão #3 (foto), que o visitante regule a velocidade do movimento de números projetados sobre a parede de uma sala escura, refletidos também sobre um espelho d’água. SELECT.ART.BR
ABR/MAI 2015
foToS: dE CIMA pARA BAIxo, CoRTESIA puC ARChIvo dE oRIgInALES E dIvuLgAção
exposição até 25 abril | 2015 segunda à sexta de 12h às 20h - sábados das 16h às 20h rua João Borges 86 | gávea | rio de janeiro tel | fax: 55 21 2294 4305 | www.mercedesviegas.com.br
agenda
S Ã O PA U LO 28
SUBINDO PELAS PAREDES Leda Catunda, 11/4 a 23/5, Galpão Fortes Vilaça, Rua James Holland, 71 | www.fortesvilaca.com.br Com o galpão da Barra Funda pela primeira vez à disposição, Leda Catunda não economizou na paramentação do local. Além de exibir sua produção mais recente em pinturas, gravuras e colagens, levou para o espaço toda uma produção de desenhos que dão estrutura às formas orgânicas características de seu universo. Reconfiguradas como estampa e impressas em papel, gotas, plantas, insetos e até pretzels! – sobem pelas paredes do local, dialogando com trabalhos com imagens ultrapop do rock e do surfe, como Botão II (2014)(foto).
S Ã O PA U LO
PASSAGEM ABERTA Praça das Artes, Av. São João, 281 www.facebook.com/pracadasartes Vizinha ao Theatro Municipal de São Paulo, a Praça das Artes (acima), projeto de Francisco Fannucci e Marcelo Ferraz (da Brasil Arquitetura) em parceria com Marcos Cartum, foi parcialmente inaugurada em 2012, colocando em funcionamento o módulo que abriga as escolas de música e de dança. A prefeitura agora promete retomar as obras para finalizar o módulo onde residirão os corpos artísticos profissionais do Municipal. O térreo, por fim, ligará a Rua Conselheiro Crispiniano, a Avenida São João e
S Ã O PA U LO
o Vale do Anhangabaú. Aberta para pedestres,
EXPEDIÇÃO URBANA
contará com restaurantes, bares e árvores.
Ver do Meio, 27/5 a 12/7, Instituto Tomie Ohtake, Rua Coropés, 88 | www.institutotomieohtake.org.br Risco de assalto, vigilância excessiva, trânsito. Há sempre uma dose de hostilidade à espera de quem sai com uma máquina fotográfica em São Paulo. Como relatos de expedicionários, as imagens da exposição Ver do Meio – Como o Mato Que Cresce Entre as Pedras revelam olhares de três fotógrafos que foram à rua prontos para lidar com o confronto. Com curadoria de Nelson Brissac, a mostra reúne mais de cem trabalhos feitos por Arnaldo Pappalardo (abaixo, foto feita na favela do Amassa Sapo), Mauro Restiffe e Pio Figueiroa no período de um ano, em regiões centrais e na periferia da capital paulista. SELECT.ART.BR
ABR/MAI 2015
foToS: dE CIMA pARA BAIxo, CoRTESIA gALERIA foRTES vILAçA, ARnALdo pAppALARdo E @MLSIRAC/fLICkR
agenda MILÃO
DiSeGNo BRaSileiRo 30
Rio + Design 2015 Milão, 13 a 19/4, Via Tortona, 31 MADE - Mercado de Arte e Design em Milão, 14 a 19/4, Palazzo Litta Corso Magenta, 24 | www.mercadodeartedesign.com Na esteira do Salone del Mobile 2015, evento máximo do design internacional sediado em Milão, duas iniciativas aproveitam a visibilidade sobre o tema nesta metade de abril para mostrar ao mundo o que é que o Brasil tem. Realizado desde 2009 junto ao evento milanês, o Rio + Design tem como tema de 2015 a produção em madeira e a que usa tecnologia. Apostando no sucesso das suas duas edições nacionais (2013 e 2014), a maDe (à direita, estante Cross, da Alva Design) estreia sua versão italiana mesclando as novidades do setor à abordagem historicista da instalação inédita dos irmãos Campana.
S Ã O PA U LO
com eFeiTo Op-Art – Ilusões do Olhar, 16/4 a 1/6, Museu da Casa Brasileira, Av. Brigadeiro Faria Lima, 2.705 | www.mcb.org.br Além de sua conhecida influência sobre o design e a moda, a op-art também repercutiu na arquitetura, como mostra a exposição Op-Art – Ilusões do Olhar. A exposição multimídia compõe um panorama sobre o movimento, com projeções de pinturas de Raymundo Colares criadas para prédio no Rio e obras de luiz Sacilotto (na foto, Concreção 5735, 1957), entre outros. Em maio, o MCB também exibirá uma mostra fotográfica sobre o uso de bicicletas em Amsterdã.
C I N C I N AT T I
Dupla ocupação em ohio AVAF, sem previsão de término, Contemporary Arts Center (CAC), 44 E. 6th Street www.contemporaryartscenter.org Self Portrait as a Light - Albano Afonso, até 30/8, CAC e 21C Museum Os padrões supercoloridos do assume Vivid astro Focus, formado pelo brasileiro Eli Sudbrack e pelo francês Christophe HamaidePierson, ganharam nova casa, sem prazo para sair. Uma intervenção da dupla está na fachada do contemporary arts center (CAC, foto à direita), de Cincinatti, Ohio, primeiro edifício projetado por Zaha Hadid nos EUA. albano afonso (na foto à esquerda, São Paulo, Dias de Verão 2004/05, 2008) também tem uma obra pública no local, em adesivo de chão e parede, conectando os edifícios do CAC e do 21C Museum, onde o realiza um grande panorama dos últimos 15 anos de sua obra, com cerca de 40 trabalhos. SELECT.ART.BR
ABR/MAI 2015
foTo: dE CIMA pARA BAIxo, CoRTESIA MAdE, CoRTESIA MCB, dIvuLgAção
agenda
RIO DE JANEIRO
RECONSTRUÇÃO ESPACIAL 32
Pretérito Imperfeito – Amalia Giacomini, 6 a 30/5, Mercedes Viegas Arte Contemporânea, Rua João Borges, 86 | www.mercedesviegas.com.br Com formação em Arquitetura pela FAU-USP, Amalia Giacomini vem desenvolvendo um trabalho conceitual que altera a percepção espacial do espectador por meio de intervenções diretas nos ambientes. Na individual, apresenta duas novas séries, Finitos e Superficiais (na foto, Memória Superficial #3), que parecem indefinir os contornos internos da galeria pela sobreposição de materiais translúcidos.
N OVA YO R K
VISTA PARA O HUDSON Whitney Museum, 99, Gansevoort Street, a partir do dia 1º/5 | whitney.org No dia 1º de maio, o Whitney
RIO DE JANEIRO
EMOÇÃO SÚBITA Eija-Liisa Ahtila, 13/4 a 7/6, Oi Futuro Flamengo, Rua Dois de Dezembro, 63 www.oifuturo.org.br/cultura/oi-futuro-flamengo Na curadoria de Catherine de Zegher,
Museum abrirá sua nova sede
diretora do Museum of Fine Arts
(foto) em Nova York, localizada
Ghent (Bélgica), a artista finlandesa
entre o Parque High Line e o Rio Hudson. Desenhado pelo arquiteto
Eija-Liisa Ahtila (abaixo, Horizontal) ganha sua primeira individual no Brasil.
Renzo Piano, o novo prédio
Ela ocupa três pisos e os vitrais da
conjuga galerias internas e um
instituição carioca com instalação,
espaço expositivo que está sendo
vídeos e fotografias. Sua temática
divulgado como o maior vão livre
apropria-se de imagens oníricas e
interno sem colunas da cidade. Para a inauguração, foi planejada a maior exibição que o museu já realizou a partir de seu acervo, onde há obras de Archibald Motley, Frank Stella, Laura Poitras e David Wojnarowicz.
de elementos da natureza para falar da constituição de identidade dos indivíduos e a condição feminina diante da violência. Desconstruindo a narrativa, Ahtila atinge a emoção do espectador de forma inesperada.
SELECT.ART.BR
ABR/MAI 2015
foToS: dIvuLgAção, Ed LEdERMAn E dIvuLgAção
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TODA VEZ QUE OLHAMOS PARA ESTATÍSTICAS, QUEREMOS VER UMA CRIANÇA VIVENDO MELHOR.
EspEcial Águas
95,1
clima Uma surpresa no 84,6
Educação, saúde e proteção. Não é tão complicado melhorar a vida de uma criança. Mas é preciso querer. É preciso lutar por isso. Provocar a reação da sociedade, conscientizar e mobilizar. É isso que a Fundação Abrinq tem feito nos últimos 25 anos. Porque só com respeito e oportunidades vamos mudar a história das próximas gerações.
A estiAgem imprevistA que Atingiu o SudeSte e o NordeSte eSvaziou oS reServatórioS do paíS e deve agravar-Se NeSte iNverNo. Chuva farta, 76,6 de Novo, só em 2016
Q
uem observou as chuvas que caíram sem dar trégua entre fevereiro e março talvez tenha esquecido, por um momento, da estiagem histórica que atinge o Sudeste e o Nordeste do país nos últimos anos. O tempo durante o primeiro trimestre do ano foi amigável o suficiente para que o nível de água nos reservatórios em várias regiões voltasse a subir, depois de meses de queda contínua. Em São Paulo, o sistema Cantareira, que abastece a capital, voltou para a casa dos 15% de capacidade, depois de ter atingido 5%. Se confortam a população, as boas notícias não reduzem as preocupações dos especialistas. “As 2000 *Fonte:chuvas IBGE/PNAD 2013 a situação a não piorar. É levaram bom lembrar, no entanto, que, historicamente, março é o último mês com grande
Percentual de crianças de 0 a 3 anos fora
volume de precipitação”, diz o pesquisaradas pelo Operador Nacional do Sistema das creches. A taxa de cobertura em creche dor Hilton Silveira, do Centro de PesquiElétrico (ONS), responsável pela coordeBrasil (%) é a razão entre odanúmero de crianças sas Meteorológicas no e Climáticas Aplicanação e controle geração e transmissão em idade escolar (de 0 a 3noanos) e oSudeste, número das à Agricultura (Cepagri), da Unicamp. de energia Brasil. No os reserA estiagem que atinge o país se arrasta vatórios contavam com 54%Odagráfico capacidade matrículas nessa etapa de ensino. pelo menos desde 2013. Rios e reservatóde máxima em março de 2013. Neste ano, refere-se à diferença da taxa de cobertura em rios de todas as regiões baixaram drastio número se aproxima dos 23%. No Norcreche em relação à população de 0 a 3 anos.* camente desde então. “O que vemos nos deste, na mesma comparação, a queda reservatórios é o efeito cumulativo da esfoi de 43% para 20%. É uma situação que tiagem. De dezembro de 2013 a março de preocupa a indústria de forma especial. 2014, praticamente não choveu, e os níUsinas hidrelétricas representam 81% veis de água, que costumam subir nesse da matriz energética brasileira. E o nível período, caíram”, diz o meteorologista das represas está abaixo do registrado em Alexandre Nascimento, da Climatempo. 2001, quando ocorreu uma das últimas Por isso, o que choveu até agora está longrandes estiagens do país. ge de corrigir o prejuízo. 2006 2013 situação de emergência O efeito cumulativo a que o meteoroMais de mil cidades brasileiras estão em logista se refere fica evidente em uma rásituação de emergência, decretada em pida análise do nível das represas monito-
agenda
S Ã O PA U LO
EXTINÇÃO INDÍGENA A Queda do Céu, 10/4 a 5/7, Paço das Artes, Avenida Universidade, 1, Cidade Universitária www.pacodasartes.org.br Usando um termo da cosmogonia ianomâmi como título, a curadoria de Moacir dos Anjos usa a produção de expoentes da arte brasileira e internacional, nas mais diversas técnicas, para fazer uma denúncia sobre a alarmante situação dos indígenas no Brasil e na América do Sul. Os trabalhos articulam questões sobre violência, despossessão e extinção de rituais dos ditos povos primitivos e têm autoria de nomes como Cildo Meireles, Claudia Andujar e Harum Farocki (acima, frame de A Prata e a Cruz, 2010).
S Ã O PA U LO
CINDY E EU Eu com Cindy Sherman, 7/4 a 16/5, Mira Galeria de Arte, Rua Joaquim Antunes, 187
S Ã O PA U LO
GErAÇÃO Em rEsGATE SP-ARTE, Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque do Ibirapuera, portão 3, 9/4 a 12/4 | www.sp-arte.com Vale ficar atento, nesta edição da SP-Arte, à exibição das obras de Nicolas Vlavianos (abaixo, obra sem título de 2010) e Teresa Nazar (1936-2001), casal de estrangeiros que se formou no Brasil em 1961, ele vindo da Grécia, e ela da Argentina. Trazida à feira pela filha deles, Myrine Vlavianos, que tem um escritório de arte em Florianópolis, a coleção exemplifica a produção de escultores de uma geração que traçou caminhos entre a arte concreta e o pop, ao lado de
Cindy Sherman, que usou e abusou de citações em
Rubens Gerchman e Antonio Dias
séries fotográficas como Untitled Film Stills, agora
e Hélio Oiticica.
é citada e apropriada pela artista brasileira renata siqueira Bueno (acima). Eu com Cindy Sherman, intervenção sobre livro da artista norte-americana, está em exposição na nova Mira Galeria de Arte, em São Paulo. O livro é parte de uma série de trabalhos que consistem na colagem de fotos em publicações de terceiros, reinventando sua narrativa. Como define Bueno, valendo-se da citação do fotógrafo Joan Fontcuberta, “A imagem”, dizia Godard, “não pertence a quem a faz, mas a quem a utiliza.” fotos: de cima para baixo, divulgação, iwan baan e cortesia myrine vlavianos
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S Ã O PA U LO S Ã O PA U LO
´ PArTE 2 AbrAmovicć
MOSTRAS CONJUGADAS Olhar o Olho Olhando e North of the Border, 8/4 a
Places of Power, 6/4 a 16/5, Rua Gomes de Carvalho, 842
2/5, Espaço e-arte / Arte Hall, Rua Joaquim Antunes, 187,
www.lucianabritogaleria.com.br
www.artehall.com.br
Junto à mostra de marina Abramovic no Sesc-Pompeia, a
Em parceria com outros espaços de fora da
Luciana Brito Galeria exibe 30 obras (aqui, Retrato da Artista
cidade, a galeria paulistana Arte Hall inaugura,
com uma Vela) da artista em Places of Power. No conjunto,
em abril, duas mostras conjugadas. Da carioca
há objetos, fotos, desenhos e registros de performances.
Portas Vilaseca expõe obras de Ismael Monticelli
A curadoria revela a ligação que a artista cultivou com o Brasil,
sob o título Olhar o Olho Olhando, em que o
desde a primeira visita, em 1989, estudando cristais e pedras
artista gaúcho usa registros fotográficos para
preciosas, bem como a ação dos minerais no corpo e na mente.
um exercício crítico sobre o suporte. Da Galeria PSH Projects, que tem sedes em Bogotá e Miami, apresenta North of the Border, coletiva de artistas latino-americanos como Tomas Ochoa (abaixo, Libres de Toda Mala) e Luis Martin Bogdanovich.
S Ã O PA U LO
PRECURSORA EXPERIMENTAL Uma Mulher Moderna – Fotografias de Gertrudes Altschul, até 20/6, Casa da Imagem, Rua Roberto Simonsen, 136-B Quando se fala em fotografia experimental modernista, os nomes recorrentes injustamente não incluem a alemã Gertrudes Altschul (1904-1962). Fugindo da perseguição aos judeus durante a Segunda Guerra Mundial, ela fez de São Paulo sua cidade e tema. Com a afiliação ao Foto Cine Clube Bandeirante, passou às pesquisas de planos fechados e recortes de luz. A curadoria de Isabel Campos apresenta seus trabalhos pioneiros e premiados no Brasil e exterior, e documentos que remontam à sua trajetória. SELECT.ART.BR
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foToS: CoRTESIA LuCIAnA BRITo gALERIA, CoRTESIA ARTE hALL E dIvuLgAção
Photography by Warren & Nick
PERRIER-JOUËT, THE ALLURING CHAMPAGNE Desde sua fundação em 1811, a casa de champagne Perrier-Joüet produz artesanalmente vinhos elegantes e florais com a rara delicadeza das uvas Chardonnay. A elegância do champagne combinada à garrafa de Perrier-Jouët Belle Epoque decorada pelas anêmonas de estilo Art Noveau, oferece momentos de puro encantamento e beleza. www.perrier-jouet.com
APRECIE COM MODERAÇÃO.
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S Ã O PA U LO
VISTAS DO ALTO
Tuca Reinés: O Olhar Vertical, até 5/7, Sala Arte Santander, Av. Juscelino Kubitschek, 2.235
Começou como um trabalho publicitário e aos poucos ganhou outro tratamento, diz o fotógrafo Tuca Reinés, sobre as imagens aéreas de cidades brasileiras apresentadas na exposição O Olhar Vertical. Encomendadas pelas agências Santander Select, elas foram incorporadas à coleção do banco. São Paulo, Rio de Janeiro, Ribeirão Preto e Brasília estão entre as 49 cidades fotografadas por Reinés em 101 horas de voo de helicóptero. Como nas fotos desta página (acima, João Pessoa; abaixo, Manaus), a curadoria de Agnaldo Farias procura similaridades geográficas entre as cidades, com os trabalhos apresentados sempre em duplas.
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foto:
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E n t r E v i sta
Fala, Jürgen Mayer! De passagem pelo Brasil, profissional considerado expoente da nova geração diz que o futuro da arquitetura está na combinação entre o natural e o tecnológico e revela que vai construir uma estrutura temporária, em agosto, em São Paulo giselle Beiguelman
Jürgen Mayer, 50 anos, é o arquiteto à frente do estúdio multidisciplinar que leva seu nome em Berlim e onde combina, desde 1996, arquitetura, design, comunicação, mídias digitais e muita tecnologia. Possui obras no acervo do MoMA, em Nova York, e, entre outros prêmios, foi ganhador do Audi Urban Future Award (2010). Destacam-se no seu trabalho a pesquisa em torno de novos materiais e a constante investigação sobre como a digitalização do cotidiano expande e transforma nossas noções de espaço. Autor de projetos que interferem radicalmente na paisagem, combinando história e inovação, como o posto da fronteira da Geórgia com a Turquia (2011), tornou-se mundialmente conhecido pelo projeto do Metropol Parasol (foto), em Sevilha, inaugurado no mesmo ano. A estrutura suspensa, encravada no centro histórico da capital andaluza, foi eleita um dos oito principais marcos arquitetônicos da Espanha e tornou-se, mais que um cartão-
atender. Você caminha pelos diferentes níveis e pode contemplar
postal, um polo agregador da vida social e política da cidade,
a cidade de cima, usar as funcionalidades dos serviços hoje
para onde convergem todas os protestos e encontros. Mayer
implantados e descer até o museu arqueológico que fica no
esteve no Brasil a convite da feira Revestir, onde foi um dos
subterrâneo. É importante notar também que estão presentes em
palestrantes e conversou com selecT sobre revitalização e
toda a sua estrutura arquitetônica elementos históricos que vêm
políticas de patrimônio histórico, sua percepção da arquitetura
da catedral, das árvores e, especialmente, da própria história de
brasileira e o futuro da arquitetura.
Sevilha, que foi um dos principais centros de inovação da Europa. Essa capacidade de inovar de Sevilha foi uma das diretrizes de
Como vê seu projeto do Metropol Parasol, na Plaza de la
olhar seu patrimônio histórico.
encarnación, em Sevilha, do ponto de vista das políticas de preservação de patrimônio histórico?
Você conhece as políticas de revitalização e de urbanização
Jürgen Mayer: O projeto ocupa uma importante área do centro
em curso no Brasil?
histórico de Sevilha, desde o tempo dos romanos e também
Nada muito específico, mas poderia dizer que estamos todos
durante todo o período medieval. Abrigou o Mercado Público
acompanhando o que acontece aqui, com todos esses grandes
e um convento, que foram demolidos nos anos 1980. A região
eventos, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas. Isso acaba por
ficou abandonada e perigosa e o nosso projeto foi, mais do que
interferir na maneira como as cidades são organizadas, envolve
tentar reintroduzir o mercado, construir um espaço público para
interesses financeiros que chegam, mas também faz certas
todos. Nesse caso, isso implicava levar em consideração todo o
coisas acontecerem, melhorando sua infraestrutura, atraindo
sentido histórico daquele lugar e a cultura cotidiana que viria a
investimentos que de outra forma demorariam anos. Mas isso
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foTo: PAULo D’ ALESSANDRo.
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é uma percepção remota e geral. Meu ponto de vista
especialmente, como arquiteto alemão interessa muito saber
pessoal é que vim para cá pela primeira vez em 1993. Fiquei
como se lida com as questões entre dentro e fora, que, para
com amigos na Vila Madalena, então um bairro calmo, com
nós, é sempre muito difícil, por causa do clima, e para vocês,
alguns bares, artistas e atividades culturais. Agora voltei, e
até me dá inveja… Fazem um jardim qualquer e ele se torna
é outra coisa. Extremamente viva, com certa gentrificação
rapidamente uma selva toda verde (risos).
da área, é verdade, mas você vê como essa parte da cidade mudou, e com vários prédios residenciais e comerciais
Você tem planos de fazer algo no Brasil?
muito bonitos. Acho que em poucos lugares no Brasil vi as
Estamos muito no começo… Mas volto em agosto para a Design
coisas acontecendo com a qualidade que estão ocorrendo
Weekend. Devo fazer uma estrutura temporária em agosto.
lá. Na Vila Madalena há uma nova identidade sendo criada e um alto nível de arquitetura.
Sua palestra na feira Revestir é sobre a Arquitetura do Futuro. Em uma frase, o que é a arquitetura do futuro?
Conhece a arquitetura brasileira contemporânea?
Ficaria feliz em dar conta de falar do que está acontecendo
Logicamente, conheço o trabalho de Isay Weinfeld, mas
agora (risos) e nesse sentido destacaria os processos de
também sigo os de jovens arquitetos como os do Triptyque,
digitalização e os modos como vão e estão alterando nossas
e de jovens designers, como Guto Requena. Há vozes
formas de construir e pensar e as preocupações com a
brasileiras que fazem parte de uma rede internacional e
sustentabilidade. Principalmente, destaco a combinação
é ótimo ouvir e saber como diferentes culturas lidam com
entre o tecnológico e o natural, algo no que, me parece,
temas comuns, como digitalização e memória. Para mim,
o Triptyque está bem interessado.
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ABR/mAi 2015
foTo: GERBEn vAn HEijninGEn
MARNI E GALERIA ESTAÇÃO 43
VÉIO
Cícero Alves dos Santos curadoria | curated by
Stefano Rabolli Pansera 08 maio 2015 | may 08 2015 Abadia de São Gregório Saint Gregory’s Abbey VENEZA | VENICE
GALERIA
ESTAÇÃO
rua Ferreira de Araujo 625 Pinheiros SP 05428001 fone 11 3813 7253 www.galeriaestacao.com.br
design
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Da ciDaDe interativa à ciDaDe participativa giselle beiguelman
Ações coletivas em ambientes ricos em dados abrem caminho para a cidadania em rede
Projeto realizado em Lisboa permitia que o público dançasse dentro de uma cabine e transmitisse suas imagens para os semáforos em tempo real
As cidAdes contemporâneAs foram expandidas pelas tecnologias
digitais. Elas permitiram a ocupação de fachadas com telas e acesso, via aplicativos, a informações que vão do fluxo do trânsito ao mapeamento de remoções decorrentes de obras públicas. Se, ao longo dos anos 1990, os especialistas discutiam como apropriar-se das redes para tornar a cidade mais interativa, hoje, com a capilarização da tecnologia, a aposta é em como utilizá-las para interferir no cotidiano das cidades. A discussão sobre “cidades inteligentes” cede, assim, espaço para a de cidadania, reinventando as formas de ocupar as ruas e as próprias noções de política urbana. Não se trata mais de apenas planejar e regrar o espaço coletivo, mas, sim, de como mobilizar para que essas regras sejam fluidas o suficiente para constituir e reconstituir o uso comum, conforme as necessidades do momento. Um exemSELECT.ART.BR
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plo básico: como fazer com que os carros parem de fato no farol vermelho e os pedestres atravessem apenas na faixa de segurança? E uma questão mais complexa: como migrar da ideia de uma cidadania digital – que se esgota no uso de aplicativos – para as práticas de uma cidadania em rede, pautada pela ação colaborativa entre todos? ruAs dAnçAntes
Atravessar as ruas nos centros das grandes cidades converteu-se em uma espécie de batalha campal entre homens e máquinas. Isso
Grande como nossos sonhos. Grande como nossos talentos. Grande como nossas histórias.
Audiovisual brasileiro. Grande como o Brasil.
Com o seu reconhecimento e os contínuos investimentos do Governo Federal, o audiovisual brasileiro cresceu e se diversifi cou. Filmes, séries e outras produções nacionais estão presentes no cinema, na televisão e nas telas dos computadores e celulares em todo o país. E com o seu prestígio e as ações do Brasil de Todas as Telas, o mais importante programa de incentivo ao audiovisual já construído em nosso país, nossa produção vai se tornar cada dia maior.
Assista, recomende, valorize o que é seu.
Saiba mais:
/ancinegovbr
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vale para o trânsito caótico das metrópoles brasileiras, mas vale também para várias capitais europeias. Os carros, muitas vezes, não respeitam as faixas, mas é inegável que, na pressa, muita gente se arrisca correndo entre os carros. Com base nisso, a linha de automóveis Smart patrocinou um projeto que colocou os pedestres na função de protagonistas do trânsito. Instalou réplicas dos sinais de tráfego em escala humana e convidou o público a dançar lá dentro. Suas imagens foram silhuetadas na forma de bonequinhos e apareceram, em tempo real, dançando no sinal, no lugar dos tradicionais – e aborrecidos – sinais de interdição. O resultado, depois de um teste de um mês em Lisboa, no fim do ano passado, foi um aumento de 81% no número de pessoas que paravam no sinal vermelho. Não há dúvida que a receita de sucesso desse projeto passa por dois pilares do design de informação: o investimento na experiência do usuário (UX, User Experience), como experiên-
Bueiros Conectados, de Andrei Speridião, promove gestão coletiva da cidade
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cia participativa e não meramente reativa a cliques, e a exploração no limite máximo do potencial das cidades em rede. Afinal, é o fato de esses equipamentos urbanos funcionarem em rede o que permite a sua interligação em sistemas que podem ser apropriados de outras formas pela população. SiStemaS paraSitaS
Utilizar a base tecnológica implantada para criar novas ecologias sociomidiáticas é o que está por trás da ideia de parasitismo, no glossário do ativismo contemporâneo. Não se trata de haquear pura e simplesmente um sistema para uma causa própria, mas infiltrar-se para criar plataformas comuns. Em uma frase, estamos falando aqui da migração da apologia do individualismo DIY (Do It Yourself, Faça Você Mesmo) para o coletivista DIWO (Do It With the Others, Faça com os Outros). Na prática, isso aparece em projetos como os Bueiros Conectados do jovem designer paulista Andrei Speridião. Eles funcionam a partir da combinação entre um equipamento – desenvolvido por Speridião –, que é implantado nos bueiros e se alimenta das informações que os sensores dos bueiros captam e transmitem (como nível de água). Esse equipamento-parasita é a fonte de informações de um aplicativo para celular. Qualquer pessoa poderia acessar, assim, os dados gerados por um bueiro e, com isso, participar da gestão da cidade, identificando sua integridade física e o nível de sua capacidade de uso. O aplicativo permite não só que essas informações sejam agregadas a um mapa coletivo, mas também imediatamente transmitidas para o órgão ou instituição onde está localizado e à subprefeitura relacionada. Premiado no último IDEABrasil, um prêmio internacional devotado à excelência em design, Bueiros Conectados aposta no potencial da conexão entre os objetos e os cidadãos, privilegiando a mobilização coletiva para a tomada de decisões preventivas. O projeto aguarda parceiros para ser implementado (www.bueirosconectados.net). FoToS: wESLEy LEE E AndREi SpERidião. nA páginA Ao LAdo, REpRodução
APRESENTA: 47
A
Arte
NO MAIS SOFISTICADO NÍVEL
As grandes obras de arte, as apresentações e os espetáculos podem ser tão inspiradores que conseguem mudar o destino das pessoas. Porém, há um esforço muito maior e que quase ninguém consegue enxergar. São os patronos culturais, que trabalham nos bastidores e muitas vezes em silêncio para dar vida à arte que emociona. Desde 1992 a Montblanc reconhece os grandes patronos do mundo, concedendo o prêmio Montblanc de la Culture Arts Patronage. E como parte do prêmio, os vencedores recebem um instrumento de escrita único, da Edição Exclusiva Patrono das Artes. Este ano, Edição Exclusiva Patrono das Artes, que será lançada mun-
dialmente em 01 de abril, vai homenagear Luciano Pavarotti, um dos maiores tenores e apoiadores da cultura de todos os tempos. A combinação perfeita da lenda da música clássica, com a sofisticação admirada das criações artesanais de Montblanc. São três modelos que representam as superstições, gostos e trajes mais marcantes de Luciano Pavarotti. Para tornar o instrumento de escrita tão singular e grandioso como foi o artista, todos os moldes e ferramentas usados na criação são destruídos. Assim, quem tem uma Montblanc Edição Exclusiva Patrono das Artes terá a certeza de que poucos serão como ele. Conheça mais em montblanc.com.
coLuna móveL
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Os Dois Planaltos(1985), instalação de Buren no Palais Royal, em Paris. Em abril, artista terá site specific na Galeria Nara Roesler, no Rio
L i s e t t e L ag n a d o Da n iel Buren, a volta De um c láss ic o aos t ró pic os
Práticas artísticas contemPorâneas e arquitetura alimentam uma relação conflituosa .
A forte atração entre as duas disciplinas garante o calor do debate, como os projetos de arte pública que concebem intervenções a céu aberto, no intuito de tirar a arte da estagnação das paredes e dos interiores das casas. Mas essa operação requer uma complexidade que vai além da escala e do uso de materiais de construção, ou seja, não basta expor maquetes ou blocos de concreto e virar tendência disputada em feiras internacionais para conseguir o lastro com o espaço e o tempo que são próprios da arquitetura. O que significa isso? No mínimo, revisitar o artista francês Daniel Buren, cujo processo de reflexão demonstra a interdependência entre obra e contexto. Antes de seguir, cabe indagar que tipo de depoimento consegue a arte pronunciar em um campo tão minado e fora de controle quanto o espaço urbano disputado por avalanches de imagens publicitárias. Ou estará o artista fadado a reivindicar um pavilhão que possa chamar de “seu”? No debate que a revista Artforum organizou para sua edição de outubro de 2012, com críticos, artistas e arquitetos, o crítico Hal Foster manteve distância e não se dobrou ao modelo wagneriano de fusão Gesamtkunstwerk (obra de arte total). O que interessa não é a simples justaposição, mas uma coarticulação entre os agentes envolvidos: artista, arquiteto, urbanista, curador. Quando convidados a trabalhar em colaboração, artista e arquiteto edificam um palco de infindáveis negociações, como se a tão propalada “síntese das artes” de SELECT.ART.BR
ABR/mAi 2015
Mário Pedrosa só pudesse ficar no plano da utopia. Na arquitetura moderna, o historiador Siegfried Giedion ensina logo a desconfiar do termo “estilo” para não desaguar em formalismos. Resta à crítica traçar a linha divisória entre propriedade e oportunismos. Daniel Buren figura entre os poucos que sabem responder in situ às questões colocadas por uma construção, seja ela física ou simbólica. Não por acaso, sua obra magistral consistiu na inserção de colunas (cilindros), elemento inconteste da arquitetura, no pátio interno do Palais Royal, em Paris (1985-1986). Ali, a peça Os Dois Planaltos – instalada hoje em caráter permanente – atingiu vários domínios “protegidos”, como a encomenda pública e o monumento histórico. É bom lembrar que 1985 é o ano em que o neoexpressionismo alemão e a transvanguarda italiana desembarcam na Bienal de São Paulo pelo artifício de uma encenação apelidada de Grande Tela! Nascia entre nós a amizade entre curador e arquiteto para criar um enunciado crítico. Consagrado por suas listras regulares na paisagem urbana, Buren está de volta ao Rio de Janeiro depois da exposição realizada no Centro de Arte Hélio Oiticica. Em 2001, aquele lugar não poderia ter sido mais feliz ao abrigar um artista que vem há cinco décadas discutindo o fim do quadro, o exterior no interior e vice-versa, o deslocamento do corpo na percepção do campo espacial, a subserviência aos poderes políticos no espaço público. A história da arte lhe deve o conceito de “especificidade do sítio” (site specificity). Fosse só isso, já seria muito. Buren retorna agora como um clássico. FoTo: @viCToRTSu/FLiCkR
14 . mar – 17 . abr
RUBENS MANO
Stand H02 - Pavilhão da Bienal, Parque Ibirapuera São Paulo, SP
12 . mar – 03 . mai
SOFIA BORGES
01 . abr – 10 . mai
T H I A G O R O C H A P I T TA
09 . abr – 30 . mai
A N A P R ATA
18 . abr – 19 . jul
NELSON FELIX
25 . abr – 14 . jun
JOSÉ RESENDE
contrato social Galeria Millan
09 – 12 . abr
SP-ARTE
Imagine Brazil (coletiva) Instituto Tomie Ohtake São Paulo, SP
Que partam as lentes empoeiradas (coletiva) Instituto Tomie Ohtake São Paulo, SP
Minutemen La Maudite Paris, França
OOCO Estação Pinacoteca São Paulo, SP
Pinacoteca do Estado de São Paulo São Paulo, SP
fogo cruzado
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A ArquiteturA modernistA AindA tem Algo A dizer? Paradigma surgido nas primeiras décadas do século passado, o ideário modernista trazia em sua essência a configuração formal que deveria abrigar um novo indivíduo, resultante do progresso industrial e humanista. sem conseguir desenvolver um movimento sucessor de mesmo calibre, consolidou-se no Brasil como único referencial arquitetônico, em que funcionalidade e ideologia caminhavam obrigatoriamente juntas. com a evidência de seu fracasso como catalisador de mudanças sociais, seu legado tem a relevância e a atualidade problematizadas na opinião de nomes de destaque no cenário de hoje.
Zaha hadid ArquitetA irAquiAnA rAdicAdA em Londres, vencedorA do Prêmio Pritzker de ArquiteturA em 2004
Eu ainda acredito na visão do século 20 pela qual a arquitetura pode contribuir para uma vida melhor, criando ambientes propícios para todos os aspectos da vida. É uma questão de bem-estar. A arquitetura pode trazer consigo um senso inerente de vitalidade e otimismo, a habilidade de conectar comunidades e construir seu futuro. Nossa tarefa como arquitetos é continuar esse progresso. SELECT.ART.BR
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anna DietzsCh ArquitetA pAulistA, diretorA dA filiAl do escritório norte-AmericAno dAvis Brody Bond AedAs, em são pAulo
Num mundo castigado por guerras, o modernismo nasce com a esperança de outro futuro. O arquiteto-salvador, o mundo resgatado pela tecnologia, a industrialização como base para uma igualdade almejada. Independentemente de seus preceitos ou dogmas, a arquitetura moderna baseia-se num entendimento do mundo que se quer holístico e proativo. Uma plataforma para o engajamento intelectual e político. Nesse sentido ainda nos ensina e nos instiga: qual é hoje nossa visão de futuro, nossa plataforma de convicções? Não é, com certeza, o ideário moderno. Mas se quer tão forte quanto ele.
GuiLherme Wisnik Arquiteto e curAdor dA 10ª BienAl de ArquiteturA de são pAulo
O fundamento da arquitetura moderna é a ideia de que as edificações produzidas de forma racional e otimizada são a base para o pensamento e a produção de cidades mais igualitárias, menos hierarquizadas e mais coletivas. Penso não haver dúvidas, hoje, de que esse é um desafio que ainda está no horizonte.
Jean-Louis Cohen Arquiteto e historiAdor frAncês especiAlizAdo em ArquiteturA modernA
A arquitetura modernista não tem mais nada a dizer, ainda que tenha contribuído muito durante décadas, uma vez que seus programas em muitos casos responderam às expectativas sociais. As linguagens que tiveram origem no modernismo, que de forma alguma é uma arquitetura apática e monolítica, endereçaram aos novos grupos sociais o que a prática nas classes altas havia até então negligenciado. Experimentos paralelos com estruturas e suas expressões tectônicas com o espaço, além de novos paradigmas estéticos, transformaram profundamente a relação da arquitetura com suas heranças histórias, ainda que muitos dos fundadores do modernismo tenham encontrado inspiração em épocas passadas. A ousadia dos experimentos do modernismo, infelizmente, foi eclipsada pelo uso do instrumental moderno em programas públicos ou privados. Inicialmente subversivas, essas formas não podem mais ser usadas como linguagem pura. Se o modernismo nos ensinou algo, foi a subversão e a atenção às expectativas da população. Uma lição fundamentalmente ética. fotos: de cima para baixo, divulgação, guillaume gaudet. na página ao lado, brigitte lacombe
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carla Juaçaba ArquitetA rAdicAdA no rio de JAneiro
A arquitetura moderna é a melhor fonte da arquitetura contemporânea. A qualidade da arquitetura paulista atual tem uma consistência filosófica e técnica fundada no modernismo. Então, tudo é uma continuação, não uma negação de todas essas qualidades.
alvaro Puntoni Arquiteto pAulistA integrAnte do gruposp
A arquitetura deve ser compreendida como a expressão técnica e social do tempo em que vivemos, mas que sempre desenha o mundo que ainda não conhecemos. Como tal, não cremos que haja uma arquitetura de ontem e de hoje, mas apenas a arquitetura que construiu e constrói todo o universo humano. Quando falamos de arquitetura moderna, estamos nos remetendo à arquitetura que desenhou o mundo que se transformava no início do século 20, com as revoluções para homens que deveriam brilhar como o sol, como disse o poeta. Depois, as guerras e o século trataram de mostrar outros caminhos e descaminhos, mas sem o encantamento dessa época de transformação, apesar de ser ainda a mesma arquitetura dos homens. Nesse sentido, a arquitetura moderna já disse e tem tudo a dizer, pois ainda somos os mesmos homens em busca de uma vida melhor para todos. Quando fazemos arquitetura, fazemos todas as arquiteturas que foram feitas e uma que ainda não existiu.
Marcelo Ferraz Arquiteto pAulistA, sócio dA BrAsil ArquiteturA
O movimento moderno na arquitetura continua. Seu ideário de construir um hábitat humano mais justo e afeito aos tempos mutantes ainda está na ordem do dia e é desafio da sociedade atual na construção das cidades e da cidadania. Ainda lutamos pela conquista de espaço público, por habitação digna para todos – bem projetada e bem construída –, por mobilidade com transportes públicos eficientes e decentes, por sistemas racionais de abastecimento de água e energia, e por saneamento básico. Ainda lutamos por cidades mais democráticas, contra os guetos, sejam eles de ricos ou de pobres. Ainda lutamos por cidades mais confortáveis, onde o trabalho não escravize, a escola não oprima e a casa não seja somente um dormitório – cidades onde a vida seja a celebração da convivência e do prazer. É a utopia moderna? SELECT.ART.BR
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Franklin lee e anne Save de Beaurecueil Arquitetos pAulistA e frAnco-AmericAnA, sócios dA suBdV Architecture
PorFírio valladareS Arquiteto e designer, rAdicAdo em Belo horizonte
Estritamente sob o ponto de vista da plasticidade, talvez sim. É muito pouco provável que um movimento esgote todas as vertentes de expressão plástica a ele afeitas, por mais que vejamos mais do mesmo. Mas será que isso é realmente importante? A contemporaneidade assiste ao crescimento das publicações voltadas ao design de interiores e, ao mesmo tempo, ao encolhimento do espaço editorial dedicado à arquitetura. Isso não é à toa. A formação do arquiteto plasmada no modernismo consolidou um modelo de profissional altamente elitista e inacessível ao comum dos mortais. Esse profissional foi treinado para projetar monumentos, grandes obras encomendadas por grandes homens. Ao longo da história, o arquiteto consolidou-se como uma espécie de papagaio de pirata, sempre sobre o ombro de algum poderoso; o artista dos reis. E não se dedicou àquilo que dele se esperava, que é projetar uma casa digna para o homem comum. O homem comum, acertadamente, não se interessa pela arquitetura.
Ao longo de sua história, a arquitetura modernista disse tantas coisas diferentes que talvez, hoje, se tenha tornado completamente muda, como alguém que falou demais e perdeu a voz, ou ao menos a credibilidade. Ela representou tantas ideologias diferentes e conflitantes: de sua emergência como um movimento sociopolítico de esquerda que desmantelou as hierarquias sociais burguesas na França, Alemanha e Rússia, até ser usada em monumentos brutalistas (estilo específico do modernismo de 1950 a 1970, em que o concreto era a matéria-prima por excelência) pelos fascistas na Itália, e, finalmente, até ser supercomercializada e desprovida de significado político por sua produção industrial em massa nos Estados Unidos. A arquitetura modernista tornou-se uma estética estilística sem muito a dizer. Ainda, a crise ecológica global provou a falência dos fundamentos estéticos puristas do projeto arquitetônico modernista em sua incapacidade de mediar efetivamente os fluxos ambientais de gravidade, sol, vento e chuva. A caixa ortogonal do estilo arquitetônico modernista foi despida de estruturas orgânicas, que com inteligência distribuíam a força da gravidade, que sombreavam e refletiam a luz do sol, que mediavam a ventilação natural, e que ecologicamente direcionavam a água da chuva, como fora alcançado anteriormente com o ornamento funcional orgânico do gótico e fachadas e estruturas vernaculares, por exemplo. A arquitetura modernista, hoje, está sendo redefinida, pelos neomodernistas e neofuturistas, para trazer de volta a natureza como um elemento atuante e não apenas como pano de fundo. Então, sim, a arquitetura modernista deveria calar-se e deixar a natureza falar.
Fotos: divulgação. na página ao lado, de cima para baixo, raFael pavarotti/schelling, divulgação e Felipe hellmeister
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mundo codificado
r i ca r d o va n st e e n
gustavo f i o rat t i
A curvA populAcionAl dAs grAndes metrópoles Até 2030 54
38 milhões 36 milhões
35 milhões
30 milhões
2030 25 milhões
2025 20 milhões
2020 15 milhões
2015 tóquio A parte mais escura do gráfico representa a população de 2030. A mais clara representa a atual.
dÉLhi
25 milhões 24 milhões
23 milhões
20 milhões
15 milhões
sÃo PAuLo
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CAiRo
“A cidade não para, a cidade só cresce”, bem avisou Chico Science. Mas passou batido para o titular do manguebeat que as cidades também se fundem umas com as outras, formando megalópoles. Até 2050, 6,4 bilhões de pessoas já terão ocupado os centros urbanos, o que representará quase 70% da população mundial. A seLecT mostra, aqui, o desenho do crescimento de dez protagonistas desse fenômeno, com Tóquio disparando na frente.
30 milhões
26 milhões 24 milhões
xangai
mUmbai
cidade dO méxicO
26 milhões
20 milhões
nOVa YORK
20 milhões
PeQUim
OSaKa
FONTE: Relatório da ONU World Urbanization Prospects: The 2014 Revision, Highlights (crescimento populacional)
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p r oj e to
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CIDADES IMAGINÁRIAS Complexos urbanos idealizados por pintores, escritores, cineastas: como a poética pode contaminar a realidade e também ser contaminada por ela G U S TAVO F I O R AT T I
À parte suas idiossincrasias, Wheel, 17 e Zaíra são cidades que
compartilham algo em comum: elas não existem. Ou melhor, existem, mas em um plano que não é este onde repousam São Paulo, Tóquio ou Piracicaba. Espelhamentos de uma época ou frutos de poéticas decalcadas nas realidades urbanas, essas três cidades fictícias exemplificam um tema que se espraiou por campos de expressão diversos. Filmes de Hollywood têm cidades inventadas. Quadrinhos, videogames, obras literárias e as artes visuais também. City Wheel, uma roda cujos raios são prédios, pertence às City Series, conjunto de peças geométricas criadas desde 2011 pelo norte-
Inspirada no projeto Metrópole Fluvial, desenvolvido por Alexandre Delijaicov na FAU-USP, fotografias de Gabriel Rinaldi modificadas pelo fotodesigner Fujocka mostram como seria São Paulo com seu sistema hídrico recuperado
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Foto: reprodução
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Detalhe da escultura em madeira Cityscape, do escritório americano McNnabb Studio
-americano James McNabb, a partir de aglomerações de edifícios-miniaturas em madeira. City 17 foi criada pela Valve, empresa especializada em videogames, para o jogo Half Life 2; e Zaíra é uma das 55 cidades descritas pelo escritor italiano Italo Calvino em seu livro As Cidades Invisíveis (1972), um clássico da literatura fantástica. Podemos acrescentar a essas até mesmo a escura e perigosa Gotham City, cujos becos são cenários para as aventuras de Batman. Ela foi criada nos anos 1940, 15 anos após a estreia do filme Metrópolis (1927), do austríaco Fritz Lang. Haverá mais exemplos, no decorrer deste texto, de cidades e metrópoles imaginárias que poderiam formar uma coleção de retratos da passagem do século 20 para o 21. Pertencessem ao catálogo de um gênero – ao lado de paisagens, naturezas-mortas, retratos, obras conceituais –, as imagens de cidades que não existem comprimem a identidade de uma era. Nelas há temas recorrentes e que “permanecem inescapáveis”, diz à Select Darran Anderson, escritor irlandês que está finalizando o livro Imaginary Cities, a O Dixonary de Tom Dixon ser lançado em maio (no Brasil, a opção será adquiri-lo explica a linguagem pelo site Amazon). falar sobre seu trabalho, o audo designerAo por meio suas inspirações tor identificadenessa opçãoetemática “o desejo de construir Babéis interpretações e derrotar Deus, a tecnologia como expansão dos sentidos humanos, os espaços em branco
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preenchidos nos mapas com sonhos e pesadelos, o horror das distopias, o memento mori lembrando que tudo um dia estará em ruínas e, à parte tudo isso, nosso desejo de que tudo permaneça para sempre”. O marco inicial do livro de Anderson é As Cidades Invisíveis, de Calvino, com sua série de lugares fantásticos descritos em diálogos fictícios pelo protagonista Marco Polo a Kublai Khan, imperador que pretende erguer o reino perfeito. O processo de transferir ideias para o papel e erguer construções tridimensionais é “mais poético do que consideramos”, diz Anderson. “Pegue o Taj Mahal ou o Cristo Redentor. Não há outra razão para que qualquer uma dessas estruturas exista senão como algo que foi antes sonhado por alguém. E, ainda assim, temos a impressão de que aquilo nos foi dado por Deus.” Cidades que existem
Ao considerar que o desenvolvimento das cidades (aquelas que de fato existem) mantém relação íntima com a imaginação e as artes, o autor defende que essas mesmas cidades podem, e provavelmente vão, a partir de agora, passar por um gradual processo de reinvenção. “Existe certa liberdade na tarefa de dedicar-se ao hipotético, algo que nos permite discernir o que é daquilo que poderia ser”, diz Anderson. A literatura do século 20 teria ela própria nos influenciado a um sistema em colapso. “Aldous Huxley, George Orwell, Yevgeny Zamyatin e companhia nos precaveram contra certas tendências que poderiam levar ao totalitarismo. Mas uma coisa que não previram foi uma era em que nos tornamos paralisados
What Says the Flowers, desenho do americano Benjamin Sacks
Fotos: reprodução. NA pÁGINA Ao LAdo: MCNABB studIo
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pelo cinismo e pela apatia, uma desconfiança em parte introjetada pela própria literatura distópica. Em uma era que se recusa a acreditar em qualquer utopia, o niilismo e os oportunistas prosperam.” Para o arquiteto e urbanista Alexandre Delijaicov, da FAU-USP, problemas urbanos também podem surgir de imaginários específicos, aqueles que derivam das deturpações estimuladas, por exemplo, pela lógica do mercado. “O desastre urbano que estamos vivendo agora foi armado por um imaginário que se dedicou à tarefa de iludir e enganar”, cita em depoimento à seLecT, em contraponto ao que chama de “utopia concreta”. Delijaicov é um dos coordenadores do grupo de estudos Metrópole Fluvial. Com o objetivo de estudar, fomentar e difundir a cultura de projetos de arquitetura de infraestruturas de cidades fluviais, o grupo passou a imaginar uma São Paulo reconfigurada a partir da valorização de seu sistema hídrico, hoje poluído, canalizado ou estancado por paredões rodoviários. Uma utopia concreta. A palavra “utopia” também deu norte ao professor de história da arte Hans Ulrich Reck em texto para o catálogo da 25ª Bienal de Arte de São Paulo. A mostra era composta de 12 módulos dedicados ao tema Iconografias Metropolitanas (2002), e no 12º módulo construiu-se coletivamente uma metrópole imaginária. Reck passa pela ideia de que “em meio a ruínas a utopia faz sentido”, referindo-se ao paradoxo de almejar o perfeito no futuro. Nas cidades criadas pelo desenhista americano Benjamin Sack, as questões éticas e comportamentais infiltram-se por território paralelo, pelo estético puro. Em seus detalhados organismos urbanos, as formas geométricas funcionam como células. “Cidades, de uma maneira bem simples, são compostas de pontos, linhas, SELECT.ART.BR
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Edifício Guarita, maquete de Marcio Kogan e Isay Weinfeld, integrou a 25 a Bienal de São Paulo, Iconografias Metropolitanas
FoToS: REpRodução
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La sortie de l’Opéra en l’An 2000 (1902), ilustração de Albert Robida comentada por Darran Anderson no livro Imaginary Cities
Alexandre Delijaicov lembra que as cidades são obras coletivas e abertas. Podem ser consideradas a maior expressão artística já criada pelo homem
quadrados, cubos, círculos, triângulos, cilindros. Eu re trato a evolução de algo simples para algo complexo, e também a força que direciona esse trajeto a fazer uma ligação entre história, física e artes”, diz Sack. Neste caso, a memória do artista exerce o papel de catalisar reações provocadas pelo encontro de cultu ras e tempos. Os resultados são vistas aéreas, ou “bird views”, que assumem a perspectiva de um pássaro. Se imergíssemos nesses quadrados, cilindros e triângu los, em um voo rasante pelos espaços vazios desenha dos entre eles, encontraríamos outros complexos em escala humana, como os retratados pela série fotográ fica Imaginary Towns, do italiano Francesco Romoli. “Luzes que iluminam ruínas, melancolia, uma mistura de memória intuitiva e resignação. Meus personagens encaram tudo isso quase como heróis que precisam lidar com a solidão das cidades”, diz Romoli. E então o imaginário complexo de outra criatura mons truosa, aos poucos, vai se formando em pleno século 21. Delijaicov lembra que as cidades, e desta vez ele fala das que existem de fato, são elas próprias “obras coletivas e, portanto, abertas”. Podem ser consideradas, conclui, a maior expressão artística já criada pelo homem. Com ima ginários que se combinam. Ou que se destroem.
C o m p o r ta m e n t o
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URBANISMO TÁTICO L u c i a n a Pa r e j a n o r b i at o
Coletivos artísticos e arquitetônicos plantam projetos de reconfiguração urbana à margem do poder público
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Filho da Revolução industRial, o urbanismo surgiu
como resposta ao aumento da população nas cidades e à aspiração de projetar a cidade como um macro-organismo controlável. Nessa perspectiva, foi compreendido tradicionalmente como uma disciplina pela qual arquitetos uniam-se ao poder público para traçar planos de crescimento ordenado para os aglomerados humanos. As dinâmicas sociais e os próprios ritmos do capital nunca seguiram essas diretrizes à risca. O processo de globalização e a rapidez da circulação de informação depois da internet escancaram de vez a ineficiência do ideal estratégico. Especialmente em países em desenvolvimento, como o Brasil, onde a infraestrutura de base é tão problemática. Na falta de saneamento, iluminação e pavimentação, como exigir do espaço público vocação social e estética? Diante da iminência do caos urbano e ambiental neste início do século 21, nada mais natural que cidadãos ajam por conta própria, na tentativa de sanar demandas urgentes. Mais que isso, de implementar iniciativas que resgatem o convívio, a vida em comunidade e o respeito às diferenças. É a era do urbanismo tático. O movimento é internacional e vem ganhando seguidores, desde os anos 1990. O termo “urbanismo tático” popularizou-se nos EUA, em 2010, quando foi usado em um debate
Com iniciativas como o Parque de Balanços no Anhangabaú, o Basurama leva aos moradores das cidades uma nova noção de vida em grupo Foto: CORTESIA BASURAMA.
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Painel instalado sob o Minhocรฃo (SP) pelo grupo carioca Muda, que usa a iconografia modernista para recuperar รกreas degradadas SELECT.ART.BR
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Apesar de serem rápidas e de fácil execução, as ações diretas devem apontar para possibilidades de mudança de longo prazo
sobre a pedestrização da Times Square (NY). Em sua esteira, a empresa de design e planejamento urbano The Street Plans Collaborative, de Miami e NY, lançou em 2011 seu primeiro manual virtual, Tactical Urbanism: Short-Term Action/Long-Term Change (Ação de Curta Duração/ Mudança de Longo Prazo), uma compilação de projetos táticos. Veio o Volume 2 (disponível em bit.ly/1fw6dK7), com casos novos; um terceiro manual voltado para experiências na América Latina; e um quarto sobre Austrália e Nova Zelândia. Acima das particularidades desse campo em cada país, o urbanista Mike Lydon, sócio da Street Plans, afirma à seLecT que “a questão crucial do urbanismo tático é tratar os problemas nas cidades com ações rápidas e facilmente executáveis, que mostram a possibilidade de mudança de longo prazo”. Essa é a ideia fundamental no coração dos projetos de urbanismo tático ao redor de todo o mundo. Como numa profecia, o pensador francês Henri Lefebvre (1901-1991) escreveu em seu La Production de L’Espace (Éditions Anthropos, 1981), que “a ‘verdade do espaço’ vincula o espaço, por um lado, à prática social e, por outro, aos conceitos elaborados e encadeados teoricamente pela De colete refletivo, Mike Lydon, sócio da Street Plans Collaborative, pinta sinalização em rua dos EUA
Fotos: cortesia mike lydon. na página ao lado, cortesia coletivo muda
filosofia, ainda que a superando como tal, precisamente pela conexão com a prática”. É dessa mistura de saberes formais e cotidianos que o urbanismo tático se alimenta. Gentileza urbana
Com a precariedade urbanística e todo tipo de carência social, o Brasil é um sítio privilegiado para ações diretas. Um exemplo desse tipo de prática hoje no Rio de Janeiro são as intervenções do Coletivo Muda. Em atividade desde 2011, o grupo formado pelos designers Bruna Vieira e João Tolentino e os arquitetos Diego Uribbe, Duke Capellão e Rodrigo Kalache vale-se de sua formação e da pesquisa com módulos para criar murais que carregam diversas memórias. “Desde a herança portuguesa até os painéis de azulejos dos grandes muralistas brasileiros”, segundo os integrantes. Pela imagética conectada ao modernismo, o Muda criou um canal direto entre paisagem e moradores. “Nossos painéis se espalham pela cidade, ativando a percepção dos transeuntes e fazendo com que a paisagem urbana se torne mais presente no dia a dia da população”, dizem. De fato, locais degradados que vão desde o Largo da Carioca ao metrô de Nova York ganham beleza e visibilidade. Velho de guerra na cena tática, o Bijari está atualmente em cartaz na Choque Cultural, em SP, com um projeto que a revista seLecT publicou em primeira mão em sua edição 17: as Praças Impossíveis. São simpáticas bicicletas munidas de guarda-sol, banco e jardim portáteis que improvisam espaços públicos coletivos onde quer que exista um canto inútil. Outros desdobramentos são os happenings do carioca Opavivará, que articulam desde espaços temporários de convívio e até chuveiros públicos; ou a pesquisa Bicicletas Ambiente:
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Pela característica coletiva de suas atividades, o movimento tem como questão fundamental o empoderamento comunitário Economias de Quintal (2013), da dupla de ar tistas mineiras Ines Linke e Louise Ganz, que mapeou hortas comunitárias, criadores de ani mais, quintais produtivos, nascentes, fontes de água, de energias, sistemas construtivos al ternativos e outras microeconomias verdes da Grande Belo Horizonte. Pela fartura, o Institu to de Arquitetos do Brasil (IAB) realiza desde 1993 o Prêmio Gentileza Urbana, para “peque nas atitudes dos cidadãos que colaboram para deixar a vida nas cidades cada dia melhor”. “Os coletivos se multiplicaram muito ra pidamente”, diz Marta Bogea, arquiteta e pro fessora da Faculdade de Arquitetura e Urba nismo da USP. “É importante pensar na po tência desse movimento. Será que o nosso único motivo para estarmos juntos são os mo mentos de confraternização? Até que ponto o coletivo é só festa?”, problematiza.
são ensinados à população. “A questão do empoderamento comunitário é fundamental dentro da nossa atuação”, diz o artista espanhol Miguel Ro dríguez Cruz, um dos integrantes do Basurama. #ficaadica das instalações no site do grupo (http://bit.ly/1B5cCIs). O coletivo Micrópolis, criado em 2010 por arquitetos com formações complementares em ciências sociais, começou no ano passado a inves tir em projetos de conscientização no bairro Calafate (BH). Foi lá que os eventos antes efêmeros do grupo passaram a ser norteados por um pro jeto pedagógico, gerando um jornal feito em parceria com moradores, o Fala Calafate. “Começamos a reunir práticas cotidianas e histórias das pessoas não com o intuito de solucionar problemas, mas como forma de criar redes e mostrar como as práticas dos próprios moradores têm uma potência muito grande no espaço do bairro”, conta o integrante Felipe Carnevalli. O jornal virou um sucesso e a comunidade abraçou a causa. “Até o padre da igreja local nos chamou para sugerir uma reportagem sobre a crise da água e as fontes escondidas do bairro.” Nesse rastro sobressai a busca por uma nova forma de perceber o mundo. O fim das certezas quanto ao futuro abre as portas para a arte propor novos modos de existência.
SoluçõeS fictíciaS, práticaS cotidianaS
Jornal Fala Calafate, produzido pelo coletivo Micrópolis em colaboração com a comunidade do bairro de BH
Para que ações táticas não sejam confundidas com baladas e festejos, a solução é realizar ini ciativas de cunho pedagógico, que capacitem os públicos locais para a continuidade das ações. Como fazem o coletivo Basurama, que se divide entre Madri e São Paulo, e o mineiro Micrópolis. Na ativa desde 2001, o Basurama chegou a SP em 2007. Como o nome indica (basura é lixo em espanhol), o grupo trabalha com mate riais descartados, articulando urbanismo e eco logia. Eles lançaram em março último o Guia Fantástico de São Paulo (www.facebook.com/ guiafantasticodesaopaulo), cujas ilustrações de Ángela Léon mostram soluções fictícias e poé ticas para a megalópole, como uma piscina gi gante no Minhocão ou balanços suspensos em viadutos, que chegaram a virar realidade na Vi rada Cultural. Mas, além da fantasia, iniciativas como jardins verticais feitos com garrafas PET e trepatrepas de carretéis de fiação pública SELECT.ART.BR
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foToS: CoRTESiA miCRópoLiS
portfólio
A N D R É K O M AT S U DISFUNCIONAL, MAS REAL MÁRION STRECKER
O artista paulistano, convidado para a 56ª Bienal de Veneza, usa elementos construtivos para criar metáforas e desmontar ideias
Mato Sem Cachorro Não Tem Dono (2005), registro de ação com instalação de uma espécie de “pipicat” em sala expositiva SELECT.ART.BR
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Foto: cortesia do artista
A bAndeirA brAsileirA nA fAchAdA do pAvilhão nAcionAl na Bienal de Veneza, a partir
de maio, vai estar ladeada por um par de tênis velhos. Essa é a maneira que o paulistano André Komatsu encontrou para ressaltar que a nação é mais bem representada pelo homem comum, não pelo campo verde e o losango amarelo oriundos da bandeira imperial portuguesa, pelas metáforas das riquezas naturais, nem pelos ideais positivistas de ordem e progresso. Komatsu vai representar o Brasil ao lado do português-carioca Antonio Manuel e da paraense Berna Reale, artistas também escolhidos pelo curador Luiz Camillo Osorio, diretor do MAM do Rio e responsável pela exposição nacional na 56ª Bienal de Veneza, de 9 de maio a 22 de novembro. A participação brasileira é financiada pelo Ministério da Cultura por meio da Funarte (Fundação Nacional de Artes) e produzida pela Fundação Bienal de São Paulo, no pavilhão nacional mantido na cidade italiana pelo Ministério das Relações Exteriores. SELECT.ART.BR
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À esq., O Estado das Coisas II, instalação (2011) com um par de tênis velhos. À dir., Ordem Casual 3 (2010), fotografia com grid digital impressa em jato de tinta sobre papel de algodão, e desenho em ponta-seca. Abaixo, Atlas (2007), instalação com madeira, barra rosqueada, parafuso e camiseta
“Representar é uma palavra superforte. É uma honra, mas represento apenas parte das artes visuais do Brasil, parte de uma classe socioeconômica. A arte sempre foi utilizada como um instrumento de poder, mas eu estou cagando para isso. Não represento o governo. O trabalho fala desse sistema de controle”, diz Komatsu, filho de arquiteto e formado, em 2002, em Artes Plásticas na Fundação Armando Álvares Penteado (Faap), escola da elite paulistana. Ele mora atualmente na Vila Mariana e divide um ateliê com os colegas artistas Marcelo Cidade e Keila Alaver no bairro de Quarta Parada, na região sudeste de São Paulo, cujo nome deriva do fato de ter sido até 1981 a quarta parada da Estação de Ferro Central do Brasil. Komatsu nasceu pouco antes disso, em 1978. Metáforas da situação social, econômica ou política são frequentes na obra de Komatsu, bem como reflexões sobre o próprio ofício. A obra mais antiga deste Portfólio de seLecT é Y0K (2002). Trata-se do registro de uma performance filmada nos tempos da Faap, em que Komatsu salta em direção a uma quina de parede, numa tentativa de “desvirginar o vazio”. A ideia não era apresentar a performance ao vivo, muito menos reencená-la no futuro. Outro ponto importante para Komatsu é gostar do anonimato. “Poderia ser qualquer um”, diz ele. “Não vejo a performance como espetáculo, mas como um meio de entender a situação real através de uma ação real”. Em Y0K, o 0 representa a quina da parede, enquanto o Y e o K são uma referência a Yves Klein, autor de uma célebre fotomontagem chamada Salto no Vazio (1960), em que o artista francês, pioneiro da performance e da arte conceitual, aparece se lançando no ar, numa alusão crítica ao programa espacial. fotos: acima, cortesia do artista; abaixo, edouard fraipont. na página ao lado, cortesia do artista
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Na instalação Mato Sem Cachorro Não Tem Dono (2005), Komatsu montou uma espécie de “pipicat”: um canto de areia sobre o qual ele mesmo urinou, para demonstrar que o espaço institucional da arte é uma ação domesticada. Sem prever como o público reagiria, o artista viu meninas e rapazes imitarem sua atitude nas exposições, e urinarem também na sua obra, tornando o espaço “insuportável”. A instalação Atlas (2007), com o nome do mito grego condenado a levar o mundo nas costas, é uma barra de madeira presa entre o chão e o teto do espaço expositivo, e no chão a barra pressiona uma camiseta, simbolizando o peso que as pessoas carregam em nossa sociedade. Na instalação Ícone (2008), Komatsu desvia a lâmpada de uma luminária para dentro de um buraco na parede, de modo que a luz ilumine não a sala de exposição (o “espaço do teatro”), mas, sim, o almoxarifado, um local que o público não frequenta. “O marginal move-se melhor que o herói, porque o herói é um ícone, torna-se um dogma, ele é referência, enquanto o marginal é o oposto: não tem o brilho, mas é capaz de criar soluções mais versáteis e menos burocráticas”, argumenta. As soluções que as pessoas dão para a arquitetura da cidade também são exploradas por Komatsu, como na série Ordem Casual (2010). O método usado foi fotografar uma cena urbana, aplicar no computador um grid digital, ampliar a imagem em jato de tinta sobre papel de algodão, e aí usar ponta-seca sobre o papel para marcar um novo grid. O desenho segue a composição mostrada na foto, numa tentativa de racionalizar o casual. Time Out (2013) traz um relógio instalado de tal modo que a trajetória de um dos ponteiros está bloqueada por um maço de papel sulfite. As folhas representam a burocracia, que impedem o tempo de correr. Um trabalho ainda inédito é Água Suja, um objeto cinético feito com um balde cheio. As duas instalações que Komatsu pretende mostrar em Veneza têm nomes semelhantes. Se O Estado das Coisas II vai exibir um velho par de tênis pendurado na fachada, Status Quo será ainda mais contundente. Consiste em dois corredores laterais que começam com 1 metro de largura e se estreitam até 50 centímetros. No centro do espaço haverá uma grande gaiola, rasgada. É pelo rasgo que o público se sentirá atraído e, fatalmente, quererá entrar. “Veja só: entrar na gaiola será um alívio! É uma servidão voluntária em relação ao fluxo”, diz Komatsu. “A história é uma grande manipulação. A gente vive numa sociedade funcional, produtiva, por isso é tão difícil se desvencilhar.”
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Y0K (2002), imagens de vídeo de 7’’, em que o artista salta para a quina de parede
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“Não vejo a performance como espetáculo, mas como um meio de entender a situação real através de uma ação real” fotos: cortesia do artista
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Febre do Ouro (2014), com tubos quadrados de ferro, alambrados de aço galvanizado, fios elétrico e lâmpadas SELECT.ART.BR
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foto: Nicolò Burgassi
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Casa do Morumbi, projetada por David Ottoni, finalizada em 1975, vazia desde 2010. Foto fevereiro/2015. SELECT.ART.BR
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Ensaio visual
A RUÍNA BRUTALISTA T e x To e f oTo s A n A O t t O n i
Fotógrafa apresenta recorte de sua pesquisa sobre a arquitetura brutalista paulista, estilo em que o concreto era a matéria-prima por excelência, investigando seu papel simbólico no contexto brasileiro
Velódromo da USP, projetado para os jogos Pan-Americanos de 1975, que não se realizaram no Brasil, finalizado em 1977. Fechado para competições desde 1990. Foto outubro/2014
Meu pai, david ottoni, arquiteto paulista e discípulo de vilanova artigas, projetou nos anos 1970 uMa casa
de concreto armado aparente e vidro para a sua família, com dormitórios muito pequenos, camas-estante e uma grande sala envidraçada com vista para um vale ainda pouco construído e muito arborizado. Eu vivi nessa casa por 17 anos, reclamando do tamanho do meu quarto e do frio que sentíamos no inverno, mas usufruindo da
belíssima vista daquela sala ensolarada, e orgulhosa de viver em um lugar tão particular, no fim das contas. A casa está vazia há cinco anos, desde a morte de meus pais, e, infelizmente, o sentido do projeto perdeu-se com o crescimento do entorno. O lote estreito não suportou a verticalização dos vizinhos. A casa ficou muito escura, sem sol e sem vista, desconfortável para os padrões contemporâneos. A infraestrutura está irreversivelmente destruída. Desde 2012 venho fotografando o seu processo de deterioração. A partir de 2014, o ensaio tornou-se pesquisa de mestrado e foi estendido a outros prédios do brutalismo paulista, dialogando com a própria imagética das ruínas e investigando seu papel simbólico no contexto brasileiro, que tanto preza o seu modernismo.
Centro de Artes Cênicas, projeto de 1973 de Jorge Wilheim, paralisado em 1976 por falta de verbas. Retomado em 1991, foi novamente abandonado após a abertura do Paço das Artes. Foto fevereiro/2015.
A imagem da ruína brutalista não tem o glamour das ruínas pré-modernas que frequentam o nosso imaginário, como as fantasmagóricas gravuras de Luigi Piranesi ou as dramáticas telas de Willian Turner. O concreto não descasca, escurece; o vidro temperado fica apenas sujo e, quando quebra, some. A ferrugem reside no interior do concreto, invisível. Sua única identificação com a ruína romântica é a retomada descontrolada da natureza, da vegetação que vai invadindo frestas e juntas
de dilatação e ajardinando lajes de cobertura. A forma de conservar ou restaurar esses prédios mostra-se complexa e polêmica, se não contraditória à sua proposta original, o espírito da época modernista. Devemos tombá-los? Como restaurá-los? As imagens deste ensaio certamente carregam uma nostalgia pessoal, a saudade da convivência com meu pai dentro da casa de concreto, da vida de jovem estudante na FAU-USP, da extrema convicção no sucesso do projeto modernista da qual eu era cercada. Mas o sentimento nostálgico não é exclusividade minha, ao contrário, é lugar-comum no pensamento contemporâneo. A retomada do gosto pela ruína acompanha a obsessão memorialística que resgata arquivos, ressignifica resíduos e revê a história. A imagem das ruínas modernistas, por sua vez, carrega a saudade do futuro prometido pelo projeto moderno.
Garagem de Barcos Santa Paula, de 1961, obra assinada por Vilanova Artigas e Carlos Cascaldi. Foto novembro/2014 SELECT.ART.BR
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curadoria
TAIPA-TAPUME REVISTA “A cidade de São Paulo é um palimpsesto – um imenso pergaminho cuja escritura é raspada de tempos em tempos, para receber outra nova (...).” A citação de Benedito Lima de Toledo, trecho do livro São Paulo – Três Cidades em Um Século, ajuda-nos a pensar a capital paulista. A cidade, desde o fim do século 19, cresce em ritmo acelerado, apresenta um desenvolvimento pautado por ciclos de construção, demolição e reconstrução e tem uma história constantemente reescrita. História iniciada com as edificações de taipa de pilão, desde então, vem sendo pautada e pontuada pelos tapumes dos canteiros de obras. Seu crescimento populacional, seu adensamento urbano e a monetização do solo acirram as disputas pela ocupação dos espaços, causando impactos sociais, políticos, econômicos e ambientais, e tornando cada vez mais complexa a preservação de seu patrimônio histórico, arquitetônico e cultural. Tais questões foram tratadas na exposição Taipa-Tapume, realizada em setembro de 2014, na Galeria Leme, e agora são rearticuladas e revisitadas em uma plataforma editorial, com trabalhos que lidam com elementos típicos de uma revista: diagramação, ilustração, fotografia documental, legenda, texto e página de classificados. TOmás TOledO
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Obras de seis artistas comentam os constantes ciclos de construção, demolição e reconstrução que regem o desenvolvimento urbano de São Paulo
Sandra Gamarra
Sandra Gamarra apropria-se da fábula Os Três Porquinhos para elaborar um livro ilustrado, em que adapta a história original para o contexto de São Paulo. As imagens apresentadas são um fragmento do trabalho realizado em 2014 e representam simbolicamente três estágios do desenvolvimento urbano da cidade, aproximando a narrativa ficcional da narrativa histórica. FOTOS: cOrTeSia da arTiSTa
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Beto Shwafaty
O livro A Vida dos Centros (2013), de Beto Shwafaty, apresenta três áreas de São Paulo que podem ser consideradas centrais, por diferentes motivos e ligadas a períodos distintos: o Centro histórico, a Avenida Paulista e a Avenida Luís Carlos Berrini. A partir de relatos de trabalhadores que atuaram nessas áreas, conjugados a materiais iconográficos de diversos arquivos, emergem observações sobre os ciclos e fluxos de progressos da cidade, narrativas sobre mudanças urbanas e políticas que tocam questões pessoais, de natureza pública e também social. SELECT.ART.BR
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fotos: EvElson dE frEitas/folhaprEss. na pรกgina ao lado, folhaprEss
Jaime Lauriano
A série Em Exposição (2013), de Jaime Lauriano, desdobra-se em vídeos e fotografias feitas a partir de entrevistas com trabalhadores do mercado imobiliário e do setor da construção. Nesta versão, as respostas do entrevistado são suprimidas, mas nas perguntas do artista revelam-se as contradições e os conflitos em que vivem os trabalhadores das empresas que atuam na especulação imobiliária.
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Lais myrrha
Breve Cronografia dos Desmanches (2013), de Lais Myrrha, foi elaborado originalmente como uma publicação. A página aqui reproduzida articula, com imagem e texto, os conceitos de desmanche físico e simbólico, explorando seus significados e suas relações com a vida nas cidades.
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fotos: cortesia do artista
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Bruno Baptistelli
Outros Territórios (da série Transconcreto) (2010), de Bruno Baptistelli, é o registro de uma cena comum da cidade de São Paulo, onde nos deparamos constantemente com improvisos arquitetônicos e urbanísticos. Esta imagem é simbólica e sintetiza o fluxo de constante transformação que rege o desenvolvimento da cidade, evidenciando uma cisão entre a idealização do projeto e seus desdobramentos no uso cotidiano.
paBlo accinelli
Em Fuera de Campo, Pablo Accinelli utiliza-se da imagem, transferida por frottage, de uma página de classificados de jornal para evocar o potencial de projeção da imaginação que os anúncios de venda de imóveis produzem no leitor. O espectador do trabalho não tem acesso aos textos dos anúncios, mas é justamente o que está fora do texto que fornece as bases para uma possível elaboração ficcional.
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foToS: CoRTESiA do ARTiSTA. NA PAGiNA Ao LAdo, EdoUARd fRAiPoNT
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O ângulO perfeitO Dos pioneiros do século 20 ao uso de softwares, a imagem de arquitetura permanece como um dos nichos mais técnicos da fotografia, envolta em buscas meticulosas pela luz perfeita e pelo paralelismo de linhas
G A B R I E L KO G A N
Foto da série Case Study House #22 (1960), de Julius Shulman, retrata casa projetada por Pierre Koenig, em Los Angeles; acima, o fotógrafo americano procura o melhor ângulo para preservar a imagem da cidade ao fundo fotos: julius shulman
TanTo no Brasil como nos EsTados Unidos,
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o florescimento da arquitetura moderna foi acompanhado por um consistente movimento na fotografia. Há um paralelismo entre a boa arquitetura e a boa fotografia. Em meados do século 20, fotógrafos como Marcel Gautherot, Peter Scheier e Chico Albuquerque criavam uma poética autoral ao mesmo tempo que documentavam obras dos mestres brasileiros Oscar Niemeyer, Lucio Costa, Vilanova Artigas, Lina Bo Bardi e Afonso Eduardo Reidy, entre outros. Nos EUA, na mesma época, as fotos de Julius Shulman (1910-2009) serviram como verdadeiras peças publicitárias para a arquitetura moderna. Suas lentes consagraram casas criadas dentro da vanguarda artística da Califórnia e ajudaram a popularizar a arquitetura
Acima, foto de Chico Albuquerque registra cena no Edifício Louveira, em São Paulo; ao lado, o fotógrafo retrata Lina Bo Bardi em sua Casa de Vidro, em 1952
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junto ao grande público norte-americano com uma linguagem que se aproximava da propaganda. Obras de mestres como Richard Neutra, Craig Ellwood e a dupla Charles e Ray Eames estão entre as que fotografou. Shulman trabalhou na revista Arts & Architecture, uma publicação que incentivava o experimentalismo. O fotógrafo não media esforços na tentativa de conseguir o ângulo perfeito: para registrar sua imagem mais célebre – a foto da Case Study House #22, do arquiteto Pierre Koenig, com a cidade de Los Angeles ao fundo –, ele projetou o próprio corpo para fora da laje da residência. No processo de criação dessa série, assistentes seguravam galhos arrancados do jardim para criar uma massa de textura na parte superior da imagem. A composição da foto era assim feita como uma pintura. O importante não era só registrar imagens daquele espaço, mas também tornar a arquitetura bonita e sedutora para possíveis clientes e leitores. Enquanto Schulman, nos Estados Unidos, se aproximava da publicidade, no Brasil a tradição da fotografia de arquitetura emergia do jornalismo. Criava-se aqui, sobretudo a partir da década de 1950, uma identidade própria, autêntica, para os ensaios fotográficos: além de retratarem a arquitetura, as fotos eram crônicas sociais do contexto histórico. Marcel Gautherot, por exemplo, visitou diversas vezes Brasília a partir de 1958, quando se iniciava a construção da cidade. As imagens do franco-brasileiro não apenas mostram as belas formas dos edifícios de Niemeyer e o traçado urbano de Lucio Costa como também o trabalho no canteiro de obras e as atividades dos chamados candangos – os primeiros habitantes da cidade moderna, que foram para a região para trabalhar nas obras. Gautherot acaba por expor uma dimensão preciosa, mas frequentemente invisível da arquitetura: o processo de construção. Além disso, a atmosfera metafísica da cidade, construída do zero em três anos, permeia fotos das superquadras e do eixo monumental com seus canteiros a pleno vapor, envolvidos por uma densa neblina.
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Acima, foto de Pedro Vannucchi em unidade do Sesc em Sorocaba; abaixo, a Faculdade de Educação da Hogeschool, em Utrecht, Holanda, em registro de Pedro Kok
Fotos: acima, pedro vannucchi; abaixo, pedro kok. na página ao lado, chico albuquerque
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A relação com o fotojornalismo também aparece na obra de outros pioneiros. Peter Scheier – colaborador da revista O Cruzeiro – teve fotos publicadas nos livros criados para exposições no MoMA de Nova York, nos anos 1940 e 1950, sobre a arquitetura brasileira. Já Chico Albuquerque (1917-2000), mais próximo da obra de Shulman, vinha da publicidade. A crônica sobre os usos da arquitetura também aparecia nos seus ensaios por meio da inserção da figura do arquiteto como usuário do espaço construído. Esse é o caso das célebres fotos de Lina Bo Bardi em sua casa de vidro, contemplando as vistas da escada e da sala – hoje ícones da fotografia de arquitetura no Brasil. A obra de José Moscardi, menos conhecida e estudada, apesar da grande importância, focou principalmente a modernidade de São Paulo, em especial o brutalismo de Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha. Todos esses fotógrafos, entre os anos 1940 e 1960, são assíduos colaboradores das publicações de arquitetura brasileira da época, como Acrópole e Módulo – de Oscar Niemeyer – e Habitat – de Lina Bo Bardi.
RegistRos contempoRâneos
A presença do fotojornalismo nos ensaios de arquitetura adentra a década de 1970 com influente presença de Cristiano Mascaro. Entre 1974 e 1988, ele coordena o Laboratório de Recursos Audiovisuais na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, de onde obteve também diploma em 1968. Mascaro representa uma transição na tradição da fotografia de arquitetura no Brasil: do fotojornalismo para uma produção feita por fotógrafos-arquitetos. Entre seus principais discípulos na FAU-USP está Nelson Kon, hoje celebrado por publicações internacionais como um dos principais fotógrafos de arquitetura do mundo. Kon procura representar o espaço arquitetônico minimizando
Por Pedro Vannucchi, urbanização da Favela do Sapé, projeto dos arquitetos Marina Grinover, Catherine Otondo e Jorge Pessoa. Na página ao lado, Edifício Casa Pico, na Suíça, projeto de Angelo Bucci/SPBR Arquitetos, clicado por Nelson Kon
Veja na Select iPad uma galeria de imagens dos fotógrafos de arquitetura SELECT.ART.BR
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A boa fotografia de arquitetura depende da boa arquitetura e transmite emoção, além de documentar a imagem do espaço distorções nas dimensões do espaço por efeitos ópticos. Dessa forma, aproxima-se de uma estética realista, como se pudéssemos nos transportar para dentro da obra. Ele é uma espécie de militante na defesa de uma arquitetura contemporânea afiliada ao modernismo. Tem uma predileção por trabalhar com arquitetos que exploram linhas puras e soluções construtivas racionais. Dessa forma, revela obras de escritórios como MMBB, SPBR e Andrade Morretin, entre outros. Compõem ainda a seleção brasileira de fotógrafos de arquitetura outros nomes como Romulo Fialdini – reconhecido pelas fotos de espaços internos e estilo de vida – e Leonardo Finotti – que tem uma gigantesca documentação de projetos pelo mundo, incluídas obras de arquitetos ainda pouco publicados, como o paraguaio Solano Benítez. Uma nova geração de fotógrafos, também graduados em arquitetura, muito influenciada pela obra de Kon, dá continuidade à tradição brasileira. Pedro Vannucchi, por exemplo, faz
um trabalho cuidadoso: não diferentemente de alguns mestres, ele pode demorar horas para posicionar a câmera em busca de precisão geométrica. Outro novo expoente da fotografia de arquitetura no País é Pedro Kok, que, além das fotos, explora as possibilidades de imagens em movimento. Seus filmes são pensados como composições fotográficas e seus trabalhos já foram expostos em museus como o Centre Pompidou, em Paris, além de estampados em publicações como a revista italiana Domus. AnAlógico e digitAl
Desde os tempos do Case Study, a foto de arquitetura mudou. As pesadas máquinas analógicas deram lugar às ágeis digitais reflex, conhecidas como DSLR, munidas de lentes tilt-shift, que corrigem distorções de perspectiva e possibilitam o reenquadramento horizontal e vertical da imagem. Softwares de edição são capazes de colar e fundir enquadramentos, algo antes feito em laboratórios especializados. Hoje, 20 arquivos podem ser emendados digitalmente para ampliar o campo de visão de uma imagem. No entanto, nem tudo deixou de ser o que era. A foto de arquitetura permanece como um dos nichos mais técnicos da fotografia, envolto em buscas meticulosas por paralelismo de linhas verticais na imagem e pela luz perfeita para criar contrastes. As composições pretendem transmitir emoções, além de documentarem a imagem de um espaço. Mais que isso, em uma relação mutualística, a boa fotografia de arquitetura depende da boa arquitetura, assim como a boa arquitetura precisa de sua fotografia. fotos: NelsoN KoN. Na págiNa ao lado, pedro vaNNucchi
E n t r E v i s ta / Pa b l o l E ó n d E l a b a r r a
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NOVO KUNSTHALLE TROPICAL O curador mexicano assume a direção da Casa França-Brasil como um experimento, vê o ato expositivo como oportunidade de pesquisa e defende criar pensamento, em vez de importar exposições MÁRION STRECKER
ExpEriência na dirEção dE instituiçõEs Pablo León de la Bar-
ra não tem, embora tenha atuado recentemente como curador de arte latino-americana para o Guggenheim de Nova York. Mas o polivalente curador e pesquisador, nascido na Cidade do México em 1972, chegou ao Brasil no fim de janeiro para dirigir a Casa França-Brasil, no Centro do Rio de Janeiro, cheio de vontade de aproveitar o contexto ao máximo. A Casa França-Brasil funciona em edifício neoclássico projetado pelo arquiteto Grandjean de Montigny, da Missão Artística Francesa. O edifício foi encomendado por Dom João VI e inaugurado em 1820 como Praça de Comércio do Rio de Janeiro, então sede do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. Quatro anos depois, transformou-se em alfândega e foi ainda depósito para arquivos do Banco Ítalo-Germânico e sede do II Tribunal do Júri, antes de se tornar um centro cultural, em 1990. Lembremos que Pablo León de la Barra é autor de um projeto chamado Novo Museu Tropical, que se desdobrou em parte de exposição curada pelo suíço Hans Ulrich Obrist na Casa de Vidro de Lina Bo Bardi, em 2013, onde Pablo León estendeu redes nos pilotis e mostrou desenhos seus em vitrines, com perguntas do tipo “Como acordar museus mortos?” O SELECT.ART.BR
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projeto estendeu-se também em publicação e vídeo no 33º Panorama do MAM de São Paulo e nas páginas da edição 16 de seLecT, no começo do ano passado. Formado em arquitetura no México e Ph.D. em história e teoria pela Architectural Association de Londres, Pablo León defende a necessidade de se criar pensamento, em vez de simplesmente importar exposições. É o que ele pretende fazer na Casa França-Brasil, instituição cultural vinculada à Secretaria de Estado de Cultura do Rio e administrada atualmente pela organização social OCA Lage. Quanto tempo você pretende ficar no Brasil?
O contrato é de três anos, renováveis por mais três. A OCA Lage tem um tempo para administrar as duas casas: o Parque Lage e a Casa
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Pablo León de La Barra, em setembro de 2014, para a curadoria de Visão do Paraíso: Pensamento Selvagem, programa SOLO da ArtRio. Entre as obras expostas, Art (1978), de Regina Vater
França-Brasil. É uma grande oportunidade tanto para a Escola de Artes Visuais, onde está Lisette Lagnado, quanto para cá, para repensar, a partir do Rio, o que pode ser a educação de arte e o que pode ser a exposição, um instituto de cultura no Rio, no Brasil, no continente americano. Você já havia dirigido uma instituição?
Nunca. Havia trabalhado de forma muito independente, mas também no lado comercial, como diretor artístico de uma galeria comercial em Londres. Trabalhei em feiras como curador, palestrante. Fiz muita pesquisa sobre história de exposições, relação de arte e América Latina. Muito do trabalho que eu fazia como pesquisa em algum momento expus em galerias, e Lisette Lagnado expôs no Panorama do MAM-SP uma pesquisa que eu havia feito sobre diferentes tipos de museus no continente americano. E a seLecT publicou, na edição 16.
Sim! Fazer todas essas atividades me permitiu entender como funcionam os diversos atores que trabalham no campo da arte. A relação da instituição com o trabalho do artista, o trabalho do curador, como
funciona o mercado, a academia, como esse ecossistema de engrenagens funciona. Fiz tudo isso basicamente sendo independente nos últimos 15 anos, e depois veio o convite do Guggenheim para trabalhar como curador de arte latino-americana para uma iniciativa global que o museu fez com o projeto MAP, que consiste em mapear três territórios. Eu fiz a América Latina. O projeto continua, pois a exposição está itinerando e eu acompanho a exposição. O projeto era de exposição e aquisições. Foi uma oportunidade para o museu relacionar-se com toda a região, mas também para incorporar trabalhos à coleção. Isso me permitiu conhecer como funciona uma instituição tão grande como o Guggenheim. Para mim foi uma experiência incrível de aprendizagem. Uma coisa muito americana, mas de Foto: pAULA ALZUGARAY
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“É uma oportunidade de usar esse lugar para experimentar, um laboratório de pensamento tropical, de vanguarda tropical, onde podem ser criadas diferentes conexões também com artistas de outras latitudes” total respeito pelo trabalho do artista e o trabalho de conservar os trabalhos para o futuro. Todas as obras expostas foram adquiridas. A Casa França-Brasil não tem acervo, certo?
Não, não tem. Penso que o mais semelhante que pode haver é um modelo de Kunsthalle europeu, um espaço em que se fazem exposições mas não há coleção. Minha predecessora, Evangelina Seiler, penso que fez um trabalho muito importante em criar uma linha, em dar um enfoque à arte contemporânea. O que estamos fazendo há duas semanas, que não é nada, é ver qual foi a história da Casa França, desses 25 anos desde que foi fundada por esse convênio entre Darcy Ribeiro (então secretário de Cultura do Rio) com Jack Lang (então ministro da Cultura da França). Houve exposição sobre os viajantes franceses, mas também do Egito, de Miró, arte popular brasileira, exposição amazônica, uma exposição de artistas dos anos 70, que foi boa. Houve momentos muito interessantes, mas, sim, penso que o importante da direção passada foi o foco no contemporâneo, que de alguma maneira é importante continuar. E esse nome, como foi pensada essa instituição como “França-Brasil”, trata-se também de uma certa relação internacional, que usa o Rio como uma maneira para criar essa rede de trabalho, de conexões, de pensamento. Não vai haver favorecimento aos artistas brasileiros ou latinos?
Penso que tem de haver um pouco de tudo. Alguém falou outro dia: por que você vai fazer algo latino-americano? Não precisamos de latino-americanos no Rio. Queremos ser internacionais. Já temos a Casa Daros. Eu falei: eu nunca disse que vou fazer algo latino-americano, mas acho, sim, que é importante relacionar o Rio e o Brasil com o resto do continente, com a Europa... Nos últimos dez ou 15 anos, isso mudou, há mais relações e mais conhecimento entre os diferentes curadores, artistas, há colecionadores da arte que se está fazendo em outros lugares da América Latina. E se tem de ver que há diferenças de linguagem, a história colonial é semelhante, mas é diferente. Há também muitas coincidências e podemos entender o que os outros estão fazendo porque há essas semelhanças. Creio que parte do meu trabalho de curador tem consistido em criar essas conexões. Me interessa criar esses diálogos porque não são únicos, não são apenas geográficos, são diálogos de pensamento, de sensibilidade, maneira de pensar através da arte. SELECT.ART.BR
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Quais são seus planos para essa Casa?
Estarei mais focado no programa expositivo, mas me interessa usar essa oportunidade como experimento, para pensar e repensar como poderia ser uma instituição no século 21, no Rio, no Brasil, no continente americano, uma instituição cultural que não coleciona, mas que está viva, em diálogo com os artistas do lugar, que está trazendo e criando novas conexões. Qual vai ser a relação da Casa França-Brasil com a Escola de Artes Visuais do Parque Lage?
Espero trabalhar mais com Lisette Lagnado (diretora da EAV). Faz dez anos mais ou menos que conheço Lisette e, para mim, ela é uma força vital de pensamento. Segui sua Bienal de 2006, segui sua exposição de Derivas, que ela fez no Reina Sofía, segui seu Panorama. Ela é alguém que entende, como eu, que a arte, o ato expositivo, é uma oportunidade de pesquisa, não só da realidade, mas de questões vitais, de possibilidades de criar trocas de pensamento artístico. E penso que agora ela está focada na parte educativa desse projeto irmão, desse projeto gêmeo, que vai haver conexão. Ela já está fazendo micro-revoluções ali, trabalhando com novas gerações, e penso que aí pode haver muito trabalho em conjunto, em estimular e criar uma nova cena cultural a partir do Rio, que tem sido o trabalho da Escola de Artes Visuais por 40 anos. Espero muito ter uma linha direta de conexão, de conhecimento. É uma oportunidade de usar esse lugar como para experimentar, para criar novos espaços, novas ideias, um laboratório de pensamento tropical, de vanguarda tropical, onde podem ser criadas diferentes conexões
também com artistas de outras latitudes. Não se trata desse modelo que importa exposições de fora, mas realmente gerar desse lugar o próprio pensamento, as próprias exposições. Sim, está aberto a colaborações, mas que tenham essa particularidade. Vocês têm metas de público? Discutem-se essas coisas aqui ou não?
Há uma série de metas que são parte do contrato da OS com o governo, algumas bem reais, como quatro exposições por ano, ao menos uma delas com componente internacional, tem de receber público de escolas como parte da missão educativa. Fale com Marcio (Botner, diretor da OS Oca Lage). Para ele, também é uma nova etapa, passar de um projeto de que cuidou por dez anos, que é A Gentil Carioca (galeria de arte contemporânea em sociedade com os também artistas Ernesto Neto e Laura Lima, no Centro do Rio). A Gentil Carioca na realidade funcionou como um pequeno centro cultural, mais do que um projeto de galeria comercial. Esta é agora uma segunda etapa de Marcio, e também das pessoas que estão no conselho: devolver algo à sua cidade, gerar algo para a sociedade, gerar uma união de forças criativas. Há um entendimento de que, para que isso aconteça, tem de estar em diálogo com outras forças. Então tem a Lisette, que vem de São Paulo e traz uma certa sensibilidade, eu que venho do México, Londres e também de Nova York, e trago outra maneira de pensar, para criar esse momento. Você deve voltar em um ano e ver o que aconteceu. O que você está achando da cena brasileira?
Para mim, foi fundamental a primeira viagem que fiz ao Brasil, em 2000 ou 2001, que mudou meu mapa do mundo, mudou minha visão para baixo
e desde embaixo. A partir daquele momento, comecei, em Londres, a pesquisar não só a cena brasileira, mas também as outras cenas da América Latina. O Brasil me mudou nesse sentido. São Paulo é como a Cidade do México: duas megacidades de proporções tão grandes, complexas, uma vida cultural com muitas camadas. O Rio é diferente, é outra qualidade, outra sensibilidade também. O que me interessa do Rio é que tem, por um lado, uma presença muito forte vegetal, mineral, de paisagem, gente, uma combinação de lugar com população, uma combinação europeia, africana. Embora haja uma zona sul, de descendentes europeus, há muito mais que uma zona sul, que está por todos os lados, que é parte da realidade do lugar. Talvez tenha a ver com o clima também, muitas barreiras se dissolvem, ou são mais permeáveis. Por outro lado, o Rio é uma cidade que está se transformando, com as Olimpíadas. Há esse plano todo do Porto Maravilha com o risco de higienizar a cidade, de tirar-lhe essa vida, vamos ver. E de alguma maneira a Casa França-Brasil, assim como o Museu de Arte do Rio, o MAR, que está a dez minutos daqui… Essa é outra coisa interessante, o programa que Paulo Herkenhoff está desenvolvendo é incrível. Entrar no MAR é um pouco como entrar na cabeça do Paulo, e como ele tem uma vitalidade de pensamento. Cada vez que se vai ao MAR é como se estivesse abrindo janelas em outras direções. Você disse que o Brasil olha para o Atlântico, mas o Paulo olha para dentro. Você tem um orçamento definido?
A Casa França-Brasil, em edifício que foi praça de comércio em 1820 e funciona como centro cultural desde 1990
Desse tamanho (querendo dizer muito pequeno). Coisa de Brasil, inclusive o MAM, que trabalha sem ter orçamentos definidos… cada projeto que fazem no MAM eles têm de pedir a Lei Rouanet, têm de captar dinheiro para esse projeto, e às vezes não conseguem. Tanto o governo quanto a iniciativa privada precisam entender que a cultura é uma responsabilidade. É uma grande pergunta para a América Latina, que não tem um modelo como o norte-americano, onde há mais filantropia. E os governos estão se desentendendo. No México também é assim. foto: pedro agilson/oca lage
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V E R N I SSAG E
N at u r e z a i N s o N d á v e l A fotografia de Luis González Palma produz choque entre o visível e outras dimensões do saber, em exposição na Galeria de Babel, em São Paulo
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Fotos de número 10 (na página ao lado) e 18 da série Möbius(2013-14)
“A fotogrAfiA nos ApresentA A morte com os olhos Abertos”, afirma o artista guatemalteco Luis González Pal-
ma (1957), um dos maiores expoentes da fotografia de caráter experimental na atualidade. Com quase 30 anos de carreira, a obra de Palma destaca-se pela prospecção de sua pesquisa, desdobrada em séries que investigam a expressão por meio de metáforas visuais que materializam o que é intangível aos olhos. No início de sua carreira, nos anos 1980, o artista tornou-se conhecido pelos retratos frontais que, ao receberem uma camada de betume, adquiriam um aspecto sépia, tensionando assim a temporalidade das imagens. Os personagens fotografados, tipos
comuns da população da Guatemala, evocavam a ancestralidade por meio da dignidade, beleza e fragilidade que o artista captava com sua lente antes de iniciar um complexo processamento das imagens, que dentro da história da fotografia faz certa referência às estratégias da fotógrafa Julia Margaret Cameron (1815-1879). Os olhos, preservados em branco, pareciam saltar da tela e serviam de metáfora para abordar o tumultuado e violento processo de colonização e dominação dos antepassados indígenas, as relações discrepantes de poder, as idiossincrasias existentes entre a tradição e a engrenagem sociocultural e política que a coloca em xeque. fotos: cortesia luis gonzález palma/galeria de babel
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“Nesses retratos se denotava claramente a solidão desses personagens, mas também a firmeza emocional deles. O olhar direto pressupõe um espaço de contradições e ambiguidades. Trata-se de uma reflexão que tem por premissa a beleza como sinônimo da fragilidade, a memória como dor e o tempo como decadência”, diz Palma.
improVáVel equilíbrio
Um exemplo das parábolas visuais bem orquestradas por Palma em suas Hierarquias da Intimidade é a instigante imagem que recebe o título de Quando a Verdade É Absolvida. Nela vemos, no canto de um espaço em que se multiplicam as marcas da passagem do tempo, uma cadeira que se fundiu a uma mesa de apeEstrategia Que nos Une (na página ao lado), da série Jerarquías de Intimidad (2005) nas dois pés, dando-lhe um improvável e delicado ponVisão subjetiVa to de equilíbrio. A imagem representa mais aquilo que falta Passado esse momento, em que a obra do artista fazia à cena do que os elementos físicos de fato. Quais foram as referências diretas à história política e hierárquica de histórias que imprimiram a passagem do tempo nesse espaseu país, pensado como um microcosmo das relações de ço familiar? A cadeira e a mesa, amalgamadas, apresentampoder como um todo, suas novas séries foram ganhan-se atrofiadas, alijadas da funcionalidade que as justifica no do maior subjetividade. Criar símbolos, metáforas visumundo. Quais foram as ocorrências que as tornaram assim? ais potentes, que pudessem expressar a impossibilidade Que verdade foi absolvida dessa equação que resultou em de se narrar a história dos desígnios do ser por meio da vestígios que não podem mais ser rastreados e esse improfaculdade da visão tornou-se um paradigma ainda mais vável equilíbrio do território doméstico? agudo em sua produção. Segundo Luis González Palma, “trata-se de um ensaio O olhar que certifica a história deve ser abandonado com imagens carregadas de mistério e tensão, que represenem prol de um olhar que repensa, reflete e transforma tam um drama detido e inquietante, no qual cada fotografia essa história condensada pela experiência, pelo choque atua como um instante de sonho alargado, em que figuras entre aquilo que o visível apresenta e outras dimensões atemporais são como feridas da memória”. do saber que vão moldar, esculpir, macular e, então, dar Avançando cada vez mais nessa direção, na qual o artista uma forma renovada e infinitamente mais complexa à investe contra os paradoxos que almejam dar materialidade imagem que iniciou o processo. ao que possui natureza insondável e invisível, Palma vem, Por meio desse olhar labiríntico, Palma começou, em desde 2013, trabalhando na série Möbius, em referência di2004, a construir a série Jerarquías de Intimidad (Hierarreta à Fita de Möbius, um espaço topológico estudado por quias da Intimidade), que é parcialmente exposta na GaleAugust Ferdinand Möbius, em 1858, no qual o pesquisador ria de Babel, em São Paulo, a partir de 7 de abril. Realizada representa um caminho sem fim nem início, infinito, que na Argentina, onde mora atualmente, essa série representa pode ser percorrido em toda a superfície da fita que tem “cenas carregadas de experiências psicológicas significatiapenas um lado, mas aparenta ter dois. vas”, em que a frase que serve de título a cada imagem, Com essa série, Palma radicaliza ainda mais suas estratégias, como O Gozo do Não Dito, expande as fronteiras simbólina imbricação da fotografia com outras linguagens, como a cocas de cada fotografia. Cria-se, assim, uma espécie de jogo lagem e a escultura, por exemplo, gerando trabalhos de intenno qual palavras e imagens geram um sistema não linear sa beleza formal e apresentando um mergulho profundo nos em que o espectador é impulsionado, entre enigmas, a enigmas do olhar. Se a fotografia nos apresenta a morte com os fazer livres conexões. É curioso perceber nesse sistema a olhos abertos, como diz Palma, em Möbius, mais do que nunsemelhança com obras literárias, tais como O Castelo dos ca, vislumbramos novas dimensões possíveis segredadas entre Destinos Cruzados, de Italo Calvino, e contos específicos nossas inabaláveis certezas e o insondável que nos ronda. de Jorge Luis Borges e Julio Cortázar. SELECT.ART.BR
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foToS: CoRTESiA LuiS gonzáLEz pALmA/gALERiA dE BABEL
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Fotografia nº 6, da série Möbius, na qual o fotógrafo guatemalteco radicado em Buenos Aires vem trabalhando desde 2013
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A seção Vernissage é um projeto realizado em parceria com galerias de arte que prevê a publicação de um texto sobre a obra de um artista que estará em exposição durante os meses de circulação da edição.
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Sem Título (2015),obra da exposição Para as Amarras, em que Tostes se refere à Telemaquia
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V E R N I SSAG E
( ao m e u a m o r m a i o r e l i n d o ) (axé) Em individual na Luciana Caravello Arte Contemporânea, no Rio de Janeiro, Afonso Tostes aproxima a poesia de Homero e a cultura tradicional dos terreiros da Diáspora Africana
Bernardo Mosqueira
Em 2013, Afonso TosTEs convidou-mE pArA fAzEr A curAdoriA dE suA Exposição individuAl nA cAsA frAnçA-BrAsil, no rio dE JAnEiro. No início do pro-
cesso de desenvolvimento da mostra, fomos até a Fazenda Bom Retiro, na cidade de Chapéu Duvas, no interior de Minas Gerais, para encontrar as peças de madeira que um dia formaram a estrutura de um paiol que fora utilizado para armazenar as colheitas de milho da região. Estando todas as peças surpreendentemente presentes e em boas condições, decidimos por remontá-lo dentro do centro cultural. Após pesquisa sobre sua origem e uso, descobrimos que
ele havia sido construído há 250 anos por africanos escravizados que haviam chegado ao Brasil na Praça XV (a poucos metros de onde hoje é a Casa França-Brasil) e, logo após serem comprados, haviam sido forçados a caminhar acorrentados do litoral carioca até a tal fazenda mineira. O paiol construído por esses homens e mulheres assistiu à tortura, humilhação, sofrimento e morte deles e de várias gerações de descendentes. Suas peças de madeira seriam vendidas para fazer batentes de portas e janelas de uma pousada próxima a Juiz de Fora. Isso não aconteceu, pois Xangô, o grande rei, o poderoso orixá, apareceu para nós
foto: cortesia Luciana caraveLLo arte contemporânea
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dois e nos indicou que aquela exposição deveria tratar da história do povo negro no Brasil. E foi assim que nasceu Tronco, exposição que apresentava quatro grandes instalações, sendo uma delas intitulada Articulação. Esse trabalho consistia numa sala escura em cujas paredes estavam fixadas oito pinturas, nas quais podíamos ver representada uma chama acesa sobre um fundo azul-marinho. Às oito peças e suas oito chamas se somava uma última pintura ígnea, feita diretamente sobre a parede quase preta do ambiente. A tal instalação baseava-se na Oréstia, trilogia clássica de Ésquilo – mais especificamente um trecho de seu início que narra a chegada em Atenas da informação da vitória em Troia. A história conta que olheiros permaneceram posicionados próximos a pilhas de madeiras nos topos de nove ilhas e montes durante toda a duração da batalha e que, na noite em que aconteceu a vitória, ateou-se fogo na pilha de madeiras em Troia e, acendendo as outras fogueiras, uma a uma, foi possível levar até Atenas, em poucas horas, a mensagem do fim da guerra. Essa instalação reverberava o desejo de que chegaria o dia em que poderemos anunciar na África a vitória do povo negro no Brasil. Essa foi a primeira experiência de aproximação que Afonso Tostes (que tem longa história pessoal de relação com a cultura de matriz africana) construiu entre a cultura clássica grega e a história do povo negro no Brasil. Certamente, foi esse o trabalho que abriu os caminhos para a organização de Para as Amarras, nova exposição individual que o artista faz na Galeria Luciana Caravello, a partir de 21 de maio. Desta vez, Tostes lançou-se sobre um estudo sistemático da Telemaquia, primeira parte do clássico A Odisseia, atribuído a Homero, e a relacionou diretamente à Diáspora Africana, violento fenômeno ocorrido entre os séculos 16 e 19, que forçou a imigração de mais de 35 milhões de africanos escravizados e sequestrados de seu continente de origem para as Américas, Ásia e Europa. EntrE o céu E o mar
É interessante apontar que A Odisseia é considerada a segunda obra da história da literatura ocidental, enquanto a expressão Diáspora Africana surge entre o fim da década de 1980 e o começo da década de 1990 em um contexto de construção de vocabulário e teoria pós-colonial. Odisseu foi um herói grego que passou dez anos na Guerra de Troia e, com sua característica astúcia, foi um dos maiores responsáveis pelo fim daquela batalha. A
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Odisseia conta a história de seu retorno até Ítaca, sua cidade de origem, onde, por sua ausência e pela falta de informações sobre sua vida ou morte, muitos pretendentes cercavam sua mulher de forma abusiva. Telêmaco era o filho do casal que fora afastado do pai muito cedo pela guerra. A Telemaquia conta a história da transformação de Telêmaco adolescente em adulto, no momento em que, temendo pelo futuro da família e do reino de Ítaca, resolve buscar notícias sobre o paradeiro do pai. O trecho pesquisado por Tostes termina justamente com a partida de Telêmaco, que desejava assassinar todos os pretendentes de sua mãe, mas, para isso, precisaria da ajuda de Odisseu. Nesse trecho do poema, nos é narrado um processo de busca pela própria origem e de realização da própria força, que é guiado pela deusa Atena. Apenas nesse início, podemos ler detalhes sobre sacrifícios de animais feitos para os mortos e para a tal deusa, e há trechos, inclusive, em que Atena aparece para Penélope em sonho e para Telêmaco como o rei Mentor, indicando as estratégias que o jovem deveria adotar para obter sucesso. Aliás, eis a origem da palavra “mentor”. A Diáspora Africana, por sua vez, é também – como definido pela União Africana em 2002 – um processo de busca de qualquer descendente africano por sua origem, além de ser parte fundamental do desenvolvimento atual do continente africano. Na exposição na Luciana Caravello Arte Contemporânea, Tostes entende que o Atlântico que banha o Brasil e a África ainda é o mesmo que nos une e separa. Para essa mostra, ele elaborou uma série de experiências com velas de barco, telas sem chassi, cordas náuticas e um conjunto de peças de madeira recolhidas da beira de praias cariocas com interesse naquilo que está entre o céu e o mar. É interessante imaginar que a Odisseia é um poema composto originalmente para ser cantado, repassado oralmente, com o mesmo tipo de processo com o qual foi transmitida a cultura negra no Brasil. Há, na poesia de Homero, e na cultura tradicional de terreiro, uma vontade de afirmar um mundo específico para a eternidade. Além disso, A Odisseia também é a história de um processo de sobrevivência, astúcia e de um povo protegido por deuses que se manifestam como sentimentos, poderes e acontecimentos dos homens ou da natureza. As obras em exposição reverberam a vontade não de um retorno físico à África, mas são plenas na vontade de fortalecer a própria astúcia e contar com a ajuda dos deuses para então descobrir como vencer os usurpadores da justiça.
“Há, na poesia de Homero, e na cultura tradicional de terreiro, uma vontade de afirmar um mundo específico para a eternidade”
Peças de madeira recolhidas da beira de praias cariocas compõe nova série de trabalhos
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A seção Vernissage é um projeto realizado em parceria com galerias de arte que prevê a publicação de um texto sobre a obra de um artista que estará em exposição durante os meses de circulação da edição.
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foto: cortesia Luciana caraveLLo arte contemporânea
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Sharjah
TempoS embaralhadoS
Obra do argentino Adrián Villar Rojas na Bienal de Sharjah
luiSa duarTe
Com suave acento político, 12a Bienal de Sharjah prefere murmurar a gritar Sharjah é um Emirado Árabe no qual o cruzamento de tempos é evidente. Um passado longevo mistura-se a um presente ainda em construção. É nesse lugar onde camadas de tempo se misturam que se dá a 12ª edição da Bienal de Sharjah, sob curadoria de Eungie Joo, intitulada The Past, The Present, The Possible. Reunindo 55 artistas de 25 diferentes países, em que 36 apresentam obras inéditas ou comissionadas, a mostra consegue manter, ao longo de seus diferentes momentos, em espaços distintos da cidade, um acento político que antes prefere murmurar do que gritar, mesclando obras de forte vigor formal com outras de claro empenho narrativo. A exposição exibe desde nomes jovens, como a dupla premiada Basel Abbas & Ruanne Abou-Rahme, passando por artistas da mesma geração da curadora, como Damián Ortega, Danh Vo, Haegue Yang e Julie Mehretu, sendo marcada ainda por uma série de obras de nomes menos conhecidos, cujos trabalhos passam longe do que seria mais palatável para o mercado. Jac Leirner e Cinthia Marcelle são as duas artistas brasileiras da exposição. A primeira apresenta uma bela sala, na qual as obras – que seLeCt.art.Br
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Sharjah Biennial 12, até 5/6, www.sharjahart.org
mesclam o desejo construtivo e minimalista ao rumor do cotidiano e da vida que passa – dialogam muito bem com uma Bienal que se quer política, mas de maneira sutil. Cinthia Marcelle realiza especialmente para a mostra a instalação At The Risk of The Real, na qual o trabalho mais cotidiano é ressignificado, geometria e imprevisibilidade se encontram, e temos assim uma cena de alta voltagem poética e visual instaurada entre milhares de grãos de areia. O maior destaque de uma Bienal marcada por pontos altos está localizado em um galpão de uma fábrica de gelo desativada em Kalba, vilarejo a uma hora e meia do centro de Sharjah. Planetarium, do argentino Adrián Villar Rojas, traz uma série de esculturas cujas bases são pilares que um dia já existiram naquele local. Ou seja, se constrói o novo a partir das ruínas, e não de uma tábula rasa. Cada “nova” coluna é formada por materiais encontrados pelo artista e sua equipe ao redor do lugar: concreto, terra, plantas, sabonetes, conchas, uma calça jeans, um tênis Adidas, pedras, frutas, leguminosas, e assim por diante. Camadas de diferentes tempos, uns perecíveis, outros que podem sobreviver por milênios, outros ainda por florescer, juntam-se em uma obra de forte apelo pictórico que pede para ser vista à distância, e bem de perto. Planetarium traz consigo uma esperança de fundo melancólico, ou seja, uma consciência do tempo que olha para o passado à luz da urgência do presente, semeando assim novos possíveis para o por vir – sem dúvida uma bela e potente síntese para The Past, The Present, The Possible. fotos: eduardo ortega
reviews Livros
MonuMento teórico PauLa aLzugaray
Hal Foster alicerça a arquitetura contemporânea sobre suas conexões com a arte Hal Foster é uma das grandes antenas da cultura contemporânea. Quando, nos anos 1990, etnografia, antropologia, documentarismo e arquivos inundavam a produção artística, o crítico norte-americano produziu O Retorno do Real (1996), ensaio definitivo sobre o legado do pop entre as formas de realismo então emergentes. Nos anos 2000, quando a globalização e a nova ordem informacional instauraram os ambientes de socialização amigavelmente protegidos das redes sociais, Foster lançou o petardo Design and Crime (2003), denunciando a sociedade do conforto e a infantilização da cultura. Agora o crítico, historiador e editor da revista October aponta em O Complexo Arte-Arquitetura (2011), recém-lançado no Brasil, para conexões entre arte e arquitetura como chave de entendimento da cultura contemporânea. Embora altamente erudita, estruturada sobre teorias marxistas, pós-estruturalistas e da psicanálise, a escrita de Hal Foster neste O Complexo Arte-Arquitetura é generosamente palatável, buscando um caminho entre o comentário jornalístico e a crítica especializada. “Ainda há pouco tempo, um quase pré-requisito para uma arquitetura de vanguarda era seu compromisso com a teoria; mais recentemente passou a ser a relação com a arte”, anuncia no prefácio. Teórico do pop e do minimalismo, Foster alicerça toda a arquitetura contemporânea e pós-moderna sobre a coexistência simultânea dos dois movimentos artísticos na América do pós-Guerra. De entrada, aponta que, em meio à austeridade eco-
O Complexo Arte-Arquitetura, Hal Foster, Cosac Naify, 288 págs. R$ 59
nômica da Grã-Bretanha dos anos 1950, a ideia do pop – e de seu comprometimento com a cultura de massa – é lançada por um grupo de jovens artistas, arquitetos, críticos de arte e historiadores da arquitetura. Negando o lema da arquitetura modernista (Mies van der Rohe) – less is more (menos é mais) –, prescrevem o projeto pós-moderno do less is a bore (menos é uma chatice), sustentada sobre uma “estética da obsolescência” e uma “nova ordem simbólica da superfície e da tela”. Robert Venturi, autor da atualização do lema modernista e de Aprendendo com Las Vegas, de 1972 – tratado que discutia as novas bases da arquitetura a partir do corredor comercial (strip) da cidade-cassino –, citava o fotolivro Every Building on the Sunset Strip, de Ed Ruscha, como inspiração decisiva. “No entanto, esta é uma compreensão parcial do pop (...). Nem mesmo Ruscha endossava a nova paisagem automobilística”, desconstrói Foster, preocupado em apontar fragilidades e contradições das conjunções arte-arquitetura. Outros totens da arquitetura pós-moderna e contemporânea, como Richard Rogers, Renzo Piano, Rem Koolhaas, Frank Gehry, Norman Foster, Zaha Hadid, Diller Scofidio, Yoshio Taniguchi, Herzog & de Meuron e Jean Nouvel, são igualmente contextualizados, comentados e desconstruídos neste que se apresenta como mais um monumento da crítica cultural. “Sem a crítica não há alternativas”, dispara. foto: divulgação
rEviEws livros
ProJETo soCiAl luCiAnA PArEJA norbiATo
Coletânea de ensaios críticos de Mário Pedrosa confirma o peso de sua importância e influência no meio arquitetônico brasileiro Um crítico não constrói seu texto só com opinião, mas com a inserção nas entrelinhas de um projeto de sentido mais amplo. É o caso de Mário Pedrosa, norte da crítica de arte brasileira do século 20. Arquitetura: Ensaios Críticos, um dos dois primeiros livros de uma coleção inteiramente dedicada a Pedrosa – ainda sem número de títulos definido (o outro é Arte: Ensaios) –, aborda um tema de capital importância para a compreensão de seu legado, a arquitetura. O ex-membro do Partido Comunista, expulso por sua orientação trotskista (ou revolucionária) nos anos 1930, nunca deixou sua militância por um país mais justo à parte de seus textos sobre arte. Ao contrário. Para Pedrosa, por seu caráter transgressor, a arte seria o motor do surgimento de novos paradigmas sociais. Daí o abandono de sua defesa da arte engajada proletária e a adesão ao construtivismo abstrato. É nesse momento da trajetória de Pedrosa que a antologia de textos jornalísticos lança uma luz reveladora. Como o arquiteto e urbanista Guilherme Wisnik frisa no ótimo texto de apresentação, “é espantoso, nesse sentido, o contraste entre o peso de sua importância e influência no nosso meio arquitetônico e o caráter não sistemático de sua produção, somado ao fato de a arquitetura ter ocupado um espaço pontual em sua carreira”. Isso se deve ao fato de o crítico ter abraçado a arquitetura modernista em seu projeto de concretização do ideal de igualdade. Segundo Pedrosa, por seu aspecto utilitário e sua penetração no cotidiano de forma maciça, a construção SELECT.ART.BR
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Arquitetura: Ensaios Críticos, organização de Guilherme Wisnik, Cosac Naify, 208 págs., R$ 49,90
modernista seria, em si, qualidade de vida para a população e, ao mesmo tempo, o elemento de sensibilização do homem comum para um novo olhar ao mundo. Brasília seria o símbolo máximo dessa utopia, se fosse ocupada também por seus operários. Mas, quando eles foram transferidos para as cidades-satélites sem qualquer planejamento, o crítico viu seu prognóstico frustrado e parou de escrever sobre o tema. Pela cuidadosa seleção de Wisnik, a narrativa do conjunto de textos faz a fiel condução desse percurso da quimera à desilusão. Se não viu seu sonho tornar-se real, Pedrosa imprimiu-o no papel com tal desejo de concretude que, mesmo com o passar do tempo, segue inspirando o pensamento arquitetônico na busca de uma utopia que se possa construir de fato. foTo: divuLgAção
Livros
FotograFia é cinema
Truffaut é homenageado na fotografia La Nuit Américaine de Vicente de Mello
Katia macieL
Poética cinematográfica é evocada em séries de Vicente de Mello reunidas em fotolivro “Que maravilha poder olhar o que não vemos”, disse Jean-Luc Godard sobre o cinema, em seu documentário Histoire(s) du Cinéma. As séries fotográficas de Vicente de Mello, reunidas pela primeira vez no fotolivro Parallaxis, nos aproximam, nos gestos, na escala, nos títulos e na fabulação, do universo cinematográfico. Na série Galáctica, o artista apropria-se de um repertório de objetos domésticos – luminárias, candelabros e spots de luz – para gerar uma cosmologia em preto e branco, na qual gravitamos, como na odisseia futurista de Stanley Kubrick. François Truffaut é homenageado nos letreiros acesos sobre a Paris noturna na fotografia La Nuit Américaine, da série Quantas Asas Tem um Pixel? Em D’Après, o acúmulo de imagens de luz e sombras no cortinado da janela na fotografia Para Bergman faz referência à atmosfera dos filmes do cineasta.
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Parallaxis, Vicente de Mello, Editora Cosac Naify, 320 págs., R$ 130
Na seriação de imagens o livro fabula possíveis narrativas, como na sucessão das fotografias O Aquário – uma sandália invertida; Dimensão Contida – o reflexo de uma fila em uma estação de trem; e Rosa dos Ventos – uma mulher descalça prestes a saltar de um parapeito; todas imagens em contraluz da série Contre-Jour. É o próprio artista Vicente de Mello que em verbetes, ao mesmo tempo conceituais e técnicos, resume o problema de cada conjunto de imagens em uma poética transparente que incide e acompanha o modo do espectador ver as imagens. Parallaxis é uma palavra grega que significa alteração e é um termo recorrente na fotografia por se referir à diferença da posição aparente de um objeto visto de diferentes pontos de vista. O livro inicia-se com um movimento em close ou trailer sobre todas as séries. Vemos partes ampliadas das fotografias que aparecem a seguir, sempre dispostas de modo particular em uma montagem definida pelo enquadramento que demanda cada sequência. É precisa a edição de Charles Cosac e Miguel de Castilho ao definir a mancha gráfica como variação do espaçamento do visível. Para quem conhece o trabalho de Vicente de Mello é um privilégio ver a forma primorosa da sua obra em Parallaxis. Para quem não o conhece, a oportunidade é única.
foTo: viCEnTE dE mELLo
SÃO PAULO
jAneLAS de eSqUecimentO GUStAVO FiORAtti
A segunda exposição do jovem espaço Lama.sp, parece reduzirse, em um primeiro momento, à intenção de uma provocação Ao usar telas de tapume laranja para tampar partes ou a totalidade de fotos assinadas por Leonardo Finotti, todas elas retratando fachadas de edifícios modernistas de São Paulo, o artista suíço Mayo Bucher concede-nos a expressão de um posicionamento político, lembrando-nos de olhar com mais afeto para o patrimônio histórico. Suas interferências na mostra Art Towards Architecture perturbam o olhar não embotado ao mesmo tempo que acusam os que se acostumaram com um imaginário precário avançando rudemente por uma cidade sempre em construção. Essa leitura não é de todo rasa, pois as fachadas retratadas na região central impregnam-se com a atmosfera do entorno decadente, corroído pela ação daninha do esquecimento. Ainda assim há muito mais a ser visto na obra de Bucher, para além da questão política. Trabalhos anteriores do artista, alguns deles expostos no corredor que dá acesso à sala principal do Lama.sp, são também compostos de sobreposições de materiais com algum grau de transparência. São frequentes os desenhos geométricos, grafismos e as formas numéricas permitindo entrever, por baixo, imagens fotográficas. Também há um quadro feito a partir do decalque de um material gelatinoso sobre um
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ABR/mAi 2015
Fotógrafo Leonardo Finotti e artista suíço Mayo Bucher chamam a atenção para o patrimônio histórico da cidade
Art Towards Architecture, até 3/5, Lama.sp, Pça. Pedro Lessa, 110, 37º andar, São Paulo www.facebook.com/ lamasaopaulo
assoalho de tacos. Removido o piso, resta impressa uma memória. Dessa forma, o uso da sobreposição, no trabalho de Bucher, permite identificar, em suas camadas, memórias aparentemente desconexas, enquanto revela-se a relação crua da identidade dos materiais. O mesmo exercício dá o norte para Art Towards Architecture, embora torne-se mais evidente na nova série a proposição de um ruído, ou mesmo de um erro na intenção de uma composição harmônica. É quase infantil a maneira como o artista opta por aplicar faixas do material sem exceder os limites impostos pelas colunas verticais formadas pelas janelas, do térreo à cobertura. Nesse respeito com a gestalt, pincela-se uma suposta paródia sobre a arte concreta. Esse cuidado cai por terra em um apêndice da exposição em uma sala ao lado, ocupada por uma espécie de casulo feito com o mesmo material laranja, cujo interior é habitado por uma lâmpada fria. A exposição, por fim, extravasa seu conteúdo para o lado de fora das salas, que ficam no 37° andar do Edifício Mirante do Vale, com vista para o Anhangabaú. Também com tela de tapume, Bucher recobre uma faixa inteira do prédio, o que só é possível ver da rua. Após a visita, torna-se possível um reposicionamento sobre a primeira impressão passada pelo farto material laranja. Em eterna manutenção, a cidade enverga-se a uma bela apropriação poética.
foToS: guSTAvo hiRiART
APRESENTA:
GASOLINAS BRASILEIRAS Nas próximas páginas, você vai conhecer as gasolinas Petrobras e vai comprovar que todas elas possuem mais inovação e tecnologia do que você imagina. Vai saber mais também sobre a nova gasolina Petrobras Grid, que proporciona maior desempenho e máxima eficiência ao seu carro.
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GASOLINA PETROBRAS. A gasolina Petrobras possui tecnologia e qualidade equivalentes às das mais avançadas do mundo. Desde 1o de janeiro de 2014, ela tem, no mínimo, 94% menos enxofre que as antigas gasolinas e está disponível em todo o território nacional.
GASOLINA COMUM
Menor impacto ambiental
Maior proteção do motor
Melhor desempenho
CARACTERÍSTICAS DA GASOLINA PETROBRAS: Redução de 800 partes por milhão para até 50 partes por milhão do teor de enxofre na gasolina. Uma diminuição de 94%, que reduz as emissões de óxidos de enxofre em 35 mil toneladas por ano. Foi desenvolvida para os motores brasileiros, atendendo às exigências das tecnologias de última geração para o controle das emissões dos poluentes veiculares. Essas tecnologias atendem aos limites de emissões estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) para veículos leves do Programa de Controle das Emissões da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve).
Evolução da Qualidade das Gasolinas Petrobras ó Segmento Automotivo 119
Gasolina Fórmula 1
Gasolina S-50
Gasolina Aditivada SUPRA Remoção do chumbo da gasolina (pioneirismo)
Gasolina
Gasolina PREMIUM
Pioneirismo com produto S-30
BENEFÍCIOS DA GASOLINA PETROBRAS: Possibilita a introdução de novos veículos com modernas tecnologias para o tratamento de emissões. Reduz as emissões de gases no escapamento dos motores atuais de última geração. Baixíssima formação de depósitos em válvulas, bicos injetores e na câmara de combustão: menor desgaste e vida útil mais longa do motor. Aumento do desempenho e prolongamento da vida útil do catalisador e redução do desgaste do motor. Permite uma vida útil mais longa do lubrificante, mantendo a eficiência energética com menor custo de manutenção. 60% menos poluição causada por veículos.
PROGRAMA DE OLHO NO COMBUSTÍVEL É o programa dos Postos Petrobras que garante a qualidade do combustível do seu veículo e, por isso, mostra o compromisso que a Petrobras tem com o consumidor.
MAIOR DESEMPENHO. MÁXIMA EFICIÊNCIA. Desenvolvida no Cenpes, um dos centros de pesquisa aplicada mais importantes do mundo, a Petrobras Grid tem na sua fórmula aditivos que garantem maior desempenho e máxima eficiência. A gasolina Petrobras Grid incorpora o aditivo modificador de atrito e mantém-se entre aquelas de melhor desempenho na ação detergente-dispersante.
CARACTERÍSTICAS DA GASOLINA PETROBRAS GRID
• Aditivo detergente e dispersante. • Aditivo modificador de atrito, que reduz o desgaste das peças. • Coloração esverdeada exclusiva. • Baixo teor de enxofre.
BENEFÍCIOS E MELHORIAS PARA O CONSUMIDOR: Reduz os desgastes das peças.
Mantém sempre limpo o sistema de alimentação de combustível.
QUAL A PRINCIPAL FUNÇÃO DO ADITIVO MODIFICADOR DE ATRITO? Sua principal função é atuar nos componentes internos do motor (anéis de segmento, pistões e cilindros) de forma a minimizar o atrito entre eles e, com isso, proporcionar maior aproveitamento da energia mecânica produzida.
Menor custo de manutenção.
Pode ser utilizada em qualquer veículo movido a gasolina, ou flex, especialmente os equipados com injeção eletrônica.
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Reduz as emissões de poluentes.
A cor esverdeada facilita sua identificação e a diferencia dos demais combustíveis.
Combustível do carro.
Tem combustível que já nasce com o brasileiro. Os outros, a gente desenvolve aqui. Nova gasolina Petrobras Grid. Maior desempenho, máxima eficiência. Gasolina se escolhe assim.
www.petrobras.com.br
CombustĂvel do Erick. 123
CURIOSIDADES A gasolina Petrobras Grid passou por 1.200 horas de testes, durante um ano de pesquisas, até chegar às bombas dos postos de combustíveis.
Um dos principais testes realizados foi o de retomada de velocidade, executado em uma pista de provas e que obteve um resultado excelente. A gasolina Petrobras Grid é a substituta da gasolina Supra nos Postos Petrobras de todo o Brasil.
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GASOLINA PETROBRAS GRID GASOLINA COMUM
O uso contínuo da gasolina provoca acúmulos depositados no motor, prejudicando a sua eficiência a longo prazo.
A gasolina Petrobras Grid combate esse problema prevenindo a formação de depósitos com seus aditivos de limpeza.
DÚVIDAS FREQUENTES
1 - Como a gasolina Petrobras Grid se diferencia no mercado? A gasolina Petrobras Grid incorpora o aditivo modificador de atrito e mantém-se entre aquelas de melhor desempenho na ação detergente-dispersante.
2 - O que se deve ter em mente na hora de fazer a escolha de qual gasolina usar para abastecer o carro? Qualidade do produto, custobenefício, marca e contribuição ao meio ambiente.
3 - Pode-se intercalar o uso da gasolina comum com a gasolina Petrobras Grid? Sim, porém os benefícios obtidos com os aditivos não poderão ser totalmente observados no dia a dia.
4 - Onde eu encontro a Petrobras Grid? A Petrobras Grid já está disponível em todos os Postos Petrobras do Brasil.
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GASOLINA PETROBRAS PODIUM. A Petrobras Podium é a gasolina de alta performance da Petrobras e com qualidade internacional. É a gasolina automotiva de maior octanagem comercializada em todo o mundo.
Pode ser utilizada em qualquer veículo a gasolina ou flex. As retomadas de velocidade acontecem em menor tempo e as ultrapassagens ficam mais seguras. Sua fórmula de alta estabilidade resulta em menor degradação, mantendo inalteradas suas propriedades por muito mais tempo. Desenvolvida com a mesma tecnologia utilizada na concepção da gasolina da Fórmula 1. Possui ultrabaixo teor de enxofre, característica que reduz a emissão de poluentes e ajuda a preservar o meio ambiente.
Petrobras Podium
Petrobras Grid
Petrobras Podium
87 87 Gasolina Comum
95
ITIVOS
É a capacidade que o combustível tem, em mistura com o ar, de resistir a altas temperaturas na câmara de combustão, sem sofrer detonação. A detonação também é conhecida como “batida de pino” e pode destruir o motor. Quanto maior a octanagem, maior será a resistência à detonação. Veja ao lado o comparativo entre as gasolinas da Petrobras.
ADITIVOS
O QUE É OCTANAGEM?
Método IAD (Índice Antidetonante) = (MON + RON)/2
Principais Características da Gasolina Petrobras Podium 127
- Contém detergentes/dispersantes que mantêm limpo o sistema de alimentação evitando formação de depósitos no motor; - Assim como as demais gasolinas brasileiras, a Petrobras Podium recebe adição de etanol anidro; - Combustível com ultrabaixo teor de enxofre (UBTE) e, por isso, menos poluente, apresentando teor de enxofre máximo de 30 ppm;
BENEFÍCIOS:
- É levemente alaranjada devido ao corante laranja adicionado ao etanol anidro;
Maior durabilidade do motor (menor formação de depósitos nos motores, possibilitando aumentar os intervalos entre as manutenções);
- Pode ser utilizada em qualquer veículo movido a gasolina ou flex, especialmente os equipados com injeção eletrônica;
Baixo nível de emissões de gases poluentes no meio ambiente (menos poluente);
- Recomendada principalmente para veículos que possuem motores de alto desempenho e/ou que requeiram combustível com alta octanagem;
Melhor desempenho (resposta) nas retomadas de velocidade, proporcionando mais segurança nas ultrapassagens;
- Contém aditivo modificador de atrito, que reduz o desgaste das peças.
Menor desgaste das peças.
s e l e c t e x pa n d i d a
#AcidAdevistAdecimA Leitores enviam imagens de cidades clicadas a partir de localizações elevadas via Instagram. Conheça as 12 finalistas no nosso site e as quatro mais votadas pelo júri da seLecT
Da esquerda para a direita: Robson Leandro da Silva (@robson_leandro), Alexandre Urch (@aurch), Thiago Honório (@honoriothiago) e Stephanie Massarelli (@tetelina). Eles foram eleitos por: Redação da seLecT, Cássio Vasconcellos, Cripta Djan e Facundo Guerra
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em construção
P r o j e t o P i Pa e m americanóPolis O que as ruas de Americanópolis, a Argentina e a Choque Cultural têm em comum? O grafiteiro Tec. Nascido em Córdoba, mas radicado na capital paulista há quatro anos, o artista representado pela galeria especializada em grafite escolheu o bairro do extremo sul de SP como cenário de suas novas pinturas gigantes sobre o asfalto. Se antes elas estampavam as ruas de Perdizes e até a avenida Paulista com homens e animais, como ratos e lagartixas, agora Tec trouxe à tona um hábito lúdico da vida das regiões mais afastadas: empinar papagaio. Quatro enormes pipas coloridas foram pintadas em diferentes ladeiras de Americanópolis, parecendo sobrevoar o chão. Daí o nome, Projeto Pipa. Uma forma de colocar poesia no cotidiano urbano. Mas como registrar o processo de criação de uma pintura com essas dimensões? Com ajuda da tecnologia, claro. Munido de um drone, o artista clicou a série de fotografias que o Eduqativo da Choque, localizado no Centro de São Paulo (www. institutochoquecultural.org.br/#oinstituto), exibe a partir de 11 de abril. Em agosto, o artista ganha individual na sede da galeria, apresentando de novo as imagens hi-tech, acompanhadas de pinturas inéditas. LPN SELECT.ART.BR
ABR/mAi 2015
foTo: CoRTESiA TEC/CHoQUE CULTURAL
DOMINIQUE GONZALEZ-FOERSTER FABIO MIGUEZ GUIMAR ÃES ROSA NUNO R AMOS EDUARDO K AC
7 7 2 2 3 6
3 9 3 0 0 3
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As relações amorosas, possessivas, conturbadas, enigmáticas e irônicas que os artistas visuais desenvolvem com as palavras e a literatura
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ISSN 2 236-393 9 exemplar De assINaNte venda proibida
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a r t e e C U Lt U r a C O N t e M P O r â N e a
JUN/JUl 2015 fev/mar 2015 aNO aNO0505 eDIÇÃO eDIÇÃO2422 r$r$16,90 16,90
O Amante, 2015, de Fabio Morais
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